reengenharia - em busca de uma teoria - scielo.br · ceitos que estão por trás da reengenharia....

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REENGENHARIA - EM BUSCA DE UMA TEORIA ARTIGOS "Fábio de Souza Abreu A crescente importância do tema Reengenharia torna premente uma análise mais detalhada de suas origens. Uma teoria que define os conceitos básicos envolvidos e seus pré-requisitos para implementação é apresentada. The increasing importance of Reengineering needs a theory about its origins. A theory that gives the basic concepts and prerequisites to implementation are explained. PALAVRAS-CHAVE: Base tecnol6gica, alinhamento estretéçico, estrstéçt« para tecnologia da informação, Reengenharia de Neg6cios, Reengenharia de Processos. KEYWORDS: Technological base, strategic alignment, Information tecn- nology Strategy, process reen- gineering, business reengi- neering. "Mestrando em Administração de Empresas na EAESP/FGV. Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 34, n.5, p, 49-61 SetJOut. 1994 49

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REENGENHARIA - EM BUSCA DEUMA TEORIA

ARTIGOS "Fábio de Souza Abreu

A crescente importância do tema Reengenharia torna premente uma análise maisdetalhada de suas origens. Uma teoria que define os conceitos básicos envolvidos eseus pré-requisitos para implementação é apresentada.

The increasing importance of Reengineering needs a theory about its origins. A theory thatgives the basic concepts and prerequisites to implementation are explained.

PALAVRAS-CHAVE:Base tecnol6gica, alinhamentoestretéçico, estrstéçt« paratecnologia da informação,Reengenharia de Neg6cios,Reengenharia de Processos.

KEYWORDS:Technological base, strategicalignment, Information tecn-nology Strategy, process reen-gineering, business reengi-neering.

"Mestrando em Administração deEmpresas na EAESP/FGV.

Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 34, n.5, p, 49-61 SetJOut. 1994 49

l1~cgARTIGOS

1. HAMMER, Michael. Reengi-neering work: don't auto mate,obliterate. Harvard BusinessReview, p. 110-2, Jul./Aug.1990. Sua definição é "Reenge-nharia é o radicalredesign dosprocessos de um neg6cio paraatingir ganhos dramáticos deperformance."

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Este artigo visa a trazer aos leitores umaperspectiva de três pontos críticos parauma melhor compreensão da Reengenha-ria. No primeiro ponto buscamos uma jus-tificativa e a sua origem e, paralelamente,procuramos chamar a atenção para o pa-pel fundamental que a tecnologia tem so-bre as organizações, principalmente nosanos 90. O segundo ponto é apresentaraos leitores a ampla dimensão estratégicaque a Reengenharia pode e deve ter quan-do adotada por uma organização, ao mes-mo tempo que mostramos os riscos para aorganização de um processo de Reenge-nharia, reduzido em sua extensão, masambicioso em termos de resultados. Porúltimo e secundariamente, demonstramoscomo a Reengenharia se relaciona com astécnicas de melhoramento contínuo comoTQM - Total Quality Management.

A Reengenharit pode.ser'" k'

entendida ,como !Igo cícli~o,,"que se repete de .te,,!pos em

tempos na históriado hom~m.

REENGENHARIA - POR QUE AGORA?

A Reengenharia não é apenas uma novametodologia para redesign de processo,como pode ser tomada a princípio. Quan-do Hammer! verbalizou o conceito daReengenharia no artigo "Reengenharia:não automatize, destrua", esclareceu tam-bém algumas das mudanças aparentemen-te caóticas que estão ocorrendo. SegundoHammer, a justificativa para a Reengenha-ria é que a tecnologia da informaçãoatualmente disponível requer uma estru-tura, ou organização, própria para podergerar seus frutos com pleno potencial, eque, certamente, não é uma estrutura or-ganizacional criada antes do advento des-sa nova tecnologia. Harnmer, porém, ape-sar de justificar Reengenharia no contextohistórico, não o faz de forma mais ampla.

Dentro de uma perspectiva mais abran-gente, podemos definir a Reengenhariacomo a busca de uma nova forma de rea-lizar um processo a partir de uma novarealidade tecnológica, para obter a perfor-mance "máxima" pelo uso dessa nova tec-nologia. Dessa forma, a Reengenhariapode ser entendida como algo cíclico, quese repete de tempos em tempos na histó-ria do homem.

A Revolução Industrial, e com ela a eco-nomia industrial, teve seu início na segun-da metade do século XVIII com a inven-ção do tear hidráulico e da máquina de fiar.Porém, o processo de transformação quecriou a estrutura, ou organização, adequa-da à nova base tecnológica surgiu somen-te no início do século XX, 150 anos aden-tro da nova economia. Os principais mar-cos dessa transformação foram: os princí-pios de Taylor na forma de realizar as ta-refas; a base da administração dada porFayol; a linha de montagem criada porHenry Ford (1907) e o conceito de divisio-nalização da empresa criado por A1fred P.Sloan na GM (1920). E, de fato, os maio-res ganhos da economia industrial surgi-ram a partir dessa nova estrutura organi-zacional que foi amplamente reprodu-zida por toda a atividade humana nesteséculo.

Partindo dessa constatação, propomosum modelo teórico para tentarmos defi-nir o momento em que a transformaçãodas organizações se inicia por força da tec-nologia. Por analogia, podemos imaginaresse processo como uma represa que so-mente abre suas comportas quando a águaatinge um dado nível. Da mesma forma,a alteração profunda da estrutura das or-ganizações somente se inicia quando o de-senvolvimento alcançado num grupo denovas tecnologias atinge determinado ní-vel de amadurecimento. Consideraremosesse nível como sendo o momento em queessas novas tecnologias começam a ser uti-lizadas de forma integrada, formando abase tecnológica de uma nova economia,e que os produtos oriundos dessa integra-ção são colocados à disposição da socie-dade de maneira relativamente democrá-tica (baixo custo e fácil acesso).

O processo de desenvolvimento de umanova economia agora pode ser delineado

© 1994, Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.

REENGENHARIA - EM BUSCA DE UMA TEORIA

de forma teórica (ver figura 1). Dentro damaturidade da velha economia começama surgir tecnologias que diferem radical-mente das existentes até então, portanto,de baixa utilidade. Essa fase inicial é se-guida por um período de aperfeiçoamen-to, primeiro integrando as novas tecnolo-gias com as antigas e, num segundo mo-mento, viabilizando o uso conjunto des-sas novas tecnologias, formando uma novabase tecnológica. Quando essa nova basetecnológica toma-se disponível à socieda-de de forma relativamente democrática, aestrutura organizacional transforma-se,trazendo ganhos de produtividade inima-gináveis até então. Esses ganhos-de pro-dutividade geram acumulação de recur-sos que viabilizam o surgimento de novastecnologias, reiniciando-se o ciclo.

Essa apresentação seqüencial é teórica,pois na realidade essas fases se sobrepõem.Esse conceito fica bem mais claro quandoobservamos o que está acontecendo coma economia atual.

A ECONOMIA DA INFORMAÇÃO

A economia da informação, que substi-tuiu a economia industrial, tem como basea eletrônica e consolidou-se nos anos 50em função de três fatores: a massificaçãodos meios de comunicação simples, comoa TV e o telefone; a utilização efetiva docomputador e o início do processo de mi-niaturização com a invenção do transistor(ver quadro 1).

Agora, nos anos 80 e 90, a economia dainformação está sendo consolidada pelouso conjunto de sua tecnologia, ao mes-mo tempo que a sua democratização éobtida principalmente pela redução decustos advindos da miniaturização. Por-tanto, segundo nossa teoria do ciclo da tec-nologia e transformação da organização,está se delineando o momento onde umanova organização deve aparecer. Podemosdizer que não é por coincidência que ob-servamos, dentro da teoria das organiza-ções, quebras de paradigmas e uma ava-lanche de novas teorias.

Sea transformação das organizações, ouciclo de Reengenharia (conforme a defini-ção proposta), ocorrida no início do sécu-lo aconteceu quase de forma natural, o ci-

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REENGENHARIA

NOVAORGANIZAÇÃO

Eletrônica:Telecçmunicações

· televisão· rádio· telefone· satélites· fibra ótica

Informática· software· hardwar.e· processamento· banco de dados

Miniaturização

Redes de comunicação globaisfeitas on-line

numa base multimídia,com acesso a enormes

bancos de dados,relacionais.

?•

do atual está sendo bem mais complexo eaparente por duas razões:

• a economia da informação está se de-senvolvendo com uma rapidez muitomaior que a anterior, em função da maiorfacilidade para acessar a informação.(oriunda da própria tecnologia) e do ní-vel educacional da população, quandocomparado com a situação existente noinício do século;

• o uso conjunto da nova tecnologia afetadiretamente a forma como as organiza-ções trabalham, porque estas se estrutu-ram em função dos fluxos de informa-ção (o que é mais verdadeiro para gran-des corporações').

2. HOPPER, Max D. RattlingSABRE - new ways to compe-te on information. Harvard Bu-siness Review, v. 68, n. 3, p.118-25, May/Jun. 1990.

A Reengenharia, dentro dessa visãoampliada, representa o ponto de ruptura

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ARTIGOS

3. HALL, Gene, ROSENTHAL,Jim, WADE, Judy. How to makeReengineering real/y work.Harvard Business Review, v.71, n. 6, p. 119-31, Nov./Dec.1993. Resultados globais sãogastos totais e lucratividade.

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Quando orientamos aReengenharia para a dimensãodo negócio, não perdemos um

benefício sequer dos obtidos noenfoque tradicional ou

Reengenharia de Processos,e ainda abrimos imensaspossibilidades para a

transformação da organização.

da estrutura organizacional antiga e o sur-gimento de uma nova estrutura. Na ver-dade, não importa se o nome que damos aesse processo é Reengenharia ou não. Oimportante é percebermos a real dimen-são do impacto da tecnologia nas organi-zações. Nesse ponto, Hammer foi o pri-meiro a colocar, de forma explícita. essapercepção na teoria organizacional, dei-xando clara a impossibilidade de as em-presas escaparem desse processo.

Agora podemos entender mais facil-mente porque a Rccngcnharia tem comopremissas:

uso intensivo da tecnologia da informa-ção: afinal, estamos procurando a orga-nização adequada para a economia dainformação;ganhos de produtividade dramáticos: anova forma de organizar um processodeve trazer resultados impressionantesquando comparados com a forma ante-rior utilizada na estrutura organizacio-nal da economia industrial;foco no processo: uma vez que a organi-zação existente está com Udestino mar-cado", devemos focar nossa atenção nonegócio que a originou, representado naorganização pelo conjunto de processospor ela administrados;não melhore, inove: qualquer melhoriado processo existente é desnecessária.Melhor será redesenhar de forma radi-cal e fundamental o processo e, então,aplicar técnicas de melhoria e qualidade.

Da mesma forma que devemos creditara Hammer o reconhecimento pelo resgateda importância da tecnologia na redefini-ção das estruturas das organizações, te-mos que admitir que ele não nos forneceuum sistema do que chamou de Reengenha-ria. Essa falha colocou em risco todo oconceito e o trabalho de outros pesquisa-dores sobre o tema, trazendo quase umdescrédito, que, a posteriori, foi revertidograças à força de experiências cujos resul-tados mostraram a consistência dos con-ceitos que estão por trás da Reengenharia.

Podemos agora discutir sobre as meto-dologias e o escopo da Reengenharia queatualmente estão sendo apresentadas paraas empresas. Não entraremos nos deta-lhes do processo de implantação, masapresentaremos os principais erros daabordagem inicial da Reengenharia(Reengenharia de Processos), comparan-do com uma abordagem mais atual, conhe-cida como Rccngcnharia de Negócios (daqual mostraremos somente as principaisfases para a sua implantação).

Atualmente, é possível delímitar duasclassificações para projetos de Reengenha-ria: uma abordagem mais restrita em ex-tensão, chamada Reengenharia de Proces-sos, e uma outra que se propõe a guiar aempresa por um processo completo detransformação, chamada Rccngenharia deNegócios.

Resultados de pesquisas" mostram queempresas que obtiveram resultados glo-bais relevantes com processos de Reenge-nharia adotaram uma postura de totalcomprometimento com o projeto, deram amais ampla abrangência possível, buscaramuma clara orientação para o cliente e o mer-cado, no momento de estabelecer a visãoque iria orientar o processo, e considerarama tecnologia da informação como parte fun-damental do planejamento estratégico.

A empresa que decide embarcar numprojeto de Reengenharia deve fazer umasérie de opções, conscientes ou não, quedefinem as possibilidades do processo eseu objetivo - ficar restrita a ganhos de

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produtividade, qualidade e redução decustos ou buscar um enfoque que permitaa transformação da organização e até doseu negócio. Essas opções ocorrem quan-do a organização:

• define os objetivos da Reengenharia emtermos de custos e produtividade, istoé, de otimização, em vez de objetivosmais amplos como melhoria do relacio-namento com o cliente (em todos os sen-tidos);

• estabelece uma série de projetos inde-pendentes de Reengenharia de Proces-sos sem que se apóiem num nítido obje-tivo, em vez de estabelecer uma visãoamplamente divulgada pela organiza-ção que direcione e crie sinergia entre osprojetos;

• objetiva resultados de curto prazo (uma dois anos), em vez de definir uma pers-pectiva para cinco anos ou mais;

• possui executivos que não assumem deforma decidida a coordenação de proje-tos de Reengenharia, limitando-se a umaparticipação simbólica. A organizaçãodesigna alguém para ser o gerente de Re-engenharia (como temos hoje o gerentede qualidade total em diversas empre-sas), em vez de empenhar-se na conquis-ta do entusiasmo e comprometimento detodos (membros da organização, acionis-tas, clientes, fornecedores etc.);

• faz alterações na infra-estrutura, (siste-mas de informação, recursos humanose estrutura organizacional) de forma de-sorganizada e conseqüentemente sujei-tas a uma série de problemas, em vez dealterá-la de forma integrada e orientan-do os investimentos para uma homoge-neidade organizacional de longo prazo(treinamento, equipamento, novas estru-turas etc.);

• define a razão motivadora para a Reen-genharia em termos e objetivos de cará-ter financeiro, em vez de buscar benefí-cios múltiplos;

• decide que o foco da Reengenharia serárestrito nos processos e em escala limi-tada, e não com toda a organização':

• define o papel da área de sistemas deinformação como um órgão de suporteou assessoria e não como peça centraldo processo.

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novos negóciosou redefinição

É importante percebermos que, quan-do orientamos a Reengenharia para a di-mensão do negócio, não perdemos umbenefício sequer dos obtidos no enfoquetradicional ou Reengenharia de Processos,e ainda abrimos imensas possibilidadespara a transformação da organização. Po-deríamos comparar esquematicamente aReengenharia de Processos e aReengenha-ria de Negócios (ver figura 2).

A Reengenharia de Negócios reduz apossibilidade de vários riscos existentes naReengenharia de Processos. Orientaçõesde curto prazo e para resultados financei-ros geram, na maioria dos casos, um con-junto de projetos de Reengenharia comple-tamente descoordenados. Embora cadaprojeto possa trazer resultados dramáticos,a característica descoordenada e fragmen-tada reduz significativamente a possibili-dade de resultados mais amplos e, piorainda, reduz os resultados sinérgicos querealmente podem ser dramáticos, como atransformação do negócio.

A abordagem descoordenada fragmen-ta esforços e traz uma série de problemas:

• a existência de diferentes formatos debancos de dados, diferentes hardwares esoftwares, criando incompatibilidade e re-dundância;

• demissões desnecessárias e necessidadede gastos maiores com treinamento deRH,para atender requisitos diferentes decada processo, reduzindo a flexibilida-de dos membros da organização;

4. Estamos nos referindo aofoco da Reengenharia e não àforma de implementação. quenesse caso é sem pre feita atra-vés do re de sign dos processos.

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I1~11ARTIGOS

• perda de controle por falta de padroni-zação nas avaliações dos processos etc.

5. HALL. Gene et aI. Op. cit.

Resumindo, simplesmente não se podegarantir que a organização como um todoestará melhor após a Reengenharia de Pro-cessos somente porque alguns processossubmetidos à Reengenharia apresentaramresultados dramáticos.

De fato, pela teoria sistêrnica, podemosafirmar que a organização, como um todo,dificilmente obterá resultados na maioriados projetos de Reengenharia de Proces-sos porque a otimização de uma parte deum sistema não significa que todo o siste-ma será otimizado. Pesquisa realizada em100 empresas", e mais detalhadamente em20, mostra que aquelas que fizeram seusprocessos de Reengenharia de forma maisampla possível obtiveram reduções doscustos totais da ordem de 17%, enquantoque as empresas que adotaram uma pers-pectiva mais estreita tiveram reduções in-significantes (menores que 1%). O quedeve ficar claro é que a Reengenharia,como tem sido apresentada, orientada so-mente para o processo, não garante ummelhor desempenho da organização, masdo processo, e, às vezes, à custa do restoda organização.

Porém, a grande vantagem da Reenge-nharia de Negócios não está apenas emevitar os problemas existentes em uma

perspectiva micro, ou de processo. A Reen-genharia de Negócios fornece uma basemais sólida para a organização enfrentaras resistências e as barreiras de transiçãoque existem no processo, principalmentepor requerer, entre outras coisas, uma só-lida base estratégica e comprometimentopor parte da alta direção. Na realidade,um projeto estruturado de Reengenhariade Negócios funciona como um verdadei-ro break-through drioer para a organizaçãodurante o processo de transformação.

Reinterpretando a Reengenharia: umavisão estratégica de transformação donegócio

Uma vez aceita a necessidade premen-te de uma nova estrutura organizacionalde forma a "colocar" a empresa na econo-mia da informação, esta deve ser a metade qualquer processo de Reengenharia.Ter clara a real dimensão da Reengenha-ria é o primeiro passo para poder usufruirtodas as possibilidades que ela oferece.Algumas empresas que passaram por pro-cessos de Reengenharia apresentam resul-tados impressionantes, muito além da es-fera operacional, como novas possibilida-des estratégicas e novos negócios, frutosda Reengenharia e do uso intensivo da tec-nologia da informação. Processos de Reen-genharia sem uma perspectiva estratégi-ca e desatentos às modificações que possam

REENGENHARIA E OUTRAS METODOLOGIAS ORGANJZAGIONAISDE MUDANÇAS

A Reengenharia não possui uma metodologia consolidada, e ainda está longe disso, apesar de observarmos um rápidodelineamento dessa nova metodologia a partir da experiência pioneira de um grande número de empresas amerioanas eumas poucas brasileiras.

A Reengenharia, como tudo que é novo, pode assumir vários nomes. Ou se preferirem, várias outras técnicas. quandoaplicadas. alcançam resultados similares- aos da Reengenharia, como OVA - Overhead Value Anal:}!sis, AVA - ActivityValue Anaiysis, CPR - Core Process. Redesign etc ', Embora todas essas técnicas possam chegar a resultados similaresaos obtidos com a Reengenharia, seu foco é menor e menos ambicioso. O que é importante frisar é que li Reengenhariautiliza todas as ferramentas disponíveisem outras técnicas para atingir seus objetivos. Isso é especialmente claro emrelação ao ferramental dos sistemas de melhoramento contínuo como CEP - Controle Estatistico de Processo, TQC -Total Quality Controlo TQM - Total Quality Managemeru etc.

Técnicas de melhoramento contínuu.como TQM (Total Quality Management), diferentemente do que éamplamen-

1. RIGBY, Darrel. Tne secret htstory of process ReengiQeeri~g. Planning Review, v. 21, n. 2. p. 25·7, Mar.IApr. 1993.

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vir a ocorrer na estrutura organizacionalpodem ser extremamente prejudiciais.

Dentre os diversos modelos e teoriassurgidas recentemente sobre Reengenha-ria, o modelo de três fases proposto porWilliam H. Davidson'' é o que, em nossaopinião, melhor consegue englobar todoseu potencial. Nesse modelo, o processode Reengenharia é composto por três fa-ses, caracterizadas por sucessivas mudan-ças do foco da organização e dos objetivosperseguidos relativos à performance. Em-bora Davidson considere fundamental quea perspectiva estratégica perrneie todo oprocesso de Reengenharia, não julga ne-cessário uma fase inicial na qual a empre-sa deve concentrar esforços. Porém, acres-centaremos ao modelo essa fase inicial,objetivando o alinhamento estratégico daorganização (ver figura 3).

Na primeira fase, estratégia, é realiza-do todo o processo de formulação do pla-ncjamento estratégico e alinhamento daorganização (devendo ser expresso atra-vés de uma visão motivadora) para imple-mentação do processo completo de Reen-genharia. Nessa fase, são avaliadas a es-tratégia para o negócio e a tecnologia paraa adequação das operações e das estrutu-ras existentes. Na fase Il, ativação, umavez definidos na fase Tos processos-chavepela nova orientação, o foco organizacio-nal passa a ser interno, e a atenção volta-

REENGENHARIA - EM BUSCA DE UMA TEORIA

REENGENHARIA DO NEGóCIO - AS QUATRO FASES DE TRANSFORMAÇÃO

i\~1

FONTE Baseado no modelo de três fases de DAVIDSüN, W. H. Bevonc Reengineering: the three phases of business trenstormatíon,IBM Systcm Joume; v. 32, n.1, p. 65-79,1993

se para os ganhos de performance relacio-nados com a Reengenharia de Processos(redesenho e a automação de processosexistentes), objetivando o aumento da pro-dutividade e da qualidade e a redução doscustos. Na fase III, melhoria ou amplia-ção do negócio, partindo das habilidadese da infra-estrutura desenvolvidas nas faseI e lI, o foco é transferido para a agregaçãode valor aos processos e serviços ofereci-dos ao cliente, como nos recebidos juntoaos fornecedores. A fase IV, redefinição,envolve a formação de novas unidades de

6. DAVIDSON, W. H. BeyondRe-engineering: lhe three pha-ses ot business transtormatíon.IBM System Journal, v. 32, n.1, p. 65-79, 1993.

te afirmado por alguns especialistasê, dificilmente se casam com processo de Rccngenharia. A principal razão está nasdiferentes premissas e procedimentos (ver quadro 2). Os defensores mais radicais da Reengenharia, como Hammer",afirmam que as técnicas de melhoramento contínuo devem ser aplicadas em um processo somente após se ter feita aReengenharia do mesmo, Porém estudos de empresas brasileiras que estão envolvidas em processos de Recngcnhariade Negócios mostram que a divulgação dos conceitos de qualidade e incentivo a programas de qualidade ajudam oprocesso. Essa utilização da técnicas de qualidade com a Reengenharia deve ser restrita, pois um fator preocupantereferente à inversão da ordem, ou utilização concomitante de ambos processos, permanece: o comprometimento com osfuncionários. Técnicas de melhoria contínua pressupõem uma forte confiança e a existência de um compromisso delongo prazo entre as partes, que de forma alguma pode ser garantido no processo de Reengenharia", Portanto, é de seesperar que empresas que desenvolveram e obtiveram excelentes resultados através de técnicas da melhoria contínua,enfrentem maiores resistências internas, se adotarem a Reengcnharia.

2. Ver DAVENPORT, Thomas H. Need radical innovation and continuous improvement?lntegrate process Reengineering and TQM. Planning Aeview, V. 22. n. 3,p. 6-t2, May/Jun. t993: FUREY,Thimothy, R. A six step guide to pracess Reengineering. Planning Aeview, v. 21, n. 2, p. 203, Mar.lApr. t993.

3. HAMMER, Michael. The Reengineer. Planning Aeview, v. 22, n. 3. p. 18-21, May/Jun. 1993. (Entrevista concedida a Robert M. Randall.)

4. Não queremos dizer que a Reengenharia é parceira de demissões em massas, como muitas a1irmam. Na verdade, demissões em massa são advindas de processosde Reengenharia sem orientação estratégica bem definida.

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ARTIGOS

56

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II1:"i i~"I

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11

Embora aJ.gunscasos possam afirmar que aplicaram com' sucesso processos deReengenharia I, II1

e TOM concomitantemente, quando analisamos seus exemplos normalmente um (mais 'I!provavelmente ambos) dos seguintes fatos estava presente: ou o processo de Reengenharia ! iera feito dentro de um foco muitoestreito,ouacultura orgél.nizacionalnecessária para obter IIItodo o potencial das técnicas de melhora~~,~~~,~~~~f,n~~,~~:o.:~tava Plen~:~nt~_d~s~~~~~Vi~:~_~1

Infra-estruturaREENGENHARIA

o Normalmente requer um novodesigno

o Vai contra alguns símbolos evalores da cultura existente.

o Implica criar umcomprometimento com amudança, porém as possibilidadespara uma nova cultura devem sermantidas abertas.

Difusão / Orientação o Top-town.

Forma de melhoramento o Horizontal (processo) elimina asfronteiras entre funções e entre aempresa e os clientes efornecedores.

Compromisso edeterminação dos

executivos seniores

o Total e efetivo (pelo menos 50 %do tempo).

Impacto organizacional o Muito alto.

Tecnologia o Normalmente requer novastecnologias (principalmente TItecnologia da informação),

Necessidade de recursos o Elevada, tanto em capital(tecnologia), como emtreinamento.

Coordenação o Muito alta.o Totalmente integrada.

Implementação o Elevada dificuldade, requer açõesintensas e abrangentes.

o Coordenação estratégica é crítica ..-~. _ .. _.~._'._._---_. ~.•~-" .._--_. ~_ ..-'-~-------"",,,,,,,,--_.~--,~

Resultados o Produz resultados radicais, podelevar ao surgimento de novosnegócios,

MELHORAMENTO CONTfNUOo Raramente é necessário alterar a

presente-torrna.o Implica criar uma nova cultura

organizacional baseada nocomprometimento mútuo entre aspartes.

o Bottom-up.

o Horizontal (processos), porémrespeita as barreiras verticais entrefunções, e por isso, é voltadapara tarefas.

Oi Relativo ou simbólico (por ser umprocesso controlado e restrito, ocompromisso dos altos executivopode ser baixo).

••Baixo (não alterasignificativamente a estrutura).

d: i

o Sendo o método utilizado omelhoramento continuo, nãorequer necessariamente novastecnologias.

.iBaixa, a maior parte destinado atreinamento.

o Baixa.o Fragmentada.

o Baixa dificuldade, é um processocontrolado e fragmentado.

• Zero defeitos e a perfeição do statusquo (incrementaI).

1. HALL. Gen" et ai. How to rnake Reengineering real/yw:órk. Harvarcj Business Review, V. 71, n, 6. p.119-31. NovJOec. 1993. Nesteartigo os autores mostram claramente a necessidade de um .ccmpromlsso total do maior executivo da empresa (CEO) com Oprocesso de Reengenharia. chegando explicitamente a estabelecer Opercentual de, 00 mínimo. 50% (p. 126).

'"

RAE o v. 34 o n. 5 o Set./Out. 1994

REENGENHARIA - EM BUSCA DE UMA TEORIA

negócios, pois o aperfeiçoamento dos pro-cessos e serviços ocorridos na fase IH le-vam a organização a se defrontar com apossibilidade de criar novas unidades denegócios independentes. As capacidadesdesenvolvidas através das fases anterio-res são "orientadas" estrategicamente nosentido de tornarem-se novas competên-cias centrais ou core compeiences', poden-do redefinir a atividade original da orga-nização. Portanto, a fase IV implica umarevisão estratégica do plano original apre-sentado na fase I.

Fase INessa fase a organização já deve rom-

per com as tradicionais formas de agir eadequar-se para a mudança. O foco orga-nizacional deve se centrar na busca deuma nova direção estratégica e na avalia-ção do negócio. Nesse ponto, é crítico oreconhecimento da tecnologia da informa-ção - TI - como força determinante detodas as atividades da organização. É fun-damental que a organização abandone apercepção tradicional da tecnologia da in-formação. Hoje, a TI per meia e determinatodas'as atividades humanas e não podemais estar restrita a um departamento, aum plano diretor de informática ou a qual-quer coisa parecida. A organização devereconhecer a transcendência da TI, deixan-do de vê-la apenas como um suporte paraestratégias de negócios e aceitando o fatode a TI ser também uma força modelado-ra das estratégias dos negócios existentese determinante de novos negócios.

O planejamento da utilização da TI devepassar pela análise detalhada dos aspec-tos-chave de sua formulação estratégica:prever usos combinados da TI com a tec-nologia da atividade da organização; teruma perspectiva envolvendo não apenasa empresa, mas os seus relacionamentoscom o ambiente; realizar previsões delongo prazo para as principais tecnologi-as que afetam o desempenho e desenvol-ver uma "visão tecnológica" para ti orga-nização.

Como modelo de planejamento paraunir a estratégia do negócio com a estra-tégia da TI, tanto na formulação como naimplementação, sugerimos o modelo de

RAE • v. 34 • n. 5 • Set./Out. 1994

FigurO4

DINÂMICA DO ALINHAMENTO ESTRATÉGICO

FONTE: HI!NOERSON.J. C., \lENKATAAMAN. N, SlralE!ojl1c: álignml!l1l: h:lVeHlgl~ iedmclogy lor!l'a~jor~ng orgalllzarlons iBM SyMem..lDurt)8J. v,32.,tl.1, p. 4-"6,1-993

FigUraJj5,!---------------------,

DINÂMICA DO ALINHAMENTO ESTRATÉGICO - FORMA TRADICIONALETAPA 1 ETAPA 2

I Estcatégiq paraI o negócio

Obs.: embora essa divisão em etapas não:seja prática, seu efeito par"? compresnsão teórica é importante.

Henderson e Venkatraman", que além deenvolver a TI no processo de planejamen-to estratégico e implantação, traz a inter-dependência entre as componentes estra-tégicas, como mostra a figura 4 (ver figu-ra 4). Vale a pena ressaltar que o modeloproposto tem como pressupostos a ade-quação estratégica, isto é, o inter-relacio-namento entre os componentes ambientaise internos é consistente (possuistrategíc fit);e que essa adequação estratégica é contí-nua e dinâmica para adaptar-se às mudan-ças ambientais sempre que for necessário.

Basicamente o modelo proposto mostraa complementariedade entre as partes queformam a organização e sua estratégia.Por exemplo, a definição da estratégia donegócio pode ser o primeiro passo para oalinhamento estratégico, porém, para im-

ETAPAS ETAPA 4

Estratégia paraa tecnologia

7. Competência central ou corecompetence pode ser definidacomo a capacidade de empregarde forma harmônica todas as for-ças e habilidades da empresa paraexplorar vantagens competitivas econstruir uma poderosa posiçãode mercado. Outra forma de defi-nir core competence é: tecnolo-gia + organização social + apren-dizado coletivo. Sua essência e ca-racterfsttca básica é ser ampla-mente compartilhada por todosdentro da organização. Ela deve:ser uma fonte de diferenciaçãosignificativa, ter um amplo espec-tro de aplicações para o desenvol-vimento de vantagens competiti-vas, funcionar como um elo deunião entre os negócios da orga-nização e ser difícil de ser imitadapelos conco rrentes. .

8. HENDERSON, J. C., VENKA-TRAMAN, N. Strategic alignment:leveraging technology for trans-forming organizations. IBM Sys-tem Journal, v. 32, n. 1, p. 4-15,1993.

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l1~lEARTIGOS

9. uturação, diferente-m rt Reengenharia, é umprocesso de curta duração, po-rém de impacto estratégico quenão envolve mudanças profun-das na forma de a empresa ope-rar as atividades ligadas à suacote competence.

10.·Precísâo nas operações deuma organizaç~o deve ser en-tendida como a habilidade de-sen:vnl1tida para oferecer a umcliente indiViduai produtos eserviÇi I']djvidua!izadOS (cus-to , oferecendo configu-

preços e entrega úni-habilidades de que a

empresa necessita para atingirum elevado grau de precisão emseu negócio são: microsseg-mentação, habilidade de ofertarprodutos individualizados paramercados de consumo em mas-sa e precisão em preços - ha-bilidade e flexibilidade paraidentificar custos individualiza-dos a cada venda.

v . ~~"''I- "r... ,,";? "l"'k , • ....?~j~ ~"".,ple,rtl..-enta,;,:loí t;J preciso IJlnda.n as nas

<' '4 ~ < " c;;;.~ 'f voperações e ria organisaçãoí Para realizaressas mudanças, são necessários novas es-truturas, ferramentas, no que se refere aossistemas de informação, e outros skills (emrecursos humanos, tecnologia das opera-ções), mas para implementá-los são neces-sários um planejamento estratégico deforma a definir as estruturas, as ferramen-tas e os treinamentos que melhor se ade-quem à tecnologia presente e futura (verfigura 5).

O exemplo da figura 5 mostra a dinâ-mica tradicional do alinhamento estraté-gico, onde a alta direção faz o papel do for-mulador estratégico e desencadeia o pro-cesso. Porém, existem exemplos de diver-sas empresas que utilizam outras dinâmi-cas, com resultados mais expressivos. Res-saltamos aquelas que colocam estraté-gia para a tecnologia como etapa 2, ou mes-mo 1, no processo de alinhamento estra-:tégico.

Outra ação que a organização deve em-preender, ainda na fase I, é realizar qual-quer reestruturação? que se faça necessá-ria. Apesar de a reestruturação de organi-zações ser algo já amplamente divulgado,lembramos que esta deve ser feita antes dese alinhar toda a organização para o pro-cesso de Reengenharia. Reestruturaçãopode incluir, entre outras coisas, consoli-

dações, mudanças estruturais, terceiriza-ções e desinvestimentos em negócios quenão pertençam à core competence atual. Arazão para se realizar a reestruturação éevitar que a empresa aplique seus esfor-ços de Reengenharia em áreas que não te-nham perspectiva estratégica.

A organização já deve finalizar a fase Icom a difusão do alinhamento estratégicoe de urna visão clara e positiva do futuroda organização pelos seus membros e pe-los grupos com que se relaciona.

Fase 11A fase II é a busca da excelência ope-

racional através da Reengenharia de Pro-cessos. Essa fase se inicia com o mapea-mento e posterior redesign dos processosexistentes buscando a redução de custos,aumento da qualidade e da produtivida-de. Nessa fase, a organização deve bus-car a excelência em cinco dimensões ope-racionais: produtividade, velocidade, qua-lidade, "precisão:"? e serviço ao cliente.

As três primeiras dimensões são carac-terísticas da fase II,e, não por coincidên-cia, são os objetivos mais comuns obser-vados em experiências de Reengenharia.Precisão e serviços ao cliente são objetivosbem mais complexos e são consideradoscomo os focos iniciais da fase III. Entre-tanto, as empresas que buscam incremen-

AMERJCAN AIRUNES - UM EXEMPLOPARA AS QUATRO FASESDETRANSFOfWAÇÃ01

A AMR, empresa holding do grupo da.An)erici!-riAirlines, vem transformando por completo a si mesma, e todo o setor detransporte aéreo comercial nos EUA a 'partir do desenvolvimento de seu sistema de reservas por computadores - SABRE.Três fatores levaram a AMR a um processo completo de transformação do negócio: a evolução do SABRE, de um modelode automação simples para um sistema integrado de múltiplas fq.P-9ões; a "desregulamentação do setor aéreo comercialamericano e a visão dos altos executivos da organitação.

O sistema SABRE começou a operar no mercado americano em 1963, após quatro anos-de desenvolvimento, objetivandouma maior eficiência atravésda automação no processo de reserva de passagens e assentos. A princípio, esse sistema nãoera visto como estratégico, mas como uma forma de manter paridade com a concorrente United Airlines. O objetivo erareduzir custos e erros na emissão de reservas (produtividade e eficiência). .

Em 1980, em meio à crise gerada pelo processo de desregulamentação do setor comercial aéreo, a empresa foi obrigadaa rever seus paradigmas e buscar uma nova perspectiva estratégica. Nesse momento, a empre~a passou por um extensivoplanejamento estratégico, caracterizando a fase I, iniciando a úan~fOlmayão do negócio. A direção da empresa percebeuque o sistema de reservas por 'Computador passaría a ser central para a 'conquista de espaço nas agências de turismo e,conseqüentemente, no mercado. '

Nessa situação, inicia-se a fase UI (a AMR não necessitou passar pela fase Il, uma vez que o sistema SABRE já eraeontinuamente aperfeiçoado por uma questão concorreneial), onde, o SA~RE passa a SeI melhorado, Com o objetivo deoferecer novos serviços e produtos às-agências, de forma a tomá-las quase dependentes da AMR, pela qualidade insuperável

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tos em produtividade, velocidade e quali-dadeorierttadaspara o-cliente, possuemmaiores chances de atingir a Iàse-Ill commenores resistências", .

Essa fase se caracteriza pelos seguintesprogramas: uso intensivo de técnicas demapeamento de processos; redesign (rede-finição e automação) dos processos, obje-tivando aumentos da produtividade; uti-lização do ferramental de TQM e controleestatístico de processo, para incremento daprodutividade e estabelecimento de me-didas; e [ust-in-time, time baeed compeiiiione EDI - Eletronic Data lnierchange, paraganhos de velocidade.

Fase 111Quando a organização busca resultados

na precisão e serviços ao cliente, surgem,inevitavelmente, o aumento na oferta deprodutos e serviços e a abertura de novosmercados para a empresa. Pode-se dizerque a fase III de transformação inicia-sequando o foco da organização muda ex-plicitamente da otimização das operaçõesinternas para a busca da satisfação docliente e ampliação dos mercados, atravésda excelência na precisão do negócio, nosserviços ao cliente e no desenvolvimentode novas core compcicnces.

Essa fase se caracteriza pelos seguintesinstrumentos: grupos de foco, pesquisas

de mercado e QFD - Quczlity Funcii nDeployment. A utilização desses inst u-mentos é o fator-chave para melhorar oserviçóªº_cIíf:'rtt~~.~~r a satisfa~~o ...e o conseqüente nível de retenção.docli-"ente. Para conseguir precisão Jl{)negó· ..o que em outras palavras significa el vda sofisticação na atividade mercadológí"ca e alta flexibilidade operacional, a orga-nização deve trabalhar em programas demass-customization, microssegmentação esistemas de custeio flexíveis.

A plena aplicação dessas técnicas nor-malmente gera a ampliação de serviços eprodutos oferecidos pela organização. Porisso, a empresa deve estar aberta e alertapara ampliar seu escopo de mercados e denovos clientes. O ideal seria que a entra-da em novos mercados e o acesso a novossegmentos já estivessem previstos no pla-nejamento realizado na fase I. Portanto,programas que objetivem a ampliação doscanais de distribuição e comunicação, dosmercados e o estabelecimento de parce-rias passam a ser centrais nessa fase.

Fase IVA emergência de novas unidades de ne-

gócios (SBU - Strategic Busines« Unit) ca-racteriza a quarta fase do processo detransformação. É importante notar as op-ções estratégicas dessa fase. Uma nova

11. Conforme podemos observarno box Algumas experiênciasbrasileiras.

do seu sistema de reservas. Entre esses serviços, destacam-se uma versão mais amigável ao usuário, chamada EAASYSABRE e SUPER SABRE, o fornecimento do board-pass antecipado, a ampliação das escolhas do cliente etc. Umamelhoria estratégica foi abrir um canal diretamente ao consumidor final, através do acesso ao sistema EAAS Y SABRE emredes de computadores como Prodigy (nctwork de serviços pessoais interativos). Em 1988, o sistema SABRE contribuíacom 6% da receita da AMR, porém, já era responsável por 17% do lucro de 801 milhões de dólares gerado pelo grupo.

A partir de 1988, sob pressão de uma possível ação anti-truste do Congresso Americano, que levaria a AMR a perder ocontrole sobre o sistema SABRE, a empresa decidiu partir para outros negócios. A opção da AMR por outros mercadosnão visava apenas à redução do risco de uma intervenção governamental. A real possibilidade de ganhar dinheiro com anova core competence era mais atrativa que tentar mantê-la restrita ao negócio original da empresa.

A AMR iniciou um programa de diversificação: redefinindo o SABRE com o conceito de "supermercado eletrônicopara viagens", ampliou seus serviços e negócios, caracterizando a sua entrada na fase IV do processo de inovação. Osistema passou a incluir hotéis, trens, aluguéis de carros, pacotes de turismo, bilhetes para shows etc. Nessa fase, essesserviços foram ligados à uma nova subsidiária, a AMR Info. Service Inc. - AMRIS. Os objetivos da AMRIS eram procurarreduzir a dependência do sistema SABRE a um único mercado e buscar formas para operar dentro de uma perspectivaglobal. Através de alianças estratégicas, a AMRIS vem desempenhando com sucesso sua missão. Com o Hilton e aMarriott (cadeias de hotéis) e a Budget Rent-A-Car (empresa de locação de carros), a AMRIS desenvolveu um sistema

1. Esse exemplo foi baseado em dois trabalhos: o primeiro, umpaper preparado pelo professor W. Davídson: Transforming computei reservatíon service - the evolution ofan info-business in lhe airline busineee (Redondo Beach, CA: Mesa Research, 1992), 15 páginas; o segundo, um artigo publicado por Max D, Hopper (vice-presidentesênior para 18 na American Airlines e vice cnsirmen para a AMR Informalion servíce), Rattlling SABRE - new ways to compele on information: Harvard Business Review,v. 68, n. 3, p. t 18-25, May!Jun. 1990.

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(Continua na página seguinte)

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Em artigo publicado na revistaExame=vv: ano passado, uma sé-rie de exemplos são apresenta-dos como modelos de Reenge-

nha r ia , Como mostra o quadro 3 (verquadro 3), a maioria dessas empresas, comexceção do Banco de Boston, da RMB e daSanta Cruz Seguradora, pelo teor dascolocações de seus representantes, deixaclara a restrita orientação de seus pro-

ARTIGOS

AVALIAÇÃO DE EXPERIÊNCIAS BRASILEIRAS EM REENGENHARIA

Fase I Fase II FasesIIIe IV

Agroceres: velocidade (reduziu o tempo entre a emissão dos pedidose o faturamento de catorze para sete dias).

Banco de Boston: serviços ao cliente (busca a automatização deoperações básicas, orientadas pela visão "o cliente pode ser atendi-do sem sair de casa" oriunda de um plano estratégico estruturado).

Climax: velocidade (modificou o processo de distribuição de mer-cadorias, diminuindo de dez para cinco dias o atendimento de pedi-dos).

Grupo Machine: produtividade (centralização dos serviços de su-porte, trazendo economias de US$ 18 milhões ao ano).

RMB - Refinações de Milho Brasil: velocidade (redução de todosos lead-timcs da empresa visando a melhorar desenvolvimento deprodutos, distribuição e produção. Houve também uma extensa re-visão do mix de produtos).

Santa Cruz: serviço ao cliente (reestruturação e informatização doatendimento ao cliente).

Não está claro se essa etapa foi ou não concluída.Rccngenharia aplicada apenas a um processo.

Rccngcnharia pode atingir roda a organização (a extensão é determinada pela estratégia que originou oprocesso).baixa possibilidade de o processo atual de Rccugcnharia levar à fase TIl e IV e à conseqüente transformaçãodo negócio.boa pósvibilidade de o processo atual de Rcengcnharia levar à fase til e IV e à conseqüente transformaçãodo negócio.

12. NETZ, Clayton. A arte de fazermais com menos. Exame, o.52-9, 4 de agosto de 1993.Também foram feitas entrevistase acompanhadas palestras dosexecutivos de parte das em-presas citadas.

revisão estratégica de toda a organizaçãodeve ser a primeira tarefa nessa fase. No-vas competências surgem do desenvolvi-mento de uma alta capacidade em utilizara informação de forma a gerar valor e quese traduzem em mase-cusiomization, preci-

são e microssegmentação.Essas novas core compeiences

podem ser percebidas como es-senciais para o negócio tradicio-nal da empresa e por isso seremresguardadas, mesmo oferecen-do possibilidades de novos negó-cios. Por outro lado, se a revisãoestratégica demonstrar a viabili-dade em explorar comercialmen-te essas novas core compeiences, aReengenharia termina por levara uma verdadeira transforma-ção do negócio original da orga-nização.

Os programas principais paraos quais a empresa irá voltar suaatenção nessa fase são: atividadesde stari-up, consolidação, desen-volvimento do espírito empreen-dedor e busca de alianças estra-tégicas para acelerar a exploraçãodas novas competências.

Algumas experiênciasbrasileiras

computadorizado elereservas c gerenciamento para o mercado de redes de hotéis e locadoras de carros; com o maiorsistema de reservas europeu, a AMRIS levou seus serviços aos viajantes europeus; e em associação com osistema nacional de ferrovias francês, está criando um sistema de reservas para toda a Europa.

A partir de 1989, outras empresas foram abertas para aproveitar a nova core competence da AMRIS; a AMR DirectMarket Co., que fornece serviços de telemarketing para o grupo AMR e outros clientes; a AMR Technical Trainning,que oferece treinamento em produtos que envolvam automação e sistemas; a AMR Vídeo FinanciaI Services, que atuaem serviços de video banking e cobrança para instituições financeiras; a AMR Freight Automation, que fornece softwarespara transportadoras de carga e a AA Decision Technology, que vende todo o know-how desenvolvido em TI e sistemasde informações - SI - para as empresas.

Em 1990, mais de 80% da compra de passagens já era feita através de sistemas de reservas por computador emagências, contra 40'f,; em 1976, transformando completamente o perfil do mercado. O sistema SABRE possuía umporte invejável: continha 45 milhões de passagens em seus bancos de dados, relacionadas a 650 empresas aéreas, comum creseimento em torno de 50% ao ano, nos últimos 15 anos. Por outro lado, esse sistema representou um investimentoacumulado de US$ 1,3 bilhões,

Como previsto pela direção da empresa, em 1990 a AMR ofereceu mais de 50% elo sistema SABRE à venda aopreço de US$ 15 milhões para cada percentual de ações, o que totalizava US$ 1,5 bilhões como valor de mercado parao sistema. Porém, a oferta não incluiu a AMRIS c tudo o que se relacionava com a core competence em desenvolver ecomercializar serviços de informação.

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cesses de Reengenharia para os resultadosadvindos da fase 11, obtendo melhoriarestritas aos processos que foram sub-metidos à Reengenharia.

A Reengenharia não é uma opção paraas organizações, é um imperativo impos-to pela nova base tecnológica. Todas asorganizações irão passar por esse proces-so, de uma forma ou de outra, c podemosprever que muitas ficarão pelo caminho,enquanto outras que trabalharem duropara guiarem a si mesmas serão recom-pensadas num curto espaço de tempo.

Claro que as grandes mudanças qlle es-tão ocorrendo em outras variáveis am-bientais influenciam a organização, comoa globalização e o acirramento da compe-tição, o amadurecimento do consumidor,a busca da qualidade etc. Por outro lado,vale a pena perguntar: até que ponto atransição para a nova base tecnológica éresponsável ou não por essas mudanças?Feito isso, é possível ver onde a tecnologiada informação pode ajudar a organizaçãoa lidar com essas variáveis ambientais.

O mais importante, porém, é a necessi-dade de uma nova forma de relacionamen-to com os empregados e com todos os gru-pos ligados à organização. São esses gru-pos que levarão a cabo qualquer projetode Reengenharia (principalmente os em-pregados) e que devem ser a força criativaque determinará o futuro da organização.

Três sugestões para futuros trabalhospodem ser feitas para o desenvolvimentoda teoria da Reengenharia de Negócios: aintegração das outras teorias para abordara mudança organizacional (teorias sobreo papel da cultura na organização etc.); odesenvolvimento de estudos para avaliaro impacto da tecnologia da informação narelação homem-trabalho e a aceleração doprocesso de desenvolvimento do ferra-mental e das técnicas orientadas para osconceitos básicos da Reengenharia.

Esses estudos são muito importantes,pois, como podemos observar no nossodia-a-dia, a Reengenharia está em rápidaevolução e espera-se, para um futuro nãomuito distante, uma nova evolução doconceito. A Reengenharia de Negóciosdeve evoluir para a Reengenharia da Ca-

deia Produtiva, que passariaganhos não apenas dentro damas envolvendo toda a linhaque forma o setor industrial em que a .ern-presa está inserida.

A Reengenharia é algo novo dentro dateoria organizacional mas, diferentemen-te de outras proposições que apareceram,tem por trás de si um conceito sólido quea justifica. Independentemente do nomedado, a Reengenharia requer uma teoriaséria que a valorize. Esse é, de fato, o obje-tivo deste artigo.

Um ponto importante que deve ser salientado são as dife-renças das opções atuais e as encontradas pela pioneira AMRno desenvolvimento de seu SI. Hoje, ao contrário da AMR, asempresas dispõem de diversas facilidades, que com certezaaceleram o processo e diminuem seus custos:• hardware: hoje, a variedade de direções e opções existentes

em tecnologia da informação sem dúvida permite às empresas"customizarem" a tecnologia às necessidades específicas,conseguindo maior eficiência;

• software: o SI da AMR foi por muito tempo, desenvolvidopor ela própria (desenvolvimento in-housev, o que tornou oprocesso lento e caro. Hoje, parcerias e contratação deempresas especializadas aceleraram significativamente oprocesso;

• know-how: as experiências de empresas como a AMR e outrasem diversos setores estão facilitando c acelerando osprocessos de desenvolvimento de SI e a metodologia paraconduzir O processo, baseada na Reengenharia.

o caso dramático de transformação do negócio fornecidopela AMR deve servir como exemplo para as empresas quequeiram assumir a liderança em seu setor de forma duradourae, ao mesmo tempo, lançar a empresa definitivamente naeconomia da informação.

Hoje, pode-se dizer que a estrutura da AMR está maispróxima à de uma empresa integradora de sistemas como a EDS,que.de uma companhia aérea, o que leva a AMR a ponderar empassar o controle da American Airlines para seus empregados,a.exemplo de sua concorrente United Airlines'. A mudança donegócio (e da core competence), como ocorreu com a AMR

considerada benchmarking mundial em geren-de informação"). deveu-se a aspectosdo governo e o declínio do negócio de

~""''',-~; e ao pioneirismo que permeou tododeve ficar claro que a mudança na coreuma opção estratégica. U

Artigo recebido pela Redação da RAE em abril/94, avaliado em abril, maio, junho/94 e aprovado para publicaçãO em junho/94.