revinter revista da toxicologia -volume 7 número 3 out de 2014 - são paulo
DESCRIPTION
REVISTA DE TOXICOLOGIA, RISCO AMBIENTAL E SOCIEDADETRANSCRIPT
ISSN 1984-3577
São Paulo, v. 7, n. 3, out. 2014
_______________________________________________________________________________________________________
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 06-149, out. 2014
2014 Intertox
Periódico científico de acesso aberto, quadrimestral e arbitrado
meses: (2) fevereiro, (6) junho e (10) outubro.
Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida desde que citada a fonte.
As opiniões e informações veiculadas nos artigos são de inteira e exclusiva responsabilidade dos
respectivos autores, não representando posturas oficiais da empresa Intertox Ltda.
Seções
Artigo Original; Artigo de Atualização; Comunicação Breve; Ensaio; Nota de Atualização e
Revisão; Notas
Idiomas de Publicação
Português e Inglês
Contribuições devem ser enviadas para <[email protected]>.
Disponível em: <http://revinter.intertox.com.br>.
Normalização e Produção Web site
Henry Douglas
Capa
Henry Douglas
Projeto Gráfico
Henry Douglas
Rua Turiassú, 390 - cj. 95 - Perdizes - 05005-000 - São Paulo - SP – Brasil Tel.: 55 11 3872-8970
http://www.intertox.com.br / [email protected]
RevInter – Revista Intertox de Toxicologia,
Risco Ambiental e Sociedade. / InterTox uma empresa do
conhecimento. – v. 7, n. 3, (out. 2014).- São Paulo: Intertox. 2014.
Quadrimestral
ISSN: 1984-3577
1. Ciências Toxicológicas. 2. Risco Químico. 3. Sustentabilidade
Socioambiental. I. InterTox uma empresa do conhecimento.
Biblioteca InterTox II. Título.
1. Ciências Toxicológicas. 2. Risco Químico. 3. Sustentabilidade
Socioambiental. I. InterTox uma empresa do conhecimento.
Biblioteca InterTox II. Título.
_______________________________________________________________________________________________________
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 06-149, out. 2014
Expediente
Editor(a) Conselho Editorial Científico (2011-2013)
Maurea Nicoletti Flynn Alice A. da Matta Chasin
Bibliotecária Doutora em Oceanografia (USP) Doutora em Toxicologia (USP)
Com Especialização Ecologia
Comitê Científico (2011-2013)
Irene Videira Lima
Doutora em Toxicologia (USP), Perita Criminal
Toxicologista do IML-SP por 22 anos.
Marcus E. M. da Matta
Doutor em Ciência pela Faculdade de Medicina
USP. Especialista em Gestão Ambiental (USP).
Engenheiro Ambiental e Turismólogo.
Moysés Chasin
Farmacêutico-bioquímico pela UNESP-SP
especializado em Laboratório de Análises
Clínicas e Toxicológicas e de Saúde Pública.
Ex-Perito Criminal Toxicologista de classe
especial e Diretor no Serviço Técnico de
Toxicologia Forense do Instituto Médico Legal
da SSP/São Paulo. Diretor executivo da
InterTox desde 1999.
Ricardo Baroud
Farmacêutico-Bioquímico Toxicólogo, Editor
Científico da PLURAIS Revista
Multidisciplinar da UNEB e da TECBAHIA
Revista Baiana de Tecnologia.
Eduardo Athayde
Coordenador no Brasil do WWI - World Watch
Institute
Eustáquio Linhares Borges
Mestre em Toxicologia (USP), ex-Presidente da
Sociedade Brasileira de Toxicologia, ex-
Professor Adjunto de Toxicologia da UFBA.
Fausto Antonio de Azevedo
Mestre em Toxicologia USP, ex-Diretor Geral
do Centro de Recursos Ambientais do CRA-BA,
ex-Presidente do CEPED-BA, ex-Subsecretário
do Planejamento, Ciência e Tecnologia do
Estado da Bahia.
Isarita Martins
Doutora e Mestre em Toxicologia e Análises
Toxicológicas (USP), Pós-doutorado em
Química Analítica (UNICAMP), Farmacêutica-
Bioquímica Universidade Federal de Alfenas
MG.
João S. Furtado
Doutor em Ciências (USP), Pós-doutorado
(Universidade da Carolina do Norte, Chapel
Hill, NC, EUA).
José Armando-Jr
Doutor em Ciências (Biologia Vegetal) (USP),
Mestre (UNICAMP), Biólogo (USF).
Sylvio de Queiroz Mattoso
Doutor em Engenharia (USP), ex-Presidente do
CEPED-BA.
_______________________________________________________________________________________________________
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 06-149, out. 2014
Sumário
TOXICOLOGIA
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de
câncer gástrico nesta região 6
Desenvolvimento de métodos cromatográficos qualitativos para identificação
de benzodiazepínicos 25
Utilização na medicina popular, potencial terapêutico e toxicidade em nível
celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia officinalis L. e Mentha
piperita L. (Família Lamiaceae) 50
SUSTENTABILIDADE
A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações 69
Plantas medicinais: cultivo em quintais pela população de um município do
semiárido Piauiense, nordeste do Brasil 101
SOCIEDADE
Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias processadoras
de açaí de Imperatriz-MA 114
Percepção de adolescentes em conflito com a lei sobre as ações de saúde 124
Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em moradores
de bairros da zona sul de Teresina – PI 140
Editorial
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 06-149, out. 2014.
Revinter inscrita no Sistema Qualis da CAPES
A Revinter – Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e
Sociedade – é um periódico científico de acesso aberto, quadrimestral (meses
de fevereiro, junho e outubro), arbitrado, publicado pela parceria Intertox-
Ecoadvisor, São Paulo, SP, Brasil e classificado na Tabela de Áreas do
Conhecimento do CNPq em Ciências Biológicas - 2.10.07.00-4 – Toxicologia.
Sua missão é divulgar a produção científica da Toxicologia, Meio
Ambiente e Sociedade, estimulando as contribuições criativas e inéditas do
trabalho acadêmico, de pesquisa e do meio empresarial, tanto de autores
nacionais como estrangeiros, contribuindo para a discussão e o
desenvolvimento do conhecimento nestas áreas.
A Revinter tem como objetivos: (a) contribuir para o aumento da
produção de conhecimento das comunidades acadêmica e profissional de
Toxicologia; (b) servir como canal adequado para veicular avanços
conceituais, tecnológicos e de experiências empresarial e profissional; (c)
estimular a difusão de conhecimentos que promovem atitudes voltadas ao
aumento de competitividade das organizações.
Seu foco está na publicação de contribuições científicas no campo das
Ciências Toxicológicas, com ênfase em todos os aspectos do gerenciamento
dos riscos químico e toxicológico que tenham repercussão sobre o meio
ambiente e a sociedade. Além dos números regulares, a Revinter pode editar
edições especiais monotemáticas, que abordem temas relevantes que
possuam interface com a toxicologia e a sustentabilidade socioambiental.
A Revinter aceita a submissão de contribuições de profissionais e
pesquisadores de todas as áreas envolvidas com as Ciências Toxicológicas,
como as seguintes especialidades, entre outras: Biossegurança;
Contabilidade Social e Ambiental; Direito Ambiental; Economia Ambiental;
Farmacoepidemiologia; Fármaco-toxicologia; Planejamento Ambiental;
Química Ambiental; Resíduos Sólidos, domésticos e industriais; Segurança
Alimentar; Sociologia da Saúde; Toxicidade de resíduos de praguicidas;
Toxicologia Ambiental; Ecotoxicologia; Toxicologia da Reprodução e do
Desenvolvimento; Toxicologia de Alimentos; Toxicologia Forense;
Toxicologia Ocupacional; Toxicologia pré-clínica e clínica; Toxicologia Social.
As diferentes seções da Revinter são: Toxicologia; Ecotoxicologia;
Sustentabilidade e Sociedade. As contribuições são publicadas na forma de:
Artigos originais; Comunicações; Ensaios; Informes; Opinião; Revisões.
Os originais submetidos para publicação na Revinter, em Português,
Espanhol ou Inglês, serão aceitos para análise pressupondo-se que: (a) sejam
exclusivamente inéditos; (b) todas as pessoas listadas como autores tenham
Editorial
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 06-149, out. 2014.
aprovado o encaminhamento; (c) qualquer pessoa citada como fonte de
comunicação pessoal aprovou a citação; (d) as opiniões emitidas pelos
autores sejam de sua exclusiva responsabilidade. O Comitê Editorial faz
uma análise preliminar quanto à pertinência e/ou adequação da submissão
ao escopo da Revinter. As contribuições recebidas são submetidas à
apreciação de dois membros do Conselho Editorial, dentro de suas
especialidades. Em caso de empate, um terceiro membro será convidado. A
análise é assessorada, quando necessário, por Avaliadores ad hoc. O
resultado do parecer do Conselho Editorial é comunicado aos autores, sob
anonimato, obedecendo-se o procedimento conhecido por sistema duplo-cego.
A Comissão Editorial procederá as alterações de ordem puramente formal,
ortográfica e gramatical, visando a manutenção do padrão culto da língua,
respeitando, porém, o estilo dos autores. Quando se fizerem necessárias
modificações substanciais, os autores serão notificados e encarregados de
fazê-las.
A Revinter adota a filosofia de "acesso aberto", permitindo o acesso
gratuito e irrestrito ao seu conteúdo, proporcionando maior democratização
mundial do conhecimento.
O esforço permanente do grupo que lidera a Revinter resultou em seis
anos de publicações ininterruptas até aqui, tendo-se atingido o total de 19
números, com 157 artigos publicados e 195 autores. Desde o lançamento de
seu primeiro número, em outubro de 2009, a Revinter já registrou, no total,
257.934 downloads, com média mensal de 3582 downloads.
Isso tudo somado possibilitou que a Revinter fosse incluída pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), do
Ministério da Educação (MEC), na classificação do Sistema WebQualis. O
Qualis é um sistema de avaliação de periódicos mantido pela Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no Brasil que
relaciona e classifica os veículos utilizados para a divulgação da produção
intelectual quanto ao âmbito da circulação (local, nacional ou internacional)
e à qualidade (A, B, C). A classificação possui atualização anual e segue uma
série de critérios definidos pela CAPES, que inclui o número de exemplares
circulantes, número de bases de dados em que está indexado, número de
instituições que publicam na revista.
Conforme se pode consultar no endereço da internet
http://qualis.capes.gov.br/webqualis/principal.seam, a Revinter encontra-se
incluída como transcrito abaixo:
Editorial
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 06-149, out. 2014.
Tal fato gera novo alento e força propulsora para que a Intertox-
Ecoadvisor e todo o corpo de profissionais envolvidos com a Revinter
renovem suas forças e a determinação de prosseguir levando adiante essa
cruzada pela divulgação do conhecimento e geração de oportunidade para a
publicação dos autores brasileiros.
Maurea Nicoletti Flynn e Fausto Antonio de Azevedo
Conselho Editorial Científico
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
6
Relação entre consumo alimentar da
população nordestina e o alto índice de
câncer gástrico nesta região
Victor Alves de Oliveira
Núcleo de Pesquisa em Biotecnologia Aplicada a Saúde e Meio
Ambiente - NUPBSAM
Aluno do Curso de Nutrição do Campus Senador Helvídio Nunes de
Barros – Universidade Federal do Piauí. CSHNB.
Thayse Wilma Nogueira de Oliveira
Núcleo de Pesquisa em Biotecnologia Aplicada a Saúde e Meio
Ambiente - NUPBSAM
Aluna do Curso de Nutrição do Campus Senador Helvídio Nunes de
Barros – Universidade Federal do Piauí. CSHNB.
Marcus Vinicius Oliveira Barros de Alencar
Laboratório de Pesquisa em Genética Toxicológica
Aluno da Pós Graduação em Ciências Farmacêuticas
Universidade Federal do Piauí. CSHNB.
Gilberto Santos Cerqueira
Laboratório de Anatomia Universidade Federal do Piauí, CSHNB
Doutor do Curso de Nutrição do Campus Senador Helvídio Nunes de
Barros – Universidade Federal do Piauí. CSHNB.
Ana Paula Peron
Núcleo de Pesquisa em Biotecnologia Aplicada a Saúde e Meio Ambiente
- NUPBSAM
Professora Doutora do Curso de Ciências Biológicas do Campus Senador
Helvídio Nunes de Barros – Universidade Federal do Piauí. CSHNB.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
7
João Marcelo de Castro e Sousa*
Núcleo de Pesquisa em Biotecnologia Aplicada a Saúde e Meio Ambiente
- NUPBSAM
Professor Mestre do Curso de Ciências Biológicas do Campus Senador
Helvídio Nunes de Barros – Universidade Federal do Piauí. CSHNB.
*Autor para correspondência: João Marcelo de Castro e Sousa, e-mail:
[email protected] , fone (86) 81006336.
RESUMO
No mundo, o câncer de estômago figura como a segunda maior causa de
morte por câncer. A relação entre câncer gástrico e nutrição é apontada em
vários estudos, sendo a dieta um fator exógeno bastante relevante. Dessa
forma, este trabalho teve como objetivo cruzar dados do perfil alimentar da
população do nordeste brasileiro com estudos que investigaram a relação
entre as neoplasias gástricas e os principais alimentos consumidos, para
explicar a alta incidência desta neoplasia na região. Para isso, foi realizada
uma revisão de literatura, por meio de buscas bibliográficas nos bancos de
dados informatizados Medline/Pubmed, Scielo e Lilacs, no período de maio a
julho de 2013, considerando artigos que investigaram a relação entre
neoplasias gástricas e a alimentação. Foram encontrados 43 artigos, dos
quais 21 atenderam aos critérios de inclusão do estudo, e estes foram
divididos em dois grupos. O primeiro com as características alimentares do
nordeste, e o segundo, a influência dos alimentos tradicionais nas neoplasias
gástricas. Analisando os artigos: arroz, café, feijão, carne e refrigerantes
estão entre os principais alimentos consumidos pela população nordestina e
alguns desses alimentos possuem, na sua composição ou na sua conservação,
substâncias carcinogênicas. Observou-se também que alguns alimentos,
ditos preventivos para tal patologia, são os menos consumidos pela
população dessa região. Portanto, pode-se notar que a alimentação da
população nordestina parece possui uma estreita relação com o
desenvolvimento e a alta incidência do câncer gástrico, sendo um fator de
risco a ser considerado e estudado para a redução dessa patologia na região.
Palavras-chaves: Câncer gástrico. Alimentação. Nordeste. Brasil.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
8
ABSTRACT
Worldwide, stomach cancer appears as the second leading cause of cancer
death. The relationship between gastric cancer and nutrition is suggested in
several studies, the diet being a very important exogenous factor. Thus, this
paper aims to cross data between dietary profile of the northeastern
Brazilian population with studies that investigated the relationship
between gastric cancer and the main food items consumed, to explain the
high incidence of this tumor in the region. For this, a literature review,
through literature searches in computerized databases Medline / Pubmed,
Lilacs and SciELO, from the period May to July 2013, considering articles
that investigated the relationship between gastric cancer and diet. Overall
43 papers were found, of which 21 met the inclusion criteria. The included
papers were divided into two groups. The first with northeast region dietary
characteristics, and the second, with the influence of traditional food on
gastric neoplasms. The items: rice, coffee, beans, meat and soft drinks are
among the main food item consumed by the population and some of these
foods have in their composition or their storage process, carcinogenic
substances. It was also observed that the population of that region
consumes less preventive food items for such pathology. Therefore, it can be
noted that the diet of the Northeastern population has a close relationship
with the development and high incidence of gastric cancer. Such a risk
factor must be considered and studied to reduce this pathology in this region
Keywords: Gastric Cancer. Food. Northeast. Brazil.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
9
INTRODUÇÃO
No mundo, um dos tipos mais comuns de câncer é o de estômago e
este figura como a segunda maior causa de morte por câncer. A mais recente
estimativa mundial apontou a ocorrência de cerca de um milhão de casos
novos de câncer de estômago para o ano de 2014, configurando-se como a
quarta causa mais comum de câncer. Mais de 70% dos casos ocorreram em
países em desenvolvimento, como o Brasil. E, além disso, a incidência é
cerca de duas vezes mais alta no sexo masculino do que no feminino. Para o
ano de 2014, estima-se, para o Brasil, 20.390 novos casos, sendo 12.870
homens e 7.520 mulheres. Para a região Nordeste, foco do estudo, sem
considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer de estomago é o
segundo em homens (9/100 mil) e o sexto mais frequente entre as mulheres
(6/100 mil) (INCA 2014).
O câncer gástrico é uma patologia de etiologia multifatorial, em que
os tumores se desenvolvem a partir de lesões na mucosa gástrica,
ocasionadas pela ação e/ou interação de fatores de risco, ou seja, é um
processo que inclui várias etapas sendo resultado da exposição a fatores
endógenos (genéticos) e exógenos (ambientais), por um longo período de
tempo (CARVALHO et al. 2010).
Para os fatores endógenos, as alterações no material genético se
destacam no desenvolvimento e progressão do câncer gástrico, tendo
alterações em oncogenes e genes supressores de tumores (genes que
controlam o ciclo celular) assim como em outros mecanismos de controle da
estabilidade genômica, respondendo pelo aparecimento dessa patologia. As
alterações descritas até agora incluem amplificações e mutações nos
seguintes genes: c-ERBB2, KRAS, MET, TP53 e c-MYC (RIBEIRO et al.
2010).
A relação entre câncer gástrico e nutrição é apontada em vários
estudos, sendo a dieta um fator exógeno bastante relevante. Entre os fatores
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
10
dietéticos associados à carcinogênese gástrica, vale ressaltar que dietas com
altas concentrações de cloreto de sódio, nitrito e nitrato, presentes em
alimentos defumados e frituras, são o ponto inicial para provocar
transformações na mucosa gástrica, podendo dar início a esta neoplasia
(MELO et al. 2012). Acredita-se que cerca de 35% dos diversos tipos de
câncer ocorrem em razão de dietas inadequadas. É possível identificar, por
meio de estudos epidemiológicos, associações relevantes entre alguns
padrões alimentares observados em diferentes regiões do globo e a
prevalência de tal patologia (GARÓFOLO et al. 2004).
Características regionais apontadas no consumo individual
confirmam os perfis diferenciados de disponibilidade de alimentos que
caracterizam as cinco grandes regiões do Brasil. O rendimento familiar é
importante para caracterizar a disponibilidade domiciliar de alimentos e o
consumo individual. O aumento da presença de frutas, verduras, legumes e
do refrigerante esta ligado a um maior rendimento familiar, e a tendência
inversa também foi observada para o consumo de feijão e farinha de
mandioca (JAROSZ et al. 2012).
Diversos autores apontam estudos que mostram a dieta habitual como
importante fator no aparecimento do câncer de estômago. Entre os fatores
de risco para essa neoplasia, está uma dieta rica em gorduras animais e com
baixa ingestão de frutas, vegetais e cereais. Além da dieta inadequada, estão
entre os fatores de risco o alcoolismo, sedentarismo e a infecção alimentar
pela Helicobacter pylori.
Diante do exposto, o objetivo do estudo foi cruzar dados de perfil
alimentar da população do nordeste do Brasil com estudos que investigaram
a relação entre as neoplasias gástricas e os principais alimentos consumidos
por esta população, sejam eles carcinogênicos ou anticarcinogênicos,
explicando assim a alta incidência desta neoplasia na região.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
11
METODOLOGIA
Foi realizada uma revisão de literatura, por meio de buscas
bibliográficas nos bancos de dados informatizados Medline/Pubmed, Scielo e
Lilacs, no período de maio a julho de 2013. Considerou-se os artigos que
investigaram a relação entre neoplasias gástricas e a alimentação, incluindo
uma pesquisa das características alimentares do nordeste do Brasil.
Incluíram-se artigos de estudos epidemiológicos transversais, ecológicos,
revisão, caso-controle e coorte publicados no período de 2008 a 2013. Não
foram inseridos no estudo, artigos nos quais o câncer foi investigado em
relação a suas consequências para o estado nutricional. Excluíram-se
também, aqueles que não estavam disponíveis na íntegra, visto que esse fato
dificultava e/ou impossibilitava a extração de informações relevantes para a
investigação dos fatores e desfecho analisados.
As buscas foram conduzidas por meio do formulário avançado
utilizando no campo “descritores de assunto” as seguintes palavras-chave
em português e seus correspondentes em inglês: neoplasias gástricas,
fatores de risco, consumo alimentar, alimentos, câncer de estômago e
características alimentares do nordeste do Brasil. Todas as palavras-chave
constam nos descritores em ciências da saúde.
Do conjunto de artigos identificados, foram selecionados os
relacionados com os hábitos alimentares, e estudos que comprovem a
interação dos principais alimentos consumidos na região com o
aparecimento destas neoplasias.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram encontrados 43 artigos, dos quais 21 atenderam aos critérios de
inclusão do estudo, compreendendo artigos de revisão, caso controle,
epidemiológicos e transversais.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
12
Os artigos foram divididos em dois grupos. O primeiro continha
aqueles que tratavam das características alimentares do nordeste, e o
segundo, os que citavam a influência de cada um dos alimentos mais
consumidos na região com o aparecimento de neoplasias gástricas. A partir
dos artigos base do grupo um, foi feito um cruzamento de dados para traçar
o perfil alimentar da população do nordeste do Brasil.
Com a pesquisa foi possível traçar o perfil alimentar do nordestino,
que mostrou que os alimentos mais consumidos pela população da região de
um modo geral são: arroz (84%), café (79%), feijão (72,8%), pão de sal (63%) e
carne bovina (48,7%). A banana foi a fruta mais citada (16,0%) e a salada
crua (16%) a preparação incluindo verduras mais frequentes entre os
brasileiros. A prevalência do consumo de sucos e refrescos foi de 39,8% e de
refrigerantes 23%, assim estes ocuparam, respectivamente, a sexta e nona
posições entre os alimentos mais consumidos. A prevalência de consumo do
leite integral foi de 12,4% e a de queijos, 13,5%. Biscoito salgado (15,9%),
bolos (13,4%), e doces (11,7%) também estiveram entre os 20 alimentos com
maior prevalência de consumo no País.
Entre os trabalhos analisados, o de Souza e colaboradores (2013)
mereceu destaque pois construíram em sua pesquisa o ranking dos 20
alimentos mais consumidos no Brasil, a partir do Inquérito Nacional de
Alimentação, onde são levados em consideração fatores regionais,
econômicos e sociais para o consumo alimentar. O café foi o item de maior
prevalência no Nordeste (83,6%). Sucos e refrescos também figuraram entre
os itens de maior consumo ficando em sexta posição no ranking. A
prevalência do consumo de refrigerantes foi de 16,1%, o que corresponde à
14ª posição. Hortaliças foram mais frequentemente citadas sob a forma de
salada crua no Nordeste (20ª posição, 10,6%).
Alguns itens, que aparecem entre os mais prevalentes somente em algumas
regiões, marcam características locais no consumo de alimentos, por
exemplo, a farinha de mandioca na região Nordeste (13ª posição, 18,2%). Os
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
13
doces também aparecem entre os itens mais consumidos na região, com
prevalência em torno de 13%. Já os salgados fritos e assados não figuraram
entre estes itens. Os biscoitos salgados e os ovos estão entre os mais
prevalentes em todas as regiões do país, e os peixes também foram citados
com importância no Nordeste.
A partir do estudo de Souza e colaboradores (2013) foi analisado
alimentos com alta incidência para região Nordeste e que ao mesmo tempo
possuem na sua constituição compostos que são fatores de risco para o
desenvolvimento e progressão do processo de carcinogênese gástrica. Como
também foram avaliados e analisados alimentos de baixa incidência na
mesma região do País e que possuem propriedades antineoplásicas.
Alimentação como fator de risco para o câncer gástrico na Região
Nordeste
Café
Dentre todos os alimentos citados no consumo diário dos nordestinos o
café obteve o maior destaque ocupando o topo do ranking de consumo. O café
é uma das matérias-primas com maior importância no comércio
internacional. É igualmente uma das bebidas mais apreciadas em todo
mundo, não só pelas suas características organolépticas, mas também pelo
seu efeito estimulante (ALVES et al. 2009).
Esta é uma bebida muito consumida pela população, que possui uma
mistura complexa de diferentes moléculas com atividade genotóxica, como o
metilglioxal, o peróxido de oxigênio e os dicarbonos alifáticos, formados
durante o processo de torrefação. Düsman et al. (2012) mostram que o café
induz mutações em várias cepas de Salmonella typhimurium, em células de
hamster Chinês e em linfócitos humanos. O café instantâneo também possui
atividade genotóxica, tanto por seus constituintes como pela formação dos
compostos fenólicos decorrentes da auto-oxidação do mesmo.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
14
Estudos realizados demonstraram que a cafeína, presente em chás e
cafés, afeta a ação reparadora do DNA durante a divisão celular, modifica a
resposta apoptótica e altera o funcionamento do gene p53, que codifica uma
proteína reguladora do ciclo celular. Além disso, o café e a cafeína são
capazes de interagir com muitos outros mutagênicos e os seus efeitos são
sinergísticos junto com raios-X, luz ultravioleta e alguns agentes químicos
(DÜSMAN et al. 2012).
Carne
A carne bovina também é um alimento muito consumido na região
nordeste, figurando entre os cinco itens mais consumidos (JAROSZ et al.
2012). O Departamento de Saúde dos Estados Unidos considera que existe
uma associação de risco moderado consistente entre o consumo de carnes
processadas e o câncer do trato gastrointestinal (MAGALHÃES et al. 2008).
Está bem documentado na literatura que os compostos N-nitrosos e o
nitrato induzem à formação tumoral por meio da sua transformação em
nitrito, um óxido desestabilizado, que pode acarretar danos ao material
genético, causando assim uma lesão celular. O nitrito, que pode ser formado
endogenamente, também provém das carnes curadas (conservadas com
nitrito de sódio), embutidos e alguns vegetais (espinafre, batata, beterraba,
alface, tomate, cenoura, nabo, couve-flor, repolho, rabanete, etc.) que contêm
nitrato, o qual é transformado em nitrito pela ação da saliva. Os
mecanismos postulados para o aumento do risco do câncer de estômago com
o consumo de compostos nitrosos estão associados ao aumento de radicais
livres, que promovem lesão celular com redução na produção de muco, um
fator de proteção à mucosa gástrica (MAGALHÃES et al. 2008).
Métodos de preservação e preparo de carnes, que acarretam a
formação de amina heterocíclicas, além dos nitritos, também foram
associados ao maior risco de cânceres do trato gastrintestinal. Por exemplo,
preparar as carnes com temperaturas elevadas, produzindo um suco
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
15
queimado, ou expor a carne diretamente ao fogo, como durante o preparo do
churrasco, tem sido desaconselhado pela World Cancer Research Fund, por
produzir componentes carcinogênicos na superfície do alimento e aumentar
o risco de câncer, principalmente de estômago. A presença de elevada
quantidade de benzo [a] pirenos – hidrocarboneto cíclico aromático nos
alimentos, considerado um potente carcinogênico - também é correlacionada
com essas formas de preparações e parece associar-se com o risco aumentado
de câncer do trato gastrintestinal (GARÓFOLO et al. 2004).
Refrigerantes
Estudos toxicológicos na literatura com corantes alimentares
presentes em refrigerantes mostram que alguns desses corantes possuem
atividades citotóxicas e mutagênicas. Alves e colaboradores (2009)
comprovaram que o corante caramelo, presente nos refrigerantes sabor Cola,
apresentou atividade mutagênica em Salmonella typhimurium cepa TA 100.
O corante também causou convulsões quando administrado em ratos,
camundongos e pintos, afetou adversamente os níveis de glóbulos brancos e
linfócitos em animais de laboratório, e inibiu a absorção de vitamina B6 em
coelhos, devido à presença de uma impureza chamada de 4-Metilimidazol no
corante caramelo, produzida por processos que utilizam amônia. O 4-
Metilimidazol apresentou potencial carcinogênico em camundongos tratados
por 2 anos com concentrações bem elevadas dessa substância. Outros
corantes como o amaranto, corante presente em alimentos como,
refrigerante sabor Uva, também apresentou potencial mutagênico e
carcinogênico quando administrados em camundongos (ALVES et al. 2009).
Gomes e colaboradores (2013) demostraram que os corantes
alimentares amarelo crepúsculo, vermelho bordeaux e amarelo tartrazina
tem capacidade citotóxica sobre o ciclo celular de Allium cepa L. Cada
corante foi avaliado nas doses de 0,4 e 4,0 mL, nos tempos de exposição de
24 e 48 horas, em células de pontas de raízes de Allium cepa L, e os
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
16
resultados obtidos mostraram que os três corantes, nas doses e tempos de
exposição avaliados, foram citotóxicos às células do sistema-teste utilizado.
Salgados, biscoitos e industrializados
O consumo de alimentos processados e industrializados se mostra
prevalente na população de todo o Brasil. No Nordeste, a prevalência de
salgados fritos ou assados não foi tão expressivo, porém os biscoitos e
industrializados foram citados entre a maior parte da população de todo o
país, estando mais presente entre os adolescentes de renda alta e média
(JAROSZ et al. 2012).
Nestes alimentos o potencial carcinogênico esta presente na interação
dos aditivos alimentares com o organismo. É pertinente a constante
preocupação com as substâncias químicas sintéticas, pois estas podem
desencadear o câncer, estando presentes nos alimentos como aditivos ou
contaminantes ambientais de uso na agricultura como, por exemplo, os
agrotóxicos.
Algumas substâncias adicionadas aos alimentos, como os corantes e
os conservantes, acumulam-se no organismo e deve-se tomar um cuidado
maior quanto as suas doses de ingestão diária. Mesmo considerando-se uma
parcial eliminação dessas substâncias e uma degradação metabólica da
mesma, deve-se destacar que não existem informações bem definidas para
cada substância quanto à dose diária de ingestão e o risco da carcinogênese.
Dependendo da substância, uma pequena dose ingerida diariamente e por
tempo prolongado, pode resultar no câncer (CESAR e TOLEDO 2011).
As nitrosaminas e os antioxidantes BHA (antioxidante butil
hidroxianisol) podem provocar danos e mutações no DNA, provavelmente
desencadeando, desta forma, a neoplasia. Também alguns corantes
artificiais, nomeadamente a eritrosina e a tartrazina, apresentam este
potencial. Essas substâncias alteram o “turn-over” das células durante o seu
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
17
crescimento normal ou no processo de hiperplasia regenerativa e, deste
modo, contribuem para a incidência de câncer (ALVES et al., 2009).
A identificação de agentes antimutagênicos e/ou anticarcinogênicos
em alimentos é de grande relevância na busca de estratégias para a
prevenção do câncer. Atualmente, os corantes mais investigados são os do
grupo Azo (amarelo tartrazina, amarelo crepúsculo e vermelho 40), devido
aos seus possíveis efeitos mutagênicos e carcinogênicos.
Farinha
No nordeste, uma característica marcante da alimentação desta
região é o alto consumo de farinha de mandioca. A relação entre o consumo
de farinha e o câncer, é a alta ingestão de anilina, presente em vários tipos
de farinha de mandioca e fonte de radicais aminas e dióxido de nitrogênio.
Estes compostos podem atuar como substrato para a formação endógena de
nitrosaminas, importantes carcinógenos associados à patogênese do câncer
gástrico, particularmente na situação de carência relativa de antioxidantes,
em função de um consumo reduzido de legumes e vegetais, embora maior de
frutas. Os compostos nitrosos e o nitrato induzem à formação tumoral por
meio da sua transformação em nitrito, levando ao aumento na produção de
radicais livres (CESAR e TOLEDO 2011).
Alimentação como fator preventivo de câncer gástrico na região
Nordeste
Uma nutrição adequada e apropriada é indispensável para a
manutenção da saúde. Contribui tanto para a diminuição de riscos de
doenças como também para a restauração da homeostasia em casos de
enfermidades. Por meio da alimentação é possível promover a recuperação,
reabilitação, desintoxicação e reparo de células, proporcionando maior
vitalidade a órgãos e tecidos.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
18
A alimentação pode modificar o processo de carcinogênese,
principalmente nos estágios iniciais, proporcionando melhores resultados no
tratamento e diagnóstico clínico. Dessa forma, através de um padrão
nutricional normal ou equilibrado pode-se reduzir o risco de câncer
(ANTUNES et al. 2010).
Foram identificadas várias etapas na patogênese do câncer nas quais
os fatores dietéticos podem, supostamente, atuar no aumento ou na
diminuição da probabilidade de desenvolvimento de um câncer clínico.
Sendo assim é de fundamental importância conhecer as substâncias
mutagênicas em cada alimento que pode causar câncer, além de conhecer
também alimentos que promovam o processo inverso, identificando sua ação
e como este previne tal patologia (FIGUEREDO e SILVA 2003; GARÓFOLO
et al. 2004; EPPLEIN et al. 2010).
Frutas e sucos
O consumo de frutas pela população nordestina não é tão frequente. A
fruta mais consumida é a banana, que esteve prevalente não só nesta região
mais em todo o Brasil. Outra fruta também citada no consumo,
principalmente da população idosa, foi a laranja, que tem boas
concentrações de vitamina C. Os sucos também tiveram lugar de destaque
no consumo da população nordestina e ocuparam a sexta posição no ranking
dos alimentos mais consumidos. Os sucos e frutas estão ligados com a
prevenção do câncer, pois as vitaminas possuem propriedades
quimiopreventivas que funcionam como antioxidantes em sistemas
biológicos (JAROSZ et al. 2012; CESAR e TOLEDO 2011; SHILLS et al.
2009).
As vitaminas mais investigadas com propriedades quimiopreventivas
são os carotenóides e as vitaminas C e E, que funcionam como
antioxidantes. O processo carcinogênico é caracterizado por um estado
oxidativo crônico, especialmente na etapa de promoção. Além disso, a fase de
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
19
iniciação está associada com dano irreversível no material genético da
célula, devido ao ataque de radicais livres. Desse modo, os nutrientes
antioxidantes poderiam reduzir o risco de câncer inibindo os danos ao DNA
(CESAR e TOLEDO 2011).
Estudos sobre o mecanismo de ação dos carotenóides, na inibição da
carcinogênese, revelaram a existência de ações múltiplas: proteção ao DNA
contra a mutagênese e genotoxicidade; inibição da proliferação celular;
facilitação da comunicação intercelular e estímulo ao sistema imunológico.
As vitaminas C e E são importantes antioxidantes, que reduzem a
velocidade de iniciação ou previnem a propagação de radicais livres. A
vitamina E é especialmente importante na prevenção da peroxidação de
lipídios, enquanto que a vitamina C reage efetivamente com superóxido e
radicais hidroxilas. Esta vitamina desempenha ainda papel importante na
redução de radicais cromanoxil e na regeneração da vitamina E. Um
mecanismo importante na prevenção do câncer pelo ácido ascórbico é a sua
capacidade de inibir a formação de compostos N-nitrosos (N-nitrosaminas).
Essa propriedade é de grande significado na redução do risco de câncer em
humanos. Sob certas condições, suplementação com ácido ascórbico pode
reverter células transformadas em células morfologicamente normais,
podendo ser este mais um mecanismo de sua atuação na prevenção de
tumores (CESAR e TOLEDO 2011).
Quanto à vitamina E (α-tocoferol), esta é reconhecida, como a melhor
bloqueadora de radicais livres em membranas. Tem sido demonstrado que a
vitamina E inibe reações de nitrosação na célula, sugerindo que possa
exercer um efeito anticarcinogênico. A suplementação com vitamina E não
altera a progressão de tumores já instalados. Sugere-se que sua ação
antitumoral esteja ligada à sua capacidade de inibir a formação de radicais
livres, que poderiam danificar o DNA. Da mesma forma que a vitamina C, a
vitamina E pode atuar sobre o sistema imunológico aumentando a resposta
imune (PACHECO e SGARBIERI 2010).
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
20
Os estudos de Epplein e colaboradores (2010) notaram que os homens
com o mais alto consumo de frutas tinham uma redução de
aproximadamente 50% no risco de câncer gástrico distal em comparação com
os homens com o mais baixo consumo de frutas. Esta associação foi
especialmente forte entre os fumantes sempre masculinos, para quem
aqueles com mais alto nível de ingestão de frutas tiveram quase 60% menos
risco de câncer gástrico distal.
Cavalcante e colaboradores (2011) observaram em seu estudo com
camundongos que o caju (Anacardium occidentale) mais precisamente em
forma de suco e cajuína (suco processado), as formas mais comumente
consumidas no nordeste do Brasil, tem elevado potencial antigenotóxico e
anticlastrogênico in vivo, o que pode estar relacionado com os compostos
antioxidantes encontrados em ambas as bebidas. Mostrando assim, a
capacidade dessa fruta em reduzir os radicais livres que são elementos que
reagem com a estrutura do DNA causando modificações nessa estrutura.
Leite e fibras alimentares
A alimentação da população nordestina apresentou características
peculiares quanto ao consumo de leite e fibras alimentares presentes nas
saladas cruas. O leite é a forma mais acessível da suplementação alimentar
de cálcio e, as fibras solúveis e insolúveis nos legumes e vegetais são
responsáveis por uma grande proteção em outros tipos de câncer do trato
gastrointestinal.
Cabral e Gruezo (2010) citam alguns estudos de coorte e caso-controle
que comprovam que há uma associação entre a ingestão de cálcio e a
diminuição dos riscos de câncer colorretal, citam também estudos que
mostram que uma ingestão >250g/dia de leite esta relacionada com um
menor risco de câncer colorretal quando comparado com uma ingestão
<70g/dia, e que o consumo de 500g/dia (aproximadamente 2 copos de leite)
estava associado com a redução em 12% do risco de câncer colorretal.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
21
As fibras alimentares também denominadas dietéticas constituem um
grupo de componentes funcionais dos mais importantes. É fornecida
principalmente pelos alimentos de origem vegetal e tem ações protetoras
contra o câncer colorretal (ANTUNES et al. 2010).
Várias hipóteses procuram explicar a ação preventiva da fibra
alimentar no câncer de cólon: 1) redução da exposição a agentes
carcinogênicos pelo aumento do bolo fecal e/ou diminuição do tempo de
trânsito do bolo intestinal; 2) redução da produção de ácidos biliares
secundários (desoxicólico e litocólico) pela diminuição de bactérias
produtoras de enzimas (7-α-desidroxilases) responsáveis pela conversão dos
ácidos biliares primários (cólico e quenodesoxicólico) nos ácidos secundários
que são pro-carcinogênicos; 3) efeito ligante da fibra a hormônios
(estrógenos) promotores de câncer de cólon e mama; 4) produção de ácidos
graxos de cadeias curtas que contribuem para a redução do pH do bolo
intestinal e desempenham papel fisiológico importante em nível de tecido
epitelial (ANTUNES et al., 2010).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista todos os dados avaliados, pode-se notar que a
alimentação na região Nordeste possui uma estreita relação com o
desenvolvimento de vários tipos de câncer, principalmente o de estômago
por este órgão ser o primeiro do trato gastrointestinal a ter contato com
substâncias carcinogênicas e por ser onde as primeiras interações de grande
importância estão acontecendo, aumentando assim sua exposição a
substâncias precursoras de dano e que pode induzir ao câncer.
Outro fator importante observado na alimentação dessa região foi a
taxa do consumo de alimentos que tem potencial carcinogênico, como carnes,
refrigerantes, café, farinha e industrializados, que se apresentou bem mais
elevada que o consumo de alimentos como sucos e frutas que previnem o
aparecimento de neoplasias gástricas.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
22
Além disso, deve se levar em consideração o fator econômico que está
ligado ao consumo alimentar da população e a disponibilidade de alimentos
na região.
Assim, o declínio da incidência do câncer gástrico na região Nordeste,
pode se dar com a implementação de uma alimentação rica em frutas e
vegetais, visto que o consumo destes alimentos pela população da região é
deficiente. É necessário também que aconteça uma reeducação alimentar
quanto ao consumo de alimentos com potencial carcinogênico, para que aja
um equilíbrio favorável à prevenção desta neoplasia.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES RC, CASAL S, OLIVEIRA B. Benefícios do café na saúde: mito ou
realidade? Quim. Nova, Vol. 32, No. 8, 2169-2180, 2009.
ANTUNES DC, SILVA IML, CRUZ WMS. Quimioprevenção do Câncer
Gástrico. Revista Brasileira de Cancerologia 2010; 56(3):367-374.
CABRAL CM, GRUEZO ND. Ingestão de Cálcio e Vitamina D e Risco de
Câncer Colorretal: uma Revisão Bibliográfica. Revista Brasileira de
Cancerologia 2010; 56(2): 259-266.
CARVALHO JB, SALGADO NA, SILVA ACM, RAMOS EMLS, DEMACHKI
S, ARAÚJO MS. Fatores de risco socioambientais e nutricionais envolvidos
na carcinogênese gástrica. Rev. para. Med.; 2011, 25(2/3) abr.-set.
CAVALCANTE AACM, DANTAS SMMM, LEITE AS, MATOS LA, SOUSA
JMC, PICADA JN, SILVA J. In vivo Antigenotoxic and Anticlastogenic
Effects of Fresh and Processed Cashew (Anacardium occidentale) Apple
Juices. J Med Food 14. 2011, 792–798
CESAR ACG, TOLEDO MCB. Comparação do desenvolvimento sócio-
econômico com a morbidade hospitalar nos casos de câncer de pulmão,
estômago e colorretal entre as regiões Nordeste e Sudeste do Brasil. RevBio
- Revista de Biociêcias da Universidade de Taubaté. Vol.17 - nº 2 –
2011.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
23
DÜSMAN E, BERTI AP, SOARES LC, VICENTINI VEP. Principais agentes
mutagênicos e carcinogênicos de exposição humana. SaBios: Rev. Saúde e
Biol., v.7, n.2, mai./ago., 2012. 66-81.
EPPLEIN M, SHU XO, XIANG YB, CHOW WH, YANG G, LI HL, ET AL.
Fruit and Vegetable Consumption and Risk of Distal Gastric Cancer in the
Shanghai Women’s and Men’s Health Studies. Am J Epidemiol 2010;
172:397–406.
FIGUEREDO VA, SILVA CHC. A influência da alimentação como agente
precursor, preventivo e redutor do câncer. Universitas Ciências da
Saúde- vol.01 n.02:317-325.
GOMES KMS, OLIVEIRA MVGA, CARVALHO FRS, MENEZES CC,
PERON AP. Citotoxicity of food dyes Sunset Yellow (E-110), Bordeaux Red
(E-123), and Tatrazine Yellow (E-102) on Allium cepa L. root meristematic
cells. Food Sci. Technol, Campinas, 33(1): 218-223, 2013.
GARÓFOLO A, AVESANI CA, CAMARGO KG, BARROS ME, SILVA SR,
TADDEI JAAC, SIGULEM DM. Dieta E Câncer: Um Enfoque
Epidemiológico. Rev. Nutr., Campinas, 17(4):491-505, 2004.
Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA).
Estimativa 2012: incidência de câncer no Brasil, Rio de Janeiro: Inca,
2012.
Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA).
Incidência de câncer no Brasil, Rio de Janeiro: Inca, 2012.
JAROSZ M, SEKUŁA W, RYCHLIK E, FIGURSKA K. Impact of diet on
long-term decline in gastric cancer incidence in Poland. World J
Gastroenterol. January 7; 17(1): 89-97. 2011.
MAGALHÃES LP, OSHIMA CTF, SOUZA LG, LIMA JM, CARVALHO L,
FORONES NM. Variação de peso, grau de escolaridade, saneamento básico,
etilismo, tabagismo e hábito alimentar pregresso em pacientes com câncer
de estômago. Arq Gastroenterol. 45. (02). 2008.
MELO MM, NUNES LC, LEITE ICG. Relationship between Dietary Factors
and Anthropometric and Gastrointestinal Tract Neoplasms: Investigations
Done in Brazil. Revista Brasileira de Cancerologia. 2012. 58(1): 85-95.
PACHECO MTB, SGARBIERI VC. Alimentos Funcionais. Campinas – SP;
2010.
Artigo original
OLIVEIRA, Victor Alves de; OLIVEIRA, Thayse Wilma Nogueira de; ALENCAR, Marcus
Vinicius Oliveira Barros de; PERON, Ana Paula; SOUSA, João Marcelo de Castro e.
Relação entre consumo alimentar da população nordestina e o alto índice de câncer gástrico
nesta região. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n.
3, p. 06-24, out. 2014.
24
RIBEIRO HF, ALCÂNTARA DFA, MATOS LA, SOUSA JMC, LEAL MF,
SMITH MAC, BURBANO RR, BAHIA MO. Cytogenetic characterization
and evaluation of c-MYC gene amplification in PG100, a new Brazilian
gastric cancer cell line. Braz. Journal Med Biol Res, August 2010,
Volume 43(8) 717-721
SHENG GE, FENG X, SHEN L, WEI Z, ZHU Q, SUN J. Association
between Habitual Dietary Salt Intake and Risk of Gastric Cancer: A
Systematic Review of Observational Studies. Gastroenterology Research
and Practice. Gastroenterology Research and Practice: 2012, Vol. 2012,
11 p.
SHILLS ME, et al. Nutrição moderna na saúde e na doença, 2ª ed.
Barueri, SP: Manole; 2009. 781-97.
SOUZA AM, PEREIRA RA, YOKOO EM, LEVY RB, SICHIERI R.
Alimentos mais consumidos no Brasil: Inquérito Nacional de Alimentação
2008-2009. Rev Saúde Pública 2013; 47(1 Supl):190S-9S.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
25
Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para
identificação de benzodiazepínicos
Julia de Abreu Gadelha
Farmacêutica graduada pela Universidade Federal do Ceará
Endereço para correspondência: Laboratório de Pesquisa em
Toxicologia.
*Autor para correspondência: Laboratório de Pesquisa em Toxicologia.
Rua Alexandre Baraúna, 949 - Rodolfo Teófilo - Fortaleza - CE / CEP
60430-160. 3º andar.
Auriana Serra Vasconcelos
Farmacêutica mestranda em farmacologia da Universidade Federal do
Ceará
Vívian Romero Santiago
Farmacêutica Perita legista da Perícia Forense do Ceará e especialista
em farmacologia legal.
Wanderley Pinheiro de Holanda Junior
Farmacêutico Perito legista da Perícia Forense do Ceará.
Breno Alves Auad Moreira
Farmacêutico mestrando em ciências farmacêuticas da Universidade
Federal do Ceará.
Janete Eliza de Sá Soares
Professora doutora da disciplina de toxicologia de alimentos do
Departamento de Farmácia da Faculdade de Farmácia, Odontologia e
Enfermagem da Universidade Federal do Ceará.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
26
Teresa Maria de Jesus Ponte Carvalho
Professora doutora da disciplina de Análises Toxicológicas do
Departamento de Farmácia da Faculdade de Farmácia, Odontologia e
Enfermagem da Universidade Federal do Ceará.
RESUMO
Os benzodiazepínicos são os agentes sedativo-hipnóticos mais prescritos no
mundo devido à eficácia terapêutica e ao rápido início de ação. Porém, desde
1970, são descritos casos de dependência devido ao consumo abusivo desses
fármacos. Além disso, são utilizados com objetivo criminoso em roubos e
estupros através de adulterações em bebidas ou alimentos, sendo os
principais, flunitrazepam, clonazepam, diazepam e midazolam. A
Toxicologia Forense utiliza métodos analíticos de triagem e de confirmação
para a identificação de substâncias, entre eles, os mais utilizados são os
métodos cromatográficos. O objetivo desse estudo foi desenvolver métodos
cromatográficos qualitativos por Cromatografia em Camada Delgada (CCD)
e Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE) para a identificação dos
benzodiazepínicos (bromazepam, clonazepam, clordiazepóxido, diazepam,
flunitrazepam, flurazepam e midazolam). Foram testadas diferentes
condições cromatográficas para o aperfeiçoamento dos métodos. Para CCD,
selecionou-se a fase móvel acetato de etila:metanol:hidróxido de amônio
(89,5:10:0,5) e revelação através da solução de cloreto férrico, de
aquecimento e da solução de Dragendorff para melhor identificação e
separação. Foram observadas colorações diversas de manchas (branco, cinza,
amarelo, laranja e marrom) e fatores de retenção entre 0,30 e 0,58. O
método foi testado para a análise de duas amostras de comprimidos, que
mostraram a presença de flunitrazepam e bromazepam. Para CLAE,
utilizando-se coluna C18, comprimento de onda 230nm, fluxo 1mL/min e
volume de injeção de 25µL, foram testadas diferentes proporções da fase
móvel acetonitrila:metanol:água na tentativa de identificar e separar os sete
padrões de benzodiazepínicos, não sendo possível esta separação. Porém, a
fase móvel acetonitrila:metanol:água (40:20:40) ajustada em pH 4 com ácido
fosfórico (1/2) foi capaz de separar os padrões de flunitrazepam (5,6 min),
clonazepam (4,4 min) e diazepam (11,4 min). Além disso, a fase móvel
acetonitrila:metanol:água (20:45:35) identificou o midazolam (10,5 min), que
não foi detectado nas outras proporções da fase móvel testadas. Diante dos
resultados expostos, a metodologia desenvolvida nesse estudo pode ser
aplicada nas análises toxicológicas qualitativas com finalidade forense,
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
27
porém, ainda necessita de mais estudos para o aperfeiçoamento do método e
para a sua validação analítica.
Palavras-chave: Cromatografia em Camada Delgada. Cromatografia
Líquida de Ultra Eficiência. Toxicologia Forense. Benzodiazepínicos.
ABSTRACT
Benzodiazepines are sedative-hypnotic agents and the most prescribed in
the world due to its therapeutic efficacy and rapid onset of action. However,
since 1970, cases of dependence due to the abuse of these drugs have been
described. Moreover, those agents are used to rob and rape victims through
adulteration of food or drinks. The most used are flunitrazepam,
clonazepam, diazepam and midazolam. The Forensic Toxicology uses
analytical methods of screening and confirmation for the identification of
substances. The most common are chromatographic methods. The aim of
this study is to develop chromatographic methods for qualitative Thin Layer
Chromatography (TLC) and Ultra Performance Liquid Chromatography
(UPLC) for the identification of benzodiazepines (bromazepam, clonazepam,
chlordiazepoxide, diazepam, flunitrazepam, flurazepam and midazolam).
Different chromatographic conditions for the improvement of the methods
were tested. For TLC, the mobile phase selected was ethyl acetate:
methanol: ammonium hydroxide (89,5:10:0,5) and the visualization agents
were ferric chloride solution, heating and Dragendorff solution for better
separation. Colorations were observed forming several spots (white, gray,
yellow, orange and brown) and the retention factors observed, between
0.30and 0.58. The method was tested for the analysis of two samples of
tablets, which showed the presence of flunitrazepam and bromazepam. For
UPLC, using a C18 column, wavelength 230nm, flow1ml/min and injection
volume of 25μL were tested different ratios of mobile phase
acetonitrile:methanol:water in an attempt to identify and separate the
seven patterns of benzodiazepines. The separation was not possible.
However, the mobile phase acetonitrile:methanol:water(40:20:40) adjusted
to pH 4 with phosphoric acid (1/2) was capable of separating patterns of
flunitrazepam (5.6 min), clonazepam (4.4 min) and diazepam (11.4 min). In
addition, mobile phase acetonitrile:methanol:water(20:45:35) identified
midazolam (10.5 min), which was not detected in other mobile phase ratios
tested. The methodology developed in this study can be applied in
qualitative toxicological analyzes with forensic purpose; however, it still
needs more studies to analytical validation.
Keywords: Thin Layer Chromatograph.Ultra Performance Liquid
Chromatography.Forensic Toxicology.Benzodiazepines.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
28
INTRODUÇÃO
A Toxicologia Forense engloba qualquer aplicação da ciência dos
toxicantes, com o objetivo de esclarecer uma investigação criminal e está
intimamente relacionada à Toxicologia Analítica, a qual consiste na
identificação e/ou quantificação de agentes tóxicos e/ou seus metabólitos,
como também na detecção de parâmetros relacionados com a exposição à
toxicantes que resultam em alterações fisiológicas no organismo (MOREAU;
SIQUEIRA, 2008).
As análises toxicológicas com fins médico-legais são empregadas para
detectar, identificar e quantificar agentes tóxicos, com aplicação nas
análises post-mortem, controle de dopagem, toxicodependência, crimes
ambientais (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008).
Dentre as metodologias utilizadas nas análises toxicológicas, temos
como bastante utilizada a cromatografia. A cromatografia é um método
físico-químico de separação, que se baseia na migração diferencial dos
componentes de uma mistura, distribuídos em duas fases imiscíveis, a fase
móvel e a estacionária. A fase estacionária permanece fixa e a fase móvel
passa através dela, arrastando determinados componentes da mistura,
enquanto outros ficam retidos na fase estacionária, o que irá resultar na
migração diferencial de cada componente (PERES, 2002).
Os métodos cromatográficos possuem boa sensibilidade e são capazes
de separar diversos tipos de espécies, desde não voláteis até termicamente
instáveis, sendo utilizados para fins qualitativos e quantitativos (TONHI,
2002).
Considerando os diversos tipos de cromatografia, podemos destacar a
Cromatografia em Camada Delgada (CCD) e a Cromatografia Líquida de
Alta Eficiência (CLAE).
A Cromatografia em Camada Delgada (CCD) tem sido empregada
como método de triagem para a detecção de compostos carbâmicos, como o
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
29
aldicarb (XAVIER et al., 2007) e a CLAE como método de confirmação
(MELITO, 2004) com finalidade forense. A CLAE é bastante utilizada como
método de triagem ou confirmação e, juntamente com a espectrometria de
massa, é a técnica de eleição para confirmação por fornecer máxima
especificidade possível (MOREAU; SIQUEIRA, 2008).
Dentre as drogas de importância para as situações periciais, destacam-
se os benzodiazepínicos, drogas estas que originalmente teriam ação
sedativa e hipnótica, podendo ser usados também como agentes
antiepilépticos, ansiolíticos, relaxantes musculares e como anestésicos,
quando administrados em altas doses e associados a outros fármacos.
(GOODMAN, 2006). Entretanto, além da dependência e tolerância,
infelizmente, os benzodiazepínicos passaram a ser “conhecidos nas ruas”
como drogas facilitadoras de estupros e roubos, possibilitando a venda por
traficantes. Os mais conhecidos são o flunitrazepam, designado por “rape
drug”, principalmente porque é um indutor do sono, cuja ação se dá de forma
rápida e intensa, além de atuar como ansiolítico, relaxante muscular e levar
a produção de amnésia (BERTHELON et al., 2003); o clonazepam (POLÍCIA
CIVIL DO ESTADO DE RONDÔNIA, 2013); e, o diazepam (AMIR;
WAISMAN, 2006), provavelmente, por serem fármacos da classe de
benzodiazepínicos com ação mais longa.
Estes fármacos vêm sendo utilizados com o objetivo criminoso de sedar
vítimas potenciais de estupro e assalto (CHEN; HU, 1999; BICHOP,
LERCH, MCCORD, 2004). Vários casos destes são registrados nas
delegacias brasileiras por vítimas induzidas a ingerir bebidas adulteradas
com essas substâncias, conhecidas, popularmente, como “Boa Noite
Cinderela” (LEIROZ; RIEHL, 2008).
Dessa forma, apesar de serem muito prescritos, os benzodiazepínicos
são alvos de uso indiscriminado (LAVIE et al, 2009; FORSAN, 2010), o que
torna necessário o desenvolvimento de métodos confiáveis para a análise
qualitativa e quantitativa desses fármacos no estudo médico-legal. Além
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
30
disso, o desenvolvimento de métodos capazes de identificar substâncias de
interesse forense permite estabelecer nexo causal entre um determinado
evento e um efeito, ou mesmo a tentativa deste, possibilitando a elucidação
de uma investigação (MENEZES et al., 2012).
O presente trabalho tem como objetivo principal desenvolver métodos
cromatográficos qualitativos (triagem e confirmação) para identificação dos
benzodiazepínicos com finalidade forense, principalmente aqueles fármacos
envolvidos em eventos criminosos que necessitam ser identificados para que
o procedimento legal seja instaurado.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo analítico, qualitativo, utilizando-se o método
da Cromatografia em Camada Delgada (CCD) e Cromatografia Liquida de
Alta Eficiência (CLAE).
As análises foram realizadas em um Cromatografia Liquida de Alta
Eficiência (CLAE) com sistema de bombeamento, detector com arranjo de
diodos (PDA) (AccelaThermoScientific®) e sistema de aquisição de dados
ChromQuest 5.0 (ThermoScientific®) e coluna analítica ODS HYPERSIL C18
(250x4,6mm) da ThermoScientific®.
Os reagentes sólidos foram pesados em balança analítica de precisão
RK®-200. A água utilizada no preparo das soluções foi purificada em
Sistema MilliQ – ELGA®. As soluções foram filtradas em sistema de
filtração com bomba a vácuo GAST®, membrana Pall Corporation® tipo
PTFE (0,45- 47mm) e homogeneizadas em banho ultrason QUIMIS® modelo
Q335D. Foram utilizados micropipetadores automáticos PIPETMANNeo®
GILSON e as medidas de pH foram feitas no Phmetro JENWAY® modelo
3510.
Foram utilizados os seguintes solventes e materiais: Água purificada
em sistema MilliQ® (resistividade 18,2 MΩ.cm); Acetato de etila (ISOFAR®);
Metanol e Hidróxido de amônio para análise - P.A. (VETEC®); Metanol e
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
31
Acetonitrila grau HPLC (TEDIA®); Cromato placas (Sílica gel 60 F254
MERCK®).
Os padrões de benzodiazepínicos analisados, bem como duas amostras
de comprimidos foram cedidos pela Perícia Forense do Ceará (PEFOCE).
Cromatografia em Camada Delgada (CCD)
Foram preparadas soluções de benzodiazepínicos 5% em metanol grau
CLAE. Os padrões utilizados no trabalho foram: bromazepam, clonazepam,
clordiazepóxido, diazepam, flunitrazepam, flurazepam e midazolam. As
amostras de comprimidos foram maceradas utilizando grau e pistilo e, em
seguida, extraídas com metanol.
Foram utilizados os seguintes reveladores: cloreto férrico 10% (FeCl3),
aquecimento (∆) e solução de dragendorff. A fase móvel utilizada foi acetato
de etila:metanol:hidróxido de amônio (89,5:10:0,5).
Primeiramente, foi feita a padronização com os benzodiazepínicos
bromazepam, clonazepam, clordiazepóxido, diazepam, flunitrazepam,
flurazepam e midazolam.
A aplicação dos padrões na placa cromatográfica foi feita utilizando-se
capilares de vidro (volume de ¼). Após a aplicação dos padrões, a
cromatoplaca foi levada para a cuba cromatográfica contendo o sistema
solvente acetato de etila: metanol: hidróxido de amônio (89,5:10:0,5) e foi
deixada eluir até 10 cm. Com a eluição completa, a cromatoplaca foi deixada
à temperatura ambiente para secagem e, em seguida revelada,
primeiramente, com o cloreto férrico a 10%, depois foi aquecida por 5
minutos em estufa a 100º C, e, por último, revelada com a solução de
Dragendorff.
Para a análise das amostras de comprimidos, aplicou-se pequenas
quantidades das soluções das amostras na cromatoplaca, juntamente com as
soluções padrões de benzodiazepínicos, e seguiram-se os mesmos
procedimentos descritos acima após a aplicação.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
32
Cromatografia Liquida de Alta Eficiência (CLAE)
As soluções dos fármacos de bromazepam, clonazepam,
clordiazepóxido, diazepam, flunitrazepam, flurazepam e midazolamforam
preparadas a 5% em metanol grau HPLC (solução estoque) e, em seguida,
diluídas para uma concentração de 250µg/mL (solução trabalho). Essas
soluções foram mantidas sob refrigeração até o momento de uso.
Diferentes comprimentos de onda foram analisados com a finalidade
de selecionar o que permitia melhor visualização dos padrões de
benzodiazepínicos. Os comprimentos testados foram: 210; 230e 315nm.
Para a escolha da composição da fase móvel para a separação
cromatográfica testaram-se os seguintes solventes em diferentes proporções:
acetonitrila (ACN), metanol (MetOH) e água purificada (H2O). As
composições testadas foram: ACN:MetOH:H2O (40:20:40), ACN:MetOH:H2O
(40:20:40) acidificada com H3PO4 (1:2) até pH 4, ACN:MetOH:H2O
(30:20:42), ACN:MetOH:H2O (35:20:45), ACN:MetOH:H2O (35:25:40),
ACN:MetOH:H2O (30:25:45), ACN:MetOH:H2O (45:35:20) e
ACN:MetOH:H2O (20:45:35). Todas elas, antes do uso, foram
desgaseificadas em aparelho para banho ultrassônico e a água foi filtrada
através de papel de filtro, com auxílio de bomba de vácuo.
Foi utilizada a coluna cromatográfica de fase reversa ODS
HYPERSIL C18 (250 x 4,6 mm x 5µm), tomando-se como base dados da
literatura (LIMA, 2009; KASSAB; LANGUE, 2009; SESHAGIRI RAO;
USHA RANI, 2009; SRUTHI et al, 2012).
As determinações cromatográficas foram feitas em CLAE e os sete
benzodiazepínicos estudados foram determinados pela cromatografia líquida
em fase reversa (CL-FR), fluxo 1mL/min e eluição isocrática composta de
fase móvel contendo os solventes acetonitrila, metanol e água.
Para evitar grandes oscilações de absorvância na linha de base, a
coluna cromatográfica era condicionada com a fase móvel a ser utilizada nos
experimentos por aproximadamente 20 minutos. Após esse tempo, eram
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
33
injetados 25µL dos padrões, observando-se a detecção através do tempo de
retenção. Diversas proporções da fase móvel composta pelos três solventes
(acetonitrila, metanol e água) foram testadas, descritas no item 3.4.2.3.
Porém, nem todos os benzodiazepínicos puderam ser testados em cada fase
devido a problemas técnicos do equipamento.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Determinações por Cromatografia em Camada Delgada (CCD)
No procedimento de revelação da cromatoplaca foi utilizado,
inicialmente, a solução de cloreto férrico (FeCl3), sendo possível a
visualização de três dos sete benzodiazepínicos (bromazepam,
clordiazepóxido e flunitrazepam). No entanto, as manchas eram muito claras
e fugazes. Então, a cromatoplaca foi aquecida para a melhor fixação das
manchas e, em seguida, foi revelada com a solução de Dragendorff. Após esse
revelador, foi possível a visualização dos sete padrões de benzodiazepínicos,
mostrando-se manchas bem mais visíveis (Tabela 1).
Segundo Clarke (1986), o cloreto férrico (FeCl3) é capaz de revelar
grupamentos fenólicos, já a solução de Dragendorff é capaz de revelar
compostos alcaloides, devido as reações químicas que ocorrem entre essas
substâncias. No entanto, apesar dos benzodiazepínicos não possuírem
grupamentos fenólicos e nem pertencerem à classe dos alcaloides, esses
reveladores são descritos como eficientes na literatura (MORAES;
SZNELWAR; FERNICOLA, 1991).
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
34
Um aspecto importante observado na revelação da cromatoplaca foi que
as manchas correspondentes aos padrões de clonazepam e midazolam eram
muito fugazes, e a mancha correspondente ao padrão de bromazepam
persistia ao passar do tempo, ficando com uma coloração roxa.
A fase móvel utilizada em CCD não deve ser pouco polar, incapaz de
remover os compostos do ponto de aplicação, e nem muito polar, capaz de
arrastar os compostos até o topo da placa cromatográfica. Sendo assim,
melhores resultados são obtidos com misturas de solventes (DEGANI;
CASS; VIEIRA, 1998).
No caso da separação dos benzodiazepínicos estudados, a fase móvel
constituída pelos solventes acetato de etila (89,5 mL), metanol (10 mL) e
hidróxido de amônio (0,5mL) foi capaz de permitir o deslocamento na fase
estacionária de todos os padrões de benzodiazepínicos, obtendo valores do
fator de retenção (Rf) na faixa de 0,3 a 0,6. Apesar da proximidade de alguns
valores, foi possível a identificação de cada benzodiazepínico, já que durante
a análise dos resultados em CCD também se leva em consideração as cores
das manchas obtidas durante a revelação (Tabela 2).
As amostras de comprimidos foram identificadas frente às condições
previamente estabelecidas, sendo elas: fase móvel -acetato de
etila:metanol:hidróxido de amônio (89,5:10:0,5) e reveladores –solução de
cloreto férrico, aquecimento e solução de Dragendorff. As soluções das
amostras foram aplicadas na cromatoplaca juntamente com os padrões de
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
35
benzodiazepínicos, a fim de identificar o(s) princípio(s) ativo(s) presente(s)
nos comprimidos.
A Tabela 3 apresenta os resultados das amostras de comprimidos e dos
padrões de benzodiazepínicos estudados frente às condições cromatográficas
já estabelecidas, descrevendo as cores e os valores do Rf produzidos pelos
reveladores solução de cloreto férrico (FeCl3) a 10%, aquecimento (∆) e
solução de Dragendorff.
As Figuras 1 e 2 mostram as placas cromatográficas reveladas com a
solução de cloreto férrico a 10% e com a solução de Dragendorff,
respectivamente.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
36
Figura 1 – Cromatoplaca por CCD após revelação com solução de cloreto férrico. Fase
móvel: acetato de etila:metanol:hidróxido de amônio (89,5:10:0,5).
Figura 2 – Cromatoplaca por CCD após revelação com solução de Dragendorff. Fase móvel:
acetato de etila:metanol:hidróxido de amônio (89,5:10:0,5).
Analisando o comportamento das amostras através da comparação
com os padrões, é possível identificá-las qualitativamente, porém, ainda será
necessária a confirmação dos resultados, já que a CCD é utilizada como
técnica de triagem. Na amostra 1 há a suspeita de flunitrazepam, já na
amostra 2 suspeita-se do bromazepam, pois os valores de Rf estão bem
próximos dos padrões desses fármacos, bem como revelaram de forma
semelhante aos padrões citados.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
37
Determinações por Cromatografia Líquida de Alta Eficiência em
Fase Reversa (CLAE-FR)
O comprimento de onda ideal é aquele em que o composto apresenta
absorção máxima e livre de interferências (COLLINS; BRAGA; BONATO,
2007). Dessa forma, entre os comprimentos de onda analisados, o escolhido
foi o de 230nm.
A escolha do solvente para a eluição depende da sua polaridade e da
sua capacidade de remover os analitos adsorvidos na fase estacionária. Para
as colunas menos polares, como a C18, utilizada na CLAE-FR, o solvente de
eluição precisa ter características bem polares, como a água, o metanol e a
acetonitrila (HAGE; CARR, 2011). Portanto, neste estudo os solventes
escolhidos para composição da fase móvel foram a acetonitrila, o metanol e a
água, testados em diferentes proporções.
Não foi possível encontrar uma fase móvel que separasse bem todos os
sete padrões de benzodiazepínicos. No entanto, foi possível visualizar
comportamentos diferentes de cada padrão com a utilização das diferentes
proporções da fase móvel.
De acordo com a teoria de Brönsted-Lowry, os ácidos são todas as
espécies químicas capazes de doar um próton (íon H+) a outra substância, já
as bases são as espécies químicas capazes de aceitar um próton de um ácido
(ATKINS; JONES, 2006). Observando a estrutura dos benzodiazepínicos
estudados nesse trabalho (Figura 3), é possível perceber que todos eles
podem funcionar como bases, pois são capazes de receber íons H+ através do
grupamento carbonila, porém, somente o bromazepam, o clonazepam e o
clordiazepóxido podem funcionar como ácidos, ou seja, são capazes de doar
íons H+ através do grupamento amina.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
38
O tempo de retenção engloba todo o tempo em que o analito
permaneceu no sistema cromatográfico, desde a injeção até a saída do ponto
máximo do pico. Esse tempo leva em consideração a interação do analito com
a fase móvel e com a fase estacionária, bem como a força do solvente de
eluição, ou seja, a capacidade do eluente de deslocar os solutos mais retidos
na fase fixa para permitir sua detecção. Quanto mais forte o solvente de
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
39
eluição, menor o tempo de retenção, ou seja, o analito será detectado mais
rapidamente. Em fase normal, o solvente forte é mais polar e vai reduzir a
retenção, já o mais fraco é menos polar e vai aumentar a retenção. Porém,
em fase reversa, o solvente fraco é o mais polar e o solvente forte é o menos
polar (COLLINS; BRAGA; BONATO, 2007). Portanto, na cromatografia em
fase reversa, o solvente fraco possui alta afinidade pelo analito mais polar,
podendo arrastá-lo mais rapidamente durante a corrida; já o solvente forte
possui baixa afinidade pelo analito mais polar, demorando mais tempo para
arrastá-lo.
A Tabela 5 contém as forças de eluição dos solventes por cromatografia
em fase normal, mostrando que a água é o solvente mais forte, o metanol
médio e a acetonitrila o mais fraco. Porém, por fase reversa, na detecção de
analitos mais polares, ocorre o inverso, a acetonitrila passa a ser o solvente
mais forte, seguido do metanol e a água o mais fraco.
Foram testadas diferentes proporções da fase móvel ACM:MetOH:H2O
na tentativa de identificar e separar cada um dos sete padrões de
benzodiazepínicos analisados. A seguir, os comportamentos desses padrões
serão descritos separadamente frente à fase móvel.
Bromazepam Entre todas as fases móveis analisadas, só foi possível a
detecção do padrão de bromazepam na fase ACN:MetOH:H2O (40:20:40)
acidificada com ácido fosfórico a pH 4, com formação de pico no tempo de
retenção de 4,45 minutos.
Clonazepam Após análise por CLAE nas fases móveis constituídas por
ACN:MetOH:H2O nas diversas proporções, foram obtidos diferentes tempos
de retenção do clonazepam (Figura 4).
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
40
Figura 4 - Comportamento do clonazepam frente às fases móveis compostas por
ACN:MetOH:H2O em diferentes proporções. Condições cromatográficas: coluna C18,
fluxo 1mL/min; comprimento onda 230nm, volume de injeção de 25µL.
Comparando esses tempos de retenção frente às fases móveis nas
variadas proporções, é possível fazer algumas observações com relação aos
solventes de eluição utilizados. Ao comparar a fase móvel na proporção
ACN:MetOH:H2O40:20:40, acidificada com H3PO4 (4,4min) e sem
acidificação (5,6min), percebeu-se que a fase acidificada foi capaz de reduzir
o tempo de retenção, ou seja, aumentou a interação da fase móvel com o
clonazepam, levando, entre as proporções testadas, ao menor tempo de
retenção obtido desse padrão.
Comparando as proporções ACN:MetOH:H2O30:25:45 (7,8min) e
35:25:40 (5,9min), notou-se que o aumento de acetonitrila e a diminuição da
água resultou na redução do tempo de retenção, mostrando que a
acetonitrila aumenta a interação do clonazepam com a fase móvel, mas a
água reduz a interação. Além disso, comparando as proporções
ACN:MetOH:H2O38:20:42 (6,2min) e 35:25:40 (5,9min), percebeu-se que o
aumento de metanol é capaz de reduzir o tempo de retenção, ou seja,
também aumenta a interação do clonazepam com a fase móvel.
Clordiazepóxido Os diferentes tempos de retenção do padrão de
clordiazepóxido frente à fase móvel ACN:MetOH:H2O nas diversas proporções
encontram-se na Figura 5.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
41
Figura 5 - Comportamento do padrão de clordiazepóxido frente às fases móveis
compostas por ACN:MetOH:H2O em diferentes proporções. Condições
cromatográficas: coluna C18, fluxo 1mL/min; comprimento onda 230nm, volume de
injeção de 25µL.
Com relação à acidificação da fase móvel, não ocorreu alteração
significativa no tempo de retenção do clordiazepóxido. E, diferente do
clonazepam, a fase móvel que permitiu uma eluição mais rápida desse
padrão foi ACN:MetOH:H2O na proporção 38:20:42 (4,8min), sendo assim,
ao comparar esse resultado com o obtido na proporção 40:20:40 (4,95min)
nota-se que o aumento da acetonitrila e redução da água levou a um
pequeno aumento do tempo de retenção, diferente do observado para o
clonazepam.
Comparando as eluições quando se utilizou ACN:MetOH:H2O nas
proporções 35:20:45 (6,2min) e 35:25:40 (5,27min), notou-se que o aumento
de metanol, com redução da água, é capaz de reduzir o tempo de retenção.
Porém, ao comparar os resultados obtidos com a fase ACN:MetOH:H2O nas
proporções 30:25:45 (6,8min) e 35:20:45 (6,2min), observou-se que o aumento
de acetonitrila e o a redução de metanol levou à redução do tempo de
retenção.
Diazepam Os tempos de retenção obtidos do padrão diazepam nas
diferentes fases móveis testadas encontram-se na Figura 6.
Figura 6 - Comportamento do padrão de diazepam frente às fases móveis compostas
por ACN:MetOH:H2O em diferentes proporções. Condições cromatográficas: coluna
C18, fluxo 1mL/min; comprimento onda 230nm, volume de injeção de 25µL.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
42
Entre todos os benzodiazepínicos estudados, o diazepam foi o que obteve os
maiores tempos de retenção. Observando a tabela 4 é verificado que ele não
é capaz de doar íons H+ e recebe apenas dois, sendo, entre os sete padrões
estudados, o que menos interage com a fase móvel.
A fase móvel ACN:MetOH:H2O (40:20:40) em pH 4 ajustado com H3PO4
foi a que obteve o menor tempo de retenção, demonstrando que a
acidificação da fase diminui a retenção. Isso ocorre porque o diazepam não é
doador de prótons e, portanto, em meio ácido, recebe prótons e fica
dissociado (mais polar), reduzindo a interação com a fase estacionária e,
consequentemente, o tempo de retenção.
Ao comparar as proporções de ACN:MetOH:H2O 30:25:45 (17,7min) e
35:20:45 (15,3min), percebe-se que ambas possuem o mesmo somatório de
acetonitrila e metanol (55%), porém, com tempos de retenção diferentes e
menor ao utilizar maior quantidade de acetonitrila, solvente de eluição mais
forte que o metanol. Para esse padrão, a acetonitrila e o metanol também se
mostraram inversamente proporcionais ao tempo de retenção. Com relação à
água, percebe-se que as duas proporções de fase móvel em que ela estava em
maior quantidade (30:25:45 e 35:20:45) tiveram os maiores tempos de
retenção, demonstrando que a água é diretamente proporcional à retenção.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
43
Flunitrazepam Após a análise por CLAE, observou-se que o
flunitrazepam possui comportamento semelhante ao clonazepam (figura 7).
É possível justificar isso ao verificar na tabela 4 que ambos são aceptores de
quatro íons H+, o que leva a interações semelhantes com a fase móvel e,
assim, a tempos de retenção semelhantes.
A fase móvel ACN:MetOH:H2O (40:20:40) em pH 4 foi a que permitiu o
menor tempo de retenção, porém, essa acidificação não levou à alteração
significante na retenção, pois não reduziu tanto o tempo de retenção como
aconteceu para o clonazepam e diazepam.
Figura 7 - Comportamento do padrão de flunitrazepam frente às fases móveis compostas
por ACN:MetOH:H2O em diferentes proporções. Condições cromatográficas: coluna C18,
fluxo 1mL/min; comprimento onda 230nm, volume de injeção de 25µL.
Flurazepam Os resultados dos tempos de retenção obtidos após eluição
nas diversas fases (figura 8) mostraram muita semelhança de
comportamento com o clordiazepóxido, com tempos de retenção iguais ou
bem próximos, o que se justifica ao verificar na tabela 4 que ambos são
aceptores de três íons H+.
A acidificação da fase móvel não alterou significativamente o tempo
de retenção. A fase móvel que permitiu menor retenção também foi
ACN:MetOH:H2O na proporção 38:20:42 (4,5min), que, ao comparar com a
proporção 40:20:40 (5min), notou-se que o aumento de acetonitrila e de água
resultou no aumento do tempo de retenção. Porém, ao comparar as
proporções 30:25:45 (6,8min) e 35:20:45 (6,2min), observa-se que o aumento
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
44
da acetonitrila e a redução do metanol, reduziram o tempo de retenção. E,
comparando as proporções 35:20:45 (6,2min) e 35:25:40 (5,33min), percebeu-
se que o aumento do metanol e redução da água levaram à redução do tempo
de retenção.
Figura 8 - Comportamento do padrão de flurazepam frente às fases móveis
compostas por ACN:MetOH:H2O em diferentes proporções. Condições
cromatográficas: coluna C18, fluxo 1mL/min; comprimento onda 230nm, volume de
injeção de 25µL.
Midazolam Entre todas fases testadas, o midazolam foi detectado
apenas na fase móvel ACN:MetOH:H2O (20:35:45), obtendo tempo de
retenção de 10,5 minutos. Essa fase foi escolhida para esse fármaco de
acordo com pesquisas na literatura (KASSAB; LANGUE, 2003).
Separação dos padrões de benzodiazepínicos
Na tentativa de separar os padrões de benzodiazepínicos, foram
escolhidas quatro fases móveis em diferentes proporções que foram testadas
para todos os sete benzodiazepínicos estudados. Os resultados encontram-se
na Figura 9.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
45
Figura 9 - Tempos de retenção dos benzodiazepínicos na fase móvel ACN:MetOH:H2O
em diferentes proporções. Condições cromatográficas: coluna C18, fluxo 1mL/min;
comprimento onda 230nm, volume de injeção de
25µL.
O diazepam mostrou uma boa separação em relação aos outros padrões
em todas as proporções da fase móvel ACN:MetOH:H2O, pois apresentou
tempos de retenção bem superiores em relação a todos os outros.
O flunitrazepam e o clonazepam apresentaram tempos de retenção bem
próximos, porém na fase ACN:MetOH:H2O pH 4 (40:20:40) foi possível a
separação dos dois.
O bromazepam fase ACN:MetOH:H2O pH 4 (40:20:40) mostrou tempo
de retenção muito próximo ao clonazepam, não podendo ser separado.
Para o clordiazepóxido e flurazepam não foi possível realizar a
separação, pois se comportam muito semelhantes frente às diferentes
proporções da fase móvel.
E o midazolam não foi detectado nas proporções da fase móvel
presentes nos gráficos da figura 11, mas foi possível sua detecção na fase
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
46
móvel ACN:MetOH:H2O (20:35:45), sendo essa fase escolhida para a sua
separação.
CONCLUSÃO
As condições cromatográficas (fase móvel e reveladores) utilizadas na
Cromatografia em Camada Delgada (CCD) para a separação dos
benzodiazepínicos estudados (bromazepam, clonazepam, clordiazepóxido,
diazepam, flunitrazepam, flurazepam e midazolam) foram estabelecidas.
São elas: fase móvel acetato de etila:metanol:hidróxido de amônia
(89,5:10:0,5) e reveladores solução de cloreto férrico, aquecimento e solução
de Dragendorff.
Na Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE), as condições
cromatográficas também foram estabelecidas para a identificação dos sete
padrões de benzodiazepínicos. São elas: fluxo de 1mL/min, comprimento de
onda de 230nm, coluna C18 e fase móvel acetonitrila:metanol:água em
eluição isocrática. Porém, não foi possível encontrar uma proporção da fase
móvel capaz de separar todos os padrões, necessitando de mais estudos para
o aperfeiçoamento do método, sendo sugerida a utilização de eluição por
gradiente para esse objetivo. Dos sete padrões de benzodiazepínicos, a fase
móvel acetonitrila:metanol:água (40:20:40) ajustada em pH 4 com ácido
fosfórico (1:2) foi capaz de permitir a separação de apenas três
(flunitrazepam, clonazepam e diazepam). Além disso, a fase móvel
acetonitrila:metanol:água (20:45:35) foi capaz de identificar o midazolam,
não detectado nas outras proporções, o que permitiu sua separação dos
outros padrões.
Apesar de ainda necessitar de mais estudos para o aperfeiçoamento do
método na separação dos sete padrões de benzodiazepínicos, os métodos
propostos são importantes para as análises toxicológicas qualitativas, com
finalidade forense, na identificação dos benzodiazepínicos flunitrazepam,
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
47
clonazepam, diazepam e midazolam, fármacos que estão sendo utilizados
para a prática de crimes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMIR, L.; WAISMAN, Y. Medical andtoxicologicalaspectsofdrugfacilitated
sexual assault. Israeli Journal of Emergency Medicine.Israel, v. 6, n. 3,
p. 62-66, 2006.
ATKINS, P. W.; JONES, L. Princípios de química: questionando a vida
moderna e o meio ambiente. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2006.
BERTHELON, C. et al. Do zopiclone, zolpidem and flunitrazepam have
residual effects onsimulated task of collision
anticipation.JournalofPsychopharmacology. London, v. 17, n. 3, p. 324-
331, 2003.
BISHOP, S.C.; LERCH, M.; MCCORD, B.R. Micellarelectrokinetic
chromatographic screening method for common sexual assault drugs
administered in beverages.Forensic Science
International.EstadosUnidos, v. 141, p. 7-15, abr., 2004.
CHEN, Y.; HU, A. Simultaneous determination of trace benzodiazepines
from drinks by using direct electrospray probe/mass spectrometry.Forensic
Science International. Hualien, v. 10, p. 79-88, jul., 1999.
CLARKE, E.G.C. Clarke’s Isolation and Identification of Drugs. 2. ed.
The Pharmaceutical Press: London, 1986.
COLLINS, C. H.; BRAGA, G. L.; BONATO, P. S. Fundamentos de
cromatografia.Campinas: Unicamp, 2007. 451 p.
DEGANI, A. L. G.; CASS, Q. B.; VIEIRA, P.C. Cromatografia, um breve
ensaio. Química Nova na Escola Cromatografia, n. 7, 1998.
DODERMAN, A. M; LIDBERG, L. El abuso de flunitrazepam (Rohypnol) em
combinación com alcohol provoca violência premeditada grave em
varonesjóvenesdelincuentes.Revista de Toxicomanías. Barcelona, v. 28,
p. 28-42, 2001.
DRUG BANK. OPEN DATA DRUG & DRUG TARGET DATABASE.
Disponível em: <http://www.drugbank.ca> Acesso em: 15 julho 2013.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
48
ENCYCLOPEDIA OD DRUGS. BENZODIAZEPINES. Disponível em:
<http://www.drug-encyclopedia.eu/DW_EN/benzodiazepines.shtml> Acesso
em: 15 maio 2013.
FORSAN, M. A. O uso indiscriminado de benzodiazepínicos: uma
análise crítica das práticas de prescrição, dispensação e uso
prolongado. Monografia (Especialização em Atenção Básica em Saúde da
Família) - Universidade Federal de Minas Gerais, Campos Gerais, 2010.
GOODMAN, L. S.; GILMANN, A. G. As bases farmacológicas da
terapêutica. 11ª ed. Rio de Janeiro: McGraw Hill, 2006.
HAGE, D. S.; CARR, J. D. Analytical chemistry and quantitative
analysis.1. ed.New Jersey: Pearson Education, 2011.
KASSAB, N. M.; LANGUE, L. G. R. Desenvolvimento e validação de
métodos analíticos por CLAE para determinação de midazolam em
formulações farmacêuticas de uso humano e veterinário. 2009.
Iniciação Científica - Departamento de Farmácia-Bioquímica, Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso do Sul, 2009.
LAVIE, E. et al. Benzodiazepine use among opiate-dependent subjects in
buprenorphine maintenance treatment: correlates of use, abuse and
dependence. Drug and Alcohol Dependence. Bordeaux, v. 99, p. 338-344,
2009.
MELITO, A. L. Metodologia para identificação cromatográfica de aldicarb
em sangue de cães e gatos intoxicados. 64 f. Dissertação (Mestrado) -
Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo,
São Paulo, 2004.
MENEZES, M.C.; VASCONCELOS, A.S.; SOARES, J. E.S.; HOLANDA
JUNIOR, W.P.; CARVALHO, T.M.J.P. Utilização de métodos analíticos na
toxicologia forense para identificação de carbamatos presentes no
chumbinho. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 5, n. 3, p. 28-41, 2012.
MORAES, E. C. F.; SZNELWAR, R. B.; FERNICOLA, N. A. G. Manual de
Toxicologia Analítica. São Paulo: Livraria Roca, 1991. 229 p.
MOREAU, R. L. M.; SIQUEIRA, M. E. P. B. Toxicologia Analítica. 1ª Ed.,
Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
Artigo original
GADELHA, Julia de Abreu; VASCONCELOS, Auriana Serra; SANTIAGO, Vívian Romero;
JUNIOR, Wanderley Pinheiro de Holanda; MOREIRA, Breno Alves Auad; SOARES, Janete
Eliza de Sá; CARVALHO, Teresa Maria de Jesus Ponte. Desenvolvimento de métodos
cromatográficos qualitativos para identificação de benzodiazepínicos. RevInter Revista
Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 25-49, out. 2014.
49
OGA, S.; CAMARGO, M. M. A.; BATISTUZZO, J. A. Fundamentos de
toxicologia. 3. ed. São Paulo: Atheneu, 2008.
PERES, T. B. Noções básicas de cromatografia. Biológico. São Paulo, v. 64,
n. 2, p. 227-229, 2002.
POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE RONDÔNIA. CACOAL – PC apreende
doces com clonazepam. Rondônia, abr., 2013. Disponível em:
<http://www.pc.ro.gov.br/destaque/cacoal-pc-apreende-doces-com-
clonazepam-20130405-2104.html>. Acesso em: 25 maio 2013.
TONHI, E. et al. Fases estacionárias para cromatografia líquida de alta
eficiência em fase reversa (CLAE-FR) baseadas em superfícies de óxidos
inorgânicos funcionalizados. Química Nova. São Paulo, v. 25, n. 4, p. 616-
623, 2002.
XAVIER, F.G. et al. Cromatografia em camada delgada para o diagnóstico
da intoxicação por aldicarb (“chumbinho”) em cães e gatos. Arq. Bras. Med.
Vet. Zootec., São Paulo, v. 59, n. 5, p.1231-1235, 2007.
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
50
Utilização na medicina popular,
potencial terapêutico e toxicidade em
nível celular das plantas Rosmarinus
officinalis L., Salvia officinalis L. e
Mentha piperita L. (Família Lamiaceae)
Geiz Malaquias
Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas. Campus Senador Helvídio
Nunes de Barros, Universidade Federal do Piauí.
E-mail: [email protected].
Gilberto Santos Cerqueira
Docente Adjunto. Departamento de Nutrição. Campus Senador Helvídio
Nunes de Barros, Universidade Federal do Piauí.
E-mail: [email protected].
Paulo Michel Pinheiro Ferreira
Docente Adjunto. Departamento de Biofísica e Fisiologia / Programa de
Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas (PPGCF), Universidade
Federal do Piauí.
*Autor para correspondência: Universidade Federal do Piauí, Avenida
Universitária, lado ímpar, Bairro Ininga. Teresina, Piauí. CEP 64.049-
550. E-mail: [email protected].
Ana Carolina Landim Pacheco
Docente Adjunto. Departamento de Ciências Biológicas. Campus Senador
Helvídio Nunes de Barros, Universidade Federal do Piauí. Rua Cícero
Duarte, n◦ 940. Bairro Junco. Picos, Piauí, Brasil. CEP 64607-670. E-
mail: [email protected].
João Marcelo de Castro e Souza
Docente Assistente. Departamento de Ciências Biológicas. Campus
Senador Helvídio Nunes de Barros, Universidade Federal do Piauí. E-
mail: [email protected].
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
51
Maria do Socorro Meireles de Deus
Docente Assistente. Departamento de Ciências Biológicas. Campus
Senador Helvídio Nunes de Barros, Universidade Federal do Piauí. E-
mail: [email protected].
Ana Paula Peron*
Departamento de Ciências Biológicas / Programa de Pós-graduação em
Genética e Melhoramento (PPGM). Campus Senador Helvídio Nunes de
Barros, Universidade Federal do Piauí. Rua Cícero Duarte, n◦ 940.
Bairro Junco. Picos, Piauí, Brasil. CEP 64607-670.
E-mail: [email protected]
*Autor para correspondência.
RESUMO
Este trabalho teve por objetivo realizar uma revisão bibliográfica extensa,
porém objetiva, sobre a utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinales,
Salvia officinales e Mentha piperita, pertencentes a família Lamiaceae, visto
que, estas plantas são amplamente cultivadas e utilizadas na medicina
popular, e estudadas por pesquisadores do mundo todo quanto aos seus
potenciais terapêuticos e toxicológicos. Para realização desta pesquisa
consultou-se as bases de dados Scielo, PubMed e Google Acadêmico. Após a
análise dos artigos verificou-se que estas plantas, principalmente pela ação
dos óleos essenciais, terpenos e flavonóides presentes em suas constituições
fitoquímicas, são eficientes, na medicina popular e com ação comprovada
cientificamente no tratamento de doenças dos aparelhos digestório,
circulatório e respiratório, e do sistema nervoso. Quanto a toxicidade em
nível celular destas plantas, as três possuem efeito antiproliferativo,
citotóxico, genotóxico e mutagênico a linhagens de células normais e
tumorais. A partir desta revisão, reforça-se a importância destas plantas na
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
52
cura e amenização de doenças e o potencial para serem usadas,
futuramente, como quimiopreventivas.
Palavras-chave: potencial medicinal, ação tóxica as células, alecrim,
salvia, hortelã-pimenta.
ABSTRACT
This study aimed to perform an extensive, but objective, literature review on
the use in folk medicine, therapeutic potential and toxicity at the cellular
level, of Rosmarinus officinales, Salvia officinales and Mentha piperita
belonging to the family Lamiaceae. These plants are widely cultivated and
used in folk medicine, and studied by researchers worldwide for its
therapeutic and toxicological potential. For this research, the bases of
SciELO, PubMed and Google Scholar were consulted. After analyzing the
articles it was found that these plants, mainly by the action of its essential
oils, terpenes and flavonoids phytochemical in their constitutions are
efficient in the treatment of diseases of the digestive apparatus, circulatory
and respiratory, and nervous system. As for toxicity at cellular level, the
three plants have antiproliferative, cytotoxic, genotoxic and mutagenic
effects to strains of normal and tumor cells. From this review, it is
reinforced the importance of these plants in healing and alleviation diseases
and the potential for being used in the future as a chemopreventive.
Keywords: medicinal potential, action toxic cells, rosemary, salvia e
peppermint.
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
53
INTRODUÇÃO
O uso de plantas medicinais tem sido significativo nos últimos
tempos. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que 80%
da população mundial faz uso da medicina popular para a amenização ou
cura de doenças (LOPES et al. 2010). Assim, tem-se verificado um grande
avanço científico no entendimento do mecanismo de ação de compostos
químicos presentes nas plantas com ações medicinais, bem como seus
potenciais tóxicos, como por exemplo, os flavonóides, alcaloides, terpenos,
taninos e esteróis, sendo isto claramente observado pelo número de
trabalhos científicos publicados nesta área em congressos e em periódicos
nacionais e internacionais (CAPELLO et al. 2007).
A família Lamiaceae possui aproximadamente 300 gêneros e 7.500
espécies distribuídas nos diferentes continentes (ALARCON-AGUIAR et al.
2002, AFONSO 2010). Muitas das suas plantas são cultivadas em hortas e
jardins, e todas possuem um odor intenso, decorrente da presença de óleos
essenciais em suas folhas e flores (SILVA et al. 2010). São também
conhecidas por suas propriedades antioxidantes, com destaque as espécies
dos gêneros Rosmarinus, Salvia e Mentha, que, em geral, são plantas
subarbustivas, de pequeno porte e muito ramificadas (CUVELIER et al.
1994). Em função da composição fitoquímica, estas plantas possuem
importante valor econômico, sendo utilizadas na culinária, como
condimento, e como ornamentais, na decoração e arejamento de ambientes
(VEIGA-JÚNIOR e MELLO 2008).
Outra característica importante é o potencial terapêutico de seus
representantes, onde, diferentemente de outras famílias de plantas, a
Lamiaceae possui espécies, que além da utilização na medicina popular,
possuem grupos químicos com ação terapêutica e tóxica já comprovados por
estudos laboratoriais (SILVA et al. 2010). Dentre os gêneros mais
importantes das lamiáceas estão o Rosmarinus, Salvia e Mentha, que
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
54
possuem as espécies R. officinalis, S. officinales e M. piperita,
respectivamente, como as mais bem definidas em relação a estes aspectos
(BAKIKEL et al. 2008).
Nesse contexto, este estudo teve por objetivo abordar, de forma
extensa, porém objetiva, a utilização na medicina popular, o potencial
terapêutico e a toxicidade em nível celular das plantas R. officinalis, S.
officinales e M. piperita.
METODOLOGIA
Tratou-se de uma pesquisa bibliográfica de base descritiva extensa e
objetiva, realizada no período de junho de 2000 a agosto de 2014, por meio
de levantamento de dados pesquisados na literatura, utilizando as bases de
dados Scielo, PubMed e Google Acadêmico, afim de selecionar estudos, em
português e inglês, relevantes para a discussão do tema abordado. Para esta
seleção utilizou-se a combinação dos seguintes termos: Lamiaceae, aspectos
botânicos, potencial medicinal, toxicidade em nível celular, gênero
Rosmarinus, espécie Rosmarinus officinales, alecrim, gênero Salvia, espécie
Salvia officinales, Salvia, gênero Mentha, espécie Mentha piperita e hortelã-
pimenta.
Desenvolvimento
A utilização de plantas para tratamento, cura e prevenção de
enfermidades é uma das mais antigas formas de prática medicinal da
humanidade, onde se tem registrados diferentes procedimentos utilizando
estes organismos. Apesar da grande evolução da medicina alopática a partir
do século XX, ainda existem obstáculos básicos para a utilização dos
medicamentos sintéticos por parte da população, em função, muitas vezes,
do difícil acesso aos centros de atendimento hospitalares e do valor cobrado
por estes medicamentos (COSTA 2008). Estes motivos, associados a fácil
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
55
obtenção e a grande tradição no uso de plantas medicinais, contribuem para
a utilização destas plantas na medicina popular, principalmente pelas
populações dos países em desenvolvimento (CALIXTO 2005, VEIGA-
JÚNIOR e MELLO 2008).
Dentre as plantas amplamente utilizadas como medicamento no
mundo todo estão as da família Lamiaceae, pertencentes à subclasse
Asteridae e a ordem Lamiales, com 300 gêneros e 7.500 espécies
encontradas nos mais variados habitats (MAYER 2009). Seus
representantes são típicos de savana, mas podem ser encontrados em áreas
quentes de todo o mundo. No Brasil, esta família, até o momento, é
representada por 34 gêneros, dos quais quatro são endêmicos, e por 498
espécies, das quais 334 são endêmicas (HARLEY et al. 2013).
Seus representantes possuem caule curto e lenhoso, e flores pequenas
de coloração azul a violeta dispostas em inflorescências. Usualmente, são
cultivados em hortas e jardins residenciais, com destaque as espécies dos
gêneros Ocimum, Lavandula, Mentha, Majorana, Rosmarinus e Salvia.
Possuem odor intenso, e por isso classificadas como aromáticas, decorrentes
de suas folhas e flores serem ricamente constituídas por óleos essenciais
(BARREIRO 2006). Em função da constituição fitoquímica, muitas destas
espécies são utilizadas como condimentos, na decoração de ambientes, na
fabricação de cosméticos e, principalmente, para fins medicinais (HARLEY
et al. 2013).
Ações medicinais e toxicidade em nível celular da espécie R.
officinalis
Dentre os representantes da família Lamiaceae encontra-se a R.
officinalis L., conhecida popularmente como alecrim. Esta espécie possui
origem na região mediterrânea da Europa, mas é cultivada em quase todos
os países de clima tropical, como por exemplo, o Brasil, e encontrada em
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
56
quintais residenciais; ervanários, na forma in natura e seca moída; e hortas.
Além de alecrim, esta herbácea também é conhecida por alecrim-de-cheiro,
alecrim-das-hortas, alecrim-da-casa, alecrim-comum, alecrim verdadeiro e
rosmaninho (SILVA et al. 2010).
Em relação a constituição botânica, o alecrim possui porte
subarbustivo lenhoso, ereto de até 1,5m de altura, pouco ramificado com
folhas pequenas, lineares, coriáceas, de aroma forte, de 1,5 a 4cm de
comprimento por 1 a 3mm de espessura, flores pequenas de cor azul-claro e
de aroma intenso (ANGIONI et al. 2004). Na constituição fitoquímica de
suas folhas e flores ocorrem a presença de diterpenos, como o ácido carnósico
(presente de forma marjoritária), carnosol, rosmadiol, rosmanol,
epirosmanol, rosmaquinonas e metil carnosato. Também são encontrados os
flavonóides, como a genkvanina, cirsmaritina, diosmetina, diosmina,
gencuanina, luteolina, hispidulina e apigenina; os ácidos caféico, clorogênico
e rosmarínico; e esteróis (SILVA et al. 2010).
Na medicina popular dos países da América do Sul e da Europa as
folhas e flores do alecrim são utilizadas em infusão para a amenização de
flatulência epigástricas, como aceladoras da digestão, como diurética e
digestiva, como coleréticas, colagogas, na desobstrução nasal, na eliminação
de catarros, como cicatrizantes, antimicrobianas, na amenização de
problemas circulatórios e reumáticos (LORENZI e MATOS 2002, AFONSO
et al. 2010), na amenização de dores de cabeça, enxaquecas, tonturas, falta
de memória, depressão, na cura de eczemas, como analgésicos para dores de
garganta (SILVA et al. 2010), na amenização de mialgias, neuralgias
intercostal e dor ciática, na amenização de cansaço físico e mental
(HEINRICH et al. 2006), e como antidiabético (BAKIKEL et al. 2008).
No entanto, nas últimas décadas, ocorreram mudanças importantes
no conceito de medicamentos de origem vegetal, onde as indústrias
farmacêuticas e outros laboratórios de pesquisas passaram a considerar
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
57
plantas medicinais, como a R. officinales e outros representantes da família
Lamiaceae, importantes protótipos para o desenvolvimento de novos
medicamentos. Atualmente, laboratórios em todo mundo estudam a ação
medicinal dos compostos químicos presentes nesta espécie. A seguir, serão
citados estudos realizados com compostos químicos presentes na
constituição fitoquímica nas folhas e flores do alecrim.
Heinrich e colaboradores (2006) e Hussain e colaboradores (2010)
verificaram atividade antioxidante e antitumoral, respectivamente, em
roedores tratados com os terpenos rosmadiol e rosmanol extraídos das folhas
do alecrim. Ainda, estudos laboratoriais demonstraram que o ácido carnósico
isolado desta planta protege os cloroplastos da oxidação, retirando radicais
livres, durante situações de estresse na planta, como baixa umidade e altas
temperaturas. Pesquisas realizadas com roedores mostraram que o efeito
antioxidante dos seus terpenos carnosol foi superior aos do antioxidante
sintético butil-hidróxi-anisol (BHA) e semelhante a do antioxidante sintético
butil-hidróxi-tolueno (BHT). Também se verificou que o seu diterpeno
carnosol possui a habilidade de reduzir danos oxidativos causados ao DNA,
a proteínas e as membranas fosfolipídicas de mamíferos.
Hussain e colaboradores (2010) relataram, a partir de estudos
realizados com animais e culturas de células, que os terpenos encontrados
no alecrim desempenham importante papel na regulação da atividade e/ou
expressão de sistemas enzimáticos implicados em processos fisiológicos
vitais ao organismo, como apoptose, destruição de células tumorais,
transdução do sinal intracelular e regulação de enzimas que metabolizam
xenobióticos no fígado, como a superóxido dismutase, catalase e glutationa
transferase. Estes autores também relatam que a natureza lipofílica dos
terpenos extraído do alecrim tem nas membranas biológicas um dos
principais alvos para a sua atividade, visto que, o ácido carnósico e seus
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
58
derivados foram encontrados associados a membranas de cloroplastos,
protegendo estas estruturas.
Trabalhos mostraram a eficácia do óleo essencial de R. officinales em
aumentar o desenvolvimento cognitivo em seres humanos saudáveis
submetidos a uma bateria de testes computadorizados, onde foi observado
que o impacto olfatório causado por este óleo realça significativamente a
qualidade total da memória secundária. Dentre as ações farmacológicas
desta espécie comprovadas cientificamente tem-se observado também a ação
hipoglicemiante, a atividade inibidora da enzima acetilcolinesterase e da α-
amilase, e efeito hepatoprotetor contra agentes hepatotóxicos, como aos
compostos tetracloreto de carbono (CCl4), tetra-butilhidroperóxido (t-BHP),
ciclofosfamida e azatioprina (YESIL-CELIKTAS et al. 2010)
Ainda, Visanji e colaboradores (2006) relataram a ação
antimicrobiana do extrato etanólico de alecrim frente a bactérias sensíveis e
resistentes a antibióticos sintéticos, onde foi possível verificar sinergismo
entre antibióticos e os extratos desta planta, possibilitando que antibióticos
ineficazes apresentassem ação sobre bactérias resistentes. Estes autores
ainda demonstraram demostraram atividade bacteriostática e fungiostática
do extrato aquoso de alecrim por meio da técnica do orifício em ágar.
Em relação a toxicidade em nível celular desta planta, pode-se citar
sua atividade celular antiproliferativa. Esta atividade é atribuída à ação
dos compostos químicos rosmarinidifenol, rosmariquinona e rosmanol
(YESIL-CELIKTAS et al. 2010). Segundo Visanji e colaboradores (2006),
altas concentrações destes terpenos estacionam o ciclo celular na fase G2 da
interfase por interromper a duplicação do citoplasma e o início da
condensação cromossômica. Estes autores ainda observaram que super-
dosagens do diterpeno carnosol tem a ação de estacionar células em divisão,
no estágio de prometáfase, por atuar sobre as ciclinas B1 durante a divisão
celular, não permitindo a formação adequada do fuso mitótico. Este dado
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
59
corrobora aos resultados obtidos neste trabalho, onde em todos os TR, nos
três TE, ocorreu um grande número de células em prófase (Tabela 1).
Muitas pesquisas sobre o efeito antiproliferativo do alecrim foram
realizadas nos últimos anos, como a de Yesil-Celiktas e colaboradores (2010)
que avaliaram a ação de extratos aquosos e alcóolicos das folhas de R.
officinalis, em concentrações consideradas elevadas, que variaram de 12,50
a 47,55 microg/mL, sobre as linhagens de células humanas NCI-H82 (células
de carcinoma de pulmão), DU-145 (células de carcinoma de próstata), Hep-
3B (células de carcinoma de fígado), K-562 (leucemia mielóide crônica) e
MCF-7 (adenocarcinoma da mama) e verificaram que o alecrim inibiu
significativamente a divisão celular em todas elas.
De modo semelhante, Tai e colaboradores (2012) e Cheng e
colaboradores (2011) observaram redução significativa do índice mitótico em
células da linhagem A2780 (células cancerosas de ovário humano), e de
várias linhagens celulares de carcinomas de cólon de roedores tratadas com
concentrações elevadas de carnosol, respectivamente. Dessa forma, a planta
alecrim tem sido considerada por muitos pesquisadores como um potente
anticancerígeno, antitumoral e quimiopreventivo.
Ações medicinais e toxicidade em nível celular da espécie S.
officinalis
Outra espécie da família Lamiaceae, porém do gênero Salvia, muito
utilizada na medicina popular de todo o mundo e que, recentemente, tem
sido amplamente estudada quanto ao seu potencial medicinal por
pesquisadores de muitos países, é a S. officinales L., conhecida
popularmente como salva, salva-das-boticas e salva-dos-jardins. É uma
planta originária do Mediterrâneo, e, da mesma forma que o alecrim, é
encontrada no mundo todo (PIEROZAN et al. 2009). Suas plantas
apresentam hábito de crescimento herbáceo ou arbustivo muito ramificado,
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
60
de pequeno porte, medindo entre 50 a 80cm, com florescimento entre os
meses de agosto e dezembro (LORENZI e MATOS 2002). Possuem folhas
verde-acinzentadas, oval-lanceoladas e largas, e flores agrupadas em espiga
(CORRÊA et al. 2003).
Na composição fitoquímica das flores e folhas desta espécie estão
presentes os terpenos ácido carnosólico, ácido oleanólico, ácido ursólico e
carnosol; os flavonóides diosmina, luteolina, apigenina e quercetina; o fenol
ácido cafeico; os óleos essenciais cineol, cânfora, borneol, tuiona; e taninos
(LORENZI e MATOS 2002). Na medicina popular a Salvia em infusão é
utilizada para amenização da ansiedade, irritabilidade, para dispepsia, na
cura de problemas hepáticos e digestivos (PIEROZAN et al. 2009), como
redutora da lactação, antiglicemiante, antimicrobiana, na higiene bucal, no
combate a leucorréias, na cicatrização de feridas (ALONSO 2004, LIMA et
al. 2005), na cura de aftas, no combate a dores de dente, na cura de úlceras e
como emenagoga (LORENZI e MATOS 2002).
Estudos laboratoriais demonstraram que os terpenos presentes na
composição fitoquímica das folhas e flores da S. officinales possui grande
potencial antiinflamatório, antiproliferativo e neuroprotetor as células de
roedores e humanos (POECKEL et al., 2008). Em 2007, Bozin e
colaboradores avaliaram a capacidade antimicrobiana do cineol e cânfora
presentes nesta planta e verificaram que estes compostos químicos agiram
contra cepas de Escherichia coli L., Salmonella typhi L., Salmonella
enteritidis L. e Shigella sonei L.
Poeckel e colaboradores (2008) demonstraram a capacidade dos
terpenos ácido carnósico e carnosol extraídos da Salvia agirem em células de
roedores diretamente em agentes pró-inflamatórios, inibindo células
polimorfonucleares (PLM) e a formação de leucotrienos. Maryam e
colaboradores (2005) demonstraram o efeito hipoglicemiante do extrato
metanólico de folhas de S. officinalis em ratos diabéticos induzidos por
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
61
estreptozotocina. Ainda, Rodrigues e colaboradores (2003) observaram
potencial cicatrizante do ácido oleanólico em ratos com úlceras induzidas por
ácido acético.
Em relação a toxicidade em nível celular utilizando extratos de
Salvia, estudos como os de Nicollela e colaboradores (2014) mostraram que o
extrato aquoso das folhas desta planta promoveu o aparecimento de
micronúcleos em cultura de células de fibroblastos de pulmão de hamster
chinês (V79) e em cultura de células de hepatoma humano. Também reduziu
de forma significativa o índice de divisão celular destas células, mostrando-
se citotóxico e mutagênico as linhagens de células em questão.
Sertel e colaboradores (2011) observaram que altas concentrações do
óleo essencial de S. officinalis foram citotóxicas e mutagênicas a linhagem
HNSCC, linhagem de carcinoma da cavidade oral de humanos, reduzindo a
viabilidade celular ao mínimo. Loizzo e colaboradores (2007) verificaram que
o óleo essencial extraído das folhas e flores de desta planta tem grande
potencial em inibir a divisão celular em células de tumor humano, como nos
casos de câncer renal, de próstata, de mama e de pele. Da mesma forma que
o alecrim, a Salvia tem sido considerada um importante quimiopreventivo.
No entanto mais pesquisas devem ser realizadas em diferentes sistemas
testes para se afirmar com propriedade esta ação.
Ações medicinais e toxicidade em nível celular da espécie M.
piperita
Também pertencentes à família Lameaceae as espécies do gênero
Mentha, conhecidas popularmente como hortelãs ou mentas, são muito
utilizadas na medicina popular de vários países (DORMAN et al. 2003).
Supõe-se que as hortelãs tenham sido introduzidas na Europa, via norte da
África (RUSSOMANNO et al. 2005). Atualmente as espécies do gênero
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
62
Mentha encontram-se em toda a Europa, África e Américas (PATON et al.
2000;).
A mais conhecida popularmente das hortelãs é a espécie M. piperita,
conhecida popularmente como menta, hortelã e hortelã-pimenta. Trata-se de
uma espécie herbácea, perene, de caule subarbustivo com 60 a 90cm de
altura, muito ramificados. Possuem folhas pilosas, pecioladas, opostas,
lanceoladas e agudas, com bordas serreadas de cor verde escura na face
superior e verde clara na face inferior, e com flores, de cor lilás, em espigas
terminais (RUSSOMANNO et al. 2005).
Esta espécie, da mesma forma que outras plantas da família
Lamiaceae, é rica em óleo essencial que produz um aroma mentolado,
balsâmico e fresco, característico do hortelã-pimenta e com diversas
aplicações na indústria de alimentos, cosmética e farmacêutica (SILVA
2001). A composição fitoquímica destas plantas são o mentol, mentona,
mentofurano, acetato de mentila e pulegona (AFLATUNI 2005; CAPELLO
et al. 2005).
De acordo com Cassol (2007) a M. piperita é utilizada na medicina
popular para a amenização da atonia digestiva, gastralgia, cólicas, afecções
hepáticas, bronquite crônica, como calmante, revitalizante, antidepressivo,
antialérgico, carminativo, hipotensor, tônico em geral, antiespasmódico,
espasmolítica, antiemética, estomáquica e como broncodilatadora
(LORENZI e MATOS 2006) e estimulante do sistema nervoso (MIMICA et
al. 2003).
Ainda na medicina popular, segundo Lorenzi e Matos (2006), o
hortelã-pimenta pode ser utilizado como digestivo, no combate a náuseas e a
flatulência, como antivomitivo, na amenização de inflamações de gengiva e
cólicas intestinais. O hortelã-pimenta há vários anos é avaliado em estudos
laboratoriais quanto ao seu potencial medicinal. Mimica et al. (2003),
verificaram que o óleo extraído das folhas desta planta possui propriedade,
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
63
antifúgica; antibactericida, frente a cepas E. coli; e grande potencial
antioxidante em células de ratos Wistar, diminuindo drasticamente a
concentração de radicais hidroxila –(OH).
Em outro trabalho, Lorenzi e Matos (2006) usaram o óleo de hortelã-
pimenta no tratamento de transtornos digestivos, melhorando os sintomas
abdominais em pacientes com síndrome do cólon irritável. Ainda, testaram o
óleo essencial de M. piperita em inalação e observaram sua eficiência no
tratamento de distúrbios respiratórios. Ainda, verificaram que o óleo desta
planta é um potente estimulante do Sistema Nervoso Central em
mamíferos, por potencializar o estado de alerta quando inalado. Mimica et
al. (2003) relataram que o óleo deste tipo de hortelã possui potente atividade
analgésica em humanos, reduzindo de forma significativa a sensibilidade na
dor de cabeça e enxaqueca quando administrados em seres humanos.
Também verificaram que este óleo é eficiente no combate a acnes e
dermatites. Estes autores também citam que o óleo extraído das folhas do
hortelã-pimenta é estimulante da circulação especialmente nos casos de
lipodistrofia ginóide e varizes.
Smartha e colaboradores (2006) verificaram que extratos aquosos
administrado a camundongos Swiss tiveram ação antigenotóxica e
quimiopreventivas as células destes animais. Romero-Jimenez (2005)
avaliaram o potencial genotóxico de extratos aquosos de M. piperita em teste
de SMART e verificaram sua capacidade em retirar radicais livres. Assim
estes autores afirmam que o as folhas do hortelã-pimenta possuem potente
atividade antioxidante.
Ainda, em estudos realizados por Jain e colaboradores (2011) e Ferreira e
colaboradores (2014) foi verificado que os óleos essenciais presentes nas
folhas desta planta promovem fragmentação das mitocôndria e condensação
da cromatina sem perda da integridade da membrana plasmática,
acelerando o processo de apoptoses em células de roedores. No entanto,
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
64
diferentemente do alecrim e da salvia, o hortelã-pimenta ainda foi pouco
estudado quanto seu potencial quimiopreventivo. Assim, pesquisadores
como Smartha e colaboradores (2006) e Jain e colaboradores (2011) afirmam
que mais pesquisas são necessárias para se pra a verificação deste potencial.
CONCLUSÃO
A partir desta revisão pode se verificar e reforçar a importância
medicinal destas três espécies, onde estas plantas, apesar de serem de
gêneros diferentes possuem propriedades terapêutica parecidas, com ênfase
a atividade citotóxica, genotóxica, mutagênicas e quimiopreventivas a
linhagens de células tumorais, principalmente, pela ação de seus óleos
essenciais. Assim, é importante que outras plantas da Família Lamiaceae
sejam estudas para a verificação de suas ações medicinais bem como os seus
potenciais tóxicos em nível celular e assim gerar benefícios a população de
um modo geral.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AFLATUNI, A. The yield and essential oil content of mint (Mentha
ssp.) in northern ostrobothnia. Dissertação de mestrado da
Universidade de Oulu, Oulu, 2005.
AFONSO, M. S.; SANT´ANA, L. S.; MANCINI-FILHO, J. Interação entre
antioxidantes naturais e espécies reativas de oxigênio nas doenças
cardiovasculares: perspectivas para a contribuição do alecrim (Rosmarinus
officinalisL.). Nutrire, v.35, n. 1, p.129-148. 2010.
ALARCON-AGUILAR F. J.; ROMAN-RAMOS R.; FLORES-SAENZ J. L.;
AGUIRRE-GARCIA F. Investigation on the hypoglycemic effects of extracts
of four Mexican medicinal plants in normal and alloxan-diabetic mice.
Phytotheraphy Research, v. 16, n. 4, p. 383-386. 2002.
ALONSO, J. Tratado de Fltofarmacos y Nutracéuticos. Rosário, Corpus
Libras, 2004. 200p.
ANGIONI, A.; BARRA, A.; CERETI, E.; BARILE, D.; COÏSSON J. D.;
ARLORIO M.; DESSI S.; CORONEO, V.; CABRAS, P. Chemical
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
65
composition, plant genetic differences, antimicrobial and activity
investigation of the essential oil Rosmarinus officinalis L. Journal of
Agricultural and Food Chemistry, v. 52, p. 1227-1301. 2004.
BAKIREL, T.; BAKIREL, U.; KELES, O. U.; ÜLGEN, S. G.; YARDIBI, H. A
avaliação in vivo das atividades antidiabéticos e antioxidantes do alecrim
(Rosmarinus officinalis ) em coelhos diabéticos aloxano. Jornal de
Etnofarmacologia, v. 116, p. 64-73. 2008.
BOZIN, B.; MIMICA-DUKIC, N.; SAMOJLIK, I.; JOVIN, E. Antimicrobial
and Antioxidant Properties of Rosemary and Sage (Rosmarinus officinalis L.
and Salvia officinalis L., Lamiaceae) Essential Oils. Journal of
Agricultural and Food Chemistry, v. 55, p. 7879-7885. 2007.
CALIXTO, J. B. Efficacy, safety, quality control, marketing and regulatory
guidelines for herbal medicines (phytotherapeutic agents). Brazilian
Journal of Medical and Biological Research, v. 33, n. 2, p. 179-89.
2005.
CAPPELO, G.; SPEZZAFERRO M.; GROSSIL L.; MANZOLI L.; MARZIO L.
Peppermint oil (Mintoil) in the treatment of irritable bowel: a prospective
double blind placebo controlled randomized trial. Digestive and Liver
Disease, v. 39, n. 6, p. 530-536. 2007.
CASSOL, D.; FALQUETO, A. R.; BACARIN, M. A. Fotossíntese em Mentha
piperita e Melissa officinalis sob sombreamento. Revista Brasileira de
Biociências, v. 5, n. 2, p. 576-578. 2007.
CHENG, AC., LEE, MF., TSAI, ML., LAI, CS., LEE, JH., HO, CT. and PAY,
MH., 2011. Rosmanol potently induces apoptosis through both the
mitochondrial apoptotic pathway and death receptor pahway in human
colon adenocarcinoma COLO 205 cells. Food Chemical Toxicology, vol. 49, n
2, p. 485-493. 2011.
CORRÊA, A. D.; BATISTA, R. S.; QUINTAS, L. E. M. Plantas medicinais:
do cultivo à terapêutica. Petrópolis, Vozes, 2003. 190p.
COSTA, L. C. B. Condições culturais, anatomia foliar, processamento
e armazenamento de Ocimum selloi em relação ao óleo essencial.
Dissertação de Doutorado em Agronomia, Universidade Federal de Lavras,
Lavras – MG, 2008.
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
66
CUVELIER, M. E.; BERSET, C.; RICHARD, H. Antioxidant constituents in
sage (Salvia officinalis). Journal of Agricultural Food Chemistry. v. 42,
n. 3, p. 665-669. 1994.
DORMAN, H. J. D.; KOSAR, M.; KAHLOS, K.; HOLM, Y.; HILTUNEN, R.
Antioxidant properties and composition of aqueous extracts from Mentha
species, hybrids, varieties, and cultivars. Journal of Agricultural and
Food Chemistry, v. 51, n. 16, p. 4563-4569. 2003.
FERREIRA, P.; CARDOSO, T.; FERREIRA, F.; FERNANDEZ-FERREIRA,
M.; PIPER, P.; SOUSA, M. J. Mentha piperitaessential oil induces apoptosis
in yeast associated with both cytosolic and mitochondrial ROS-mediated
damage. FEMS Yeast Research. 2014. Doi: 10.1111/1567-1364.12189
HARLEY, R.; FRANÇA, F.; SANTOS, E. P.; SANTOS, J. S.; PASTORE, J. F.
Lamiaceae. In: Lista de Espécies da Flora do Brasil (2013). Jardim
Botânico do Rio de Janeiro Disponível em:
<http://reflora.jbrj.gov.br/jabot/floradobrasil/FB8296>. Acesso em:
15/07/2014
HEINRICH, M.; KUFER, J.; LEONTI, M.; PARDO-DE-SANTAYANA, M.
Ligações interdisciplinares com as ciências históricas - Etnobotânica e
etnofarmacologia. Journal of Ethnopharmacology, v. 107, p. 157-160,
2006.
HUSSAIN, A. I.; ANWAR, F.; CHATHA, S. A. S.; JABBAR, A.; MAHBOOB,
S.; NIGAM, P. S. Rosmarinus officinalis óleo essencial: antiproliferativo
atividades antioxidantes e antibacterianas. Brazilian Journal of
Microbiology, v. 41, p. 1070-1078. 2010.
JAIN, D.; PATHAK, N.; KHAN, S.; RAGHURAM, G. V.; BHARGAVA, A.;
SAMARTH, R.; MISHRA, P. K. Evaluation of cytotoxicity and
anticarcinogenic potential of Mentha leaf extracts. International Journal
of Toxicology, v. 30, n. 2, p. 225-236. 2011.
LIMA, C. F., ANDRADE, P. B.; SEABRA R. M.; FERREIRA M. F.;
WILSON, P. C. The drinking of a Salvia officinalis infusion improves liver
antioxidant status in mice and rats.
LIMA, C. F.; AZEVEDO, M. F.; ARAUJO. R.; FERREIRA M. F.; WILSON,
C. P. Metformin-like effect of Salvia officinalis (common sage): is it useful in
diabetes prevention? British Journal of Nutrition, v. 2, n. 96, p. 326-333.
2006.
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
67
LOIZZO, M. R.. "Cytotoxic activity of essential oils from Labiatae and
Lauraceae families against in vitro human tumor models." Anticancer
research. v. 27, n.5, p. 3293-3299. 2007.
LOPES R.M., OLIVEIRA T.D., NAGEM T.J., PINTO A.D.S. Flavonóides.
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento. v. 3, n. 14. 2010.
LORENZI, H.; MATOS, F. J. A. Plantas medicinais no Brasil: nativas e
exóticas. Nova Odessa, 2002. 300p.
LORENZI, H.; MATOS, F. J. Plantas Medicinais no Brasil: Nativas e
Exóticas Cultivadas. Nova Odessa, 2006. 400p.
MAYER, B. Gastroprotective constituents of Salvia officinalis L.
Fitoterapia, v. 80, n. 7, p. 421-426. 2009.
MIMICA, D. N.; BOZIN, B.; SOKOVIC, M.; MIHALLOVIC, B.; MATAVULJ,
M. Antimicrobial and antioxidante activies af there mente species essential
oils. Medicinal plant, v. 69, n. 5, p. 413-9. 2003.
NICOLELLA, H. D. Differential effect of manool, a diterpene from Salvia
officinalis on genotoxicity induced by methyl methanesulfonate in V79 and
HepG2 cells. Food and Chemical Toxicology (2014).
PATON, A.; HARLEY, R.; HARVEY, T. A newsletter for Lamiaceae &
Verbanaceae research. In: VITEX, Herbarium, Royal Botanic Gardens
Kew. 2000. Disponível em: <http://www.rbgkew.org.uk/data/vitex/jan00.pdf>
Acesso em: 15/07/2014.
PIEROZAN, M.K. Caracterização química e atividade antimicrobiana de
óleos essenciais de Salvia L. espécies. Ciencia e Tecnologia de
Alimentos, v.29, n. 4, p. 764-70, 2009.
POECKEL, D.; GREINER, C.; VERHOFF, M.; RAU, O.; TAUSCH, L.;
HO¨RNIG, C.; STEINHILBER D.; SCHUBERT-ZSILAVECZ, M.; WERZ, O.
Carnosic acid and carnosol potently inhibit human 5-lipoxygenase and
suppress pro-inflammatory responses of stimulated human
polymorphonuclear leukocytes. Biochemical pharmacology. v. 7, n. 6, p.
91-97. 2008.
RUSSOMANNO, O. M. R.; KRUPPA, P. C.; FIGUEIREDO, M. B. Oidium
asterispunicei em plantas de hortelã-pimenta. Fitopatologia Brasileira, v.
30, n. 5, p. 551. 2005.
Artigo revisão
MALAQUIAS, Geiz; CERQUEIRA, Gilberto Santos; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
PACHECO, Ana Carolina Landim; SOUZA, João Marcelo de Castro e; DEUS, Maria do
Socorro Meireles de; PERON, Ana Paula. Utilização na medicina popular, potencial
terapêutico e toxicidade em nível celular das plantas Rosmarinus officinalis L., Salvia
officinalis L. e Mentha piperita L. (Família Lamiaceae). RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 50-68, out. 2014.
68
SAMARTH, R. M.; PANWAR, M.; KUMAR, A. Modulatory effectsmof
Mentha piperita on lung tumor incidence, genotoxicity and oxidative strees
in benzo[a]pyrene-treated Swiss albino mice. Environmental Molecular
Mutegenese, v. 47, n.3, p. 192-198. 2006.
SERTEL, S. Anticancer activity of Salvia officinalis essential oil against
HNSCC cell line (UMSCC1)]." Hno. v. 59, n.12, p. 1203-1208. 2011.
SILVA, A. B., SILVA, T.; FRANCO, E. S.; RABELO, S. A.; LIMA, E. R.;
MOTA, R. A.; CAMARA, C. A. G. da; PONTES-FILHO, N. T. Atividade
antibacteriana, composição química, e citotoxicidade do óleo essencial de
folhas de árvore de pimenta brasileira (Schinus terebinthifolius Raddi).
Brazilian Journal Microbiologic, v. 41, p. 158-163. 2010.
ROMERO-JIMÉNEZ, M.; CAMPUS-SANCHEZ, J.; ANALLA, M.; MUÑOZ-
SERRANO, A.; ALONSO-MORAGA, A. Genotoxicity and anti-genoetoxicity
of some tradicional medicinal herbs. Mutation Research, v. 585, n. 1-2, p.
147-155. 2005.
TAI, J.; CHEUNG, S.; WU, M.; HASMAN, D. Antiproliferation effect of
Rosemary Rosmarinus officinalis on human ovarian cancer cells in vitro.
Phytomedicine,v. 19, n. 05, p. 436-443. 2012.
VISANJI, J.M.; THOMPSON, D.G.; PADFIELD, P.J., 2006. Induction of G2
/M phase cell cycle arrest by carnosol and carnosic acid is associated with
alteration of cyclin A and cyclin B1 levels. Cancer letters, v. 237, n. 1, p.
130-136. 2006.
YESIL-CELIKTAS, O.; SEVIMLI, C.; BEDIR, E.; VARDAR-SUKAN, F.
Inhibitory effects of rosemary extracts, carnosic acid and rosmarinic acid on
the growth of various human cancer cell lines. Plant Foods for Human
Nutrition, v. 65, n. 02, p. 158-163. 2010.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
69
A Sustentabilidade Ambiental dentro das
organizações
Ana Paula Teixeira Santos
Administradora de empresas graduada pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Administradora, Organização Dinâmica da
Intertox.
RESUMO
Entre os principais problemas que ameaçam a sobrevivência das próximas
gerações podemos destacar o crescimento demográfico, a limitação dos
recursos indispensáveis à vida e o aumento contínuo dos níveis de produção.
Baseado nesses fatores veremos a perspectiva de futuro das populações
elaborada por Malthus e Hardin (perspectiva pessimista) e a perspectiva
elaborada por Adam Smith e Julian Simon (perspectiva otimista). Será
abordado também como a Sustentabilidade pode melhorar as empresas
protegendo-as, gerenciando-as e promovendo seu crescimento.
Apresentaremos uma comparação das principais características que
diferenciam uma empresa com Visão Tradicional (reativa) de uma empresa
com Visão Sustentável (proativa), e também abordaremos como os termos
Ética e Moral estão ligados às ações das empresas, principalmente suas
ações sustentáveis.
Palavras-chave: Sustentabilidade; Gestão Ambiental; Empresas; Recursos
Ambientais; Responsabilidade Social.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
70
ABSTRACT
Among the main issues that threaten the survival of future generations it is
possible to highlight the demographic growth, limitation of resources
required for living, and the continuous increase in production levels. Based
on these factors it will be presented the prospect of future populations
developed by Malthus and Hardin (pessimistic outlook) and the prospect
elaborated by Adam Smith and Julian Simon (optimistic outlook).
Furthermore, it will be discussed how the Sustainability can improve
companies, protecting, managing and promoting their growth. It will be
presented a comparison of the main features that differentiate a company
with a Traditional View (reactive) from a company with a Sustainable
Vision (proactive), and also it will be discussed how the terms Ethics and
Moral are linked to the procedures of companies, especially their
sustainable actions.
Keywords: Sustainability; Environmental Management; Companies;
Resources; Social Responsibility.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
71
INTRODUÇÃO
Sustentabilidade é um modo de suprir as necessidades humanas sem
comprometer as futuras gerações.
A responsabilidade de uma empresa pelo carbono emitido, começa na
extração ou na manufatura de matérias-primas e estende-se por toda a
cadeia produtiva e além dela, para as emissões associadas ao consumo e ao
descarte do produto consumido (seus cartuchos e suas embalagens).
A empresa sustentável do século XXI é aquela que avalia todo o ciclo
de vida do produto, calcula suas emissões de carbono e desenvolve uma
estratégia de minimização e, no longo prazo, de eliminação desse conteúdo
de carbono. A “descarbonização” é a única meta aceitável em uma estratégia
de sustentabilidade no longo prazo. Para a maioria dos produtos e serviços
ofertados no mercado global, é possível obter reduções significativas das
emissões de carbono ou do grau de carbonização recorrendo a tecnologias já
disponíveis.
O que forçará mudanças no perfil de carbono da demanda e da
produção de bens e serviços? Com certeza, os fatores mais determinantes
serão o aumento e redefinição da ação regulatória do Estado e a presença
crescente de um novo agente regulador: a agência multilateral ou global.
Leilões de cotas e créditos de emissões de carbono, impostos sobre
carbono, regras restritivas e proibições diretas de determinadas práticas e
usos se tornarão frequentes e comuns nos próximos anos. Quem não se
adaptar a esse novo cenário perderá competitividade, mercado e, no limite,
não conseguirá sobreviver nele.
O Brasil é o único país do mundo de grande extensão territorial que
concentra o transporte de cargas no modelo rodoviário. O país tem
desprezado as ferrovias e hidrovias como meio de transporte de cargas de
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
72
longa distância. Essas distorções no sistema de transportes fazem com que
ele seja um grande emissor potencial de gases de efeito estufa.
As políticas energéticas em diferentes países estão sendo
progressivamente reorientadas, a fim de atingir, no longo prazo, padrões de
produção e uso de energia que levem em consideração três fatores
(segurança do abastecimento e disponibilidade de recursos energéticos;
busca de flexibilidade da demanda; preocupação e responsabilidades
ambientais).
Exemplos dessa tendência:
Setor de transportes: os carros flex bi ou tricombustível e os carros
híbridos, especialmente associados à tecnologia plug-in1 (ver foto abaixo), e
o papel crescente do uso de biocombustíveis de primeira geração a partir de
matérias-primas agrícolas, como o etanol (proveniente da cana-de-açúcar, no
Brasil, e proveniente do milho, nos Estados Unidos) e o biodiesel, produzido
a partir de diferentes oleaginosas.
Geração de eletricidade: o papel crescente das centrais eólicas em
diferentes países e as novas tecnologias visando reduzir o nível de emissões
das centrais a carvão.
Programas de eficiência energética: diferentes tecnologias e
equipamentos reduzindo o consumo de energia, além de programas de
gestão da demanda e novas regulamentações fixando padrões de consumo
eficiente para diferentes equipamentos.
O futuro do setor de petróleo e gás natural está fortemente vinculado
às transformações advindas do setor de transportes, no qual predomina o
uso de derivados do petróleo, porém, a grande e longa transição aponta para
uma corrida tecnológica cujo objetivo é abastecer o automóvel do futuro. É
provável o surgimento de uma grande variedade de iniciativas em
1 Um automóvel híbrido plug-in possui dois motores, sendo: um motor elétrico e um de apoio (o tradicional, motor
a explosão) a bateria usada para alimentar o motor elétrico pode ser carregada através de uma tomada, isso faz
com que o carro opere com uma quantidade significativamente reduzida de combustível fóssil.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
73
biocombustíveis, que devem concorrer com iniciativas em outras tecnologias
que seriam mutuamente exclusivas: células a combustível, carros elétricos,
veículos híbridos. (ZYLBERSZTAJN e LINS, 2010).
As 5 dimensões da Sustentabilidade
A Gestão Ambiental resume-se em um sistema de atividades de
planejamento, responsabilidades, práticas, processos e recursos para
desenvolver, atingir, analisar e manter a política ambiental. O objetivo é
fazer a empresa minimizar os impactos e efeitos negativos provocados no
ambiente por suas atividades de produção, seja produtos ou serviços.
Empresas que aderiram a gestão ambiental com responsabilidade,
vivenciam os benefícios da sustentabilidade em suas diferentes esferas
organizacionais (benefícios econômicos, benefícios estratégicos e incremento
da receita corporativa).
Pensar em Sustentabilidade é pensar grande, pensar amplo. E é por
isso que alguns autores afirmam que a Sustentabilidade pode ser dividida
em cinco dimensões2 :
Sustentabilidade Social – a criação de um processo de desenvolvimento
sustentado por uma civilização com igualdade na distribuição de renda e de
bens, de modo a reduzir as diferenças entre os padrões de vida dos ricos e
dos pobres. Alguns autores incluem aqui, na Sustentabilidade Social, os
programas e ações de conscientização da sociedade que visam posicioná-la
contra o consumismo exagerado e supérfluo, fortemente visível no presente
século.
2 A abordagem da Sustentabilidade dividida em 5 dimensões foi formulada primeiramente por Ignacy Sachs e
pode ser verificada em SACHS, Ignacy. Desenvolvimento includente, sustentável e sustentado. Rio de
Janeiro: Ed. Garamond, 2004 , p. 15-16 e TINOCO, João Eduardo. KRAEMER, Maria Elisabeth. Contabilidade
e Gestão Ambiental. São Paulo: Editora Atlas, 2004, p. 137.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
74
Sustentabilidade Econômica – alcançada através do gerenciamento
eficiente dos recursos e de um fluxo constante de investimentos públicos e
privados.
Sustentabilidade Ecológica – alcançada através da limitação do consumo
de combustíveis fósseis e demais recursos facilmente esgotáveis, redução dos
resíduos e da poluição através da conservação de energia, de recursos
naturais e da reciclagem. Inclui-se aqui, a busca pela substituição de
recursos não-renováveis por alternativas renováveis e de menor impacto
ambiental e social.
Sustentabilidade Espacial – dirigida para a obtenção de um cenário
rural-urbano mais equilibrado e com melhor distribuição territorial dos
assentamentos humanos e das atividades econômicas.
Sustentabilidade Cultural – inclui a procura por raízes endógenas de
processos de modernização e de sistemas agrícolas integrados, que facilitam
a geração de soluções específicas para o local, o ecossistema, a cultura e a
área.
Para planejar um modelo de desenvolvimento que pretenda ser
sustentável, deve-se considerar todas as dimensões envolvidas direta e
indiretamente no negócio, e também conhecer os objetivos do
desenvolvimento sustentável:
Retomar o crescimento.
Alterar a qualidade do desenvolvimento.
Atender às necessidades essenciais de emprego, alimentação,
energia, água e saneamento.
Manter um nível populacional sustentável.
Conservar e melhorar a base de recursos.
Reorientar a tecnologia e administrar o risco .
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
75
Incluir o meio ambiente e a economia no processo de tomada de
decisões.
Sob a atual pressão mercadológica e da sociedade, a empresa que não
incorporar o conceito de sustentabilidade, verdadeiramente, em sua gestão
de negócios e não apenas no discurso ou nas ações de marketing,
provavelmente terá dificuldades em sobreviver às próximas décadas.
Uma montadora de automóveis não pode, por exemplo, usar recursos
de comunicação para se vangloriar de “ser ambientalmente correta” apenas
por adotar tapetes feitos a partir da reciclagem de garrafas pet, ignorando os
impactos causados ao meio ambiente ao longo do ciclo de vida desse meio de
transporte. Um carro é fabricado a partir de mais de uma tonelada de aço,
além de utilizar borracha, vidro e plástico, e é movido a combustível fóssil. A
indústria de transporte é uma das mais poluidoras do mundo. Sendo assim,
associar a gestão sustentável à utilização de tapetes reciclados não pode ser
considerado um exemplo de sustentabilidade, pois corresponde apenas a
uma ação de marketing. (ZYLBERSZTAJN e LINS, 2010).
Políticas Públicas Ambientais
Segundo Barbieri (2007), entende-se por Política Pública Ambiental o
conjunto de objetivos, diretrizes e instrumentos de ação que o poder público
dispõe para produzir efeitos desejáveis sobre o meio ambiente.
À medida que os problemas surgiam a gestão ambiental começou a ser
desenvolvida e implantada pelos governos dos Estados nacionais, de modo
que as primeiras manifestações de gestão ambiental procuravam solucionar
problemas de escassez de recursos vitais à subsistência humana e animal, só
após a Revolução Industrial os problemas ligados à poluição começaram a
ser tratados de modo sistemático. Durante muito tempo as iniciativas dos
governos eram quase exclusivamente de caráter corretivo, os governos só
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
76
enfrentavam os problemas ambientais depois que eles já tinham sido
criados, isso ainda ocorre explicitamente em muitas situações, inclusive em
países considerados de primeiro mundo. Foi a partir dos anos 1970 que
vários países começaram a desenvolver políticas governamentais que
tratassem as questões ambientais de modo integrado e, inclusive,
introduzindo uma abordagem preventiva. Os debates sobre a relação entre
meio ambiente e desenvolvimento urbano e os acordos ambientais
multilaterais contribuíram, e muito, para essa mudança de comportamento
e de políticas públicas integradas.
Como reflexo das políticas públicas ambientais há diversos
instrumentos de comando e controle operando, fiscalizando, monitorando e
auditando empresas de diversos setores e segmentos de atuação. Esses
instrumentos também são chamados de instrumentos de regulação direta e
objetivam alcançar as ações que degradam o meio ambiente, limitando ou
condicionando o uso de bens, a realização de atividades e o exercício de
liberdades individuais em benefício da sociedade como um todo. Trata-se do
exercício do poder de polícia dos entes estatais, que manifesta-se por meio de
proibições, restrições e obrigações impostas às organizações e aos indivíduos
através de normas legais.
A seguir veremos a classificação e os tipos mais comuns de
Instrumentos de Política Pública Ambiental3:
Referente a Comando e Controle:
Padrão de emissão
Padrão de qualidade
Padrão de desempenho
3 BARBIERI, José Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e instrumentos. São Paulo:
Ed. Saraiva, 2007, p.73.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
77
Padrões tecnológicos
Proibições e restrições sobre produção, comercialização e uso de produtos
e processos.
Licenciamento ambiental
Zoneamento ambiental
Estudo prévio de impacto ambiental.
Referente ao Econômico:
Tributação sobre poluição
Tributação sobre uso de recursos naturais
Incentivos fiscais para reduzir emissões e conservar recursos
Remuneração pela conservação de serviços ambientais
Financiamentos com condições especiais.
Criação de mercados de produtos ambientalmente saudáveis
Permissões negociáveis
Sistema de depósito-retorno
Poder de compra do Estado (licitações sustentáveis ou fornecedores
ecologicamente corretos)
Outros:
Apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico
Educação ambiental.
Unidades de conservação
Informações ao público.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
78
Dentre todos esses tipos de instrumentos de política pública
ambiental os três tipos de maior importância são: padrões de
qualidade ambiental, padrões de emissão e padrões tecnológicos.
Os padrões de qualidade ambiental se referem aos níveis máximos
admitidos para os poluentes de um dado segmento do meio ambiente, são
segmentados em ar, água e solo. Esses níveis são estabelecidos como médias
aritméticas ou geométricas de concentração diária ou anual, permitindo com
isso, incorporar as variações climáticas que afetam a dispersão e a
concentração dos poluentes.
Os padrões de emissão se referem aos lançamentos de poluentes
individualizados por fonte aos lançamentos de poluentes individualizados
por fontes fixas ou estacionárias, como os armazéns, as fábricas e as lojas, ou
fontes móveis, como os automóveis, caminhões, embarcações e outros
veículos. Os padrões de emissão estabelecem uma quantidade máxima
aceitável de cada tipo de poluente por fonte poluidora (ex. 0,5 mg/l de
chumbo) ou uma quantidade máxima por unidade de tempo (ex. “X”
toneladas de dióxido de carbono por dia, mês ou ano). Há um tipo especial de
padrão de emissão que estabelece exigências no desempenho das máquinas,
equipamentos e operações fabris, com o objetivo de reduzir a emissão de
poluentes específicos a um nível aceitável, como normas legais que
estabelecem valores máximos permitidos para as emissões de gases e
fumaça em veículos automotores (ex. limite máximo de emissão de monóxido
de carbono de veículos automotores: 24g/km).
O controle da poluição pode ser estabelecido através dos meios e
recursos tecnológicos que as fontes poluidoras adotarem. É importante
compreendermos que o termo “tecnologia” abrange não somente softwares e
programas com linguagem computacional, mas inclui também máquinas,
instalações, ferramentas, materiais e outros elementos físicos de um
estabelecimento ou uma unidade produtiva, práticas administrativas e
operacionais ex: avaliação de fornecedores, especificar e selecionar
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
79
materiais, métodos de inspeção, roteiro da produção, planejamento da
manutenção e treinamento.
Segundo Barbieri (2007), definir o padrão tecnológico é uma tarefa
árdua e complexa para a alta administração da empresa, pois além das
tecnologias estarem em constante evolução elas representam ativos de posse
privativa daqueles que as desenvolvem, de forma que a melhor tecnologia
para certa finalidade nem sempre está disponível para todos os agentes
produtivos, devido a isto, o padrão tecnológico a ser adotado precisa sempre
considerar a disponibilidade da tecnologia. Em geral, o padrão tecnológico é
estabelecido após consultas com especialistas, fornecedores de tecnologia e
os responsáveis pelas unidades produtivas. O objetivo de todas essas
consultas é alcançar consenso entre as partes quanto ao melhor padrão
tecnológico disponível a ser adotado.
De acordo com os estudos de Barbieri, as empresas se utilizam de dois
importantes critérios para auxiliá-las na escolha da tecnologia que irão
adotar em seus processos produtivos. Um desses critérios se baseia no
conceito de Melhor Tecnologia Disponível e o outro se baseia na Melhor
Tecnologia Disponível que Não Acarreta Custo Excessivo4. Este segundo
critério procura evitar que a empresa adote um padrão de tecnologia que irá
apresentar um resultado final muito pequeno em relação às outras
tecnologias disponíveis, porém, com um custo consideravelmente mais
elevado. Também tenta evitar que o custo da implementação da melhor
tecnologia disponível não inviabilize os empreendimentos do ponto de vista
econômico. Este segundo critério (Melhor Tecnologia Disponível que Não
Acarreta Custo Excessivo) é muito utilizado nos Estados Unidos, no Reino
Unido e em outros países da Europa para fixar limites máximos de emissões
de poluentes. No Brasil, a prática mais usual é a definição de padrões de
4 BARBIERI, José Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e instrumentos. 2ª edição.
São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 75.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
80
qualidade e de emissão, o critério de Melhor Tecnologia Disponível é usado
apenas na ausência de padrões de emissão fixados em normas legais.
Entre os instrumentos de Comando e Controle podemos citar as
proibições ou banimentos da produção, banimentos em comercialização e uso
de certos produtos, o estabelecimento de cotas de produção, cotas para
comercialização ou utilização de materiais ou recursos; o licenciamento
ambiental para atividades ou obras potencialmente poluidoras e o
zoneamento ambiental também são considerados instrumentos de comando
e controle das poluições fabris, industriais, entre outras.
Regulamentações ambientais adequadas podem estimular o
surgimento de inovações que reduzem os custos ambientais e permitem o
uso mais eficiente de recursos. O problema não é a regulamentação em si,
mas o modo como ela é formulada. Uma regulamentação ambiental pública
rigorosa pode se tornar uma vantagem competitiva para a empresa e o país,
em outras palavras, a proteção ambiental, via instrumento de comando e
controle, pode ser um importante fator de competitividade das empresas e
dos países. (BARBIERI, 2007, p. 84-85).
Alguns motivos por que a regulamentação é necessária:
Cria pressões que motivam a realização de inovações pelas empresas;
Melhora a qualidade ambiental quando a inovação não compensa o
custo total da conformidade;
Educa e alerta a empresa a respeito de ineficiências prováveis e de
áreas potenciais para melhorias;
Aumenta a probabilidade de que as inovações de produtos e processos
sejam mais amigáveis ao meio ambiente;
Cria demanda pelo aprimoramento ambiental, até que as empresas e
os clientes sejam capazes de perceber e mensurar a ineficiência dos
recursos como fonte de poluição;
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
81
Ajuda a equilibrar o período de transição, assegurando que nenhuma
empresa será capaz de ganhar posição por não efetuar os
investimentos ambientais.
Ainda dentro do tema Políticas Públicas Ambientais, Barbieri afirma
que uma política pública ambiental deve contemplar a educação ambiental e
que esta deve ser usada como um de seus instrumentos. A meta da
educação ambiental é desenvolver uma população consciente e preocupada
com o meio ambiente, para atuar individual e coletivamente na busca de
soluções para os problemas atuais e para a prevenção de novos problemas,
para serem portadoras de soluções e não apenas de denúncias. Uma
educação ambiental eficaz deve produzir mudanças nas próprias condutas
diárias das pessoas, modificando por exemplo, seus hábitos de consumo e
descarte dos resíduos (orgânicos e não orgânicos).
A eficácia de uma política pública ambiental bem elaborada depende
diretamente de outras políticas públicas. É muito comum a convivência
conflituosa entre diversas políticas públicas. Exemplos: uma política
agrícola voltada para a produtividade pode induzir o uso abusivo de água,
fertilizantes e agrotóxicos. Políticas de transportes e de energia baseadas em
combustível fóssil não ajudam em nada as políticas ambientais. A falta de
uma política de transporte coletivo na cidade de São Paulo estimula os
indivíduos locais a utilizarem cada vez mais seus veículos particulares
(carros, motos). Subsidiar combustíveis fósseis para ampliar a oferta de
energia elétrica pode inviabilizar a utilização de fontes renováveis de
energia. Uma política monetária baseada em altas taxas de juros, ao
penalizar o setor produtivo reduzindo suas margens e, portanto, os fundos
de investimentos, contribui negativamente para a atualização tecnológica
das empresas, obrigando-as a operarem com equipamentos e instalações
obsoletos.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
82
Logo, é possível concluir que a falta de coerência e de interação entre
as diversas ações de políticas públicas acaba e tornando um incentivo às
práticas ambientais insustentáveis por parte de muitos agentes privados. Se
as demais políticas públicas forem elaboradas em harmonia com a política
pública ambiental esta última terá maior chance de se mostrar realmente
efetiva e eficaz.
A Mesa Redonda
Consumidores, financiadores, acionistas e potenciais investidores
exigem cada vez mais, compromissos éticos das corporações. Não basta
apenas olhar para o resultado econômico-financeiro para avaliar o
desempenho de uma organização, pois na atualidade seu desempenho
também é avaliado e medido levando-se em conta os resultados de todas as
partes e divisões da cadeia produtiva, bem como o impacto nos recursos
naturais.
Alguns acontecimentos na natureza ajudam a entender o quanto o
momento é crítico e depende de mudanças efetivas nos meios de produção e
nos modos de consumir.
No início dos anos 1990 surgiram novas iniciativas internacionais de
rastreamento e certificação socioambiental. Indústrias de roupas, setor
naval e de pesca, indústria química, mineração, construção civil, transportes
e diferentes segmentos da agricultura respondem, ao menos formalmente, a
protocolos que envolvem a certificação de seus produtos e o rastreamento de
suas atividades.
Em muitos casos o rastreamento permitiu avanços, apesar da
existência, até hoje, de procedimentos inaceitáveis.
Segundo Abramovay (2012), apesar dos benefícios sociais e
ambientais da certificação ela possui efeitos desiguais evidentes, como por
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
83
exemplo: a certificação envolve custos que podem limitar severamente o
acesso aos mercados dos produtores com menor poder econômico.
A partir dos anos 2000 se intensificaram e com maior sucesso as
campanhas voltadas de forma explícita contra comportamentos julgados
destrutivos praticados pelo setor privado. Empresas e marcas globais foram
alvo de campanhas em que são apontadas abertamente. Isso as obrigou a
responder a críticas, criar departamentos de relacionamento com a
sociedade civil e alterar seus próprios métodos de avaliação de seus
negócios. Hoje há empresas de consultoria especializadas em orientar as
empresas privadas em suas relações com stakeholders.
Tem aumentado de maneira acelerada a diversidade dos setores em
que a relação com os stakeholders se intensifica. A qualificação dos produtos
é cada vez mais generalizada e profunda o que leva as empresas a adotarem
atributos que vão além do que a legislação de cada país exige. Dentro desses
processos de mudanças as empresas e as associações empresariais passam a
procurar parâmetros de julgamento de suas atividades que vão muito além
do balanço contábil ou da remuneração dos acionistas. O que implica a
formulação de vários indicadores, como o uso de materiais e energia, balanço
de emissões de gases de efeito estufa e a mensuração dos impactos que
fazem as firmas tanto na biodiversidade como nas populações e comunidades
encontradas ao longo de suas cadeias de valor.
Até as próprias organizações não governamentais alteram seus
procedimentos, realizam negociações diretas com o setor privado, o que exige
preparação técnica. Os riscos reputacionais então ampliam-se. Para as
empresas se torna necessário saber escolher os stakeholders com os quais
irão dialogar, selecionar os temas relevantes, demonstrar compromisso,
abertura e visibilidade naquilo que a empresa faz, em cada um desses
tópicos há riscos e conflitos imensos.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
84
Para Abramovay (2012), os mercados não podem ser encarados como o
domínio da vida privada, em oposição ao Estado e à sociedade civil. As
empresas estão se organizando de forma cada vez mais profissionalizada
para lidar com as pressões sociais decorrentes daquilo que produzem e das
cadeias de valor que gerem, e é fundamental que as organizações da
sociedade civil ampliem sua participação nesse campo, pois essa interação
terá um papel decisivo na emergência de uma nova economia.
Abramovay ainda defende a ideia de que o conceito de
responsabilidade social elaborado até os dias atuais é insuficiente para
enfrentar o tema, e que a criação de valor para a empresa deve visar,
direta e claramente, a criação de valor para a sociedade. Não é algo
que ocorre à margem dos negócios, mas está em seu cerne. Criar valor não
deve ser encarado em apenas ter lucro.
“Se não agirmos agora, os danos causados pelas
agressões ao meio ambiente serão devastadores para a
economia do planeta. As grandes empresas dos Estados
Unidos já estão se conscientizando disso e já adotaram
medidas para diminuir a emissão de carbono. Há um
ditado que diz: se quiser ir mais rápido, vá sozinho; se
quiser ir mais longe, vá junto. Temos de ir rápido e
juntos. Para as gerações futuras, temos de ser a geração
que teve coragem de fazer o que muitos achavam que era
impossível para salvar a Terra” Al Gore , 20075
5 ZYLBERSZTAJN, David. LINS, Clarissa. Sustentabilidade e geração de valor: a transição para o século
XXI. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 2010, p. xvii (Introdução).
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
85
“Os próximos anos representam uma grande
oportunidade para estabelecermos novas bases de
crescimento capazes de transformarem a economia e a
sociedade. Vamos atravessar o período de recessão por
meio da redução de riscos e de investimentos que vão
criar um planeta mais seguro, limpo e com uma
economia mais forte” Nicholas Stern – professor da
London School of Economics6.
Fig. 1 - Evolução das expectativas sociais
Fonte: BARBIERI e CAJAZEIRA, 2009, p. 72.
A figura acima representa a evolução das expectativas das pessoas,
em relação às empresas, ao comprarem um produto ou contratarem o serviço
6 ZYLBERSZTAJN, David. LINS, Clarissa. Sustentabilidade e geração de valor: a transição para o século
XXI. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 2010, p. xvii (Introdução).
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
86
de determinada empresa e pode ser usada para ilustrar as partes
interessadas que compõem a Mesa Redonda.
Crescimento populacional, recursos limitados e nível de produção
O crescimento demográfico, a limitação dos recursos indispensáveis à
vida (humana e animal) e o aumento contínuo dos níveis de produção
(ligado à automação , demanda e superconsumo) são as três principais
problemáticas que ameaçam a sobrevivência das gerações das próximas
décadas. Considerando essas três grandes problemáticas, Barbieri (2007)
apresenta dois extremos ligados à perspectiva de futuro das populações de
todo o globo terrestre.
A primeira perspectiva de futuro é defendida por Malthus e Hardin
(perspectiva com inclinação pessimista) , a segunda é defendida por Adam
Smith e Julian Simon (perspectiva com inclinação otimista), cada qual com
seus argumentos e apontamentos advindos da análise social.
Na perspectiva pessimista, temos Malthus7 defendendo a ideia de que
a paixão entre os sexos é necessária e não irá se alterar e assim ele conclui
que a população, quando não controlada, tende a aumentar numa
progressão geométrica, enquanto os recursos e os meios de subsistência
crescem em proporção aritmética, o que acabaria resultando em escassez de
alimentos. Ainda segundo Malthus, o equilíbrio entre oferta e demanda de
alimentos seria restabelecido pelas guerras, doenças, pestes e outras
catástrofes que ele denomina como “freios positivos”, uma vez que ele não
acreditava na capacidade dos seres humanos, principalmente dos mais
pobres, de refrear preventivamente seus impulsos em razão de restrições
morais e controle da natalidade. Por isso mesmo Malthus condenava as
políticas públicas em defesa dos pobres, como as Leis dos Pobres (Poor
7 Malthus em sua obra “Ensaio sobre a população”, publicada em 1798.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
87
Laws), introduzidas na Inglaterra no início do século XVII, e que
incentivariam os pobres a aumentar ainda mais sua prole, ampliando o
descompasso entre a população e os meios de subsistência. Ainda nessa
linha de pensamento Malthus também condenava os sindicatos, pois em seu
entender, conceder melhores salários aos trabalhadores estimularia o
crescimento populacional. Malthus fez escola, embora suas previsões
pessimistas não se tenham verificado, e o adjetivo malthusiano é utilizado
para indicar pessoas pessimistas quanto ao futuro devido ao descompasso
entre recursos e necessidades e devido à dificuldade de conter o crescimento
populacional, principalmente das populações pobres.
Ainda hoje, o neomalthusianismo continua pessimista quanto ao
futuro da humanidade e prega a necessidade de controle da população.
Segundo seus argumentos, as altas taxas de natalidade geram populações
muito jovens e como estas consomem mais do que produzem, o resultado
final é o aumento da pobreza.
Hardin8, um autor neomalthusiano9, aponta que há certos problemas
para os quais não há solução técnica, como por exemplo, as questões
relativas à população mundial, pois uma Terra finita pode suportar apenas
uma população finita e não é isso o que se observa diante da liberdade de ter
filhos. Hardin considera essa liberdade intolerável e se opõe ao direito das
famílias decidirem sobre essa questão. Para ele como não há solução técnica
capaz de salvar a humanidade da miséria resultante da superpopulação, a
liberdade de procriar arruinará a todos.
No outro extremo temos a perspectiva otimista de futuro em relação
aos recursos necessários à vida humana. Essa perspectiva otimista se baseia
8 Hardin em seu artigo “The tragedy of the commons”, publicado em 1968 na prestigiada revista Science.
9 Neomalthusiano – adjetivo dado às pessoas que atualmente acreditam na Teoria Populacional Malthusiana,
criada pelo demógrafo Thomas Malthus. Segundo essa teoria a superpopulação dos países é a principal a causa
da pobreza dos mesmos. Para os neomalthusianos, uma população numerosa seria um obstáculo ao
desenvolvimento e levaria ao esgotamento dos recursos naturais, ao desemprego e à pobreza.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
88
na crença de que qualquer problema de escassez no presente ou no futuro
próximo será solucionado mais adiante, defende a ideia de que sempre
haverá a possibilidade de substituição de insumos e processos produtivos.
Funciona como um “efeito dominó10” onde à medida que o mercado visualiza
a possibilidade de esgotamento de um certo recurso natural, o seu preço de
mercado aumentaria e isso estimulará as atividades de pesquisa e
desenvolvimento científico e tecnológico para melhor aproveitar esse recurso
escasso e também para encontrar alternativas de substitui-lo. Essa visão
otimista considera, na prática, todos os recursos infindáveis, pois diante da
iminência de escassez de um certo recurso sempre será encontrado algum
substituto.
Adam Smith11 em sua obra “A riqueza das nações” faz análises e
apontamentos a favor da perspectiva otimista. Adam afirma que,
independentemente do solo, clima ou extensão territorial de uma nação, a
abundância ou escassez de bens de que ela irá dispor dependerá de duas
circunstâncias, sendo a primeira mais importante que a segunda :
1. Da habilidade, destreza e bom senso com que o trabalho é executado.
2. E da proporção entre os que executam e os que não executam o
trabalho útil.
Segundo Adam Smith, sempre haverá demanda por alimentos e da
mesma forma que os animais, os humanos se multiplicam
proporcionalmente aos meios de subsistência. Assim, ele conclui que os
10 Efeito Dominó – expressão usada para representar uma ação que gera uma sequência de acontecimentos que
ocorrem um após o outro inevitavelmente, lembrando, no sentido figurado, ao que acontece quando se organiza as
peças de um dominó todas em pé e uma atrás a outra com um pequeno espaço entre elas, e então, se empurra a
primeira peça fazendo-a cair sobre a segunda peça, repentinamente esta cairá sobre a próxima e rapidamente
todas estarão derrubadas.
11 SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigações sobre sua natureza e suas causas. São Paulo: Abril
Cultural, 1983.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
89
alimentos sempre irão demandar trabalho e sempre haverá alguém disposto
a produzi-los, de modo que a terra irá sempre produzir uma quantidade de
alimentos mais que suficiente para remunerar o trabalho e repor o capital.
Julian Simon, economista da Universidade de Maryland e outro
defensor da perspectiva otimista de futuro em relação aos recursos
indispensáveis à vida, afirmava que os seres humanos sempre souberam
resolver seus problemas. Prova disso é a melhor qualidade de vida de que a
humanidade dispõe hoje comparada ao passado. E quanto mais pessoas,
maior a capacidade para resolver problemas. Para Simon, o resultado final é
surpreendente, pois as condições finais seriam melhores do que se a escassez
nunca tivesse ocorrido. Os meios alternativos encontrados seriam até
melhores do que a antiga forma aplicada (ou os recursos antes utilizados).
Barbieri (2007), explica que essas duas posturas (perspectiva
pessimista e otimista) estão equivocadas, embora ambas trazem
contribuições importantes para o debate sobre recursos naturais e vitais à
vida. A obra de Malthus contribuiu para o desenvolvimento da dinâmica
populacional e serve, até hoje, como base para se desenvolver modelos que
buscam relacionar o crescimento das populações de qualquer espécie com os
seus fatores limitantes, entre eles a oferta de recursos. O grande problema é
quando esses modelos explicativos baseados nos conceitos de Malthus são
transformados em modelos normativos aplicados aos seres humanos, como
programas de esterilização em massa de populações pobres.
Barbieri ainda aponta que é comum as pessoas que afirmam que há
gente em excesso no Planeta não se incluírem entre os que estão sobrando, e
assim suas propostas e argumentos sempre se voltam contra os outros, os
que não podem se defender.
Três maneiras como a Sustentabilidade melhora as empresas
Ao encontrar, ou mesmo ao buscar, o equilíbrio entre o social, o
econômico e o ambiental, os princípios da sustentabilidade podem melhorar
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
90
a gestão da empresa de três maneiras básicas – ajudando a protegê-la , a
gerenciá-la e a promover seu crescimento12.
Proteção da empresa
A proteção da empresa inclui a redução dos riscos de prejudicar os
clientes, os empregados e as comunidades; a identificação o mais cedo
possível de riscos iminentes e de falhas gerenciais pendentes; a limitação de
intervenções regulatórias; e a preservação da licença de operação implícita
ou explícita, concedida pelo governo ou pela comunidade em geral.
Gestão da empresa
A gestão da empresa abrange redução de custos, melhoria da
produtividade, eliminação de desperdícios desnecessários e garantia de
acesso a fontes de capital a custos mais baixos.
Promoção do crescimento da empresa
A promoção do crescimento da empresa inclui a abertura de novos
mercados, o lançamento de novos produtos e serviços, a aceleração do ritmo
de inovação, a melhoria da satisfação e da lealdade dos clientes, a ampliação
da fatia de mercado mediante a conquista de novos clientes para os quais a
sustentabilidade seja valor pessoal ou empresarial importante, o
desenvolvimento de novas alianças com parceiros de negócios e com outros
stakeholders, além da melhoria da reputação e do valor da marca.
Importância da Sustentabilidade na Estratégia Empresarial
A Sustentabilidade aplicada na estratégia empresarial implica
reforçar o planejamento de longo prazo e ampliar o leque de fatores
considerados. A estratégia do negócio passará a ter o foco muito além na
12 SAVITZ, Andrew. WEBER, Karl. A empresa sustentável – Verdadeiro Sucesso e Lucro com
Responsabilidade. Rio de Janeiro: Ed. Campus. 2007, p. 40.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
91
empresa em si mesma e na primeira camada da esfera de relacionamento,
que cobre as cadeias de suprimento e a distribuição e venda.
“Hoje, há consenso no sentido de que toda empresa deve
estar engajada no esforço maior para manter a civilização
humana e aumentar a qualidade de vida, de forma
compatível com a capacidade de suporte do planeta. Isso se
aplica em especial à indústria e ao agronegócio e significa
compatibilizar as demandas por água, energia e recursos
naturais com os estoques disponíveis e renováveis do planeta
e também com a capacidade para absorção da geração de
resíduos sólidos, efluentes e emissões atmosféricas. Ou seja,
cada indivíduo isoladamente e cada organização, tenha
caráter produtivo e lucrativo ou não, são chamados a
assumir novos deveres, mudar hábitos e ajustar
comportamentos. Isso significa abandonar uma atitude
reativa e adotar posições proativas.” (ZYLBERSTAJN e
LINS, 2010, p.158 )
“Já é possível afirmar que a Responsabilidade Social no
Brasil superou uma primeira fase de assimilação e agora
começa a ser, de fato, incorporada ao dia a dia das
organizações. Do ponto de vista quantitativo, há um maior
engajamento de empresas em projetos sociais. Sob a ótica
qualitativa, a implementação de ações socialmente
responsáveis integradas ao planejamento estratégico das
empresas vem tendo um avanço importante... Hoje mais
empresários tem clareza do valor que a gestão sustentada
pela Responsabilidade Social agrega aos negócios13.”
13 Responsabilidade Social. <www.ethos.org.br/site/conferencia/rsocial.htm> visitado em 10 de agosto de 2000.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
92
A tabela 1 abaixo, informa que para as empresas administradas a
partir de uma visão tradicional e reativa pensar nos problemas ambientais e
adotar práticas que minimizem seus impactos representa um aumento de
despesas e investimentos sem retorno. Para elas os problemas ambientais
são solucionados a partir do cumprimento da legislação vigente. As
empresas com visão tradicional e reativa acreditam que configura um
cenário de concorrência desleal quando seus competidores não cumprem a
atual legislação ambiental e social. As empresas com visão sustentável e
proativa, por usa vez, acreditam que solucionar problemas ambientais é
uma maneira de se reduzir custos, desperdícios e perdas além de
representar uma forma de prevenir riscos para o negócio. Também
acreditam que as empresas devem adaptar seus processos antes das
exigências legais e de forma ainda mais rigorosa que as legislações. As
empresas sustentáveis e proativas veem a questão ambiental como meio de
encontrar oportunidades de negócios e assim conquistarem um forte
diferencial frente aos seus competidores. Elas acreditam também que se
suas ações, seus processos, sua logística e sua cadeia de suprimentos
seguirem orientações rumo à excelência ambiental ela, a empresa,
consequentemente irá se valer dos benefícios de um legítimo marketing
ecológico, como ter uma imagem positivamente forte e ser reconhecida
publicamente como empresa responsável ambiental e socialmente.
Tabela 1 – Dois tipos de visão empresarial: Visão Tradicional (REATIVA) e
Visão Sustentável (PROATIVA)
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
93
VISÃO TRADICIONAL E REATIVA VISÃO SUSTENTÁVEL E PROATIVA
Problemas ambientais são
absorvedores de despesas e
investimentos sem retorno.
A solução dos problemas ambientais deve ser
encarada como forma de reduzir custos,
desperdícios e perdas, e prevenir riscos para o
negócio, conciliando ecologia com economia.
A solução dos problemas ambientais
resume-se ao cumprimento da
legislação vigente.
As empresas devem se antecipar às novas
legislações em gestação, sempre mais
rigorosas, tendo em vista a globalização da
economia e a consolidação nas leis dos
avanços das novas tecnologias disponíveis e
economicamente viáveis.
O não cumprimento da legislação
ambiental e social por competidores é
uma ameaçadora forma de
concorrência desleal.
As oportunidades de negócios no campo
ambiental podem representar forte
diferencial frente aos competidores, ao lograr
melhor acolhida entre clientes e investidores
ambientalmente responsáveis; o respeito a
normas ambientais mais rigorosas pode
eliminar concorrentes.
A poluição e os acidentes ambientais
são algo danoso para a imagem da
empresa.
A excelência ambiental é a base para
promover o marketing ecológico legítimo, que
não deve ser confundido com mera
propaganda.
Fonte: ZYLBERSZTAJN e LINS, 2010, p.159.
Os três domínios da Responsabilidade Social das Empresas
Estudiosos e pesquisadores do tema Sustentabilidade sabem que este
tema também aborda a questão da Responsabilidade Social. Muitas pessoas
e até grandes organizações não compreendem ao certo o que é
Responsabilidade Social Empresarial, o que representa este tema e o que
está incluso nessa abordagem.
Para o Instituto Ethos, responsabilidade social é definida da seguinte
forma:
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
94
[...] é a forma de gestão que se define pela relação ética
e transparente da empresa com todos os públicos com os
quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas
empresariais compatíveis com o desenvolvimento
sustentável da sociedade, preservando recursos
ambientais e culturais para as gerações futuras,
respeitando a diversidade e promovendo a redução das
desigualdades sociais.14
Barbieri e Cajazeira (2009), apresentam o modelo dos três campos ou
os três domínios da Responsabilidade Social Empresarial15. Este modelo foi
criado por Schwartz e Carroll em 2003 com o intuito de representar
adequadamente os elementos relacionados à Responsabilidade Social
Empresarial.
Em seu modelo, Schwartz e Carroll apontam que a Responsabilidade
Social Empresarial possui três domínios (ou três campos de forte atuação):
o domínio econômico, o legal e o ético.
O campo econômico se refere às atividades voltadas para produzir
resultados e retornos financeiros positivos (diretos e indiretos), como a
maximização de lucro ou do valor das ações. São exemplos claros de ações
econômicas diretas as atividades para incrementar as vendas da empresa ou
para evitar litígios. São exemplos de ações econômicas indiretas aquelas que
visam melhorar a imagem da empresa frente aos consumidores e acionistas
ou elevar a motivação de seus funcionários.
O campo da responsabilidade legal se refere às ações da empresa
para cumprir as normas e princípios legais, podendo se dividir em três
14 INSTITUTO ETHOS DE EMPRESAS E RESPONSABILIDADE SOCIAL. Processos gerenciais:
Responsabilidade Social Empresarial, junho de 2005, p.25.
15 BARBIERI, José Carlos. CAJAZEIRA, Jorge Emanuel Reis. Responsabilidade social empresarial e
empresa sustentável: da teoria à prática. São Paulo: Ed. Saraiva, 2009, p. 56.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
95
categorias: ações de conformidade legal, medidas para evitar litígios16 e
medidas antecipatórias às leis regulamentadoras.
O campo ético se refere às responsabilidades da empresa diante das
expectativas da população, das comunidades e de seus stakeholders,
envolvem medidas e condutas éticas domésticas e globais. O domínio ético
pode ser dividido em três padrões éticos gerais: o padrão convencional, o
consequencialista e o padrão deontológico. O padrão convencional são
as normas sociais e os padrões considerados como necessários para o
funcionamento das indústrias no segmento e localidade onde elas atuam,
pelas associações profissionais e pela sociedade, incluindo os acionistas,
clientes, empregados competidores e demais stakeholders. Como essas
normas sociais variam entre diferentes grupos sociais, uma forma das
empresas contornarem essa limitação é elaborando e divulgando Códigos de
Ética formais, muitas vezes apresentados pela área de RH no processo de
integração de novos colaboradores.
O padrão ético consequencialista é aquele onde as ações são julgadas
ou decididas pensando-se em suas consequências. Nele, uma ação é
considerada consequencialista se promover o bem social ou se produzir a
maior quantidade de benefícios líquidos, ou o menor custo líquido,
comparativamente às outras alternativas.
O padrão ético deontológico está ligado diretamente às noções de
obrigação e dever como motivos das ações da empresa. É aqui, que a
empresa tem bem claro os direitos de todas as partes envolvidas, direta e
indiretamente, em seu negócio. Por exemplo: ao planejar a instalação de
uma indústria química, a empresa deverá considerar que é direito dos
moradores locais que a empresa se preocupe e preze por adotar todas as
medidas necessárias para garantir a segurança e a saúde de toda
16 Litígio – contestação de que pode resultar um processo judicial ou arbitramento. Pendência, atitude negligente,
disputa, demanda. Fonte: FERREIRA, Aurélio Baird Buarque. Mini Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Rio
de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1993, p. 337.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
96
comunidade local, ao mesmo tempo em que, por outro lado, há uma vasta
legislação que regulamenta todos os requisitos e exigências necessários para
que esta indústria seja construída, equipada e monitorada de maneira a não
causar dano ou prejuízo local, quer aos moradores das regiões vizinhas quer
às outras empresas, aos animais e às fontes de água local que ali já estavam.
Da mesma forma, é natural da empresa que segue o padrão ético
deontológico se preocupar em seguir corretamente todas as obrigações legais
apontadas pelas leis trabalhistas vigentes (direito dos funcionários e dever
da empresa que age com ética e moral). O padrão ético deontológico está
inevitavelmente ligado aos termos Ética e Moral17 e esses dois termos
estão relacionados a costumes, hábitos, condutas e modo de vida.
O substantivo Moral se refere ao conjunto de normas e valores aceitos
pela sociedade e que orientam a conduta humana. O adjetivo Moral é a
característica de uma conduta orientada por normas e valores morais,
qualificando-a como boa, certa, correta ou desejada. O substantivo Ética
indica o estudo a respeito da moral, por isso também é conhecido como
filosofia moral ou ciência moral. As palavras amoral e imoral precisam ser
esclarecidas. O sentido literal do adjetivo Amoral é ausência de
considerações de ordem moral. Trata-se de ação, decisão ou julgamento que
não envolve questões morais. Torcer por um time de futebol e ouvir pagode
são exemplos de fatos amorais ou não-morais. Já o adjetivo Imoral indica
uma oposição às normas morais, como é o caso da ação de votar em um
candidato a deputado sabidamente corrupto.
Carroll, um dos autores mais conhecidos no campo da ética e da
Responsabilidade Social Empresarial afirma que uma empresa com uma
administração imoral é aquela cujas decisões, ações e comportamentos se
opõem abertamente às normas morais vigentes e os administradores tem
17 BARBIERI, José Carlos. CAJAZEIRA, Jorge Emanuel Reis. Responsabilidade social empresarial e
empresa sustentável: da teoria à prática. São Paulo: Ed. Saraiva, 2009, p. 85, 87 e 88.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
97
plena consciência desse fato. Decidem e agem movidos apenas para obter
benefícios para a empresa ou para si próprios sem considerar os danos que
causam aos demais envolvidos e os direitos dos mesmos.
A administração de uma empresa é amoral quando nem é a favor e
nem contra aos preceitos morais, pelo fato de que os administradores não se
dão conta das implicações das suas decisões e ações sobre outras pessoas,
organizações e grupos. Há, neste caso, uma forte necessidade de percepção
ou de consciência por parte da empresa no caso dos amorais involuntários ou
não intencionais.
Retomando à abordagem de Responsabilidade Social Empresarial
apresentada por Schwartz e Carroll, onde são apresentados o domínio
econômico, o legal e o ético, é muito comum que as empresas em suas ações e
programas acabem dando maior ênfase em UM dos três campos (como
mostra a figura abaixo). Embora o ideal é que a empresa sempre busque o
equilíbrio entre os três campos da responsabilidade social (figura D).
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
98
Fig. 2 - Responsabilidade Social Empresarial : perfis das empresas
Fonte: BARBIERI e CAJAZEIRA, 2009, p. 60.
Considerações Finais
Numa abordagem geral sobre Sustentabilidade, pode-se dizer que, ao
contrário do que muitas pessoas pensam, o tema Sustentabilidade não é,
apenas, sinônimo de meio-ambiente. Pensar em Sustentabilidade não é
sinônimo de “pensar verde”, pois esse tema possui uma verdadeira
amplitude de assuntos e questões interligadas e bem conectadas
entre si.
Ser uma empresa sustentável não é apenas ter uma Política
Ambiental muito bem elaborada e constantemente monitorada e
mensurada, mas representa também, práticas honestas e legais de trabalho;
remunerações justas e ambiente de trabalho seguro e adequado aos
funcionários; inclui pensar em toda a cadeia de suprimentos; pensar nas
comunidades e populações envolvidas em cada etapa dos processos do
negócio; geração de emprego e renda a jovens e comunidades carentes; não-
exploração de mão de obra infantil; promoção de ações e programas sociais
que visem minimizar os impactos da concentração de renda; inclui expandir
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
99
ou fomentar a educação básica do país; favorecer e impulsionar o ingresso
dos jovens na educação superior, especialmente os jovens oriundos de
comunidades ou populações carentes; se preocupar a fundo com toda a
cadeia de valor da empresa buscando parceiros e estabelecendo alianças
sustentáveis com outras empresas, fornecedores e prestadores de serviços
que sejam claramente responsáveis social, econômica e ambientalmente. A
união do Social, Econômico e Ambiental é inviolável quando falamos em
Sustentabilidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABRAMOVAY, Ricardo. Muito além da economia verde. São Paulo: Ed.
Abril, 2012.
BARBIERI, José Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e
instrumentos. 2ª edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007.
BARBIERI, José Carlos. CAJAZEIRA, Jorge Emanuel Reis.
Responsabilidade social empresarial e empresa sustentável: da teoria à
prática. São Paulo: Ed. Saraiva, 2009.
FERREIRA, Aurélio Baird Buarque. Mini Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa. 3ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1993.
MARQUES, José Roberto. Sustentabilidade e Temas Fundamentais de
Direito Ambiental. Minas Gerais: Editora Millennium, 2009.
SAVITZ, Andrew. WEBER, Karl. A empresa sustentável – Verdadeiro
Sucesso e Lucro com Responsabilidade. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 2007.
SACHS, Ignacy. Caminhos para o Desenvolvimento Sustentável. 2ª edição.
Rio de Janeiro: Ed. Garamond, 2002.
SACHS, Ignacy. Desenvolvimento includente, sustentável e sustentado. Rio
de Janeiro: Ed. Garamond, 2004.
Ensaio
SANTOS, Ana Paula Teixeira. A Sustentabilidade Ambiental dentro das organizações.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 69-100,
out. 2014.
100
TINOCO, João Eduardo. KRAEMER, Maria Elisabeth Pereira.
Contabilidade e Gestão Ambiental. São Paulo: Editora Atlas, 2004.
ZYLBERSZTAJN, David. LINS, Clarissa. Sustentabilidade e geração de
valor: a transição para o século XXI. Rio de Janeiro: Ed. Elsevier, 2010.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
101
Plantas medicinais: cultivo em quintais
pela população de um município do
semiárido Piauiense, nordeste do Brasil
Maria de Fátima Pereira da Silva
Licenciada em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Piauí.
Campus CSHNB.
Paulo Henrique da Silva
Licenciado em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Piauí.
Campus CSHNB.
Ykaro Richard Oliveira
Licenciado em Ciências Biológicas, Universidade Federal do Piauí.
Campus CSHNB.
Tássio Marcílio Francisco Gomes
Especialista em Educação Ambiental, Professor Auxiliar I, Curso de
Ciências Biológicas, Universidade Federal do Piauí. Campus Senador
Helvídio Nunes de Barros.
Paulo Michel Pinheiro Ferreira
Doutor em Farmacologia, Programa de Pós-graduação em
Ciências Farmacêuticas, Departamento de Biofísica e Fisiologia,
Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Piauí.
Gilberto Santos Cerqueira
Pós-doutor em Morfologia, Programa de Pós-Graduação em Ciências
Farmacêuticas da Universidade Federal do Piauí. Laboratório de
Anatomia Campus CSHNB.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
102
Maria Carolina de Abreu
Doutora em Botânica, Professora Adjunto II, Curso de Ciências
Biológicas, Universidade Federal do Piauí- Campus Senador Helvídio
Nunes de Barros. E-mail: [email protected].
RESUMO
O uso das plantas medicinais cultivadas em quintais, é uma prática
recorrente entre populações de todo planeta, por questões socioeconômicas
ou culturais, tanto em zonas rurais como urbanas. É evidente a importância
dos quintais facilitando as ações antropogênicas e condicionando a
manutenção desses recursos vegetais no período de estiagem. Esse estudo
objetiva levantar dados no que concerne o cultivo e uso de plantas
medicinais nos quintais. Ele foi realizado na cidade de São Julião, no
semiárido Piauiense. Estudo de caráter quali-quantitativo descritivo,
realizado entre fevereiro e maio de 2013, sendo considerado o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, além de aplicar 100 entrevistas
semiestruturadas, onde as residências foram escolhidas aleatoriamente.
Registrou-se o uso e o cultivo de oito espécies, distribuídas em 06 famílias,
sendo a Lamiaceae (03) de maior ocorrência. Constatou-se o cultivo em
quintais em 24% das citações, e o uso destas em 91,67%. Das partes
utilizadas predominou a folha com 83,33%, e como forma de preparo foi a
infusão com 79,17%. Com base no exposto, o pequeno número de plantas
medicinais cultivadas em quintais, leva a indagações e contradições de
cunho cultural e ético, carecendo de mais estudos na região para
compreender os motivos do abandono destas práticas.
Palavras – chave: Conhecimento popular, Caatinga, Cultivo e uso de
plantas.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
103
ABSTRACT
The use of medicinal plants cultivated in backyards is an applicant practice
among peoples across the planet by socioeconomic or cultural issues in rural
and urban areas. The importance of backyards is evident, facilitating the
anthropogenic actions and conditioning the maintenance of these plant
resources in drought. The study aim was to get information about
cultivation and use of medicinal plants in backyards, at São Julião city in
semi-arid of Piauí state, Brazil. The study has a quali-quantitative approach
with descriptive character and was conducted between February and May
2013, was been considered the informed consent for research, with 100 semi-
structured interviews applied and households randomly selected. Was
recorded the use and cultivation of eight species, distributed in 06 families,
being the Lamiaceae (03) family of higher occurrence. Cultivation in
backyards occurred in 24% of the citations, and the use of these in 91.67%.
The most used part of the plants was the leaf 83.33%, and the infusion was
the method of preparation most common 79.17%. Based on the exposed, the
small number of medicinal plants cultivated in backyards leads to questions
and contradictions with cultural and ethical character, needing more studies
to understand the abandonment of these practices.
Keywords: Popular knowledge, Caatinga, Cultivation and use of plants.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
104
INTRODUÇÃO
Considerando as palavras de Salvi e Heuser (2008), planta medicinal
é todo e qualquer vegetal que uma vez aplicado sob determinada maneira e
por alguma via ao ser humano é capaz de promover um efeito farmacológico.
A utilização de plantas medicinais é uma prática comum entre as
populações. Cerca de 80% da população mundial depende da medicina
tradicional para suas necessidades básicas de saúde e, quase 85% da
medicina tradicional envolve o uso de plantas medicinais, seus extratos
vegetais e seus princípios ativos (OMS 2002). Em consonância com Lima e
colaboradores (2010), acrescenta-se que a utilização de plantas medicinais
tem incentivos inclusive da Organização Mundial da Saúde.
Estes vegetais têm um papel muito importante na questão
socioeconômica, tanto para as populações que vivem em meio rural quanto
para as que vivem no meio urbano. A utilização de espécies medicinais, na
maioria das vezes nativa da sua região, ou cultivadas em quintal, pode
reduzir os gastos com medicamentos alopáticos (CALIXTO 2000). Por outro
lado, Di Stasi (2007) reporta que o avanço da ciência e da tecnologia no que
tange à elaboração sintética de fármacos vem desestimulando, ao longo do
tempo, a utilização das plantas medicinais no cuidado à saúde.
Os quintais são considerados sistemas agroflorestais importantes
para o cultivo, seleção e conservação de espécies de plantas, fornecendo
recursos para o consumo familiar e para preservação da cultura local
(KUMAR e NAIR 2004), sendo também apontados como responsáveis em
conservar parte da história da cultural local, podendo ser considerados
reservas atuais e potenciais de recursos vegetais (BRASIL et al. 2007).
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
105
Desta forma, este espaço é de grande relevância para o contato com
variadas espécies vegetais, bem como à manutenção de conhecimentos
populares (NASCIMENTO et al. 2006; SIVIERO et al. 2011).
Na visão de Rocha e colaboradores (2010), os quintais facilitam as
ações antropogênicas, principalmente no que se refere a procriar condições
de sobrevivência nos períodos de seca do sertão nordestino, onde algumas
plantas perdem suas folhas e outras chegam a morrer. Para Amorozo (2002)
o hábito de cultivar plantas em quintais nas zonas urbanas permite formar
através da união de vários espaços plantados, como praças e parques, ilhas
de vegetação que contribuem para a melhoria da qualidade de vida nos
centros urbanos.
É importante ressaltar que os quintais são compreendidos como um
sistema de produção complementar a outras formas de uso da terra,
podendo se destaca pelo valor econômico que desempenham na residência,
constituindo uma fonte disponível de recursos alimentícios e medicinais
(PASA, SOARES e GUARIM-NETO 2005).
Este trabalho teve como objetivo realizar um levantamento de dados
sobre o cultivo e uso de plantas medicinais nos quintais da população do
município de São Julião/PI.
METODOLOGIA
O levantamento foi realizado na cidade de São Julião, município
piauiense de aproximadamente 5.761 habitantes (IBGE 2010), o qual foi
fundado em 18 de dezembro de 1960 e dista 382 km da capital Teresina 382
km.
O município dispõe de abastecimento de água, energia elétrica
distribuída pela Companhia Energética do Piauí S/A - CEPISA, terminais
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
106
telefônicos atendidos pela TELEMAR Norte Leste S/A, agência de Correios e
Telégrafos, hospital e escolas de ensino fundamental e médio. A agricultura
praticada no município é baseada na produção sazonal de feijão, algodão,
mandioca e milho.
No tocante às condições climáticas do município, ocorre o clima
semiárido quente e seco, com temperaturas mínimas de 24ºC e máximas de
36ºC. Localizado na altitude de 377 m, apresenta solos, em grande parte
provenientes da alteração de gnaisses, quartzito, mármore, xisto, arenito,
siltito e conglomerado, rasos ou pouco espessos, jovens, às vezes pedregosos,
ainda com influência do material subjacente (JACOMINE et al. 1986).
A coleta de dados foi realizada entre os habitantes do município de
São Julião – PI, onde foram aplicados 100 formulários em residências
escolhidas de forma aleatória nas zonas rural e urbana, no período de
fevereiro a maio de 2013. O formulário semiestruturado foi composto por 14
questões abordando dados sobre o perfil dos participantes e questões sobre o
hábito destes em utilizar e cultivar plantas medicinais em seus quintais. No
processo de coleta de dados foram levadas em consideração as exigências
contidas na Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, que
regulamenta a pesquisa com seres humanos (BRASIL 2012). Para tanto, os
participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
assegurando aos participantes o anonimato, a privacidade e o direito de
desistir em qualquer etapa da pesquisa. Ressalta-se que esse estudo não
possui nenhum conflito de interesse, se constituindo numa pesquisa de
caráter quali-quantitativa de natureza descritiva. Todos os formulários
foram analisados à luz da literatura pertinente, e os dados compilados e os
gráficos construídos por meio do programa Microsoft Excel 2010.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
107
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados obtidos através das 100 entrevistas, norteadas pelo
formulário de 14 questões aplicados à população do município de São Julião-
PI, permitiram estabelecer o perfil da população deste município quanto ao
cultivo de plantas medicinais em quintais além da diversidade e uso destas
plantas.
Quanto ao gênero dos participantes, 26% foram do sexo masculino e
74% do sexo feminino. Em um estudo semelhante de Nascimento e
Gonçalves (2013) para avaliar o uso de plantas cultivadas em quintais
urbanos no município de Campina do Monte Alegre em São Paulo, também
prevaleceu o maior conhecimento entre as mulheres que parece estar mais
voltado ao cultivo e a utilização de plantas medicinais.
O grau de escolaridade dos entrevistados variou entre Ensino
Fundamental incompleto (39%), Ensino Fundamental completo (22%),
Ensino Médio incompleto (8%), Ensino Médio completo (17%), Graduação
incompleta (4%), Graduação completa (8%) e Pós-graduação (2%). Percebe-se
uma maioria de sujeitos com ensino fundamental incompleto, o que denota
uma baixa escolaridade dos envolvidos no estudo. Todavia, ter baixa
escolaridade não significa que o indivíduo não conhece sobre o cultivo e a
utilização de determinadas plantas, pois tal saber pode ter sido a ele
repassado de forma oral pelos familiares e na comunidade.
Em uma pesquisa semelhante sobre plantas venenosas de Silva e
colaboradores (2014) na cidade de Francisco Santos, que fica à 60 km de São
Julião, também prevaleceu a escolaridade de Ensino Fundamental
incompleto. Porém, um estudo sobre a ocorrência do uso de plantas
medicinais por moradores de um bairro do município de Marília-SP, mostra
que 31% dos participantes possuía nível superior completo, levando-nos a
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
108
acreditar que o cultivo e o consumo de plantas medicinais não se dá apenas
em classes de condições socioeconômicas menos favorecidas.
No que se refere à faixa etária dos entrevistados, há uma maior
frequência na classe de idade compreendida entre 31 a 55 anos (38%). Em
seguida, com um número muito próximo de entrevistados (36%) aparece a
faixa etária de 18 a 30 anos. A menor frequência foi a da faixa etária entre
76-90 anos com 3%. Silva e colaboradores (2014) aponta a faixa etária de 76-
90 como sendo dotada de maior conhecimento sobre os recursos naturais, por
terem sentido ao longo da vida a necessidade de recorrer às plantas como
fonte de medicamento.
Sobre a renda mensal familiar dos entrevistados, prevaleceu a renda
média de um salário mínimo (55%), sendo relevante também informar a
percentagem de pessoas com renda abaixo de um salário mínimo (43%).
Desta forma, através dos dados obtidos na pesquisa, constatou-se que
o perfil da amostra questionada é de mulheres de baixa escolaridade com a
faixa etária entre 31 a 55 anos, com renda familiar de um salário mínimo.
Do universo de entrevistados, apenas 24% cultivam plantas
medicinais em seus quintais e os demais 76% não cultivam. Assim, é
interessante ressaltar a pequena quantidade de pessoas que cultivam
plantas medicinais.
Considerando os indivíduos que ocorrem na porcentagem dos que
cultivam (24%), apenas oito espécies foram mencionadas por estes, as quais
são cultivadas e usadas para finalidades medicinais, conforme evidencia-se
na Tabela 1.
Tabela 1. Nomes vulgares, nomes científicos e famílias das plantas medicinais cultivadas
nos quintais pela população do município de São Julião – PI.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
109
Em relação ao uso das plantas cultivadas, indagou-se aos envolvidos
na pesquisa se quando utilizam as plantas medicinais, fazem uso daquelas
que cultivam ou buscam em outros lugares. Para tal questão, 22% das
pessoas questionadas faz uso daquelas que cultivam e, 78% busca em outros
lugares.
Da parcela de indivíduos que cultiva plantas medicinais em seus
quintais (24), 91,67% (22) faz uso daquelas que cultivam. Com relação ao
local em que têm acesso às plantas medicinais, a grande maioria (58%)
mencionou o mercado, 39% citou o acesso com vizinhos e apenas 3% fez
referência à mata.
Esses dados mostram que, apesar de a maioria ter acesso no mercado,
ainda existe um grande compartilhamento de plantas entre vizinhos. E
mesmo não cultivando plantas medicinais, as pessoas as utilizam muito
para fins terapêuticos. Somavilla e Canto-Dorow (1996) verificaram que 76%
das plantas utilizadas como medicinais na cidade de Santa Maria (RS) são
obtidas através de amigos e também pelo hábito de cultivo caseiro.
Aos que afirmaram cultivar plantas em seus quintais, foi questionado
se fazem uso de algum tipo de adubo e também se utilizam agrotóxico. As 24
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
110
pessoas que cultivam plantas utilizam o adubo orgânico e 95,83 % (23) não
usam nenhum tipo de agrotóxico, apenas 4,17% (1) faz uso de veneno para
matar pragas.
Com relação a utilização das plantas medicinais cultivadas, 83,33%
(20) dos entrevistados que cultivam plantas medicinais em seus quintais
(24) faz corte na planta utilizando apenas as folhas. Pereira-Martins (2001)
na comunidade negra de Abacatal-PA, também teve as folhas (57%) como a
parte da planta mais indicada. Os demais 16,67% (4) não faz nenhum corte e
utiliza toda a planta. Já a forma de preparo predominante na comunidade é
a infusão, mencionada por 79,17% (19) dos sujeitos que cultivam plantas
medicinais no município de São Julião. A infusão é um tipo de chá que
é ingerido de forma oral.
Na população de São Julião esses chás são as preparações
terapêuticas mais populares, sendo usados para quase todas as indicações
de cura e prevenção das doenças, como por exemplo, tosse, gripes, diarreias,
problemas de fígado, intestinos, calmante, diurético, cólicas, insônia e dores
em geral. Outro tipo de preparo utilizado é o lambedor, citado por 20,83% (5)
da população que cultiva plantas medicinais e é utilizado para dores de
garganta e no tratamento de gripes.
Outro dado que investigou-se refere-se a época do ano que os
entrevistados mais utilizam remédios caseiros preparados a partir das
plantas cultivadas. A maioria deles 71% não fazem diferença do uso, 17%
utilizam mais no período chuvoso (janeiro a maio) e 12% no período seco
(junho a dezembro). Resultados semelhantes foram obtidos por Pereira
(2010) em uma pesquisa sobre levantamento de dados sobre o uso e os
costumes da utilização de plantas medicinais pela população picoense, no
qual a grande maioria dos entrevistados (69,5 %) também não faziam
diferença entre os períodos seco e chuvoso no uso das plantas medicinais.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
111
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em decorrência dos resultados analisados, é perceptível a pequena
quantidade de plantas medicinais que são cultivadas nos quintais da região
estudada. Seria a explicação para tal fato o grande desenvolvimento da
ciência e da farmacologia no que se refere o desenvolvimento de
medicamentos alopáticos e homeopáticos e a facilidade de adquiri-los? Ou a
descrença da população investigada quanto às propriedades bioativas que os
vegetais apresentam e que podem proporcionar benefícios na terapia de
inúmeras doenças? Ou seria a questão da mudança de padrões e de hábitos
quanto o cultivo de plantas medicinais na região de São Julião-PI, que já
sofre as pressões decorrentes da modernidade?
São respostas estas, necessárias para compreender o panorama seja
cultural seja ético em que tal localidade está inserida, haja vista que o uso e
cultivo de plantas está inserido na cultura popular, vinculados à
disseminação do conhecimento referente a tais ao longo das gerações. Assim,
carecem estudos para melhor compreender os motivos que estão levando a
população em foco a abandonar às práticas de cultivo das plantas medicinais
em quintais locais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMOROSO, M. C. M. Uso e diversidade de plantas medicinais em Santo Antônio do Leverger,
MT, Brasil. Acta Botânica Brasílica, v. 1, p. 189-203, 2002.
BRASIL, R. D.; SOLDATI, G. T.; COSAT, F.V.; MARCATTI, A.A; JR, R.R.; COELHO, F.M.G . 2007.
Riqueza de Plantas e Estrutura de Quintais Familiares no Semi-árido Norte Mineiro. Revista
Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, p. 864-866.
BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa. Normas para pesquisa envolvendo seres humanos: (Res. CNS 466/12 e outros)
Brasília, DF, 2012. Acesso em: 19/09/2014.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
112
CALIXTO, J. B. Efficacy, safety, quality control, marketing and regulatory guidelines for herbal
medicines (phytotherapeutic agents). Braz. J. Med. Biol. Res.,v. 33, n. 2, p. 79-89, 2000.
DI STASI, L. C. Plantas Medicinais: verdades e mentiras: o que os usuários e os profissionais de
saúde precisam saber. São Paulo: UNESP; 2007.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Resultados do censo 2010. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/censo2010>.
JACOMINE, P.K.T. et al. Levantamento exploratório – reconhecimento de solos do Estado do
Piauí. Rio de Janeiro. EMBRAPA-SNLCS/SUDENE-DRN. 1986. 782 p.
KUMAR, B.M.; NAIR, P.K.R. the enigma of tropical home gardens. Agroforestry systens, vol. 19,
p. 195-207, 2004.
LIMA, J.F; SILVA, M.P.L.; TELES, S.; SILVA, F.; MARTINS, G. N. Avaliação de diferentes substratos
na qualidade fisiológica de sementes de melão de caroá [Sicana odorifera (Vell.)
Naudim]. Revista Brasileira de Plantas Medicinai, v. 12, n.2, p.163-167, 2010.
MACEDO, A.F; OSHIIWA, M.; GUARIDO, C.F.Ocorrência do uso de plantas medicinais por
moradores de um bairro do município de Marília-SP. Rev. Ciênc. Farm. Básica Apl. v. 28, n.1,
p.123-128, 2006.
NASCIMENTO, A. P. L.F; GONÇALVES, K. (2013).Uso de plantas cultivadas em quintais urbanos
no município de campina do Monte Alegre, SP. XI Congresso de Ecologia do Brasil, Setembro
2013, Porto Seguro – BA.
NASCIMENTO, A.P.B.; SILVA, M.R.; GARAVELLO, M.E.P.E.; MOLINA, S.M.G. Quintais
domésticos: conhecimento, tradição e utilidades no município de Piracicaba (SP). In:
EHWC’2006 Environmental and Health World Congress, Santos.
ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD (OMS). Estrategia de la OMS sobre medicina
tradicional 2002-2005. Genebra, Switzerland, 2002.
PASA, M.C. SOARES, J.N e GUARIM-NETO,G. Estudo etnobotanico na comunidade de
Conceição- Açu (alto da bacia do rio Aricá Açu, MT, Brasil). Acta Botânica Brasílica, v. 19, p.
195-207, 2005.
PEREIRA, J. B.A. Levantamento de dados sobre o uso e os costumes da utilização de plantas
medicinais pela população picoense 44p. (Monografia Graduaçãoem Licenciatura Ciências
Biológicas)–Departamento de Biologia, Universidade Federal d Piauí, Picos –PI, 2010.
PEREIRA-MARTINS, N. C. Abordagem etnobotânica de plantas medicinais e alimentícias na
comunidade negra de Abacatal, Ananindeua – PA. Dissertação (Mestrado em Agronomia) -
Departamento de Biologia Vegetal, Faculdade de Ciências Agrárias do Pará, Belém, 138 f. 2001.
Artigo ORIGINAL
SILVA, Maria de Fátima Pereira da; SILVA, Paulo Henrique da; OLIVEIRA, Ykaro
Richard; GOMES, Tássio Marcílio Francisco; FERREIRA, Paulo Michel Pinheiro;
CERQUEIRA, Gilberto Santos; ABREU, Maria Carolina de. Plantas medicinais: cultivo em
quintais pela população de um município do semiárido Piauiense, nordeste do Brasil.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 101-
113, out. 2014.
113
ROCHA, V.M.S; GOMES, T.M.F; LEAL, C.B; ABREU, M.C; SANTOS, L.L. A cultura de Preparo e
Partes Usadas das Plantas da Caatinga, na Medicina Popular: dados preliminares. III Encontro
de Ciências Biológicas, II Jornada de Iniciação Cientifica. UFPI, Campus Senador Helvídio
Nunes de Barros. 2010
SALVI, R. M. e HEUSER, E. D. Interações medicamentos x fitoterápicos: em busca de uma
prescrição racional. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008. 116p.
SILVA, L.R. R; ABREU, M.C.; FERREIRA, P. M. P; PACHECO, A. C. L.; CALOU, I. B. F.; CERQUEIRA,
G. S. Plantas Tóxicas: conhecimento de populares para prevenção de acidentes. RevInter
Revista Intertox de Toxicologia, risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 2, p. 17-36, 2014.
SIVIERO, A., DELUNARDO, T.A., HAVERROTH, M., OLIVEIRA, L.C., MENDONÇA, A.M.S. Cultivo de
Espécies Alimentares em Quintais Urbanos de Rio Branco, Acre, Brasil. Acta Botanica Brasilica.
v.25, n.3, p.549-556, 2011.
SOMAVILLA N, CANTO-DOROW TS. Levantamento das plantas medicinais utilizadas em bairros
de Santa Maria, RS, Brasil. Cienc Natura v. 18, p. 31-148,1996.
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
114
Avaliação das condições higiênico-
sanitárias de indústrias processadoras de
açaí de Imperatriz-MA
Saimon Guthierre Neco Nonato
Graduando em Engenharia de Alimentos, Centro de Ciências Sociais,
Saúde e Tecnologia, Universidade Federal do maranhão, Imperatriz-
MA / Brasil.
Stella Regina Arcanjo Medeiros
Engenheira de Alimentos, Doutora, Professora da Universidade Federal
do Piauí, Campus de Picos. Rua Cícero Duarte, no 905. Cep:64.600-000.
Picos-PI / Brasil. Tel.: (89) 34221018.
E-mail: [email protected].
Amanda Mazza Cruz de Oliveira
Nutricionista. Doutora, Professora do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Ceará, Campus de Ubajara.
Paula Adrianne Braga de Sousa
Nutricionista. Especialista em vigilância sanitária pela Escola de Saúde
Pública do Ceará. Vigilância Sanitária e Ambiental de Fortaleza – CE.
Ana Cibele Pereira Sousa
Nutricionista. Universidade Federal do Piauí. Universidade Federal do
Piauí, Campus de Picos.
Ellaine Santana de Oliveira
Nutricionista. Universidade Federal do Piauí. Universidade Federal do
Piauí, Campus de Picos.
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
115
RESUMO
O objetivo desse trabalho foi avaliar as condições higiênico-sanitário de
indústrias processadoras de açaí do município de Imperatriz - MA, por meio
da aplicação de uma lista de verificação das boas práticas de fabricação
obtida a partir dos dispositivos da RDC nº 218/05, e posteriormente efetuou-
se o percentual de atendimento dos itens classificando-os conforme a
Resolução RDC nº 275/02 – ANVISA. As industrias estudadas foram
classificadas no Grupo III, com o atendimento de ≤ 50 de adequações. Sendo
que a empresa C obteve o menor percentual de adequação com apenas
29,8%. Os fatores que mais contribuíram para esta avaliação insatisfatória
foram a ausência de procedimentos que assegurassem a integridade e a
qualidade sanitária do açaí, despreparo dos manipuladores durante o
manuseio dos alimentos, hábitos pessoais e de higiene inadequados, e as
precárias instalações físicas/estruturais e tecnológicas das empresas
investigadas.
Palavras-chaves: açaí, qualidade, lista de verificação, indústrias.
ABSTRACT
The aim of this study was to evaluate the hygienic and sanitary
conditions of acai processing industries in the municipality of Imperatriz -
MA, through the application of a checklist of good manufacturing practices
obtained from the RDC 218/05 devices, and subsequent assessment of
attendance percentage of classification items in accordance to RDC
Resolution Nº. 275/02 - ANVISA. Studied industries were classified in Group
III, with the requirement attendance of ≤ 50. Company C had the lowest
percentage of adequacy with only 29.8%. The factors that contributed to this
unsatisfactory assessment included the absence of procedures to ensure açai
integrity and quality, handlers’ lack of professional qualification, inadequate
personal hygiene habits, and poor physical, structural and technological
installations of the facilities investigated.
Key words: açaí, quality, checklist, industries.
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
116
INTRODUÇÃO
O Brasil é o principal produtor, consumidor e exportador do açaí, fruto
típico e popular da região amazônica, que nos últimos anos ganhou
importância devido aos seus efeitos benéficos à saúde, associados a sua
composição fitoquímica e a capacidade antioxidante (MENEZES, TORRES e
SRUR 2008; HOMMA e FRAZÃO 2002).
A qualidade das popas de frutas está relacionada com a qualidade da
matéria-prima, as condições de transporte e processamento e o tipo de
embalagem. No caso do açaí, são inúmeros os problemas enfrentados para se
estabelecer no mercado, quando a empresa deve colocar como fator principal
de seu produto, a qualidade (COHEN et al. 2011). A produção de alimentos
industrializados requer uma logística adequada, para que dessa forma
consiga uma produção industrial padronizada e a disponibilização do
alimento o ano inteiro (ALMEIDA 2013).
Além das pragas no campo, as polpas de açaí também estão sujeitas
às contaminações por matérias estranhas durante as etapas de
processamento do fruto, como a presença de insetos e fragmentos, ácaros,
ovos e larvas, além de areia, terra entre outros no produto final, indicadores
de falha na adoção ou manutenção das boas práticas de fabricação (BRASIL
1997).
Outro aspecto importante a ser considerado e que merece grande
atenção das autoridades sanitárias e órgãos fiscalizadores é o fato do açaí
ser uma das possíveis causas da contaminação por via oral da Doença de
Chagas Aguda (DCA) (BRASIL 2008). A contaminação de alimentos pelo
Trypanosoma cruzi pode ocorrer quando insetos triatomíneos depositam
suas fezes infectadas na superfície de alimentos ou de ingredientes
alimentícios ou, eventualmente, quando os insetos são triturados durante o
processamento das frutas. Esta última é a principal hipótese explicativa
para os diversos surtos ocorridos nos últimos anos (VALENTE et al. 2002)
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
117
Dada a importância das boas práticas de fabricação a fim de garantir
a qualidade higiênico sanitária e a conformidade dos produtos alimentícios
com os regulamentos técnicos, esse estudo objetivou avaliar as condições
higiênico sanitárias de indústrias processadoras de açaí do município de
Imperatriz-MA.
METODOLOGIA
Para avaliação da qualidade sanitária dos quatros estabelecimentos
processadores de açaí, elaborou-se uma lista de verificação a partir dos
procedimentos higiênico-sanitários para preparo, acondicionamento,
armazenamento, transporte, distribuição e comercialização de alimentos e
bebidas preparados com vegetais, dispostos no anexo da RDC nº 218/05. A
lista constou de 3 (três) blocos, divididos em 29 (vinte e nove) itens, assim
caracterizados:
Bloco 01: aquisição, recebimento e armazenamento das matérias-
primas, ingredientes, embalagens e insumos;
Bloco 02: manipuladores de alimentos;
Bloco 03: processamento do açaí.
A coleta de dados procedeu-se com aplicação da lista de verificação,
utilizando o método de observação direta e indagações aos funcionários.
Para avaliação do panorama sanitário dos estabelecimentos estudados,
efetuou-se o percentual de atendimento dos itens, classificando-os conforme
a Resolução RDC nº 275/02 – ANVISA, que considera como Baixo Risco
(Grupo I) - de 76 a 100% de atendimentos aos itens; Médio Risco (Grupo II) -
51 a 75% de atendimento aos itens e Alto Risco (Grupo III) - até 50% de
atendimento aos itens.
Após a avaliação geral dos estabelecimentos, elaborou-se um
documento constando as medidas corretivas das principais não
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
118
conformidades detectadas, contribuindo assim para a adoção e priorização
das estratégias de adequação à legislação vigente.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Quanto à investigação das condições sanitárias de processamento das
polpas de açaí, 100% das empresas avaliadas foram classificadas no Grupo
III (≤ 50 de adequações), no somatório dos itens dos 3 blocos, sendo a
indústria A a que atingiu o maior índice de atendimento (47%), e a empresa
C o menor percentual de adequação (29,8%) (Figura 1).
Figura 1. Percentual geral de adequação sanitária dos estabelecimentos processadores de
polpas de açaí em Imperatriz-MA.
Dentre os fatores que contribuíram para esta avaliação insatisfatória,
os itens que mais se destacaram foram: ausência de procedimentos que
assegurassem a integridade e qualidade sanitária do açaí durante as etapas
de aquisição, armazenamento, preparo e exposição, despreparo dos
manipuladores durante o manuseio dos alimentos, hábitos pessoais e de
higiene inadequado; precárias instalações físicas/estruturais e tecnológicas.
Na avaliação particular dos procedimentos de aquisição, recebimento
e armazenamento das matérias-primas, ingredientes, embalagens e insumos
(Bloco 1), verificou-se baixo percentual de adequação (< 50%) em todos os
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
119
estabelecimentos visitados, sendo o estabelecimento B, o que apresentou
maior índice de não-conformidades (33%) (Figura 2).
Figura 2. Percentuais de adequação sanitária, por bloco, das empresas processadoras de
polpas de açaí em Imperatriz-MA.
No que diz respeito aos manipuladores de alimentos, a empresa A
apresentou o maior percentual de atendimento (75%), enquanto as empresas
B, C e D apresentaram os menores índices de conformidade, 12,5%, 12,5% e
25%, respectivamente.
Quanto ao processamento do açaí, avaliado no Bloco 3, verificou-se as
empresas A e C apresentaram os menores índices de atendimento, enquanto
as outras empresas (B e D) apresentaram valores superiores a 50% de
atendimento.
Na investigação das condições sanitárias de processamento das polpas
de açaí, todas as indústrias foram classificadas como estabelecimentos de
alto risco sanitário.
A ausência de procedimentos que assegurem a integridade e
qualidade sanitária do açaí durante as etapas de aquisição, armazenamento,
preparo e exposição tornam-no impróprio ao consumo, pois, de acordo com a
FAO/OMS (1996), as deficiências de qualidade da matéria prima não podem
ser supridas, pois as condições finais dos produtos alimentícios são o
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
120
resultado da soma do estado da matéria prima com os processos de
elaboração.
Os frutos devem ser avaliados no ato de sua aquisição e na recepção
para verificação das condições higiênico-sanitárias, a presença de vetores e
pragas e ou de seus vestígios, bem como de outros materiais contaminantes.
Frutos em condições insatisfatórias devem ser rejeitados.
A falta de preparo dos manipuladores durante o manuseio dos
alimentos, hábitos pessoais e de higiene inadequados são fatores de risco,
pois o manipulador de alimentos é a principal fonte de contaminação dos
alimentos, por isso se faz indispensável que ele conheça e adote cuidados de
higiene pessoal, para que possa produzir alimentos seguros (FAO/OMS
1996; BRAGANÇA 2001; SILVA JR 2001).
Manipuladores podem ser portadores de formas vegetativas de
bactérias patogênicas. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde,
até 26% dos surtos de doenças de origem alimentar são vinculados aos
manipuladores e, portanto, o seu treinamento em segurança alimentar é
uma das intervenções mais críticas na prevenção de doenças de origem
alimentar (FERREIRA e JUNQUEIRA 2009).
Precariedade de instalações estruturais e tecnológicas também é um
aspecto importante a ser considerado nas boas práticas e tem como objetivo
prevenir contaminação do produto durante o processo de manipulação ou
comercialização (SILVA JR 2001). O processamento das frutas para
obtenção de polpas deve apresentar-se dentro dos padrões de higiene e
qualidade, sendo indispensável à adoção de Boas Práticas de Fabricação
(ABREU, NUNES e OLIVEIRA 2003).
Segundo Clemente (1999) a segurança alimentar é desafio atual,
devendo ser analisada ao longo de toda cadeia alimentar. Assim a
fiscalização da qualidade dos alimentos deve ser feita não só no produto
final, mas em todas as etapas da produção, desde a colheita, passando pelo
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
121
transporte, armazenamento e processamento, até a distribuição final ao
consumidor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Todos os estabelecimentos apresentaram apenas 50% de
atendimentos aos itens avaliados, sendo considerados de alto risco sanitário.
Os dados sugerem que o panorama sanitário dos processadores de açaí
sejam utilizados como critério para definição e priorização das estratégias
institucionais de intervenção no sentido realizar educação sanitária e
tecnologia para produção do açaí com vista ao atendimento dos quesitos
necessários para garantir a sanidade e qualidade do açaí.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABREU, M.C.; NUNES, I.F.S.; OLIVEIRA, M.M.A. Perfil microbiológico de
polpas de frutas comercializadas em Teresina, PI. Hig. Alim. v.17, n. 112, p.
78-81, 2003.
ALMEIDA, P. G. Alimentos industrializados versus saúde do consumidor.
RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e
Sociedade, v. 6, n. 3, p. 73-77, 2013.
BRAGANÇA, M. G. L. Boas Práticas de fabricação para o
processamento artesanal de alimentos. Belo Horizonte: EMATER-MG,
2001. 20p.
BRASIL. Secretaria de Vigilância Sanitária (SVS) do Ministério da Saúde.
Portaria nº326, de 30 de julho de 1997. Regulamento técnico sobre condições
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
122
Higiênico-Sanitárias e de Boas Práticas de Fabricação para
Estabelecimentos Produtores/Industrializadores de Alimentos. Diário
Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 01 de ago.
1997, Seção 1.
BRASIL. Ministério da Saúde. Informe Técnico nº35, de 19 de jun. 1008:
Gerenciamento do Risco Sanitário na transmissão de Doenças de
Chagas Aguda por Alimentos. Acesso 10 de jan. de 2014. < Disponível
em: www.anvisa.gov.br/alimentos/informe/35_190608.htm>.
CLEMENTE, E.S. Controle higiênico-sanitário em supermercados. In: V
CONGRESSO NACIONAL DE HIGIENISTAS DE ALIMENTOS. 1999.
Resumos... Foz do Iguaçu, 1999.
FAO/OMS. Organizacion de las naciones unidas para la agricultura y la
alimentación. Organizacion Mundial de la salud. Programa conjunto
sobre normas alimentarias. Comision Del Codex Alimentarius. Codex
Alimentarius Volumen 1B. Requisitos generales. Roma, 1996.
HOMMA, A.E.O.; FRAZÃO D.A.C.O. Despertar da fruticultura amazônica.
Fruticultura em Revista, p. 27-31, 2002.
SILVA JR, E. A. Manual de Controle Higiênico-Sanitário em
Alimentos. 4ª Ed. São Paulo: Varela, 2001. 307p.
FERREIRA, L.C.; JUNQUEIRA, R.G. Condições higiênico-sanitárias de
uma indústria de processamento de conservas de polpa de pequi na região
norte do estado de Minas Gerais. Ciênc. agrotec. Lavras, v. 33, Edição
Especial, p. 1825 -1831, 2009.
Artigo ORIGINAL
NONATO, Saimon Guthierre Neco; MEDEIROS, Stella Regina Arcanjo; OLIVEIRA,
Amanda Mazza Cruz de; SOUSA, Paula Adrianne Braga de; SOUSA, Ana Cibele Pereira;
OLIVEIRA, Ellaine Santana de. Avaliação das condições higiênico-sanitárias de indústrias
processadoras de açaí de Imperatriz-MA. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 114-123, out. 2014.
123
MENEZES, E.M.S.; TORRES, A.T.; SRUR, A.U.S. Valor nutricional da
polpa de açaí (Euterpe oleracea Mart.) liofilizada. Acta Amazônica, v .38,
n.2, p. 311-316, 2008.
VALENTE, S.A.S.; VALENTE, V.C.; PINTO, A.Y.N. Por que ocorrem
episódios familiares de doença de Chagas associado à transmissão oral na
Amazônia brasileira? Revista da Sociedade Brasileira de Medicina
Tropical, v.35, p.165, 2002.
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
124
Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde
Danila Barros Bezerra Leal
Bacharel Em Enfermagema Pela Universidade Federal Do Piauí,Picos-
Pi, Brasil.
Iolanda Gonçalves De Alencar Figueiredo
Enfermeira, Mestre em UTI, Professora do Curso de Bacharelado Em
Enfermagem da Universidade Federal do Piauí, CSHNB, Picos-Pi,
Brasil.
Jalles Dantas De Lucena
Enfermeiro, Mestrando do Programa de Pós-graduação em
Neurociências Cognitiva e Comportamento da Univerisidade Federal da
Paraíba.
Ana Paula Fragoso De Freitas
Enfermeira, Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ciências
Médicas da Univerisidade Federal do Piauí
Email: [email protected].
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
125
RESUMO
Por muito tempo os adolescentes foram regidos apenas pelo Código de
Menores de 1979. Mas em 1990, com a regulamentação do estatuto, que
abrange direitos e deveres, o jovem passou à condição de cidadão recebendo
também punições em caso de transgressão à lei. O presente estudo teve
como objetivo analisar a percepção dos adolescentes em conflito com a lei
sobre as ações de saúde. Trata-se de uma pesquisa descritiva-exploratória,
com abordagem qualitativa. Participaram desse estudo 8 (oito) adolescentes,
que estavam na casa do albergado, em cumprimento de medida
socioeducativa de internação provisória. Os dados foram coletados através
da aplicação de um roteiro de entrevista semiestruturada. A pesquisa
permitiu caracterizar os adolescentes infratores como sendo, na sua maioria,
jovens do sexo masculino, com idade média de 17 anos, ensino fundamental
incompleto, e que moravam com suas mães. De maneira geral, constatou-se
a ausência do desenvolvimento de ações de saúde na unidade e, dessa forma,
um desacordo com as legislações atuais que garantem assistência à saúde
dos adolescentes em cumprimento de tal medida, comprovado pelo discurso
dos adolescentes, os quais caracterizam a assistência à saúde na instituição
como ruim. Considera-se assim a necessidade de um trabalho
multidisciplinar eficaz, a fim de fortalecer as articulações propostas para o
desenvolvimento saudável do adolescente, além de um acompanhamento
psicopedagógico para tentar estabilizar as mudanças advindas com a
adolescência.
Palavras-chaves: Adolescente. Assistência à saúde. Saúde Coletiva.
ABSTRACT
For a long time the teenagers were only ruled by the Minor Code of 1979. In
1990, with the regulations of the statute, which covers rights and duties, the
young men went to the status of citizen also getting punishments in case of
transgression of the law. The present study aimed to analyze the perception
of adolescents in conflict with the law on health care. This is a descriptive-
exploratory study with a qualitative approach. Participants were 8 (eight)
teenagers, who were housed in the home, under socio measure of provisional
admission. Data were collected through the application of a semi-structured
interview. The research allowed the characterization of young offenders as,
mostly young males, mean age 17 years, completed elementary school, and
living with their mothers. In general, we found the absence of health
activities development in the unit, in disagreement with current laws that
guarantee health care for adolescents, in compliance with such action,
evidenced by the discourse of adolescents, which characterize health care in
the institution as bad. It is therefore considered the need for an effective
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
126
multidisciplinary work in order to strengthen joints proposals for healthy
adolescent development, educational psychology, plus a follow up to try to
stabilize the changes after adolescence.
Keywords: Adolescents. Health care. Public Health.
INTRODUÇÃO
A adolescência caracteriza-se como uma fase de intensas
transformações físicas e psíquicas, sendo muitas vezes marcada por dúvidas
e inseguranças oriundas do acúmulo de responsabilidades. A adolescência
estabelece um período de transição entre a infância e a vida adulta, marcado
pelo abandono da dependência da infância e a aquisição de uma maior
autonomia e independência em campos da vida, como de atividade
ocupacional, relações afetivas estáveis e identidade sexual, entre outras.
De acordo com o artigo 2° do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), o adolescente pertence à faixa etária dos 12 anos completos aos 18
anos, porém ocorre um desacordo da fixação etária com a Organização
Mundial de Saúde (OMS), que circunscreve essa fase como sendo dos 10 aos
19 anos.
É importante lembrar que o adolescente ficou até pouco tempo, alheio
aos direitos civis, pois vigorava apenas o Código de Menores de 1979, que se
fundamentava na doutrina da Situação Irregular, com forte tendência à
criminalização da pobreza e à internação do público infanto-juvenil,
direcionando-se apenas aos menores em situação irregular, ou seja, aos
abandonados, carentes e infratores (ZAPPE e RAMOS 2010). Somente com
a regulamentação do ECA, pela lei 8.069/90, surgiu um novo olhar sobre
esse segmento populacional, servindo como referencial legal obrigatório nas
ações que beneficiam crianças e adolescentes, além de garantir direitos e
afirmar a cidadania, considerando-os como sujeitos de direitos, pessoas em
condição peculiar de desenvolvimento e prioridade absoluta (BOAS, CUNHA
e CARVALHO 2010).
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
127
Além do ECA também existem outras legislações que garantem
direitos ao adolescentes, inclusive aos adolescentes em conflito com a lei,
como a portaria nº 1.082, de 23 de maio de 2014, que redefine as diretrizes
da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes em
Conflito com a Lei, em Regime de Internação e Internação Provisória
(PNAISARI). Apesar de tantas determinações legais há um distanciamento
entre a realidade vivenciada pelos adolescentes e o ideal jurídico da garantia
de direitos dos adolescentes infratores (BRASIL 2014). Essa concepção
estigmatizada em relação aos adolescentes autores de atos infracionais
recebe influência histórica, devido à inexistência de direitos de qualquer
natureza a esse segmento da população (BOAS, CUNHA e CARVALHO
2010). O distanciamento do ideal jurídico também se deve ao despreparo dos
profissionais em atender as necessidades desse público, além da dificuldade
de sensibilizar gestores para o interesse pela questão da saúde do
adolescente privado de liberdade.
Diante dessa realidade justifica-se a importância deste estudo, a fim
de conhecer a realidade institucional local, reafirmando os direitos dos
adolescentes em conflito com a lei, à saúde de forma integral, além de
contribuir para o aprimoramento científico, visto que existem poucas
publicações sobre o tema proposto. Objetivou-se assim, analisar a
assistência à saúde oferecida aos adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de internação provisória, buscando identificar ações de saúde
desenvolvidas no estabelecimento socioeducativo para posteriormente
comparar com o ideal jurídico da garantia dos direitos dos adolescentes.
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
128
METODOLOGIA
Foi realizado um estudo exploratória descritivo com abordagem
qualitativa. O cenário da pesquisa foi uma casa do albergado, localizada
numa cidade no interior do Piauí. Participaram dessa pesquisa adolescentes
com idade entre 14 e 17 anos, de ambos os sexos, em conflito com a lei e em
cumprimento de medida socioeducativa de internação provisória. As
entrevistas semiestruturadas tiveram o número de sujeitos determinados
pelas repetições das respostas, isto é, quando estas, de forma mais
consistente produziram informações redundantes, totalizando oito sujeitos.
Os dados foram coletados entre os meses de abril e junho de 2014 e, partindo
do ponto de saturação, estes, foram agrupados em categorias de temáticas,
apresentando os seguintes passos para sua operacionalização: transcrição,
ordenação, classificação e interpretação e análise final, momento em que se
estabelecem articulações entre os dados e as referências teóricas da
pesquisa, buscando responder as indagações da pesquisa com base em seus
objetivos (MINAYO 2008).
Ao realizar a categorização dos dados, destacaram-se os seguintes
temas: reincidência de infração e custódia no estabelecimento de internação
provisória; ações de saúde durante permanência na instituição; definição da
assistência à saúde na instituição.
Todas as etapas deste projeto estiveram em concordância com a
Resolução 466/12, o que exigiu encaminhamento ao Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade Federal do Piauí, portando número de CAAE
26913814.8.0000.5214.
Essa pesquisa não possui nenhum conflito de interesse e segue os
preceitos da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, norma que
regulamenta a pesquisa envolvendo seres humanos e Declaração de
Helsinque (BRASIL 2012). Todos os participantes assinaram um termo de
consentimento livre e esclarecido.
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
129
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A pesquisa permitiu caracterizar os sujeitos do estudo de acordo com
o gênero, idade, nível de escolaridade e formação familiar. E confirmou a
predominância de adolescentes do sexo masculino e com idade máxima igual
a 17 anos e, mínima de 14 anos, demonstrando a caracterização da violência
masculina juvenil e a permanência dessa particularidade ao longo dos anos,
visto que no estudo de Zappe e Ramos (2010) que traçou o perfil de
adolescentes privados de liberdade, na cidade de Santa Maria/RS, também
obteve-se a idade média entre 16 e 17 anos dos internos que ingressaram no
Centro de atendimento Socioeducativo Regional de Santa Maria (CASE-
SM).
Quanto ao nível de escolaridade, a maioria dos adolescentes havia
estagnado entre a 7ª e 8ª série do ensino fundamental, extremando-se entre
a 4ª série do ensino fundamental e o 1º ano do ensino médio, como
evidenciado nos relatos anteriores. Assim, mais uma vez, concorda-se com os
estudos de Zappe e Ramos (2010), nos quais os autores constataram a
predominância de adolescentes que não possuíam o ensino fundamental
completo. Houve compatibilidade de resultados também com a pesquisa de
Souza, Abrão e Almeida (2011) e de Menicucci e Carneiro (2011), os quais
analisaram as formas de implementação do ECA e do SINASE em dois
centros socioeducativos de Minas Gerais, e observaram que a participação
dos jovens em cursos profissionalizantes era muito falha devido a baixa
escolaridade dos menores, que restringiam-se ao ensino fundamental
incompleto. Esse abandono escolar, contemplado também no estudo de
Maruschi, Estevão e Bazon (2012), no interior do Estado de São Paulo,
mostra a ineficiência da família, da comunidade e do Estado em efetivar a
educação aos jovens, que já foi previsto no ECA.
No que se refere à família, a maioria dos pesquisados, nesse estudo,
moravam com a mãe quando praticaram o ato infracional. Como citado nas
narrações, 6 (seis) adolescentes em conflito com a lei residiam com suas
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
130
mães, um vivia somente com o pai e o outro sujeito da pesquisa morava com
sua esposa. Esses dados assemelham-se ao estudo de Souza, Abrão e
Almeida (2011), como também com o estudo realizado na cidade de Recife,
sobre a percepção de adolescentes infratoras submetidas à ação
socioeducativa sobre assistência à saúde, de Monteiro e colaboradores
(2011), no qual a maioria dos participantes possuía uma constelação
familiar matriarcal, sendo a figura materna, muitas vezes, citada como a
única representante do núcleo familiar.
Destoando do exposto acima, Davoglio e Gauer (2011), encontraram
no seu estudo que a maioria dos adolescentes pesquisados residia com
ambos ou pelo menos com um dos pais quando praticou o ato infracional.
Os resultados da presente pesquisa chamam atenção para o fato de
que o conflito com a lei não está associado à situação de rua ou à ausência
familiar no plano físico. Porém a presença da mãe/parente não exclui a
negligência, que se dá pela carência ou ausência de cuidados responsáveis,
podendo submeter o adolescente a uma inconstância psicológica, pois como
dito por Monteiro e colaboradores (2011), a fragilidade dos vínculos afetivos
com a família faz o adolescente ter uma maior probabilidade de se envolver
em infrações, apesar de não ser esta a regra.
Reincidência de Infração e Custódia no Estabelecimento de
Internação Provisória
A presente pesquisa revelou uma maior incidência de adolescentes
que estavam cumprindo a medida socioeducativa de internação provisória
pela primeira vez. Dos pesquisados, 5 (cinco), num total de 8 (oito), possuíam
essa característica de primeira internação provisória; 2 (dois) estavam em
cumprimento de medida socioeducativa pela segunda vez; e 1 (um) já estava
pela terceira vez na instituição.
Esses resultados conciliam-se com a pesquisa de Davoglio e Gauer
(2011) que investigaram as características sócio-demográficas de
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
131
adolescentes em medida socioeducativa com privação de liberdade, em Porto
Alegre (RS), e encontrou uma frequência maior que 70% de adolescente em
cumprimento da primeira medida socioeducativa. Assim também como em
um estudo realizado por Maruschi, Estevão e Bozon (2012), no interior de
São Paulo, a fim de investigar a persistência da conduta infracional, em
amostra composta de quarenta adolescentes em conflito com a lei, revelou
reincidência de apenas 32,5% da amostra, distinguindo-os de mais da
metade que estavam pela primeira vez.
Ainda que os estudos enunciem a primazia da primeira internação em
oposição à reincidência, não é possível louvar esse resultado, pois não
existem dados que relacionem os egressos de instituições para cumprimento
de medida socioeducativa e os criminosos do sistema penitenciário, não
sabendo ao certo se o adolescente transgressor da lei não volta a cumprir
medida socioeducativa pelo fato de ter conseguido sua completa
ressocialização no meio, sendo a prática pedagógica eficiente, ou se pelo fato
do adolescente já ser maior de idade e não se caracterizar como adolescente,
passando a ser penalizado não mais sob regência do ECA, mas sim da Lei de
Execução Penal.
É válido colocar que outro segmento importante do atual estudo é a
magnitude do ato infracional, o qual foi elevando-se com a reincidência, ou
seja, a gravidade da transgressão sucessiva à lei foi sempre maior do que na
primeira violação. Como relatado pelos adolescentes, quando foi perguntado
se o mesmo já teria cumprido medida socioeducativa na instituição, como
mostrado nas falas que se seguem:
Adolescente D: Já, é a segunda vez que venho, da primeira vez foi assalto de 6
mil, e dessa foi 12.
Adolescente F: Terceira vez que venho. Da primeira vez foi tráfico de droga, da
segunda foi roubo de celular. E agora foi homicídio, 15.
Adolescente G: Já, essa já é a segunda vez. Da primeira vez foi ameaça e tráfico
de droga, e dessa vez foi tentativa de homicídio, porque a infeliz, que era minha
colega, tava na cama com meu namorado.
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
132
Dessa forma, observa-se inconsonância com a parte do estudo de
Davoglio e Gauer (2011), os quais mencionam que nem sempre o ato
infracional pelo qual o adolescente cumpre a atual medida socioeducativa foi
o mais grave que já cometeu.
Essa divergência de resultados pode ser característica local, devido à
fragilidade das ações socioeducativas, que não conseguiram despertar no
adolescente a moral, nem tão pouco sensibilizá-lo quanto processo de
construção de um novo ser.
Outro fator que contribui pra esse aumento da proporção do ato
infracional é o uso de drogas, confirmado também no estudo de Maruschi,
Estevão e Bazon (2012), que julgaram como sendo o terceiro fator que
melhor discriminou o grupo de adolescentes reincidentes dos não
reincidentes.
Ações de Saúde Desenvolvidas na Instituição
De acordo com o ECA, o adolescente acusado da prática de um ato
infracional pode ficar internado provisoriamente até que seja proferida a
sentença referente ao seu processo num período máximo de 45 dias, devendo
esse processo ser analisado durante esse prazo.
Apesar de ser um período relativamente curto, a atividade pedagógica
logo deve ser iniciada, a fim de conseguir bons resultados, ou seja,
ressocializar eficazmente o adolescente. Ações no âmbito da saúde também
devem ser principiadas em tempo oportuno, pois na maioria das vezes esses
adolescentes chegam às instituições com a saúde fragilizada, devido ao estilo
de vida precário e inconstante.
A saúde do adolescente em conflito com a lei, em cumprimento de
medida socioeducativa de internação/ internação provisória, é regida pela
portaria nº 1.082 de 23 de maio de 2014, que redefine as diretrizes da
Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes em Conflito
com a Lei, em Regime de Internação e Internação Provisória (PNAISARI), a
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
133
qual compreende as ações de saúde que devem ser prestadas aos
adolescentes na situação descrita, devendo ser contempladas, de acordo com
o artigo 8º, ações de promoção da saúde e prevenção de agravos, ações de
assistência e reabilitação da saúde e atividades de educação permanente.
Essa assistência deve ser oferecida pelas equipes de referência, seguindo as
atribuições indicadas na política nacional de atenção básica, por meio da
portaria GM/MS nº 2.488, de 21/10/2011. Porém o encontrado na atual
pesquisa não condiz com exatidão com as legislações citadas. Nesse estrato
perguntou-se sobre a necessidade de atendimento de urgência ou consulta
com algum profissional da saúde. As respostas também mostraram violação
das normas, já que deve ser garantido a integralidade e a universalidade de
acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência. Ainda assim,
através da fala de alguns adolescentes percebe-se uma mínima assistência à
saúde:
Adolescente A: Não, senti dor de cabeça um dia e me deram um remédio, mas
num me consultaram não.
Adolescente B: Não, mas sábado fizeram aquele negócio que fura o dedo e viram
minha pressão.
Adolescente C: Não, só senti dor de dente, aí fui no hospital, que era pra
arrancar, mas num tive coragem.
Adolescente D: Nunca senti nada, Graças à Deus, sou saudável.
Adolescente E: Tava com umas manchas no olho e a enfermeira veio olhar daí
mesmo onde a senhora tá, e disse que ia passar pra eu lavar, mas não trouxe
ainda.
Adolescente G: Precisei tia, mas ninguém veio. Aqui eles não levam pro hospital
com medo de eu fugir, mas isso num é problema não, se eu quisesse fugir daqui,
já tinha fugido.
A adolescente G relatou necessidade de atendimento no momento de
outra pergunta da pesquisa e afirmou não ter recebido atendimento.
Ainda foi possível perceber que as ações de promoção à saúde e
prevenção de agravos também não foram executadas com rigor, pois quando
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
134
se perguntou acerca de orientações sobre abster-se do uso de drogas, ou
sobre os tipos de violências, DST’s, gravidez na adolescência, paternidade
responsável, alimentação saudável, entre outros, obteve-se discursos de
vivências externas, ou seja, as informações recebidas foram dadas fora da
instituição, por pessoas alheias à assistência à saúde, ou de forma
inconsistente.
Adolescente A: A enfermeira entregou uns panfletos, mas só entregou, quem
falou comigo sobre essas coisa foi os cara que trabalha aqui.
Adolescente B: Disseram que quando eu sair daqui é pra eu trabalhar e ajudar
minha mãe, pra não fazer coisa errada.
Adolescente D: Só disseram pra usar camisinha, mas foi lá fora, minha mãe,
minhas tias.
Adolescente E: É pra um respeitar o outro, se não... esse negócio de paternidade
eu já sei isso, porque já tenho um filho.
Adolescente F: Disseram que não é pra comer muita gordura. Pra eu respeitar
os outros. Disseram que é pra eu deixar de ser mal, deixar essas coisa pra lá. Eu
sou caba homem, num tenho coragem de abandonar ela não, se eu fiz, eu tenho
que criar. Mas que era pra usar camisinha. Ela falou nesse lugar bem aí que a
senhora tá, a enfermeira.
Adolescente G: Falaram alguma besteirinha aí, mas num lembro mais não.
Adolescente H: Só sei de violência porque li o ECA.
Diferente deste resultado, no estudo de Monteiro e colaboradores
(2011), concluiu-se que a instituição pernambucana atende a maioria dos
requisitos da Portaria nº 1.082[3], através da promoção e prevenção da
saúde, ofertando palestras educativas, apoio psicopedagógico, áreas de lazer,
além de manter contato com instituições de referência e contra referência
relacionada à assistência a saúde, incentivo na inserção educacional e
profissionalizante.
Analisando a atenção à saúde do adolescente de ato infracional
privado de liberdade no Brasil, sob a ótica da inspeção nacional às unidades
de internação de adolescentes em conflito com a lei, em todo o Brasil, em
2006, Vila Boas, Cunha e Carvalho (2010) revelaram em seu estudo que
raramente havia equipe da Estratégia de Saúde da Família (ESF) para o
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
135
acompanhamento dos internos; também aproximou-se dos resultados desta
pesquisa no que se referia ao não oferecimento de assistência de urgência
aos usuários do serviço. A prevenção e orientação sobre a transmissão do
vírus da imunodeficiência humana, assim como outras atividades de
educação em saúde eram esporádicas. Vale ressaltar que essa pesquisa
menciona a problemática de maneira geral, não excluindo as exceções.
Em um estudo realizado por Cavalcanti, Dantas e Carvalho (2011), no
qual se objetivou discutir a situação dos adolescentes em privação de
liberdade no que se refere ao atendimento público em saúde, também se
concluiu que há descumprimento dos direitos sociais que os adolescentes
possuem constitucionalmente, dentre estes o direito à saúde.
Essa realidade local/nacional perpassa por uma série de fatores, sendo
necessária a reordenação de conceitos, crenças e atitudes, tanto dos
profissionais de saúde, que não recebem capacitação específica para lidar
com o adolescente em conflito com a lei que é um usuário do serviço em
condição peculiar, como principalmente dos gestores, para que volte a sua
atenção ao adolescente com transtorno de conduta, que pode ser modificado
e adaptado à sociedade.
Definição da Assistência à Saúde na Instituição pelos Adolescentes
No que concerna à assistência prestada percebe-se que o julgamento
dos jovens envolvidos com a prática de atos infracionais categorizou a
assistência à saúde na instituição para cumprimento de medida
socioeducativa como de má qualidade, na sua maioria, sendo que da
totalidade apenas um a considerou como boa enquanto três afirmaram ser
regular e quatro ruim.
Adolescente A: Porque o menino tava com a barriga doendo e chorando e só
deram chá e disseram que na cadeia era assim mesmo (Ruim).
Adolescente B: Tava sentido dor de barriga e tontura e nem ligaram pra mim,
mas o outro menino tava ruim, foi bem ligerim pro hospital. Pra mim só
fizeram um chá de casca de laranja (Regular).
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
136
Adolescente C: Tem que levar pro hospital, num vai deixar morrer (Regular).
Adolescente D: Rapaz, é difícil. Boto fé que a gente chama o cara e pode é
morrer e o cara não vem. Tem condição não (Ruim).
Adolescente E: Ela veio ver meu olho na sexta. Acho que aqui é boa (Boa).
Adolescente F: Se eu precisar eles dão assistência (Regular).
Adolescente G: Tia, eu já precisei, quase morro bem aqui, e ninguém fez nada
(Ruim).
Adolescente H: Rum, se eu precisar eles tem que vim, se não eu faço é um
escândalo (Ruim).
O artigo de Areco e colaboradores (2011) envolveu um enfoque
qualitativo dos serviços de saúde mental e drogadição de um município do
estado de São Paulo, que oferece assistência aos adolescentes em situação de
vulnerabilidade social. E os resultados dessa pesquisa também mostraram
ausência da atenção integral de forma articulada, assim como está proposto
no ECA, evidenciando inconstância dos atendimentos, quase ausência de
planejamento das ações, sendo estas fragmentadas, sobreposição de
determinados serviços e ausência de outros, autenticando a desatenção à
saúde de adolescentes vulneráveis também em outras regiões do país.
Da mesma forma, o estudo de Coutinho e colaboradores (2009), que
objetivou identificar as representações sociais da prática socioeducativa de
privação de liberdade através das falas dos adolescentes, concluiu que a
prática de exclusão social emergiu de forma mais significativa nas falas dos
atores sociais retratando uma prática estigmatizante, no qual a ociosidade e
a violência são partes da rotina, e acaba por comprometer o processo de
ressocialização do adolescente privado de liberdade, pontuando mais uma
vez a falta do seguimento de normativas referentes à execução das medidas
socioeducativas e principalmente à saúde dos adolescentes que cumprem
tais medidas.
Destarte equipara-se a realidade local à realidade nacional,
admitindo-se que o entendimento da problemática do adolescente em
conflito com a lei deve ser multifatorial, pois nenhum fator isolado pode
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
137
bastar para a compreensão de casos tão complexos como esses, devendo
envolver diferentes setores de políticas públicas. Assim também como
apenas um profissional da saúde não pode ser responsável pela totalidade
das (in)resoluções dos objetos de discussão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa possibilitou caracterizar o adolescente transgressor da lei
como sendo na sua maioria do sexo masculino, com 17 anos e ensino
fundamental incompleto, além de identificar a sua constituição familiar
matriarcal. A noção dessa realidade exprime as lacunas existentes no
desenvolvimento desses jovens causadas pela carência de apoio familiar,
escolar e governamental. A fim de solidificar a importância dessas três
esferas na construção da identidade do adolescente, faz-se necessário aplicar
políticas públicas para permanência na escola, através do preenchimento
completo do horário letivo com atividades interativas, como a prática de
esportes, grupos de teatro ou dança, ações ecológicas e de cunho social, ou
seja, atividades que estimulem os bons sentidos e desenvolva discernimento
moral no adolescente. Essa informação aponta para a necessidade de um
acompanhamento psicopedagógico ainda na escola, antes da influencia das
transformações da adolescência.
A existência de casos de reincidentes demonstra falhas nas atividades
sociopedagógicas da instituição. Uma alternativa para evitar a reincidência
dos jovens na unidade socioeducativa e até no sistema prisional para adultos
é a articulação, por parte dos gestores, com empresas a fim de absorverem
aprendizes para o seu quadro de funcionários, dando-lhes a oportunidade de
aprender uma profissão e remodelar a sua trajetória de vida. Com o mesmo
propósito, podem ser desenvolvidos ofícios emergenciais, que capacitem os
adolescentes a conseguirem renda com atividades que não exijam
conhecimento científico, mas que possa ser desenvolvida com habilidade e
prática, como ofício de carpinteiro, cozinheiro, encanador, pedreiro, entre
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
138
outras. Outra forma para evitar a reincidência do ato infracional seria
organizar centros de reabilitação para dependentes químicos acessíveis à
comunidade local e que estes tenham articulação com a instituição
socioeducativa, para facilitar a referência, pois muitas vezes os jovens já
estão dependentes de substâncias que alteram seus os impulsos e suas
percepções, levando facilmente a transgressão.
Assim, faz-se necessária uma equipe multiprofissional engajada em
construir uma conexão eficiente entre as redes de atenção à saúde, que
garanta uma assistência completa ao jovem, desde a atenção primária até a
mais especializada, e primordialmente faz-se necessário desalinhar a
persistência da lógica prisional que embasa o tratamento desses jovens para
assim, garantir uma ressocialização digna.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ZAPPE, J. G; RAMOS, N. V. Perfil de adolescentes privados de liberdade em
Santa 122Maria/RS. Psicologia & Sociedade. v. 22, n. 2, p. 365-373, 2010.
BOAS, C. C. V; CUNHA, C. F; CARVALHO, R. Por uma política efetiva de
atenção integral à saúde do adolescente em conflito com a lei privado de
liberdade. Rev Med, v.20, n.2, p.225-233, jun-2010.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.082, de 23 de maio de 2014.
Brasília: Senado Federal, 2014
BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão
Nacional de Ética em Pesquisa. Normas para pesquisa envolvendo seres
humanos: (Res. CSN 466/12) Brasília, DF, 2012.
SOUZA, E. M; ABRÃO, F. P. S; ALMEIDA, J. O. Desigualdade social,
delinquência e depressão: um estudo com adolescentes em conflito com a lei.
Rev. salud pública. v. 13, n. 1, p. 13-26. 2011.
MENICICCI, C. G; CARNEIRO, C. B. L. Entre monstros e vítimas: a
coerção e a socialização no sistema socioeducativo de Minas Gerais. Serv.
Soc. Soc. n. 107, p. 535-556. jul-set. 2011.
Artigo ORIGINAL
LEAL, Danila Barros Bezerra; FIGUEIREDO, Iolanda Gonçalves De Alencar; LUCENA,
Jalles Dantas De; FREITAS, Ana Paula Fragoso De. Percepção de adolescentes em conflito
com a lei sobre as ações de saúde. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco
Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 124-139, out. 2014.
139
MARUSCHI, M. C; ESTEVÃO, R; BAZON, M. R. Risco de persistência na
conduta infracional em adolescentes: estudo exploratório. Estudos de
Psicologia. n. 29, p. 679-687. out-dez. 2012.
MINAYO, M.C.S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em
saúde. 11ª ed. São Paulo: Hucitec, 2008.
MONTEIRO, E. M. L. M, et al. Percepção de adolescentes infratoras
submetidas à ação socioeducativa sobre assistência à saúde. Esc Anna
Nery, v.15, n.2, p.323-330, abr-jun/2011.
DAVOGLIO, T. R; GAUER, G. J. Adolescentes em conflito com a lei:
aspectos sociodemográficos de uma amostra em medida socioeducativa com
privação de liberdade. Contextos Clínicos, v. 4, n. 1, p. 42-52, jan-jun.
2011
CAVALCANTI, P. B; DANTAS, A. C. S; CARVALHO, R. N. Contornos e
sinergias entre a política de Saúde e o adolescente privado de liberdade:
intersetorialidade como desafio. Textos & Contextos. v. 10, n. 2, p. 399 -
410, ago-dez. 2011.
ARECO, N. M, et al. Caracterização dos serviços que atendem adolescentes:
interfaces entre saúde mental e drogadição. Psicologia & Sociedade. v. 23
n. 1, p. 103-113. 2011.
COUTINHO, M. P. L, et al. Prática de privação de liberdade em
adolescentes: um enfoque psicossociológico. Psicologia em Estudo. v. 16,
n. 1, p. 101-109, jan./mar. 2011.
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
140
Prevalência e fatores relacionados com a
automedicação em moradores de bairros
da zona sul de Teresina – PI
Antonio Alexandre Henrique Sousa
Graduando em Farmácia, Faculdade Santo Agostinho, Teresina-PI.
Ana Cibele Pereira Sousa
Bacharel em Nutrição, Universidade Federal do Piauí, Campus
Senador Helvídio Nunes de Barros, Picos-PI.
Ludmila Araújo Rodrigues Lima
Graduanda em nutrição, Universidade Federal do Piauí, Campus
Senador Helvídio Nunes de Barros, Picos-PI.
Ruy Roberto Porto Ascenso Rosa
Farmacêutico, Faculdade Santo Agostinho, Teresina-PI.
Iana Bantim Felício Calou
Farmacêutica, Doutora em Farmacologia UFC, Professora Adjunto I,
Curso de Nutrição, Universidade Federal do Piauí, Campus Senador
Helvídio Nunes de Barros, Picos-PI.
Tonny Kerley de Alencar Rodrigues
Bacharel em Economia (UFPI) e em Administração (FSA), Doutorando
em Administração Coppead/UFRJ, Professor da Faculdade Santo
Agostinho. Teresina-PI.
* Endereço para correspondência, Rua porto, 389, Bairro: São Pedro,
CEP: 64019-500, Teresina-PI. E-mail: [email protected].
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
141
RESUMO
A automedicação é uma das forma de autocuidado à saúde mais
praticadas pela população. Não obstante é necessária a devida orientação
tendo em vista que a falta de informação pode levar a danos à saúde uma
vez que, sendo ferramenta comum de tratamento médico, o fácil acesso aos
fármacos os fazem os principais responsáveis pelo crescente número de
intoxicações registradas no país. Este trabalho teve como objetivo avaliar a
prevalência e fatores relacionados com a automedicação em moradores dos
bairros São Pedro e Irmã Dulce de Teresina-PI. Consiste em um estudo
epidemiológico de base populacional onde foram entrevistados 180
moradores dos bairros citados por meio de um questionário semiestruturado.
O resultado mostrou uma alta prevalência de automedicação, e dentre as
classes de medicamentos mais utilizados estão os analgésicos seguido dos
antitérmicos. As doenças referidas com maior prevalência tratada com esses
medicamentos foram a cefaleia, resfriado/gripe e febre.
Palavras chave: Intoxicação, fármacos, autocuidado.
ABSTRACT
Self-medication is the most practiced form of self-care health by the
population. No proper guidance and lack of information can lead to health
hazards, since being common tool for medical treatment; easy access to
drugs is mainly responsible for the increasing number of poisonings
registered in the country. This study aimed to assess the prevalence and
factors related to self-medication for residents of São Pedro and Irmã Dulce
neighborhoods, Teresina-PI. It consists of an epidemiological population-
based study where 180 residents received a semi-structured questionnaire
to answer and were all interviewed. Results showed high prevalence of self-
medication, and among the most widely used classes of drugs are analgesics
followed by antipyretics. The most prevalent diseases treated with these
drugs, were headache, cold / flu and fever.
Keywords: Intoxication, drugs, self-care.
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
142
INTRODUÇÃO
O medicamento é tido como um símbolo de saúde, de cura e de retardo
da progressão de doenças, porém o uso indiscriminado ou indevido pode
suscitar o agravamento do estado de saúde do paciente, intoxicação, ou até
mesmo a morte (LIMA, NUNES e BARROS 2010).
Segundo Azevedo (2010), a toxicologia atual é entendida como a
ciência que estuda os efeitos adversos das substâncias químicas sobre os
organismos vivos e avalia a probabilidade da sua ocorrência. E dentre os
agentes tóxicos mais frequentemente envolvidos nos casos de intoxicação
tem-se o paracetamol, os salicilatos, os anticolinesterásicos, a
metemoglobina e a carboxihemoglobina, os barbitúricos e os
benzodiazepínicos, antidepressivostricíclicos, alem das drogas de abuso,
etanol e cocaína (VIERA 2012).
De acordo com Schvartsman e Schvartsman, (1999) as consequências
clínicas e/ou bioquímicas da exposição aguda a substâncias químicas
encontradas no ambiente ou isoladas são as intoxicações exógenas agudas,
dentre as substancias isoladas causadora de tal enfermidade destacam-se os
medicamentos.
A automedicação é definida como a utilização de fármacos sem
prescrição médica, onde o próprio paciente decide qual fármaco a ser
utilizado, com o objetivo de tratar ou aliviar sintomas ou mesmo de
promover a saúde (WERTHEIMER e SERRADELL 2008). O problema do
uso indiscriminado de medicamentos na atualidade é a capacidade de
colocar em risco a saúde de boa parte da população, por ser uma prática
potencialmente danosa à saúde se não praticada de forma correta (LOPES
et al. 2014).
No Brasil, cerca de 80 milhões de pessoas praticam a automedicação.
Fatores como a má qualidade de oferta de fármacos, o não cumprimento da
obrigatoriedade da receita médica e a carência de informações e instrução da
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
143
população em geral, justificam a preocupação em implementar as
estratégias do uso racional de fármacos (SILVA et al. 2011).
Consequências sérias podem advir do uso de medicamentos desprovido
de informação médica ou farmacêutica, como o aumento da resistência
bacteriana aos antibióticos e a hemorragia cerebral devido à combinação de
um anticoagulante com um simples analgésico (LIMA e RODRIGUES 2008).
Dentre os fatores associados ao uso indiscriminado de fármacos tem-se,
a propaganda massiva e a facilidade de acesso a medicamentos em
farmácias e supermercados, dando assim a impressão de que são produtos
livres de riscos à saúde. Expondo os consumidores a reações indesejadas
(NASCIMENTO 2003).
Diante da importância do cenário descrito esta pesquisa consiste em
um estudo epidemiológico de base populacional, que tem como objetivo
determinar a prevalência e os fatores associados à prática da automedicação
da população de dois bairros da zona sul de Teresina-PI.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo descritivo (GIL 2002), desenvolvido nos bairros
São Pedro e Irmã Dulce, Teresina-PI, no período de outubro de 2013 a
janeiro de 2014. A pesquisa utilizou um n amostral de 180 pessoas (nível de
confiança de 95% e erro amostral de 5%). Os critérios de inclusão para
participação da pesquisa foram: idade maior que 18 anos; pertencerem a
esses bairros e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para
Participação em Pesquisa. Os aspectos éticos de confiabilidade e privacidade
foram assegurados de acordo com a resolução nº 196/96.
Quanto à abordagem, a pesquisa é quantitativa, aplicada, consistindo
num estudo transversal onde foi realizado um levantamento por meio de um
questionário semiestruturado adaptado de Barros, Griep e Rotenberg (2009)
com uma escala tipo Liker, para coleta dos dados, constituído de perguntas
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
144
estruturadas contendo dados de identificação e referentes à automedicação.
Os dados foram analisados por meio do software SPSS 20.0.
A coleta de dados foi realizada após aprovação pelo comitê de ética da
Faculdade Santo Agostinho - FSA, sob o número de
protocolo:16813613.2.0000.5602.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na figura 1 tem-se exposto o percentual de entrevistados que
relataram já terem usado ou comprado medicamentos sem receita médica.
Figura 1. Percentual de utilização e compra de medicamentos sem receita médica.
Fonte: Pesquisa: Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em moradores de
bairros da zona sul de Teresina – PI.
Os resultados obtidos corroboram os resultados de Fernandes, Palma e
Monteiro (2010), onde 80% da população investigada no estudo afirmara que
se automedicava. Assim como no estudo de Oliveira e Pelógia (2011), em
estudo de automedicação entre profissionais de saúde onde 53,1%, a maior
prevalência encontrada, foi de automedicação.
Estudos epidemiológicos sobre o uso de medicamentos impõem
reconhecer que tal prática não se limita a fatores farmacoterapêuticos. Na
verdade, pode-se constatar que, além da contribuição do modelo biomédico,
exercem grande influência, as estratégias promocionais dos produtores com
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
145
a lógica de mercado subjacente, mais recentemente, engendrando novas
artimanhas para convencer prescritores e consumidores sobre as vantagens
dos fármacos como fonte de bem-estar e de saúde (BARROS 2008).
Na figura 2, tem-se os tipos de medicamentos utilizados pelos
entrevistados, onde o consumo de analgésicos corresponde a classe
medicamentosa mais utilizada da população de estudo, corroborando assim
com estudos de Galato, Madalena e Pereira (2012) onde a maioria da
população estudada, 52,3% dos universitários, fazia uso de analgésico para
alívio de dores. Os analgésicos foram a maior classe consumida em outros
estudos como o de Freitas, Martins (2008) e Arrais et al. (1997). Apontando
que situação semelhante já era observada há cerca de onze anos, e, assim
como no estudo de Lalama (1999), as categorias de medicamentos mais
utilizadas na automedicação eram analgésicos, antibióticos e anti-
inflamatórios, dos quais 49% eram sugeridos pela propaganda. No entanto
ressalta-se que nesta pesquisa os antibióticos não tiveram tanta
expressividade em virtude de um maior rigor na apresentação da receita no
ato de sua venda ao longo dos anos, e os anti-inflamatórios apresentaram
um valor considerável. Entretanto em pesquisa realizada em Goiânia
apontou um perfil diferente da população idosa onde uso de analgésico
atingiu somente 9,1% de consumo, e o uso de medicamentos para doenças
cardiovasculares foi predominante neste estudo (Santos et al. 2013).
Salienta-se que dos tipos de medicamentos relatados, os vermífugos
apresentaram menor valor percentual.
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
146
Figura 2. Classe de medicamentos utilizados.
Fonte: Pesquisa: Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em moradores de
bairros da zona sul de Teresina – PI.
A figura 3 retrata as doenças apontadas pelos entrevistados como causa da
automedicação.
Figura 3. Motivos/doenças relacionados com a automedicação
Fonte: Pesquisa: Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em moradores de
bairros da zona sul de Teresina – PI.
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
147
Segundo Freitas e Martins (2008), as principais afecções relatadas
pelos usuários de medicamentos por automedicação em seu estudo foram:
cefaleia (32%), dores osteomusculares (31%), e infecção respiratória (25%),
corroborando desta forma com os resultados aqui obtidos.
Lessa e Bochner (2008) ressaltam que o amplo uso de medicamentos sem
orientação médica, quase sempre acompanhado do desconhecimento dos
malefícios que podem causar, é apontado como uma das causas destes
constituírem o principal agente tóxico responsável pelas intoxicações
humanas registradas no país. Para que esse quadro seja mudado, é
necessário o cumprimento da regulamentação sobre o uso de medicamentos,
obedecendo às limitações em relação à dispensação farmacêutica destes
produtos (BORTOLON et al. 2008).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observou-se um alto percentual de automedicação, o que já era
esperado tendo em vista se tratar de um legítimo processo de autocuidado. A
classe de analgésicos, antitérmicos e anti-inflamatórios, pertencentes ao
anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs), foram os mais citados por
conseguirem um manejo rápido dos sintomas mais comuns apresentados por
qualquer população, a exemplo da cefaleia. A despeito de ser uma prática
permitida, a mesma deve ser devidamente orientada, tendo o profissional
farmacêutico papel imprescindível no fornecimento de informações
necessárias ao cliente da farmácia. A compra de medicamentos dissociada de
uma boa dispensação é fator de risco para intoxicações por medicamentos,
que a despeito de ser um problema antigo, tem alta prevalência no nosso
país.
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
148
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZEVEDO, F.A. A Toxicologia e o Futuro. RevInter, v.3, n.3, 2010.
BARROS, A.R.R.; GRIEP, R.H.; ROTENBERG, L. Self-medication
among nursing workers from public hospitals Automedicación
entre los trabajadores de enfermería de hospitales públicos
públicos. Enfermagem [online], v.17, n.6, p. 1015-1022, 2009.
BARROS, J.A.C. Nuevas tendencias de la medicalización. Cien Saude
Colet, v.13 (Supl.), p.579-587, 2008.
BORTOLON, P.C. et al. Análise do perfil de automedicação em mulheres
idosas brasileiras. Ciência & Saúde Coletiva, v. 13, n. 4, p. 1219-1226,
2008.
FERNANDES, A.; PALMA, L.; MONTEIRO, F.F.C. Medicamentos não
sujeitos a receita médica - razões mais frequentes de seu uso. Rev.
Lusófona de Ciências e Tecnologias da Saúde, v.1, n.7, p.47-55, 2010.
FREITAS, E.O.; MARTINS, I. Concepções de saúde no livro didático
de ciências. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências, 2008.
GALATO, D.; MADALENA, J.; PEREIRA, G.B. Automedicação em
estudantes universitários: a influência da área de formação. Ciência &
Saúde Coletiva, v.17, n.12, p.3323-3330, 2012.
GIL, A.C. Como elaborar projeto de pesquisa. São Paulo: Atlas; 2002.
LALAMA, M. Perfil de consumo de medicamento en laciudad de Quito.
Educ. méd. contin , n.64, 7-9, 1999.
LESSA, M. de A.; BOCHNER, R. Análise das internações hospitalares de
crianças menores de um ano relacionadas a intoxicação e efeitos adversos de
medicamentos no Brasil. Revista Bras. Epidemiol, v.11, n.4, p.660–674,
2008.
LIMA, A.A.A; RODRIGUES, R.V. Automedicação - O uso
indiscriminado de medicamentos pela população de porto velho.
[Online] Disponível em:
Artigo ORIGINAL
SOUSA, Antonio Alexandre Henrique; SOUSA, Ana Cibele Pereira; LIMA, Ludmila Araújo
Rodrigues; ROSA, Ruy Roberto Porto Ascenso; CALOU, Iana Bantim Felício; RODRIGUES,
Tonny Kerley de Alencar. Prevalência e fatores relacionados com a automedicação em
moradores de bairros da zona sul de Teresina – PI. RevInter Revista Intertox de
Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 7, n. 3, p. 140-149, out. 2014.
149
http://www.unir.br/html/pesquisa/Pibic_XIV/pibic2006 [Acesso em:
15.jan.2014]
LIMA, G.B.; NUNES, L.C.C.; BARROS, J.A.C. Uso de medicamentos
armazenados em domicílio em uma população atendida pelo programa saúde
da família. Ciênc. saúde coletiva, v.15, n.3, p. 3517-3522, 2010.
LOPES, W.F.L.; COELHO, M.R.O.M.; OLIVEIRA, J.P.; ARAUJO, Y.M.O.;
MELO, M.C.N.; TAPETY, F.I. A prática da automedicação entre estudantes
de uma instituição de ensino superior de Teresina-Pi. R. Interd. v. 7, n. 1,
p. 17-24, 2014.
NASCIMENTO MC. Medicamentos: ameaça ou apoio à saúde? Rio de
Janeiro: Vieira e Lent, 2003.
OLIVEIRA, A.L.M.; PELÓGIA, N.C.C. Cefaleia como principal causa de
automedicação entre os profissionais da saúde não prescritores. Rev Dor.
v.12, n.2, p.99-103, 2011.
SANTOS, T.R.A.; LIMA, D.M.; NAKATANI, A.Y.K.; PEREIRA, L.V.; LEAL,
G.S.;
AMARAL, R.G. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev.
Saúde Pública, v.47, n.1, 2013.
SCHVARTSMAN, C.; SCHVARTSMAN, S. Intoxicações exógenas agudas.
Jornal de Pediatria, v.75, n.2, p.244-250, 1999.
SILVA, I.M.; CATRIB, A.M.F.; MATOS, V.C. e col. Automedicação na
adolescência: um desafio para a educação em saúde. Ciênc Saúde
Coletiva, v.16(Suppl 1), p1651-60, 2011
VIEIRA, A.A. Laboratório de Análises Toxicológicas de Emergência em
Hospitais. RevInter, v. 5, n. 3, p. 60-75, 2012.
WERTHEIMER, A.I.; SERRADELL, J. A discussion paper on self-care and
its implications for pharmacists. Pharm Wordl Sci. v.30, n.4, p.309-315,
2008.