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ANÁLISE DO MAPEAMENTO DO FLUXO DE VALOR NA IDENTIFICAÇÃO DE DESPERDÍCIOS NA LOGÍSTICA INTERNA: UM ESTUDO DE CASO NA INDÚSTRIA TÊXTIL Fabricio Eduardo Henriques (UFSC) [email protected] Antonio Jose dos Santos (IST/SOCIESC) [email protected] Marcelo Macedo (IST/SOCIESC) [email protected] Este artigo visa mostrar os passos executados para idealizar o estado futuro de um processo, utilizando, para isso, um Mapa de Fluxo de Valor. Trata-se de um estudo de caso, desenvolvido em uma empresa de grande porte que fabrica artigos dee vestuário. A oportunidade de melhoria foi identificada, selecionando um sistema de logística interna e aplicando os conceitos de Lean Manufacturing. O presente artigo ratifica a eficiência da aplicação da ferramenta Mapa de Fluxo de Valor, com a ilustrativa de uma empresa do ramo têxtil localizada em Santa Catarina. A confecção dos mapas do estado atual e futuro pode auxiliar na eliminação de desperdícios, reduzir o lead time do setor estudado de 162,5 para 77,7 horas e reduzir também os níveis de estoques de materiais. A execução das propostas de melhoria contidas neste artigo já estão em andamento, auferindo melhores resultados no nível de serviço do setor estudado. Palavras-chaves: Mentalidade Enxuta, Manufatura Enxuta, Mapa de Fluxo de Valor XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

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ANÁLISE DO MAPEAMENTO DO FLUXO

DE VALOR NA IDENTIFICAÇÃO DE

DESPERDÍCIOS NA LOGÍSTICA

INTERNA: UM ESTUDO DE CASO NA

INDÚSTRIA TÊXTIL

Fabricio Eduardo Henriques (UFSC)

[email protected]

Antonio Jose dos Santos (IST/SOCIESC)

[email protected]

Marcelo Macedo (IST/SOCIESC)

[email protected]

Este artigo visa mostrar os passos executados para idealizar o estado

futuro de um processo, utilizando, para isso, um Mapa de Fluxo de Valor.

Trata-se de um estudo de caso, desenvolvido em uma empresa de grande

porte que fabrica artigos dee vestuário. A oportunidade de melhoria foi

identificada, selecionando um sistema de logística interna e aplicando os

conceitos de Lean Manufacturing. O presente artigo ratifica a eficiência

da aplicação da ferramenta Mapa de Fluxo de Valor, com a ilustrativa de

uma empresa do ramo têxtil localizada em Santa Catarina. A confecção

dos mapas do estado atual e futuro pode auxiliar na eliminação de

desperdícios, reduzir o lead time do setor estudado de 162,5 para 77,7

horas e reduzir também os níveis de estoques de materiais. A execução das

propostas de melhoria contidas neste artigo já estão em andamento,

auferindo melhores resultados no nível de serviço do setor estudado.

Palavras-chaves: Mentalidade Enxuta, Manufatura Enxuta, Mapa de

Fluxo de Valor

XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção

Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

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1.1

1. Introdução

Os desdobramentos de princípios fundamentais da administração de Taylor e Ford

evoluíram para um sistema de produção que é tido na atualidade como referência em qualidade,

flexibilidade e produtividade, capaz de competir com preços devido a sua sistemática de redução

de desperdícios. Trata-se da Mentalidade Enxuta, surgida no Japão, na fábrica da Toyota, que é

uma filosofia de manufatura que segundo Liker (1997), “encurta o tempo entre pedido do cliente

e a entrega, através da eliminação de desperdícios”.

A identificação e a mitigação de fatores de desperdício (de tempo, de atividades

desnecessárias, de retrabalhos, etc.) no processo de logística interna podem reduzir o lead time

deste processo, podendo trazer uma vantagem competitiva para uma organização. O mapeamento

do fluxo de valor é uma ferramenta que poderia operacionalizar esta análise, pela identificação

das atividades que agregam e que não agregam valor ao processo. Nesse sentido, o objetivo

principal deste trabalho é investigar se a aplicação do mapeamento do fluxo de valor, uma

ferramenta da filosofia lean, no processo de separação e distribuição de malhas e tecidos para o

setor de corte de uma empresa, permite identificar os desperdícios inerentes ao processo e propor

melhorias no sentido de mitigá-los, proporcionando uma redução no lead time.

Para se atingir esse objetivo foi realizada inicialmente uma revisão de literatura de cunho

exploratório para identificar as variáveis pertinentes e levantar os principais desperdícios

inerentes ao setor logístico, assim como as ferramentas que poderiam apoiar sua redução ou

eliminação. Posteriormente, foi realizado um estudo de caso em uma empresa nacional de grande

porte para a análise da aplicação do mapeamento do fluxo de valor em processos de logística

interna. Para a coleta de dados, foram utilizadas as técnicas de entrevista, análise de documentos

e observação direta dos processos.

2. Lean Manufacturing

O conceito de mentalidade enxuta introduzido por Womack e Jones (2004) visando

descrever uma filosofia de trabalho e algumas das práticas adotadas pela indústria automobilística

japonesa, trata de uma abordagem para a melhoria contínua dos processos, objetivando a

eliminação de todo o tipo de desperdício e atividades que não agregam valor. No âmbito dos

sistemas produtivos, Taiichi Ohno (1997) percebeu e relatou sete tipos de desperdícios, conforme

mostra o quadro 1:

Desperdício Descrição

Super produção Produzir mais do que o cliente necessita em dado momento.

Esperas Tempo ocioso porque materiais, pessoas, equipamentos ou

informações não estão prontos.

Defeitos de qualidade Trabalho que contém erros, retrabalho, enganos ou falta de

alguma coisa necessária.

Inventários desnecessários Mais materiais, peças ou produtos disponíveis do que o

cliente necessita em dado momento.

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Processamento

inapropriado

Esforço que não agrega valor sob o ponto de vista do

cliente.

Transporte excessivo Movimentação de produtos, que não agrega valor.

Movimentação excessiva Movimentação de pessoas, que não agrega valor.

Quadro 1 – Tipos de desperdício (adaptado de Ohno, 1997)

Nos processos produtivos, muitas das atividades desenvolvidas têm um caráter mais

administrativo. A gestão da logística interna de uma organização industrial, por exemplo, carrega

consigo muito processamento de cunho mais administrativo. Com esse enfoque, Werkema (2006)

relaciona alguns exemplos de desperdícios gerados em áreas administrativas e de prestação de

serviços, conforme mostra o quadro 2.

Tipo de desperdício Exemplos

Defeitos Erros em faturas, pedidos, cotações de compra de materiais.

Excesso de produção Processamento e/ou impressão de documentos antes do

necessário, aquisição antecipada de materiais.

Estoques Material de escritório, catálogos de vendas, relatórios.

Processamento

desnecessário

Relatórios não necessários ou em excesso, cópias adicionais

de documentos, reentrada de dados.

Movimento desnecessário Caminhadas até o fax, copiadora, almoxarifado.

Transporte desnecessário Anexos de e-mails em excesso, aprovações múltiplas de um

documento.

Espera Sistema fora do ar ou lento, ramal ocupado, demora na

aprovação de um documento.

Quadro 2 – Exemplos de desperdícios (WERKEMA, 2006)

2.1 Ferramentas do Lean Manufacturing

Os próximos parágrafos irão apresentar e descrever, de forma sucinta, cada uma das

seguintes ferramentas da abordagem lean: mapa de fluxo de valor, métricas lean, kaizen, kanban,

padronização, 5S, gestão visual, redução de setup, TPM e pokayoke.

Rother e Shook (2003) desenvolveram uma ferramenta denominada mapa de fluxo de valor,

usada para mapear os fluxos de todos os materiais e de informações de processos de manufatura.

Esta explicita o propósito de localizar os fluxos de materiais e informações dentro do processo

produtivo e a necessidade de analisar esses fluxos em uma perspectiva presente/futura na busca

de eliminação de desperdícios.

As métricas lean buscam quantificar como os resultados da organização podem ser

classificados, no que diz respeito à velocidade e eficiência (WERKEMA, 2006). Essas medidas

devem ser utilizadas para a identificação de metas na condução de ações lean e para o

monitoramento da evolução dos resultados alcançados. Podem ser citados como exemplos de

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métricas lean: o tempo de ciclo, o lead time, o tempo de troca e o tempo takt (tempo que dita o

ritmo da produção em função da demanda do cliente).

Womack e Jones (2004), definem kaizen como um processo de melhoria contínua e

incremental, que deve ser implementado com o objetivo de criar mais valor e menos

desperdícios. O resultado da introdução de kaizen nos processos pode ser acompanhado pelo

monitoramento das métricas lean.

Conforme Lage Junior e Godinho Filho (2008), o kanban é um subsistema do sistema Toyota

de produção usado para controlar os estoques em processo, a produção e o suprimento de

componentes e, em determinados casos, de matérias-primas.

No âmbito do lean manufacturing, a criação de procedimentos padronizados para o trabalho

dos operadores de um processo produtivo é baseada no tempo takt, na sequência das tarefas

executadas por um operador dentro do tempo takt e no estoque padrão exigido para a operação do

processo (WERKEMA, 2006).

O 5S é uma metodologia para organizar, limpar, desenvolver e sustentar um ambiente de

trabalho produtivo. Ela representa cinco termos relacionados, cada um iniciado com a letra S, que

descrevem práticas no local de trabalho úteis para controles visuais e produção enxuta. Essas

cinco práticas de senso de utilização, senso de ordenação, senso de limpeza, senso de

padronização e senso de disciplina são executadas sistematicamente para alcançar sistemas de

produção enxuta (KRAJEWSKI, 2009).

De acordo com o Lean Enterprise Institute (2003), gestão visual é a colocação em local fácil

de ver de todas as ferramentas, peças, atividades de produção e indicadores de desempenho do

sistema de produção, de modo que a situação do sistema possa ser entendida rapidamente por

todos os envolvidos. Werkema (2006) afirma que o 5S e a Padronização representam as bases

para a implementação da gestão visual.

Segundo Conceição et al (2009), a redução do setup é uma ferramenta que visa reduzir

exclusivamente o tempo de parada da linha de produção para a troca de produto. Para os autores,

os principais fatores motivadores e vantagens alcançadas com essa redução são: a possibilidade

de produção de pequenos lotes, a redução do lead time (tempo de resposta), a viabilidade de

redução de estoques, o aumento da qualidade, a redução de desperdício e retrabalho, o aumento

da flexibilidade, o aumento de produtividade, a conscientização das causas que geram erros e

espera e o aumento da disponibilidade dos equipamentos.

O TPM – Total Productive Maintenance (Manutenção Produtiva Total) é um conjunto de

procedimentos que têm como objetivo garantir que os equipamentos de um processo produtivo

sejam sempre capazes de executar as tarefas necessárias de modo a não interromper a produção.

Para que o TPM seja efetivo, deve haver o envolvimento direto de todas as pessoas que operam

os processos (WERKEMA, 2006).

PokaYoke é um dispositivo ou procedimento empregado para prevenir defeitos. Segundo

Shingo (1996), defeitos surgem porque erros são cometidos; os dois têm uma relação de causa e

efeito, contudo, erros não se tornarão defeitos se houver feedback e ação no momento do erro.

2.2 Mapeamento do Fluxo de Valor – MFV

O MFV é uma ferramenta qualitativa de produção enxuta amplamente usada com o objetivo

de eliminar desperdício (KRAJEWSKI, 2009). Seu funcionamento se dá sob a forma de coleta de

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dados, análise destes e propostas de melhorias. Com uma relação de informações sobre as

demandas dos clientes, fornecimento de matéria-prima, processos produtivos, tempos de ciclo,

setup de máquinas e estoques, além do número de pessoas envolvidas e a forma como os dados

fluem na empresa, desenha-se um mapa que contempla de forma esquemática e organizada esses

dados, o mapa do estado atual. A partir deste e tendo como mola mestra de todas as mudanças o

cliente, ou seja, a demanda, utilizam-se os princípios e as práticas da produção enxuta para se

trabalhar todo o fluxo de materiais e informação. As propostas são também desenhadas e

compõem o mapa do estado futuro, e podem requerer desde alterações na organização da

produção, como por exemplo, a criação de células de produção, até acordos com fornecedores

para suprimento de matéria-prima em prazos menores, que reduziriam os estoques iniciais.

Os MFV apresentam uma iconografia padrão (figura 1) que facilita a visualização do

processo atual e a comunicação das alterações a serem realizadas visando a introdução de

melhorias incrementais. As informações relacionadas com as métricas lean são dispostas no

mapa, em caixas de dados e ao longo do fluxo de materiais. Para o fluxo de informações também

são utilizadas simbologias próprias para esse tipo de ferramenta.

MONTAGEM

T/C = 40 seg.

TR =

2 Turnos

2% Refugo

Figura 1 – Ícones para mapas de fluxo de valor (adaptado de Rother e Shook, 2003)

3. Estudo de caso

A empresa selecionada para o estudo é uma empresa nacional de grande porte que fabrica

artigos de vestuário, e dentro da proposta do estudo, de analisar um serviço logístico interno foi

escolhido o setor de armazenagem de malhas e tecidos para aplicação dos conceitos estudados.

O setor escolhido para estudo, recebe, armazena e seleciona os mais diferentes rolos de

malha e tecido, enviando os rolos selecionados para o setor de corte, onde estes rolos passam por

uma análise de encaixe, e posteriormente são processados nas máquinas de corte. Os talhados são

então transportados e distribuídos pelo mizusumashi (carrinho que percorre uma determinada rota

I

N

FIFO

Transporte

Processo

Fontes

externas

Caixa de

dados

Estoque

Lote de

kanbans

Operador Movimento

sistema empurrado Movimento produção

acabada p/ o cliente

sistema empurrado

Kanbans de produção

e de retirada Retirada

Supermercado Estoque pulmão

ou de segurança

Posto de kanban Fluxo de

informação manual

e eletrônica O X O X

Nivelamento

de carga

Acúmulo de

informação

Fluxo

sequencial

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na fábrica distribuindo o material aos demais setores) aos processos de fabricação subsequentes,

que podem ser feitos internamente, por terceiros, ou em outras plantas no Estado ou até mesmo

na região nordeste do Brasil. Portanto, estes demais processos não serão detalhados no trabalho,

que se limitará a acompanhar as malhas até o final do processo de corte, por onde passam 100%

das peças produzidas no Brasil.

Pelos passos dos processos serem exatamente os mesmos não foi limitada a escolha por

uma única família de produtos, pois uma vez feito o mapeamento de uma família, este se aplicará

as outras, contudo, identificou-se a demanda para cada uma.

O processo produtivo inicia através do PCP Central que comunica as previsões com

horizonte de seis semanas aos fornecedores, liberando pedidos semanalmente. Os tecidos chegam

semanalmente de caminhão, e as malhas, que são produzidas internamente, são transportadas

através de empilhadeira diariamente. As Ordens de Produção semanais são enviadas aos

programadores setoriais contendo centenas de Ordens de Corte, para as quais, os programadores

selecionam os rolos a serem utilizados via sistema.

Ao concluir a seleção dos rolos via sistema para uma ordem de corte, a informação

contendo os pallets contenedores desses rolos é enviada aos operadores de empilhadeira que

movimentam os pallets da área de estoque para uma área de seleção de rolos.

Outro operador retira os rolos que foram selecionados, agrupando-os por ordem de corte

em outro pallet. Após a coleta de todos os rolos de uma ordem de corte o pallet é disponibilizado

ao processo seguinte, onde cada rolo é medido e posteriormente feita a chamada análise de

encaixe, que nada mais é que uma verificação via software, da disposição das peças a serem

produzidas, visando o melhor aproveitamento dos tecidos. Já analisados, os rolos são

encaminhados para as mesas de corte, que possuem diferentes máquinas para cada tipo de tecido,

sendo 4 para malhas, 1 para tecidos planos, 1 para malhas especiais e outra para listrados. Após

cortados, os tecidos são distribuídos aos processos seguintes. A figura 2 exemplifica o fluxo dos

processos através do desenho do layout do setor.

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Figura 2- Layout dos setores e fluxo dos processos.

Diante do exposto, foi elaborado o mapa do estado atual, para que fosse possível identificar

oportunidades de melhoria para os processos em análise, conforme mostra a figura 3. Uma vez

realizado este mapa, propôs-se, com base nos princípios enxutos, a redução dos desperdícios

identificados no estado atual e a elaboração de um mapa futuro com propostas de melhoria, como

pode ser visto na figura 4. Os tempos levantados nos mapas foram estimados levando-se em

consideração a experiência dos colaboradores, observação dos pesquisadores e coleta de dados

históricos. Cada caixa de processo é identificada com o número de operadores que executam a

atividade, o process time que um operador leva para executar a atividade ou tempo de valor

agregado (P/T), o lead time (LT), o número de turnos em que os operadores trabalham realizando

o processo, a quantidade em estoque (E) entre processos, e no primeiro processo ainda foi

adicionada a demanda de atendimento diário de 50.000 peças. Cada ordem de corte possui em

média 600 peças, totalizando pouco mais de 83 ordens que devem ser produzidas diariamente. No

processo de seleção foi identificado que as ordens são encaminhadas ao processo seguinte

somente quando o pallet contenedor estiver cheio de rolos, contendo em média cerca de 3 e 4

ordens de corte por pallet, podendo ainda contar com ordens de diferentes tipos de malha no

mesmo pallet. Adicionalmente, o mapa do estado atual mostra que o setor de corte possui 4

diferentes tipos de máquina, totalizando 7 máquinas, 4 para malhas, 1 para tecidos planos, 1 para

malhas especiais e 1 para listrados. A produção é empurrada em todas as etapas do processo de

fabricação. Para que uma ordem de corte seja concluída são necessárias 162,5h, das quais

somente em 3,8h realmente existe algum tipo de processamento.

A aplicação do mapeamento de fluxo de valor identificou desperdícios, principalmente,

dentro dos processos de programação e seleção dos rolos de tecido, com desalinhamento da

programação em relação à demanda e retrabalhos na seleção dos rolos e na separação de ordens

de corte.

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Figura 3- Mapa do Fluxo de Valor – Estado Atual.

Pontos importantes observados durante a construção do Mapa do Estado Atual:

- A demanda de liberação e atendimento de Ordens de Corte é feita de forma geral (produção

total da semana/ por dias da semana) e não é divida entre as 4 famílias existentes, ocasionando

em alguns momentos, excesso de ordens selecionadas para uma determinada família enquanto

não existe nenhuma ordem já selecionada para outra família.

- O processo de seleção agrupa rolo a rolo para uma determinada ordem de corte. Ao

completar um pallet contenedor com diversas ordens de corte, ele acaba misturando os rolos

novamente. Esse fato gera aumento do tempo de processo da tarefa seguinte (que por vezes

precisa abastecer uma máquina de corte de uma determinada família, tendo que buscar os rolos

que estão no fundo de um pallet coberto por diversos outros rolos), retrabalho, movimentação e

esforço físico extra, e por algumas vezes não permite que seja possível encontrar o rolo desejado

em tanto material em processo.

- Cada vez que uma máquina finaliza um processo de corte, o operador procura por outra

ordem de corte adequada à sua máquina, escolhendo aleatoriamente sem qualquer fila ou critério

de seleção.

A primeira etapa para construção do mapa do estado futuro é determinar o takt time. O tempo

takt resulta da divisão do tempo disponível por turno pela demanda do cliente por turno. Nesse

caso, o quadro 3 mostra o takt time encontrado.

Demanda 250.000 peças Demanda/ 50.000/3 Tempo de 8h x60min

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semanal turno =16.667 peças trabalho/turno =480min

Semana 5 dias de

trabalho (3

turnos/dia)

Média de

peças/ ordem

de corte

600 peças Paradas 40min

Demanda

diária média

250.000/5

=50.000 peças

Número de

ordens/ turno

16.667/600

=27,77

Tempo

disponível/turno

440min

Takt time = 440min/ 27,77 = 16min/ ordem

Quadro 3 – Cálculo do takt time

Somente com a restrição de utilizar um pallet contenedor para cada ordem de corte na

atividade de seleção pretende-se reduzir o process time da atividade, contribuindo assim para a

melhoria do processo seguinte, e podendo ainda absorver a tarefa de medição dos rolos mesmo

retirando um operador, ou melhor, deslocando-o para a atividade de movimentação haja vista que

a empresa possui duas empilhadeiras. Com essa melhor organização a atividade de análise de

encaixe ficaria restrita a analisar o aproveitamento da malha, estima-se que assim o process time

da atividade ficará reduzido a 30 minutos.

Com relação a entrega de tecidos, pode-se organizar vários outros clientes utilizar um

sistema de entrega do tipo “milk run” (coleta programada), de forma que as entregas possam ser

feitas diariamente, eliminando assim, 80% do estoque de tecidos. Os tecidos representam cerca

de 40% do total armazenado hoje, sendo o restante, malhas.

Sugere-se ainda a colocação de um supermercado onde há um evidente desbalanceamento,

entre análise de encaixe e as máquinas de corte, sendo este o processo puxador do novo sistema.

Cada vez que uma ordem de corte é colocada em uma das máquinas, visualmente é detectada a

necessidade para a análise de encaixe, que por sua vez se abastece de outro supermercado na

seleção de rolos.

A programação poderá ser feita via nivelamento (heijunka), podendo ser introduzida via

kaizen para se adequar aos colaboradores. Inicialmente o nivelamento teria características como

as apresentadas no quadro 4.

Peças Demanda

semanal

Demanda/

turno

Peças Demanda

semanal

Demanda/turno

Malhas (M) 160.000 pçs 17,8 ordens Especiais (E) 30.000 pçs 3,3 ordens

Tecidos (TP) 50.000 pçs 5,5 ordens Listrados (L) 10.000 pçs 1,1 ordens

Sequência de Produção = M M TP M E M TP M M = 144min (esta sequência seria repetida três vezes ao

turno, adicionando-se na última delas um L)

Quadro 4 – Programação e nivelamento da produção

Outro ponto que merece muita atenção é o tempo elevado de corte, muito acima do tempo

takt, é certo que têm-se aqui mais máquinas, porém melhorias na velocidade de corte da máquina

e mais rapidez no abastecimento também ajudariam na aproximação do tempo takt. Devido a essa

programação sequenciada, não será necessário um operador dedicado a cada máquina. Para

realizar a produção necessária de malhas especiais e da malha de listrados um único operador

seria suficiente, enquanto que não há necessidade de utilizar 4 pessoas e 4 máquinas para malhas,

3 pessoas e 3 máquinas também seriam suficientes para a demanda atual.

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O excesso de capacidade no processo de programação se faz necessário visto que é o único

processo que trabalha em apenas um turno. Desta forma é evidente que tenha que produzir em

excesso para garantir que na sua ausência não faltem ordens de corte já liberadas e atendidas para

que as atividades seguintes não fiquem ociosas. Hoje o que se faz é liberar ordens apenas para

garantir a “fábrica funcionando”, mas vê-se que além de mantê-la operando é de fundamental

importância que opere de maneira correta, ou seja, de acordo com as reais necessidades do setor

cliente. O que se propõe com o trabalho é que a atividade funcione também em 3 turnos, ou ao

menos em 2, haja vista que hoje trabalham 2 operadores em turno único. Outra mudança sugerida

seria criar uma “barreira” via sistema onde as ordens já atendidas não seguiriam automaticamente

ao processo seguinte, fazendo com que o processo seguinte possa escolher a família de produtos

que é necessária naquele momento. Pode-se desenhar agora um mapa do estado futuro, com um

fluxo de informação mais simples e uma produção nivelada (figura 4).

Figura 4- Mapa do Fluxo de Valor – Estado Futuro.

4. Conclusões

O objetivo principal deste trabalho foi investigar se a aplicação do mapeamento do fluxo

de valor, uma ferramenta da filosofia lean, no processo de separação e distribuição de malhas e

tecidos para o setor de corte de uma empresa, permite identificar os desperdícios inerentes ao

processo e propor melhorias no sentido de mitigá-los, proporcionando uma redução no lead time.

Neste estudo foi possível observar que o Mapeamento do Fluxo de Valor dá visibilidade ao

processo permitindo que melhorias sejam introduzidas não de forma pontual, mas, visando o

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melhor resultado global. Ganhos significativos, foram obtidos, como mostra o quadro 5, que

apresenta a evolução de algumas métricas lean para o processo analisado.

ESTADO DO PROCESSO

ESTOQUE MALHAS E TECIDOS

ESTOQUE EM PROCESSO

LEAD TIME DE PRODUÇÃO

PROCESS TIME

Antes 4 DIAS 21,7 h 162,5 h 3,9 h

Proposta 2,7 DIAS 4,2 h 77,7 h 2 h

Quadro 5 – Comparativo dos resultados

O estudo, no entanto, limitou-se a verificar parte do processo produtivo da fábrica. O

mapeamento não foi feito de porta a porta, o que não é recomendado pela literatura quando não

se tem noção do impacto das mudanças no todo (ROTHER; SHOOK, 1998). Mesmo assim o

estudo conseguiu comprovar que é possível com a aplicação da abordagem lean na logística, e a

empregabilidade da ferramenta MFV diagnosticar e reduzir desperdícios também neste setor.

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