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Telhados verdes: estudo quantitativo de eficácia técnica e econômica Green roofs: a quantitative evaluation of technical and economical efficacy Patrícia Strumiello Daraia Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil [email protected] André Luiz de Lima Reda Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil; Escola de Engenharia Mauá do IMT, São Caetano do Sul, SP [email protected] Abstract — Green roofs are presented as a sustainable alternative for drainage designers to curb urban floods due to soil impermeabilisation – as it happens in São Paulo city. Only recently, this ancient architectural technique became adopted in Brazil, receiving technical recognition in terms of improvements, qualities and advantages. Literature research was performed on their hydraulic efficiency and advantages. Their water retention capacity was analysed as a function of substrate thickness, and an existing design spreadsheet was used in this analysis, showing that retention volumes increase for growing substrate thicknesses – however, only up to a limit (remaining constant after it). Also, the use of Berthelot’s algorithm to estimate infiltrated rainfall heights on a discrete rainfall histogram was demonstrated – having shown advantageous for permeable soils, rather than the traditional Horton’s formula. Finally, an economic analysis showed the feasibility of adopting green roofs at private building, and public areas – the former showing most advantageous. Keywords — Green roof, water retention and infiltration, substrate thickness, Berthelot algorithm, economic viability I. INTRODUÇÃO Enchentes urbanas trazem grande prejuízo à sociedade. A impermeabilização do solo urbano aumenta as enxurradas e, portanto, o volume que chega de imediato aos corpos d’água, que não têm capacidade para recebê-los e extravasam – a exemplo do que ocorre na cidade de São Paulo. Tal histórico é constrangedor para a engenharia brasileira, que, apesar dos investimentos em obras públicas, constantemente os vê anulados por freqüentes inundações. Tende-se a canalizar e retificar rios e córregos, o que frequentemente não resolve o problema, só transfere a inundação para jusante e exige novas medidas para superar as consequências na nova área atingida. Dado o rápido avanço da urbanização, por responsabilidade da construção civil, estuda-se há muito tempo medidas para conter enxurradas, mas alternativas às obras de macrodrenagem tradicionais. Dentre elas, vem crescendo a tecnologia dos "telhados verdes", que retêm temporária e parcialmente as águas pluviais, influem nas conseqüências da insolação no microclima e biodiversidade urbanos e diminuem a poluição do ar (BRENNEISEN, 2004, apud [12]). Telhado verde ou cobertura verde é uma técnica de arquitetura que consiste em aplicar solo e vegetação sobre uma cobertura impermeável, em edificações de vários tipos. Historicamente, encontram-se registros de seu uso desde 600 a.C., na Babilônia, Mesopotâmia e Império Romano. Na Islândia, é secular [10], mostrando não ser técnica nova. Porém, o reconhecimento técnico de suas vantagens, qualidades e benfeitorias na modernidade só começou recentemente. E, daí, têm surgido estudos sobre o comportamento hidrológico, térmico e acústico das coberturas verdes, que vão deixando de ser vistas só pelo valor estético. Os estudos térmicos e hidrológicos foram os que mais obtiveram destaque. É, pois, relevante estudar as características e vantagens dos telhados verdes, bem como sua viabilidade econômica. O objetivo geral do trabalho é avaliar a eficiência de telhados verdes sobre construções nas cidades para amenizar enchentes e o microclima urbano, especialmente em São Paulo. Como objetivo específico, o artigo estuda a capacidade de retenção do telhado verde para reduzir inundações e o impacto da variação da espessura do substrato nessa retenção. Também visa avaliar custos na adoção do telhado verde e sua viabilidade econômica, tanto para o morador quanto para a Prefeitura. II. METODOLOGIA Inicialmente, foi realizada pesquisa bibliográfica no tema. Nas propostas de dimensionamento hipotético de telhado verde, foi usada a tabela dinâmica de Tanzillo e Costa [18]. A análise do impacto da variação da espessura do substrato na capacidade de retenção foi baseada em resultados da planilha. Analisou-se a viabilidade econômica da adoção de telhado verde usando preços providos ao projetista em tabelas públicas. III. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA DO ESTADO DA ARTE A drenagem urbana se baseia numa infraestrutura com a função de coletar, armazenar, transportar e finalmente dar às águas pluviais destinos adequados, em quantidades adequadas. Aplica diversas medidas para minorar o impacto das enchentes. Na cidade moderna, com solo quase todo impermeabilizado, a chuva é pouco absorvida e levada mais rápido para jusante, pela alta velocidade da enxurrada. Isto aumenta picos de cheias em áreas baixas, transferindo para elas a inundação. Com isto, a rede de drenagem ali se torna insuficiente. Segundo Tucci [20], "Para casos extremos, verifica-se que o pico da cheia numa área urbanizada pode chegar a ser seis vezes maior do que o pico desta mesma bacia em condições naturais". Em © 2017 SHEWC XVII Safety, Health and Environment World Congress 35 July 09-12, 2017, Vila Real, PORTUGAL DOI 10.14684/SHEWC.17.2017.35-39

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Telhados verdes: estudo quantitativo de eficácia técnica e econômica

Green roofs: a quantitative evaluation of technical and economical efficacy

Patrícia Strumiello Daraia Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana

Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil [email protected]

André Luiz de Lima Reda Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie-UPM, São Paulo, SP, Brasil; Escola de Engenharia Mauá do IMT, São Caetano do Sul, SP

[email protected]

Abstract — Green roofs are presented as a sustainable alternative for drainage designers to curb urban floods due to soil impermeabilisation – as it happens in São Paulo city. Only recently, this ancient architectural technique became adopted in Brazil, receiving technical recognition in terms of improvements, qualities and advantages. Literature research was performed on their hydraulic efficiency and advantages. Their water retention capacity was analysed as a function of substrate thickness, and an existing design spreadsheet was used in this analysis, showing that retention volumes increase for growing substrate thicknesses – however, only up to a limit (remaining constant after it). Also, the use of Berthelot’s algorithm to estimate infiltrated rainfall heights on a discrete rainfall histogram was demonstrated – having shown advantageous for permeable soils, rather than the traditional Horton’s formula. Finally, an economic analysis showed the feasibility of adopting green roofs at private building, and public areas – the former showing most advantageous.

Keywords — Green roof, water retention and infiltration, substrate thickness, Berthelot algorithm, economic viability

I. INTRODUÇÃO

Enchentes urbanas trazem grande prejuízo à sociedade. A impermeabilização do solo urbano aumenta as enxurradas e, portanto, o volume que chega de imediato aos corpos d’água, que não têm capacidade para recebê-los e extravasam – a exemplo do que ocorre na cidade de São Paulo. Tal histórico é constrangedor para a engenharia brasileira, que, apesar dos investimentos em obras públicas, constantemente os vê anulados por freqüentes inundações. Tende-se a canalizar e retificar rios e córregos, o que frequentemente não resolve o problema, só transfere a inundação para jusante e exige novas medidas para superar as consequências na nova área atingida.

Dado o rápido avanço da urbanização, por responsabilidade da construção civil, estuda-se há muito tempo medidas para conter enxurradas, mas alternativas às obras de macrodrenagem tradicionais. Dentre elas, vem crescendo a tecnologia dos "telhados verdes", que retêm temporária e parcialmente as águas pluviais, influem nas conseqüências da insolação no microclima e biodiversidade urbanos e diminuem a poluição do ar (BRENNEISEN, 2004, apud [12]). Telhado verde ou cobertura verde é uma técnica de arquitetura que consiste em aplicar solo e vegetação sobre uma cobertura impermeável, em edificações de vários tipos. Historicamente, encontram-se registros de seu uso desde 600 a.C., na Babilônia,

Mesopotâmia e Império Romano. Na Islândia, é secular [10], mostrando não ser técnica nova. Porém, o reconhecimento técnico de suas vantagens, qualidades e benfeitorias na modernidade só começou recentemente. E, daí, têm surgido estudos sobre o comportamento hidrológico, térmico e acústico das coberturas verdes, que vão deixando de ser vistas só pelo valor estético. Os estudos térmicos e hidrológicos foram os que mais obtiveram destaque. É, pois, relevante estudar as características e vantagens dos telhados verdes, bem como sua viabilidade econômica.

O objetivo geral do trabalho é avaliar a eficiência de telhados verdes sobre construções nas cidades para amenizar enchentes e o microclima urbano, especialmente em São Paulo.

Como objetivo específico, o artigo estuda a capacidade de retenção do telhado verde para reduzir inundações e o impacto da variação da espessura do substrato nessa retenção. Também visa avaliar custos na adoção do telhado verde e sua viabilidade econômica, tanto para o morador quanto para a Prefeitura.

II. METODOLOGIA

Inicialmente, foi realizada pesquisa bibliográfica no tema.

Nas propostas de dimensionamento hipotético de telhado verde, foi usada a tabela dinâmica de Tanzillo e Costa [18]. A análise do impacto da variação da espessura do substrato na capacidade de retenção foi baseada em resultados da planilha.

Analisou-se a viabilidade econômica da adoção de telhado verde usando preços providos ao projetista em tabelas públicas.

III. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA DO ESTADO DA ARTE

A drenagem urbana se baseia numa infraestrutura com a função de coletar, armazenar, transportar e finalmente dar às águas pluviais destinos adequados, em quantidades adequadas. Aplica diversas medidas para minorar o impacto das enchentes.

Na cidade moderna, com solo quase todo impermeabilizado, a chuva é pouco absorvida e levada mais rápido para jusante, pela alta velocidade da enxurrada. Isto aumenta picos de cheias em áreas baixas, transferindo para elas a inundação. Com isto, a rede de drenagem ali se torna insuficiente. Segundo Tucci [20], "Para casos extremos, verifica-se que o pico da cheia numa área urbanizada pode chegar a ser seis vezes maior do que o pico desta mesma bacia em condições naturais". Em

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áreas rurais isto muda – a vegetação atrasa a enxurrada e a infiltração no subsolo reduz seu volume. Além de ultrapassar valores hidráulicos máximos permitidos, quando a enchente transborda para fora da rede de drenagem, contamina-se com lixo e esgoto e a água assim poluída pode propagar doenças.

Enchentes são um fenômeno natural, às vezes intensificado pela ação do homem [3]. Portanto, a inundação, consequência indesejável da enchente excessiva que ultrapassa a capacidade da rede de drenagem, é um problema com raízes diversificadas e combinadas, naturais e antrópicas.

Segundo Heneine [7], telhado verde é o emprego de solo e vegetação sobre a cobertura da edificação. Usa gramíneas ou plantas suculentas, dentre outras, conforme o intuito do projeto. Classifica-se em três categorias, a saber: intensivo, extensivo e semiextensivo. O intensivo tem substrato de no mínimo 20cm e baixa declividade, permitindo vegetação densa e até lenhosa. Telhados verdes do tipo extensivo têm substrato entre 2,5 e 15cm de espessura, suportando maior declividade e permitindo o crescimento de vegetação rasteira com raiz pouco profunda. Sua manutenção e irrigação exigem pouco ou quase nenhum esforço e sua instalação tem baixo custo, além de não exigir estruturas de apoio de alta resistência. O semiextensivo é intermediário entre o intensivo e o extensivo, com espessura de 12 a 15 cm, podendo combinar as vantagens de ambos.

Entre as principais vantagens do telhado verde, estão suas capacidades de reter água, mudar a umidade relativa do ar, diminuir amplitudes térmicas, reduzir ruídos, melhorar a qualidade do ar e proteger a estrutura da cobertura predial.

Uma alteração climática moderna e perceptível é a elevação gradual da temperatura urbana, com a possível criação de ilhas de calor e elevada variação de temperatura. Segundo Minke [10], lajes impermeabilizadas na Europa sofrem variação de temperatura de -20° até 80°C. Catuzzo [4] afirma que telhados verdes podem reduzir os problemas relacionados à variação de temperatura e umidade relativa do ar, mostrando resultados práticos com amplitude térmica de 5,3ºC usando telhado verde. Além disto, relata aumento de 15,7% na umidade relativa do ar ao se passar de telhado convencional para o verde. Conclui-se, daí, que o telhado verde pode gerar economia da energia para aclimatação interna na edificação, rumo à sustentabilidade.

Outra característica benéfica dos telhados verdes é sua capacidade de absorver ruídos, muito útil nas grandes cidades com poluição sonora que afeta a saúde física e psicológica. Para Machado et al. [9], telhados convencionais expandem as ondas sonoras, permitindo à poluição sonora mais facilmente penetrar nos edifícios ou escapar. Entretanto, plantas e substrato em telhados e paredes verdes absorvem ondas sonoras e reduzem bastante a poluição sonora dentro dos edifícios.

Adicionalmente aos benefícios dos telhados verdes citados, acrescenta-se a maior durabilidade da estrutura de cobertura – protegem–na da erosão da chuva e do vento. Minke [10] afirma que na Alemanha telhados verdes se denominam "telhados sólidos", dada sua capacidade de resistir a incêndios para espessuras de substrato acima de 3 cm; além de protegerem estruturas de concreto, madeira e outros materiais contra a erosão solar, por reduzirem a amplitude térmica.

Quanto à preocupação com o peso adicional aplicado pelo telhado à estrutura, Savi [16] considera 7 tipos de coberturas, estimando seus pesos pela NBR 6120 (“Carga para cálculo de estrutura de edificações”) e dados dos fornecedores. O do tipo hexagonal se mostrou o mais leve, pois novas tecnologias de materiais e construtivas têm contribuído para reduzir seu peso.

A característica mais importante do telhado verde, seja para o interesse da pesquisa, seja por urgências da drenagem urbana, é a capacidade de reter água. Vários estudos quantificam sua influência na diminuição de picos de cheia. O modelo de desempenho hidrológico de Palla et al. [13] mostra que, convertendo em verdes 100% dos telhados de uma região, reduzir-se-ia picos de vazão em média em 51%, com maior efeito ainda usando substrato mais profundo. Burszta-Adamiak [2] estuda a retenção da água pluvial em diversos tipos de telhado verde, obtendo relação média entre água retida e água precipitada cerca de 30% maior nos telhados verdes do que nos convencionais. Jobim [8] seleciona vários tipos de telhados verdes (modular, hexagonal, alveolar e de reciclados) medindo eficiência no fluxo pluvial e capacidade de armazenar sua água, bem como a influência sobre esta da adição de argila expandida. O volume do escoamento pluvial caiu entre 59 e 88,1%. A capacidade de armazenar água variou entre 8,2 e 14,2 mm/m², exceto no telhado de reciclados, que teve 22% de redução no volume e capacidades de armazenamento de 4,5 mm/m². No protótipo experimentado por Baldessar [1], de um total de 92.800 L de água precipitados, saíram somente 20.710 L, 22,3% do total – ou seja, 77,7% da chuva foram retidos.

Para o estudo de caso aqui efetuado, usou-se a planilha preparada por Tanzillo e Costa [18], numa simulação de chuva sobre telhado verde na cidade de São Paulo. Resultou amortecimento com retenção no volume, e pico 15% menor.

O levantamento bibliográfico de Daraia [5] apura ser a Alemanha pioneira em edifícios sustentáveis, com 40 anos de tradição em telhados verdes. Na América do Norte, Toronto, em 2010, foi a primeira cidade a exigir instalação de telhado verde em edifício novo, seja comercial, institucional ou residencial condominial. Em 2012, ampliou a lei para industriais. Durante os anos 90, a Suíça aprovou lei federal exigindo telhado verde em novas edificações. No Brasil, leis exigem sustentabilidade na drenagem pluvial, com infiltração no lote da edificação e área mínima de solo permeável. Em São Paulo, a Lei Municipal 13.276/2002 requer a execução de reservatório de retenção em terrenos com área impermeável além de 500 m², devendo reter volume mínimo de água precipitada em função dessa área. O telhado verde, no entanto, ainda não faz parte do cômputo legal da área permeável – o que incentivaria a obediência à Lei. Se o telhado verde fosse considerado área permeável, o valor do terreno cresceria sem ampliar a degradação ambiental.

Uma das leis do tipo mais conhecidas é a do ‘IPTU Verde’, Lei Municipal 6793/2011, de Guarulhos, SP, com benefícios fiscais – ex: desconto de até 20% no IPTU para a edificação sustentável. Houve recentemente projetos incentivando telhados verdes, tais como o corredor verde em torno do Minhocão, na cidade de São Paulo – 4.000m2 totais de jardins em ‘paredes verdes’, o maior jardim vertical da América e o terceiro maior do mundo à época. No momento, a Prefeitura implanta paredes

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verdes em muros laterais da Avenida 23 de Maio, eixo norte-sul da cidade [6] [11].

IV. ESTUDO DE CASO O caso adotado para estudos econômicos aqui apresentado

se deve a Tanzillo e Costa [18] (com a devida autorização daqueles autores, do mesmo grupo de pesquisa dos presentes autores), que adotaram uma bacia total com 900m2 de terreno e área de telhado de 500m2. A planilha Excel criada por aqueles autores arquiva as medidas geométricas das áreas envolvidas, as características do substrato, e, conforme o caso, simula a passagem de uma tormenta de projeto na forma de um hidrograma de enchente para cada fase do sistema drenante. Também para telhado convencional (alternativa de telhado sem plantas, na mesma edificação), a planilha calcula hidrogramas efluentes do telhado e do terreno. Para o telhado verde, são inicialmente criados pela planilha três hidrogramas: um para o escoamento superficial pela área verde; outro para o escoamento superficial pela área sem vegetação (área de terreno menos da área do telhado) e o último representando a saída de água por sob substrato (hidrograma de “exfiltração” do substrato). Compondo os três, resulta um hidrograma efluente do terreno com telhado verde, a ser comparado com o do telhado convencional, como mostra a Figura 1, onde o aspecto mais importante é o abatimento obtido, de cerca de 15%, na vazão de pico descarregada na rede pública de drenagem.

A infiltração no solo, devida à gravidade, é função das características de permeabilidade deste e é a causa da retenção pelo substrato, objetivo principal do telhado verde aqui em foco – determinante na sua eficiência. Um dos métodos mais conhecidos para estimar alturas pluviométricas infiltradas a cada incremento de tempo é a fórmula de Horton [19], incluída como ferramenta de cálculo na planilha. Uma das dificuldades no uso dessa fórmula é o caso da tormenta que, após discretizada no tempo, apresenta intervalo com incremento de altura pluviométrica precipitada inferior à altura máxima que pode infiltrar segundo a fórmula de Horton. Para resolver tal impasse, Daraia [5] discute o uso do algoritmo proposto por Berthelot em 1970 (ver [19], p. 344), lembrando que este problema não é importante no caso estudado, pois nele o ietograma da tormenta de projeto tem alturas pluviométricas relevantes em todos os intervalos.

Dentre as propriedades do telhado verde, a espessura do substrato tem especial importância por influenciar diretamente as vantagens da aplicação da técnica. É o fator mais relevante na determinação do peso total do telhado verde e, obviamente, de sua influência na carga da estrutura. Também influencia a capacidade de retenção das águas pluviais, devido ao aumento na capacidade de infiltração e no volume retido, visto ser este diretamente proporcional à espessura do substrato do telhado. Neste estudo, investiga-se a relação entre a espessura do substrato, obtida pela tabela dinâmica de Tanzillo e Costa [18], e o volume retido, sujeito também a outros fatores.

Fig. 1. Hidrogramas efluentes da bacia com e sem telhado verde (Fonte: [18])

No trabalho realizado por Tanzillo e Costa [18], foi adotada uma espessura de 158 mm, o que classifica esse sistema como semi-extensivo (tipo de telhado adotado no caso lá estudado). À busca de otimizar a capacidade de retenção, pode-se alterar a espessura do substrato na tabela dinâmica de Tanzillo e Costa [18] para investigar como o volume de águas pluviais retido varia em função de variações naquela espessura. Na parte da planilha que estima escoamento superficial e infiltração, pode-se alterar aquela espessura e observar a variação de valores importantes, tais como o volume total retido (em m³ e %), o volume total escoado com e sem telhado verde e o tempo de percolação no substrato.

Observou-se, com a espessura do substrato aumentando de 25 mm para 200 mm, um aumento gradual no volume retido coerente com aquela variação. Porém, a partir de 210 mm de espessura, não aumenta mais o volume retido (Figura 2). Fica constante, para os valores particulares dos parâmetros impostos à tabela dinâmica no caso estudado por Tanzillo e Costa (2012). Observa-se também que o tempo de retardo do escoamento vai crescendo quando a espessura aumenta gradualmente, mostrando aumento coerente com aquele das outras grandezas.

Fig. 2. Gráfico relacionando as grandezas envolvidas no amortecimento do escoamento pluvial pelo telhado verde (Fonte: [5])

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O máximo volume retido, de 15,715 m³, e a maior porcentagem de retenção obtida, 25,68%, foram resultados alcançados para a espessura de 210 mm – o que classifica o sistema como semiextensivo. Logo, pode-se constatar ser possível alcançar um desempenho satisfatório na retenção de águas pluviais mesmo sem usar sistema intensivo – que requer muita manutenção e carrega mais a estrutura. Uma relação entre grandezas que mostram o comportamento da água no processo de amortecimento do escoamento pluvial predial proposto em Tanzillo e Costa [18] é ilustrada no gráfico da Figura 2, para telhado de 100m2.

V. ANÁLISE ECONÔMICA No âmbito econômico, pode-se analisar o efeito de telhados

verdes sob dois ângulos diversos, a saber: o do morador da edificação e o do sistema público de drenagem pluvial.

Para estimar quanto o morador economiza com água, supõe-se que se consiga o volume retido estimado por Daraia ([5], 6.22, Tabela 6), que calcula o amortecimento pelo telhado da edificação com a planilha de cálculo do estudo de Tanzillo e Costa [18]. Sem o telhado verde, igual volume de água potável seria comprado pelo morador – que, com o telhado verde, o economizaria. Adota-se a categoria “Residencial Normal” de uso, prevista no Comunicado 03/2016 da Sabesp [15]. Apesar de o uso da água pluvial vir em prol da sustentabilidade, deve-se observar a legislação sobre qualidade da água para uso humano. Como não há lei especifica para água de telhado verde, adotou-se a NBR 13.969/97, para tanques sépticos (que no seu item 5.6.2 discorre sobre uso de esgoto tratado). Para estimar o custo da água para o morador, aplicaram-se as tarifas da Sabesp ao volume retido, obtendo-se a estimativa de custo da água aproveitada, como se fosse de reuso, para reduzir a conta de água do morador. Para a análise econômica dos custos resultantes de usar vários tipos de telhados verdes num caso hipotético, aplicou-se correção monetária à tabela de Savi [16], atualizando para 2017 (Tabela I) os preços relativos ao caso estudado. Porém, pesquisa da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio em 2012 indica tamanho médio do imóvel brasileiro como 73,24 m² (área útil). Assim, neste estudo comparativo entre preços de telhado verde e convencional se adotou área de 100m², além da de 500m², original de Tanzillo e Costa [18].

O estudo de Tanzillo e Costa [18] adota espessura de 158mm, resultando volume retido de 13,68 m³ e economia de R$ 42,38 (DARAIA [5]). Se o volume for mais de 20 m³, a tarifa da água potável a considerar deve ser maior. Assim, observa-se uma influência dos telhados verdes sobre a economia da residência positiva e relevante.

Na análise das vantagens para a drenagem pública, lembra-se que um benefício importante dos telhados verdes é sua capacidade de retenção, ajudando a diminuir picos de cheias. O excesso escorre superficialmente para a drenagem pública de águas pluviais. A visão mais favorável é que todos os telhados da região sejam verdes. Assim, estimam-se aqui duas situações, a primeira com 100% dos telhados verdes; a segunda com 50% dos telhados verdes, resultando volumes de retenção a serem cotejados para diversas espessuras. Pôde-se observar que, no cenário com 100% de aplicação de telhados verdes, a maior reservação possível pelos telhados resultou 25.144,00 m³, o que equivale a 24,25 % do volume total escoado no evento. Com

base em considerações hidráulicas, estima-se, neste caso, que o sistema público de drenagem poderia reduzir os diâmetros nominais das galerias de coleta pluviais um pouco menos de 24%. Para a vazão do exemplo, a consequente redução no preço de uma peça de concreto armado tipo PA2, para a Prefeitura, seria de R$ 263,09 para cerca de R$ 244,31 (cf. [14]; cálculos em [5]). Na larga escala, o impacto econômico seria bem maior. TABELA I. ATUALIZAÇÃO DOS CUSTOS DOS DIVERSOS TIPOS DE COBERTURAS

(Fonte: adaptado de [16]).

Para comparar o impacto econômico do amortecimento da cheia na rede de drenagem, tomam-se por base preços de tubos de concreto para drenagem de diversos diâmetros e equações de custo por metro linear de tubulação instalada. Os custos das diversas alternativas são estimados em Daraia [5].

Portanto, apesar de o custo de um telhado verde ser justificável para o munícipe que ocupa um imóvel, após certo tempo de amortização, é para o sistema público de drenagem urbana que se apresentam as maiores vantagens em adotar telhados verdes numa bacia. Por isso, alguns municípios do Brasil estão discutindo reduzir o IPTU para quem tiver telhado verde – por exemplo, Guarulhos, no estado de São Paulo [17].

VI. CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES Inicialmente, procedeu-se a revisão de conceitos relativos a

drenagem e enchentes urbanas, suas causas e conseqüências e seu histórico. Foi também efetuada uma revisão do estado da arte no uso de coberturas prediais. Assim, resume-se aqui, uma pesquisa bibliográfica abrangente sobre coberturas prediais verdes – a qual pode ser consultada, na íntegra, pelo leitor com interesse específico em Daraia [5].

Dando continuidade a estudos anteriores do grupo de pesquisa ao qual pertencem os autores, publicados na íntegra em 2012 por Tanzillo e Costa [18], reporta-se aqui, ainda, um ensaio de cálculo hidráulico para estimar o grau de amortecimento da onda de cheia que perpassa a cobertura de um imóvel durante uma chuva intensa, permitindo estimar a economia possível para o munícipe e para o poder público caso se adote telhados verdes de forma generalizada numa região. Concluiu-se que eles podem representar uma solução significativa, tanto para a segurança contra inundações quanto para baratear a gestão da água pluvial. Tal solução geraria relevante economia para o poder público (reduzindo os diâmetros necessários na rede municipal de drenagem), mas também certa economia na despesa com água para usos não nobres por parte do usuário da edificação – não tão relevante

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quanto aquela obtida pelo município – em virtude dos gastos para implantação da obra predial.

Com os cálculos investigativos acima citados, demonstrou-se a utilidade do software apresentado em [18] como ferramenta para projetar telhados verdes – um modelo matemático flexível, que pode ser ajustado pelo usuário para diferentes situações, podendo até ser enriquecido com rotinas e fórmulas adicionais, já que seu código é aberto ao usuário esclarecido.

A capacidade de absorção e de menor emissão de radiação solar pelos telhados cobertos por vegetação, reduzindo a amplitude térmica; sua influência na evaporação para controle de umidade atmosférica na cidade, por evapotranspiração; a ação da vegetação no resgate do carbono oxidado presente na atmosfera, colaborando para mitigar o efeito estufa; a absorção de ondas sonoras, reduzindo ruídos, e a possibilidade de proteger a parte superior da estrutura predial contra alguns fatores agressivos também são classificadas como vantagens dos telhados verdes pela revisão bibliográfica desenvolvida no trabalho mais abrangente no qual se baseia o relato parcial desta publicação, devido a Daraia [5] – que também pode ser consultado pelo leitor interessado.

O fato de as estimativas quantitativas deste trabalho serem aproximadas, baseadas em índices e taxas típicas regionais, sugere a importância de se desenvolver futura pesquisa sobre este mesmo tema com maior profundidade e maior acuracidade e com base em dados coletados de fato, seja em campo ou laboratório. Ensaios hidráulicos em bacias experimentais representando telhados verdes precisam ser realizados para respaldar – e até corroborar ou corrigir – o esquema numérico da modelagem matemática aqui efetuada.

REFERÊNCIAS [1] BALDESSAR, S. M. N. Telhado verde e sua contribuição na redução da

vazão da água pluvial escoada. Curitiba, PR. 2012. Dissertação. (Mestrado em Construção Civil) - Área de concentração: Ambiente Construído. UFPR, Curitiba. Disponível em: <http://www.prppg.ufpr.br/ppgcc/sites/www.prppg.ufpr.br.ppgcc/files/dissertacoes/d0168.p df>

[2] BURSZTA-ADAMIAK, E. Analysis of the retention capacity of green roofs. Journal of Water and Land Development, v. 16, n. 1/6, pp. 3-9, 2012.

[3] CANHOLI, A. P. Drenagem ubana e controle de enchentes. São Paulo: Oficina de Textos, 2005. 302 p.

[4] CATUZZO, H. Telhado verde: impacto positivo na temperatura e umidade do ar. O caso da Cidade de São Paulo. São Paulo, 2013. Tese (Doutorado) - Área de Concentração: Geografia Física. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8135/tde-18122013-123812/pt-br.php>.

[5] DARAIA, P. S. Telhados verdes: estudo quantitativo de eficácia técnica e econômica. 2017. Trabalho de conclusão de curso em Engenharia Civil, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2017, 74p.

[6] Estadão Conteúdo. Plantas vão substituir grafites na Avenida 23 de maio. 2017. São Paulo: Agência Estado, 27/01/2017. Disponível em:

https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2017/01/27/plantas-vao-substituir-grafites-na-avenida-23-de-maio.htm. Acesso em 29/04/17

[7] HENEINE, M.C.A.S. Cobertura Verde. 2008. 49 p. Monografia apresentada ao Curso de Especialização em Construção Civil da Escola de Engenharia UFMG, Belo Horizonte, 2008. Disponível em: <http://www.cecc.eng.ufmg.br/trabalhos/pg1/Monografia%20Maria%20Cristina%20Almeida.pdf>

[8] JOBIM, A. L. Diferentes tipos de telhados verdes no controle quantitativo da água pluvial. Dissertação (Mestrado em Engenharia) - Curso de Mestrando Profissionalizante em Engenharia, Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, 2013.

[9] MACHADO, M. V. ; BRITTO, C.; NEILA J.. El cálculo de la conductividad térmica equivalente en la cubierta ecológica. Revista on-line de ANTAQ, v.3, n.3, jul./set. 2003. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/ambienteconstruido/article/view/3495/1896>

[10] MINKE, G. Techos verdes. Planificación, ejecución, consejos prácticos. Uruguai: EcoHabitar, 2005, 86 p.

[11] NEVES, F. P. Minhocão ganha novo jardim vertical e chega a 4.000 m² de paredes verdes. São Paulo: Folha de São Paulo. 16/12/2016. 1p. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/12/ 1841529-minhocao-ganha-novo-jardim-vertical-e-chega-a-4000-m-de-paredes-verdes.shtml>. Acesso em 29/04/17

[12] OLIVEIRA, E. W. N.; SILVA, L. P. Telhados verdes para habitações de interesse social: retenção das águas pluviais e conforto térmico. 2009. 87 f. Dissertação (Mestrado em Gestão Sustentável de Recursos Hídricos) -Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro, 2009. Disponível em: <http://www.peamb.eng.uerj.br/producao.php?id=205>

[13] PALLA, A.; BERRETTA, C.; LANZA, L. G.; LA BARBERA, P. Modelling Storm Water Control Operated by Green Roofs at the Urban Catchment Scale University of Genoa - Italy, In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON URBAN DRAINAGE, 11, Edinburgh, 2008. Proceedings… Edinburgh, 2008.

[14] Prefeitura de São Paulo. Início - Secretarias - Serviços e Obras / Tabela de custos. São Paulo: Prefeitura de São Paulo, Secretaria Municial de Serviços e Obras Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/obras/tabelas_de_custos/index.php?p=232211>. Acesso em 2/05/17

[15] Sabesp. Comunicado - 03/16. São Paulo: Sabesp. Diário Oficial do Estado de São Paulo, 12 de abril de 2016. 15p. Disponível em: <http://site.sabesp.com.br/site/uploads/file/clientes_servicos/comunicado_03_2016.pdf>. Acesso em 10/05/17

[16] SAVI, A. Telhados Verdes: análise comparativa de custo com sistemas tradicionais de cobertura. 2012. 125 Folhas. Monografia (Construções Sustentáveis) - Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba.

[17] SPITZCOVSKY, D. Guarulhos implanta IPTU Verde. Editora Abril S.A.: Planeta Sustentável, São Paulo, 5 jul. 2011. Disponível em: <http://planetasustentavel.abril.com.br/noticias/desconto-iptu-verde-guarulhos-beneficiofiscal-sustentabilidade-moradias-632838.shtml>

[18] TANZILLO, A. A.; COSTA, G. B. Telhados verdes: uma proposta de dimensionamento para a sustentabilidade em urbanização e drenagem sustentáveis. 2012. Trabalho de conclusão de curso em Engenharia Civil, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2012, 123p.

[19] TUCCI C. E. M.; PORTO, R. L. L.; BARROS, M. E. Drenagem Urbana. 1.ed. 428p. Porto Alegre: Ed. da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1995.

[20] TUCCI, C. E. M. (Org.). Hidrologia: ciência e aplicação. 2 ed., São Paulo: Editora Universidade EDUSP/ABRH, 2000.

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