formacao territorio evolucao politico administrativa ceara questao limites municipais

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Formação do territorio do Ceará

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  • 1FORMAO DO TERRITRIO E EVOLUO

    POLTICO-ADMINISTRATIVA DO CEAR:

    A QUESTO DOS LIMITES MUNICIPAIS

  • GOVERNO DO ESTADO DO CEAR

    Cid Ferreira Gomes Governador

    SECRETARIA DO PLANEJAMENTO E GESTO (SEPLAG)

    Desiree Custdio Mota Gondim Secretria

    INSTITUTO DE PESQUISA E ESTRATGIA ECONMICA DO CEAR (IPECE)

    Eveline Barbosa Silva Carvalho Diretora Geral

    GERNCIA DE ESTATSTICA GEOGRAFIA E INFORMAO (GEGIN) - IPECE

    Cleyber Nascimento de Medeiros - Coordenao

    INSTITUTO DE PESQUISA E ESTRATGIA ECONMICA DO CEAR (IPECE)

    Av. Gal. Afonso Albuquerque Lima, s/n - Edifcio SEPLAG, 2 AndarCentro Administrativo Governador Virglio Tvora CambebaTel. (85) 3101-3496CEP: 60830-120 Fortaleza-CE. [email protected] www.ipece.ce.gov.br

  • 3FORMAO DO TERRITRIO E EVOLUO POLTICO-ADMINISTRATIVA DO CEAR:

    A QUESTO DOS LIMITES MUNICIPAIS

    Lana Mary Veloso de Pontes

    Fortaleza,IPECE 2009

  • 4SECRETARIA DO PLANEJAMENTO E GESTO (SEPLAG)

    INSTITUTO DE PESQUISA E ESTRATGIA ECONMICA DO CEAR (IPECE)

    BASEADO NA DISSERTAO DE MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO E POLTICAS PBLICAS APRESENTADA UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEAR - UECE INTITULADA FRON-TEIRAS E TERRITRIOS MUNICIPAIS: O CASO DE CASCAVEL (CE), SOB A ORIENTAO DA PRO-FA. DRA. LIDUNA FARIAS ALMEIDA DA COSTA - UECE, E SUBMETIDA BANCA EXAMINADORA COMPOSTA POR: PROFA. DRA. LIDUNA FARIAS ALMEIDA DA COSTA - UECE, PROF. DR. FRAN-CISCO HORCIO DA SILVA FROTA - UECE, E PROFA. DRA. LUZIA NEIDE MENEZES TEIXEIRA CARIOLANO - UECE.

    Edio Original 2007

    Publicado por: INSTITUTO DE PESQUISA E ESTRATGIA ECONMICA DO CEAR - IPECE

    Direitos Adquiridos pelo INSTITUTO DE PESQUISA E ESTRATGIA ECONMICA DO CEAR - IPECE

    Copyright 2009 - IPECE

    ISBN: 978-85-98664-12-5

    P813f Pontes, Lana Mary Veloso de. Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa

    do Cear: A Questo dos Limites Municipais / Lana Mary Velosode Pontes. Fortaleza: IPECE, 2010. 92p

    1- Limites municipais. 2 - Gesto do territrio; 3 - Arquivo Grfi co Municipal; 4 - Cear.

    I Ttulo. II IPECE.CDU 352.911 (813.1)

    Impresso no Brasil

  • 5Dedico este livro ao Mestre, guia espiritual, estrela que nor-teia meu caminho. Aos meus pais, Jos Honrio de Pontes e Neuza Veloso de Pontes (in memorian), por propiciarem a minha exis-tncia terrena. Aos meus fi lhos, Marla Solara, Maria Solara e Mateus Pontes, razo e motivao desta jornada. A minha neta ris, pela alegria e esperana de renovao.

  • 6

  • 7AGRADECIMENTOS

    Deus, pela luz, f e coragem a mim concedidas. Dra. Ana M. Matos Arajo pela amizade, incentivo, orientao, apoio e contribuies

    acadmicas, essenciais para a concluso dessa dissertao.Aos companheiros da Diviso de Geografi a e Cartografi a do IPLANCE e da Gerncia de

    Geodsia e Geografi a - DIGEO do IBGE, Arimatia Mattos, Eliseu Canuto, Elizabete Aguiar, Ftima Silva, Joo Silvio Dantas, Mrcia Gurgel, Terezinha Falco (in memorian) e Zlio Frei-tas; Antnio Maurcio, Hamilton Srgio, Joo do Carmo Felipe, Jos Ademar, Jos Edivaldo, Tadeu Gonalves e Washington Luiz, pelo aprendizado adquirido nos 10 anos de desenvolvi-mento do Projeto Arquivo Grfi co Municipal AGM-CE.

    Ao Diretor da Unidade Estadual do IBGE CE Francisco Moreira Lopes e aos Coorde-nadores da Gerencia de Geodsia e Cartografi a Antnio Carlos Rodrigues e Marcelo Campos Maia pelas discusses tcnicas e o idealismo de reordenar a malha territorial do Estado do Cear.

    Ao IPECE, na pessoa da dirigente Eveline Barbosa Silva Carvalho, pelo incentivo e apoio para a concretizao deste trabalho.

    Universidade Estadual do Cear e a Secretaria de Planejamento e Gesto, pela oportu-nidade concedida para realizao do Mestrado Profi ssional em Planejamento e Polticas P-blicas.

    Aos professores, Dr. Horcio Frota, Dra. Liduna Farias A. Costa, Dr. Luiz Cruz Lima e Dra. Luzianeide Coriolano, pelo estmulo e prestimosas contribuies.

    Aos colegas do IPECE, especialmente aos companheiros Cleyber Nascimento, Daniela Freitas, Eder Mileno, Mrio Arago e Nertan Cruz, da Clula de Cartografi a e Geoprocessa-mento, que foram fundamentais para a realizao das fi guras e mapas.

    Helena Mota Dias, bibliotecria do IPECE, pela cesso do acervo bibliogrfi co e nor-malizao.

    Helosa Bezerra, pela reviso e contribuies no texto fi nal.A todos familiares, amigos e colegas, pelo incentivo e fora nos momentos de superao

    dos obstculos.

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  • 9O Instituto de Pesquisa e Estratgia Econmica do Cear - IPECE tem a grata satisfao de oferecer Sociedade Cearense a presente publicao Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais.

    Trata-se de texto que focaliza a questo territorial fazendo um traado a partir da forma-o do Territrio Cearense no contexto do arranjo nacional.

    Considerando a confi gurao inicial do territrio e sua fragmentao ao longo de diferen-tes perodos da histria do pas, realizada uma anlise da formao poltico-administrativa, para desse ponto, desaguar no problema comum em nossos dias, das fronteiras municipais, fruto desse mesmo processo descrito de forma cuidadosa nesta publicao.

    O estudo em apreo foi elaborado pela gegrafa e Analista de Planejamento e Oramento da Secretaria do Planejamento e Gesto, lotada no IPECE, Lana Mary Veloso de Pontes, sendo o mesmo parte da Dissertao de Mestrado Profi ssional em Planejamento e Polticas Pblicas da Universidade Estadual do Cear (UECE), defendida no ano de 2007.

    Ao divulgar o presente estudo o IPECE oferece sociedade Cearense um resgate da his-tria e apresenta a realidade territorial do Estado do Cear, dando subsdios para um melhor entendimento do ordenamento espacial ao longo dos anos fruto das transformaes em dife-rentes dimenses.

    Eveline Barbosa Silva Carvalho

    Diretora Geral

    APRESENTAO

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    SUMRIO

    1 INTRODUO.............................................................................................................................................................................13

    2 O TERRITRIO CEARENSE NA FORMAO NACIONAL......................................................15

    2.1 A Formao do Territrio Nacional...............................................................................................................................152.2 O Processo de Formao Territorial do Cear......................................................................................................182.3 A Confi gurao Inicial do Territrio Cearense.....................................................................................................21

    3 FORMAO POLTICO-ADMINISTRATIVA DO CEAR E A BASE LEGAL.........30

    3.1 A Fragmentao do Territrio Cearense....................................................................................................................31

    3.1.1 A questo Populacional Durante a Colnia...............................................................................................32

    3.1.2 O Perodo Correspondente ao Imprio.......................................................................................................333.1.3 O Perodo Relativo Repblica Velha........................................................................................................393.1.4 A Era Vargas e da Repblica Populista.......................................................................................................433.1.5 A Ditadura Militar e a Nova Repblica......................................................................................................53

    3.2 As Transformaes Ordenadas com Base Legal.................................................................................................603.2.1 A Legislao Territorial.........................................................................................................................................61

    4 O PROBLEMA DAS FRONTEIRAS MUNICIPAIS E O PROJETO ARQUIVO GRFICO MUNICIPAL DO CEAR AGM- CE...........................................................................................664.1 Fronteiras Municipais.............................................................................................................................................................664.2 O Projeto Arquivo Municipal no Cear AGM-CE........................................................................................67

    4.2.1 Os Procedimentos Metodolgicos do Projeto AGM.......................................................................69

    5 CONSIDERAES FINAIS............................................................................................................................................71

    6 ANEXOS..............................................................................................................................................................................................74Anexo A - Decreto-Lei N 311 de 2 de maro de 1938................................................................................74Anexo B - Lei N 1.153 de 22 de novembro de 1951.....................................................................................77Anexo C - Lei Complementar N 84, 21 de Dezembro De 2009...........................................................84Anexo D - Carta Martima e Geogrfi ca da Capitania - Estado do Cear - 1817 (encartado)

    7 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS......................................................................................................................87

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    Lista de Figuras

    Figura 1 - Caminhos dos Primeiros Migrantes Baianos e Pernambucanos...................................................23Figura 2 - Primeiras Vilas nas Bacias Hidrogrfi cas - Estado do Cear - 1699 a 1822........................27Figura 3 - Carta Martima e Geogrfi ca da Capitania - Estado do Cear - 1817......................................29Figura 4 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1823 a 1889........................................................................36Figura 5 - Municpios Criados - Estado do Cear -1890 a 1929........................................................................41Figura 6 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1930 a 1963........................................................................48Figura 7 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1983 a 1988........................................................................56Figura 8 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1990 a 1992.......................................................................58Figura 9 - Municpios Criados - Estado do Cear - Aps 1951...........................................................................63

    Lista de Quadros

    Quadro 1 - Primeiros Municpios Criados - Estado do Cear - 1699 a 1822.............................................25Quadro 2 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1823 a 1889...................................................................34Quadro 3 - Municpios Criados - Estado do Cear -1890 a 1929.....................................................................40Quadro 4 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1930 a 1963...................................................................46Quadro 5 - Municpios Criados e Extintos - Estado do Cear - 1958 a 1963.........................................50Quadro 6 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1983 a 1988...................................................................55Quadro 7 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1990 a 1992......................................................................57

    Lista de Tabelas

    Tabela 1 - Populao da Capitania do Cear Grande, segundo as principais Vilas - 1804.......................32Tabela 2 - Populao da Capitania do Cear Grande, segundo s principais reas produtivas - 1860 e 1872....................................................................................................................................................................................................................................42Tabela 3 - Populao e Taxa de urbanizao dos principais municpios do Estado do Cear - 1950 e 1960.....................................................................................................................................................................................................................45Tabela 4 - Municpios Emancipados segundo os perodos da poltica brasileira - Estado do Cear - 1699 1992......................................................................................................................................................................57

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    O Brasil, nas ltimas dcadas, foi marcado por uma grande quantidade de emancipaes de municpios. Neste contexto, o Cear tambm passou por um acelerado processo de frag-mentao do territrio em unidades poltico-administrativas.

    Ao longo da histria, desde a colonizao, percebe-se um processo de fragmentao, resultado de um arranjo territorial poltico e seletivo. Inicialmente, as unidades de menor hie-rarquia na organizao poltico-administrativa do pas surgiram de uma evoluo das comu-nidades a partir da ocupao territorial, com a expropriao de terras dos nativos, visando reproduo do capital mercantilista europeu. No Cear, a ocupao aconteceu tardiamente, como uma extenso e em subsdio s atividades canavieiras na Mata Atlntica, primeira por-o do territrio nordestino colonizada.

    A infl uncia do poder poltico e econmico da pecuria de corte em algumas Vilas, fa-cilitou o surgimento de outras, oriundas de povoados prximos ou mesmo distantes daqueles das sedes dos Termos, pelo caminho das charqueadas ou nos locais de encontros de viajantes e vaqueiros. A fragmentao territorial do Cear foi acentuando-se progressivamente por meio de Cartas, Ordens e Alvars Rgios, Resolues Imperiais e Provinciais, Leis Isoladas e Leis Gerais de ordenamento territorial, estas ltimas editadas at o ano de 1951.

    No decorrer deste processo, j no sculo XX, muitos foram os municpios emancipados a partir de distritos, que em virtude do abandono poltico, buscaram autonomia administrativa e fi nanceira. Tal abandono, estava expresso mais claramente na escassez de recursos fi nanceiros para investimentos fi xos no espao, como melhoria de rodovias, construo de postos de sa-de, de escolas, infra-estrutura econmica e outros.

    A Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 retornou a autonomia para as esferas estaduais legislarem sobre o assunto da emancipao ou criao de municpios.

    O presente trabalho, tem como base a Dissertao de Mestrado, Fronteiras e Territrios Municipais: O caso de Cascavel (CE) e objetiva, em termos gerais, apresentar a descrio da ocupao do territrio do Cear, com sua evoluo populacional e subdiviso em municpios, resgatando a legislao com seus critrios de emancipaes e alteraes dos limites munici-pais.

    No resgate histrico, teve-se o cuidado de no ultrapassar as proposies deste trabalho. Isto , buscou-se na literatura aquele referencial de contedo histrico e geogrfi co sobre a confi gurao territorial do Estado e dos Municpios com as informaes provenientes de di-versas fontes, tais como: documentos (ofi ciais e acadmicos), registros administrativos, revis-

    1 INTRODUO

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    Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais

    tas e jornais, alm de documentos e notcias veiculadas na internet. As pesquisas cartogrfi cas do IBGE, do IPLANCE e, atualmente, do IPECE foram bsicas, tais como as cartas topogr-fi cas, estatsticas e documentao tcnica.

    A elaborao deste trabalho possibilita a ampliao do conhecimento sobre o processo da evoluo poltico-administrativa do Cear, iniciando-se com a Introduo; o segundo captulo trata do resgate histrico sobre a Confi gurao do Territrio Nordestino e Cearense. O ele-mento norteador da breve retrospectiva a relao capital-trabalho, ou seja, como o capital foi utilizando o trabalho e o espao na ocupao do territrio a partir da colonizao do Nordeste e do Brasil.

    A seguir, no terceiro captulo, apresentada a Evoluo Poltico-administrativa do Estado do Cear, desde o seu primeiro municpio at a situao atual. A periodizao procura uma melhor visualizao do processo poltico nacional, relacionando os aspectos legais que deram origem criao dos 184 municpios do Cear. Alm da documentao legal, foram utilizados os dados das principais fontes e autores disponveis como: GIRO (1983), ARAGO (1996) e FALCO (1999).

    No quarto captulo, a discusso sobre a metodologia do Projeto Arquivo Grfi co Muni-cipal AGM - CE, detalhando os passos operacionais dessa metodologia, enfocando a impor-tncia na organizao da fragmentao do espao.

    Conclui-se, tecendo consideraes fi nais a respeito de algumas refl exes sobre a questo da fragmentao e da necessidade de ao do Estado, na poltica territorial com vistas ao apro-fundamento do tema e a soluo de problemas socioterritoriais.

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    A expanso capitalista europia produziu espacialidades que foram importantes na for-mao do territrio brasileiro. Um processo nem sempre contnuo, que se iniciou com a colo-nizao ao associar uma soma considervel de capitais com formas primitivas de escravido. Tal combinao permitiu a expropriao da populao nativa e o desmatamento de grandes pores do espao pelo extrativismo, que seria depois ampliado pela produo agrcola e o benefi ciamento da cana-de-acar, alm da pecuria extensiva.

    Neste captulo, procura-se resgatar o processo de uso e de ocupao do espao na for-mao do territrio brasileiro e, consequentemente, na confi gurao do territrio cearense. Observa-se tal movimento no contexto de integrao entre o serto e as reas de colonizao portuguesa, com seus movimentos populacionais e correntes migratrias dos principais cen-tros (Salvador e Olinda). Relacionam-se os deslocamentos com a ampliao da fronteira agr-cola e a apropriao de terras para o criatrio de bovinos e equinos, suprindo s necessidades de alimento e de trao animal dos lugares de produo para exportao, conforme maiores detalhes a seguir.

    2.1 A Formao do Territrio NacionalO territrio dominado pelos portugueses, desde 1500, j havia sido antes povoado por di-

    versas tribos indgenas. Assim, a expropriao de terra das populaes nativas e a devastao das fl orestas litorneas pelo colonizador deram-se desde o sculo XVI. A atuao da metr-pole portuguesa visava expanso capitalista necessria acumulao ampliada do capital mercantil, sendo introduzidas formas antigas de escravido para o cultivo da cana-de-acar. Os ndios que no se submeteram ao processo de colonizao, pois fi zeram resistncia ca-pitulao de seus territrios e escravido, entraram em confronto com o colonizador (com seus servos e vassalos), movimentando-se pelo territrio em busca de locais de resistncia e de sobrevivncia alternativas ao jugo portugus (ARAJO; CARLEIAL, 2001).

    A ocupao do territrio brasileiro fez-se, inicialmente, pelo litoral (cultivo da cana-de-acar) e foi adentrando para o interior com atividades complementares, contando com a pre-sena de rios caudalosos, de fundamental importncia para o transporte e o acesso s reas de fl orestas, destacando-se o So Francisco, o Paraguau, dentre outros. Assim, os engenhos tanto localizaram-se no litoral como em reas de vrzeas, nas margens de rios ou em canais, contribuindo para a formao dos povoados e vilas mais importantes. Hoje, nestas reas, con-centra-se a maior parte da populao (ANDRADE, 1995).

    As condies naturais e a proximidade com a metrpole europia, de certa forma, deter-

    2 O TERRITRIO CEARENSE NA FORMAO NACIONAL

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    Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais

    minaram as primeiras formas de ocupao portuguesa no espao brasileiro. Os indgenas tanto avanaram para o confronto, nessas terras banhadas pelos principais rios, quanto seguiram em sentido contrrio, adentrando em reas ainda pouco exploradas, e situando-se, estrategicamen-te, em pontos de alto relevo (nas montanhas e serras) para a resistncia e o refgio.

    Distante do litoral e a montante dos rios navegveis, alguns povoados surgiram em torno da pecuria e da agricultura de subsistncia, com a presena dos pequenos engenhos. Essa pro-duo sertaneja necessitava de animais para ser escoada internamente, bem como para chegar at o litoral e seguir por via martima aos diferentes pontos do pas, lugares que, na sequncia, tambm se transformaram em povoados (IPLANCE, 1982).

    Mas, a ocupao portuguesa no teve um movimento de oposio proveniente apenas da populao nativa. A efetivao da conquista com a explorao sistemtica da colnia portuguesa requereu combate a corsrios e confl ito com outras metrpoles europias dominantes. Em parti-cular, os corsrios exploravam o litoral clandestinamente e fundavam feitorias, tais como: Itama-rac, em Pernambuco, Santa Cruz, na Bahia e Cabo Frio, no Rio de Janeiro (ANDRADE, 1995).

    Esta diviso de foras com as demais metrpoles europias poderosas suscitou a frag-mentao do territrio brasileiro em 15 capitanias hereditrias, na quarta dcada do sculo XVI, seguindo o modelo das ilhas do Atlntico, embora no obtendo o mesmo sucesso. As capitanias tiveram destinos bem diferentes: algumas sequer foram ocupadas, a exemplo do Maranho, Cear, Rio Grande e Santana; outras tiveram um pequeno povoamento inicial, com a implantao de vilas e de engenhos de acar, fracassando, porm, em decorrncia de vrios fatores (Itamarac, Ilhus, Porto Seguro, Esprito Santo, Paraba do Sul e Santo Amaro); e hou-ve sucesso limitado s capitanias de Pernambuco e de So Vicente, com a expanso de culturas tropicais, que deram surgimento s vilas e povoados no seu entorno (ANDRADE, 1995).

    O sistema de capitanias no duraria muito no Brasil, embora a alternativa seguinte ainda no rompesse com o domnio portugus e abafasse o sentimento nacionalista que estava emer-gindo no territrio brasileiro. Este sistema que dependia de Lisboa, possua relativa autonomia, por serem administradas por seus Donatrios retrocedeu para um modelo de total centraliza-o administrativa, que era o Governo-Geral. A capitania da Bahia e a cidade de Salvador te-riam sido escolhidas como sede para a capital do Brasil, deslocando o poder da zona canavieira apenas de um lugar para outro, mantendo-se na faixa litornea (IPLANCE, 1982).

    A infl uncia da Bahia e do Sudeste cresceu com a expanso territorial do fi nal do sculo XVI, quando os bandeirantes retornaram do interior do continente aps o movimento que fi -zeram para procurar pedras e metais preciosos. Andrade (1995, p. 22) observa no nmero de escravos trazidos para o Sudeste com as Bandeiras uma dupla consequncia: a expanso ter-ritorial e o despovoamento do interior. Na Bahia, as correntes migratrias buscavam o desen-volvimento da pecuria e a proteo de vilas e fazendas prximas ao litoral contra o ataque de ndios. Mas pelas necessidades de suporte produo principal (cana-de-acar), emergiu um movimento contrrio, partindo do Recncavo para os Sertes, sendo feito pelos grandes cria-dores de gado. As fazendas estendiam-se do morro do Chapu, na Bahia, at o rio das Velhas, em Minas Gerais. O fato de a pecuria e a minerao no absorverem grandes contingentes de

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    mo-de-obra, assim como a agricultura, que fi cou restrita ao alimento de subsistncia, foram os motivos pelos quais os centros urbanos de expresso nos Sertes Nordestinos tiveram rela-tivo retardo em relao queles dos espaos litorneos.

    A diviso territorial do trabalho naquele perodo fazia-se pela ocupao litornea do a-car e a ocupao do interior pelo gado, alm da extrao de minerais preciosos. Isto , a partir de Pernambuco, Bahia e So Vicente, a ocupao do interior seguiu caminhos e motivos va-riados: para o Nordeste, a procura de pastagens deu origem formao de grandes latifndios; para o Sul, o trabalho escravo indgena e a descoberta das minas de ouro e diamantes origina-ram trs novas capitanias- Minas Gerais, Gois e Mato Grosso.

    No sculo XVIII, o domnio dos latifndios j se fazia presente, sendo expressivo na Bahia, no territrio banhado pelo Rio So Francisco e no Serto Setentrional do Nordeste, incluindo o Estado do Cear. A ocupao destes territrios est associada tanto economia aucareira quanto pecuria extensiva, sendo que, no ltimo caso, a explorao da terra se dava por sesmeiros e por sitiantes posseiros.

    Ainda de acordo com Andrade (op. cit., p. 148), o gado teve grande importncia na forma-o do territrio nordestino, em especial no Serto e no Litoral Setentrional, embora aparea em toda extenso da regio. As necessidades de terras motivaram as concesses de sesmarias, nas reas sertanejas, em direo ao Rio So Francisco. Vaqueiros e prepostos ocupavam terras e estabeleciam currais na margem esquerda do rio, no territrio de Pernambuco at chegar ao Piau e ao Cariri cearense.

    As sesmarias consistiam em grandes extenses de terras dos Sertes Nordestinos que motivavam as disputas de famlias. Isto , a conquista do serto foi marcada pela luta entre os poderosos (em particular, de Salvador) e aqueles que, sem prestgio para obter terras, assu-miram a condio de foreiros. Iniciava-se o arrendamento da terra e as relaes clientelsticas entre proprietrios e trabalhadores. Estes foreiros, na Bahia, eram colocados sob a proteo dos gros-senhores, ao reconhec-los com domnio sobre a terra, comprometendo-se com o pagamento de 10 mil ris, em foro, por um lote de uma lgua de terra em quadra, dando mar-gem formao de stios a partir dos currais de reses.

    Na luta pela ocupao das terras frteis entre proprietrios de currais de gado e popula-o nativa, teve incio a Guerra dos Brbaros que durou dez anos, aniquilando vrias tribos e conduzindo ao aldeamento dos remanescentes, escravizao de ndios e formao de agregados nas fazendas de gado. Assim se deu a ocupao do Cear, Rio Grande do Norte e quase toda Paraba. Aqui o sistema de criao era o mesmo do Agreste, o que as diferenciava eram as fazendas serem mais importantes, mais extensas e terem maior nmero de cabeas (ANDRADE, 1989).

    A pecuria, sem dvida, foi o modelo de produo que determinou a ocupao dos Sertes Nordestinos. No sc. XVII, os currais estavam relacionados s duas correntes que adentra-ram para o interior. Os currais baianos se estabeleceram margem direita do So Francisco e pelas ribeiras do Rio das Velhas (territrio Mineiro), das Rs, Parnamirim, Jacuipe, Itapecuru, Real, Vrzea Barris e Sergipe. E, os currais pernambucanos, assentados margem esquerda

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    Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais

    do So Francisco e nos vales do Rio Preto, Guaraira, Corrente, Paje, Moxot, So Miguel, em Alagoas, do Paraba do Norte, do Piranha, Au, do Apodi, do Jaguaribe, do Acara, do Piau e at do Parnaba. Ainda conforme Andrade (2005), se estendia desde Olinda at a fronteira do Maranho a Oeste.

    O caminho do gado de Olinda e, posteriormente, de Recife serviu para o surgimento de pequenas povoaes e vilas nos sertes do Nordeste. De Olinda, se dirigia para o Norte por Goiana, Esprito Santo (PB), Mamanguape, Canguaretama, Papari, So Jos do Mipibu, Natal, Au, Mossor, Praia do Tibau (RN), Aracati e Fortaleza (CE). Outra estrada que fazia escoar o gado piauiense para Olinda se fazia atravs do Cear, Paraba e Pernambuco, partindo do Piau e, em Crates, cruzando vrias localidades at chegar a Olinda (IPLANCE, 1982).

    Constata-se, portanto, que o territrio nordestino foi confi gurado visando tanto o mercado externo, para suprir a metrpole portuguesa de bens e mercadorias, quanto o fornecimento ali-mentar do mercado interno. Nos espaos da produo aucareira houve abundncia e riqueza montada na escravido indgena e negra, mas nos espaos da pecuria contou-se apenas com o trabalho de poucos escravos, que foi substitudo pelo trabalhador agregado fazenda, dando origem aos parceiros e posseiros, ou pequenos produtores de subsistncia, que ainda hoje per-duram em algumas localidades.

    2.2 O Processo de Formao Territorial do Cear

    O processo de formao do territrio do Cear pode ser visto pela ocupao desta capitania pelos europeus, que aconteceu de forma tardia, comparada conquista da zona da mata nordes-tina ou ao litoral aucareiro, cuja ocupao foi no incio do sculo XVI. No territrio da pecu-ria no Nordeste, ela s vem acontecer no fi nal do sculo XVII. A produo aucareira avanava pelas terras do litoral, desde a Paraba at a Bahia, enquanto a pecuria, atividade subsidiria, expandia-se para o interior. Desta forma, a interiorizao das capitanias do Cear, Paraba e Rio Grande do Norte se deram pela formao de territrios da pecuria, onde as populaes nativas foram dizimadas em funo da mercantilizao do territrio, alm da subordinao ao europeu, como retrata Pinheiro (2000).

    As terras deveriam ser doadas de acordo com o nmero de ndios de cada aldeia. Nesse caso o que prevalecia era a noo mercantil de propriedade, deixando-se de lado no s todo o carter simblico do territrio como a necessidade de reas de disperso, que era um dado marcante no modo de vida dos povos originrios. (2000, p. 23).

    importante ressaltar que o confl ito entre colonizadores e povos indgenas acentuou-se em todo o Nordeste, em funo das atividades desenvolvidas e do processo de limpeza dos nativos para a efetivao da produo mercantil. No Cear, a problemtica foi a mesma, pois, medida em que as terras foram sendo ocupadas pela pecuria, ia-se expulsando indgenas. No contexto geral da colonizao, cabe destacar a atuao dos sesmeiros e dos bandeirantes no processo de restrio do territrio dos povos indgenas.

    A pecuria possibilitou a ocupao da capitania do Cear a partir da necessidade de terra

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    para o desenvolvimento da atividade. As primeiras doaes de sesmarias ocorreram no pero-do de 1678-1782, nas imediaes do Rio Jaguaribe no sentido Aracati para o Sul, em direo ao Rio Salgado.

    Das 2.378 datas solicitadas, num perodo de mais de um sculo e meio, 91% jus-tifi cava a necessidade de terra para ocupar com a pecuria. [...] Entre 1679-1699, num perodo de 20 anos, foram doadas 261 sesmarias, o que representa uma mdia de 13 cartas ao ano. [...] entre 1700 e 1740, num perodo de 40 anos foram 1.700 ses-marias, representando uma mdia de 42 sesmarias por ano. [...] h um subperodo entre 1700-1720. Nestes decnios foram distribudas 932 cartas, dando uma mdia de 46 por ano. (op. cit, p. 30).

    Ainda segundo Pinheiro (2000), a ocupao da capitania do Cear se consolida em 1720, com a transformao do territrio dos indgenas em territrio da pecuria. Tal atividade invia-bilizou o uso de mo-de-obra escrava negra, pelos altos preos diante dos valores obtidos com os produtos agrcolas no mercado interno. Portanto, necessitou de mo-de-obra livre e migran-te de outras reas de produo, alm de parte da populao indgena que havia sido aculturada e catequizada nos aldeamentos indgenas. Da porque a expanso das culturas agrcolas, em termos de reas, fi cou restrita agricultura de subsistncia.

    Discute-se, contudo, que a agricultura no expandiu neste perodo colonial devido tan-to s grandes distncias do mercado (entre serto e litoral), quanto s pssimas condies das estradas que, assim, reduziam a comercializao interna dos produtos agrcolas (GIRO, 1995, p.36). Mas, no se pode deixar de considerar o fato de que havia uma agricultura de subsistncia sendo praticada pelos trabalhadores das fazendas pecurias, que se mantinham praticamente auto-sufi cientes, no fosse a importao de determinados produtos vindos da Metrpole ou das principais Vilas. O algodo um exemplo desta fase, em que a agricultura e o benefi ciamento artesanal eram praticados apenas para o consumo de servos e trabalhadores dos latifndios.

    Alm disso, desde os primrdios da ocupao do territrio cearense pode-se falar de uma espcie de industrializao e urbanizao no Estado, que teria se formado a partir da indstria da carne seca, ou da charqueada, e do comrcio que se desenvolveu no seu entorno. Tal proces-so surgiu como estratgia para superar a concorrncia e para minimizar o fato de o gado sofrer consideravelmente com seu transporte para o mercado interno, em direo s zonas produtoras de cana-de-acar, inclusive para reas de minerao.

    A charqueada foi uma espcie de benefi ciamento que se fez carne do gado para evitar as perdas e manter-se na concorrncia do mercado. Tanto havia perda por mortalidade quanto pela reduo do peso do rebanho ao fi nal do percurso, entre as fazendas e as feiras, onde se-riam vendidos (op. cit., p.38).

    O benefi ciamento da carne do gado proporcionou uma nova expresso econmica ao ter-ritrio cearense, pois possibilitou uma outra estratgia de participao no mercado interno de abastecimento alimentar para as principais regies produtoras. Quando o ciclo econmico da cana-de-acar esteve localizado em Pernambuco, o gado poderia ser transportado vivo, por

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    rotas terrestres que abriam novas estradas e ocupaes nos territrios cearense, pernambuca-no, se extendendo at a Bahia. Entretanto, com o deslocamento da economia, atravs do ciclo da minerao,1 para o sudeste do pas (Minas Gerais), havia a necessidade de outra insero do principal produto cearense no mercado interno.

    A industrializao da carne,2 contudo, no permaneceu como um modo de saber fazer apenas dos cearenses. Tal tcnica migrou para longe, chegando ao Rio Grande do Sul, atravs de viajantes que conheciam a arte do benefi ciamento da carne do sol, adaptando-a para a rea-lidade do clima frio e mido dos pampas gachos. Assim, enquanto parte do rebanho cearense era dizimada pela grande seca (1790-1793), os produtores do sul, h mais de uma dcada, aproveitavam os altos nveis de produtividade de seu rebanho, favorecidos por pastagens na-turais, para avanar e concorrer com o benefi ciamento da carne. Os sulistas aplicavam preos alternativos para atingir o principal mercado interno- a zona da minerao. As localidades vizinhas da zona produtora de Aracati (Au e Mossor), pertencentes ao Rio Grande do Norte, tambm tiveram acesso tcnica e instalaram ofi cinas que foram, contudo, controladas pela Provncia de Pernambuco, que tambm se benefi ciava de parte da riqueza gerada pelo Cear (GIRO, 1995, p.71-72).

    Segundo pesquisa histrica do IPLANCE (1982, p.36) o Cear participou de uma forma exclusivamente dependente da zona produtora de acar, e, indiretamente, de Portugal. Mas no havia somente dependncia de produtos e tecnologias importadas, houve tambm sangria de recursos que muito atrasou a ocupao e o desenvolvimento cearense, cessando somente ao fi nal do sculo XVIII (1799), com a separao das duas provncias. Isto signifi cou que, durante todo perodo do gado e do charque, parte da riqueza produzida pelo territrio cearense fora destinada ao territrio pernambucano, alm da metrpole portuguesa colonizadora.

    Nesse momento de emancipao poltica da provncia do Cear inicia-se um novo ciclo econmico, o do algodo, que seria favorecido pelos novos rumos polticos e econmicos to-mados em nveis nacionais e mundiais.

    O algodo j era explorado no territrio nordestino desde o incio de seu povoamento como forma de suprir os trabalhadores de tecidos para suas confeces pessoais e domsticas, como j comentado anteriormente. Contudo, em termos de mercado externo, ainda em 1777, os produtores e comerciantes cearenses de algodo tentaram atingir o mercado europeu, atravs de Portugal. Mas as relaes de subordinao Capitania de Pernambuco impediram esta in-teno mercadolgica e, de certo modo, contiveram a produo. Mas foi a abertura dos Portos, em 1808, que permitiu, no apenas o Cear abrir-se para o mundo, bem como os investidores internacionais passarem a aplicar capital em territrio cearense, com destaque para os comer-ciantes portugueses e ingleses em Fortaleza (IPLANCE, 1982, p.36).

    Em particular, a economia algodoeira motivou a fi xao e a imigrao de trabalhadores, alm de demandar o trabalho da populao indgena residente nos aldeamentos ou sob o con-

    1 Tal ciclo teve uma durao longa, iniciou ao fi nal do sculo XVII, com apogeu em meados do sculo XVIII, permanecendo at, quase ao seu fi nal. In Histria do Brasil - Sntese cronolgica. Disponvel em: http://www.objetivo.br/portal/frm_conteudo.aspx?codConteudo=85&tituloanterior=Roteiros+para+Estudo. Acessado em 03/10/2007.2 Se que se pode dizer que havia (ou h) uma transformao industrial no seu processo de benefi ciamento.

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    trole dos padres e jesutas nas misses. Entretanto, o auge desta economia no territrio cearen-se e nordestino se deu durante a Guerra de Secesso dos Estados Unidos (1861-1865), que era o principal fornecedor desta matria-prima no mercado europeu txtil.

    O algodo foi uma cultura que se adequou realidade cearense no apenas em termos naturais, mas sociais e econmicos, tal como foi brevemente resumido no pargrafo seguinte:

    Uma nova fase inicia-se na economia do Cear, em fi ns do Sculo XVIII, quando o algodo surge como negcio altamente rentvel, adaptando-se ao clima da zona semi-rida, bem como ao sistema existente, fornecendo, das folhas, a alimentao para o gado e liberando rea para a agricultura de subsistncia. A expanso das exportaes de algodo acentua-se no sculo XIX, graas demanda por matrias-primas, provocada pela Revoluo Industrial. (IPLANCE, 1982, p.36).

    A Capitania experimentaria outros ciclos econmicos, sem deixar de obter riqueza pela pecuria consorciada ao algodo. Assim, entraria em nova fase de ocupao e uso de seu ter-ritrio, tal como foi observado por diversos historiadores e gegrafos, dentre eles cita-se Silva (2000).

    A cana-de-acar e o caf tiveram pouca importncia no territrio cearense, pois nunca chegaram a ser produto principal ou monocultura, afi nal o regime de semi-aridez que assola quase todo territrio cearense, torna-o imprprio para tais culturas, fi cando restritas a deter-minadas reas de exceo. A ttulo de exemplifi cao, inicia-se com o plantio de canaviais, que deram sustento ao mercado interno pelo fornecimento de alimentos, e, em 1840, tais cana-viais, com suas matas adjacentes, foram transformados em cafezais, como se exemplifi cara nas Serras de Meruoca, Baturit, Ibiapaba, alm de parte do Cariri cearense. Cear e Pernambuco tornaram-se exportadores de caf em determinados momentos favorveis ao mercado externo e, em Baturit (CE), surge uma pequena nobreza dos proprietrios dos cafezais, a exemplo do que havia no sudeste do pas.

    A economia algodoeira e a produo de cana e de caf, entretanto, no foram a base do perodo inicial que chamamos de confi gurao do territrio cearense, apesar de sua contribui-o na proliferao de cidades e de municpios.

    2.3 A Configurao Inicial do Territrio CearenseAs anlises histricas sobre a ocupao do territrio cearense referem-se a duas possibili-

    dades: uma decorrente da imigrao interna, ou dos deslocamentos das atividades subsidirias economia principal da Colnia; ou aquela referente defesa do territrio contra as investidas de outros pases europeus interessados em explorar esta poro da Amrica recm descober-ta (IPLANCE, 1982). Sem entrar no mrito da questo, considera-se que ambas as situaes contriburam para a formao de cidades e municpios e merecem, portanto, ateno deste trabalho.

    Como consequncia da defesa territorial e dos aldeamentos, as vilas surgiram tambm por razes econmicas, que foram a pecuria, com suas rotas e percursos no mercado interno,

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    alm de seus efeitos multiplicadores. Pode-se observar, portanto, dois grandes perodos de defi nio das primeiras clulas bsicas do Estado, que chamamos de confi gurao inicial do territrio, que estaria sendo formado pelas primeiras 16 Vilas, que deram origem aos atuais 184 municpios cearenses. O primeiro perodo foi relativo ao incio da ocupao, referente colonizao portuguesa e retirada do indgena do territrio que seria destinado pecuria (de 1699 a 1762). No segundo momento, a atividade pecuria teria desencadeado um fl uxo co-mercial e de servios a partir de seus produtos.

    As vilas foram erguidas princpio nas regies litorneas, ratifi cando a hiptese de defe-sa, tendo em vista que a economia pecuria nascente se fazia no sentido contrrio, do serto para o litoral, ou internamente no sentido leste e oeste, quase que reconfi gurando os caminhos dos primeiros migrantes baianos e pernambucanos (Figura1). Foram poucos os casos de Vilas erguidas para a defesa do litoral cearense: a Vila de Aquiraz, criada em 1699 e a de Fortaleza, em 1725. As vilas oriundas da penetrao pernambucana, com um raio de ao maior sobre o territrio cearense, surgiram do movimento leste-oeste, do Aracati (1747) em direo ao territrio do Piau, espraiando-se tambm do norte para o sul, saindo tambm do Aracati, pelo Jaguaribe, at a vila de Ic (1735). A penetrao baiana, por sua vez, teria sido feita pelo sul do Estado, atravs dos vales dos Rios Salgado e Jaguaribe e passando por Crato (criado em 1762) at a Paraba. Ainda na fase das primeiras vilas, destacam-se aquelas que foram erigidas em funo do aldeamento indgena, que foram: Viosa do Cear (1759), Caucaia (1759) e Baturit (1762) (vide Figura 1).

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    Figura 1 - Caminhos dos Primeiros Migrantes Baianos e Pernambucanos

    Fonte: Elaborao Prpria Adaptao do IPLANCE (1982, p.38).

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    At 1758, havia somente Aquiraz, Fortaleza, Ic e Aracati. Esta data corresponde a um marco na instalao de Vilas, quando os aldeamentos indgenas foram elevados a categoria de Vila e os povos nativos supostamente seriam igualados aos colonos, de acordo com Pinheiro.

    [...] a partir de 1758, as aldeias indgenas foram transformadas em vilas. Com a expulso dos jesutas, a administrao dos povos indgenas passou para a rbita laica e os povos nativos foram igualados aos demais moradores. (2000, p. 46).

    Diz-se que somente por hiptese houve uma igualao de direitos, pois, conforme anlise anterior, os indgenas foram controlados como mo-de-obra semi-escrava nestas aldeias e de-pois nas Vilas, servindo de trabalhadores para as novas Vilas emancipadas.

    Na segunda fase, intensifi ca-se o criatrio e o comrcio do gado, bem como o benefi cia-mento da carne e do couro para o mercado interno, fatos que impulsionaram a formao das outras oito primeiras Vilas. Na bacia do Banabuiu-Quixeramobim prosperou a primeira Vila da regio central do Estado, que foi a de Quixeramobim (1789); As bacias do Acara e do Co-rea tornaram-se os beros das vilas de Sobral (1766), Granja (1776) e Guaraciaba do Norte (1791); assim como a bacia do Rio Jaguaribe deu origem s vilas de Russas (1799) e Tau (1801) na bacia do Salgado foram criadas as Vilas de Jardim (1814) e Lavras da Mangabeira (1816) (Figura 2 e Quadro 1).

    Assim, em pouco mais de um sculo, entre 1699 a 1822, j havia uma relativa concentra-o populacional e de Vilas ao longo dos Rios Jaguaribe-Salgado, Acara e do Corea, com menor destaque para as bacias do Banabuiu-Quixeramobim.

    Cabe destacar que o Cear, com seu espao quase totalmente exposto ao regime de semi-aridez, encontrou possibilidades de pecuria extensiva ao longo das margens de seus rios in-termitentes. O historiador Geraldo Nobre comenta que as sesmarias ocupavam as margens dos rios de forma perpendicular, talvez para possibilitar um maior nmero de benefi ciados com este recurso to escasso no semi-rido, que a gua potvel:

    As sesmarias geralmente eram 3x1, 3x2, 3x3, 2x1. Que signifi ca trs lguas margem do rio e uma lgua de largura e assim por diante. Assim, as fazendas se constituam em regra com trs lguas dispostas ao longo de um curso de gua por uma de largura, sendo meia para a margem, as lguas eram desiguais entre si e quase sempre pequenas. (NOBRE apud MAPURUNGA, 2003, p.171).

    Alm disso, chama-se ateno para o fato de que, nestes primrdios da Capitania do Ce-ar, as sesmarias iam sendo ocupadas deixando espaos vazios entre elas, ou seja, sem limites defi nidos, colocando-se tal com uma fronteira de faixa, vista na concepo de Mattos (1990). Tais espaos vazios foram sendo ocupados por posseiros, gerando confl ito com os latifundi-rios vizinhos, visto que seus limites no eram bem demarcados ou protegidos, tendendo o gado a ultrapass-los, provocando perdas, queixas, desavenas e mortes. Em 1850, com a lei das Terras, tais glebas foram consideradas devolutas e somente poderiam ser adquiridas mediante compra. O depoimento de Nobre sobre as terras devolutas no Cear bastante elucidativo da

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    Neste perodo colonial, portanto, o gado foi o grande responsvel no apenas pela per-manncia do homem no serto, mas tambm pela movimentao e expanso destas reas e, posteriormente, pelo incio da urbanizao. Alm disso, surgiram diversas outras Vilas que as-sumiram funes de destaque na economia sertaneja, seja como entreposto para parada e recu-perao do gado, no cruzamento de rotas para o mercado, ou ainda nas cidades litorneas, que

    Quadro 1 - Primeiros Municpios Criados - Estado do Cear - 1699 a 1822Nmero

    de OrdemMunicpio

    Original (1)Data de Criao

    Instrumento Legal

    Data de Instalao

    Lei e Data de Consolidao

    1 Aquiraz 13/02/1699 Carta Rgia 1700 (2) Lei n 1.258 de 27/07/1915

    2 Fortaleza 11/03/1725 Carta Rgia 13/04/1726 Carta Imperial de 17/03/1823

    3 Ic 17/10/1735 Ordem Rgia 04/05/1738 Lei n 244 de 25/10/1842

    4 Aracati 11/04/1747 Resoluo Rgia 19/02/1748 Lei n 244 de 25/10/1842

    5 Viosa do Cear 06/ 06/1759 Proviso Rgia 07/07/1759 Lei n 1.994 de 14/08/1882

    6 Caucaia 07/07/1759 Proviso Rgia 15/10/1759 Lei n 448 de 20/12/1938

    7 Baturit 16/12/1762 Carta Rgia 14/04/1764 Lei n 844 de 09/08/1858

    8 Crato 16/12/1762 Carta Rgia 21/06/1764 Lei Provincial n 628 de 17/10/1853

    9 Sobral 22/07/1766 Carta Rgia 05/07/1773 Lei n 229 de 12/01/1841

    10 Granja 27/06/1776 Alvar Rgio 17/10/1776 Lei n 602 de 03/11/1854

    11 Quixeramobim 20/02/1789 Ordem Rgia 13/06/1789 Lei n 770 de 14/09/1856

    12 Guaraciaba do Norte 12/05/1791 Alvar Rgio 12/05/1791 Lei n 448 de 20/12/1938

    13 Russas 16/05/1799 Ordem Rgia 06/08/1801 Lei n 900 de 09/08/1859

    14 Tau 14/12/1801 Ordem 03/05/1802 Lei n 2.677 de 02/08/1929

    15 Jardim 30/08/1814 Alvar Rgio 3/01/1816 Lei Provincial n 1.829 de 13/09/1879

    16 Lavras da Mangabeira 20/05/1816 Resoluo Rgia 08/01/1818 Lei n 2.075 de 20/09/1884

    Fonte: Giro (1983); Arago (1996); Falco (1999).

    (1) corresponde cada clula bsica original.(2) s foi possvel identifi car o ano de instalao.

    questo: que elas [terras devolutas] existiam limitando as fazendas entre si. Uma lgua de terra permanecia devoluta entre elas. Nesses espaos, os donos das fazendas no podiam levantar pontes ou quaisquer outras construes, pois a sua utilidade era de servir de marco divisrio, pela ausncia de muros e cercas na regio. Tal medida buscava evitar a mistura entre as cabeas dos rebanhos e as incurses do gado nas plantaes vizinhas e, mesmo, o seu extravio. A idia era evitar tambm confrontos entre os vizinhos. (NOBRE apud MAPURUNGA, 2003, p. 172).

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    se especializaram no benefi ciamento da carne salgada com destino a locais mais longnquos. Dentre as Vilas erigidas pelo maior peso da atividade pecuria destacam-se: Ic, Sobral, Qui-xeramobim, Russas e Tau.

    As charqueadas e alguns dos subprodutos do couro iniciaram-se em Aracati, como prin-cipal entreposto martimo, que fazia entrega para Pernambuco e de l saam para as reas de minerao e para a metrpole portuguesa (IPLANCE, 1982, p. 56). Conforme Giro (1995, p. 65), as ofi cinas que se instalaram em Aracati comearam a desenvolver suas atividades a partir da primeira dcada do sculo XVIII. Arajo (2002, s/p.), por sua vez, observa que tais ofi cinas rapidamente se expandiram, associadas s atividades tercirias de prestao de ser-vios (administrativa, comunicao, fi nanceiro, comercial e etc.), atraindo bastante populao para o local, inclusive de estrangeiros, ampliando e enriquecendo a construo dos principais equipamentos e de moradias.

    Mas nem toda vila se prestava ao benefi ciamento da carne (ou para instalar ofi cinas). Era de grande importncia, por exemplo, que o local dispusesse de condies para extrao do sal marinho, alm de permitir a embarcao e o transporte por cabotagem, o que implicava na existncia de uma enseada natural (barras de rios). No territrio da Vila de Granja, mais especifi camente na localidade praiana de Camocim, e na Vila de Sobral, no porto de Acara, as condies ambientais tambm favoreciam (barra do rio, clima e extrao de sal) o desenvol-vimento de ofi cinas de carne seca, tal como comprovado por vrios historiadores, dentre eles Valdelice Giro:

    As povoaes de Aracati, Granja, Camocim e Acara, possuam as condies exigidas. Ali, em toscas ofi cinas, passou a ser fabricado um tipo de carne seca, no prensada, moderadamente salgada e desidratada ao sol e ao vento, por tempo necessrio sua conservao. Isso com o aperfeioamento da tcnica empregada pelo ndio, transferida ao vaqueiro, no preparo da carne seca, ainda hoje comum nas regies sertanejas nordestinas-a chamada carne-de-sol. (1995, p.65).

    Em resumo, quando se quer reportar a este quadro inicial que conformou as primeiras Vilas do territrio cearense com suas fronteiras, tal qual hoje se conhece, pode-se atribuir ao fato econmico da pecuria extensiva e de sua comercializao, alm do benefi ciamento de seus principais produtos (carne e couro). Uma produo que reunida do Piau, foi levada em direo aos mercados interno e externo, tanto por deslocamento interno quanto utilizando transporte martimo. Tais trajetrias comerciais teriam expandido os movimentos de instala-o de fazendas, bem como haveria fomentado pontos de entrepostos e de portos martimos para circulao dos principais produtos exportados e importados, defi nindo rotas que ligavam os diversos quadrantes do territrio cearense.

    As vilas foram as menores unidades territoriais com autonomia poltica e administrativa, caracterstica do territrio brasileiro em formao, da fase da colonizao at o fi nal do sculo XIX. A vila equivalente a municpio na diviso administrativa de origem romana, cuja desig-nao foi adotada na Pennsula Ibrica e transferida de Portugal para suas colnias, conforme Furtado (2007, p.202-203).

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    Figura 2 - Primeiras Vilas nas Bacias Hidrogrfi cas - Estado do Cear - 1699 a 1822

    Fonte: Elaborao Prpria (2007).

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    Ainda neste perodo, designava-se como termo o territrio da vila, cujos limites so im-precisos; tinha sua sede nas vilas ou cidades respectivas; era dividido em freguesias (que um conceito eclesistico) [...] (op.cit., p.203).

    A partir de tais conceitos, pode-se entender melhor a Carta Martima e Geogrfi ca da Capitania do Cear, elaborada por Antonio Jos da Silva Paulet, em 1817, sobre a qual se tra-balhou os principais destaques (Figura 3). Nesta Carta, os territrios de 13 das antigas Vilas so delimitados e considerados como Termos, cujas sedes lhe prestam o nome. Verifi cam-se algumas diferenciaes em relao Figura 2 construda para representar essa fase inicial de confi gurao do territrio cearense.

    primeira vista, cada um dos 16 municpios que formaram as clulas bsicas originais do territrio cearense est representado nesta Carta de 1817, com exceo das vilas erigidas posteriormente a esta data que, na ocasio, ainda eram povoados: a Villa de Lavras da Man-gabeira (antigo Povoado de So Vicente de Lavras), includa no Termo da Villa de Ic. Outros dois casos chamam ainda ateno: Caucaia (antiga Villa de Soire) por no possuir um territrio delimitado, fazendo parte do Termo da Villa de Fortaleza; ao contrrio, Baturit (antiga Villa de Monte Mor O Novo), apesar de estar delimitado por territrio especfi co, no estava sendo identifi cado como um Termo e nem fazia parte de outro.

    Assim, o desenvolvimento e a evoluo poltico-administrativa do Estado estiveram e es-to relacionados s atividades sociais, econmicas, polticas e culturais que se desenvolveram a partir deste perodo colonial. As primeiras Vilas fi rmaram-se como clulas bsicas originais, com mltiplas funes dentro da economia pecuria, como: produtoras, comerciais, adminis-trativas, industriais e de servios. Algumas com mais de uma funo adotada em perodos diferentes, e com movimentos de crescimento e de estagnao na histria do Cear e do Brasil, tal qual pode-se acompanhar nos desdobramentos seguintes sobre o territrio cearense.

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    Figura 3 - Carta Martima e Geogrfi ca da Capitania - Estado do Cear - 1817

    (Vide Anexo D).

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    A retrospectiva da formao territorial nacional possibilitou analisar os fatores econmi-cos como determinantes dos fatores polticos e sociais na confi gurao bsica do territrio ce-arense. O modelo de ocupao do Cear traado pela pecuria extensiva deu-se, praticamente, no sculo XVIII, atendendo aos interesses dos pecuaristas, diante da necessidade de grandes extenses de terras para a atividade, infl uenciando o surgimento de confl itos e de manipula-o/dominao poltica da classe trabalhadora.

    Aps essa confi gurao bsica, o territrio seria intensamente fragmentado por ao de grandes proprietrios de terra ou latifundirios, cuja dominao poltica se fazia sentir desde as fazendas de criao do gado e de produo do algodo destinados ao mercado distribuidor e em direo aos centros industriais mais dinmicos do pas. Assim, as estruturas de poder poltico e econmico que comandaram o Estado do Cear durante sculos, ainda hoje, mantm fortes elementos que se manifestam e se materializam nas relaes polticas clientelsticas, nas desigualdades scio-espaciais e na concentrao da renda, com ampliao da pobreza e da misria, dentre outros problemas.

    Este processo de ocupao, contudo, somente foi acompanhado de uma base legal, que regulamentaria o territrio como um todo, bem depois da ocupao e do processo de frag-mentao iniciado durante o Imprio. Apesar da propriedade privada da terra ser fundamental para a dominao poltica, no havia interesse local de registrar, formalmente, a transformao do territrio municipal com suas fronteiras demarcadas empiricamente. E, mesmo em termos nacionais, houve apenas um determinado momento poltico no qual se procurou dar uma co-erncia e uma organizao territorial interna e fronteiria ao pas, dentro de uma perspectiva nacionalista, conforme ser demonstrado neste captulo.

    Por outro lado, no havia um contingente populacional expressivo que viesse ocupar todo o territrio das Vilas e fazer presso sobre suas fronteiras. O processo de criao de Vilas, identifi cado por Andrade, na provncia de Minas Gerais, pode ser extensivo s demais provn-cias brasileiras, qual seja a princpio, as vilas eram muito distantes umas das outras e pratica-mente no possuam fronteiras bem delimitadas, tal como se apreende da passagem referida por Andrade:

    O povoamento no era continuo, ele se adensava em torno dos garimpos, dando origem as vilas que se situavam muitas vezes, grande distncia uma das outras [...]. Nos grandes espaos que se estendiam entre estas vilas desenvolveram-se lavouras de subsistncia, voltadas para o seu abastecimento e tambm atividades pecurias [...]. (1995, p.22-23).

    3 FORMAO POLTICO-ADMINISTRATIVA DO CEAR E A BASE LEGAL

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    Portanto, como no havia necessidade de separar as Vilas por fronteiras, e, anteriormente, nas sesmarias, no havia uma delimitao ntida de grandes regies brasileiras, tal como nos faz concluir Costa:

    [...] O espao para o qual reclamavam providncias para o Estado Imperial ain-da no tinha fronteiras defi nidas capazes de circunscrev-la como regio [...]. (2005, p.41)

    Por sua vez, a falta de um critrio legal para delimitar fronteiras e separar vilas viria ser reclamada, localmente, somente bem mais tarde, sendo levantada, parcialmente, ou de acordo com os interesses confl itantes de algumas das partes envolvidas. Portanto, a diviso poltico-administrativa da atualidade est permeada de problemas, ou seja, com pendncias de litgios e confl itos de fronteiras tanto entre os municpios quanto entre outros estados do Nordeste. So exemplos de litgio do Cear: os ocorridos com o Rio Grande do Norte quanto defi nio do limite na chapada do Apodi; e com o Piau, quanto defi nio do limite sobre a chapada da Ibiapaba. reas consideradas de exceo do ponto de vista ambiental de uma regio semi-rida como a nordestina.3.1 A Fragmentao do Territrio Cearense

    Apesar de reconhecer que a fragmentao do territrio cearense teve forte impulso da economia algodeira, durante o sculo XIX, acompanhada de macios investimentos em infra-estrutura econmica e urbana, no se pode deixar de observar as questes de ordem poltica e demogrfi ca.

    De acordo com Giro apud Rodrigues (1995), as estruturas de poder ligadas propriedade da terra, aos latifundirios que se interpuseram no contexto poltico local e nacional, fi zeram das emancipaes dos municpios uma relao direta com os interesses polticos, ao afi rmar que:

    A diviso do territrio cearense, como acontecia com os demais Estados, esteve sujeita aos inconfessveis interesses polticos e outros de ordens diversas no inspirados no bem comum. Criava-se, extinguia-se, restaurava-se Municpios sem obedincia sistema lgico, justo e geral, e da a confuso reinante neste mbito da administrao pblica. (1995, p. 22).

    Mesmo nos tempos mais remotos, o processo de criao dos municpios tambm esteve associado ao crescimento e ao movimento populacional pelo territrio, mostrando a relao entre o problema de fronteiras municipais e a presso demogrfi ca.

    Portanto, procura-se, realizar anlise sobre o processo econmico de ocupao do espao, associado populao. Tais abordagens so seguidas de consideraes sobre a atuao do Es-tado Brasileiro,31notadamente quanto s formas de governo e de poltica nacional e estadual, para ento elucidar-se a discusso do aparato legal no processo de fragmentao do territrio cearense.3 Para efeito de anlise deste capitulo subdividimos o processo de fragmentao do territrio cearense em sete grandes perodos de formao do territrio brasileiro com seu Estado-nao, que foram: Colonial, Imperial, Repblica Velha, Estado Novo e Repblica Populista, Ditadura Militar e Nova Repblica.

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    Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais

    3.1.1 A Questo Populacional Durante a ColniaNo decorrer da formao bsica inicial do Estado do Cear, entre 1699 e 1822, referente

    criao das 16 Vilas no perodo colonial brasileiro, o contingente populacional era ainda bas-tante diminuto. Apenas a Vila de Crato detinha uma relativa concentrao populacional (quase 21 mil habitantes), podendo ser considerada a principal vila em termos populacionais, embora no fosse a mais importante em termos de mercado (Tabela 1).

    A explicao para tal destaque populacional estava nas bases de sobrevivncia dos tra-balhadores. A fartura de gua e de terras midas permitiu uma base agrcola diversifi cada, incluindo cultura da cana-de-acar, algodo e pecuria, benefi ciamento da cana (acar, ra-padura, melado e outros derivados) e do algodo. Alm disso, no Crato deu-se incio a um processo de benefi ciamento industrial que fora importante para a confi gurao dos territrios cearense, piauiense e pernambucano. Mas, seriam a intelectualidade e a poltica as bases de sustentao mais forte desta vila, que se tornou municpio-plo da regio sul do estado e com infl uncia sobre os estados vizinhos (AMORA, 1995).

    Tabela 1 - Populao da Capitania do Cear Grande, segundo as principais Vilas - 1804

    Vilas / Total Absolutos %

    Total 77.369 100,0

    Crato 20.681 26,7

    So Joo do Prncipe (Tau) 10.448 13,5

    Sobral 9.952 12,9

    Ic 8.851 11,4

    So Bernardo (Russas) 7.465 9,6

    Campo Maior (Quixeramobim) 6.013 7,8

    Aquiraz 5.526 7,1

    Aracati 4.931 6,4

    Granja 3.502 4,5

    Fonte: FURNES, 2000, p.104.

    Tau, Sobral e Ic foram as demais Vilas de maior atrao populacional nesses primr-dios da ocupao cearense. Suas funes administrativas e suas bases tercirias de comrcio e servios formaram as principais razes para manter a populao ali residente, embora no se comparassem com a Vila de Crato.

    Aracati surpreendia pela contradio de ser a principal Vila econmica (industrial, co-mercial e de servios), aquela que daria formao rede de cidades (SILVA, 2000, p.227), teve pouca expresso em termos populacionais, com menos de 5 mil habitantes. Um contingente que era, em 1804, quatro vezes menor que a populao de Crato.

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    3.1.2 O Perodo Correspondente ao Imprio No perodo do Imprio, considerando o intervalo de anos entre 1823 a 1889, foram eri-

    gidas 48 novas Vilas, que somadas s 16 anteriores, totalizavam 64 municpios. Na primeira metade do sculo XIX, o processo era lento e foram criados somente 11 novos municpios, desmembrados42de 6 das 16 clulas originais, estando concentrados do seguinte modo: dois oriundos do desmembramento de Crato (Barbalha e Milagres) e Sobral (Itapipoca e Acara), trs do Municpio de Ic (Jucs,Jaguaribe e Pereiro). Itapipoca apesar de ter sido criado neste perodo passou por desmembramento, originando o Municpio de Itapaj (1849). Entre 1851 e 1889, ao contrrio, a fragmentao territorial foi bem mais acelerada, pois aconteceram 37 emancipaes, sendo que das clulas originais, exceo de Tau e Guaraciaba do Norte, todos os outros 14 municpios deram origem a novos municpios (Quadro 2).

    Faz-se destaque ao quantitativo de municpios criados a partir dos municpios de Quixera-mobim (4) e Lavras da Mangabeira (3). O restante dos municpios originou-se de forma quan-titativamente homognea em 26 dos 64 municpios existentes. Neste perodo, tambm passou a fazer parte do Cear dois municpios (Crates e Independncia) originrios da Vila de Marvo pertencentes ao territrio do Piau (Figura 4).

    Essas vilas passaram por experincias comuns, enquanto principais territrios de concen-trao da riqueza pecuria que, associada produo do algodo, permitiu que a populao local se estabelecesse e pudesse enfrentar as adversidades climticas.

    A economia algodoeira, alm de permitir o consrcio com o gado, constituiu-se no gran-de fomentador econmico da fragmentao territorial, tendo por suporte a poltica local e imperial de enfrentamento das questes da seca, pois adequou-se aos sistemas de poder e de produo vigente.

    Conforme Neves (2000), a seca fazia com que se quebrassem as relaes paternalistas en-tre patro e empregados, que mantinham um sistema de lealdade dos moradores (votando em seus partidos e representantes polticos) pela reciprocidade dos donos da terra (que amparavam seus moradores durante a crise climtica).

    Mas a seca tambm gerou motivo poltico para que os governantes locais conseguissem mobilizar recursos para investimentos em obras, utilizando os trabalhadores rurais como mo-de-obra. Assim, conforme Celeste Cordeiro (2000, p. 140-141), a seca afetaria o sistema pol-tico, pois intensifi cava a dependncia local ao governo central; ao mesmo tempo, permitia o favorecimento, a barganha e a corrupo nas eleies.

    4 Ao se criar uma nova clula administrativa (municpio) o seu territrio, na maioria das vezes, era formado de vrios outros e no obrigato-riamente de um nico municpio. Para este trabalho considera-se como municpio de origem aquele ao qual o povoado ou distrito se achava vinculado poltica e administrativamente, embora o seu territrio, no momento da formao, pudesse advir de vrias unidades administrativas.

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    Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais

    Nmero de

    OrdemMunicpio

    CriadoData de Criao

    Instrumento Legal

    Data de Instalao

    Municpio de Origem

    Lei e Data de Consolidao

    17* Jucs 03/02/1823 Resoluo Imperial 17/10/1823 Ic Decreto n 448 de 20/12/1938

    18 Itapipoca 03/03/1823 Resoluo Imperial 03/11/1823 Sobral Lei n 1.288 de 31/08/1915

    19 Cascavel 06/05/1833 Resoluo Provincial 17/10/1833 Aquiraz Lei n 2.039 de 02/11/1883

    20 Jaguaribe 06/05/1833 Resoluo Provincial 06/05/1833 Ic Lei n 1.532 de 12/08/1918

    21 Ip 26/08/1840 Lei n 200 26/08/1840 Guaraciaba do Norte Lei Provincial n 2.298 de 25/11/1885

    22 Pereiro 21/10/1842 Lei n 242 22/10/1842 Ic Decreto n 448 de 20/12/1938

    23 Canind 29/07/1846 Lei n 340 29/07/1846 Quixeramobim Lei n 1.221 de 23/08/1914

    24 Barbalha 17/08/1846 Lei n 374 17/08/1846 Crato Lei n 1.740 de 30/08/1876

    25 Milagres 17/08/1846 Lei n 374 17/08/1846 Crato Decreto n 31 de 25/07/1890

    26 Acara 31/07/1849 Decreto n 480 05/02/1851 Sobral Lei n 2.019 de 19/09/1882

    27 Itapaj 22/12/1849 Lei n 502 10/12/1850 Itapipoca Lei n 1.156 de 04/12/1933

    28 Maranguape 17/11/1851 Lei n 553 17/11/1851 Fortaleza Lei n 1.282 de 28/09/1869

    29 Mombaa 27/11/1851 Lei n 550 20/09/1852 Quixeramobim Lei n 1.156 de 04/12/1933

    30 Iguatu 27/11/1851 Lei n 553 25/01/1853 Ic Lei n 1.612 de21/08/1874

    31 Saboeiro 27/11/1851 Lei n 558 27/11/1851 Jucs Decreto n 448 de 20/12/1938

    32 Tamboril 04/10/1854 Lei n 664 04/10/1854 Ip Lei n 1.156 de 04/12/1933

    33 Santa Quitria 27/08/1856 Lei n 782 05/08/1857 Sobral Decreto n 448 de 20/12/1938

    34 Santana do Acara 03/11/1862 Lei n 1.012 27/06/1863 Acara Lei n 1.740 de 30/08/1876

    35 Trairi 12/11/1863 Lei n 1.068 12/11/1863 Caucaia Lei n 1.153 de 22/11/1951

    36 Misso Velha 08/11/1864 Lei n 1.120 08/11/1864 Barbalha Lei n 262 de 28/07/1931

    37 Boa Viagem 21/11/1864 Lei n 1.128 21/11/1864 Quixeramobim Decreto n 448 de 20/12/1938

    38 Assar 19/06/1865 Lei n 1.152 11/01/1869 Saboeiro Decreto n 448 de 20/12/1938

    39 Jaguaretama 29/08/1865 Lei n 1.179 29/08/1865 Jaguaribe Decreto n 448 de 20/12/1938

    40 Jaguaruana 04/09/1865 Lei n 1.183 11/06/1866 Aracati Decreto n 66 de 11/09/1890

    41 Paracuru 01/10/1868 Lei n 1.235 27/11/1868 Trairi Lei n 1.153 de 22/11/1951

    42 Limoeiro do Norte 28/12/1868 Lei n 1.255 30/06/1873 Russas Lei n 364 de 30/08/1897

    43 Redeno 28/12/1868 Lei n 1.255 21/08/1871 Baturit Lei n 2.167 de 17/09/1889

    * Os municpios com nmero de ordem de 1 a 16 esto no Quadro 1 e so os que deram origem aos demais.

    Quadro 2 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1823 a 1889 (Continua)

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    Nmero de

    OrdemMunicpio

    CriadoData de Criao

    Instrumento Legal

    Data de Instalao

    Municpio de Origem

    Lei e Data de Consolidao

    44 Pacatuba 08/12/1869 Lei n 1.284 26/04/1873 Maranguape Lei n 2.167 de 17/09/1889

    45 Corea 24/09/1870 Lei n 1.316 24/09/1870 Granja Decreto n 448 de 20/12/1938

    46 Vrzea Alegre 10/10/1870 Lei n 1.329 02/03/1872 Lavras da Mangabeira Decreto n 448 de 20/12/1938

    47 Solonpole 22/10/1870 Lei n 1.337 22/10/1870 Jaguaribe Decreto n 448 de 20/12/1938

    48 Quixad 27/10/1870 Lei n 1.347 1871 (1) Quixeramobim Lei n 2.166 de 17/09/1889

    49 Pedra Branca 09/08/1871 Lei n 1.407 09/08/1871 Mombaa Decreto n 1540 de 03/05/1935

    50 So Benedito 18/11/1872 Lei n 1.470 25/11/1873 Viosa do Cear Lei n 1.850 de 30/09/1921

    51 Pentecoste 23/08/1873 Lei n 1.542 23/08/1873 Canind Decreto n 1.540 de 23/05/1935

    52 Araripe 03/08/1875 Lei n 1.661 05/11/1877 Assar Decreto n 1.540 de 23/05/1935

    53 Morada Nova 02/08/1876 Lei n 11.719 07/01/1877 Russas Lei n 2.336 de 03/11/1925

    54 Cariria 18/08/1876 Lei n 11.727 18/08/1876 Crato Decreto n 1.156 de 04/12/1933

    55 Ibiapina 23/11/1878 Lei n 11.773 01/07/1879 So Benedito Decreto n 1.156 de 04/12/1933

    56 Camocim 29/09/1879 Lei n 1.849 08/01/1883 Granja Lei n 2.162 de 17/09/1889

    57 Crates 22/10/1880 Lei Geral n 3.012 (2) Marvo (Piau) Lei n 1.046 de 14/09/1911

    58 Independncia 22/10/1880 Lei Geral n 3.012 (2) Marvo (Piau) Decreto n 1.156 de 04/12/1933

    59 Ipueiras 25/10/1883 Lei n 2.036 16/05/1884 Ip Decreto n 1.512 de 18/03/1935

    60 Aurora 10/11/1883 Lei N 2.047 30/05/1885 Lavras da Mangabeira Lei n 1.156 de 04/12/1933

    61 Umari 12/11/1883 Lei N 2.046 12/11/1883 Lavras da Mangabeira Lei n 3.338 de 15/09/1956

    62 Meruoca 13/11/1885 Lei n 2.090 24/01/1887 Sobral Lei n 1.153 de 22/11/1951

    63 Santana do Cariri 25/11/1885 Lei n 2.096 11/01/1887 Assar Decreto n 448 de 20/12/1938

    64 Porteiras 17/08/1889 Lei n 2.169 15/12/1889 Jardim Lei n 1.153 de 22/11/1951

    Fonte: Giro (1983); Arago (1996); Falco (1999).

    (1) S foi possvel identifi car o ano de instalao.

    (2) No foi possvel identifi car a data de instao.

    Quadro 2 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1823 a 1889 (Concluso)

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    Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais

    Figura 4 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1823 a 1889

    Fonte: Elaborao Prpria - Adaptao de IPLANCE (2000).

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    Ainda na opinio de Celeste Cordeiro, a poltica local possua caractersticas que seriam dadas por essas relaes polticas com a seca, que em resumo expe:

    A ausncia de autonomia provincial, a dependncia agravada nos perodos de seca, a privatizao da poltica, com seu exerccio administrado a partir de inte-resses familiares, a utilizao dos partidos com objetivos de manuteno do man-donismo local, a impotncia do eleitor sertanejo, a fora policial como extenso do poder dos coronis, a vitria poltica como legalizao do arbtrio, o controle total dos postos da administrao, da professora ao juiz, a violncia como forma mais efi caz de intimidao dos adversrios. (2000, p.77).

    V-se, portanto, a poltica sendo assentada em base territorial, fazendo com que houvesse uma disputa por territrios entre diferentes grupos de poder. Tais fatos, certamente, vinham contribuir com a emancipao dos municpios e com o surgimento de discordncia em relao s fronteiras, a princpio entre as fazendas, depois provocando litgios entre os estados e os municpios.

    Vrios foram os momentos polticos que, durante o Imprio, romperam disputas regionais e locais. Para citar apenas os mais importantes, Cruz Filho (1966, p.39-40) faz meno s Vilas de Crato e de Ic, com o movimento revolucionrio separatista de 1824, nascido em Pernam-buco, intitulado a Confederao do Equador. Em sentido contrrio, em 1831, a guerra civil iniciada por Pinto Madeira, ao sul do Estado do Cear, na Vila de Jardim, procurava restaurar o Imprio, avanando sobre o Crato, com uma ao violenta de saque e depredao.

    Portanto, no por acaso que no sculo XIX, tenha se resolvido uma antiga divergncia referente ao litgio das terras entre o Piau e o Cear, que culminou no acrscimo da poro sudoeste do Cear, quando fora incorporada, em 1880, parte do territrio da Vila de Marvo, pertencente ao Estado do Piau e que dera origem s Vilas de Crates e de Independncia, conforme j foi citado.

    O litgio, confi gurado quando no processo de negociao as partes interessadas no chegam ao consenso na defi nio das fronteiras, limites e divisas. Entre o Piau e o Cear, ele teve incio na Serra da Ibiapaba, enquanto local e territrio de resistncia indgena coloniza-o portuguesa, que perdurou por mais de meio sculo (PINHEIRO, 2000). Contudo, aps a capitulao indgena aos portugueses, tal territrio passou a ser do interesse dos maranhenses, que estavam sob a infl uncia holandesa, disputando tal rea com a metrpole portuguesa. Tal linha de raciocnio foi observada nos fatos relativos ordem do rei de Portugal que, em deter-minado momento, decidiu a polmica entre os dois governos (Maranho e Pernambuco), sendo favorvel ao Cear, na poca, provncia subordinada a Pernambuco:

    Em 31 de outubro de 1721, [...] pareceu ao El Rei ordenar, que dita aldeia fi que como dantes no domnio desse governo de Pernambuco e capitomor do Cear, e que se suspendam por ora as ordens de se unir ao Maranho.(TORRES, 1988, p.26).

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    Formao do Territrio e Evoluo Poltico-Administrativa do Cear: A Questo dos Limites Municipais

    O representante da capitania do Piau, ainda insatisfeito, e, juntamente com o governador do Maranho, recorreu Coroa solicitando o reconhecimento de seus direitos sobre o territ-rio da Serra da Ibiapaba e do distrito de Crates. Tal polmica perdurou, por mais de 30 anos, quando a deciso rgia pendeu a favor do Cear.

    Desta experincia vivida entre os territrios cearense e piauiense, percebe-se que o li-tgio tratado dentro de uma esfera de poder que parte do nvel local e mais prximo, at o mais distante e hierarquicamente superior. Sob a infl uncia do litgio, as decises referentes ao cotidiano das pessoas e famlias, tais como aquelas sobre a propriedade de suas terras so conduzidas em nveis locais e mais prximos, tomando encaminhamento diferente se fossem conduzidas ao nvel das decises superiores e distantes. Por exemplo, em 1721, a metrpole portuguesa j havia se decidido em favor do Cear para ter direito sobre o territrio de Cra-tes. Entretanto, determinado proprietrio, ao adquirir terras no local, recebeu confi rmao de propriedade do representante de Oeiras, provncia do Piau, tal como se pode verifi car no seguinte depoimento:

    [...] Garcia de vila Pereira, da Casa da Torre, compra um extenso vale do Cra-tes, com rea de 180 quilmetros de comprimento por 120 km de largura, pela quantia de 4.000 cruzados. A posse lhe foi conferida pelo Ouvidor de Oeiras, [...] A escritura trazia chancela do Ouvidor de Oeiras, sede ento da vasta capitania do Piau [...]. (op.cit., p.26).

    Tais terras foram adquiridas posteriormente por D. Luiza Coelho da Rocha Passos da Casa da Torre (Garcia Dvila), na Bahia, para o desenvolvimento da pecuria e foram elas que deram origem aos atuais Municpios de Crates e Independncia. A fazenda denominada Pira-nhas, situada s margens do Rio Poty, originou o povoado de mesmo nome, onde foi erguida a capela de Piranhas em 1770, marco para o desenvolvimento do povoado que, posteriormente, foi elevado categoria de Vila, pelo Decreto Regencial de 6 de julho de 1832, recebendo a de-nominao de Prncipe Imperial, nome com que se pretendeu homenagear o jovem Imperador.

    Este territrio foi anexado defi nitivamente, ao Estado do Cear, em troca de uma parte do Municpio de Granja (Vila de Amarrao), localizado na barra do Rio Parnaba. Conforme o argumento da poca, tal abertura para o litoral seria de relevante importncia para a provn-cia do Piau, devido s possibilidades de relao direta com a metrpole portuguesa e demais mercados europeus.

    O povoado de Amarrao foi uma estratgia de ocupao territorial que partiu da Igreja, por meio da ao dos padres, em 1823, que ampliou sua freguesia com a realizao de bati-zados e casamentos, passando a exercer infl uncia direta sobre seus habitantes. Como desdo-bramentos polticos e econmicos, fundados na relao comercial do povoado com a cidade de Granja, a Assemblia Provincial do Cear elevou o povoado categoria de distrito (Lei n 1.777, de 29 de agosto de 1865). Aps nove anos, o distrito foi transformado em Vila (Lei n 1.596, de 5 de agosto de 1874), sendo instalada somente em 23 de julho de 1879 pelo presiden-te da Cmara Municipal de Granja, de cujo territrio havia sido desmembrado. Contudo, em 1880, a provncia do Piau reivindica a sua posse e seu territrio foi ento anexado ao desta

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    provncia, mediante a lei geral n 3.012 de 22 de outubro de 1880, na ocasio de anexao das Vilas de Crates e Independncia ao Estado do Cear.

    Ainda neste perodo, a ttulo das conquistas polticas sobre o governo central e como resultado das exportaes cearenses de algodo para os ingleses, realizaram-se diversos inves-timentos pblicos e privados que visaram apoiar a economia do algodo. J em 1857, antes do auge da economia algodoeira (durante 1860 e 1865), foi inaugurado o Trapiche do porto de For-taleza. Dezoito anos aps, o primeiro trecho da estrada de ferro de Baturit foi entregue para ligar Arronches (Parangaba) a Mondubim e a Maranguape. Em 1876, Pacatuba estaria sendo benefi ciada pela ferrovia. O trecho at Baturit, somente concluiria-se em 1882, no mesmo ano em que se disponibilizava o telgrafo por cabo submarino, melhorando a comunicao entre Fortaleza e o sul do pas, bem como com a Europa. O ramal da ferrovia Camocim a Granja havia sido ligado um ano antes (1881) (IPLANCE, 1982).

    Toda essa infra-estrutura e essa melhoria das comunicaes representavam dupla possi-bilidade: o ir e vir das mercadorias e o transporte de passageiros. A ferrovia e suas estaes foram muito utilizadas para a imigrao dos cearenses e para tentativa poltica de controle da migrao vinda do interior do Estado para Fortaleza e seu destino fi nal, ao norte ou ao sudeste do pas. Com isto, muitos dos imigrantes que deveriam apenas fazer um trampolim nas cidades menores, permaneceram ali. Tais fatos viriam modifi car o processo de erguimento dos povo-ados em vilas, com suas emancipaes polticas.

    Diferentemente deste desenvolvimento econmico e de infra-estrutura neste perodo, no havia um sistema de organizao da diviso poltico-administrativa; para cada novo municpio correspondia uma legislao individual, tendo por base as Leis Provinciais, os Decretos Leis e as Resolues.

    3.1.3 O Perodo Relativo Repblica Velha

    Entre 1890 e 1929, cerca de 40 anos aps o conturbado perodo poltico imperial, vive-se uma nova fase do algodo na economia cearense, aquela voltada para seu mercado interno de benefi ciamento industrial, a criao de novos municpios foi equivalente registrada no Imp-rio, quando se faz a relao entre o nmero de anos do perodo com as emancipaes ocorri-das. Foram criados 23 municpios, vindo a se consolidar 87 municpios no territrio cearense (Quadro 3 e Figura 5).

    Desta vez, o destaque dado a Baturit, que serviu de exemplo tanto na expanso econ-mica quanto populacional e, portanto, no desmembramento territorial. Isto porque, possuindo uma economia voltada para produo cafeeira, ela foi fortalecida pela produo algodoeira, possibilitando seu crescimento populacional.

    De acordo com informaes populacionais de 1804, Baturit no fi gurava entre as princi-pais Vilas do Estado, bem como em 1860 no estava entre as principais reas produtivas. Em 1872, j era a segunda vila produtiva com maior contingente populacional, atingindo 27 mil habitantes (Tabela 2). A populao de Baturit passou a fi xar-se ali como resultado da econo-mia algodoeira, dando origem a cinco municpios desmembrados de seu territrio no incio da Repblica, no ano de 1890: Mulungu, Aratuba, Aracoiaba, Pacoti e Guaramiranga.

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    Nmero de

    OrdemMunicpio

    CriadoData de Criao

    Instrumento Legal

    Data de Instalao

    Municpio de Origem

    Lei e Data de Consolidao

    65* Mulungu 23/07/1890 Decreto n 29 11/09/1890 Baturit Lei n 3.556 de 14/03/1957

    66 Tiangu 31/07/1890 Decreto n 33 12/08/1890 Viosa do Cear Lei n 1.156 de 04/12/1933

    67 Uruburetama 01/08/1890 Decreto n 34 19/08/1890 Itapaj Lei n 526 de 28/07/1899

    68 Aratuba 01/08/1890 Decreto n 35 12/08/1890 Baturit Lei n 3.563 de 29/03/1957

    69 Aracoiaba 16/08/1890 Decreto n 44 07/09/1890 Baturit Lei n 1.156 de 04/12/1933

    70 Brejo Santo 26/08/1890 Decreto n 49 05/11/1890 Milagres Decreto n 448 de 20/12/1938

    71 Mauriti 27/08/1890 Decreto n 51 21/10/1890 Milagres Decreto n 448 de 20/12/1938

    72 Pacoti 02/09/1890 Decreto n 56 25/10/1890 Baturit Lei n 1.156 de 04/12/1933

    73 Guaramiranga 04/09/1890 Decreto n 59 17/10/1890 Baturit Lei n 3.679 de 11/07/1957

    74 Pacajs 09/09/1890 Decreto n 63 29/09/1890 Aquiraz Decreto n 1.191 de 23/05/1935

    75 Farias Brito 13/10/1890 Decreto n 82 15/11/1890 Assar Decreto n 448 de 20/12/1938

    76 Beberibe 05/07/1892 Decreto n 67 05/07/1892 Cascavel Lei n 1.153 de 22/11/1951

    77 Senador Pompeu 03/09/1896 Lei n 332 (1) Mombaa Decreto n 659 de 22/09/1901

    78 Massap 20/09/1897 Lei n 398 05/02/1898 Sobral Lei n 1.408 de 27/08/1917

    79 Campos Sales 29/07/1899 Lei n 530 27/10/1899 Assar Decreto n 448 de 20/12/1938

    80 Juazeiro do Norte 22/07/1911 Lei n 1.028 04/10/1911 Crato Lei n 1.178 23/07/1914

    81 Ubajara 24/08/1915 Lei n1.279 31/12/1915 Ibiapina Decreto n 448 de 0/12/1938

    82 Cedro 09/07/1920 Lei n 1.725 20/10/1920 Lavras da Man-gabeira Lei n 2.255 de 19/09/1925

    83 So Gonalo do Amarante 12/09/1921 Lei n 1.841 12/11/1921 Caucaia Decreto n 64 de 07/09/1935

    84 Acopiara 28/09/1921 Lei n 1.875 14/01/1922 Iguatu Decreto n 448 de 0/12/1938

    85 Nova Russas 11/11/1922 Lei n 2.043 28/01/1923 Ipueiras Decreto n 1.156 de 04/12 /1933

    86 Reriutaba 11/11/1922 Lei n 2.056 25/09/1923 Guaraciaba do Norte Decreto n 1.540 de 03/05/1935

    87 Carir 16/09/1929 Lei n 2.704 16/09/1929 Sobral Decreto n 448 de 0/12/1938

    Fonte: Giro (1983); Arago (1996); Falco (1999).* Os municpios com nmero de ordem de 1 a 64 esto nos Quadros 1 e 2.

    (1) No foi possvel identifi car a data de instalao.

    Quadro 3 - Municpios Criados - Estado do Cear -1890 a 1929

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    Figura 5 - Municpios Criados - Estado do Cear - 1890 a 1929

    Fonte: Elaborao Prpria - Adaptao de IPLANCE (2000).

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    Tabela 2 - Populao da Capitania do Cear Grande, segundo s principais reas produtivas - 1860 e 1872

    Vilas / Total1860 1872

    Absolutos % Absolutos %

    Total 293.086 100,0 234.187 100,0

    Fortaleza 35.373 12,1 30.372 13,0

    Baturit ... ... 27.132 11,6

    Ip 18.055 6,2 24.669 10,5

    Cascavel 15.090 5,1 22.839 9,8

    Crato 19.575 6,7 18.471 7,9

    Aracati 19.667 6,7 17.618 7,5

    Quixeramobim 14.814 5,1 16.525 7,1

    Maranguape 19.832 6,8 16.271 6,9

    Granja 24.440 8,3 14.633 6,2

    Ic 13.455 4,6 14.592 6,2

    So Bernardo (Russas) 19.172 6,5 14.340 6,1

    So Joo do Prncipe (Tau) 14.156 4,8 9.704 4,1

    Cachoeira (Solonopole) 7.509 2,6 7.021 3,0

    Barbalha/Misso Velha 24.470 8,3 ... ...

    Lavras da Mangabeira 27.825 9,5 ... ...

    Sobral 19.653 6,7 ... ...Fonte: FURNES, 2000, p.112.

    Na crtica de Andrade (1995, p. 56 a 58), a Repblica no viria atender s expectativas dos que defendiam a necessidade de uma Reforma Agrria no Brasil. Ao contrrio, a Constituio de 1891 reforou o fato de as terras pblicas continuarem sob o poder dos Estados, de seus coronis e currais eleitorais, reforando o destino traado, em 1850, pela Lei das Terras, que era de con-centrar terra na mo dos poderosos. Portanto, os confl itos pela terra persistiram, a exemplo da Guerra dos Canudos, na Bahia, entre 1896 e 1897.

    O sistema poltico local continuava utilizando suas estratgias de obter recursos federais mediante o apelo social e o drama da seca. A poltica hidrulica, que havia sido iniciada no sculo XIX, se amplia com a criao da Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS) em 1909. Entretanto, mais uma vez, tais benefcios polticos viriam favorecer as oligarquias dominantes. A infra-estrutura bsica do Nordeste foi implantada nos perodos de secas, contando com as ins-tituies federais, construindo no apenas audes, mas estradas, campos de pouso, reservatrios dgua, cercas nas propriedades privadas e etc. De acordo com IPLANCE:

    a infra-estrutura fsica, como elemento de base para o desenvolvimento das rela-es econmicas, evoluiu rapidamente desde fi ns do sculo passado [XIX], progre-dindo para o nvel de atividade contnua a partir de 1909, com a criao da Inspe-toria de Obras Contra as Secas (IOCS atual DNOCS) [...]. (1982, p.58).

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    Lana Mary Veloso de Pontes

    Tais instituies, criadas em resposta s crises climticas nordestinas, de certo modo, fa-voreceram a ocupao mais consolidada do territrio regional, contribuindo para a demarcao de suas fronteiras, tal como textualmente revela Costa:

    A delimitao das fronteiras poltico-administrativas do Nordeste acionada principalmente na esfera poltica, sendo o Estado nacional seu protagonista mais signifi cativo. As aes de socorro ao fl agelo em tempos de seca, a criao de ins-tituies como o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas, o Instituto do Acar e do lcool, a Companhia de Desenvolvimento do Vale do So Francisco, a Companhia Hidroeltrica do So Francisco, o Banco do Nordeste do Brasil, culminando com a Superintendncia de Desenvolvimento do Nordeste, a qual est diretamente ligada a demarcao das atuais fronteiras do Nordeste, so exempla-res desse protagonismo. (2005, p. 38).

    A dependncia da provncia cearense dos recursos centrais no se limitava questo das crises climticas. A sedio de Juazeiro do Norte, conduzida por Padre Ccero entre 1912 e 1914, constitui-se um exemplo da represso do poder constitudo e uma consequncia negativa dessa dependncia ao poder centralizado. Desta vez, tal confl ito popular motivou a interveno Federal, em que, como nos anteriores, o Imperador controlara nomeando 43 Presidentes, entre 1841 e 1889. O Cear, como todo o Norte, alm de fi car ilhado das decises que favoreciam a economia sudeste (caf com leite), no possua nem o direito de escolher seus dirigentes (CRUZ FILHO, 1966, p.41-46).

    Fatos que viriam justifi car porque tantas pessoas e famlias, at multides de cearenses, abandonariam seu lugar de origem em busca de melhores condies de vida. Assim, com a emi-grao dos cearenses, os desmembramentos perderam fora, mas, em contrapartida, a expanso populacional e territorial de Fortaleza tornara-se bastante visvel.

    As estatsticas populacionais no Brasil vieram melhorar com a criao do Instituto Brasi-leiro de Geografi a e Estatstica (IBGE) em 1939. Entretanto, com as fontes disponveis, consta-ta-se o crescimento populacional vertiginoso do Estado no incio do sculo XX, cuja populao viria a concentrar-se, notadamente, em Fortaleza.

    Desde 1860, verifi cava-se que a populao de Fortaleza tornara-se a mais representativa do Estado. Assim, entre 1890 e 1920, a populao estadual mudou de 806 mil para 1.319 mil habitantes, enquanto Fortaleza variou de 41 mil para 79 mil habitantes. Mas, duas dcadas de-pois, em 1940, a populao cearense quase duplicara (chegou a 2.091 mil pessoas), enquanto a fortalezense crescera duas vezes mais (180 mil hab.) (SILVA, 2000, p.221).

    Apesar de todo este crescimento populacional e de novos fatos econmicos, durante o pe-rodo da Repblica Velha ainda no havia sido concebido um sistema de organizao da diviso poltico-administrativa para dar conduo ao intenso processo de criao, extino e restau-rao de municpios, o qual permanecera da mesma forma do perodo anterior (desordenada e confl ituosa).3.1.4 A Era Vargas e da Repblica Populista

    Este perodo que compreende o Estado Novo at a Ditadura Militar, ou seja, de 1930 a 1963, foi marcado por grandes transformaes polticas, sociais e econmicas, com fortes im-pactos sobre o territrio e a populao.

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    Ainda no perodo da Segunda Guerra, o governo populista de Vargas apia a emigrao de milhares de cearenses e nordestinos para a Amaznia. Tais imigrantes viriam formar o chama-do exrcito da borracha, pois foram trabalhadores que atuaram como em regime de guerra, na explorao da borracha, visando o comrcio externo. Para tanto, havia sido criada, em 1942, a instituio Servio Especial de Mobilizao de Trabalhadores para a Amaznia (SEMTA) e a Hospedaria Getlio Vargas para os imigrantes em Fortaleza, em 1943 (IPLANCE, 1982).

    A