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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ GUSTAVO KREMER O EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA: uma análise à luz da principiologia constitucional São José 2009

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

GUSTAVO KREMER

O EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA: uma análise à luz da principiologia constitucional

São José

2009

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GUSTAVO KREMER

O EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA: uma análise à luz da principiologia constitucional

Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial a obtenção do grau em Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. MSc. Rodrigo Mioto dos Santos.

São José 2009

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GUSTAVO KREMER

O EXCESSO DE PRAZO NA PRISÃO PREVENTIVA: uma análise à luz da principiologia constitucional

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e aprovada

pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e

Jurídicas.

Área de Concentração: Processo Penal e Direito Constitucional.

São José, 29 de outubro de 2009.

Prof. MSc. Rodrigo Mioto dos Santos UNIVALI – Campus de São José

Orientador

Prof. MSc. Luiz Magno Pinto Bastos Junior UFSC – Curso de Pós-Graduação em Direito – Campus Trindade

Membro

Prof. MSc. Daniel Lena Marchiori Neto UFSC – Curso de Pós-Graduação em Direito – Campus Trindade

Membro

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Dedico este trabalho acadêmico aos meus amados pais, Vicente de Paula Kremer e Maria Salete Souza Kremer, pela incessante dedicação em proporcionar uma educação voltada em valores éticos e por me ensinarem a lutar pelos meus sonhos. Obrigado pai, pelo exemplo, estímulo, renúncias e apoio. Obrigado mãe, pelo carinho, motivação, paciência e cumplicidade. Obrigado Deus, por nortear a minha vida. Sou eternamente grato a vocês.

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Mestre Rodrigo Mioto dos Santos, por ter me dado a honra de ser

seu orientando, oportunidade na qual me ensinou lições valiosas, sobre tudo a busca

incessante pelo saber.

À Universidade do Vale do Itajaí, por toda história que construímos juntos nestes

anos de graduação, onde me foi oportunizado excelente didática de aprendizado.

À todos os professores que ministraram aulas durante a faculdade, onde nunca se

cansaram em trazer seus conhecimentos para dentro da sala de aula.

Ao Procurador do Estado de Santa Catarina, senhor Antônio Fernando de

Alcântara Athayde Júnior, por ter me supervisionado durante bons e produtivos meses de

estágio na Procuradoria Geral do Estado, onde além de ensinamentos jurídicos práticos

deixou incutido em mim virtudes intelectuais e morais marcantes. ,Como bem ensinou

Aristóteles, ao dizer que nenhuma das virtudes morais surge em nós por natureza, visto que

nada que existe por natureza pode ser alterado pela força do hábito, portanto, virtudes nada

mais são do que hábitos profundamente arraigados que se originam do meio onde somos

criados e condicionados através de exemplos e comportamentos semelhantes.

A todos os meus colegas Policiais Civis, em especial aos ilustres Delegados de

Polícia Luiz Guimarães Dias Júnior, Júlio César Machado de Souza, Hélcio Ferreira,

Andréia Irany Pacheco, Gisele de Faria Jerônimo e Robson Giovanni da Silva, pela

paciência, incentivo e bons exemplos dados durante nosso convívio, onde me

possibilitaram oportunidades para a dedicação aos meus estudos bem como na minha

formação como profissional.

Ao também ilustre Delegado de Polícia Rodrigo Falck Bortolini, pela amizade,

pela confiança depositada, pelas oportunidades profissionais oferecidas, pelo apoio aos

meus estudos, pelos sábios conselhos prestados, pelo modelo de profissional, o meu muito

obrigado.

Agradeço ainda aos meus muitos amigos conquistados durante toda graduação,

com destaque ao colegas Pedro Mariano da Silva Neto e ao Valmor Cella Piazza, por todo

o nosso intenso convívio entre estudos, diversões, conversas e boas gargalhadas.

À minha irmã, Gizely Kremer, por todo o amor, preocupação, estímulo, e feliz

história que temos juntos.

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Aos meus inigualáveis pais, por todas as sabias palavras ditas nas horas certas,

onde reconheço que no fim eles sempre estavam e estão certos.

Por fim, agradeço a Deus.

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“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.” (Rui Barbosa)

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e

qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

São José, 29 de outubro de 2009.

GUSTAVO KREMER

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RESUMO

Partindo de uma análise voltada para o garantismo penal, introduzida no direito internacional por Luigi Ferrajoli, e estudada por diversos doutrinadores brasileiros, como por exemplo, Aury Lopes Júnior e Eugênio Pacelli de Oliveira, o presente trabalho tem como objetivo buscar fundamentos para confrontar a duração do prazo da prisão preventiva, sendo este prazo construído nos últimos anos através de ensinamentos doutrinários e entendimentos jurisprudências do país. Os principais fundamentos utilizados nesta pesquisa científica são as inobservâncias, ou má aplicação, dos princípios constitucionais da presunção de inocência e da proporcionalidade ou razoabilidade. Para isso foi realizada uma análise sistemática dos referidos princípios constitucionais. Examina também a supremacia constitucional, a qual deve nortear o legislador na criação de leis infraconstitucionais, as quais sempre serão subordinadas a Constituição Federal. É realizado inicialmente um estudo sistemático sobre as prisões cautelares e posterior e especificamente sobre a prisão preventiva, sobretudo a construção de seu prazo, na ausência de lei reguladora. Analisa como diversos países entendem e aplicam o prazo de duração da prisão preventiva. Observam-se também como as cortes mais elevadas do Brasil julgam o chamado excesso de prazo da segregação provisória. Por fim, a partir dos referencias teóricos antes trabalhados, é feita uma crítica, onde são apontados os efeitos da falta de aplicação da teoria garantista para o indivíduo, bem como são apontadas e sugeridas medidas de mudança legislativa.

Palavras-chave: supremacia constitucional; princípio da presunção de inocência; princípio da proporcionalidade ou razoabilidade; prisões cautelares; prisão preventiva; prazo de duração da prisão preventiva; direito estrangeiro; medidas para solução da falta de prazo da prisão preventiva.

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ABSTRACT

Coming from an analisys directed to the guarantee of the penal, brought into the internacional law by Luigi Ferrajoli, and studied by several brazilian masters, like for example, Aury Lopes Júnior and Eugênio Pacelli de Oliveira, this current paper has as main objective to search for fundaments to confront the lenght of the preventive imprisonment, as the lenght has been build up on the last years throughout the teachings of doctrines and courts decisions understandings in the country. The main fundaments used in this cientific research are the non observance, or the bad aplication of the constitucional fundamental doctrines principles of the presumption of innocence and of the proportionality or reasonalibility. To this achievement a taxonomic analisys of the quoted principles was done. Also examines the constitucional supremacy, wich must guide the lawmaker on the criation of the under-contitution laws, wich will always be subordinated to the Federal Constitution. Firstly a systematic study about precautionary imprisonment and then specifically about preventive imprisonment, chiefly the building of its lenght, in the absence of a regulator law. Analyses how several countries in the planet understand and apply the lenght of preventive imprisonment. Remarks as well how the top courts in Brazil judge the so called exceeded term of the temporary segregation. At last, from the theoretical references worked before, troughout the epistemologic study of the theme on this cientific research, a critic is made, in wich are pointed the effects of the lack of aplication of the guarantee theory of the individual, as well as law changes are pointed as sugested.

Key-words: Guarantee penal process; constitutional sovereignty; presumption of innocence principle; proportionality or reasonalibility principle; precautionary imprisonment; preventive imprisonment; lenght of the preventive imprisonment; lenght of the preventive imprisonment in other countries; courts decisions understanding; actions to solve the lack of term of the preventive imprisonment.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 11

1 A IMPRESCINDIBILIDADE DA LEITURA CONSTITUCIONAL NA INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA .................................................. 14

1.1 A idéia de supremacia da Constituição: a Constituição como Lei Máxima ........... 14

1.2 O princípio de estado de inocência e o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade correlacionados com a prisão preventiva ............................................... 19

1.2.1 O Princípio do Estado (presunção) de Inocência .............................................. 20

1.2.2 O Princípio da Proporcionalidade e o Princípio da Razoabilidade.................. 24

2 A PRISÃO PREVENTIVA NO BRASIL: O PROBLEMA DO NÃO-PRAZO ........... 33

2.1 Prisões Cautelares..................................................................................................... 34

2.2 A caracterização da prisão preventiva: fazendo uma axiologia sistemática........... 38

2.2.1 Pressupostos e Requisitos da Prisão Preventiva................................................ 41

2.3 A atual construção do prazo da prisão preventiva no ordenamento jurídico brasileiro: processo e estigmatização ............................................................................. 43

3. A PRISÃO PREVENTIVA E A O DESAFIO DE CONSTRUÇÃO DE UM PRAZO JUSTO ................................................................................................................................ 50

3.1 A prisão preventiva nos ordenamentos jurídicos internacionais e a construção de seus prazos ...................................................................................................................... 50

3.1.1 Convenções Internacionais ................................................................................... 51

3.1.2 Construção internacional da teoria do não-prazo ou prazo razoável ...................... 52

3.1.3 Construção internacional sobre o prazo da prisão preventiva e o respectivo entendimento jurisprudencial ....................................................................................... 53

3.2 A razoabilidade do prazo da prisão preventiva frente ao entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal: análise e crítica ............................................................................................................... 56

3.3 A necessidade da criação de um prazo razoável e garantista pelo ordenamento jurídico brasileiro ........................................................................................................... 64

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 68

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 70

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INTRODUÇÃO

O presente estudo científico tem como objetivo explanar como o ordenamento jurídico

brasileiro trata a questão do prazo de duração da prisão preventiva, onde através de uma

construção doutrinária e jurisprudencial o Brasil permite que um indivíduo acusado ou

suspeito de praticar determinada transgressão penal, sendo preenchidos certos requisitos

legais, possa ficar privado de sua liberdade por prazo indeterminado, consoante decisão do

magistrado, o qual, por ausência de lei especifica, pode determinar, se assim entender

necessário para o processo, a prolongação da prisão de caráter preventivo.

Diante desta falta de prisão legal muitos indivíduos são desprovidos do seu direito de

ir e vir, direito este assegurado no artigo 5º da Constituição Federal. Assim estes ficam a

mercê da benevolência dos magistrados, dos mais diversos graus de jurisdição, tendo o

indivíduo, por sua vez, uma série de prejuízos, tais como: a estigmatização social, pois passa a

ser visto como culpado; perdas materiais, por deixar de dar continuidade as suas atividades

laborais; perdas morais, por se sentir ofendido com a situação imposta; perdas de ideais, pois,

se sentirá injustiçado pelo Estado, onde sendo representado pelo Poder Judiciário, permitiu

que fosse preso mesmo sendo inocente; perdas psíquicas e físicas, já que estará sendo

colocado ao convívio próximo de verdadeiros marginais em cadeias insalubres; e por fim, por

ser condenado antecipadamente da decisão judicial final; entre outros.

Perante toda esta problemática que envolve a falta de delimitação do prazo da prisão

preventiva e as conseqüências trazidas pelo impedimento do gozo da liberdade fez com que

este trabalho fosse voltado para uma visão garantista do processo penal, a qual foi sustentada

inicialmente no âmbito internacional pelo professor italiano Luigi Ferrajoli.

Inicialmente será abordada a idéia da supremacia constitucional, onde serão mostrados

os fundamentos para se compreender como um Estado Democrático de Direito, sustentado

por uma Carta Magna, deve fazer com que esta estabeleça diretrizes para as demais leis

infraconstitucionais, demonstrando assim a sua importância e analisando as consequências

geradas pela sua inobservância.

Em seguida, passará a ser abordado a importância da utilização dos princípios

constitucionais frente à necessária hermenêutica jurídica para a interpretação das normas

infraconstitucionais, objetivando assim demonstrar a necessidade de interpretação das leis de

acordo com os preceitos constitucionais. Dentre os princípios constitucionais serão destacados

dois, os quais sejam o princípio da presunção de inocência ou estado de inocência e o

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princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, onde neste ultimo será apresentada a

junção dos dois princípios, pois há corrente doutrinárias que entendem que são distintos.

Explicar-se-á as particularidades dos referidos princípios, pois os tribunais superiores do país

justificam o prolongamento da duração da prisão preventiva através da utilização do princípio

da proporcionalidade ou razoabilidade, porém furtam-se em não mencionarem o princípio da

presunção de inocência em suas decisões.

Posteriormente serão analisadas, brevemente, as prisões cautelares com ênfase na

principiologia que estuda estas modalidades de prisão, bem como o fato que algumas dessa

possuem prazos previstos em lei, sendo que a exceção a esta regra é a prisão preventiva.

Após, será caracterizada a prisão preventiva, com a especificação do conceito, das

hipóteses autorizadoras, da necessidade de sua fundamentação, os seus pressupostos e

requisitos. Em seguida será exposto como se construiu o atual entendimento do prazo da

prisão preventiva em 81 (oitenta e um) dias, aceito por alguns doutrinadores e pela

jurisprudência majoritária do país.

Ao final, no terceiro e último capítulo, será abordado o grande desafio da construção

de um prazo realmente justo para a prisão preventiva, sendo este o epicentro desta

monografia. Para tanto, se fez oportuno citar convenções internacionais que prevêem a

delimitação do prazo da prisão preventiva, como, por exemplo, o Pacto Internacional sobre

Direitos Civis e Políticos, ratificado pelo governo brasileiro da época. Ainda sobre a

construção do prazo da prisão preventiva será exposto como outros países delimitam ou não o

referido prazo. Além disso, será analisado como e com quais fundamentos o Supremo

Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça decidem a respeito, sendo utilizadas

diversas citações de acórdãos proferidos por estas cortes máximas do país e as medidas

legislativas que estão sendo tomadas para curar esta nevrálgica patologia que é a falta de um

prazo justo para o encarceramento preventivo, bem como se discorrerá sobre sugestões para

alçar este objetivo.

Destarte, encerra-se o trabalho com a conclusão pautada na teoria garantista, e na

preservação dos ditames constitucionais.

Nota-se, que o presente trabalho acadêmico será concretizado com a utilização do

método dedutivo, ensinado pelo professor César Luiz Pasold1, onde se utilizou como técnica

investigatória desta pesquisa a documentação indireta, com pesquisas bibliografias de

1 PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 2ª Ed. Florianópolis: Editora OAB/SC, 1999.

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doutrinadores renomados no âmbito jurídico brasileiro e internacional, legislações pertinentes

ao tema proposto e o entendimento de distintos tribunais sobre o assunto, com o objetivo de

formar um posicionamento jurídico ao final deste trabalho.

Destarte, o objetivo geral deste trabalho será mostrar para a sociedade e

principalmente ao operador do direito as conseqüências irreparáveis que a decretação de

prisão preventiva, mal justificada e com duração ilimitada, pode causar a um cidadão.

Também observará a necessidade de uma melhor adequação de critérios para a esta

modalidade de prisão e por sua vez a importância e a responsabilidade do estudo e reflexão

sobre a decretação da prisão preventiva, sem que esta viole o princípio de presunção de

inocência consagrado em nossa Constituição Federal.

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1 A IMPRESCINDIBILIDADE DA LEITURA CONSTITUCIONAL NA

INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA

Como o presente trabalho envolve uma problemática em torno de lei

infraconstitucional que regula a prisão preventiva e com o objetivo de haver uma melhor

compreensão da problemática que envolve o tema, conforme será analisado posteriormente

neste trabalho, se faz necessário estudar a supremacia constitucional, ou seja, a prevalência

desta na criação e interpretação das demais normas.

Para tanto, passará a ser estudado o ápice da hierarquia das normas, ou seja, a

Constituição Federal como norma suprema. Em seguida serão analisados dois princípios

constitucionais, o da presunção de inocência e o da proporcionalidade ou razoabilidade, os

quais devem dar um rumo diferente as atuais decisões proferidas nos tribunais, como se verá

na análise jurisprudencial do capítulo 3, por serem respectivamente, garantidor de direitos

individuais configurados num Estado Democrático de Direito e como ferramenta para dosar

as medidas legais.

1.1 A idéia de supremacia da Constituição: a Constituição como Lei Máxima

No ordenamento jurídico brasileiro encontramos diversas normas positivadas, sendo

que todas derivam de uma norma maior, a qual recebe o nome de Constituição Federal, e que

por sua vez deve servir como uma espécie de matéria prima legal.

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada no ano de 1988, deve

ser considerada como referência para a elaboração das demais normas jurídicas. A

Constituição é composta de garantias e direitos fundamentais, sendo intenção do legislador

limitar o poder do Estado, configurando assim a legitimação do Estado, determinando seus

deveres e tornando possível o processo democrático em um Estado de Direito.

Deste modo, a criação de qualquer norma deve ser compatível com os preceitos

constitucionais, onde as normas constitucionais positivadas devem ser utilizadas como

paradigma para a elaboração de normas infraconstitucionais.

O próprio conceito de Constituição ajuda a explicar sua supremacia:

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[...] Constituição deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos. (MORAES, 2006, p. 02)

Ainda, complementando o conceito jurídico de Constituição:

[...] a Constituição é concebida como um conjunto de normas, um estatuto onde se acham reunidas as normas de organização do Estado. (CARVALHO, 2005, p. 193)

Como visto, a Constituição é norteadora dos atos legais praticados no e pelo Estado,

não sendo apenas a lei fundamental do Estado, mas como ensina CARVALHO (2005, p. 207),

trata-se também da lei fundamental da sociedade,

[...] devendo estabelecer não só a conformação jurídica do Estado, como também princípios relevantes para uma sociedade aberta, como os princípios fundamentais da família e os estruturantes da ordem econômica e social.

Entrando na esfera do Direito Processual Penal, a Constituição brasileira, como ensina

Roberto Delmanto Júnior (2001, p. 24), “estipula inúmeras disposições pertinentes ao

processo penal, com matriz sobretudo garantidora das liberdades individuais, que têm eficácia

imediata”. Portanto, é fácil compreender que no escrito constitucional estão inseridos a

prevalência de direitos garantidores da preservação da liberdade do cidadão. Estando estes

consagrados em nosso ordenamento supremo através dos direitos e garantias individuais,

elencados, sobretudo, no artigo 5º e incisos da Constituição Federal, os quais dão origem a

determinados princípios constitucionais, como, por exemplo, da preservação da liberdade do

indivíduo.

Estes preceitos constitucionais necessitam, por sua vez, serem “interpretados de

maneira extensiva, resguardando-se, ao máximo, as liberdades da pessoa” (DELMANTO JR,

2001, p. 14).

É importante frisar que o artigo 60 da Carta Magna prevê clausulas pétreas, onde em

seu § 4º respectivamente combinado com o inciso IV dispõe que os direitos e garantias

individuais jamais poderão ser abolidos por emendas constitucionais, tornando assim

algumas disposições constitucionais imutáveis.

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Destarte, como bem exemplifica DELMANTO JR. (2001, p. 26-28), a Carta Magna

prevê algumas cláusulas pétreas garantidoras da liberdade individual, conforme segue

resumidamente:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente; LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;

Destaca-se que os incisos acima citados por serem imutáveis (clausulas pétreas)

contribuem para a formação de princípios garantidores da liberdade individual.

Em razão do exposto até aqui, tem-se que as normas infraconstitucionais devem ser

interpretadas de acordo com o que dispõe a Constituição, garantindo a supremacia

constitucional e o Estado Democrático de Direito, conforme amplamente defendido no plano

doutrinário:

A supremacia das normas constitucionais no ordenamento jurídico e a presunção de constitucionalidade das leis e atos normativos editados pelo poder público competente exigem que, na função hermenêutica de interpretação do ordenamento jurídico, seja sempre concedida preferência ao sentido da norma que seja adequado à Constituição Federal. Assim sendo, no caso de normas com várias significações possíveis, deverá ser encontrada a significação que apresente conformidade com as normas constitucionais, evitando sua declaração de inconstitucionalidade e conseqüente retirada do ordenamento jurídico. (MORAES, 2006, p. 11)2

2 Na mesma linha de raciocino, José Afonso da Silva afirma que: “A constituição é algo que tem, como forma, um complexo de normas (escritas ou costumeiras); como conteúdo, a conduta humana motivada pelas relações sociais (econômicas, políticas, religiosas etc.); como fim, a realização dos valores que apontam para o existir da comunidade; e, finalmente, como causa criadora e recriadora, o poder que emana do povo. Não pode ser compreendida e interpretada, se não se tiver em mente essa

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E ainda complementando:

A Constituição é concebida, por isso mesmo, como ordem fundamental, material e aberta de uma comunidade. Como ordem fundamental revela sua posição de supremacia, e como ordem material contém, além de normas, uma ordem de valores, que se expressa no conteúdo de direito que não pode ser desatendido pelas normas infraconstitucionais. Considera-se ainda que a Constituição traduz uma ordem aberta, porquanto mantém uma permanente interação com a realidade. Há, desse modo, uma conexão de sentido entre os valores compartilhados e aceitos pela comunidade política e a ordenação fundamental e suprema representada pela Constituição, cujo sentido jurídico somente pode ser apreciado em relação à totalidade da vida coletiva. (CARVALHO, 2005, p. 196)

Entendendo que há a necessidade de interpretar a constituição de forma que as demais

normas infraconstitucionais não colidam com os interesses consagrados nesta, o professor

José Afonso da Silva leciona:

Nossa Constituição é rígida. Em conseqüência, é a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro. Toda autoridade só nela encontra fundamento e só nela confere poderes e competências governamentais. Nem o governo federal, nem os governos dos Estados, nem os dos Municípios ou do Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. Exercem atribuições nos termos nela estabelecidos. Por outro lado, todas as normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se se conformarem com as normas da Constituição Federal. (AFONSO DA SILVA, 2008, p. 46) (grifou-se)

Ainda com os ensinamentos do Professor José Afondo da Silva (2008, p. 47), cabe

destacar que o princípio da supremacia constitucional resulta da compatibilidade vertical das

normas do nosso ordenamento jurídico, no sentido que as normas de grau inferior somente

valerão se forem compatíveis com as normas de grau superior, sendo o grau mais elevado a

Constituição. Desta forma, as normas que não forem compatíveis com o estabelecido

constitucionalmente serão consideradas inválidas.

Sobre esta diferenciação entre a norma constitucional e a infraconstitucional o

professor Raul Machado Horta faz uma pertinente citação do doutrinador mexicano Garcia

Maynez:

estrutura, considerada como conexão de sentido, como é tudo aquilo que integra um conjunto de

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Podendo dispor de validez, de vigência e de eficácia, as normas jurídicas não se comportam igualmente dentro do ordenamento jurídico. Na exaustiva classificação de Garcia Maynez, as normas jurídicas se diferenciam pelo âmbito material e pessoal de validez, a hierarquia, a forma, as relações de complementação, a vontade das partes e as sanções. Há normas preceptivas e normas proibitivas, normas taxativas e normas dispositivas, normas constitucionais e normas ordinárias, normas primárias e normas secundárias. No domínio da Constituição, interessa particularizar a natureza da norma constitucional, que delimita o campo desta análise. A norma constitucional é a norma primária do ordenamento jurídico, ocupando o lugar mais elevado na pirâmide do sistema jurídico. A norma constitucional é a norma fundamental que ocupa o vértice do ordenamento jurídico. A posição de hierarquia suprema da norma constitucional desencadeia a sanção da inconstitucionalidade, quando se verificar o conflito entre a norma fundamental e primária e as normas ordinárias e secundárias. (HORTA, 2002, p. 194) (grifou-se)

O doutrinador Daniel Sarmento (2000, p.28) compartilha do mesmo entendimento,

onde ensina que a constituição acha-se em nosso ordenamento hierarquicamente como a lei

fundamental, que condiciona a validade e permeia a interpretação de todas as demais normas

jurídicas e que por esta razão a constituição pode ser considerada fonte comum de validade de

todas as normas, conferindo coesão ao ordenamento jurídico. Portanto, qualquer um que

pretenda interpretar a lei fundamental ou aplicá-la a casos concretos deverá buscar

arduamente sua resposta entre diferentes ditames constitucionais, tais como os princípios

constitucionais.

Os princípios constitucionais, de acordo com o professor Kildare Gonçalves Carvalho

(2005, p. 355), dão coerência e consistência ao complexo normativo da Constituição, além de

estabelecerem as bases e os fundamentos para a compreensão constitucional, expressando um

conjunto de valores do constituinte na elaboração da Constituição, orientando ainda as suas

decisões políticas fundamentais. Os princípios expressam valores fundamentais adotados pela

sociedade política, constantes no ordenamento jurídico, e informam materialmente as demais

normas, determinando integralmente qual deve ser a substancia e o limite do ato que os

executam.

Com esta concepção Carvalho anota:

[...] os princípios constitucionais atuam no sentido de impedir a produção de normas jurídicas que visem reduzir a sua eficácia, uma vez que tais normas se voltam para a efetivação dos princípios, como mandamentos nucleares do sistema constitucional. A função hermenêutica dos princípios permite aos

valores.” (AFONSO DA SILVA, 2008, p. 39).

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juízes extrair a essência de uma determinada disposição legal, servindo ainda de limite protetivo contra a arbitrariedade. (CARVALHO, 2005, p. 357)

Corroborando ainda com esta interpretação, o professor André Ramos Tavares leciona

com muita clareza o auxilio e importância prestados pelos princípios constitucionais no

entendimento das demais normas, como se pode observar:

Os princípios constitucionais são normas presentes na Constituição que se aplicam às demais normas constitucionais. Isso porque são dotados de grande abstratividade, e têm por objetivo justamente imprimir determinado significado às demais normas. Daí resulta o que se denomina sistema constitucional, que impõe a consideração da Constituição como um todo coeso de normas que se relacionam entre si (unidade da Constituição). Os princípios constitucionais, portanto, servem de vetores para a interpretação da Constituição. (TAVARES, 2007, p. 100)

Assim, com a exposição acima, componente de um breve estudo sobre a supremacia

constitucional e sobre a importância dos princípios constitucionais pode-se começar a fazer

uma análise garantista dos princípios evocados constitucionalmente frente à decretação da

prisão preventiva e por sua vez do seu prazo, levando-se em conta uma interpretação

constitucional.

Para isso, nesta pesquisa, foi destacado e realizado o estudo sobre dois princípios

constitucionais: o princípio do estado de inocência e o princípio da proporcionalidade ou

razoabilidade.

1.2 O princípio de estado de inocência e o princípio da proporcionalidade ou da

razoabilidade correlacionados com a prisão preventiva

Há, como visto acima no subitem 1.1, a necessidade de se estudar alguns

imprescindíveis princípios relacionados à prisão preventiva, os quais darão maior facilidade

ao leitor deste trabalho para conseguir entender a polêmica gerada em torno do

descumprimento destes princípios, ou da difícil aceitação de certas interpretações dadas a

estes por alguns Tribunais, ou até mesmo ao motivo da crítica de alguns doutrinadores em

desfavor do legislador, o qual criou mecanismos processuais relativamente inacabados, sem

sustentação principiológica, como é o caso da não fixação prévia de um prazo certo para o fim

da prisão preventiva, ferindo assim certos princípios basilares do direito brasileiro.

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A fim de gerar esse entendimento fundamental passa-se a estudar os dois princípios

constitucionais mais importantes, considerados pelo autor deste trabalho, quais sejam o

princípio do estado de inocência e o princípio da proporcionalidade ou razoabilidade.

1.2.1 O Princípio do Estado (presunção) de Inocência

A concepção de Estado de Inocência é defendida há muitos anos, sendo que um fato

de grande relevância histórica proporciona uma melhor apreciação desta idéia. O fato

destacado foi a criação revolucionária da declaração de Direitos do Homem e do Cidadão,

proclamada em Paris em 26 de agosto do ano de 1789, onde em seus dezessete artigos, pela

primeira vez uma nação proclama as liberdades e os direitos fundamentais do homem de

forma igualitária. Pode-se obervar esta mudança no texto da referida declaração, onde no art.

9ª expressa: “Tout homme étant jusqu’à ce qu’il ait été déclaré coupable; s‘il este jugé

indispensable de l’arrêter, toute rigueur qui ne serait nécessaire pour’s assurer de as personne,

doit être sévèrement reprimée par la loi”3, sendo traduzido numa das obras de Fernando da

Costa Tourinho Filho, como: “Todo homem sendo presumidamente inocente até que seja

declarado culpado, se for indispensável prendê-lo, todo rigor que não seja necessário para

assegurar a pessoa deve ser severamente reprimido pela lei” (TOURINHO FILHO, 2004. p.

29). Como percebido, neste momento histórico surge a primeira corrente normativa

preocupada em buscar garantir e tutelar direitos comuns a todos os homens, servindo

inclusive esta declaração como inspiração para a atual Declaração Universal de Direitos

Humanos promulgada pela ONU (Organização das Nações Unidas) no ano de 1.948.

Se reportando ao ordenamento jurídico brasileiro, ao falarmos no Princípio

Constitucional de Estado de Inocência, deve-se, desde logo, citar o Art. 5º, LVII, da nossa

Carta Magna, símbolo da Democracia Nacional, a qual busca a Paz, Justiça e Liberdade de

seu povo, o qual o caracteriza bem, como é possível ser observado:

3 Art. 9.º Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei. Tradução diponivel em<http://pt.wikipedia.org/wiki/Declara%C3%A7%C3%A3o_dos_Direitos_do_Homem_e_do_Cidad%C3%A3o#A_Declara.C3.A7.C3.A3o_do_Homem_e_do_Cidad.C3.A3o> acessado em 12 de setembro de 2009.

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Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; (Constituição da República Federativa do Brasil do ano de 1988) (Grifou-se)

Como visto, esta norma constitucional dá a ideia de que o acusado, em um processo

penal, só será considerado culpado após a sentença condenatória transitada em julgado,

garantindo a proteção da liberdade individual e consagrando o princípio de Estado de

Inocência.

Desta forma, conclui-se, que para o Estado ordenar a prisão de um indivíduo, de forma

não arbitrária, deverá comprovar a culpabilidade deste, pois como visto, todo indivíduo é

constitucionalmente presumido inocente até que se prove o contrário.

Contudo, nosso ordenamento jurídico prevê a possibilidade de prisões antes mesmo da

condenação do acusado. Estas prisões são chamadas de provisórias, ou seja, quando a prisão é

indispensável a título de cautela, e que também haja justificativa plausível, amparada aos

requisitos legais, para este ato. Temos assim uma idéia processual de cautelaridade

(necessidade imediata).

Neste sentido, entende a doutrina:

A consagração do princípio de inocência, porém, não afasta a constitucionalidade das espécies de prisões provisórias, que continua sendo, pacificamente, reconhecida pela jurisprudência, por considerar a legitimidade jurídico-constitucional da prisão cautelar, que, não obstante a presunção júris tantum de não culpabilidade dos réus, pode validamente incidir sobre seu status libertatis. Desta forma, permanecem válidas as prisões temporárias, em flagrante, preventivas, por pronuncia e por sentenças condenatórias sem trânsito em julgado. (MORAES, 2006. p.103)4

Como aludido, mesmo havendo a consagração do princípio de presunção de inocência

no ordenamento jurídico brasileiro, este prevê exceções da segregação da liberdade de um

indivíduo antes mesmo do fim do processo criminal, sendo estas a prisão temporária, a

preventiva e a em flagrante.

Ainda, o doutrinador Antonio Magalhães Gomes filho anota:

4 Com a redação dada pela Lei n.º 11.690 de 2008, não é mais considerada valida prisão decorrente de sentença de pronuncia e de sentença sem o transito sem julgado.

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[...] a denominada presunção de inocência constitui princípio informador de todo o processo penal, concebido como instrumento de aplicação de sanções punitivas em um sistema jurídico no qual sejam respeitados, fundamentalmente, os valores à dignidade da pessoa humana; como tal, deve servir de pressuposto e parâmetro de todas as atividades estatais concernentes à repressão criminal. (GOMES FILHO, 1991, p. 37)

E o professor Aury Lopes Jr, pontualmente, complementa:

[...] o princípio que primeiro impera no processo penal é o da proteção dos inocentes, ou seja, o processo penal como direito protetor dos inocentes. Este status (inocência) adquire caráter constitucional e deve ser mantido até que exista uma sentença penal condenatória transitada em julgado. (LOPES JÚNIOR, 2009, p. 67)

O princípio da presunção de inocência, segundo FERRAJOLI (2002, p. 441), é

concebido como uma opção garantista a favor da proteção da imunidade dos inocentes,

mesmo que esta proteção leve à impunidade de um culpado.

Ainda sob esta ótica FERRAJOLI (2008, p. 505-507) ensina que deve ser provado no

processo a culpa do imputado e não sua inocência, portanto, não cabe ao imputado provar sua

inocência haja vista que está por si só já deve estar presumida. O princípio da presunção de

inocência garante a “imunidade dos inocentes”, mesmo que para isso seja necessário sacrificar

o processo ou a sociedade com a impunidade do culpado. Assim, FERRAJOLI justifica esta

proteção Estatal dos inocentes com uma das teorias de MONTISQUIEU, onde este afirma que

“ ‘a liberdade política consiste na segurança, ou ao menos na convicção que se tem da própria

segurança’ ” onde “ ‘essa segurança nunca é posta em perigo maior do que nas acusações

públicas e privadas’ ” entendendo ainda que “ ‘ quando a inocência dos cidadãos não é

garantida, tampouco o é a liberdade’” (p. 506). Ora, com todos esses ensinamos fica nítida a

compreensão que o princípio de presunção de inocência garante, sobretudo, a segurança do

cidadão esperada advindo do Estado Democrático de Direito, segurança esta que está ainda

acima dos preceitos também defendidos por este princípio que são da liberdade e da verdade.

A respeito, FERRAJOLI ainda contribui ao escrever:

Toda vez que um imputado inocente tem razão de temer um juiz, que dizer que isto está fora da lógica do Estado de direito: o medo e mesmo só a desconfiança ou a não segurança do inocente assinalam a falência da função mesma da jurisdição penal e a ruptura dos valores políticos que a legitima. (FERRAJOLI, 2008, p. 506)

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De acordo com o exposto, trazendo para a realidade do cidadão brasileiro, este pode se

questionar com a seguinte indagação: Como cidadão, você sente medo de ser processado, no

atual processo penal brasileiro, mesmo sabendo que é inocente? É possível apostar que quase

todos que responderem esta pergunta dirão: sim, eu tenho receio de ser condenado ao final do

processo mesmo sabendo que sou inocente. Por quê? A resposta é simples, nosso Estado

Democrático de Direito, não garante ao cidadão a segurança jurídica que deveria garantir. Por

isso esse precioso princípio constitucional é tão importante, ao ponto que a sociedade

brasileira jamais pode autorizar que este deixe de ser aplicado em qualquer caso que seja, pois

a garantia maior do cidadão é confiar na justiça de seu país, e por sua vez ter tutelado seu

direito de liberdade. Comungando com esta idéia FERRAJOLI (2006, p. 506) pontua que “o

sinal inconfundível da perda de legitimidade política da jurisdição, como também de sua

involução racional e autoritária, é o temor que a justiça incute nos cidadãos”.

Portanto, trazendo para a questão da prisão preventiva, ou seja, da prisão antes da

sentença condenatória final, só será justificada, como ensina PACELLI (2007, p. 415),

quando as privações de liberdade do indivíduo forem justificadas pelo magistrado, onde em

suas fundamentações deve constar a imprescindível necessidade de proteção do “adequado e

regular exercício da jurisdição penal”, restando não haver outra possibilidade para garantir tal

tutela.

O Professor DELMANTO JR. (2002, p. 64) sobre o assunto defende que o Estado,

representado pelo Poder Judiciário, não pode deixar de reconhecer o princípio da presunção

de inocência, pois desta forma estaria negando o próprio processo penal. O processo penal é o

único instrumento legal que o Estado detém para considerar alguém culpado, justamente pelo

fato que o Estado Democrático de Direito garante aos seus cidadãos direitos e garantias que

preservam suas liberdades, devendo assim sempre ser o cidadão considerado presumidamente

inocente, cabendo ao Estado, em caso de dúvidas desta inocência, realizar o devido processo

legal para buscar a resposta de sua indagação anterior, onde somente ao final de toda

instrução processual poderá dizer se sua dúvida tem ou não fundamento, e em caso positivo

deve apresentá-los através das provas apresentadas no processo, e se assim restar provado a

culpabilidade do imputado poderá aplicar as sanções previamente previstas em lei.

Dadas as explicações acerca do princípio de estado de inocência e de sua relação

direta com a possibilidade de decretação de prisões provisórias, e principalmente sua

importância na compreensão do sistema processual penal, passa a ser analisado o princípio da

proporcionalidade ou razoabilidade, o qual auxiliará no entendimento garantista a ser

defendido posteriormente no capítulo terceiro deste trabalho.

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1.2.2 O Princípio da Proporcionalidade e o Princípio da Razoabilidade

Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade nunca foram tão debatidos e

invocados como atualmente pelas mais altas cortes do país (Supremo Tribunal Federal e

Superior Tribunal de Justiça), principalmente no âmbito do processo penal no sentido de

justificar longos prazos da prisão cautelar.

Neste trabalho optou-se em buscar conceder ao leitor uma compreensão global desses

princípios, para dirimir possíveis dúvidas, e facilitando entender sua correta ou equivocada

aplicação pelos tribunais brasileiros.

Em análise sobre o tema, escreve Luís Virgílio Afonso da Silva:

A regra da proporcionalidade no controle das leis restritivas de direitos fundamentais surgiu por desenvolvimento jurisprudencial do Tribunal Constitucional alemão e não na simples pauta que, vagamente, sugere que os atos estatais devem ser razoáveis, nem uma simples análise da relação meio-fim. Na forma desenvolvida pela jurisprudência constitucional alemã, tem ela uma estrutura racionalmente definida, com subelementos independentes – a análise da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito –, que são aplicados em uma ordem predefinida, e que conferem à regra da proporcionalidade a individualidade que a diferencia, claramente, da mera exigência de razoabilidade. (2002, p. 03)

Como já mencionado há uma distinção jurídica entre os referidos princípios. O

princípio da razoabilidade e o da proporcionalidade não possuem a mesma origem, porém o

seu objeto é o mesmo, qual seja a melhor adequação do direito material com o direito

processual.

O professor Sidney Eloy Dalabrida, neste sentido, leciona:

[...] a doutrina e principalmente a jurisprudência, no entanto, vem tratando de forma confusa os referidos princípios. Enquanto alguns autores afirmam que constituem manifestações do mesmo fenômeno, outros, sustentam total distinção, havendo os que registram serem fungíveis ou intercambiáveis. Independente da posição defendida, forçoso é admitir que seu acionamento se perfaz como técnica operativa para o atingimento de uma decisão justa ou, como afirma Toledo de Barros ‘as variações terminológicas estão longe, porém, de neutralizar a sua densidade de sentido e sua importância prática, porquanto ambos são padrões, não somente limitadores, como também de modulação das liberdades individuais e direitos coletivos ainda os difusos, enfim, os direitos fundamentais em toda sua diversidade. (2008, p. 76-77)

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Ainda segundo DALABRIDA (2008, p.77), apesar dos princípios da

proporcionalidade e razoabilidade terem parecidas finalidades, o conceito jurídicos destes

princípios são distintos, principalmente no que diz respeito a suas respectivas origens e suas

estruturas.

No entanto, o professor Aury Lopes Júnior (2008, p. 147), também leciona que ambos

os princípios (proporcionalidade e razoabilidade) possuem certa distinção jurídica, porém,

como bem faz ao citar SARLET, o qual, em outras palavras, diz que estes dois princípios

estão diretamente ligados ao princípio da dignidade da pessoa humana5, e por sua vez será

com este propósito que serão abordados no presente trabalho acadêmico. Diferentemente do

que a doutrina majoritária brasileira defini, como sendo princípios que comungam do mesmo

fenômeno, nesta pesquisa ler-se-ão estes princípios como se tratando do mesmo fim, por isso

não será feita uma distinção, sendo feita no máximo uma caracterização, já que o objetivo da

utilização destes é construir mais adiante um prazo razoável/ou proporcional da duração da

custódia cautelar.

Inicialmente, com o foco no tema do excesso de prazo da duração da prisão

preventiva, deve-se fazer uma análise entre sanção e direito de punir. Como bem ensina Luigi

Ferrajoli (2006, p. 366), a pena não está diretamente relacionada ao tipo penal, pois não há

uma relação natural entre elas, já que a mesma infração penal pode ser cometida de maneiras

diferentes, causando danos distintos ao bem jurídico tutelado, havendo assim a necessidade de

uma adequação entre a gravidade do direito protegido e a pena imposta a uma possível

transgressão deste. O alcance da proporcionalidade no direito penal é obtido de forma

subjetiva, existindo apenas “critérios pragmáticos baseados em valorações ético-políticas ou

de oportunidade para estabelecer a qualidade e a quantidade da pena adequada a cada delito”

(FERRAJOLI, 2006, p. 366). Surge assim um problema jurídico: criar critérios de valoração

dada a proporcionalidade utilizada para delimitar penas, sendo que estas não atinjam o limite

de punir do Estado, e por sua vez que não deixe o desobediente do direito impune, sem algum

tipo de repressão “educativa” por parte do Estado.

5 “[...] é interessante anotar que todos esses direitos fundamentais, que impõem limites ao Estado, têm como um dos principais fundamentos o próprio direito ao reconhecimento da dignidade da pessoa humana, o qual, como observa Pontes de Miranda, ‘ se operou por lentas e dolorosas conquistas na história da humanidade’, resultante de avanços da sociedade em três dimensões: democracia, liberdade e igualdade.” (grifou-se) (DELMANTO JR., 2002, p. 55)

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Ainda, citando FERRAJOLI, o problema da legitimação externada dada a

proporcionalidade das penas ainda possui três subproblemas vinculados ao problema da

subjetivação, que são

[...] o da predeterminação pelo legislador do tipo e da medida máxima e mínima de pena para cada tipo de delito; o da determinação por parte do juiz da natureza e medida da pena para cada delito concreto; o da pós-determinação, na fase executiva da pena efetivamente sofrida. (2006, p. 377)

Entendendo a complexidade dessa problemática que envolve a proporcionalidade

passa-se a debater cada uma destas dificuldades utilizando-se os ensinamentos do professor

Luigi Ferrajoli.

Para FERRAJOLI (2006, p. 367-370), a predeterminação legal da pena e sua

medida máxima e mínima dada a cada tipo penal são de difícil compreensão. Existem

várias teorias que tentam moldar e solucionar estes problemas, no entanto, a que parece mais

razoável é a ponderação entre a culpa do violador da lei penal e do dano (gravidade) causado

por este. Mas como dosar esses dois critérios relacionados entre si? Para responder esta

pergunta pode-se utilizar uma citação feita por FERRAJOLI (2006, p. 368) de BECCARIA a

qual diz “‘para que uma pena obtenha seu efeito basta que o mal dela exceda ao bem que

nasce do delito... Tudo mais é supérfluo, portanto, tirânico’”, definindo assim a medida

máxima de punição dada a determinado delito, por sua vez o mesmo autor utiliza-se, para

definir o mínimo punitivo de alguma pena, as teorias defendidas por HOBBES,

PUFENDORF e BENTHAM, a qual diz respeito ao fato que “a vantagem do delito não deve

superar a desvantagem da pena: se não fosse assim, efetivamente, a pena seria muito mais um

tributo, e não cumpriria nenhuma função dissuasória” (FERRAJOLI, 2006, p.368). Apesar

destas teorias FERRAJOLI (2006, p. 148-149) não se dá por satisfeito e defende que o

mínimo legal estudado por estas teorias atendem apenas as penas pecuniárias, porém quando

se trata de penas privativas de liberdade este defende que é cabível dar ao magistrado o poder

de equidade6, onde do máximo legal, que deve estar fixado em lei, o juiz estabelecerá de

6 “A individualização das características particulares do fato e as consequêntes valorações configuram a chamada equidade do juízo, na qual se expressa um poder que chamarei poder de conotação”. (FERRAJOLI, 2006, p. 148-149) “Aristóteles, ao analisar na Ética Nicomachea as relações de legalidade e da equidade com a justiça, escreveu que ‘o equitativo, se bem seja justo, não está de acordo com a lei, mas com uma correção da justiça legal. Por causa disso é que toda lei é universal e há casos nos quais não é possível tratar as coisas corretamente de um modo universal. Naqueles casos, então, nos quais é necessário falar de um mundo universal, sem ser possível fazê-lo corretamente, a lei aceita o mais corrente, sem ignorar que

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acordo com o caso concreto a pena mínima a ser decidida. Já quanto ao máximo legal da pena

o autor citado entende que nenhuma pena pode trazer ao apenado uma consequência maior

que o ato de sua transgressão, onde se utiliza do exemplo de alguns raros países em que para

crimes de furto a pena poderá vir a ser a mutilação ou a pena capital, não havendo aí qualquer

consideração proporcional entre o delito praticado e a pena. Observa também que em crimes

culposos deve haver uma diferenciação na valoração da pena, tendo a culpabilidade grande

impotência para incidir a pena mais justa ao caso concreto. Por fim, FERRAJOLI conclui “é

injustificado um limite mínimo que anule a eficácia preventiva da pena em relação aos

delitos; mas também é injustificado um limite máximo que anule a justificação em relação aos

maiores castigos informais preventivos”. (2006, p. 369)

A determinação por parte do juiz da natureza e medida da pena para cada delito

concreto, segundo FERRAJOLI (2006, p. 370-373), volta-se novamente a questão da

interpretação equitativa do magistrado, onde diante da falta de previsão em lei, o que não é de

se espantar, já que a lei, por lógica, não pode prever todas as situações que agravam ou

atenuam determinado ato típico deixa espaço para uma interpretação do caso concreto,

devendo o juiz valorar em suas decisões a penal melhor cabível ao caso, diante da

culpabilidade do transgressor e da gravidade e circunstâncias específicas especificas em que o

culpado atuou.

Para finalizar a problemática aludida por FERRAJOLI, que envolve a

proporcionalidade, a passa-se a discorrer sobre o problema da pós-determinação, a qual está

presente na fase executiva da pena, a qual critica a modificação da duração da pena na fase de

execução, onde o referido autor (2006, p. 373-377), defende que somente deve ser aceita essa

alteração vislumbrando a reeducação do réu, ou seja, se o réu mostrar que está reeducado

antes mesmo do fim de sua pena deve obter vantagens dessa evolução, ao contrário, se o réu

mesmo ao fim da pena demonstrar que não está pronto para ser reinserido ao convívio social o

mesmo deverá continuar privado de sua liberdade, até que prove estar possibilitado. Por outro

lado, FERRAJOLI questionada a “injustiça que deriva do fato de um homem continuar

sofrendo uma pena depois de, pelo longo tempo transcorrido, ter se convertido numa pessoa

completamente diferente da condenada é um efeito perverso da excessiva duração das penas”

(p.374), e ainda afirma que “é um defeito estrutural, dado que a mudança de personalidade da

pessoa com o transcurso dos anos constitui mais a regra do que a exceção” (2006, p. 374).

existe algum erro’. A equidade serviria, assim, para preencher a distância entre o pressuposto da abstração típico legal e a concretização do caso em julgamento.” (FERRAJOLI, 2006, p. 149)

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Como se pôde ver, o doutrinador questiona o sistema penal, onde não compreende como este

pode ser tão severo ao criar leis e decidir judicialmente em ambos os casos com rigor se na

fase executória o réu pode ser favorecido com uma série de benefícios os quais podem

diminuir, e muito, a pena final cumprida. Conclui-se então, que, para FERRAJOLI, a pena

deve ser valorada e fixada no final da instrução processual, de forma imutável, ou seja,

predeterminada e única, fazendo que uma “eficácia dissuasória”. Conforme menciona

FERRAJOLI, ao citar BECCARIA, onde este ensinou que “um dos maiores freios dos delitos

não é a crueldade das penas, senão a infalibilidade delas... A certeza da punição, ainda que

moderada, terá sempre maior impacto do que o temor de outra mais terrível, associada à

esperança de impunidade” (FERRAJOLI, 2006, p. 377), defendendo assim um modelo de

direito penal mínimo e garantista.

Após esta explicação referente aos problemas e possíveis soluções relacionados com a

proporcionalidade passa-se a analisá-la de forma a legitimar sua inserção no direito processual

penal brasileiro.

O princípio da proporcionalidade, segundo Aury Lopes Jr (2009, p. 60), é definido

como “o princípio dos princípios”, onde a “proporcionalidade é o principal sustentáculo das

prisões cautelares.”

Para o professor Eugênio Pacelli de Oliveira (2007, p. 416), a utilização do princípio

da proporcionalidade para aferir prisão preventiva é a única medida que a legitima. Uma vez

que esta modalidade de prisão é fundamentada na da “garantia da persecução penal, diante de

situações de risco real devidamente prevista em lei”, desta forma a proporcionalidade tende a

impossibilitar que a pessoa presa preventivamente não sofra danos piores dos que uma

possível condenação poderia causar, não permitindo desta forma a perda da finalidade da

prisão preventiva.

Ainda, o princípio da proporcionalidade, como ainda ensina PACELLI (2007, p. 415-

416), apesar de não ser aludido expressamente em nosso Código de Processo Penal como

instituto necessário na fixação de prisões cautelares o mesmo foi utilizado pelo legislador ao

delimitar as possibilidades da decretação das prisões cautelares, a qual fez levando-se em

consideração, por exemplo, da gravidade da pratica delituosa.

PACELLI exemplifica esta tese com o fato da

[...] impossibilidade legal de se decretar a prisão preventiva para crimes culposos e/ou para as contravenções (art. 313), mesmo que se constante a presença dos requisitos fáticos para a sua concessão, entre aqueles, arrolados no art. 312 do CPP. Parte-se do raciocínio, logicamente justificado, no

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sentido de que, mesmo quando condenado o autor de crime culposo ou de infração contravencional, dificilmente será imposta a sanção privativa da liberdade, em razão das diversas alternativas sancionatórias previstas nos arts. 43 e 44 do CP, as chamadas alternativas. (2007, p. 416)

Como bem explanado pelo autor citado, em algumas situações, como é o caso dos

crimes culposos, das contravenções penais e de alguns crimes punidos com detenção, ou mais

precisamente nos casos que vão de encontro com o artigo 313 do Código de Processo Penal, o

resultado pretendido ao final do processo seria em muito superado com a imposição de algum

tipo de prisão cautelar, trazendo assim conseqüências prejudiciais ao réu. Portanto, a prisão

cautelar deve ser utilizada e legitimada como

[...] instrumento de garantia da eficácia da persecução penal, diante de situações de risco real devidamente previstas em lei. Se a sua aplicação pudesse trazer conseqüências mais graves que o provimento buscado na ação penal, ela perderia a sua justificação, passando a desempenhar função exclusivamente punitiva. A proporcionalidade da prisão cautelar é, portanto, a medida de sua legitimação, a sua ratio essendi. (PACELLI, 2007, p. 416)

O respeito ao direito de liberdade e a eficácia na repressão dos delitos, conforme o

magistério de LOPES JR (2009, p. 60), são dois direitos divergentes encontrados na

decretação de prisão cautelar, os quais devem ser equilibrados, mesmo que de forma

dificultosa. O princípio da proporcionalidade irá

Nortear a conduta do juiz frente ao caso concreto, pois deverá ponderar a gravidade da medida imposta com a finalidade pretendida, sem perder de vista a densidade do fumus commissi delicti e do periculum libertatis. Deverá valorar se esses elemntos justificam a gravidade das conseqüências do ato e a estigmatização jurídica e social que irá sofrer o acusado. Jamais uma medida cautelar poderá se converter em uma pena antecipada, sob pena de flagrante violação à presunção de inocência. (LOPES JR, 2009, p. 60)

O princípio da proporcionalidade, com origem na Alemanha, e o princípio da

razoabilidade, com origem nos Estados Unidos, são, ainda segundo LOPES JR (2009, p. 60),

fungíveis entre si. LOPES JR (2009, p. 60-61) divide o principio da proporcionalidade em três

subprincípios ou elementos estruturais, sendo eles: adequação, necessidade e

proporcionalidade em sentido estrito.

O subprincípio da adequação nos remete ao fato que a cautelaridade das prisões

cautelares deve respeitar seus “motivos e fins”. “Logo, se houver outra medida (inclusive de

natureza cautelar real) que se apresente igualmente apta e menos onerosa para o imputado, ela

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deve ser adotada, reservadamente a prisão para casos graves, como ultima ratio do sistema.”

(FERRAJOLI, 2009, p. 61)

Ajudando nesta compreensão Suzana Toledo de Barros destaca:

Entendido o princípio da proporcionalidade como parâmetro a balizar a conduta do legislador quando estejam em causa limitações aos direitos fundamentais, a adequação dos meios aos fins traduz-se em uma exigência de que qualquer medida restritiva deve ser idônea à consecução da finalidade perseguida, pois, se não for apta para tanto, há de ser considerada inconstitucional. (2003, p. 78)

Pode-se concluir, de acordo com SILVA (2002, 91ª, p. 27), que determinada medida

só será considerada inadequada caso sua utilização não contribua em nada para fomentar a

realização do objeto pretendido.

Já o subprincípio da necessidade “preconiza que a medida não deve exceder o

imprescindível para a realização do resultado que almeja” (2009, p. 61). Esta definição vem

acompanhada com parte da definição de prisão cautelar, a qual seja a delimitação de um prazo

para esta medida urgente.

Contribuindo com a definição deste elemento, DALABRIDA escreve que a

necessidade é

[...] identificada a partir do cotejamento da medida sob análise com outras alternativas. Será, portanto, preciso indagar sobre a existência de medidas igualmente eficazes para a consecução da finalidade, mas que se possam ser menos danosas aos Direitos Fundamentais. É dizer, além de ser imprescindível para assegurar o exercício do Direito Fundamental objeto da restrição (fim), para qualificar-se como necessário, o instrumento (meio) há de ser o mais eficaz e menos oneroso para o cidadão. Em sendo possível de outro ato que limite, em menor medida, o Direito Fundamental atingido, impõe-se tê-lo como desnecessário e conseqüentemente desproporcional. (2008, p. 79)

Por fim, para que uma medida limitadora de direito seja considerada proporcional há ainda a

necessidade da análise mais um elemento, o qual é denominado proporcionalidade em sentido

estrito, e que significa dizer que há a necessidade de ser realizada analise pelo magistrado quanto a

real necessidade de segregação da liberdade do acusado em relação ao seu direito de liberdade até que

se reste provado sua culpabilidade na prática de conduta típica e ilícita. Como ainda defini LOPES JR

“significa o sopesamento dos bens em jogo, cabendo o juiz utilizar a lógica da ponderação”. Onde se

deve analisar que há “de um lado, o imenso custo de submeter alguém que é presumidamente inocente

a uma pena de prisão, em processo e sem sentença, e, de outro lado, a necessidade da prisão e

os elementos probatórios existentes.” (LOPES JR., 2009, p. 61)

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Acerca deste tema, observa Suzana Toledo de Barros:

A proporcionalidade em sentido estrito, como visto, é um princípio que pauta a atividade do legislador segundo a exigência de uma equânime distribuição de ônus. Todavia, por si, não indica a justa medida do caso concreto. Esta há de ser inferida a partir da técnica de ponderação de bens, na qual o juízo de valoração de quem edita ou controla a medida restritiva de direito é bastante amplo, de que se trata de tarefa impossível de ser efetuada, pela dificuldade de separar, medir e comparar valores e interesses em conflito. (2003, p. 87-88)

Conforme a análise apresentada, para haver desproporcionalidade em sentido estrito é

necessário não constar na medida limitadora de direitos fundamentos plausíveis para justificar

sua emergente decretação.

Após analisar os três elementos constitutivos do princípio da proporcionalidade

conclui-se que uma medida proporcional é aquela que em um só tempo reúna os três

elementos estudados, ou seja, for adequada, necessária e razoável.

Resumidamente sobre este tema, DALABRIDA compreende:

A proporcionalidade deve de ser medida, portanto, pela incidência no caso concreto destes três elementos essenciais: a adequação dos meios utilizados pelo legislador para a consecução das finalidades pretendidas; a necessidade da utilização destes meios, e a razoabilidade, aferida por meio de uma ponderação entre os objetos visados e o significado da intervenção. (2008, p. 78)

Além disso, a doutrina exemplifica hipóteses de desproporcionalidade da decretação

da prisão preventiva levando-se em conta a adoção dos elementos estudados, como segue:

Deve-se considerar a imprescindível incidência do princípio da proporcionalidade – sempre conectado que está ao valor dignidade da pessoa humana – quando da aplicação da prisão cautelar. Nessa linha, a título exemplificativo, é desproporcional decretar tal prisão preventiva em se tratando de crimes: - cometidos sem violência ou grave ameaça, cuja perspectiva de eventual pela aplicada seja inferior a 4 anos, pois caberá a substituição nos termos do art. 44 do Código Penal; - que permitam a transação penal ou a suspensão condicional do processo; - cuja pena projetada não seja superior a 2 anos em que seja possível a concessão do sursis; - quando o regime de cumprimento de eventual pena a ser aplicada seja aberto ou mesmo semi-aberto (considerando a especificidade do caso penal). (LOPES JR, 2009, p.61)

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Assim, em razão de tudo o que acima foi exposto, os princípios constitucionais da

presunção de inocência e da proporcionalidade/ou razoabilidade devem ser aplicados à prisão

preventiva com o objetivo de tutelar os direitos fundamentais do cidadão, de forma que limite

ao máximo a possibilidade da medida cautelar, para que desta forma este tipo de prisão não

seja utilizado de forma autoritária ou discriminatória, não trazendo assim ao imputado

consequências mais graves das que uma possível condenação definitiva (pois poderá ser ainda

absolvido) possa trazer.

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2 A PRISÃO PREVENTIVA NO BRASIL: O PROBLEMA DO NÃO-PRAZO

A prisão pode ser conceituada como uma espécie de privação da liberdade de um

indivíduo, em decorrência de prática de conduta ilícita ou por ordem legal. Corroborando com

esta definição o professor Fernando da Costa Tourinho Filho ensina que “prisão é a supressão

da liberdade individual, mediante clausura.” (TOURINHO FILHO, 2007, p. 391).

Nosso ordenamento jurídico prevê as hipóteses legais de decretação de prisão em

desfavor de um individuo através do art. 5º, LXI, da Constituição Federal, conforme citado

abaixo:

[...] ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

Guilherme de Souza Nucci, sobre a prisão, destaca:

É a privação da liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, através do recolhimento da pessoa humana ao cárcere. Não se distingue, nesse conceito, a prisão provisória, enquanto se aguarda o deslinde da instrução criminal, daquela que resulta de cumprimento de pena. Enquanto o Código Penal regula a prisão proveniente de condenação, estabelecendo as suas espécies, formas de cumprimento e regimes de abrigo do condenado, o Código de Processo Penal cuida da prisão cautelar e provisória, destinada unicamente a vigorar, quando necessário, até o trânsito em julgado da decisão condenatória. (NUCCI, 2008, p. 554)

Desse modo, há a prisão decorrente de sentença penal condenatória transitada em

julgado, onde o transgressor recebe a prisão como uma sanção punitiva por ter praticado

alguma conduta criminosa, ou seja, trata-se de uma prisão decorrente de uma pena imposta

pelo Estado a um individuo devido à prática de uma infração penal. Esse tipo de prisão é

conhecida por alguns doutrinadores como prisão-pena, sendo definida como “o sofrimento

imposto pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado de uma infração penal. É

imposta aquele que for reconhecidamente culpado de haver cometido uma infração penal,

como retribuição ao mal praticado, a fim de reintegrar a ordem jurídica injuriada”

(TOURINHO FILHO, 2007, p. 392). Ou ainda, corroborando com este entendimento, a

“prisão penal, cuja finalidade manifesta é a repressiva, é a que ocorre após o trânsito em

julgado de sentença condenatória em que se impôs pena privativa de liberdade” (MIRABETE,

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2001, p. 359). E para finalizar esta definição vale-se recorrer à complementação dada por,

onde leciona que a prisão-pena “não tem finalidade acautelatória, nem natureza processual.

Trata-se de medida penal destinada à satisfação da pretensão executória do Estado” (CAPEZ,

2007, p. 244).

No entanto, há outras prisões que não decorrem de sentença penal condenatória

irrecorrível, sendo elas: prisão administrativa7, prisão civil8, prisão disciplinar9 e prisão

processual.

Para o estudo do presente trabalho será analisada a prisão processual, também

conhecida como cautelar ou provisória.

2.1 Prisões Cautelares

A prisão processual, também chamada de prisão provisória, e mais conhecida como

prisão cautelar, pode ser considerada como uma espécie de medida cautelar urgente, ou seja, é

a privação da liberdade de locomoção de um individuo sem sentença definitiva ou até mesmo

na ausência do processo.

O professor Fernando Capez define a prisão provisória como:

[...] prisão de natureza puramente processual, imposta com finalidade cautelar, destinada a assegurar o bom desempenho da investigação criminal, do processo penal ou da execução da pena, ou ainda a impedir que, solto, o sujeito continue praticando delitos. Depende do preenchimento dos

7 Como lecionada o professor Fernando Capez, a prisão administrativa “é aquela decretada por autoridade administrativa para compelir o devedor ao cumprimento de uma obrigação. Esta modalidade de prisão foi abolida pela nova ordem constitucional. Com efeito, o art. 319 do Código de Processo Penal não foi recepcionado pelo art. 5º, LXI e LXVII, da Constituição Federal. Em sentido contrário, o STF já entendeu que ainda cabe a prisão administrativa do estrangeiro, durante o procedimento administrativo da extradição, disciplinado pela Lei n. 6.815/80, desde que decretada por autoridade judiciária.” (CAPEZ, 2007, p. 246). As prisões administrativas são previstas no art. 319 do Código de Processo Penal e em leis especiais, cita-se como exemplo a Lei n.º 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro), tendo assim, conforme a Constituição Federal, a decretação desta prisão ser realizada exclusivamente pelo Poder Judiciário. 8 Prisão Civil deverá ser decretada pelo Poder Judiciário nas hipóteses de inadimplemento voluntário e inescusável de divida de alimentos e do depositário infiel, conforme previsto no art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. 9 Conforme previsto no art. 5º, LXI, da Constituição Federal, será admitida esta modalidade de prisão nos casos de transgressão militar e em crimes propriamente militares.

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pressupostos do periculum in mora e do fumus boni iuris. (CAPEZ, 2006, p. 244-145)

Acontece que ao falar que a prisão cautelar “depende do preenchimento dos pressupostos do

periculum in mora e do fumus boni iuris”, onde assim se busca a aplicação da doutrina processual

civil no processo penal. Apesar desta teoria ser defendida por muitos doutrinadores há uma forte

corrente que descorda desses pressupostos, dito isto, passa-se a estudar a teoria diversa, a qual busca

fundamentos já inseridos no próprio processo penal.

Por isso o professor Aury Lopes Jr., um dos principais críticos a esta teoria defendida por

Capez, observa:

Constitui uma impropriedade jurídica (e semântica) afirmar que para a decretação de uma prisão cautelar é necessária a existência de fumus boni iuris. Como se pode afirmar que o delito é a ‘fumaça do bom direito’? Ora, o delito é a negação do direito, sua antítese! (LOPES JR., 2009, p. 49)

E com esta crítica estimula a inserção, como requisito para a prisão cautelar, da

existência do fomus mommissi delicti, como a seguir defende:

No processo penal, o requisito para a decretação de uma medida coercitiva não é a probabilidade de existência do direito d acusação alegado, mas sim de uma fato aparentemente punível. Logo, o correto é afirmar que o requisito para decretação de uma prisão cautelar é a existência do fumus commissi delicti, enquanto probabilidade da ocorrência de um delito (e não de um direito), ou, mais especificamente, na sistemática do CPP, a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria. (LOPES JR., 2009, p. 49) (grifado pelo autor)

Agora, discordando com a teoria do periculum in mora, defendida como requisito da

decretação da prisão processual, Lopes faz sua crítica e defende a tese do periculum libertatis:

Em primeiro lugar, o periculum não é requisito das medidas cautelares, mas sim o seu fundamento. Em segundo lugar, a confusão aqui vai mais longe, fruto de uma equivocada valoração do perigo decorrente da demora no sistema cautelar penal. Aqui o fator determinante não é o tempo, mas a situação de perigo criada pela conduta do imputado. Fala-se, nesses casos, em risco de frustração da função punitiva (fuga) ou graves prejuízos ao processo, em virtude da ausência do acusado, ou no risco ao normal desenvolvimento do processo criado por sua conduta (em relação à coleta da prova). O perigo não brota do lapso temporal entre o provimento cautelar e o definitivo. Não é o tempo que leva ao aparecimento do objeto. O risco no processo penal decorre da situação de liberdade do sujeito passivo. Basta afastar a conceituação puramente civilista para ver que o periculum in mora no processo penal assume o caráter de perigo ao normal

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desenvolvimento do processo (perigo de fuga, destruição da prova) em virtude do estado de liberdade do sujeito passivo. Logo, o fundamento é um periculum libertatis, enquanto perigo que decorre do estado de liberdade do imputado. (LOPES JR., 2009, p. 50) (grifado pelo autor)

Com a análise, realizada por Aury Lopes Jr., fica evidente que no processo penal

devem ser buscadas concepções que melhor possibilitem sua instrução, e no caso das prisões

cautelares há maior necessidade da compreensão de seus pressupostos e requisitos, já que

estes devem satisfazer as necessidades do processo penal, o qual não pode ser, neste caso,

comparado ao processo civil.

Compartilhando com o entendimento defendido acima, Roberto Delmanto Júnior

leciona:

De outra parte, para que a prisão cautelar possa ser aplicada, o magistrado deverá verificar, concretamente, a ocorrência do fumus commissi delicti e do periculum libertatis, ou seja, se a prova indica ter o acusado cometido o deleito, cuja materialidade deve restar comprovada, bem como se a sua liberdade realmente representa ameaça ao tranqüilo desenvolvimento e julgamento da ação penal que lhe é movida, ou à futura e eventual execução. (DELMANTO JÚNIOR, 2001, p. 84)

Ainda, utilizando ensinamentos de Aury Lopes Jr. (2009, p.53-62), para se estabelecer

maior compreensão das prisões cautelares, e até mesmo para facilitar a distinção das prisões

processuais da prisão-pena, deve ser estudada sua base principiológica. Deste modo podemos

classificar e analisar cinco princípios relevantes para a compreensão da necessidade da

medida cautelar, no caso a prisão, no processo penal, os quais seguem abaixo:

O princípio da jurisdicionalidade pode ser defino como a obrigatoriedade de ordem

judicial, devidamente fundamentada, para poder haver a decretação da prisão cautelar

(LOPES JR., 2009, p 53-54).

O princípio da provisoriedade pode ser explicado pelo fato que toda prisão cautelar

deve possuir um tempo delimitado de duração, sendo que terá como limite o prazo estipulado

em lei (ex. prisão temporária) ou o pronunciamento do magistrado (ex. prisão preventiva)

(LOPES JR., 2009, p 54-55).

Para haver decretação da prisão cautelar deve haver motivos fáticos que a autorizem

esta, sendo que na ausência destes o imputado deve ser imediatamente solto, então se fala no

princípio da provisionalidade (LOPES JR., 2009, p 55-59).

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Somente em ultimo caso deve ser decretada uma prisão cautelar, tendo em vistas os

graves danos possíveis de serem gerados ao imputado. Surge assim o princípio da

excepcionalidade, o qual deve ser analisado em conjunto com o princípio da presunção de

inocência (LOPES JR., 2009, p. 59-60).

Por fim, devemos destacar o princípio da proporcionalidade. Este princípio, já

estudado no capítulo primeiro deste trabalho acadêmico, consiste, resumidamente, na

avaliação do magistrado quanto à medida da valoração entre o respeito à liberdade e a eficácia

na repressão dos delitos. O princípio da proporcionalidade “impõe algumas restrições em

matéria de prisão cautelar, de modo a impedir que a medida deferida seja mais grave e mais

intensa que a pena a ser aplicada na ação penal, ao finado do processo.” (PACELLI, 2007, p.

438)

Pois bem, visto os princípios fundamentais referentes a este tipo de segregação de

liberdade, passa-se a dar continuidade ao estudo desta espécie de prisão.

O doutrinador Julio Fabbrini Mirabete (2001, p. 359-360) ensina que em nosso

ordenamento jurídico há uma série de liberdades individuais tuteladas, sendo que para ocorrer

à prisão de alguém deveria ser imprescindível a sentença condenatória transitada em julgada,

onde ficaria comprovada a culpabilidade do agente, garantindo assim aos cidadãos uma

segurança jurídica sobre o ato praticado pelo Estado, sendo este o encarceramento do

condenado. No entanto, há hipóteses em que a prisão pode ocorrer antecipadamente, sendo

que esta “prisão assenta na Justiça Legal, que obriga o individuo, enquanto membro da

comunidade, a se submeter a perdas e sacrifícios em decorrência da necessidade de medidas

que possibilite ao Estado prover o bem comum, sua última e principal finalidade”. E nesse

sentido, o legislador normatizou as possibilidades da decretação de prisão através do art. 282

do Código de Processo Penal, que nada mais é do que a complementação do artigo 5º, LXI, da

Constituição Federal, como segue:

Art. 282. À exceção do flagrante delito, a prisão não poderá efetuar-se senão em virtude de pronúncia ou nos casos determinados em lei, e mediante ordem escrita da autoridade competente.

Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antonio Magalhães Gomes

Filho (1993, p. 228) traçam uma análise da presunção de inocência a prisão cautelar onde

defendem que a custódia preventiva “não pode ser confundida com punição, devendo sempre

ser providência excepcional, somente justificável em situações de extrema necessidade, de

cunho jurisdicional, com respeito às garantias do devido processo legal.”

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Desta forma, o legislador necessitou da elaboração de leis para regulamentar as

possibilidades de decretação de prisões e distingui-las, para que dessa maneira fosse

delimitado o poder de agir do Estado sobre o individuo quanto à restrição de sua liberdade.

Cabe ressaltar que o magistrado ao pronunciar o acusado deverá analisar se existe

alguma hipótese autorizadora de decretação de prisão preventiva, caso pense ser o mais justo

no momento, pois com o advindo da Lei n.º 11.69010 de 2008, não há mais hipótese de prisão

processual devido exclusivamente a pronúncia do acusado.

Assim sendo, há em nosso ordenamento jurídico três possibilidades de prisões

cautelares, que são: prisão em flagrante11, prisão temporária12 e prisão preventiva.

2.2 A caracterização da prisão preventiva: fazendo uma axiologia sistemática

Sempre que houver por fundadas razões de necessidade a decretação da constrição da

liberdade de alguém, podendo este ser enquadrado como réu (fase processual) ou indiciado

(fase investigativa), e respeitados os requisitos legais, sendo esta decretação emanada por

ordem judicial, podemos falar em PRISÃO PREVENTIVA.

A Prisão Preventiva é entendida pelo doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho

como sendo:

10 O teor do texto da Lei n.º 11.690 de 2008 pode ser analisado no anexo constante no final deste trabalho acadêmico. 11 A prisão em flagrante, prevista no artigo 5º, LXI, da Constituição Federal, e no art. 282 do Código de Processo Penal, está ainda regulamentada nos artigos 301 a 310 do Código de Processo Penal, cabendo destacar os artigos 301 e 302, os quais, respectivamente, definem a possibilidade da efetuação da referida prisão e sua definição, diante desta importância segue estes abaixo: Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal; II - acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração. Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência.

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[...] qualquer prisão que anteceda à decisão definitiva do Juiz é medida drástica, ou, como dizia Bento de Faria, é uma injustiça necessária do Estado contra o indivíduo, e, portanto, deve ser reservada para casos excepcionais. Por isso mesmo, entre nós, a prisão preventiva somente poderá ser decretada dentro daquele mínimo indisponível, por ser de incontrastável necessidade e, assim mesmo, sujeitando-a a pressupostos de liberdade que o próprio ordenamento jurídico tutela e ampara. Incontrastável necessidade, eis o fundamento. (TOURINHO FILHO, 2004, p. 594)

Ainda, colaborando com a compreensão deste tipo de prisão cautelar, o respeitado

doutrinador Eugênio Pacelli de Oliveira (2007, p. 432-433) ensina que a cautelaridade desta

prisão vem em encontro da tutela da persecução penal, tendo como fim inibir que o segregado

de alguma forma comprometa a efetividade do processo criminal, além do que deve ser o

ultimo meio do magistrado de impedir esse possível risco processual diante da liberdade do

imputado.

Porém, a prisão preventiva vem em confronto com ditames constitucionais, causando,

muitas vezes, duvidas sobre sua necessidade, e nesse sentido Julio Fabbrini Mirabete leciona:

Embora se façam criticas ao instituto da prisão preventiva, já que suprime a liberdade do indivíduo antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, causando ao eventualmente inocente a desmoralização e a depressão aos seus sentimentos de dignidade, é ele previsto tradicionalmente em nossa ordem jurídica como em todos os países civilizados. Considerada um mal necessário, uma fatal necessidade, uma dolorosa necessidade social perante a qual todos devem se inclinar, justifica-se a prisão preventiva por ter como objetivo a garantia da ordem pública, a preservação da instrução criminal e a fiel execução da pena. Mas como ato de coação processual e, portanto, medida extremada de exceção, só se justifica em situações específicas, em casos especiais onde a segregação preventiva, embora um mal, seja indispensável. (MIRABETE, 2005, p. 389)

De acordo com os conceitos estabelecidos pelos doutrinadores, são exemplos de

justificativa para a prisão preventiva, o fato do réu, demonstrar uma evidente vontade de fugir

a eventual sanção penal, ou até mesmo quando estiver provado que este pode perturbar, ou

colocar em risco, a instrução criminal.

Cabe salientar, que, por exemplo, o simples fato do acusado possuir antecedentes

criminais, ou a tamanha gravidade do crime pelo qual é acusado, não justificam a decretação

de prisão provisória, pois neste caso fere o já debatido princípio da presunção de inocência, já

que implica na antecipação da sanção penal.

12 A prisão Temporária surgiu em nosso ordenamento jurídico com a publicação da Lei. n.º 7.960 de 1989, sendo que o teor de seu texto pode ser observado ao final deste trabalho acadêmico.

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Sendo assim, pode-se entender que a prisão preventiva não fere diretamente o

princípio do Estado de Inocência, o qual deve ser interpretado em sentido amplo (lato sensu),

porque não dá ao acusado o status de culpado, e sim a segrega a liberdade do acusado, em

ultimo caso, quando este demonstrar relevantes indícios de poder colocar em risco a

efetividade do processo, sua instrumentalidade, podendo ser considerado tal ato como um

mal necessário, para que o acusado não burle a instrução processual, e que o processo

criminal atinja seu objetivo, o qual seja a busca da verdade real.

Portanto, pautado nos direitos e garantias fundamentais estabelecidas na constituição,

através de princípios basilares do nosso ordenamento jurídico, e pautado também da definição

do Estado Democrático de Direito que nossa Carta Magna aprecia, não deverá ser cabível a

decretação de prisão preventiva sem um fundamento conciso.

A previsão legal para a decretação desta medida cautelar está expressa no artigo 311

do Código de Processo Penal:

Art. 311. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou do querelante, ou mediante representação da autoridade policial.

E colaborando com o entendimento sobre a competência para a decretação e a

competência para o pedido de sua provocação a doutrina leciona:

A prisão preventiva somente pode ser decretada por juiz ou por tribunal competente em decisão fundamentada, a partir de prévio pedido expresso (requerimento) do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial. Estabelece ainda o art. 311 que caberá a prisão preventiva a partir de requerimento do querelante, logo, no curso de ação penal e de iniciativa privada. Quanto a essa possibilidade, excetuando-se os casos de ação penal privada subsidiaria da pública, onde o querelante poderá fazer o requerimento, são bastante raras as situações em que isso possa ocorrer, até porque, como regra, os crimes em que a ação penal depende de iniciativa privada são de menor gravidade, sendo desproporcional a prisão preventiva.(LOPES JR, 2009, p. 91) (grifou-se)

Podemos, desta forma, extrair dos ensinamentos do professor Aury Lopes Jr., e da

própria leia, sito o artigo 311 do Código de Processo Penal, que a única autoridade

competente para a decretação da prisão preventiva é o magistrado, sendo que somente poderá

ser representada pelo delegado de polícia (autoridade policial), em fase da investigação

policial, ou requerida pelo Ministério Público, ou ainda, nos casos de ação penal privada, pelo

querelante, sendo estas ultimas possibilidade em fase de instrução criminal.

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E ainda, de acordo com os ensinamentos de NUCCI (2007, p. 582-583), durante a

investigação policial o delegado de polícia conta com a possibilidade de representar pela

prisão temporária do indiciado, indicada justamente para a investigação de crimes mais

graves, e por isso na fase procedimental deve ser mais raro a decretação da prisão preventiva

pelo magistrado, apenas sendo justificável em situações fáticas excepcionais.

Além da fundamentação judicial da autoridade competente a decretação da prisão

preventiva, por se tratar de uma medida restritiva de direitos, deve estar expressamente

prevista em lei.

2.2.1 Pressupostos e Requisitos da Prisão Preventiva

Como o explanado até então, se faz necessário estudar os requisitos e pressupostos

autorizadores da decretação da prisão preventiva, os quais vêem normatizados no artigo 312

do Código de Processo Penal, o qual estabelece:

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Como visto, a lei nos apresenta quatro situações onde caberá a decretação desta prisão

cautelar, no entanto, quaisquer destas hipóteses devem vir acompanhados da prova da

existência do crime e indício suficiente de autoria, ou seja, deve haver materialidade e

presunção de autoria do investigado ou réu, como bem explica NUCCI:

A prova da existência do crime é a certeza de que ocorreu uma infração penal, não se podendo determinar o recolhimento cautelar de uma pessoa, presumidamente inocente, quando há séria dúvida quanto à própria existência de evento típico. (2007, p. 584)

Ainda NUCCI, define o indício de autoria como sendo:

A suspeita fundada de que o indiciado ou réu é o autor da infração penal. Não é exigida prova plena da culpa, pois isso é inviável num juízo meramente cautelar, feito, como regra, muito antes do julgamento do mérito. (2007, p. 585)

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Passa-se a compreender a materialidade do crime e a presunção de autoria do

investigado ou acusado como sendo os dois pressupostos da prisão preventiva.

Destarte, há também que ser estudado os requisitos da prisão preventiva, uma vez que

a sua decretação deverá está fundamentada em ao menos um deles, autorizando assim a

constrição da liberdade de determinado indivíduo.

Os referidos requisitos são muito bem analisados abaixo, com uma combinação de

ensinamentos presentes nas obras de NUCCI (2007, p. 584-588), CAPEZ (2007, p. 265),

DELMANTO JR (2002, p. 173-192) e MIRABETE (2005, p. 390), onde cada um destes

requisitos segue individualmente explicado:

A garantia da ordem pública pode ser compreendida pelo fato que a prática de

determinadas infrações podem abalar o sentimento social de impunidade e insegurança, ou

ainda, que o fato de que um investigado ou réu solto continue a delinqüir e a assim

amedrontar a paz social.

A ordem econômica é entendida como um meio de impedir uma nova prática

delituosa do indiciado ou acusado de determinado crime contra a ordem econômico-financeira

que cause certo abalo social, sendo “justificável” sua utilização como hipótese autorizadora da

decretação da prisão preventiva por gerar sensação de impunidade a sociedade.

Há muita discussão sobre a decretação desta prisão sob garantia da ordem pública e da

ordem econômica, por se tratarem de motivos muito genéricos, e passiveis de serem

resolvidos de diversas formas, como por exemplo, a proteção as vítimas ou testemunhas do

processo, fato este que deve ser sanado pelo Estado, pois cabe a ele garantir segurança a todos

os cidadãos através da polícia. São inúmeros exemplos a citar, mas pode-se entender que,

como já dito, para a decretação de tal prisão cautelar, em qualquer dos quatros quesitos

previsto no Art. 312 do Código de Processo Penal, é necessário que o acusado demonstre

alguma relevante interferência a prejudicar a persecução penal, sendo que esta interferência

não possa ser sanada pelo Estado, através de suas obrigações constitucionais, cabendo, após

esta analise, ao magistrado ver se restam fundamentos para a decretação da prisão preventiva.

Desta forma o magistrado passa a ser o ultimo recurso Estatal para garantir a continuidade do

processo, sem interferências externas.

A conveniência da instrução criminal deve ser entendida como um meio de impedir

que o agente atue no sentido de prejudicar ou impedir a perfeita instrução criminal, ou

investigatória, dificultando a colheita de provas de um modo geral.

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A garantia de aplicação da lei penal é compreendida como o meio de tentar impedir

que o agente, por algum eminente indício, fuja, o que inviabilizará ao Estado o exercício do

direito de punir, caso ao final do processo o agente seja considerado o autor da infração penal,

devendo assim receber uma sanção punitiva.

No que tange as condições de admissibilidade da prisão preventiva, depois de

preenchido os pressuposto combinado com algum dos requisitos expressos no artigo 312 do

Código de Processo Penal, deve ser admitida13 como hipóteses de delitos passíveis de prisão

preventiva os crimes dolosos punidos com reclusão, detenção, quando o agente já estiver

sido condenado por outro crime doloso com sentença transitada em julgado, ou quando

o crime envolver violência domestica e familiar contra a mulher.

Portanto, nos crimes culposos, ou passiveis de fiança, ou ainda nas contravenções

penais, não caberá prisão preventiva.

Cabe ressaltar que a decretação da prisão preventiva deve ser devidamente

fundamentada pelo magistrado, conforme o artigo 31514 do Código de Processo Penal. E

ainda, é relevante constar que a apresentação espontânea do imputado não impede o

cumprimento desta prisão, indo assim em conformidade com o art. 31715 do Código de

Processo Penal.

2.3 A atual construção do prazo da prisão preventiva no ordenamento jurídico

brasileiro: processo e estigmatização

As prisões cautelares, por serem de caráter excepcional, decorrentes da tutela a boa

continuidade da persecução penal, ou melhor dizendo, por não serem decorrentes de sentença

13 Art. 313. Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos: I - punidos com reclusão; II - punidos com detenção, quando se apurar que o indiciado é vadio ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecer ou não indicar elementos para esclarecê-la; III - se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 46 do Código Penal. IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência. 14 Art. 315. O despacho que decretar ou denegar a prisão preventiva será sempre fundamentado. 15 Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

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condenatória transitada em julgado, devem possuir um prazo determinado, ou seja, deve

coexistir durante o período necessário para garantir sua finalidade.

Pode ser citado o caso da prisão temporária, a qual a Lei n.º 7.960 de 1989 delimita o

prazo para em cinco dias, prorrogáveis por igual período. Ainda, com o advindo da Lei nº.

8.072 de 1990, a qual define os crimes hediondos16, e os equiparados a estes (sendo: a prática

da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo), o legislador prevê

para estas hipóteses como sendo passiveis de serem decretadas pelo prazo de trinta dias,

suscetíveis de prorrogação por igual período.

Já a prisão em flagrante terá a duração máxima de 24 (vinte e quatro) horas, prazo este

obtido a partir da interpretação do artigo 306 do Código de Processo Penal, período no qual o

magistrado decidirá pela manutenção da prisão, sendo necessária a decretação da prisão

preventiva, ou a liberdade do sujeito.

No entanto, no caso da prisão preventiva não há lei que fixe o prazo de sua duração.

Como bem anotado por Eugênio Pacelli de Oliveira (2007, p. 439), há apenas uma exceção

em nossa legislação que “encontra-se na Lei nº. 9.034/95, que cuida das ações praticadas por

organizações criminosas, cujo artigo 8º estabelece o prazo de 81 dias para o encerramento da

instrução criminal, quando preso o acusado”.

Continuando com os ensinamentos de PACELLI (2007, p. 439-440), este prazo de 81

(oitenta e um) dias tem sua origem em construção jurisprudencial, firmado ao logo dos anos

utilizando-se de limites de tempo pré-estabelecidos para a prática de certos atos processuais.

16 Lei nº. 8.072 de 1989: Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V); II - latrocínio (art. 157, § 3o, in fine); III - extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2o); IV - extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ lo, 2o e 3o); V - estupro (art. 213, caput e §§ 1o e 2o); VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o, 2o, 3o e 4o); VII - epidemia com resultado morte (art. 267, § 1o). VII-A – (VETADO) VII-B - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1o, § 1o-A e § 1o-B, com a redação dada pela Lei no 9.677, de 2 de julho de 1998). Parágrafo único. Considera-se também hediondo o crime de genocídio previsto nos arts. 1o, 2o e 3o da Lei no 2.889, de 1o de outubro de 1956, tentado ou consumado.

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O Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, sobre o posicionamento

do prazo máximo de duração da prisão preventiva, entendem respectivamente:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. HOMICÍDIO QUALIFICADO POR MOTIVO FÚTIL. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. GARANTIA DE ORDEM PÚBLICA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. DECRETO CONSTRITIVO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO. EVASÃO DO DISTRITO DA CULPA. EXCESSO DE PRAZO. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. [...] 3. O período de 81 dias, fruto de construção doutrinária e jurisprudencial, subsiste apenas como referencial para verificação do excesso, de sorte que sua superação não implica necessariamente um constrangimento ilegal, podendo ser excedido com base em um juízo de razoabilidade. 4. A demora no término da instrução probatória pode ser atribuída, entre outras causas, ao comportamento do acusado, inclusive, em razão de sua fuga do distrito da culpa, bem como em razão da complexidade dos fatos a serem apurados, compreendendo duas tentativas de homicídio em conexão com dois crimes de receptação e pluralidade de réus. 5. Ordem denegada, em conformidade com parecer ministerial. (STJ. Quinta Turma. HC nº 59736. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 07/08/2007) (Grifou-se) HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO, FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO, DESTRUIÇÃO, SUBTRAÇÃO OU OCULTAÇÃO DE CADÁVER, FORMAÇÃO DE QUADRILHA ARMADA. PRISÃO PREVENTIVA EM 25.10.2006. FUNDAMENTAÇÃO. MATÉRIA NÃO SUBMETIDA À APRECIAÇÃO DO TRIBUNAL A QUO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. EXCESSO DE PRAZO JUSTIFICADO. COMPLEXIDADE DO FEITO. MANOBRAS PROTELATÓRIAS POR PARTE DA DEFESA. PLURALIDADE DE RÉUS (5 PESSOAS). PARECER MINISTERIAL PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, DENEGADA. 3. O período de 81 dias, fruto de construção doutrinária e jurisprudencial, não deve ser entendido como prazo peremptório, eis que subsiste apenas como referencial para verificação do excesso, de sorte que sua superação não implica necessariamente um constrangimento ilegal, podendo ser excedido com base em um juízo de razoabilidade. (STJ. Quinta Turma. HC nº 117958/BA - HABEAS CORPUS nº 2008/0222737-2. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 10/02/2009) (Grifou-se) HABEAS CORPUS. FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO DE PRISÃO PREVENTIVA. CUSTÓDIA CAUTELAR LASTREADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E PARA ASSEGURAR A APLICAÇÃO DA LEI PENAL (CPP, ART. 312). EXCESSO DE PRAZO. NÃO-CONFIGURAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO DA DEFESA. PROCESSO COMPLEXO. ORDEM INDEFERIDA. [...] 5. Quanto à alegação de excesso de prazo, constata-se a existência de elementos que sinalizam para a complexidade da causa (elevado número

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de crimes e de acusados). Em princípio, desde que devidamente fundamentada e atendido o parâmetro da razoabilidade, admite-se a excepcional prorrogação de mais de 81 dias para o término de instruções criminais de caráter complexo. (STF. Segunda Turma. HC nº 89090. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Julgado em 21.11.2006) (Grifou-se) PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA VOLTADA PARA O TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. PERICULOSIDADE DO RÉU. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PRECEDENTES DO STF. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. INEXISTÊNCIA. PROCESSO COMPLEXO. ORDEM DENEGADA. [...] 6. Entendo que a prisão cautelar do paciente, ainda que com prazo superior a 81 dias, pode se justificar com base no parâmetro da razoabilidade, em se tratando de instruções criminais de caráter complexo (HC 89.090/GO, rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, Sessão de 21.11.2006, DJ de 05.10.2007), como parece ocorrer na hipótese. (STF. Segunda Turma. HC n.º 97983/SP. Relator: Ministra Hellen Gracie. Julgado em 02/06/2009) (Grifou-se)

Como visto, ambos os tribunais (STJ e STF) utilizam o prazo de 81 (oitenta e um)

dias como norteador para fixar um limite a segregação cautelar, apesar de entenderem que é

passível de dilação. Desta forma se faz necessário entender a origem desse prazo.

O prazo de 81 (oitenta e um) dias, como já explanado, é fruto da construção

jurisprudencial e doutrinária, onde os defensores deste utilizam a soma de prazos legais

referentes ao início até o fim da instrução processual do indivíduo preso. Para explicar de

forma didática este prazo passa-se a observar o quadro abaixo, o qual por si só já é auto-

explicativo, como segue:

Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente (...)

Prazo de 10 dias

+ Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias (...) Prazo de 05

dias + Art. 395. O réu ou seu defensor poderá, logo após o interrogatório ou no prazo de três dias, oferecer alegações escritas e arrolar testemunhas.

Prazo de 03 dias

+ Art. 401. As testemunhas de acusação serão ouvidas dentro do prazo de vinte dias, quando o réu estiver preso, e de quarenta dias, quando solto.

Prazo de 20 dias

+ Art. 499. Terminada a inquirição das testemunhas, as partes - primeiramente o Ministério Público ou o querelante, dentro de 24 horas, e depois, sem interrupção, dentro de igual prazo, o réu ou réus - poderão requerer as diligências, cuja necessidade ou conveniência se origine de circunstâncias ou de fatos apurados na instrução, subindo logo os autos conclusos, para o juiz tomar conhecimento do que tiver sido requerido pelas partes.

Prazo de 02 dias

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+ Art. 499. Terminada a inquirição das testemunhas, as partes - primeiramente o Ministério Público ou o querelante, dentro de 24 horas, e depois, sem interrupção, dentro de igual prazo, o réu ou réus - poderão requerer as diligências, cuja necessidade ou conveniência se origine de circunstâncias ou de fatos apurados na instrução, subindo logo os autos conclusos, para o juiz tomar conhecimento do que tiver sido requerido pelas partes. C/C Art. 800. Os juízes singulares darão seus despachos e decisões dentro dos prazos seguintes, quando outros não estiverem estabelecidos: I - de dez dias, se a decisão for definitiva, ou interlocutória mista;

Prazo de 10 dias

+ Art. 500. Esgotados aqueles prazos, sem requerimento de qualquer das partes, ou concluídas as diligências requeridas e ordenadas, será aberta vista dos autos, para alegações, sucessivamente, por três dias (...)

Prazo de 06 dias

+ Art. 502. Findos aqueles prazos, serão os autos imediatamente conclusos, para sentença, ao juiz, que, dentro em cinco dias, poderá ordenar diligências para sanar qualquer nulidade ou suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade (...)

Prazo de 05 dias

+ Art. 800. Os juízes singulares darão seus despachos e decisões dentro dos prazos seguintes, quando outros não estiverem estabelecidos: I - de dez dias, se a decisão for definitiva, ou interlocutória mista; (...) § 3o Em qualquer instância, declarando motivo justo, poderá o juiz exceder por igual tempo os prazos a ele fixados neste Código.

Prazo de 10

dias

= Somando todos os prazos previstos nos artigos acima citados, oriundos do Código de Processo Penal, totalizam os 81 (oitenta e um) dias defendidos por alguns doutrinadores e por parte da jurisprudência.

Prazo de 81 dias

Acontece que a maior parte desses artigos já foram substituídos17 por novas redações,

onde estipulam prazos distintos aos apresentados acima, porém mesmo com a alteração do

Código de Processo Penal o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça ainda

insistem num prazo razoável de 81 (oitenta e um), os quais podem ser prorrogados em virtude

da necessidade processual. Ora, se não existe mais esta possibilidade de construção de prazo

em virtude da instrução processual como estes respeitáveis tribunais ainda decidem, como

pode bem observar pela data dos julgados acima, desta maneira? A resposta desta pergunta

ficará em aberta, já que não há justificativa legal para tanto. Cerceando mais profundamente

esta discussão o capitulo 3.3 deste trabalho abordará com maior ênfase esta problemática

jurídica de falta de delimitações de um prazo razoável ou proporcional, se é que existe, para o

preso preventivamente.

17 Vide Lei nº 11.719, de 2008.

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Após a análise jurisprudencial, é possível perceber que nas decisões proferidas pelo

Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, apesar da controvérsia, o prazo

máximo para o cárcere, oriundo da decretação de prisão preventiva, é em regra de 81 dias,

porém em determinados casos o prazo pode ser considerado variável. Os respeitosos

Ministros, nos dois tribunais, defendem a tese que a dilação do prazo, previsto em lei como

sendo no máximo de 81 dias, pode ser dilato, desde que haja justificativa para tanto. Ambos

os tribunais utilizam o Art. 5º, LXXVIII, e Art. 93, IX, da Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, para justificar tal tese, onde defendem que para a solução de

processos “complexos” há a necessidade de aumento dos prazos previsto em lei, o qual deverá

ser devidamente fundamentado e atendido o parâmetro de razoabilidade, admitindo assim a

prorrogação do prazo estipulado em lei, para poder cessar as instruções criminais de caráter

complexo.

Como muitos doutrinados (Luigi Ferrajoli, Aury Lopes Jr., Eugênio Pacelli de

Oliveira, Ada Pellegrini Grinover, Guilherme de Souza Nucci, Gustavo Henrique Badaró),

esta pesquisa acadêmica buscará ainda desenvolver uma visão garantista, discordando com o

posicionamento dos tribunais de última instância do país, defendendo que o prazo máximo

desse tipo de prisão cautelar deve ser delimitado, para que não forje as garantias individuais

do cidadão. Neste contexto se tentará construir um prazo de forma verdadeiramente razoável e

justa, o qual deverá atentar para um prazo razoavelmente suficiente para o magistrado tomar

as providencias que julgar extremamente necessárias com o acusado preso. É um absurdo

pensar que há casos, de pessoas que foram presas por anos em decorrência de uma decretação

de prisão preventiva, às vezes até passando da dosimetria da pena prevista para o crime

cometido, e ao final do processo não restar provada a culpa do acusado e sim sua verdadeira

inocente, a qual já deveria ter sido presumida seguindo os ditames constitucionais. Não há

reparação material que supere o dano moral causado por uma prisão ilegal, onde o acusado

passa a ser vítima do Estado Democrático de Direito, guardião de normas protetoras do

cidadão, pois foi esquecido em um sistema judiciário e carcerário deficiente, sendo forçado a

viver em situação indesejada.

Por sorte o legislador previu, ao criar o artigo 648 do Código de Processo Penal, um

mecanismo processual a ser observado quando o restar provado o excesso do direito de punir

do Estado, como segue:

Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal: II – quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;

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O artigo mencionado, correlacionado com a dilatação do prazo máximo previsto para a

prisão preventiva é interpretado pela doutrina como:

Excesso de prazo na privação da liberdade: o investigado ou réu, quando preso, deve ter o procedimento acelerado, de modo que não fique detido por mais tempo do que o razoável, segundo a lei. Há de se verificar tais hipóteses no caso concreto. Assim, na fase policial, se uma prisão temporária é decretada por cinco dias, é esse o prazo para a conclusão da detenção, haja ou não a colheita das provas suficientes. O máximo que se admite é a prorrogação da temporária por outros cinco dias, ao final dos quais deve cessar a contrição. Não ocorrendo, configura-se o constrangimento ilegal. Quanto á instrução dos processos criminais, criou-se um período – obtido pela soma dos prazos previstos no Código de Processo Penal – que é de 81 dias, tempo considerado suficiente para o término da colheita das provas. Ocorrer que, atualmente, a jurisprudência vem amenizando enormemente essa disposição, alegando que somente o caso concreto ditará se há ou não excesso de prazo para a conclusão da instrução. Logo, já não se fala em 81 dias, mas num prazo razoável, sem culpa do juiz, para a conclusão da instrução. (NUCCI, 2002. p. 915-916)

Como o explanado, a decretação da prisão preventiva e seus efeitos devem ser revistos

pelo legislador, bem como pelos órgãos jurisdicionais, com o objetivo de tornar esta uma

ferramenta para auxiliar em casos peculiares do processo penal e não como uma arma para

antecipar o efeito pretendido pela acusação numa ação penal.

Por isso no próximo capítulo serão analisados os entendimentos jurisprudências das

cortes mais elevadas do país, também será abordado o entendimento internacional sobre o

assunto, bem como quais medidas estão sendo tomadas pelo legislador para tentar sanar o

problema que circunscreve a duração da prisão preventiva.

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3. A PRISÃO PREVENTIVA E A O DESAFIO DE CONSTRUÇÃO DE UM PRAZO

JUSTO

O presente estudo revela que garantias e direitos constitucionais, como por exemplo, a

presunção de inocência, não foram lembrados pelo legislador ao criar a possibilidade de

decretação de prisão preventiva sem um prazo de duração específico.

O legislador ao deixar de fixar um prazo certo para o término do encarceramento

preventivo deixa a liberdade do indivíduo a mercê da interpretação e julgamento do

magistrado. Por sua vez, o juiz de direito deve sim ter liberdade para interpretar a lei, sua

aplicabilidade frente ao caso concreto, porém não pode criar norma, pois desta forma passar a

ter as mesmas atribuições do legislador, e é assim que faz ao estipular o prazo da prisão

preventiva.

Tentando preservar o direito de ir e vir do cidadão e analisando o atual ordenamento

jurídico brasileiro frente ao prazo de decretação de prisão preventiva passa-se a expor como

os Tribunais e Legislações Internacionais tratam o assunto, como nossos Tribunais de elevada

corte julgam essa situação delicada e as medidas de mudança a serem adotadas para

solucionar essa problemática jurídica.

3.1 A prisão preventiva nos ordenamentos jurídicos internacionais e a construção de

seus prazos

Não somente na esfera jurídica brasileira, mas como no cenário internacional as

prisões provisórias são tema de grandes discussões, pois há o choque de interesses entre

garantir a efetividade do processo penal e garantir o estado de inocência do homem.

Por isso diversas nações comungam da mesma problemática jurídica, ou seja, buscam

construir um prazo razoável de cárcere cautelar, tarefa nada fácil como se poderá observar

adiante.

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3.1.1 Convenções Internacionais

O Pacto internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque18, pode ser

citado como exemplo da discussão deste tema, onde adotou medidas consideradas justas por

lideranças de diversos países.

Este pacto foi recepcionado pelo ordenamento jurídico brasileiro em 07.07.1992 (data

da publicação), através da ratificação feita pelo então Excelentíssimo Senhor Presidente

Fernando Collor, onde trouxe alguns preceitos relacionados aos aspectos da prisão preventiva,

dando-se neste trabalho maior ênfase a matéria referente ao prazo de duração desta.

O referido pacto nos remete a disposições já consagradas na Carta Magna brasileira,

especialmente no que tange a dignidade da pessoa humana e a presunção de inocência do

indivíduo.

Ao analisar a redação do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticas com foco no

prazo de duração da prisão preventiva, o doutrinador Roberto Delmanto Júnior (2001, p. 43)

considera que o segregado de sua liberdade “deve ser julgado em prazo razoável ou ser posto

em liberdade”, onde cita como fundamento desta previsão o parte do artigo 9º, 3, 19

[...] 3. Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. (...) (Grifou-se)

Ainda com a compreensão de DELMANTO JR. (2001, p. 43), este pacto internacional

não permite que o legislador estabeleça prazos extremos de segregação de liberdade do preso

provisório, podendo incorrer em “pena de inconstitucionalidade”.

Por sua vez o magistrado, mesmo na falta de lei delimitando o prazo da prisão

cautelar, não pode decretar prisão preventiva por prazo extremo, pois fere os princípios da

razoabilidade, proporcionalidade, dignidade da pessoa humana e presunção de inocências,

sendo todos estes consagrados na Constituição Federal do Brasil e por diversos países como

bem expressa o pacto internacional estudado.

18 Levando-se em conta a tamanha importância do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque está a disposição do leitor, ao final deste trabalho, o teor de sua redação. 19 Grifado pelo autor citado.

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Há também outras convenções internacionais as quais o Brasil faz parte, como, por

exemplo, o Pacto de San José da Costa Rica, que elevam a proteção a presunção de inocência,

porém não mencionam bem a questão da duração razoável das prisões cautelares como o

Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, por isso não serão estudados neste

trabalho acadêmico, já que o foco desta pesquisa acadêmica é a razoabilidade o prazo da

prisão preventiva.

3.1.2 Construção internacional da teoria do não-prazo ou prazo razoável

Inicialmente é oportuno discorrer o entendimento comum dos professores Aury Lopes

Júnior e Gustavo Henrique Badaró (2006, p. 39) explicam que o Brasil não possui um prazo

específico para a prisão preventiva, pois tanto a Constituição, como as Leis

infraconstitucionais, bem como as Convenções Internacionais a qual o Brasil aderiu não

prevêem esta normatização. O Brasil, até a presente data, adota na aplicação de prazos de

prisões preventivas a teoria do prazo razoável ou não-prazo.

Os mesmos autores (p. 39-40) ensinam sobre a evolução das jurisprudências do

Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH) e da Corte internacional de Direitos

Humanos (CIDH) sobre a teoria do prazo razoável citando o caso conhecido como

WEMHOFF, sentenciado em 27.06.1968, pelo TEDH, onde foram criados sete critérios para

valorarem a “duração indevida” da prisão cautelar, que são eles:

a) a duração da prisão cautelar; b) a duração da prisão cautelar em relação à natureza do delito, à pena fixada e à provável pena a ser aplicada em caso de condenação; c) os efeitos pessoais que o imputado sofreu, tanto de ordem material como moral ou outros; d) a influência da conduta do imputado em relação à demora do processo; e) as dificuldades para a investigação do caso (complexidade dos fatos, quantidade de testemunhas e réus, dificuldades probatórias, etc.); f) a maneira como a investigação foi conduzida; g) a conduta das autoridades judiciais.

Como lecionam LOPES JR. e BADARÓ (p.40) os critérios citados acima deveriam

ser adotados na aferição do excesso de prazo da prisão preventiva de forma ligada, porém

com valorações independentes.

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O depois desta sentença o TEDH passou a adotar estes critérios como recurso auxiliar

em outros casos, contudo, como novamente apontam os autores mencionados acima (p.40-

41), estes critérios serviram como base inspiratória para a criação de uma segunda teoria, a

qual se utiliza de três critérios muito utilizados pelo TEDH, bem como pela CIDH, os quais

são

a) complexidade do caso; b) a atividade processual do interessado (imputado); c) a conduta das autoridades judiciárias.

Além desses critérios o TEDH vem fundamentando em suas decisões, segundo

LOPES JR. e BADARÓ (2001, p. 41), que o critério da razoabilidade ainda deve ser

compreendido, para fins de prolongamento da prisão preventiva, como a necessidade de

prevalecer o interesse coletivo sobre o individual, como bem citam os autores trecho de

decisões do TEHD que deve haver “real exigência do interesse público, que deve prevalecer

sobre o direito de liberdade, não obstante a presunção de inocência”. Os autores entendem que

a “real exigência do interesse público” é ainda mais subjetiva e de difícil compreensão que os

três critérios adotados pela segunda teoria.

Por fim, os autores citados, críticos incondicionais da doutrina ou teoria do não-prazo

discorrem em seus escritos que a posição ainda tomada pelos tribunais, cito o TEHD, a CIDH,

e os Tribunais brasileiros, de não fixar prazos para a duração da prisão preventiva são muito

“vagos”, deixando “amplo espaço discricionário para a avaliação segundo as circunstâncias

do caso e o ‘sentir’ do julgador” desrespeitando garantias e direitos individuais já estudados.

3.1.3 Construção internacional sobre o prazo da prisão preventiva e o respectivo entendimento

jurisprudencial

Passa-se neste momento a analisar diversas decisões internacionais sobre a

razoabilidade da duração do prazo da custódia cautelar, as quais contribuem para a construção

jurisprudencial sobre o assunto e por fim um maior esclarecimento.

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3.1.3.1 Duração da Prisão Preventiva na Alemanha

O Bundesgerichtshof (o qual será tratado neste trabalho como BGH), o qual seja o

Tribunal Federal alemão, proferiu sua primeira condenação quanto à dilação de prazo

indevida no ano de 1982, no caso conhecido como METZGER.

Segundo o professor Kai Ambos (2008, p. 07-08) o caso Metzger trata-se do fato de

que um matadouro municipal despejava lixo no esgoto coletivo, e como este matadouro era

subordinado a administração municipal o réu, ora administrador daquele município, foi

responsabilizado criminalmente pelos danos causados ao meio ambiente. Ocorre que se

passaram nove anos contados da data em que o réu tomou conhecimento do fato imputado a

ele até a data de prolação da sentença do Bundesverfassungsgericht, ora Tribunal

Constitucional Federal alemão. Ao analisar o caso, o BGH comparou o tempo de dilação entre

a prática do delito e a sentença recorrida com casos semelhantes, os quais tinham sido

concluídos em tempo inferior, sendo que esse excesso de prazo foi entendido como causa para

impor pena inferior, ou melhor, mais benéfica a esse réu. O BGH ainda entendeu que apesar

do caso ser complexo nada justificaria tamanha dilação de prazo para resolver o incidente,

concluindo assim que os responsáveis por este excesso foi a inércia das autoridades alemãs e

por isso ainda sentenciou em favor do réu lhe concedendo uma indenização por danos morais

e isenção das custas processuais.

Cabe ressaltar, que o caso acima citado não está relacionado diretamente com a prisão

preventiva, pois se trata apenas da dilação de prazos processuais, onde não houve decretação

da prisão preventiva. Por isso, pode-se compreender a importância que o Estado Alemão dá

para o garantismo vislumbrado um Estado Democrático de Direito, não autorizando, apesar da

culpa do acusado, que sejam cometidos excessos contra esse.

Ainda na Alemanha, como ensina DELMANTO (2007, p. 352-353), o legislador

daquele país normatizou o prazo da custódia cautelar provisória em um prazo de 6 (seis)

meses de duração, podendo este em casos específicos ser suspenso a qualquer momento ou

dilato por mais 6 (seis) meses, ou seja, a prisão preventiva não pode ultrapassar 1 (um) ano de

duração, sendo considerada ilegal a prisão que ultrapasse os ditames da lei.

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3.1.3.2 Duração da Prisão Preventiva na Argentina

A Argentina, por sua vez, após recepcionar em seu ordenamento jurídico o Pacto de

San José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos) passou a delimitar o

prazo da prisão preventiva. Segundo DELMANTO (2007, p. 355-357) a Argentina adotou o

prazo de 2 (dois) anos como sendo, em regra geral, o prazo limite desta modalidade de prisão.

Ainda prevê o ordenamento jurídico argentino que este prazo poderá, em casos excepcionais e

com a devida fundamentação judicial, ser dilatado por mais 1 (um) ano. O interessante é o

fato que quando haver o excesso de prazo da prisão o próprio magistrado, prolator da decisão

que autorizou o cárcere, será responsabilizado por cometimento de falta grave.

3.1.3.3 Duração da Prisão Preventiva na Espanha

O legislador espanhol, como leciona DELMANTO JR (2007, p. 351-352), após

constantes reformas processuais delimitou a prisão provisória em três prazos distintos, sendo

de 3 (três) meses, 1 (um) ano ou 2 (dois) anos, possibilidades estas diferenciadas de acordo

com a pena do crime imputado ao acusado.Infelizmente, o mesmo ordenamento jurídico prevê

uma dilatação desse prazo quando se restar provado que o acusado poderá impedir de alguma

forma o normal transcurso do processo e que o prazo fixado anteriormente não foi capaz de

findar a ação penal, onde o prazo inicialmente delimitado pode ser prorrogado por mais 2

(dois) anos ou até mesmo por mais 4 (quatro) anos.

3.1.3.4 Duração da Prisão Preventiva na Itália

Na Itália, atualmente, segundo DELMANTO JR (2007, p. 347-351), após a reforma

processual penal do ano de 1.998, passou a vigorar a prisão preventiva com prazos

determinados em lei. Esses prazos são fixados de acordo com a pena máxima prevista para o

crime pelo qual o acusado está sendo processado e o tipo de pena, por exemplo, a pena

perpétua, sendo esta prisão cabível desde a fase de investigatória até a fase final de instrução

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processual. A custódia cautelar tem prazos máximos de duração que variam de 3 (três) meses

a 6 (seis) anos.

Dessa forma, o legislador italiano tentou criar parâmetros razoáveis para fixação da

segregação preventiva durante a persecução penal.

Como bem analisa DELMANTO JR, as particularidades adotadas na nova legislação

italiana adverte que mesmo com o fato de o legislador tentar amenizar excessos de

sofrimentos ao acusado, o processo italiano continua sendo rigoroso de forma que não garante

plenamente a presunção de inocência do imputado, pois como bem aponta, uma das falhas da

nova legislação é o fato que se alguma decisão de instância inferior for anulada por superior,

“o prazo para a fase anulada começa a correr todo novamente” (p. 351).

Assim sendo, após estudar-se a aplicação de lei processuais penais em diversos países

do globo inicia-se o estudo sobre a aplicação do da lei processual brasileira nos seus mais

elevados tribunais, no que tange a matéria do excesso de prazo da prisão preventiva.

3.2 A razoabilidade do prazo da prisão preventiva frente ao entendimento

jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal:

análise e crítica

A mais alta corte brasileira, o Supremo Tribunal Federal, tem consolidado em suas

decisões como prazo possível para a prisão preventiva a construção do prazo de 81 (oitenta e

um dias), sendo que em determinado casos, os considerados “complexos”, entende a

respeitável corte que há a possibilidade de dilação do prazo da prisão preventiva justifica-se

no princípio da razoabilidade.

De acordo com o explanado, passa-se a analisar alguns acórdãos que formam a

jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, como segue:

EMENTA: HABEAS CORPUS. FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO DE PRISÃO PREVENTIVA. CUSTÓDIA CAUTELAR LASTREADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E PARA ASSEGURAR A APLICAÇÃO DA LEI PENAL (CPP, ART. 312). EXCESSO DE PRAZO. NÃO-CONFIGURAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO DA DEFESA. PROCESSO COMPLEXO. ORDEM INDEFERIDA. 1. Crimes dos arts. 12 c/c 18, I, e 14, da Lei nº 6.368/1976 e 304 do Código Penal. A impetração alega: i) ausência de fundamentação do decreto de prisão preventiva; e ii) excesso de prazo na instrução criminal. 2. Na espécie, a

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decretação da preventiva lastreou-se nos fundamentos da garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal, nos termos do art. 312 do CPP. 3. Quanto ao requisito da garantia da ordem pública, em linhas gerais e sem qualquer pretensão de exaurir todas as possibilidades normativas de sua aplicação judicial, destaco as seguintes circunstâncias principais: i) a necessidade de resguardar a integridade física do próprio paciente ou dos demais cidadãos; ii) o imperativo de impedir a reiteração das práticas criminosas, desde que tal objetivo esteja lastreado em elementos concretos expostos fundamentadamente no decreto de custódia cautelar; e iii) para assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial do Poder Judiciário, quanto à visibilidade e transparência de políticas públicas de persecução criminal e desde que diretamente relacionadas com a adoção tempestiva de medidas adequadas e eficazes associadas à base empírica concreta que tenha ensejado a custódia cautelar. [...] 5. Quanto à alegação de excesso de prazo, constata-se a existência de elementos que sinalizam para a complexidade da causa (elevado número de crimes e de acusados). Em princípio, desde que devidamente fundamentada e atendido o parâmetro da razoabilidade, admite-se a excepcional prorrogação de mais de 81 dias para o término de instruções criminais de caráter complexo. [...] A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem deferido a ordem de habeas corpus somente em hipóteses excepcionais, nas quais a mora processual: i) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela atuação da acusação [...] ii) resulte da inércia do próprio aparato judicial em atendimento ao princípio da razoável duração do processo, nos termos do art. 5º, LXXVIII [...] Decreto de prisão preventiva devidamente fundamentado, nos termos do art. 312 do CPP e art. 93, IX, da CF. Existência de razões suficientes para a manutenção da prisão preventiva. 9. Ordem indeferida. (STF. Segunda Turma. HC 89090/GO. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Julgado em 21/11/2007) (Grifou-se)

O acórdão acima demonstra claramente que o Supremo Tribunal Federal justifica a

prorrogação da prisão preventiva fundamentando que se deve estender o prazo da prisão

preventiva sempre que o caso em questão for considerado “complexo”, ou seja, quando pela

particularidade dos fatos criminosos o Poder Judiciário não consegue julgar o caso no mesmo

tempo que faz no julgamento dos crimes “normais” ou “comuns”. Acontece que julgando

desta forma os distintos ministros esquecem que o réu não pode ficar a mercê dar inércia do

Poder Judiciário, pois a constituição federal lhe garante direitos e garantias individuais

invioláveis, citando-se como exemplo a presunção de inocência.

Ainda utilizando acórdãos do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO. INOCORRÊNCIA. RAZOABILIDADE. O entendimento desta Corte está alinhado no sentido de que o prazo de oitenta e um dias para o término da instrução criminal não é absoluto, podendo ser dilatado mercê da complexidade dos autos e da quantidade de réus envolvidos no fato delituoso. A circunstância de o paciente e outros responderem pela prática de quatro

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homicídios qualificados [chacina] torna razoável a dilação da instrução criminal para além do prazo legalmente estipulado. Ordem denegada. (STF. Segunda Turma. HC 92483/PE. Relator: Ministro Eros Grau. Julgado em 27/11/2007) (Grifou-se)

Como o teor deste acórdão fica evidente a construção do prazo da prisão preventiva

em 81 (oitenta e um) dias, e sua possível prorrogação em casos “complexo”.

Os ministros do STF ainda acórdão que:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA VOLTADA PARA O TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. PERICULOSIDADE DO RÉU. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PRECEDENTES DO STF. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. INEXISTÊNCIA. PROCESSO COMPLEXO. ORDEM DENEGADA. [...] 2. Verifico que o juiz fundamentou suficientemente a decisão que decretou a prisão preventiva do paciente, eis que, diante do conjunto probatório dos autos da ação penal, a custódia cautelar se justifica para a garantia da ordem pública, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. 3. A periculosidade do réu constitui motivo apto à decretação de sua prisão cautelar, com a finalidade de garantir a ordem pública, consoante precedentes desta Suprema Corte (HC 92.719/ES, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 19.09.08; HC 93.254/SP, rel. Min. Carmen Lúcia, DJ 01.08.08; HC 94.248/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 27.06.08). 4. Há informações nos autos que apontam para a complexidade do processo, que apura a existência de organização criminosa especializada no tráfico internacional de drogas, com a existência de nove réus, sendo três de nacionalidade búlgara e nenhum deles com defensor comum, com a necessidade de expedição de cartas precatórias para oitiva de testemunhas arroladas pela defesa e realização de perícia, o que justifica a demora na formação da culpa. 5. A razoável duração do processo (CF, art. 5°, LXXVIII), logicamente, deve ser harmonizada com outros princípios e valores constitucionalmente adotados no Direito brasileiro, não podendo ser considerada de maneira isolada e descontextualizada do caso relacionado à lide penal que se instaurou a partir da prática dos ilícitos. 6. Entendo que a prisão cautelar do paciente, ainda que com prazo superior a 81 dias, pode se justificar com base no parâmetro da razoabilidade, em se tratando de instruções criminais de caráter complexo (HC 89.090/GO, rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, Sessão de 21.11.2006, DJ de 05.10.2007), como parece ocorrer na hipótese. 7. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus. (STF. Segunda Turma. HC nº 97983/SP. Relator: Ministra Ellen Grace. Julgado em 02/06/2009) (Grifou-se)

Ora, como imputar o grau de periculosidade ao réu se nem mesmo este foi julgado?

Decidindo desta maneira fica nítida a inobservância do princípio da presunção de inocência.

Além disso, no mesmo acórdão os ministros fazem referência a uma “razoável duração do

processo”, onde “deve ser harmonizada com outros princípios e valores adotados no Direito

brasileiro”, observa-se nesta citação que na verdade uma decisão que insisti em deixar um

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acusado preso por tempo superior ao já construído através da jurisprudência e da doutrina, por

haver ausência de delimitação legal, proclama a maior falta de respeito aos ditames

constitucionais, pois como se sabe a Constituição tem como intuito estabelecer regras para um

convívio social harmônico, dando poderes ao Estado e por sua vez dá garantias e direitos ao

cidadão para proteger-se de eventuais excessos Estatais, onde na problemática em questão

pode-se evocar mais uma vez o constrangimento de ir e vir do cidadão, que mesmo sendo

acusado de qualquer crime sempre estará protegido pelo princípio da presunção de inocência.

Ainda, frisa-se o fato que como já explanado no capítulo 2 desta pesquisa científica o prazo

de 81 (oitenta e um) dias não se sustenta mais, pois com a mudança da legislação processual o

somatório dos prazos que formam a instrução processual não resultam mais no resultado de

81 (oitenta e um) dias, sendo que mesmo assim o Supremo Tribunal Federal, ao invés de criar

um novo parâmetro frente a legislação em rigor e a falta de previsão legal estabelecendo um

prazo, utiliza-se de lei velha para decidir o direito de liberdade do cidadão, portanto,

decidindo de forma ilegal e injusta.

Como se não bastasse a afronta a determinados princípios constitucionais através dos

julgados do Supremo Tribunal Federal, este, em determinados casos não tão complexos como

citados em outros, inesperadamente o Supremo decide conforme a Carta Magna prevê, como

se pode observar abaixo:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. CORRUPÇÃO ATIVA. CONVERSÃO DE HC PREVENTIVO EM LIBERATÓRIO E EXCEÇÃO À SÚMULA 691/STF. PRISÃO TEMPORÁRIA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA DA PRISÃO PREVENTIVA. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL PARA VIABILIZAR A INSTAURAÇÃO DA AÇÃO PENAL. GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL FUNDADA NA SITUAÇÃO ECONÔMICA DO PACIENTE. PRESERVAÇÃO DA ORDEM ECONÔMICA. QUEBRA DA IGUALDADE (ARTIGO 5º, CAPUT E INCISO I DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA DA PRISÃO PREVENTIVA. PRISÃO CAUTELAR COMO ANTECIPAÇÃO DA PENA. INCONSTITUCIONALIDADE. PRESUNÇÃO DE NÃO CULPABILIDADE (ARTIGO 5º, LVII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ESTADO DE DIREITO E DIREITO DE DEFESA. COMBATE À CRIMINALIDADE NO ESTADO DE DIREITO. ÉTICA JUDICIAL, NEUTRALIDADE, INDEPENDÊNCIA E IMPARCIALIDADE DO JUIZ. AFRONTA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS CONSAGRADAS NO ARTIGO 5º, INCISOS XI, XII E XLV DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIREITO, DO ACUSADO, DE PERMANECER CALADO (ARTIGO 5º, LXIII DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). CONVERSÃO DE HABEAS CORPUS PREVENTIVO EM HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. (STF.

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Tribunal Pleno. HC 95009/SP. Relator: Ministro Eros Grau. Julgado em 06/11/2008) (Grifou-se)

Como visto, a “prisão cautelar como antecipação da pena” é considerada

inconstitucional, neste específico caso, pelo Supremo Tribunal Federal, pois a Constituição

Federal estabelece a “presunção de não culpabilidade”, garantindo assim o “Estado de Direito

e Direito de Defesa” do acusado.

Já o Superior Tribunal de Justiça passou a julgar de forma mais garantista a questão do

prazo da prisão preventiva, como nota-se abaixo:

Prisão preventiva (imposição). Testemunhas (ameaça). Decreto (falta de fundamentação). Prazo (excesso). Revogação (caso). 1. O despacho (ou a decisão) que decreta a prisão há de estar suficientemente fundamentado (Cód. de Pr. Penal, art. 315). A preventiva há sempre de vir apoiada em, bons elementos de convicção – elementos certos, determinados, concretos –, sob pena de ser havido o decreto por não fundamentado. 2. A existência de testemunhas sigilosas e de temor reverencial em relação aos acusados, também de receio quanto à integridade daqueles que prestaram depoimento, por si sós, não justificam a imposição de prisão preventiva. 3. Por ser medida de índole excepcional – liberdade é regra, prisão é exceção –, a prisão antes do trânsito em julgado deve vir, sempre e sempre, baseada em fundamentação concreta, e não em meras suposições ou conjecturas. 4. Ademais, sem dúvida que a coação é ilegal quando alguém está preso por mais tempo do que determina a lei, mormente se a prisão cautelar já perdura por mais de duzentos dias, ainda que se trate de crime cometido com violência. 5. Ordem de habeas corpus concedida. (STJ. Sexta Turma. HC nº 115040/SP - HABEAS CORPUS nº 2008/0197930-1. Relator: Ministro Nilson Naves. Julgado em 26/05/2009) (Grifou-se)

O acórdão acima demonstra que os ministros ao observarem que o acusado preso

preventivamente teve sua liberdade subtraída por mais de 200 (duzentos) dias e que este fato,

independente da gravidade do crime que é imputado ao acusado, é o suficiente para

caracterizar o constrangimento ilegal e por sua vez a necessidade de colocar em liberdade o

acusado, tomaram uma decisão pautada nos preceitos constitucionais.

Ainda decidindo sobre o excesso de prazo:

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. FURTO SIMPLES. PRISÃO EM FLAGRANTE EM 30.08.06. LIBERDADE PROVISÓRIA CONCEDIDA. RÉU QUE EMPREENDEU FUGA, NÃO COMPARECENDO À AUDIÊNCIA DE INTERROGATÓRIO. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA. RETORNO AO CÁRCERE EM 08.08.07. EXCESSO DE PRAZO CONFIGURADO (1 ANO E 6 MESES). NÃO OBSTANTE A INCLUSÃO DO PROCESSO NO MUTIRÃO, ATÉ A PRESENTE DATA NÃO FOI SEQUER REALIZADA A AUDIÊNCIA DE INTERROGATÓRIO. AUSÊNCIA DE COMPLEXIDADE DO FEITO.

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MOROSIDADE QUE NÃO PODE SER IMPUTADA À DEFESA. PROCESSO SEM ANDAMENTO DESDE 21.05.08. PARECER MINISTERIAL PELA CONCESSÃO DO WRIT. ORDEM CONCEDIDA PARA DETERMINAR A EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA EM FAVOR DO PACIENTE, SE POR OUTRO MOTIVO NÃO ESTIVER PRESO. (STJ. QuintaTurma. HC nº 113846/PI - HABEAS CORPUS nº2008/0183468-2. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 19/02/2009) (Grifou-se)

Mais uma vez nota-se que o Superior tribunal de Justiça entende que a celeridade

processual é de responsabilidade do Estado, não podendo o acusado preso preventivamente

sofrer com a falta de sua liberdade pelo fato que o Estado não julga o seu caso com brevidade.

Sobre o prazo de 81 (oitenta e um) dias o Superior tribunal de Justiça decidiu:

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO, FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO, DESTRUIÇÃO, SUBTRAÇÃO OU OCULTAÇÃO DE CADÁVER, FORMAÇÃO DE QUADRILHA ARMADA. PRISÃO PREVENTIVA EM 25.10.2006. FUNDAMENTAÇÃO. MATÉRIA NÃO SUBMETIDA À APRECIAÇÃO DO TRIBUNAL A QUO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. EXCESSO DE PRAZO JUSTIFICADO. COMPLEXIDADE DO FEITO. MANOBRAS PROTELATÓRIAS POR PARTE DA DEFESA. PLURALIDADE DE RÉUS (5 PESSOAS). PARECER MINISTERIAL PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, DENEGADA. [...] 3. O período de 81 dias, fruto de construção doutrinária e jurisprudencial, não deve ser entendido como prazo peremptório, eis que subsiste apenas como referencial para verificação do excesso, de sorte que sua superação não implica necessariamente um constrangimento ilegal, podendo ser excedido com base em um juízo de razoabilidade. 4. Na hipótese, o alongamento da instrução criminal (2 anos e 3 meses) pode ser atribuído, entre outras causas, à complexidade da causa, bem como à pluralidade de réus (5 pessoas). Informou o Juiz de primeiro grau que as manobras protelatórias da defesa e a complexidade da prova, requerida de forma independente para cada denunciado, também têm contribuído para a maior demora na finalização da instrução criminal. (STJ. Quinta Turma. HC nº 117958/BA - HABEAS CORPUS nº 2008/0222737-2. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 10/02/2009) (Grifou-se)

Para o Superior Tribunal de Justiça o prazo de 81 (oitenta e um) dias deve ser utilizado

“apenas como referencial para verificação do excesso” de prazo, no entanto, a extensão da

prisão provisória a este prazo “não implica necessariamente um constrangimento ilegal,

podendo ser excedido com base em um juízo de razoabilidade”. É caso para a extensão do

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referido prazo é quando a defesa do acusado utiliza-se de artifícios para fazer com que demore

certos atos processuais, ou também a complexidade da provas obtidas no processo.

Corroborando com este entendimento segue mais um acórdão proferido pelo Superior

Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. ROUBO CIRCUNSTANCIADO E LATROCÍNIO TENTADO. PRISÃO EM FLAGRANTE EM 11.10.07. PRISÃO EM FLAGRANTE. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. NECESSIDADE DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PERICULOSIDADE DO PACIENTE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. EXCESSO DE PRAZO JUSTIFICADO (1 ANO E 2 MESES). COMPLEXIDADE DO PROCESSO. PLURALIDADE DE RÉUS. NECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DE CARTAS PRECATÓRIAS PARA INTERROGATÓRIO DOS RÉUS E DE REDESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA. REGULAR ANDAMENTO DO PROCESSO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. PARECER MINISTERIAL PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM DENEGADA. 3. As condições subjetivas favoráveis do paciente, por si sós, não obstam a segregação cautelar, quando preenchidos seus pressupostos legais, segundo reiterativa orientação jurisprudencial. 4. A concessão de Habeas Corpus em razão da configuração de excesso de prazo é medida de todo excepcional, somente admitida nos casos em que a dilação (A) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela acusação; (B) resulte da inércia do próprio aparato judicial, em obediência ao princípio da razoável duração do processo, previsto no art. 5o., LXXVIII da Constituição Federal; ou (C) implique em ofensa ao princípio da razoabilidade. 5. O período de 81 dias, fruto de construção doutrinária e jurisprudencial, não deve ser entendido como prazo peremptório, eis que subsiste apenas como referencial para verificação do excesso, de sorte que sua superação não implica necessariamente em constrangimento ilegal, podendo ser excedido com base em um juízo de razoabilidade. 6. Neste caso, a demora para conclusão da instrução criminal (1 ano e 2 meses), apesar de manifesta, é plenamente justificável pela complexidade do feito e, especialmente, em razão da necessidade de expedição de cartas precatórias para o interrogatório dos réus. Ademais, o processo encontra-se em regular andamento, pelo que não se pode, portanto, constatar qualquer desídia por parte do Juízo processante, sendo que eventual demora decorreu também da necessidade de redesignação da audiência de interrogatório, em razão da transferência do paciente de unidade prisional. 7. Ordem denegada, em conformidade com o parecer ministerial. (STJ. Quinta Turma. HC nº 106671/SP - HABEAS CORPUS nº 2008/0107847-0. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 18/12/2008) (Grifou-se)

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Por fim, passa-se a expor casos onde os acusados presos provisoriamente tiveram seus

habeas corpus concedidos diante do nítido excesso de prazo:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO, SEQUESTRO E OCULTAÇÃO DE CADÁVER. PRISÃO PREVENTIVA. RELAXAMENTO POR EXCESSO DE PRAZO NA INSTRUÇÃO CRIMINAL. AUDIÊNCIAS REDESIGNADAS. RÉU PRESO HÁ MAIS DE UM ANO. SEM PREVISÃO DE TÉRMINO DA INSTRUÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. CORRÉUS EM IDÊNTICA SITUAÇÃO. EXTENSÃO DOS EFEITOS DO WRIT (ART. 580 DO CPP). 1. Verificado que a primeira audiência de instrução foi por duas vezes adiada, sem culpa do paciente, o qual se encontra custodiado há mais de um ano sem previsão de término para a instrução criminal, fica configurado o excesso de prazo para a formação da culpa. 2. Ordem concedida. 3. Observada a existência de corréus em idêntica situação, é necessária a extensão dos efeitos do julgado, nos moldes do art. 580 do Código de Processo Penal. (STJ. Sexta Turma. HC nº HC 132928/SE - HABEAS CORPUS nº 2009/0062119-3. Relator: Ministro Celso Limongi. Julgado em 24/08/2009) (Grifou-se) PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. QUADRILHA OU BANDO ARMADO. (1) AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. FALTA DE JUSTA CAUSA. INVIABILIDADE. (2) PRISÃO PREVENTIVA. RISCO PARA A ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA. SOFISTICADO GRUPO ARMADO. ESPECIALIZADO EM EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. CONSTRANGIMENTO. AUSÊNCIA. (2) EXCESSO DE PRAZO. PRÉVIA ORDEM JULGADA EM 2008. DILAÇÃO AINDA DENTRO DO RAZOÁVEL. ILEGALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. (3) DILAÇÃO TEMPORAL SUBSEQÜENTE. RAZOABILIDADE. AUSÊNCIA. PRISÃO PROCESSUAL POR MAIS DE 2 ANOS E 3 MESES. INSTRUÇÃO AINDA EM CURSO. CONSTRANGIMENTO. OCORRÊNCIA. 1. A ação penal pelo crime de quadrilha não se ressente de falta de justa causa, pois, apesar de não ter sido o paciente denunciado pelas infrações penais planejadas pelo bando, tem-se a narrativa de sua contribuição para o concerto sceleris. Pontue-se que o delito do art. 288 do CP compõe-se de comportamento típico autônomo, que não depende, portanto, do advento da prática das ações idealizadas. 2. De acordo com jurisprudência desta Casa de Justiça, a gravidade concreta da imputação enseja o risco para a ordem pública, justificando a prisão cautelar. 3. Não se apura irregularidade em acórdão de prévia ordem, que teve por razoável a demora na conclusão da instrução criminal. Todavia, com a superveniência de dilação temporal, para a qual não concorreu a Defesa, sendo o atraso - ensejador de prisão processual que se arrasta por mais de 2 anos e 3 meses com a instrução ainda em curso - creditado claramente à Administração, de rigor é o relaxamento da segregação. 4. Ordem concedida para o fim de relaxar a prisão do paciente na ação penal n. 493/2007, em curso na Vara Única da Comarca de Serrana/SP, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo. (STJ. Sexta Turma. HC nº 122617 SP- HABEAS CORPUS nº 2008/0268086-7. Relator: Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Julgado em 18/08/2009) (Grifou-se)

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PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ESTUPRO. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO CONFIGURADO. RÉU PRESO HÁ MAIS DE 6 ANOS, SENDO O INTERROGATÓRIO O ÚLTIMO ATO PROCESSUAL REALIZADO. ILEGALIDADE FLAGRANTE. ORDEM CONCEDIDA. 1. A dificuldade de recambiamento não pode convalidar a ilegalidade da manutenção de réu encarcerado há mais de 6 anos, sem que tenha sido ao menos apresentada a defesa prévia. 2. Ordem concedida para determinar a expedição do alvará de soltura em favor do paciente, caso não se encontre preso por outro motivo. (STJ. Quinta Turma. HC 129079 / PE – HC 2009/0030213-7. Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima. Julgado em 16/06/2009) (Grifou-se)

Nota-se que nesses três últimos acórdãos do Superior Tribunal de Justiça o

desrespeito, sanado pela corte citada, de cidadãos privados de sua liberdade por prazos

exorbitantes.

3.3 A necessidade da criação de um prazo razoável e garantista pelo ordenamento

jurídico brasileiro

Vislumbrando a necessidade de se criar um prazo razoável para a prisão preventiva no

Brasil, passa-se a analisar e a criticar esta modalidade de prisão, bem como a questionar a

atual concepção inserida na prática dos tribunais brasileiros a respeito desse tema e a sugestão

de possíveis solução a serem dadas para esta problemática jurídica.

LUIGI FERRAJOLI (2006, p. 716) critica severamente a prisão preventiva, e por sua

vez o excesso de prazo dado a esta, onde escreve que o cárcere preventivo tem duas funções,

uma delas a antecipação da pena a outra é a transformação do processo em caráter

inquisitório.

A antecipação da pena é facilmente observada, (FERRAJOLI, 2006, p. 716), pois

antes mesmo de iniciar-se o processo de instrução processual o suspeito de praticar

determinado crime pode ser privado de sua liberdade por decisão judicial fundamentada em

indícios de autoria, materialidade do crime, e alguma presunção deste colocar em risco a

efetividade do processo penal, como bem recrimina FERRAJOLI, “primeiro se pune, e,

depois se processa, ou melhor, se pune processando” (2006, p. 716). Ora, se nem mesmo

resta-se provada a autoria do crime, como o suspeito pode sofrer consequências de um

apenado? Esta pergunta, por si só, remete ao entendimento da antecipação da pena de forma

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muito ainda mais gravosa, uma vez que os homens civilizados escolheram como meio para a

solução de conflitos sociais a justiça, a qual é composta por um processo e por sua fez por

uma sentença judicial.

Já a transformação do processo acusatório, como bem explana FERRAJOLI (2006, p.

717), em um processo com caráter inquisitório fica evidente ao se perceber que “de forma

cada vez mais comum a captura é ordenada, e sobretudo mantida, para constranger o

imputado a confessar ou a colaborar”. Como considera o autor citado, a prisão preventiva tem

característica “policialesca”, pois através da força, de sofrimentos, e de todas as

consequências e fragilidades que trazem ao acusado a sua perda de liberdade preventivamente

o judiciário tenta fazer este confessar. Essa transformação de processo pode ser facilmente

percebida com as definições dadas por FERNANDO CAPEZ (2007, p. 45), onde distingue o

processo penal acusatório e inquisitório, lecionando que o sistema acusatório consiste em um

processo de caráter público, onde é dado ao acusado uma série de direitos e garantias, tais

como o direito ao contraditório, da imparcialidade do órgão julgador, da presunção de

inocência, da tutela jurisdicional, da ampla defesa, sendo que neste tipo de processo “há

distribuição das funções de acusar, defender e julgar a órgãos distintos”, não devendo assim o

imputado ser processado e julgado num processo com caráter sigiloso, onde o imputado é

desprovido do direito ao contraditório, reunindo “na mesma pessoa as funções de acusar,

defender e julgar”, como é percebido no processo penal inquisitório. Caso o imputado não

seja julgado num processo tipicamente inquisitório o mesmo será visto como um “mero

objeto da persecução, motivo pelo qual práticas como a tortura eram frequentemente

admitidas como meio para se obter a prova-mãe: a confissão.”

Como a ordem legal brasileira admite apenas o processo penal acusatório, garantindo

ao imputado uma coleção de direitos e garantias individuais, não se pode admitir a

prolongação de um cárcere que não possui justificativas que ultrapassem as defendidas pela

teoria do garantismo20, definido brevemente por FERRAJOLI (2006, p. 785) na ideia do

20 “ ‘garantismo’ designa um modelo normativo de direito: precisamente, no que diz respeito ao direito penal, o modelo de ‘estrita legalidade’ SG, próprio do Estado de direito, que sob o plano epistemológico se caracteriza como um sistema cognitivo ou de poder mínimo, sob o plano político se caracteriza como uma técnica de tutela idônea a minimizar a violência e a maximizar a liberdade e , sob o plano jurídico, como um sistema de vínculos impostos à função punitiva do Estado em garantia dos direitos dos cidadãos. É, consequentemente, ‘garantista’ todo sistema penal que se conforma normativamente com tal modelo e que satisfaz efetivamente.” (FERRAJOLI, 2006, p. 786) Ou ainda, “o garantismo coincide com a forma de tutela dos direitos vitais dos cidadãos que se realiza historicamente por meio da positivação no Estado de direito (...)” (FERRAJOLI, 2006, p. 800)

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Estado de direito, como modelo penal adotado por diversas Constituições com “um parâmetro

de racionalidade, de justiça e de legitimidade da intervenção punitiva”.

Portanto, ao saber que a Constituição brasileira recepciona este modelo penal

garantista, como pôde ser observado no capítulo 1, através da análise de diversos princípios

intrínsecos nesta, não se pode, como leciona FERRAJOLI (2006, p. 785), deixar de atender

estas garantidas contidas na Constituição e aplicar outros modelos contidos em legislações

infraconstitucionais, como é o caso da prisão preventiva, sob pena de infringir a Carta Magna

e sobre tudo o Estado de direito.

Objetivando sanar o problema que envolve este assunto tramita na Câmara dos

Deputados o Projeto de Lei da Câmara, n.º 4.208 de 2.001, o qual busca regulamentar a prisão

preventiva, entre outros ditames processuais penais, onde entre as principais propostas de

alteração do Código de Processo Penal brasileiro está: a obrigação do magistrado ou Tribunal

de reexaminar a continuidade da prisão preventiva a cada 60 (sessenta) dias no mínimo e

analisar se persistem as características que autorizam a segregação cautelar (artigo 282, §

7º21); estipula que a prisão preventiva só será decretada nos crimes dolosos punidos com pena

privativa de liberdade superior a 4 (quatro) anos ou se houver reincidência em crime doloso

ou ainda se o crime praticado envolver violência doméstica e familiar contra mulher, criança,

adolescente, idoso enfermo ou pessoa com deficiência (artigo 31322).

Caso sejam, ao final da tramitação, aprovados estes dispositivos, o Brasil passará a ter

recepcionado em seu ordenamento jurídico uma importante delimitação processual, onde o

imputado preso preventivamente não poderá ficar nesta condição por tempo superior ao

21 Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: [...] 7º O juiz ou tribunal que decretou ou manteve a medida cautelar, inclusive a prisão preventiva, a reexaminará, obrigatoriamente, a cada 60 (sessenta) dias, ou em prazo menor quando situação excepcional assim o exigir para, fundamentadamente, avaliar se persistem os motivos que a ensejaram. (NR) Redação proposta através do Projeto de Lei da Câmara, n.º 4.208 de 2.001. 22 Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal; III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; IV - (revogado). Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. (NR) Redação proposta através do Projeto de Lei da Câmara, n.º 4.208 de 2.001.

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previsto em lei. Também com essa nova legislação os requisitos da prisão preventiva ficam

mais específicos e faz ainda com que os juízos devam reexaminar a prisão cautelar

periodicamente. Com toda certeza, se aprovado o Projeto de Lei da Câmara, n.º 4.208 de

2.001, os direitos individuais do cidadão brasileiros estarão mais protegidos.

Porém, o mesmo Projeto de Lei, após passar pelo Senado, deixou de recepcionar a

possibilidade do haver no Código de Processo Penal brasileiro um prazo máximo para a da

prisão preventiva, o qual seria segundo a inicial redação do Projeto de Lei, o prazo máximo de

180 (cento e oitenta) dias para cada grau de jurisdição (previsto no extinto artigo 315-A),

sendo uma perda significativa para a legitimação da prisão provisória.

Ainda, o legislador furtou-se ao esquecer de legislar no sentido de prever

consequências significantes ao processo que tiver um imputado preso por tempo superior ao

previsto em lei.

Uma sugestão de consequência é que se o acusado for privado de sua liberdade por

tempo excedente ao previsto em lei poderia ter extinta sua punibilidade.

Por fim, outros critérios poderiam ser adotados para fixar o limite da prisão provisória,

como por exemplo, autorizar a prisão preventiva apenas em crimes dolosos e muito gravosos,

sendo que o prazo de segregação da liberdade do indivíduo não poderia ultrapassar ao mínimo

legal previsto para o crime, em tese, praticado ou sua pena-base.

O que se tem certeza é que diante dos atuais julgamentos proferidos pelo Supremo

Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça a teoria de adoção de um prazo razoável

não está sendo adotada, pois não utilizam fundamento concretos para justificar a protelação

do prazo da prisão preventiva, e sim utilizam-se de justificativas subjetivas tais como a

“complexidade do caso”, deixando o imputado vexatoriamente, por decisão arbitraria, cumprir

uma sanção antes mesmo do fim do processo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante todo este trabalho acadêmico foi possível concluir que na ausência de lei

reguladora do prazo da prisão preventiva os Tribunais maiores do país, Supremo Tribunal

Federal e Superior Tribunal de Justiça julgam que o prazo normal de duração do cárcere

preventivo é de 81 (oitenta e um) dias, prazo este fruto de uma construção doutrinária baseada

na duração da instrução criminal. Também foi exposto que os mesmos tribunais, em casos que

consideram complexo, pela quantidade de réus envolvidos ou pela matéria discutida,

permitem a prolongação do prazo de 81 (oitenta e um) dias para meses ou até mesmo anos,

onde justificam tais decisões recorrendo ao princípio da razoabilidade, o qual fica nítido o seu

mau uso, e esquecendo-se do princípio da presunção de inocência, consagrado em nossa

constituição como garantidor da liberdade do indivíduo.

Para confrontar os fundamentos das decisões dos Tribunais superiores brasileiro, foi

analisado no primeiro capítulo deste trabalho a supremacia constitucional como sendo

formadora de diretrizes e limites para as demais normas.

A Constituição Federal deve ser entendida como o conjunto de normas positivadas que

amoldem o entendimento jurídico do Estado, utilizando-se para tanto de princípios relevantes,

que garantem direitos fundamentais a todos os cidadãos, remetendo-se assim a um Estado

Democrático de Direito.

Tratando-se de processo penal, a principal contribuição da Constituição são os limites

impostos ao Estado, sobretudo garantindo a liberdade individual de cada cidadão. Para isso se

fez necessário trazer a este trabalho uma explanação do princípio da presunção de inocência, o

qual garante que todo cidadão brasileiro só poderá ser considerado culpado de um crime com

o transito e julgado da sentença condenatória, tendo assim protegida sua liberdade individual

de possíveis abusos do Estado.

Como as decisões utilizadas pelos tribunais utilizam a razoabilidade ou

proporcionalidade como justificativa para estender a prisão cautelar em determinados casos,

também foi abordado estes princípio em uma mesma essência, sendo especificado através

desta o verdadeiro objeto de aplicabilidade destes.

O Princípio da Razoabilidade ou Proporcionalidade, numa visão paritária, pode ser

entendido como a adequação do direito material com o direito formal, no caso da prisão

preventiva seria a adequação entre a sanção e o direito de punir do Estado com o direito de

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liberdade do indivíduo, tendo como problema definir a medida máxima e mínima para tal

caso.

Assim sendo, os princípios constitucionais da presunção de inocência e da

proporcionalidade ou razoabilidade limitar ao máximo a possibilidade da medida cautelar,

para que a prisão cautelar não deixe de ser uma medida de urgência processual e passe a ser

uma forma de condenação antecipada do acusado.

Num segundo momento passou-se a explicar a origem e características das prisões

cautelares, com destaque para a prisão preventiva, onda foi apresentada a construção do prazo

de 81 (oitenta e um) dias para o fim da prisão provisória, bem como foi debatido a sua

inaplicabilidade frente aos atuais ordenamentos jurídicos que regulam a instrução processual.

Por fim, foram apresentados entendimentos internacionais sobre o prazo da prisão

preventiva, além de decisões proferidas pelo pleno das mais altas cortes do país. Ainda foi

apresentado o projeto de lei complementar em tramite na Câmara dos Deputados, o qual trará

uma série de melhores para os defensores do garantismo processual penal, pois delimita o

poder segregar cautelarmente do Estado. Notou-se também que infelizmente, se aprovado este

projeto de lei, o mesmo não recepcionará um prazo fixo para a duração da prisão preventiva.

Como exposto, o tema escolhido para a realização desta pesquisa acadêmica foi

inspirada na inobservância do princípio de presunção de inocência por parte dos mais

respeitados tribunais do nosso país, onde estes autorizam a decretação de prisão preventiva de

forma banal, sem delimitações, sem utilizarem os Direitos e Garantias Fundamentais

estipulados em lei constitucional, esquecendo que assim violam o direito de ir e vir de um

cidadão, o qual tem o direito, ser for acusado formalmente de algum crime, de receber o

devido processo legal, podendo ser considerado culpado somente ao final de toda instrução

processual, com o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Cabe ressaltar que muitos dos cidadãos presos preventivamente no final da instrução

processual são considerados inocentes, justamente pela má utilização da legislação pelos

tribunais, sendo que esses ficam na condição de preso por períodos exorbitantes, tendo assim

um julgamento antecipado, feito de forma arbitraria, pois não há embasamento legal que

justifique tal ato tomado pelo Estado, sendo fundamentado apenas na livre convicção dos

magistrados.

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