signo objeto e mito em o diário de dorian grey

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Page 1: Signo objeto e mito em o diário de dorian grey

Rev. Humanidades, Fortaleza, v. 17, n. 2, p. 130-132, ago./dez. 2002130

Eduardo Jorge de Oliveira

Signo, Objeto e Mito no “O Retrato de Dorian Gray”de Oscar Wilde

Signs, Object and Myth in “A Portrait of Dorian Gray”,by Oscar Wilde

Eduardo Jorge de Oliveira1

Resumo

A arte produz signos e significados. Nesse ínterim, a literatura os perpetua, principalmente nas obrasconsideradas primas. O Retrato de Dorian Gray, obra de Oscar Wilde, envolve a mitologia quando, nosubtexto, Oscar Wilde subverte o mito de Narciso com o personagem Dorian Gray e o que seria uma crise derepresentação que o homem sente ao buscar a beleza e a jovialidade. Portanto, como metodologia foi utilizadoo estudo de análise bibliográfica, onde foi feita uma primeira leitura para obter uma visão geral e na segundaleitura foram utilizados os textos do mito de Narciso, de Carl Gustav Jung e Lúcia Santaella.

Palavras-chave: Literatura; Oscar Wilde; Inconsciente; Semiótica; Mitologia.

Abstract

Art produces signs and meanings. However, literature eternalize them, even more on those works considered masterpieces.Dorian Grey´s Portrait, Oscar Wilde´s masterpiece, envolves mythology when, in the subtext, Oscar Wilde suverts Narcise´s myth withthe character Dorian Gray and what was suposed to be a representation´s crisis about what men feel about reaching his beauty and youththerefore, as a choosen methodogy, a bibliografy analysis had to be done. A first reading was done to obtain a generaly vision and, ina second reading, some articles about Narcise´s myth, by Carl Gustav Jung and Lúcia Santaella were utilized.

Keywords: Literature; Oscar Wilde; Unconcious; Semioptic; Mythology.

1 Apresentação

Nas mais diversas formas de emancipação daarte há a produção de signos, significantes esignificados. Charles Pierce, considerado o pai doestudo dos signos, da Semiótica, já havia afirmadoque não existe um signo puro. A semiose, essadinâmica do signo, é objeto referente de estudo dasemiótica.

Na linguagem literária existe hegemonia doimaginário do leitor. A partir desse imaginário,consideramos a obra literária icônica, principalmenteporque ela pode ser observada por todos os aspectosda tricotomia pierceana (ícone, índice e símbolo).Ícone por possibilitar diversas interpretações, deacordo com cada leitor; índice por fornecer elementosque possibilitem ao leitor fazer um caminho ou criarconexões de idéias e símbolo por criar um referente ànovas significações.

No único romance do escritor irlandês OscarWilde (fixado depois em Londres), O Retrato deDorian Gray (trad. Clarice Lispector) não é só umlivro de idéias como dizem alguns, mas existe todoum rico simbolismo no eterno desejo do Homem deser jovem e eternamente belo. Tudo isso, incendiadopela vaidade.

2 Signo, Objeto e Mito no O Retrato deDorian Gray de Oscar Wilde

Sim, Basil, esse menino é um Narciso.

Lord Henry

O signo, o objeto e o Mito de Narciso

Qualquer objeto, som ou palavra capaz derepresentar uma outra coisa é signo. Essa

1 Estudante de Publicidade e Propaganda. Mailto: [email protected]

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Signo, Objeto e Mito no “O Retrato de Dorian Gray” de Oscar Wilde

representação pode ser feita através da palavra, fotoou uma pintura. Oscar Wilde (1854 – 1900) no prefáciodo livro diz: “Toda arte é ao mesmo tempo aparênciae símbolo”.

Wilde, no seu único romance O Retrato deDorian Gray, parte de uma experiência pessoal (sendorepresentado pelo Lord Henry) para uma obra pluralcom vários significados. O principal fator analisado éa mudança de sentidos. Signo e Objeto invertem ospapéis. A pintura do jovem Dorian deixa de ser suarepresentação para possuir suas características,enquanto Dorian Gray, jovial e belo, passa ele mesmoa ser sua própria representação. O signo passa a serobjeto e o objeto passa a ser signo.

Basil Hallward era o pintor que trabalhava noretrato de Dorian Gray, um jovem de beleza única.“sua imagem jovial transmitia alegria pureza ebondade...seu rosto transmitia uma total ausência desofrimentos”. É importante ressaltar que o retrato deDorian Gray era em tamanho natural, a sua maisperfeita representação. O culto à própria beleza deDorian e a admiração alheia por ela também nospermite fazer uma comparação com o mito de Narcisoque será explanado no decorrer do texto.

A velhice não só destrói e degrada a beleza físicacomo afirmou Basil, mas simboliza a morte. LordHenry duvida que os velhos ainda sejam capazes desentir alguma emoção.

Dorian não é eleito fruto de todo esse desejo àtoa. Ele é o símbolo desse objeto de veneração dosdois personagens. Ele representa o conceito dejovialidade e beleza na forma mais tangível, poisambos conceitos são abstratos e, é aí que Wilde atingeos pontos mais fracos da humanidade: juventude ebeleza eterna.

Para compreender melhor esse desejo, vejamosum comentário sobre os arquétipos de cadapersonagem. Brasil, o pintor era passivo e submisso atodos os encantos de Dorian, mesmo assim, amavasua beleza de uma forma racional. Lord Henryrepresenta mais o lado do desejo, do impulso, dalibertinagem e da inconseqüência. Ele sucumbiaDorian para o lado mais instintivo e ele cedeu poisera muito vaidoso. Ele adorava a sua imagem. Ele eraa sua imagem. Ao contrário de Narciso que via suaimagem fora de si, Dorian era a sua própriarepresentação desde o dia em que desejou que a pinturaenvelhecesse por ele e que ele ficasse sempre igual asua imagem ali representada (a imagem dele estavanele próprio, por isso ele se admirava). Nesse caso,Dorian era uma Narciso “às avessas”.

Esse culto a imagem fez com que aspersonagens pronunciassem que a aparência é tudo eque os homens tanto racionais quanto os instintivospossuem esse desejo do belo. Mas a sociedade daépoca gira em torno da aparência. Dorian Gray haviaproferido a uma de suas namoradas que era mau. “Osmaus são velhos e feios”, respondeu ela. Sem quererfugir de meu objeto de estudo, é de relevância aimportância da obra na sociedade atual não tão isentadesses valores, por isso O Retrato de Dorian Graytraz à tona, a atemporalidade. Muitas campanhaspublicitárias se utilizam desse eterno desejo dejovialidade, desses desejos de “Basis” e “Harrys” dasociedade contemporânea.

Anteriormente, Dorian teve uma namoradachamada Sybil Vane. Uma pequena e pobre atriz.Dorian desencantou-se quando ela não representoubem o seu papel. Apaixonada por ele, Sybil Vanepratica o suicídio. O quadro de Dorian ganha as marcasdo primeiro crime. Voltando para o mito de Narciso.A ninfa Eco apaixonou-se por ele. Ele também ficouencantado, mas logo o encanto se desfaz e ele adespreza. Eco, muito triste, resolve esconder-se nascavernas onde fica até o desfalecimento do corpo,restando apenas a voz. O que é muito parecido com oque ocorreu com Dorian e Sybil Vane.

O Quadro e o Inconsciente

“Geralmente, o aspecto inconsciente de um acontecimento

Nos é revelado através dos sonhos, onde se manifesta

Não como um pensamento racional,

mas como uma imagem simbólica”

C.G. Jung

O retrato não expunha só as marcascronológicas deixadas pelo tempo. O quadro passa amostrar o seu íntimo, seu inconsciente. O marco dissoé quando Dorian resolve esconder o quadro na inóspitabiblioteca do seu falecido avô. Ali ninguém teriaacesso. Só ele de vez em quando poderia ver o seu“inconsciente”, que seria o reflexo dos seus atos.“Esconderia uma coisa que trazia em si uma corrupçãopior do que a decomposição da morte. Seus pecadosseriam, para a imagem pintada na tela, o que o vermeé para o cadáver”.

Ele tenta se redimir de todas as coisas ruins quefizera, como deixar sua segunda namorada temendoque ela fizesse a mesma coisa que Sybil Vane o fezmas, o quadro ganhou uma aparência mais apavorante,mais maligna. Ele havia poupado a camponesinha porpura vaidade. Estava tudo no seu insconsciente. Era,

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Eduardo Jorge de Oliveira

portanto, “o espelho da sua alma”. Dorian assume umavida dupla, a da beleza e jovialidade que transmitiaum ar de inocência e os caprichos de uma vida libertinaestigmatizada pelos traços da pintura.

O assassinato de Basil merece uma atençãoespecial. O criador da obra perdera sua autoria. Dorianagora era o responsável pelo quadro. O seuinconsciente e suas ações determinavam os seus traçose mudava o seu semblante na pintura. Antes de morrer,Basil não reconhece a pintura, somente depois de versua assinatura é que cai em súplica. O artista não tinhanoção do que tinha criado. O inconsciente de Basil naprodução também está presente, é isso que Oscar Widenos passa. Isso, é difícil de se admitir racionalmente.A consciência, segundo Jung, resiste às manifestaçõesdo inconsciente (Jung, 1964:31)

No último encontro de Dorian Gray com oquadro haviam novas expressões na tela. Nos olhos,foram expressões de astúcia e malícia e “na boca: umtrejeito hipócrita”. Isso o perturbou, poisinsconscientemente não estava se redimindo. O quadrodizia isso. Então, Dorian tenta destruí-lo. Ele era aúnica prova do seu lado sórdido. É o momento emque se trava uma luta entre a consciência e oinsconsciente. Assim, o lado perverso no seuinsconsciente não iria mais perturbar a consciência, asua razão. Ele atravessou o quadro com a mesma facaque matou Basil. Wilde, no desfecho do livro descreveo momento após Dorian ter tentado destruir o quadro,que representava o seu inconsciente:

“Ao entrarem na sala (os empregados), viram na paredeo magnífico retrato do amo – como havia sido: noesplendor de sua esplêndida mocidade e beleza.

No chão, estava o que restava de um homem. Vestido emtraje de rigor, com uma faca cravada no peito. Ele estavalívido. Enrugado. Repugnante.

Só pelos anéis os criados conseguiram identificá-lo.”(WILDE, 1995: 127)

Para Jung, uma palavra ou imagem é simbólicaquando tem um significado além do seu sentidoimediato (JUNG, 1964:20). Neste momento, o quadroque tinha ido além de seu valor representativo, volta ater apenas o valor imediato, perdendo todo o seusimbolismo (isso, sem deixar de ser representativo).

Dentro de uma perspectiva semiótica, o signoe o objeto voltam a ser o que eram. Signo volta a ser arepresentação e objeto o representado. Antes do quadro

assumir seu valor de representação, ele quebra umespelho dado pelo Lord Herry. A causa de tudo teriasido a beleza. Contudo, Dorian ao deixar de ser signo,torna-se um cadáver velho e indescritível assumindotodos os estigmas do tempo e do inconsciente deixadono quadro, enquanto a pintura representa ele quandoera jovem e belo. Uma das hipóteses, é que não houveum alívio para a consciência de Dorian Gray porqueele não havia sido punido ou sofrido algum castigo,isso no plano do inconsciente, e, afetando a razão. Elenão queria ser punido, a única prova de seus atos era oquadro, que era ele mesmo. Quando destruiu o quadro,ele se destruiu.

Resultados

Analisar o livro O Retrato de Dorian Graypossibilitou a compreensão da percepção do signodentro da literatura, uma análise de signo e objeto, e,a relação homem e mito. Como Dorian é um Narcisocom uma imagem-em-si, um Narciso “às avessas”.Houve, portanto, uma inversão entre representação erepresentado.

Na segunda parte, pudemos relacionar O R.D.Gcom o inconsciente e símbolo segundo as idéias deCarl G. Jung (196: 20). Este artigo foi necessário, paraa conclusão da Disciplina de Semiótica, ministradapela professora Gabriela Reinaldo.

Referências

BULFINCH, Thomas. O livro de ouro da mitologia.Rio de Janeiro: Ediouro, 1999.

FERRAZ, Maria N. S. et al. Comunicação verbal enão-verbal. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 1997.

JUNG, Carl G. O Homem e seus símbolos. Rio deJaneiro: Nova Fronteira, 1964. cap. 1.

SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo:Brasiliense, 1990. (Coleção Primeiros Passos).

WILDE, Oscar. O retrato de Dorian Gray. Traduçãode Clarisse Lispector. Rio de Janeiro: Ediouro, 1995.

Data de Revisão: 03/02/2002Data de Entrega: 02/01/2002Data do Aceite: 05/04/2002