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TRABALHO INFANTIL E IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL (PETI) NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Child work trends and international Program for Erradication of Child Work implementation in Rio de Janeiro Raphael Mendonça Guimarães 1 , Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus 2 , Eduardo Santiago Bravo 3 , Fabíola Braz Penna 4 RESUMO Este é um estudo ecológico se série temporal onde foi analisada a tendência das taxas de trabalho infantil de 1992 a 2006 no Estado do Rio de Janeiro, examinando- se o período antes e depois da implantação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Foi utilizada a técnica de regressão linear para observar o comportamento da tendência para o período completo e desagregado par aos períodos de 1992 a 1998, 1999 a 2002 e 2003 a 2006. Observou-se o padrão de decréscimo das taxas ao longo do período. Entretanto, a tendên- cia não foi a mesma ao desagregar por períodos específicos, relacionados à implantação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil no Rio de Janeiro. Conclui-se que a situação de trabalho infantil é particularmente sensível às ações de políticas públicas, e reforça-se, portanto, a implantação e o aumento de cobertura deste tipo de políticas para minimizar a desigual- dade social no Rio de Janeiro. PALAVRAS- CHAVE Trabalho infantil, saúde do trabalhador, regressão linear, avaliação de po- líticas ABSTRACT This is a time-trend ecological study to analyze child work rates from 1992 to 2006 at Rio de Janeiro, examining the period before and after the imple- mentation of the International Program for Eradication of Child Work. Lin- ear regression has been done to analyze the trends profile overall the period and disaggregated pairs of 1992 to 1998, 1999 to 2002 and 2003 to 2006. The rates were shown to be decreasing throughout the period. However, the trends were not the same when the period is disaggregated, regarding the International Program for Eradication of Child Work implantation in Rio de Janeiro. It’s concluded that child work is particularly sensitive to public politics, thus we emphasize that the implantation and increase of the covering of these kinds of politics reduce social inequity in Rio de Janeiro. 1 Mestre em Saúde Coletiva. Enfermeiro do Hospital Universitário Graffrée e Guinle. End: Rua Mariz e Barros, 775 – Tijuca CEP: 20.270-004 E-mail: [email protected] 2 Doutora em Engenharia de Produção. Professora Adjunta da Faculdade de Medicina e do instituto de Estudos em Saúde Coletiva – UFRJ. 3 Especialista e Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana. Secretaria de Estado de Saúde e Defesa Civil do Rio de Janeiro – SESDEC-RJ C AD . S AÚDE C OLET ., R I O D E J ANEIRO , 17 (3): 593 - 602, 2009 – 593

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tRaBalho infantil e implantação do pRogRama de eRRadiCação do tRaBalho infantil (peti) no eStado do Rio de JaneiRo

Child work trends and international Program for Erradication of Child Work implementation in Rio de Janeiro Raphael Mendonça Guimarães1, Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus2, Eduardo Santiago Bravo3, Fabíola Braz Penna4

rESUmo

Este é um estudo ecológico se série temporal onde foi analisada a tendência das taxas de trabalho infantil de 1992 a 2006 no Estado do Rio de Janeiro, examinando­se o período antes e depois da implantação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Foi utilizada a técnica de regressão linear para observar o comportamento da tendência para o período completo e desagregado par aos períodos de 1992 a 1998, 1999 a 2002 e 2003 a 2006. Observou-se o padrão de decréscimo das taxas ao longo do período. Entretanto, a tendên­cia não foi a mesma ao desagregar por períodos específicos, relacionados à implantação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil no Rio de Janeiro. Conclui-se que a situação de trabalho infantil é particularmente sensível às ações de políticas públicas, e reforça-se, portanto, a implantação e o aumento de cobertura deste tipo de políticas para minimizar a desigual­dade social no Rio de Janeiro.

palavraS-ChavE

Trabalho infantil, saúde do trabalhador, regressão linear, avaliação de po­líticas

abStraCt

This is a time-trend ecological study to analyze child work rates from 1992 to 2006 at Rio de Janeiro, examining the period before and after the imple­mentation of the International Program for Eradication of Child Work. Lin­ear regression has been done to analyze the trends profile overall the period and disaggregated pairs of 1992 to 1998, 1999 to 2002 and 2003 to 2006. The rates were shown to be decreasing throughout the period. However, the trends were not the same when the period is disaggregated, regarding the International Program for Eradication of Child Work implantation in Rio de Janeiro. It’s concluded that child work is particularly sensitive to public politics, thus we emphasize that the implantation and increase of the covering of these kinds of politics reduce social inequity in Rio de Janeiro.

1 Mestre em Saúde Coletiva. Enfermeiro do Hospital Universitário Graffrée e Guinle. End: Rua Mariz e Barros, 775 – Tijuca CEP: 20.270-004 E-mail: [email protected]

2 Doutora em Engenharia de Produção. Professora Adjunta da Faculdade de Medicina e do instituto de Estudos em Saúde Coletiva – UFRJ.

3Especialista e Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana. Secretaria de Estado de Saúde e Defesa Civil do Rio de Janeiro – SESDEC-RJ

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R a f a e l m e n d o n ç a g u i m a R ã e S , C a R m e n i l d e S R o d R i g u e S

f R ó e S a S m u S , e d u a R d o S a n t i a g o B R a v o , f a B í o l a B R a z p e n n a

KEy wordS

Child work, workers´ health, linear regression, politics evaluation

1. introdUção

O trabalho infantil é um fenômeno indicativo das condições econômicas, sociais e políticas de uma região (Dall´Agnol & Facchini, 2000; oit, 2006). Esta relação, há tempos, tem despertado a preocupação das Nações Unidas de forma a elaborar estratégias de erradicação do trabalho infantil, como e o caso do PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) (ILO, 2002).

O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), vinculado à SEAS – Secretaria de Estado de Assistência Social do Ministério da Previdência e As­sistência Social foi lançado em 1996, como uma das primeiras ações concretas resultantes de denúncias e reivindicações relacionadas ao trabalho de crianças no Brasil. Surgiu com a perspectiva de eliminar as piores formas de trabalho de cri­anças e adolescentes no país. Em 1998, este programa atingia as regiões canaviais do estado do Rio de Janeiro, sendo o marco inicial da expansão do Programa em todo o estado (Brasil, 2008a).

Em 2001, através da análise dos dados da PNAD naquele momento, constatou­se que as taxas de trabalho infantil, tanto no Rio de Janeiro como no Brasil como um todo, voltaram a crescer após registrar queda por vários anos. Esta constatação trouxe a necessidade de uma revisão do programa, que foi elaborada, e implemen­tada a partir de 2002.

Observa-se, portanto, que há claramente três momentos distintos para a avaliação do PETI: anterior à implantação original no Rio de Janeiro, entre a implantação original e a revisão do Programa, e após a revisão do Programa. Para tal, foram utilizados dados referentes aos períodos entre 1992 a 1998, 1999 a 2002 e 2003 a 2006.

Os objetivos deste trabalho são, portanto: estudar a tendência do trabalho infantil no período de 1992 a 2006 em adolescentes de 10 a 14 anos, e avaliar o comportamento da série temporal nos períodos anterior à implemen­tação do PETI, posterior à implantação e posterior à sua revisão no estado do Rio de Janeiro.

2. mÉtodo

dElinEamEnto

Trata-se de um estudo ecológico de séries temporais, de análise exploratória, onde foi analisada a tendência das taxas de trabalho infantil no estado do Rio de Janeiro entre 1992 e 2006 (Latorre & Cardoso, 2001; Neter et al., 1990; Mon­tgomery & Peak, 1992). A análise da tendência foi realizada por meio INDICAR

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t R a B a l h o i n f a n t i l e i m p l a n t a ç ã o d o p R o g R a m a d e e R R a d i C a ç ã o d o

t R a B a l h o i n f a n t i l ( pet i ) n o e S t a d o d o R i o d e J a n e i R o

A TÉCNICA das taxas de trabalho infantil obtidas através da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD/IBGE).

Foram calculadas as taxas de trabalho infantil para o estado do Rio de Janeiro no período descrito, a partir do método de cálculo da Rede Interagencial de Informações Para a Saúde (RIPSA). Segundo a ficha de qualificação técnica da Ripsa, Taxa de trabalho infantil (Taxa de atividade infantil) é o Percentual da população residente de 10 a 14 anos de idade que se encontra trabalhando ou procurando trabalho na semana de referência, em determinado espaço geográfico, no ano considerado. A fórmula indicada para cálculo é: (Número de crianças residentes de 10 a 14 anos de idade que se encontram trabalhando ou procurando emprego na semana de referência / População total residente desta mesma faixa etária) * 100

modElagEm EStatíStiCa

No processo de modelagem, as taxas de trabalho infantil foram consid­eradas como variável dependente (Y) e os anos calendário de estudo como variável independente (X). Realizou-se a transformação da variável ano na variável ano-centralizada (Latorre & Cardoso, 2001; Neter et al., 1990). Como medida de precisão do modelo utilizou-se o coeficiente de determinação (R2).

Utilizou-se o modelo de regressão linear simples (Y = β0 + β1X), para de­screver a tendência de aumento, declínio ou manutenção das taxas de trabalho infantil para o período analisado Estabeleceu-se, para os modelos de regressão obtidos, como medida de precisão, o coeficiente de determinação (R2). Con­siderou-se tendência significativa aquela cujo modelo estimado obteve p<0,05.

Após a análise da tendência do trabalho infantil nos últimos 15 anos, desagregou-se a série nos três períodos descritos anteriormente: anterior à im­plantação original do PETI no Rio de Janeiro, entre a implantação original e a revisão do Programa, e após a revisão do Programa. Para tal, foram utilizados dados referentes a, respectivamente, 1992 a 1998, 1999 a 2002 e 2003 a 2006.

Os cálculos das taxas de trabalho infantil e gráficos com as séries históri­cas foram elaborados em planilhas do Excel (Versão 2007 para Windows Vista) e as análises de tendências realizadas no Statistical Package for Social Sciences (SPSS v.17.0).

ConSidEraçõES ÉtiCaS

O presente estudo foi conduzido dentro dos padrões exigidos pela Declaração de Helsinque e aprovado pela comissão de ética da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca /FIOCRUZ, registro CAAE nº 0198.0.031.000-08.

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R a f a e l m e n d o n ç a g u i m a R ã e S , C a R m e n i l d e S R o d R i g u e S

f R ó e S a S m u S , e d u a R d o S a n t i a g o B R a v o , f a B í o l a B R a z p e n n a

3. rESUltadoS

As taxas de trabalho infantil, no período estudado, diminuíram no Estado do Rio de Janeiro. O valor médio no período foi de 5,21%, com queda não linear, decrescente a maior parte do tempo, mas instável ao final. Este decréscimo foi de aproximadamente 71,1%, e as taxas estão descritas na Figura 1.

Analisando as tendências em cada corte temporal (Figuras 2, 3 e 4), observa­se que o comportamento descrito anteriormente não se deu homogeneamente. O comportamento não se mostrou semelhante no que se refere à tendência no período analisado como um todo ou desagregado em anterior e posterior à implantação do PETI no Estado do Rio de Janeiro.

10 y=-0,4345x + 8 ,6813

9 R2=0,8537

8

7

6

5Taxa (%) 4

3

2

1

0

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Ano

Figura 1 Tendência temporal do trabalho infantil no estado do Rio de Janeiro 1992-2006

10

9 y=-0,805x + 10 ,18 8 R2=0,982 7

6

5Taxa (%) 4

3

2

1

0

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Ano

Figura 2 Tendência temporal do trabalho infantil no estado do Rio de Janeiro 1992-1998

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t R a B a l h o i n f a n t i l e i m p l a n t a ç ã o d o p R o g R a m a d e e R R a d i C a ç ã o d o

t R a B a l h o i n f a n t i l ( pet i ) n o e S t a d o d o R i o d e J a n e i R o

4,35

4,3

4,25

4,2

4,15Taxa y=0 ,065x + 3 ,99 (%) 4,1

R2=0,7167 4,05

4

3,95

3,91999 2000 2001 2002

Ano

Figura 3 Tendência temporal do trabalho infantil no estado do Rio de Janeiro 1999-2002

Ta x a (%)

y=0 , 0 7 9x + 2 , 9 9 R2=0,0274

4,5

3,5

3

2,5

2 1,5

0,5

4

1

0 2003 2004 2005 2006

Ano

Figura 4 Tendência temporal do trabalho infantil no estado do Rio de Janeiro 2003-2006

No primeiro corte temporal, entre 1992 e 1998 (período anterior à im­plantação do PETI), já se observava um decréscimo ao longo dos anos. Já no segundo período, entre 1999 e 2002, ao contrário, observou-se uma tendência ao aumento das taxas. Este período correspondeu ao intervalo temporal entre a implantação do PETI no Rio de Janeiro e sua reformulação. No último período avaliado, entre 2003 e 2006, após a revisão dos protocolos e das normativas do PETI, observa-se uma permanência inicial do aumento após 2002, seguido de um importante decréscimo nos anos subseqüentes.

A regressão linear em cada um dos períodos ressaltou claramente a tendên­cia de redução no período completo, mas mostrou que a oscilação das taxas

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R a f a e l m e n d o n ç a g u i m a R ã e S , C a R m e n i l d e S R o d R i g u e S

f R ó e S a S m u S , e d u a R d o S a n t i a g o B R a v o , f a B í o l a B R a z p e n n a

foi sensível ao estabelecimento de políticas públicas que combatem o trabalho infantil.

4. diSCUSSão

O comportamento das taxas de trabalho infantil no período mostra tendência à queda mesmo antes da implantação do PETI. Houve, entretanto, oscilações deste comportamento ao longo dos anos.

Embora a análise de séries temporais seja útil para a vigilância epidemiológica das situações e agravos à saúde, como é o caso do trabalho infantil, o desenho ecológico possui limitações na sua capacidade de checar hipóteses causais. Neste caso é relevante considerar a complexidade da determinação do trabalho infan­til. Contudo, estes resultados permitem analisar tendências que podem sugerir e orientar hipóteses a serem testadas por estudos de base individual.

Outra limitação do estudo está no fato de o trabalho infantil ter grande concentração hoje - segundo os dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD) - em setores onde há impossibilidade ou dificuldade do ingresso da fiscalização. Neste caso estão as atividades em regime de economia familiar, principalmente na agricultura. Nos grandes centros, a exploração da mão-de-obra infantil é feita pela própria família, especialmente pequenos pro­dutores de alimentos e artesanato, principalmente em setores turísticos.

De uma forma geral, o Brasil encontra-se adiantado em relação aos demais países no que se refere à existência de legislação proibitiva ao trabalho infantil e de proteção aos direitos da criança e do adolescente. Entre seus principais dispositivos estão a Constituição Federal (Brasil, 1988) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 2001a). Entretanto, ainda há muito a fazer para que essas leis sejam efetivamente cumpridas.

Em 2001, constatou-se que as taxas de trabalho infantil no Rio de Janeiro, acompanhando a tendência nacional, voltarem a crescer após registrar queda por vários anos. Os dados da PNAD demonstram que o crescimento ocorreu mesmo com expansão de programas de melhoria na qualidade de vida dos menores como o Bolsa Escola (que foi integrado pelo Bolsa-Família) (Brasil, 2004a) e Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) (Brasil, 2008c). Esta constatação trouxe a emergência de uma revisão do programa, que foi elaborada, e trazendo como conseqüência a elaboração da Portaria nº 458, do Ministério da Previdência e Assistência Social, em 2001. Esta Portari estabeleceu Diretrizes e Normas do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI (Brasil, 2001b), e trouxe providências para a regulamentação da sua implemen­tação e operacionalização, como a constituição da Comissão de Erradicação do Trabalho Infantil, a partir de 2002.

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t R a B a l h o i n f a n t i l e i m p l a n t a ç ã o d o p R o g R a m a d e e R R a d i C a ç ã o d o

t R a B a l h o i n f a n t i l ( pet i ) n o e S t a d o d o R i o d e J a n e i R o

Em 2005, exigiu-se que o combate ao trabalho infantil fosse atributo obri­gatório em toda e qualquer ação da fiscalização, fato consolidado pelo sistema informatizado da fiscalização trabalhista a partir de janeiro de 2006. Estes registros constam para a fiscalização em empresas formais. Além disso, particularmente no Rio de Janeiro, algumas características deste período são relevantes: a primeira delas, este foi o período da troca de coordenação estadual do Programa de Saúde do Trabalhador. Este momento político se traduz em uma ação mais efetiva de implementação da Rede Nacional de Atenção Intergal em Saúde do Traba­lhador (criada em 2003 no âmbito no Ministério da Saúde) (Dias & Hoefel, 2005) no Rio de Janeiro, além de fortalecer ações de política de saúde do trabalhador, como a implantação da Portaria 777/04, que estabelece o tra­balho infantil como agravo de notificação compulsória no SINAN (Brasil, 2004b). E ainda, a expansão das ações intersetoriais envolvendo Secretaria Estadual de Saúde, Delegacias regionais do Trabalho e Ministério Público. Atribui-se a isso, portanto, a queda das taxas a partir de 2005.

Isto posto, pode-se inferir, portanto, que a situação de trabalho infantil é particularmente sensível às ações de políticas públicas, e que é necessário, pois, observar o acerto nas políticas econômicas que redistribuem a renda de maneira mais justa, promovendo as reformas estruturais necessárias e implantando programas específicos para as famílias em situação de po­breza extrema, para erradicar de maneira definitiva a prática do trabalho infantil no país (Basu & Vanph, 1998; Grimsrud & Millennium, 2003; Brasil, 1998; 2005).

Cabe acrescentar de forma sistemática, a esta vigilância, dados sobre cobertura dos programas de seguridade social, como o PETI e o PBF, análise da situação de trabalho por sexo e taxa de urbanização local. A investigação das características associadas e determinantes sociais do traba­lho infantil pode contribuir de forma oportuna na direção de investigações de novas estratégias para seu controle, além de aplicar de forma mais precisa os investimentos em promoção e assistência a grupos vulneráveis.

Vale ressaltar, finalmente, que não se dispõe, ainda, de uma avaliação mais ampla e sistemática das condições de funcionamento e do impacto do programa no conjunto de municípios onde ele foi implantado. Contudo, a avaliação geral do programa no Brasil mostra que o PETI apresenta problemas, efeitos positivos e desafios. Entre os primeiros estão uma co­bertura insuficiente das crianças que exercem atividades laborais; atrasos recorrentes no repasse de verbas e no pagamento das bolsas; insuficiên­cia do apoio e da contrapartida das prefeituras para a implantação da Jornada; ausência de critérioa falta de fiscalização, interferência política

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R a f a e l m e n d o n ç a g u i m a R ã e S , C a R m e n i l d e S R o d R i g u e S

f R ó e S a S m u S , e d u a R d o S a n t i a g o B R a v o , f a B í o l a B R a z p e n n a

e clientelista na escolha das crianças contempladas; carência de maior controle sobre as verbas repassadas aos governos locais; desarticulação entre a escola regular e a Jornada; funcionamento da mesma em condições inadequadas; baixa qualificação dos monitores, cuja capacitação é bastante variada entre os municípios.

Finalmente, a trajetória do programa coloca também em questão a urgência de políticas governamentais (com pesados investimentos) orientadas para uma transformação e melhoria radicais do ensino público, implementando, as disposições da Lei de Diretrizes e Bases sobre a escola em tempo integral; e a importância da participação da sociedade civil no desenvolvimento e no controle das políticas sociais, assim como a própria fragilidade dessa participação. Programas de alívio à pobreza precisam, portanto, ser associados a medidas que viabilizem a sua supera­ção, mais precisamente, a políticas estruturais e amplas, que permitam a retomada do desenvolvimento com uma maior equidade social.

R e f e R ê n C i a S

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t R a B a l h o i n f a n t i l ( pet i ) n o e S t a d o d o R i o d e J a n e i R o

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C a d . S a ú d e C o l e t . , R i o d e J a n e i R o , 17 (3 ) : 593 - 602 , 2009 – 601

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R a f a e l m e n d o n ç a g u i m a R ã e S , C a R m e n i l d e S R o d R i g u e S

f R ó e S a S m u S , e d u a R d o S a n t i a g o B R a v o , f a B í o l a B R a z p e n n a

nEtEr, J.; waSSErman, w.; KUtnEr, m. h. Polynomial regression. In: _____. Applied linear statistical models: regression, analysis of variance and experimental designs. 3. ed. Boston: Irwin, 1990. p. 315 - 341.

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Recebido em: 15/03/2009 Aprovado em: 13/08/2009

602 – C a d . S a ú d e C o l e t . , R i o d e J a n e i R o , 17 (3 ) : 593 - 602 , 2009

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uma ContRiBuição paRa a hiStóRia daS CiênCiaS SoCiaiS na Saúde

Coletiva – oS CongReSSoS BRaSileiRoS de CiênCiaS SoCiaiS e

humanaS em Saúde da aBRaSCo e SuaS pRoduçõeS CientífiCaS, 1995 – 2007 A Contribution for the history of Social Sciences in Public Health – ABRASCO’s Brazilian Congresses of Social and Human Sciences in Health and its scientific products, 1995 – 2007

Patrícia de Souza Rezende1, Aurea Maria Zöllner Ianni2, Olga Sofia Fabergé Alves3, Renato Barboza4

rESUmo

Este artigo apresenta os resultados de pesquisa sobre os Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, promovidos pela Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO), realizados no período de 1995 e 2007. Trata-se de um estudo de caráter descritivo e exploratório, que situa, em breve histórico, a constituição do campo da Saúde Coletiva no contexto de de­mocratização do país e o estabelecimento da saúde como direito universal e, neste cenário, a estruturação da ABRASCO, suas diretorias e as comissões de Ciências Sociais e Humanas em Saúde. A pesquisa possibilitou o levantamento do quadro das diretorias da Associação, identificou a formação profissional e a filiação institucional dos seus membros, e mapeou a representatividade dos profissionais de Ciências Hu­manas neste universo. Os 6035 resumos analisados permitiram avaliar o aumento expressivo da produção na área (quase octuplicado) e a abrangência dos trabalhos apresentados ao longo dos Congressos.

palavraS-ChavE

Congressos, Ciências Sociais, ABRASCO, Saúde Coletiva

abStraCt

This article shows the results of a research about the Brazilian Congresses of Social and Human Sciences in Health sponsored by the ABRASCO (Brazilian Association of Public Health Post-Graduation), from 1995 until 2007. This study is of explor­atory and descriptive nature, showing a brief history about the origin of Public Health in the Brazilian’s democratization context and the health establishment as a

1Cientista Social. Mestranda em Saúde Coletiva. Rua Santo Antonio, 590 – 3. andar, Bairro Bela Vista – São Paulo CEP: 01314-000 E-mail: [email protected]

2 Doutora em Ciência Ambiental. Pesquisadora Científica do Instituto de Saúde – SES/SP e Professora do Departa­mento de Medicina Social da Faculdade de Ciências Médicas Santa Casa de São Paulo. E-mail: aureanni@isaude. sp.gov.br

3 Mestranda em História Social. Pesquisadora Científica do Instituto de Saúde – SES/SP.

4Mestre em Saúde Coletiva. Pesquisador Científico do Instituto de Saúde – SES/SP

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p a t R í C i a d e S o u z a R e z e n d e , a u R e a m a R i a z ö l l n e R i a n n i , o l g a S o f i a f a B e R g é a l v e S , R e n a t o B a R B o z a

universal right. In this scenario, we also deal on the formation of ABRASCO and the establishment of its directories, with emphasis on the Social and Human Sciences in Health committee. The research made possible the analysis of the association’s directory boards, the identification of the professional graduation and institutional affiliation of its members, and also mapped the representational level of these pro­fessionals in the scientific community. The analysis of the 6035 abstracts shows a considerable quantitative increase on scientific production and in the scope of the studies presented at these congresses.

KEy wordS

Congresses, Social Sciences, ABRASCO, Public Health

1. introdUção

Este artigo resulta de uma pesquisa exploratória e descritiva sobre o percurso

das Ciências Sociais em Saúde. Recupera a constituição das Comissões de Ciências

Sociais em Saúde (CCSS) da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO),

bem como os congressos realizados da área.

Partimos da incorporação das Ciências Sociais na Saúde e suas implicações e

contribuições para a constituição e o desenvolvimento do campo da Saúde Coletiva.

Realizamos um breve resgate histórico e o entendimento do que seja a Saúde Coletiva

para, então, adentrarmosna coletadedados, investigandoalguns aspectos daABRASCO:

sua estrutura, seu papel na consolidação da Saúde Coletiva e a importância das Ciências

Sociais neste processo. Por fim, realizamos uma breve análise da produção científica

dos Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde da ABRASCO.

Para compreender o campo da Saúde Coletiva é necessário conhecer sua história

e significado que, segundo Everardo Nunes (1994), vai se estruturando a partir dos anos

80, como uma abordagem de dimensão tripla – como corrente de pensamento, como

movimento social e como prática teórica. Sua gênese situa-se em meados dos anos 50,

quando o projeto preventivista, expresso na chamadaMedicinaComunitária, pretendeu

inserir o aluno na realidade, com o objetivo de ampliar a sua noção dos processos de

saúde e adoecimento das populações, tendo em vista a mudança da prática médica.

Jairnilson Paim (2007, p. 2522) define Saúde Coletiva da seguinte forma:

“Saúde Coletiva é, simultaneamente, um campo científico e um âmbito de práticas, contribuindo com a Reforma Sanitária Brasileira mediante produção de conhecimentos e sua socialização junto aos movimentos sociais. Como campo científico, distancia-se da saúde pública institucionalizada e, como práxis, tem a possibilidade de radicalizar seus compromissos históricos com o povo, com as pessoas, com as classes dominadas”.

604 – C a d . S a ú d e C o l e t . , R i o d e J a n e i R o , 17 (3 ) : 603 - 626 , 2009

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u m a C o n t R i B u i ç ã o p a R a a h i S t ó R i a d a S C i ê n C i a S S o C i a i S n a S a ú d e C o l e t i v a – o S C o n g R e S S o S B R a S i l e i R o S

d e C i ê n C i a S S o C i a i S e h u m a n a S e m S a ú d e d a aBRaSCo e S u a S p R o d u ç õ e S C i e n t í f i C a S , 1995 – 2007

Neste contexto, ganham espaço, no plano do conhecimento, alguns concei­tos sociológicos, antropológicos, políticos, demográficos, epidemiológicos e eco­lógicos. De acordo com Sarah Escorel (1998), depois dos anos 60 a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) também estimularia, na América Latina, a utilização das Ciências Sociais aplicadas à Saúde, tendo como marco a reunião de Cuenca, Equador, em 1972.

Na década de 1970 aparecem algumas críticas ao modelo médico preven­tivista. É o momento da retomada da Medicina Social, entendida como um campo de práticas médicas e conhecimentos em saúde, que tem como foco as dinâmicas da sociedade.

Os anos 70, marcaram, também, uma época política peculiar não só no Brasil como internacionalmente; foi um período fértil para reflexões sobre as re­lações saúde-sociedade. Num contexto de embate entre forças do autoritarismo e da democratização, definiu-se como meta, para o Estado, a garantia da saúde como um direito da população. Partiu-se de uma concepção ampla do processo saúde-doença, enfatizando seus determinantes socioeconômicos, considerando as condições de vida e de trabalho das populações.

A redefinição das políticas e dos serviços de saúde exigiam, entretanto, uma reestruturação e reformulação da política de formação de recursos humanos. A necessidade de uma instância que congregasse os interesses das instituições de formação como um espaço de reflexão política e ideológica sobre as práticas médicas e, simultaneamente, instância de formulação/proposição de políticas públicas de saúde, culminou com a criação da ABRASCO, fundada em 1979, que tinha como objetivos principais: o aprimoramento do ensino e da pesquisa; a captação de apoio financeiro e técnico; a cooperação e a valorização dos pro-gramas de ensino; a promoção e a disseminação dos conhecimentos da Saúde Coletiva, dentre outros.

O termo Saúde Coletiva, genuinamente brasileiro (Costa, 1992; Canesqui, 1995), advém da noção do coletivo como produto da dinâmica das relações sociais. Para esse entendimento, foi fundamental a contribuição das Ciências So­ciais ao campo da Saúde, que forneceram as bases para a construção do objeto da Saúde Coletiva. Nunes (1994, p. 19) aponta que, a partir dos anos 80, “novas marcas na Saúde Coletiva foram impressas, como resultante direta das transformações sociais. [...] Assim novas tendências, práticas e subáreas são incorporadas na Saúde Coletiva”.

A Saúde Coletiva configurou-se, também, como movimento de oposição política e ideológica, com forte caráter de denúncia decorrente da constatação de que a lógica do capitalismo atingira a Medicina (Donnangelo & Pereira, 1976). Confrontando-se com a privatização da Medicina e a precarização das condições de vida da população, a Saúde Coletiva levantou a bandeira da responsabilidade estatal

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e da necessidade de instituir políticas sociais consistentes (Burlandy & Bodstein, 1998). Neste cenário, o campo adquiriu uma complexidade que abarcou, tanto na esfera teórica como na do âmbito das práticas, múltiplos objetos e áreas de saberes, cor­respondentes tanto às Ciências Biológicas quanto às Ciências Sociais. A inserção das Ciências Sociais na Saúde contribuiu, ainda, com outras dimensões da compreensão dos processos de saúde e adoecimento como aquelas relativas aos universos simbólico e cultural. Este constructu reformulou, em grande medida, o discurso eminentemente “biologicista” (Gonçalves, 1990), predominante até então nas práticas médicas.

Reconhecendo, portanto e nesse sentido, a importância das Ciências Sociais no cenário da Saúde Coletiva, e o seu protagonismo na constituição dos objetos e práticas do campo, reconstituímos a trajetória da sua estruturação e consolidação no interior da ABRASCO, por meio do estudo das Comissões de Ciências Sociais e Humanas em Saúde e dos Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, no período de 1995 a 2007.

2. mEtodologia

Por tratar-se de um estudo de recorte histórico, o desenvolvimento da pesquisa exigiu a recuperação das informações sobre a constituição da ABRASCO, das Co­missões de Ciências Sociais e Humanas em Saúde por ela instituídas e das comissões científicas e organizadoras dos congressos brasileiros da área.

Emilia Viotti da Costa afirma que toda história é ao mesmo tempo individual e coletiva, uma visão do passado e um retrato do presente. Assim, as obras também são “[...] expressão de determinadas condições de trabalho, das tendências da historiografia, dos debates teórico-metodológicos e das lutas políticas existentes na época de sua elaboração” (Costa, 1989 apud Ferreira et al., 2008, p. 8).

Para realizar a análise documental utilizamos como fontes prioritárias os Livros de Resumos de todos os Congressos de Ciências Sociais e Humanas em Saúde (Ane­xo 1); os documentos oficiais produzidos pela ABRASCO como a ata de Fundação da ABRASCO; o I Plano Diretor das Ciências Sociais em Saúde; o Plano Diretor do II Congresso de Ciências Sociais em Saúde; o relatório do II Congresso de Ciências Sociais em Saúde e o relatório da Oficina do III Congresso de Ciências Sociais e Humanas em Saúde.

Foram coletados, ainda, dados complementares a partir de informantes-chave da Secretaria Executiva da Associação.

Com o objetivo de organizar as informações recolhidas, foi construído um banco de dados posteriormente sistematizado em tabelas (Tabelas 1 a 5). Partiu-se da recuperação das várias diretorias da ABRASCO, seguida da com­posição das diferentes Comissões de Ciências Sociais e Humanas em Saúde e das Comissões Organizadoras dos Congressos nacionais da área. A produção científica dos Congressos foi sistematizada por meio dos resumos dos trabalhos

606 – C a d . S a ú d e C o l e t . , R i o d e J a n e i R o , 17 (3 ) : 603 - 626 , 2009

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u m a C o n t R i B u i ç ã o p a R a a h i S t ó R i a d a S C i ê n C i a S S o C i a i S n a S a ú d e C o l e t i v a – o S C o n g R e S S o S B R a S i l e i R o S

d e C i ê n C i a S S o C i a i S e h u m a n a S e m S a ú d e d a aBRaSCo e S u a S p R o d u ç õ e S C i e n t í f i C a S , 1995 – 2007

científicos, classificados segundo modalidade de apresentação e por número total por congresso.

Esta sistematização permitiu reconstituir a trajetória dos congressos e sua evolução, a dimensão da produção científica ao longo da realização dos mesmos, bem como a trajetória da Comissão de Ciências Sociais. Possibilitou, também, identificar, nas várias diretorias da ABRASCO, a participação de membros com formação na área de Ciências Sociais e Humanas e suas instituições de origem.

3. rESUltadoS E diSCUSSão

3.1. aS dirEtoriaS da abraSCo1

Organizada em 1979, durante a I Reunião sobre Formação e Utilização de Pessoal de Nível Superior na Área de Saúde Coletiva, realizada em Brasília, a ABRASCO surge como um espaço de institucionalização da Saúde Coletiva no Brasil.

Sua criação ocorre no período de transição política, momento marcado pela mobilização popular e pela emergência de várias instituições voltadas para a redemocratização do país. Essas transformações apontavam, fortemente, para a necessidade de se (re)pensar as políticas públicas no país e dentre elas as de Saúde.

A ABRASCO veio ao encontro dessas expectativas, reunindo um grupo de profissionais da área disposto a implementar novas estratégias para a Saúde Pública e respondendo, em parte, ao que havia sido preconizado pela Declara­ção da Alma-Ata em 1978, que propugnava a Saúde como direito essencial dos indivíduos e das coletividades; a obrigação do Estado em assegurar esse direito; a responsabilidade e o direito das comunidades de participar da proteção e recuperação da Saúde, bem como da gestão dos serviços; e, ainda, o direito à equidade e à universalidade no acesso aos serviços.

Nessa perspectiva, segundo Cristina M. O. Fonseca (2006, p. 22):

“[...] A história da ABRASCO espelha a inter-relação entre três campos. O primeiro diz respeito ao conjunto de interesses políticos divergentes que vigoravam naquele contexto da história brasileira. O segundo trata das novas concepções que orientavam reformulações na área da Saúde condensadas na proposta de um novo campo denominado de Saúde Coletiva. E, por fim, o terceiro preocupa-se com a formação de novos quadros, por meio da diversificação e da especializa­ção profissional na Saúde, responsável pelo ingresso de novos atores no cenário institucional da Saúde”

Nesse sentido, portanto, pode-se afirmar que a Associação se constituiu e consolidou institucionalmente em torno do eixo de interligação entre a formação profissional e a ação política, desempenhando importante papel na articulação

1 Ao F i n a l do a r t i go encon t r a - se um anexo com as s i g l a s e nomes das i n s t i t u i ções po r e x t en so.

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p a t R í C i a d e S o u z a R e z e n d e , a u R e a m a R i a z ö l l n e R i a n n i , o l g a S o f i a f a B e R g é a l v e S , R e n a t o B a R B o z a

entre formação teórica e a atuação prática, formulando proposições políticas para a Saúde Pública no Brasil e participando ativamente da área acadêmica.

Do ponto de vista organizacional, desde a sua fundação, a ABRASCO conta com presidentes, vice-presidentes, tesoureiros, secretários executivos e ad-juntos, todos eleitos pelos associados. A instituição possui, ainda, Comissões e Grupos de Trabalho (GTs) que respondem por áreas e subáreas específicas dentro da Saúde Coletiva – setores estes que dinamizam as atividades da As­sociação através de eventos, reuniões, oficinas de trabalho e publicações como forma de contemplar a complexidade intrínseca às questões da Saúde Coletiva e sua multidisciplinaridade.

Analisando o quadro de diretorias, nestes 30 anos de existência, vimos que a Associação teve 12 gestões, sendo que a última terá seu término em 2009. Durante este período a ABRASCO contou com cerca de 40 membros diretores, nos cargos de presidente e vice-presidente. Alguns ocupantes desses cargos com­puseram diretorias em mais de uma gestão (Tabela 1).

Dos membros envolvidos na composição das diretorias da ABRASCO, 11 são graduados em cursos da área das Ciências Sociais ou Humanas, represen­tando quase 30% do corpo de diretores do período. Nota-se que esses membros encontram-se concentrados, em sua maioria, nas últimas gestões: três deles no período de 1996-2000 e outros três no período de 2003-2006 (Tabela 1).

Durante os 30 anos de existência, o cargo de presidente da Associação foi ocupado apenas duas vezes por membros oriundos das Ciências Sociais. Foram eles, Arlindo Fabio Gómez de Souza (também médico sanitarista), gestão 1991­1993, e Maria Cecília de Souza Minayo, gestão 1994-1996, o que reflete uma representatividade ainda restrita dos cientistas sociais na presidência da Asso­ciação, a despeito da relevância dessa área na constituição e configuração do campo da Saúde Coletiva (Tabela 1).

No quadro geral das diretorias, ao considerar os membros formados na área de Humanas, verifica-se que a maioria é originária das Ciências Sociais, repre­sentada por cinco membros, seguidos da Filosofia (dois) e Psicologia (dois), Economia (um) e História (um) (Tabela 1).

Quanto à origem regional e institucional do conjunto de diretores da ABRASCO, há o predomínio da região Sudeste, na seguinte ordem decres­cente: Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo; seguida

__­da região Nordeste exclusivamente a Bahia __, que conta com vários membros; e depois as regiões Sul e Centro-Oeste (Tabela 1).

Nota-se que, da totalidade dos membros, 16 são do estado do Rio de Janeiro, sendo 12 deles vinculados à FIOCRUZ, três ao IMS/UERJ, e um à FGV/RJ. Provenientes do estado de São Paulo são 13: oito da USP, dois

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u m a C o n t R i B u i ç ã o p a R a a h i S t ó R i a d a S C i ê n C i a S S o C i a i S n a S a ú d e C o l e t i v a – o S C o n g R e S S o S B R a S i l e i R o S

d e C i ê n C i a S S o C i a i S e h u m a n a S e m S a ú d e d a aBRaSCo e S u a S p R o d u ç õ e S C i e n t í f i C a S , 1995 – 2007

Tabela 1 Membro s da s d i r e t o r i a s da A s so c i a ção Bra s i l e i r a de Pó s - g r aduação em Saúde Cole t iva (ABRASCO) suas ins t i tu ições e espec i f i cação das formações bás icas em C i ênc i a s Soc i a i s e Humana s , s e gundo ca r go s e g e s t õ e s – Pe r í odo : 1979 -2009

Cargos

Presidência Vice- Presidência Tesouraria Secretaria Executiva

Sec. Exec. adjunta

1979 Frederico Simões Ernani de Paiva Ferreira Braga – in 1981 Barbosa - in memorian memorian.(FIOCRUZ); Guilherme

(UNB e ENSP) Rodrigues da Silva ( DMP/USP) 1981 Benedictus Philadelpho Ernani de Paiva Ferreira Braga – in José S. 1983 de Siqueira (UFMG) memorian.; Jaimilson da Silva Paim Guedes

(ISC/UFBA) 1983 Hésio Cordeiro (Ex José da Rocha Carvalheiro (DMS/ Tânia C. 1985 presidente INAMPS) FMUSP/RP) Nunes 1985 1987

Sebastião Loureiro (DMP/UFBA)

Sônia Fleury – psicologia (FGV- RJ); Moisés Goldbaum (DMP/USP)

Eduardo M.F. de Carvalho

1987 Guilherme Rodrigues da Eleutério Rodrigues Neto (UNB); Luiz 1989 Silva (DMP/USP) Cordoni Junior ( UEL) 1989 José da Silva Guedes Nilson do Rosário Costa – ciências Alina Maria 1991 (FCMSCSP) sociais(FIOCRUZ); Carmen Fontes de A. Souza

Teixeira.A. Souza (ISC/UFBA) 1991 Arlindo F. Gómez de José da Rocha Carvalheiro (DMS/ Júlio S. 1993 Sousa- Sociologia FMUSP/RP); Maria Cristina L. G. de Muller Neto

(CANAL SAÚDE/ Mendonça (DMPS/FM/UFMG) FIOCRUZ)

1994 1996

Maria Cecília de Souza Minayo – Ciências Sociais (ENSP/FIOCRUZ)

Marilisa Berti Barros (FCM/UNICAMP); Pedro Miguel dos Santos Neto (FIOCRUZ)

Renato P. Veras

Péricles S. da Costa

João C. Canossa

1996 Rita de Cássia Barradas Eduardo Navarro Stotz – ciências sociais 2000 Barata (FCMSCSP) (ENSP/FIOCRUZ); Everardo D. Nunes –

ciências sociais ( FCM/ UNICAMP); Mario Roberto Dal’ Poz ( IMS/ UERJ); Maria Elizabeth Diniz de Barros-psicologia (UFES) Oswaldo Yoshimi Tanaka (FSP/ USP)

2000 José Carvalho de Francisco Eduardo Campos (UFMG); 2003 Noronha (FIOCRUZ) Jaimilson da Silva Paim (ISC/UFBA);

Márcia Furquim de Almeida (FSP/USP); Paulo Marchiori Buss (FIOCRUZ); Paulo

2003­ Moisés Goldbaum Eduardo Mangeon Elias (DMP/USP) Paulo Ernani Gadelha Vieira (FIOCRUZ); Álvaro Mônia

2006 (DMP/USP) Júlio S. Muller Neto (ISC/UFMT e CEBES); Hideyoshi Mariani Madel T. Luz – filosofia ( IMS/ UERJ); Matilda Rômulo Maciel T. Luz – filosofia (IMS/ UERJ); Rômulo Maciel Filho- economia ( FIOCRUZ); Soraya Maria Vargas Côrtes – história (NIPESC/UFRGS)

2006­ José da Rocha Armando Martinho B. Raggio (CONASS); Álvaro Margareth 2009 Carvalheiro (DMS/ Luiz Augusto Facchini ( UFPEL); Madel T. Hideyoshi Pessanha

FMUSP/RP) Luz – filosofia (IMS/UERJ);Maurício Lima Matilda Barreto (ISC/UFBA); Paulo Ernani Gadelha Vieira (FIOCRUZ)

Fonte: Site da ABRASCO:<http://www.abrasco.org.br/sobre/diretoria.php> (último acesso:26/10/2008)

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p a t R í C i a d e S o u z a R e z e n d e , a u R e a m a R i a z ö l l n e R i a n n i , o l g a S o f i a f a B e R g é a l v e S , R e n a t o B a R B o z a

da DMS/FCM/UNICAMP e três da DMS/FCMSCSP. De Minas Gerais são quatro, todos da UFMG. Do estado do Espírito Santo houve somente um, da UFES. Da Bahia, somam-se cinco, todos do ISC/UFBA. Repre­sentantes de Brasília são três, dois da UnB e um ex-presidente do INAMPS. O Paraná comparece com apenas um membro da UEL, e do Rio Grande do Sul, há apenas dois representantes, um de Pelotas, da UFPEL, e outro de Porto Alegre, da UFRGS (Tabela 1).

3.2. aS ComiSSõES dE CiênCiaS SoCiaiS E hUmanaS Em SaúdE da abraSCo No contexto de articulação interna e fortalecimento da ABRASCO, em

meados dos anos 80, a instituição direcionou suas atenções para o processo de redemocratização do país, participando ativamente da formulação das políticas de Saúde. Nesta fase fortaleceram-se áreas internas da Associação e organizaram-se comissões próprias, como foi o caso dos diferentes Grupos de Trabalho, além das diferentes Comissões, demarcando as identidades das diversas áreas.

Nesta estrutura geral da Associação identificamos o segmento representativo das Ciências Sociais: a Comissão de Ciências Sociais e Humanas em Saúde (CCSHS).

Segundo Canesqui (2008, p. 216), a organização desta comissão dentro da ABRASCO

“[...] responde simultaneamente às atribuições fixadas pela Abrasco e ao consenso e iniciativas dos cientistas sociais sobre a necessidade de marcar a identidade da subárea de conhecimento, de desenvolvê-la e aprimorá-la, uma vez constituinte e integrante da Saúde Coletiva, onde se entrecruzam distintos saberes e práticas”.

A Comissão de Ciências Sociais em Saúde (CCSS) foi oficializada em 1986, sob responsabilidade de Everardo Duarte Nunes e Amélia Cohn, tendo sido criada concomitantemente à Comissão de Políticas de Saúde. Esta, como aponta Canesqui (2008), teve prioridade, já que suas ações estavam voltadas ao momento político, formulando as propostas para a Saúde Pública defendidas pelo movimento sanitário brasileiro2.

Antes da criação daCCSS, algumas iniciativas foram feitas no intuito de aprofundar questões concernentes às Ciências Sociais na Saúde. Em julho de 1982 aconteceu a I Reunião Nacional sobre Ensino e Pesquisa de Ciências Sociais na área da Saúde Coletiva, promovida pela ABRASCO e pelo DMS/FCMSCSP, que visava à me­lhoria da formação de profissionais e especialistas, além de promover a ampliação de bolsas de pesquisa e sistematizar o ensino de Ciências Sociais na Saúde.

2 Sobre a Reforma San i tá r ia e a 8ª Confe rênc ia Nac iona l de Saúde, ve PA IM, Ja i r n i l son S. Reforma San i tá r ia Bras i le i ra : con t r ibu ição para a compreensão e c r í t i ca . Sa lvador : EDUFBA; R io de Jane i ro : F IOCRUZ, 2008.

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d e C i ê n C i a S S o C i a i S e h u m a n a S e m S a ú d e d a aBRaSCo e S u a S p R o d u ç õ e S C i e n t í f i C a S , 1995 – 2007

Em 1983, realizou-se um curso de atualização dos docentes e pesquisadores da área. Este curso propunha articular os diferentes centros de pós-graduação em Saúde Coletiva no país e o conjunto dos docentes dos programas de ensi­no, bem como estimular a investigação na área de Ciências Sociais em Saúde. Propuseram-se, ali, também, a organização e o aperfeiçoamento da residência médica e da especialização em Saúde Pública. Canesqui (2008, p. 222) ressalta algumas das resoluções advindas deste curso:

“Esboçou-se uma proposta para uniformizar os propósitos, conteúdos e metodologia do ensino das Ciências Sociais que conduzisse o aluno a tomar consciência do contexto em que se insere e dos limites do saber e das práticas médicas tradicionais; capacitá-lo a elaborar uma descrição distinta da realidade, incorporando a visão crítica do social e não apenas ideológica, e produzir conhecimentos sobre a conjuntura de saúde. A metodologia de ensino deveria partir de textos de Medicina Social e não das Ciências Sociais disci­plinares. Os debates sobre a proposta recusaram uniformizar aquele ensino em torno do projeto da corrente de Medicina Social, em função da diversidade das Ciências Sociais e de sua desejada articulação com as demais disciplinas (Planejamento em Saúde e Epidemiologia) na redefinição das práticas de Saúde Coletiva”.

Novas iniciativas para articular as Ciências Sociais no âmbito da Saúde e agregar os cientistas sociais da área foram feitas por volta dos anos 90, marcando uma década de intensos esforços para o fortalecimento desse campo. Em 1990, o GT Saúde e Sociedade organizou o I Encontro de Cientistas Sociais do Rio de Janeiro, na UERJ. Outro GT foi criado, no mesmo ano, para traçar um programa de trabalho para as ciências sociais, e foi composto por Madel Therezinha Luz (IMS/UERJ), filósofa; Péricles da Silveira (secretaria executiva da associação), e demais profissionais oriundos das ciências sociais, como Amélia Cohn (USP/ CEDEC), Nísia Trindade Lima (COC/FIOCRUZ), Regina Cele de Andrade Bodstein (ENSP), Rubens Adorno (FSP/USP), Fabíola Zioni (FSP/USP), Everardo Duarte Nunes (DMS/FCM/UNICAMP) e Nilson do Rosário Costa (ENSP).

Em 1993 foi realizado o I Encontro Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde em Belo Horizonte, Minas Gerais. A proposta foi congregar os profissionais das Ciências Sociais em Saúde em um fórum próprio e específico para a discussão de trabalhos e a luta por reconhecimento e identidade profissional. O tema do encontro era “A Contribuição dos Cientistas Sociais na Construção do Campo da Saúde” e contou com oficinas de trabalho sobre interdisciplinaridade no campo da Saúde, o ensino das Ciências Sociais em Saúde e a Saúde Mental. As discus­sões revelaram o interesse desses profissionais em repensar a área e recuperar o conjunto da produção das Ciências Sociais na Saúde. A comissão organizadora

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do evento forneceu os nomes para a nova composição da CCSS no ano seguin­te. Foram eles, Ana Maria Canesqui, formada em Serviço Social (DMS/FCM/ UNICAMP), os filósofos Madel Therezinha Luz e Paulo César Alves (UFBA), e os sociólogos Nísia Trindade Lima (COC/FIOCRUZ), Eduardo Stotz (ENSP/ FIOCRUZ), Rosa Maria Quadros Nehmy (DMPS/FM/UFMG) e Mercês So­marriba (UFMG). Esta comissão permaneceu atuando nos anos seguintes, tendo sido reformulada apenas em fins de 1996 (Tabela 2). Foi, portanto, esta comissão que liderou os trabalhos de realização do I Congresso de Ciências Sociais em Saúde, tendo sido a pioneira na organização dos Congressos da área.

Em 1995, realiza-se o I Congresso de Ciências Sociais em Saúde na cidade de Curitiba, Paraná, que contou com a colaboração de uma comissão organiza­dora, predominantemente local. Com a proposição de constituir um espaço de cooperação e compartilhamento de experiências e ideias, o evento abordou vários pontos da Saúde Coletiva e definições deste campo, os rumos das Ciências Sociais em Saúde no Brasil, a inserção das Ciências Sociais no ensino e suas relações com os serviços de Saúde, dentre outras questões. O tema do congresso foi “Cidade e Saúde”.

No mesmo ano, uma oficina foi organizada no Rio de Janeiro para mapear e discutir a inserção das Ciências Sociais na Saúde. As discussões desta oficina e de mais duas subsequentes – em Campinas (1996) e em Águas de Lindoia (1997) – constituíram as bases do I Plano Diretor das Ciências Sociais em Saúde, formalizado e divulgado em 1997. A formu­lação do Plano Diretor correspondeu às necessidades dos profissionais das Ciências Sociais na Saúde, identificando seus problemas e definindo estratégias e metas para suas resoluções, tendo em vista a consolidação e o fortalecimento do papel das Ciências Sociais na construção dos saberes e práticas da Saúde Coletiva.

Este foi um período conturbado na área, com reflexos na CCSS, recom­posta duas vezes em dois anos. De fins de 1996 a fins de 1997, a Comissão contou com a coordenação de Ana Maria Canesqui, Paulo César Alves, Madel Therezinha Luz, Regina Maria Giffoni Marsíglia (DMS/FMSCSP), Mercês Somarriba, Regina Cele de Andrade Bodstein e Cristina Maria Oliveira Fonseca (COC/FIOCRUZ). Uma nova alteração ocorreu em dezembro de 1997, quando, de acordo com Canesqui, Paulo César Alves assume a coordenação junto com demais membros (Tabela 2).

O II Congresso Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde da ABRAS­CO ocorreu, em 1999, no estado de São Paulo, capital, sob a presidência da cientista social Paulete Goldenberg (UNIFESP), quando foi sugerido um mandato provisório para a CCSS. Integraram a Comissão provisó­

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d e C i ê n C i a S S o C i a i S e h u m a n a S e m S a ú d e d a aBRaSCo e S u a S p R o d u ç õ e S C i e n t í f i C a S , 1995 – 2007

Tabela 2 Composiçôes da Comissão de Ciências Sociais e Humanas da Associação Brasileira de Pós­graduação em Saúde Coletiva – ABRASCO, segundo funções. Período: 1994-2007.

Ano Membros da Comissão de Ciências Sociais em Saúde da ABRASCO

1994-1996 Coordenação Ana Maria Canesqui – Serviço Social (DPMS/FCM/UNICAMP)

Demais membros Madel T. Luz – Filosofia (IMS/UERJ); Nísia Trindade Lima – Sociologia (UFMG); Paulo César Alves – Filosofia (ISC/UFBA); Eduardo Stotz – Ciências Sociais (ENSP/FIOCRUZ); Mercês Somarriba – Sociologia (UFMG); Rosa Maria Q. Nehmy – Ciências Sociais (DMPS/FM/UFMG)

1996-1997 Coordenação Ana Maria Canesqui – Serviço Social (DPMS/FCM/UNICAMP)

Demais membros Paulo César Alves – Filosofia (ISC/UFBA). Madel T. Luz – Filosofia (IMS/UERJ); Regina C. Marsiglia – Ciências Sociais (FMSCSP); Mercês Somarriba – Sociologia (UFMG); Regina C. Bodstein – Sociologia (ENSP);Cristina M. O. Fonseca – História (COC-FIOCRUZ);

1997-1999 Coordenação Paulo César Alves – Filosofia (ISC/UFBA);

Demais membros Regina C. Bodstein – Sociologia (ENSP); Regina C. Marsiglia – Ciências Sociais (FMSCSP); Cristina M. O. Fonseca – História (COC-FIOCRUZ) e demais membros não informados.

1999 2002(?)

Coordenação Paulete Goldenberg - Ciências Sociais (UNIFESP);

Demais membros Regina C. Bodstein – Sociologia (ENSP); Regina C. Marsiglia – Ciências Sociais (FMSCSP); Cristina M. O. Fonseca; Everardo D. Nunes – Ciências Sociais (FCM/UNICAMP); Eduardo Stotz – Ciências Sociais ( ENSP/FIOCRUZ); Luiz Antônio de Castro Santos - Ciências Sociais (UERJ); Nísia Trindade Lima – Sociologia (COC/FIOCRUZ); Mara Helena A. Gomes – Ciências Sociais (UNIFESP);

2002-2003 Coordenação Nísia Trindade Lima – Sociologia (COC/FIOCRUZ) Demais membros Não informado

03/2003 Coordenação Madel T. Luz – Filosofia (IMS/UERJ);

07/2003 Demais membros Silvia Gershman - Ciências Sociais (DASP/ENSP/FIOCRUZ);Gilberto Hochman – Administração Pública (FIOCRUZ); Kenneth Camargo Jr. (IMS/UERJ); Tânia Fernandes – Fámacia (COC/FIOCRUZ); Roseni Pinheiro – Enfermagem (IMS/UERJ); Maria Helena Mendonça – Sociologia(FIOCRUZ); Jussara Calmon – Farmácia; André Pereira Neto; Ilara Hammerli – Comunicação (ENSP)

07/2003- Coordenação Silvia Gershman - Ciências Sociais (DASP/ENSP/FIOCRUZ)

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38/09 12

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Tabela 2 (Continuação...)

Demais membros Gilberto Hochman – Administração Pública (FIOCRUZ); Madel T. Luz – Filosofia (IMS/UERJ); Maria Helena Mendonça –

Sociologia(FIOCRUZ); Roseni Pinheiro – Enfermagem (IMS/UERJ); Tânia Fernandes – Farmácia (COC/FIOCRUZ); Ilara Hammerli –

Comunicação (ENSP); Kenneth Camargo Jr. (IMS/UERJ);Everardo D. Nunes - Ciências Sociais (FCM/UNICAMP); Jussara Calmon –

Farmácia; André Martins – Comunicação

2005-2007 Coordenação Silvia Gershman - Ciências Sociais (DASP/ENSP/FIOCRUZ)

Sub-Coordenação Kenneth Camargo Jr. (IMS/UERJ);

Demais membros Everardo D. Nunes - Ciências Sociais (FCM/UNICAMP); Gilberto Hochman – Administração Pública (FIOCRUZ); Madel T. Luz – Filosofia (IMS/UERJ); Maria Helena Mendonça – Sociologia(FIOCRUZ); Roseni Pinheiro – Enfermagem (IMS/UERJ); Tânia Fernandes – Farmácia (COC/FIOCRUZ); Lenaura Lobato (NAP/ UFF); Mara Helena A. Gomes – Ciências Sociais (UNIFESP).

2007 Coordenação Kenneth Camargo Jr. (IMS/UERJ);

Demais membros Leny Trad – Psicologia (ISC/ UFBA); Sandra Caponi – Filosofia (UFSC); Rubens Adorno – Ciências Sociais (FSP/USP); e demais membros ainda não confirmados.

Fontes: Livros de Resumos dos I, II, III e IV Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde. ABRASCO, 1995 - 2007.Canesqui, Ana M. As Ciências e Humanas em Saúde na Associação Brasileira de Pós Graduação em Saúde Coletiva. Physis. Rio de Janeiro, v.18, n.2, 2008.Comissão de Ciências Humanas e Sociais em Saúde. Relatório, Oficina de Trabalho Ciências Humanas e Sociais em Saúde. Rio de Janeiro: 29 a 30 de julho.

ria: Regina Bodstein, Regina Giffoni Marsíglia, Cristina Maria Oliveira

Fonseca, Everardo Duarte Nunes, Eduardo Stotz, Nísia Trindade Lima, Luiz

Antônio de Castro Santos (UERJ) e Mara Helena de Andréa Gomes (UNI­

FESP) (Tabela 2).

A perspectiva de ampliar a representação das instituições de ensino e

pesquisa, bem como a representatividade dos estados, era uma preocupa­

ção presente na ABRASCO, à época, já que a Associação almejava uma

representação nacional e o maior número possível de instituições vinculadas.

Outra inquietação era ampliar o entendimento sobre as Ciências So­

ciais na Saúde – visando à integração do conjunto das Ciências Humanas

ao campo das Ciências Sociais em Saúde, o que, nas palavras de Canesqui

(2008, p. 229), “não se tratava apenas de abordar, na Saúde Coletiva, o social, o

econômico e o político, mas outras dimensões como a ética, emocional, filosófica, histórica

e antropológica”.

Estas preocupações refletiram na organização da área que, nos anos

2000, decidiu alterar o nome da Comissão para Ciências Sociais e Humanas

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em Saúde (CCSHS). Também os Congressos Brasileiros passaram, desde então, a incluir o termo Humanas. Em 2002, no Rio de Janeiro, foi realiza­do o Seminário de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, promovido pela FIOCRUZ e pela CCSHS – sob coordenação de Nísia Trindade Lima – com o objetivo de refletir sobre a contribuição recente das Ciências Sociais para os estudos do campo da Saúde Coletiva (Tabela 2).

Em 2003, uma Oficina de Trabalho foi convocada para atualizar o Plano Diretor da área, reestruturar a CCSHS e estabelecer as bases para um Simpó­sio Nacional. Como resultado, foi constituída uma nova Comissão, que já se encontrava, desde o começo do ano, em processo de reformulação. Tornaram­se membros da nova CCSHS: Sílvia Gerschman (DAPS/ENSP/FIOCRUZ) na coordenação, Maria Helena Mendonça (FIOCRUZ) e Everardo Duarte Nunes, Gilberto Hochman (COC/FIOCRUZ), Madel Therezinha Luz, Roseni Pinheiro (IMS/UERJ); Tânia Fernandes (COC/FIOCRUZ), Ilara Hammerli (ENSP), Kenneth Camargo Jr. (IMS/UERJ), Jussara Calmon (UFF) e André Martins (IESC/UFRJ) (Tabela 2).

O Congresso previsto para 2004 não foi realizado, prejudicado por pro­blemas financeiros e pelas dificuldades de agenda dos organizadores. Ainda assim, se conseguiu realizar, neste mesmo ano, o Simpósio Nacional de Ciências Sociais em Saúde, no IMS/UERJ e o II Encontro de Ciências Sociais em Saúde (na fase pré-Congresso do VII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, em Brasília, Distrito Federal).

O III Congresso de Ciências Sociais e Humanas em Saúde realizou-se em Florianópolis, Santa Catarina, em 2005. Foi presidido por Madel Therezinha Luz, e ganhou grande expressão, pois contou com um número de participan­tes bem maior do que os anteriores. Segundo Silvia Gershman (2009), então coordenadora da CCSHS, o objetivo principal deste Congresso foi discutir a crise sanitária desencadeada pelo processo de globalização da economia e os seus reflexos na dinâmica de exclusão social, na fragilização da vida e da situação de saúde das populações.

Gershman permaneceu como coordenadora da CCSHS até 2006, tendo sido substituída por Kenneth Camargo Jr.

Por ocasião do IV Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, realizado simultaneamente ao XIV Congresso da Associação Internacional de Políticas de Saúde e ao X Congresso Latino-americano de

_Medicina Social todos eles ocorridos em Salvador em co-realização com a UFBA _, elegeu-se a nova CCSHS, que passou a ter a seguinte composição: Kenneth Camargo Jr. na coordenação, Leny Trad (ISC/UFBA), Sandra Caponi (UFSC) e Rubens Adorno (Tabela 2).

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Atualmente é esta comissão que coordena os trabalhos da área de Ciências Sociais na ABRASCO, sendo, provavelmente, a responsável pelos preparativos do próximo congresso de Ciências Sociais e Humanas, com data prevista de realização para o ano 2010.

Este breve resgate histórico e análise da trajetória das CCSHS evidenciou que houve o predomínio de coordenadores vinculados a instituições acadêmicas do eixo Rio de Janeiro (5 coordenações) – São Paulo (3 coordenações), destacando­se a participação da UNICAMP e da FIOCRUZ, respectivamente. Neste período, apenas uma coordenação foi exercida fora desse eixo, e esteve sob a responsabilidade do ISC, da Bahia.

Nos anos recentes, mais especificamente desde a gestão de 2002, observou-se que as coordenações das CCSHS estiveram vinculadas a duas instituições, FIOCRUZ e UERJ, ambas do Rio de Janeiro, revelando uma polarização geográfica, considerado o território nacional.

No que se refere à totalidade dos membros integrantes da Comissão nas diferentes gestões, verificou-se uma reprodução do cenário detectado nas coordenações, ou seja, no conjunto dos membros das CCSHS, a concentração de representantes do eixo Rio – São Paulo se atualiza. O estado da Bahia esteve representado nas três primeiras gestões, retornando na última, Minas Gerais participou nas duas primeiras e Santa Catarina apenas na última.

Vale destacar que a composição da Comissão nunca contou com re­presentantes das regiões norte e centro-oeste do país, evidenciando que a ABRASCO deve envidar esforços para ampliar a representatividade nacional e a rotatividade das instituições coordenadoras e de seus membros, estimu­lando uma maior representatividade dessas regiões do país.

3.3. Os Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde Os Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde

constituíram o outro objeto da presente pesquisa. Somente a partir dos anos 90 é que os congressos específicos dessa área se tornaram realidade, embora a CCSS fosse uma das mais antigas da ABRASCO. O I Congresso Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde foi realizado apenas em 1995, cerca de 16 anos depois da formação da Comissão.

Durante o período de 12 anos, ou seja, entre 1995 e 2007, foram rea­lizados quatro congressos (Tabela 3). Enquanto o intervalo entre o I e o II Congresso foi de quatro anos, entre o II e o III o intervalo foi de seis anos, reduzindo-se a dois entre o III e o IV; evidenciando-se uma periodicidade bastante irregular. Isto talvez se justifique pela realização de outros eventos da área, intercalados aos congressos, como simpósios, reuniões e oficinas que

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demandaram a atenção dos profissionais e ocuparam, com outras atividades, as lacunas do período.

Tabela3 Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde da ABRASCO,segundo data, local e tema. Período 1993-2007

Congresso Data Local Tema

I Congresso Brasileiro de 1995 Curitiba “ Cidade e Saúde”

Ciências Sociais em Saúde

II Congresso Brasileiro de “Ciências Sociais e Saúde: Tendências, 1999 São Paulo

Ciências Sociais em Saúde Objetos e Abordagens”

“Ciências Sociais e Saúde Coletiva: III Congresso Brasileiro de

2005 Florianópolis Desafios da Fragilidade da Vida na Ciências Sociais em Saúde

Sociedade Contemporânea”

IV Congresso Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde; X Congresso Latinoamericano de Medicina Social; XIV Congresso of the International Association

2007 Salvador “Equidade, Ética e Direito à Saúde: Desafios à Saúde Coletiva Fragilidade da Vida na Mundialização”

of Health Policy

Fonte: Anais dos I,II,III e IV Congressos de Ciências Sociais e Humanas em Saúde. 1995-2007.

Os temas dos congressos expressam bem os contextos histórico-sociais con­junturais do país e a situação das Ciências Sociais no cenário da Saúde Coletiva.

Para o I Congresso foi definido o tema “Cidade e Saúde”, aparentemente um tema específico e circunscrito, mas que revela as tensões concretas do viver em cidades e as reflexões sobre as condições de vida e a situação de saúde das po­pulações nas sociedades contemporâneas.

O tema do II Congresso “Ciências Sociais e Saúde: tendências, objetos e abordagens” parece indicar a intenção de ampliar as temáticas que envolvem as Ciências Sociais e a Saúde. Sinaliza um esforço em expandir e aprofundar essas aborda­gens, demonstrando que os cientistas sociais da saúde estão sintonizados com as discussões em pauta na teoria social, já que esses temas têm sido largamente discutidos, ressoando as profundas mudanças ocorridas nas sociedades modernas a partir da segunda metade do século XX (Tabela 3).

Nos III e IV Congressos, a ampliação da área, já sinalizada no congresso anterior, ocorre acrescida da incorporação das Ciências Humanas. O III Con­gresso brasileiro, agora denominado Ciências Sociais e Humanas, realizou-se com o tema “Ciência e Saúde Coletiva: Desafios da Fragilidade da Vida na Sociedade Contemporânea”, procurando ressaltar os problemas vivenciados pelos sujeitos no contexto atual de individualização e as relações dessa dinâmica social mais

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Tabela 4 Membros do I,II,III e IV Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas, segundo presidência, comissão científica e organizadoras dos congressos. Curitiba, São Paulo, Flori­anópolis e Salvador, respectivamente. Período: 1995-2007.

Cargos Membros

Presidente do Ana Maria Canesqui – Serviço Social (DPMS/FCM/UNICAMP) I Congresso

Comissão Científica do Eduardo Stotz – Ciências Sociais (ENSP/FIOCRUZ); Madel T. Luz – Filosofia (IMS/ I Congresso UERJ); Nísia Trindade Lima – Sociologia (UFMG); Paulo César Alves – Filosofia (ISC/

UFBA); Rosa Maria Q. Nehmy – Ciências Sociais (DMPS/FM/UFMG)

Comissão Ana Maria Canesqui – Serviço Social (DPMS/FCM/UNICAMP) Organizadora do ; Arnaldo Agenor Bertone (SESA/PR); João Carlos Canossa Mendes (ABRASCO);

I Congresso Sônia Lafoz (Nesco/PR – coordenadora); Sylvio Gevaerd (SESA/PR)

Presidente do Paulete Goldenberg – (DMP/UNIFESP); II Congresso

Comissão Científica doII Congresso

Paulete Goldenberg –presidente – (DMP/UNIFESP); Regina C. Marsiglia – vice­presidente (DMS/FCM/UNICAMP); Àlvaro Roberto C. Merlo (DMS/FM/UFRGS); Amélia Cohn (DMP/FMUSP); Ana Maria Canesqui (DPMS/FCM/UNICAMP); Cristina Fonseca (COC/FIOCRUZ); Eduardo Stotz (ENSP/FIOCRUZ); Eleonora M. de Oliveira (DPM/ UNIFESP); Everardo D. Nunes (FCM/UNICAMP); Fabiola Zioni (FSP/USP);José Ivo Pedrosa (CCS/UFPI); José da Rocha Carvalheiro (FMUSP/RP); Luciano Junqueira (FEA/PUCSP); Luiz Antônio de Castro Santos (IMS/UERJ) ; Madel T. Luz (IMS/UERJ); Mara Helena Oliva Augusto (FFLCH/USP); Massako Ida(FMB/UNESP); Marcos Fereira, Myriam Bruna Debert Ribeiro (DMP/ UNIFESP); Nilson Alves de Moraes( DSC/UFRJ); Paulo Elias (DMP/FMUSP); Oviromar Flores (DSC/UnB); Regina C. Bodstein (ENSP/ FIOCRUZ); Regina Maria Barbosa (NEP/UNICAMP); Rubens Adorno (FSP/USP); Sarah Escorel (Nupes/ DASP/ENSP/FIOCRUZ); Umberto Catarino Pessoto (IS/SES-SP)

Comissão Organizadora do

II Congresso

Regina M.G. Marsíglia (FMSCSP); Diva Maria Brunieri (DPMUNIFESP); Amélia Cohn (DMP/FMUSP); Ana Maria Canesqui (DPMS/FCM/UNICAMP); Cristina Fonseca (COC/ FIOCRUZ); Eduardo Stotz (ENSP/FIOCRUZ); Eleonora M. de Oliveira (DPM/UNIFESP); Everardo D. Nunes (FCM/UNICAMP); Luiz Antônio de Castro Santos (IMS/UERJ) ; Mara Helena A. Gomes (DPM/UNIFESP); Péricles Siveira da Costa (ABRASCO); Regina C. Bodstein (ENSP/FIOCRUZ); Rubens Adorno (FSP/USP).

Presidente do III Congresso

Madel T. Luz (IMS/UERJ);

Comissão Científica do III Congresso

Alberto Groisman ,ÁlvaroHideoshiMatilda,Cynthia AndersenSarti, ElianaDiehl, Fabíola Rohden, Fátima Buchele, Gilberto Hoschman, Kenneth Camargo Jr. , Lúcia Guimarães Blank,Maria Cristina Calvo, Maria Elizabeth Barros, Maria Helena Machado, Maria Helena Mendonça , Madel T. Luz , Marta Verdi, Myrianm Mitjavila, Mönia Mariani, Renata Palandri Sigolo,Ricardo Ceccim,Roseni Pinheiro,SandraCaponi,SilviaGershman,TâniaFernandes, Vera, Walter F. de Oliveira, Yara de Carvalho

Comissão Alberto Groisman, Eliana Diehl, Elza Berger Salema Coelho, Fátima Buchele ,Flávio Organizadora do Magajewsky, Maria Cristina Calvo, Marta Verdi, Myriam Mitjavila, Rosangela Goulart ,

III Congresso Sandra Caponi, Vera Lúcia Blank

Presidente do IV Soraya Vargas Cortes (ABRASCO) Congresso José Joaquim O’ Shanaham (IAHP)

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d e C i ê n C i a S S o C i a i S e h u m a n a S e m S a ú d e d a aBRaSCo e S u a S p R o d u ç õ e S C i e n t í f i C a S , 1995 – 2007

Tabela 4 (Cont inuação. . . )

Cargos Membros

Comissão Científica doIV Congresso

Comissão Organizadora do IV Congresso

Composta por 101 membros nacionais e estrangeiros. Dentre eles, 10 são re­presentantes de diversas nacionalidades, tais como: Aléxis Benos (Grécia); Alicia Stolkiner (Argentina); Bárbara McPake ( Escócia); Débora Tajer (Argentina); Steve Ilife (Grã- Bretanha); Tulio Seppilli (Itália); Letícia Artiles (Cuba); Gomes Marc Renaud (Canadá); Marciano Sanchez-Bayle (Espanha); Rutilia Calderon (Honduras).

Álvaro Matilda(ABRASCO), Ana L. Villas-Boas (ISC/UFBA), Cecci Noronha (ISC/ UFBA), Maria da Glória C. Teixeira (ISC/UFBA),Mönia Mariani (ABRASCO)

Comissão Eduardo Mota (ISC/UFBA), Isabela Cardoso (ISC/UFBA), Jorge Iriart(ISC/UFBA) Organizadora Local Leny Trad (ISC/ UFBA), Lígia Rangel(ISC/UFBA), Mônica Nunes (ISC/UFBA) do IV Congresso

Comissão Madel T. Luz (IMS/UERJ), Maurício Torres (ALAMES), José Joaquim O’ Shanaham Organizadora (IAHP), Sebastião Loureiro (PEC/ISC/UFBA), Soraya Vargas Cortes (ABRASCO), Internacional do IV Congresso

Comissão de Honra Cristina Laurel (México), David Sanders ( África do Sul), Edmundo Granda do IV Congresso (Equador), Francisco Rojas Ochoa (Cuba), Giovanni Berlinguer (Itália), Hans

Ulrich Deppe ( Alemanha), Jaime Breilh (Equador), Maria Cecília Minayo (Brasil), Maria Urbaneja (Venezuela), Naemar Almeida Filho (Brasil), Paulo Machiori Buss (Brasil), Saul franco(Colômbia)

Fontes: Anais dos I, II, III, IV Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, ABRASCO, 1995-2007 e Lima, Nisia Maria T. Santana, José Poranaguá (Orgs.). “Saúde Coletiva como compromisso: a trajetória da ABRASCO”. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2006.

geral com as questões de Saúde (Tabela 3). O IV Congresso, ocorrido juntamente com dois Congressos Internacionais,

apresentou um aumento expressivo do número de participantes e de trabalhos científicos e teve por tema “Equidade, ética e direito à Saúde: Desafios à Saúde Coletiva na Mundialização” (Tabela 3). A amplitude do tema revela a preocupação com a dimensão do evento, buscando contemplar interesses teóricos, de pesquisas e de práticas bastante diversificados, porém catalisados numa pauta em que o direito, a ética e a equidade têm sido propugnados pela agenda da saúde pública global.

O número de membros envolvidos na organização dos Congressos, seja nas Comissões Científicas ou nas Comissões Organizadoras, confirma a dimensão e o crescimento contínuo dos eventos. Se no I Congresso, realizado em 1995, estas comissões contaram com seis e cinco membros, respectivamente, no III Congresso, ocorrido em 2005, a Comissão Científica funcionou com a colaboração de 25 profis­sionais, composição esta que expressa não apenas o aumento da demanda de trabalho, bem como o crescimento do interesse dos pares pelo evento (Tabela 4).

Observou-se, no geral, que as Comissões Científicas dos Congressos reproduziam, quase que integralmente, a composição das CCSH, agregan do membros das institui­ções parceiras locais onde os eventos foram realizados. No caso do IV Congresso __

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com a característica de um (mega)evento , esta prática foi observada, agregando-se a incorporação de representantes nacionais e internacionais na composição da Comissão

Científica (Tabela 4). Quanto às Comissões Organizadoras dos Congressos, em sua maioria, tive­

ram a participação de membros locais, já que este é o grupo que acaba por viabilizar, na localidade, a produção e realização do evento, o que facilita a organização geral. Apenas no IV Congresso observaram-se algumas diferenças: a Comissão Organizadora foi composta por uma Comissão Organizadora Local e outra Internacional, com repre­sentação de diferentes instituições com certeza, uma iniciativa que buscou atender à dinâmica e às exigências de um evento desse porte (Tabela 4).

No que se refere aos trabalhos científicos dos quatro congressos, o que se destaca é o crescimento significativo no número de trabalhos ao longo do período (Tabela 5).

Em sua primeira edição contou-se um total de 398 trabalhos. Na segunda edição, foram 437, na terceira 2.032 e na quarta 3.168. O II Congresso, com 39 trabalhos científicos a mais que o I, apresentou um acréscimo de quase 10% sobre o anterior. Pode-se perceber a diferençamais expressiva de trabalhos por ocasião do IIICongresso – 1.595 trabalhos a mais –, volume superior a 300% do total do II. Alguns fatores podem explicar este aumento, como o intervalo entre a realização do II e do III Congressos, e a incorporação da área de Ciências Humanas. Entretanto, outros fatores podem ter influenciado esse fenômeno e devem ser aprofundados em outra oportunidade, reque­rendo uma análise mais detalhada desse material (Tabela 5).

Em 2007, no IV Congresso houve um acréscimo de 1.136 trabalhos sobre o número de trabalhos apresentados no congresso anterior, um aumento de quase

Tabela 5Total de trabalhos científicos dos I, II, III, IV Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Hu­manas em Saúde, realizados em Curitiba, São Paulo, Florianópolis e Salvador, respectivamente, no período entre 1995-2007, segundo modalidades de apresentação..

Congresso Modalidade de I Congresso II Congresso III Congresso IV Congresso Total apresentação

Comunicação 170 256 443 575 1444 Coordenada

Pôster 228 181 1589 2332 4330

Painel* - - - 132 132

Forum* - - - 124 124

Palestra* - - - 5 5

Total 389 437 2032 3168 6035

* Modalidade de atividades realizadas apenas no IV Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde. Apresentados como trabalhos científicos, com numeração de trabalho inscrito. Fontes: Anais dos I, II, III, IV Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, ABRASCO, 1995-2007 e Lima, Nisia Maria T. Santana, José Poranaguá (Orgs.). “Saúde Coletiva como compromisso: a trajetória da ABRASCO”. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2006.

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d e C i ê n C i a S S o C i a i S e h u m a n a S e m S a ú d e d a aBRaSCo e S u a S p R o d u ç õ e S C i e n t í f i C a S , 1995 – 2007

60%. Neste congresso notamos, ainda, algumas especificidades como a ampliação das modalidades de painéis, fóruns e palestras, além das tradicionais Comunicações Coordenadas e Pôsteres.

O contínuo aumento de trabalhos científicos os congressos revela, para além da ampliação do ensino e da pesquisa em saúde no país, um crescimento específico da área de Ciências Sociais e Humanas em Saúde e o reconhecimento de sua importância no interior do campo da Saúde Coletiva (Tabela 5).

4. ConSidEraçõES finaiS

A pesquisa demonstrou que a ABRASCO se fortaleceu na sua trajetória institucio­nal, marcada pela presença crescente de profissionais e instituições de ensino e pesquisa representantes de vários estados do país, para além do eixo Rio de Janeiro São Paulo. Este fato, porém, não foi observado na trajetória das Comissões de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, onde predomina a representatividade dessa região.

Uma breve avaliação da composição da direção geral da ABRASCO, desde o ano de sua criação até o presente momento, revelou que a participação dos cientistas sociais, ainda que significativa – um total de 11 profissionais num conjunto de 40 diretores, sendo dois deles ocupantes de cargos máximos da direção __, encontra-se, ainda, em dissonância com a dimensão e relevância da área e mesmo da sua contribuição à constituição do campo da Saúde Coletiva no Brasil.

Os desafios da formação e desenvolvimento permanente dos profissio­nais no campo da Saúde Coletiva, marcada pela multidisciplinaridade no diálogo com as Ciências Sociais, impulsionaram o desenvolvimento de uma série de modalidades de formação articuladas e promovidas pela ABRAS­CO, nos anos 80 e 90. Contudo, a consolidação desse processo dar-se-á apenas nos anos 2000, com a integração das Ciências Humanas na CCSS. O aumento da produção científica e do número de congressistas entre 1995 e 2007, período coberto pela presente pesquisa, revela a força das Ciências Sociais e Humanas na ABRASCO e no próprio campo da Saúde Coletiva como um todo.

A temática dos congressos revelou a flexibilidade da área em proble­matizar a dinâmica social contemporânea, bem como sua capacidade de enfrentar os desafios postos à Saúde Coletiva. Dos quatro congressos, dois deles, o I e o IV, propuseram questões mais pragmáticas relacionadas à agenda da Saúde Coletiva, e os outros dois, o II e o III, se ocuparam de questões mais próprias ao campo da teoria social e das humanidades em contexto de profundas mudanças sociais.

Finalmente, vale destacar que a Saúde Coletiva tem incorporado, em sua dinâmica, novos objetos e temas relacionados à diversidade das dimen-

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sões da vida humana, refletindo aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais, ancorados sempre, e cada vez mais, nos referenciais advindos das Ciências Sociais e Humanas.

RefeRênCiaS

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Recebido em: 19/02/2009 Aprovado em: 21/09/2009

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anexo1 CongrESSo braSilEiro dE CiênCiaS SoCiaiS Em SaúdE, 1, 1995, CUritiba. Anais. Curitiba: ABRASCO, 1995.

CongrESSo braSilEiro dE CiênCiaS SoCiaiS Em SaúdE, 2, 1999, São paUlo. Relatório Científico. São Paulo: ABRASCO, 2000. 26p.

CongrESSo braSilEiro dE CiênCiaS SoCiaiS Em SaúdE, 2, 1999, São Paulo. Anais. São Paulo: ABRASCO, 1999.

CongrESSo braSilEiro dE CiênCiaS SoCiaiS E hUmanaS Em SaúdE, 3, 2005, Flo­rianópolis. Anais. Florianópolis: ABRASCO, 2005.

CongrESSo braSilEiro dE CiênCiaS SoCiaiS E hUmanaS Em SaúdE, 3, 2005, Floria­nópolis. Documento resultante da oficina. Florianópolis: Comissão de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, 2006. 4p.

CongrESSo braSilEiro dE CiênCiaS SoCiaiS E hUmanaS Em SaúdE, 4, 2007, Salva­dor. Anais. Salvador: ABRASCO, 2007.

anexo 2 liSta dE SiglaS daS inStitUiçõES

COC/FIOCRUZ: Casa de Oswaldo Cruz/Fundação Oswaldo Cruz;

DAPS/ENSP/FIOCRUZ: Departamento de Administração e Planejamento em Saúde/ Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Oswaldo Cruz;

DMS/FCMSCSP: Departamento de Medicina Social da Faculdade de Ci­ências Médicas Santa Casa de São Paulo;

DMS/FCM/UNICAMP: Departamento de Medicina Social da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas;

DMP/FMUSP: Departamento de Medicina Preventiva/Faculdade de Me­dicina da Universidade de São Paulo;

DMPS/FM/UFMG: Departamento de Medicina Preventiva e Social/ Fa­culdade de Medicina/Universidade Federal de Minas Gerais;

ENSP: Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca;

FCM/UNICAMP: Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Es­tadual de Campinas;

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FIOCRUZ: Fundação Oswaldo Cruz;

FSP/USP: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo;

IESC/UFRJ: Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro;

IMS/UERJ: Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro;

INAMPS: Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social;

ISC/UFBA: Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia;

UEL:Universidade Estadual de Londrina;

UERJ: Universidade do Estado do Rio de Janeiro;

UFBA: Universidade Federal da Bahia;

UFPEL:Universidade Federal de Pelotas;

UFF: Universidade Federal Fluminense;

UFMG: Universidade Federal de Minas Gerais;

UFRGS: Universidade Federal do Rio Grande do Sul;

UFRJ: Universidade Federal do Rio de Janeiro;

UFSC: Universidade Federal de Santa Catarina;

USP: Universidade de São Paulo;

USP/CEDEC: Universidade de São Paulo/Centro de Estudos de Cultura con­temporânea;

UNICAMP: Universidade Estadual de Campinas;

UNIFESP: Universidade Federal de São Paulo.

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