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ISBN: 978-85-7282-778-2 Página 1 ANÁLISE DO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA EM FAIXA DE PROTEÇÃO NO REVERSO DA CUESTA DE BOTUCATU (SP). Rafael Vilela de Andrade (a) , Cenira Maria Lupinacci (b) , Estêvão Botura Stefanuto (c) Stefanuto (c) (a) Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento, UNESP Rio Claro, [email protected] (b) Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento, UNESP Rio Claro, [email protected] (c) Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento, UNESP Rio Claro, [email protected] Eixo: Territorialidades, conflitos e planejamento ambiental Resumo O relevo cuestiforme é uma estrutura que contém forte relação com o sistema de drenagem, assim como acelerada dinâmica erosiva, sendo essencial sua preservação para a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A prefeitura de Botucatu (SP), através da Lei Complementar1224/2017, estipula uma faixa de proteção ambiental de 250 metros a partir da linha de ruptura do front da cuesta em direção ao seu reverso. Entretanto, a área correspondente à faixa conta com diversos tipos de usos já estabelecidos, anteriores à legislação, e o documento não especifica quais tipos de ocupação da terra são permitidos ou restritos sobre o local. Esse estudo utilizou instrumentos de geoprocessamento com a finalidade de mapear e quantificar os tipos de uso e ocupação da terra presentes sobre a faixa de proteção ambiental estipulada, fornecendo informações que auxiliem a prefeitura no planejamento ambiental do município. Palavras chave: Uso da terra; cuesta; planejamento ambiental; dinâmica erosiva.

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Page 1: ANÁLISE DO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA EM FAIXA DE … · os tipos de uso da terra adequados a cada região do município. Por se tratar de uma área de proteção, a faixa de 250

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ANÁLISE DO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA EM FAIXA DE

PROTEÇÃO NO REVERSO DA CUESTA DE BOTUCATU (SP).

Rafael Vilela de Andrade(a)

, Cenira Maria Lupinacci(b)

, Estêvão Botura

Stefanuto(c)

Stefanuto(c)

(a)Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento, UNESP – Rio Claro,

[email protected]

(b)Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento, UNESP – Rio Claro,

[email protected]

(c)Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento, UNESP – Rio Claro,

[email protected]

Eixo: Territorialidades, conflitos e planejamento ambiental

Resumo

O relevo cuestiforme é uma estrutura que contém forte relação com o sistema de

drenagem, assim como acelerada dinâmica erosiva, sendo essencial sua preservação para a

manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A prefeitura de Botucatu (SP), através

da Lei Complementar1224/2017, estipula uma faixa de proteção ambiental de 250 metros a partir

da linha de ruptura do front da cuesta em direção ao seu reverso. Entretanto, a área

correspondente à faixa conta com diversos tipos de usos já estabelecidos, anteriores à legislação, e

o documento não especifica quais tipos de ocupação da terra são permitidos ou restritos sobre o

local. Esse estudo utilizou instrumentos de geoprocessamento com a finalidade de mapear e

quantificar os tipos de uso e ocupação da terra presentes sobre a faixa de proteção ambiental

estipulada, fornecendo informações que auxiliem a prefeitura no planejamento ambiental do

município.

Palavras chave: Uso da terra; cuesta; planejamento ambiental; dinâmica erosiva.

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1. Introdução

O relevo de cuestas é identificado em diversas regiões do território nacional, sendo

encontrado sobre bordas de bacias sedimentares e caracterizado por grandes degraus

responsáveis pela separação entre os terrenos elevados dos planaltos e as regiões rebaixadas

das depressões periféricas (ROSS, 2009). A morfologia de cuestas contém duas feições

principais: o front, que corresponde à face íngreme responsável pelo desnível altimétrico

desse relevo, voltado para depressão, e o reverso, que corresponde à face suavemente

inclinada que se estende em direção ao planalto (TORRES, MARQUES NETO, MENEZES

2012).

A gênese do relevo de cuestas está relacionada com processos de erosão regressiva,

fazendo com que o front recue em direção ao reverso por processos de solapamento basal.

Dessa forma, o sistema de cuestas conta com uma dinâmica ativa, o que caracteriza essas

regiões como áreas de instabilidade e intensa atividade erosiva (PENTEADO, 1983). Em

meio a esse processo, a drenagem é um agente de grande importância que comanda os

processos erosivos sobre a cuesta e, por isso, o sistema de drenagem regional, e sua

conservação, estão intimamente ligados à dinâmica desses terrenos. Dessa forma, a

instabilidade dos terrenos no relevo cuestiforme é fator de risco aos recursos ambientais da

região, como a vegetação e a biodiversidade, a integridade do solo e, principalmente, o

sistema hídrico.

Stefanuto e Lupinacci (2019) relacionam processos erosivos com os padrões de uso e

ocupação do solo em relevos cuestiformes na região de Analândia (SP). De acordo com os

autores, o uso agrícola e de pastagens favorecem a instalação de processos erosivos sobre o

front, levando à degradação dessa forma de relevo. Assim, verifica-se a necessidade de uma

regulação adequada dos padrões de uso e ocupação da terra sobre essas regiões, com fins

conservacionistas.

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Buscando amenizar os possíveis problemas ambientais gerados pela degradação

erosiva em áreas de cuestas, a prefeitura de Botucatu (SP) desenvolveu instrumentos legais

que regulam o uso e ocupação do solo sobre essa morfologia. A Lei Complementar

1224/2017 que “Dispõe sobre o Plano Diretor Participativo do Município de Botucatu e dá

outras providências” determina no Art 73, Parágrafo único:

Fica estabelecida uma Zona Especial de Proteção Ambiental, passível de ser

subdividida em diferentes perímetros e regulamentada em diferentes níveis

de restrição, cobrindo todo o Front da Cuesta de Botucatu, assim como uma

faixa de terras com largura variável, igual ou maior a 250 (duzentos e

cinquenta) metros, a contar da linha de ruptura do front da Cuesta, em

direção ao reverso, a ser regulamentada em lei específica, devidamente

mapeada, visando à recuperação, preservação e segurança da Cuesta.

O macrozoneamento proposto pela legislação municipal pretende justamente regular

os tipos de uso da terra adequados a cada região do município. Por se tratar de uma área de

proteção, a faixa de 250 metros no reverso da cuesta deve contar com restrições aos padrões

de ocupação, visando amenizar os riscos ambientais relacionados a essa área de fragilidade

erosiva. Entretanto, a legislação não especifica quais padrões de uso da terra são adequados

para a faixa de proteção estabelecida.

Dessa forma, buscou-se realizar um levantamento da cobertura e do uso da terra, sobre

a faixa de proteção de 250 metros, a fim de diagnosticar as condições ambientais do reverso

da cuesta em Botucatu. Para tal, foi mapeada a faixa de proteção sobre o reverso cuestiforme

(Figura 1) e, em seguida formulado um mapa de uso e ocupação do solo, o qual se constituiu

em uma ferramenta de planejamento ambiental para o município, dentro de suas políticas

conservacionistas.

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2. Procedimentos Técnicos E Metodológicos

2.1. Faixa de proteção de 250 metros a partir da linha de ruptura do relevo.

A faixa de proteção ambiental de 250 metros a partir da linha de ruptura do relevo,

referente à Lei Complementar 1224/2017 foi mapeada a partir do uso de técnicas

morfométricas e de geoprocessamento em meio digital, no programa ArcGis 10.1. Utilizaram-

se os dados altimétricos do município de Botucatu correspondentes às curvas de nível e

sistema de drenagem, cedidos pela prefeitura, para a elaboração dos mapas de declividade e

de profundidade de drenagem do município, possibilitando a identificação de uma faixa de

grandes desníveis altimétricos, caracterizando o front cuestiforme.

Para definir com precisão a linha de ruptura do relevo, foi realizada uma análise das

ortofotos digitais do município, com resolução espacial de 1 metro, elaboradas pela

EMPLASA (2010/2011) e fornecidas pela prefeitura. Juntamente com os mapas de

declividade e profundidade de drenagem, utilizou-se o mosaico de ortofotos para traçar

manualmente a linha de ruptura do relevo. Os resultados desse mapeamento foram

reambulados em campo.

Em seguida, foi criado um polígono correspondente à faixa de preservação, utilizando-

se a ferramenta buffer. A partir do shapefile correspondente à linha de ruptura do relevo, a

ferramenta foi configurada com o valor de 250 (meters), e no campo Side Type selecionou-se

a opção RIGHT, uma vez que a faixa se estende apenas na direção do reverso. Com isso, foi

delimitado o polígono correspondente à faixa de proteçãode 250 metros determinada pela

legislação municipal (Figura 1).

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Figura 1: Mapa da Faixa de Proteção de 250 metros a partir da Linha de Ruptura do Front da Cuesta (Lei

Complementar 1224/2017)

2.2. Levantamento dos padrões de uso e ocupação da terra.

Para elaboração do mapa de uso e ocupação do solo utilizaram-se imagens orbitais do

sistema Sentinel2, do dia 22/10/2018, com resolução espacial de 10 metros, resolução

espectral de 16 bits e 13 bandas espectrais, georreferenciadas no sistema de projeção Sirgas

2000 UTM Zone 22S através do software ArcGis 10.1. A escala de mapeamento foi de

semidetalhe (1:40.000).

De acordo com o IBGE (2013), o uso e ocupação da terra é identificado através de

padrões homogêneos da cobertura terrestre. Dessa forma, delimitaram-se manualmente

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polígonos aos quais foram atribuídos os respectivos usos do solo. Essa etapa utilizou critérios

propostos por Anderson (1976) para mapeamentos de corberturas terrestres a partir de

imagens orbitais e de sensores remotos, baseados em cores, texturas, formas, associação com

áreas vizinhas, assim como conhecimento sobre a região.

Ao todo, foram criadas 10 classes de uso e ocupação, das quais 6 se enquadram na

classificação do IBGE (2013): áreas urbanizadas, áreas de mineração, silvicultura, pastagens,

águas continentais e área florestal. Foram escolhidas também 4 classes que não se enquadram

na classificação do IBGE, mas apresentam relevância para a análise dos tipos de uso na região

das cuestas de Botucatu: áreas agrícolas, pasto sujo, estradas e área construída.

Às áreas urbanizadas foram atribuídos os setores pertencentes à malha urbana. As

áreas construídas correspondem a elementos de infraestrutura que não pertencem à malha

urbana, como habitações rurais, agroindústrias e criadouros de animais.

A classificação do IBGE (2013) quanto ao uso e ocupação da terra determina como

duas classes distintas do uso agrícola as culturas permanentes e temporárias. Entretanto, nesse

trabalho a escala de semidetalhe não possibilitou a distinção desta característica dos itens

cultivados na região, e dessa forma, as culturas permanentes ou temporárias foram

enquadradas na classe áreas agrícolas. A distinção dessas coberturas se baseou nas áreas

vegetadas com padrões de disposição dos elementos, geralmente em fileiras e circunscritas em

polígonos bem delimitados, e também nas áreas de solo exposto, com padrões de formas

geométricas e presença de terraços agrícolas, que indicavam culturas temporárias na fase de

entre safras. A única cultura agrícola que foi individualizada com uma classe própria foi a

silvicultura, que, por consistirem no plantio de grandes árvores, as áreas ocupadas por essa

atividade apresenta uma dinâmica erosiva distinta das demais.

Diferentemente da classe das pastagens correspondentes a áreas que sugerem uso

regular e tratamento mecanizado, a classe pasto sujo foi criada para incluir áreas onde se

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encontram pastos degradados, muitas vezes abandonados pelo proprietário, com presença de

várias espécies vegetais e textura mais rugosa.

As áreas florestadas foram identificadas pela elevada rugosidade na textura e variação

dos tons de verde, o que as tornam feições de fácil identificação em toda região. As áreas de

mineração foram identificadas pela cor marrom e acinzentada, correspondentes locais de solo

exposto, mas que não estavam relacionadas às áreas de cultivo agrícola, e apresentavam

padrões de formas bem definidos, deixando claro que não se tratam de superfícies erodidas.

As águas continentais identificadas correspondem aos lagos artificiais em

propriedades rurais, feitos por represamento de canais. Devido à escala de semidetalhe, só

foram representados os reservatórios identificados na escala de 1:40.000, o que possibilita que

outros reservatórios menores não tenham sido mapeados. Por fim, as estradas correspondem a

rodovias pavimentadas identificadas nas imagens orbitais.

Após a classificação dos tipos de uso e ocupação da faixa de proteção de 250 metros,

as informações foram reambuladas através da plataforma do Google Maps, que conta com

imagens de maior resolução e possibilitou esclarecimentos quanto ao tipo de cobertura em

regiões de dúvida. Por fim, quantificaram-se os dados mapeados através da ferramenta

Calculate Geometry, sendo os mesmos apresentados por classes e em hectares.

3. Resultados

O processamento e tratamento quantitativo dos dados revelaram o seguinte padrão de

uso e ocupação do solo na faixa de proteção ambiental de 250 metros a contar da linha de

ruptura do front da cuesta em direção ao reverso (Tabela I).

Constata-se que, excluídas as áreas florestadas, os tipos de ocupação mais presentes

sobre a faixa de proteção são as pastagens, a agricultura e a silvicultura, que juntas somam

71,2% de toda a área analisada (Tabela I). Isso revela que a região da faixa de proteção está

inserida em uma zona de intenso uso do setor agropecuário. Em estudos semelhantes, a

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respeito do uso e ocupação do solo em microbacias do município de Botucatu, Campos et al.

(2015), tembém alertam para o intenso uso agropecuário na região, principalmente por

pastagens, cana de açucar e outros sistemas agrícolas, e o conflito destes padrões de uso com

áreas de preservação permanente da região.

Tabela I: Padrões de Uso e Ocupação da Terra sobre a Faixa de Proteção Ambiental de 250

metros a Partir da linha de Ruptura do Relevo de Botucatu.

Padrões de ocupação da terra Área (hm²) Porcentagem

Águas continentais 7,2 0,2%

Áreas de mineração 7,6 0,3%

Estradas 11,5 0,4%

Áreas urbanizadas 33,3 1,2%

Área construída 70,2 2,4%

Pasto sujo 103,8 3,6%

Silvicultura 201,1 7%

Culturas agrícolas 478,4 16,7%

Área florestal 577,4 20,2%

Pastagem 1.359,30 47,5%

TOTAL 2.860,30 100%

O mapa de declividade do município de Botucatu mostrou um relevo suavizado no

reverso da cuesta, o que vai de encontro com os apontamentos da bibliografia sobre esse

sistema de relevo (PENTEADO, 1983, TORRES, MARQUES NETO, MENEZES, 2012).

Isso favorece a instalação das atividades agropecuárias sobre o local. Entretanto, os terrenos

de reverso também estão inseridos na dinâmica de cuestas e, por isso, constituem áreas de

fragilidade, estando sensível aos problemas causados pelo o uso da terra.

Stefanuto e Lupinacci (2019) relacionam o uso da terra com a ocorrência de feições

erosivas em relevo cuestiforme no município de Analândia e identificam uma correlação entre

a ocorrência de sulcos e ravianas em locais de pastagem. Apesar dos autores relacionarem as

feições erosivas com demais elementos, como declividade, litologia e os tipos de solos, a falta

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de cobertura vegetal em ambientes de pastagem, favorecem os processos de erosão pluvial

(PENTEADO, 1983). Com uma área de 1.359,3 hm² de pastagem, equivalente a 47,5% da

faixa de proteção (Tabela I), identifica-se um uso que favorece a presença de processos

erosivos pluviais acelerados em grande parte da faixa de proteção.

O uso agrícola da região, que ocupa 16,7% da faixa, equivalente a 478,4 hm² (Tabela

I), aparenta forte presença de culturas temporárias, em especial a cana de açúcar, uma vez que

identificou-se muitas áreas de uso agrícola com solo exposto, sugerindo culturas temporárias,

o que também foi possível observar em campo, e relacionar com a bibliografia (CAMPOS et

al., 2015). As culturas temporárias também tornam o substrato mais frágil à erosão,

principalmente nos períodos entre safra, quando o solo fica exposto. A silvicultura também

tem forte expressão territorial, com uma área de 201,1 hm² (Tabela I), porém, este tipo de

cobertura, diferentemente das pastagens e culturas agrícolas, não potencializa tanto a erosão.

O dossel arbóreo quebra a energia das gotas de chuva, o que ameniza o processo erosivo

conhecido como splash, que correspode à desagragação das partículas superficiais do solo

com o impacto das gotas de chuva, fazendo com que esta cultura seja comumente empregada

em áreas com feições erosivas para fazer a recuperação do terreno.

As áreas de infraestrutura humana, representadas pelas áreas construídas (70,2 hm²) e

urbanizadas (33,3 hm²) (Tabela I), representam grande problema devido à instabilidade dessas

áreas. O recuo erosivo do front pode trazer riscos à estabilidade dessas estruturas, uma vez

que nos ambientes quentes e úmidos, a evolução do front por solapamento basal tende a ser

rápido (PENTEADO, 1983), podendo ser tal processo alterado devido ao impacto da

urbanização sobre a dinâmica de cuestas, uma vez que os alicerces das estruturas urbanas e a

impermeabilização do solo pode acelerar ou intensificar processos erosivos. Ainda, sobre a

malha urbana, a intabilidade pode ser agravada devido à densidade de construções e

habitantes na área, levando a um dano maior em caso de acidentes.

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As estradas, que representam uma área pequena da faixa de proteção, correspondendo

a apenas 0,4% total (Tabela I), tem seu impacto relacionado com obras feitas para sua

construção. É inevitável que se criem rotas de acesso para a cidade de Botucatu, localizada no

reverso da cuesta, que tenham de cruzar o front, entretanto é importante avaliar os danos e

riscos ambientais que essas estruturas oferecem. A construção de estradas frequentemente

necessita de cortes no relevo ou aterramentos, principalmente ao cruzarem o front, avançando

sobre relevos de alta declividade.

Foram identificadas duas áreas de mineração sobre a faixa de proteção ambiental no

reverso da cuesta, equivalentes a uma área de 7,6 hm² (Tabela 1). As minerações e a

consequente retirada de material do substrato rochoso atuam na destruição do front da cuesta.

Ainda, as águas continentais identificadas correspondem a represamentos, que não ocupam

uma área grande: 7,2 hm² (Tabela I), porém é necessário avaliar o impacto que esses

represamentos têm sobre a rede de drenagem regional. Como o reverso da cuesta é

identificado como área de nascentes, que cruzam o front para abastecerem o sistema de

drenagem regional, e como a manutenção da estrutura do front é dependente da ação das

drenagens anaclinais (TORRES, MARQUES NETO, MENEZES, 2012), é necessária uma

avaliação dos impactos dessas barragens sobre os sistemas de drenagem e o relevo da região.

Por fim, a faixa de proteção ambiental conta com 20,2% de áreas florestadas (Tabela

I). De acordo com Camposet al. (2015), as florestas nativas encontradas na região

correspondem a floresta latifoliada tropical, porém são nativas dessa região também as

fisionomias de cerrado, cerradão e capoeira (CAMPOS et al., 2015), as quais, entretanto, não

foram identificadas sobre a faixa. As áreas florestadas atuam na amenização do recuo do front

que ocorre naturalmente e desaceleram processos erosivos que podem se instalar na região.

Além disso, a ocupação das áreas de instabilidade por vegetação nativa, evita o risco que o

recuo erosivo do front pode trazer às atividades humanas.

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4. Considerações Finais

O planejamento ambiental no âmbito municipal é um exercício complexo, no qual

diversos fatores, ambientais, sociais e legais devem ser considerados no momento de

execução de um projeto de proteção ambiental. No caso de Botucatu, a necessidade de

preservação do relevo cuestiforme é clara, e para isso existe a Lei Complementar 1224/2017.

Entretanto, além da delimitação da área de proteção ambiental estipulada, resta ao poder

público definir quais são as restrições ao uso e ocupação e as possibilidades legais de executar

tais restrições, sobre a faixa de proteção de 250 metros a partir da linha de ruptura do relevo.

Diante desse panorama, as principais questões que a prefeitura deve enfrentar dizem respeito

às áreas de uso agropecuário, áreas urbanizadas e construídas.

O Brasil conta com um longo histórico de conflitos por causas ambientais envolvendo

proprietários rurais. A criação de uma faixa de proteção ambiental sobre uma área com 2038,8

hm² ocupados pelo setor agropecuário (pastagens, áreas agrícolas e silvicultura, Tabela I),

possivelmente apresentará resistência política do setor. Já as áreas urbanizadas e construídas

também constituem pontos problemáticos, uma vez que este tipo de ocupação não é adequado

aos terrenos próximos ao front devido ao risco de acidentes. Portanto, é necessária uma ação

direta do poder público quanto a isso, impedindo o desenvolvimento de novas áreas com esse

padrão de uso e ocupação, assim como se atentar às áreas onde essas estruturas já estão

consolidadas.

Ainda, para estabelecer critérios adequados quanto aos tipos de restrições aos padrões

de uso e ocupação da terra sobre o reverso cuestiforme, são necessários estudos mais

detalhados, que possibilitem quantificar o impacto causado por cada tipo de ocupação,

possibilitanto assim, uma avaliação que relacione e compare os impactos ambientais gerados,

com os outros aspectos, sociais e legais, que envolvem o planejamento ambiental.

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5. Referências Bibliográficas

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PENTEADO, Margarida M. Fundamentos de Geomorfologia. 3. Ed. – Rio de Janeiro:

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ROSS, Jurandir L. S. (Org.) Geografia do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São

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TORRES, Felipe T. P., MARQUES NETO, Roberto, MENEZES, Sebastião de Oliveira.

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Analândia (SP). Caminhos de Geografia. Uberlândia, v. 20, n. 70, p. 367–384, 2019.