o princípio da solidariedade intergeracional como pressuposto para a adoção de um paradigma...

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109 ISSN 1980-0894 Resenha, Vol.9 Nº1, Ano 2014 O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL COMO PRESSUPOSTO PARA A ADOÇÃO DE UM PARADIGMA AMBIENTAL DE SUSTENTABILIDADE THE PRINCIPLE OF INTERGENERATIONAL EQUITY AS A PRECONDITION FOR THE ADOPTION OF AN ENVIRONMENTAL SUSTAINABILITY PARADIGM Gabriela Soldano Garcez 1 Resumo: Esta resenha analisa a importância da proteção e promoção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, com a responsabilidade das presentes gerações quanto a vida digna das futuras gerações, a partir da analise do texto “Intergenerational equity: a legal framework for global environmental change”, escrito pela professora Edith Brown Weiss. É dever das atuais gerações a preservação dos níveis de qualidade ambiental, para que as futuras gerações possam desfrutar de qualidade de vida. Por esta razão, conclui-se que é responsabilidade das presentes gerações a proteção das futuras, mantendo o ambiente saudável ou, ainda, restaurando-o no que tiver sido violado, para que haja vida saudável e digna para aqueles que ainda virão. Palavras-chave: Meio Ambiente, futuras gerações, princípio da solidariedade intergeracional, direito fundamental. 1 Titulação: Advogada e Jornalista diplomada. Pós-graduada em Direito Processual Civil e Direito Processual do Trabalho, pela Universidade Católica de Santos. Mestre em Direito Ambiental, pela Universidade Católica de Santos. Doutoranda em Direito Ambiental Internacional, pela Universidade Católica de Santos. E-mail para contato: [email protected]ço: Avenida dos Bancários, nº. 80, apartamento 81. CEP: 11030-300. Bairro: Ponta da Praia. Cidade: Santos, no estado de São Paulo.

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Resenha publicada na edição Vol. 9 nº1 - InterfacEHS Revista de Saúde, Meio Ambiente e Sustentabilidade Publicação Científica do Centro Universitário Senac - ISSN 1980-0894 Acesse a edição na íntegra! http://www3.sp.senac.br/hotsites/blogs/InterfacEHS/?page_id=1480 Autora: Gabriela Soldano Garcez Resumo: Esta resenha analisa a importância da proteção e promoção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, com a responsabilidade das presentes gerações quanto a vida digna das futuras gerações, a partir da analise do texto “Intergenerational equity: a legal framework for global environmental change”, escrito pela professora Edith Brown Weiss. É dever das atuais gerações a preservação dos níveis de qualidade ambiental, para que as futuras gerações possam desfrutar de qualidade de vida. Por esta razão, conclui-se que é responsabilidade das presentes gerações a proteção das futuras, mantendo o ambiente saudável ou, ainda, restaurando-o no que tiver sido violado, para que haja vida saudável e digna para aqueles que ainda virão. Palavras-chave: Meio Ambiente, futuras gerações, princípio da solidariedade intergeracional, direito fundamental.

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Page 1: O princípio da solidariedade intergeracional como pressuposto para a adoção de um paradigma ambiental de sustentabilidade

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ISSN 1980-0894 Resenha, Vol.9 Nº1, Ano 2014

O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL COMO

PRESSUPOSTO PARA A ADOÇÃO DE UM PARADIGMA AMBIENTAL DE

SUSTENTABILIDADE

THE PRINCIPLE OF INTERGENERATIONAL EQUITY AS A

PRECONDITION FOR THE ADOPTION OF AN ENVIRONMENTAL

SUSTAINABILITY PARADIGM

Gabriela Soldano Garcez1

Resumo: Esta resenha analisa a importância da proteção e promoção do meio

ambiente ecologicamente equilibrado, com a responsabilidade das presentes gerações

quanto a vida digna das futuras gerações, a partir da analise do texto “Intergenerational

equity: a legal framework for global environmental change”, escrito pela professora Edith

Brown Weiss. É dever das atuais gerações a preservação dos níveis de qualidade

ambiental, para que as futuras gerações possam desfrutar de qualidade de vida. Por esta

razão, conclui-se que é responsabilidade das presentes gerações a proteção das futuras,

mantendo o ambiente saudável ou, ainda, restaurando-o no que tiver sido violado, para

que haja vida saudável e digna para aqueles que ainda virão.

Palavras-chave: Meio Ambiente, futuras gerações, princípio da solidariedade

intergeracional, direito fundamental.

1 Titulação: Advogada e Jornalista diplomada. Pós-graduada em Direito Processual Civil e Direito Processual do

Trabalho, pela Universidade Católica de Santos. Mestre em Direito Ambiental, pela Universidade Católica de Santos.

Doutoranda em Direito Ambiental Internacional, pela Universidade Católica de Santos. E-mail para contato:

[email protected]ço: Avenida dos Bancários, nº. 80, apartamento 81. CEP: 11030-300.

Bairro: Ponta da Praia. Cidade: Santos, no estado de São Paulo.

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Abstract: This review discusses the importance of protecting and promoting

ecologically balanced environment, with the responsibility of present generations as a

dignified life for future generations, from the analysis of the text "Intergenerational

equity: the legal framework for global environmental change", written by Edith Brown

Weiss. It is the duty of the present generation to preserve levels of environmental quality

for future generations to enjoy quality of life. For this reason, it is concluded that it is the

responsibility of present generations to protect the future, keeping the environment

healthy, or even restoring it on that has been violated, so there is healthy and dignified

life for those yet to come.

Keywords: Environment, future generations, principle of intergenerational solidarity, a

fundamental right.

O princípio da solidariedade intergeracional como pressuposto para a adoção

de um paradigma ambiental de sustentabilidade

Em “Intergenerational equity: a legal framework for global environmental

change”, texto escrito pela professora Edith Brown Weiss (nome referência nas áreas de

relações internacionais e Direito Ambiental Internacional; professora da Universidade de

Georgetown – Washington/ EUA, desde 1978), publicado em 1992 como um dos

capítulos do livro intitulado “Environmental change and internacional law: New

challenges and dimensions”, coordenado pela própria Edith, a professora explora a ideia

de que o desenvolvimento econômico provoca mudanças ambientais globais de longo

prazo, que levantam questionamentos que se estendem por mais de uma geração, bem

como que os atuais instrumentos econômicos tentam satisfazer as necessidades da geração

presente de forma eficiente, mas são insuficientes para lidar com as questões de igualdade

com as gerações futuras. É um texto que aborda, portanto, a teoria da equidade

intergeracional no contexto das mudanças ambientais globais.

Um número crescente de acordos internacionais, declarações, cartas, e resoluções

da Assembleia Geral das Nações Unidas refletem essa preocupação para o bem-estar das

gerações futuras e, estabelecem princípios ou obrigações destinadas a proteger e melhorar

o bem-estar das presentes e futuras gerações.

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A preocupação com a justiça para com as gerações futuras em relação ao meio

ambiente surgiu nas reuniões preparatórias para a Conferência de Estocolmo sobre o Meio

Ambiente Humano, em 1972, e foi incorporado ao texto final produzido. O primeiro

princípio da Declaração estabelece que " ... o homem tem uma responsabilidade solene

de proteger e melhorar o ambiente para as gerações presentes e futuras.

Existem várias abordagens para a definição de igualdade intergeracional no

contexto da relação entre as gerações para o planeta Terra.

O primeiro é o modelo preservacionista, em que a geração atual não pode destruir,

esgotar ou significativamente alterar os recursos existentes, mas sim, economizá-los para

as gerações futuras e preservar o mesmo nível de qualidade em todos os aspectos do

ambiente. O outro extremo pode ser denominado o modelo de opulência, em que a

geração atual consome tudo o que quer hoje e gera tanta riqueza quanto pode, ou porque

não há certeza de que existirão gerações futuras, ou porque maximizar o consumo de hoje

é a melhor maneira de maximizar a riqueza para as gerações futuras. Uma variante do

modelo de opulência é o modelo de tecnologia, em que não há preocupação com o meio

ambiente para as gerações futuras, porque, teoricamente, a inovação tecnológica nos

permitirá introduzir recursos substitutos infinitos. Finalmente, há o modelo de economia

ambiental, que defende que devemos fazer a contabilidade dos recursos naturais

adequadamente para cumprir as obrigações para com as gerações futuras.

Por outro lado, a teoria da igualdade intergeracional proposta pela professora Edith

parte do pressuposto de que, a sustentabilidade só é possível se olharmos para a Terra e

seus recursos como uma relação de confiança, que nos transmite tanto direitos quanto

responsabilidades. As gerações futuras têm direitos, embora esses direitos só tenham

significado se os vivos respeitá-los e, se este respeito transcender as diferenças entre os

países, religiões e culturas.

Todas as gerações são inerentemente ligadas a outras gerações (para o passado e

para o futuro), no uso do patrimônio comum da Terra. A teoria da equidade

intergeracional estipula que todas as gerações têm um lugar igual em relação ao sistema

natural. Não há nenhuma base para preferir a geração presente sobre as gerações futuras

na sua utilização do planeta.

A parceria entre as gerações é, portanto, o corolário da igualdade. Isso exige que

cada geração passe o planeta sem qualquer condição pior do que o recebeu e forneça o

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acesso equitativo aos recursos e benefícios para as futuras gerações.

Cada geração é tanto um administrador para o planeta com as obrigações de cuidar

dele e um beneficiário com direito de usá-lo.

Esta teoria da equidade intergeracional tem uma base profunda no direito

internacional. A Carta das Nações Unidas, o Preâmbulo da Declaração Universal dos

Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a Convenção

sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, a Declaração Americana dos

Direitos e Deveres do Homem, a Declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra

a Mulher, a Declaração sobre os Direitos da Criança, e muitos outros documentos de

direitos humanos, revelam uma crença fundamental na dignidade de todos os membros

da sociedade humana e em uma igualdade de direitos, que se estende no tempo e no

espaço.

Para a professora Edith, três princípios formam a base da equidade

intergeracional. Em primeiro lugar, cada geração deve ser obrigada a conservar a

diversidade da base de recursos naturais e culturais, de modo a não restringir

indevidamente as opções disponíveis para as gerações futuras. Trata-se da "conservação

de opções". Em segundo lugar, cada geração deve ser obrigada a manter a qualidade do

planeta para que este não seja repassado em condições piores do que aquela em que foi

recebida. Este é o princípio da "conservação da qualidade”. Em terceiro lugar, cada

geração deve fornecer aos seus membros direitos equitativos de acesso ao legado das

gerações passadas e, deve conservar esse acesso para as gerações futuras. É o princípio

da "conservação de acesso".

Os princípios propostos reconhecem o direito de cada geração a usar os recursos da

Terra em seu próprio benefício, mas restringem as ações da atual geração ao fazê-lo.

Os princípios de opções (também chamado de diversidade), qualidade e acesso

formam a base de um conjunto de obrigações e direitos intergeracionais, ou os direitos e

obrigações planetárias, que são mantidos por cada geração.

Na dimensão intergeracional, as gerações para as quais as obrigações são devidas

são as gerações futuras, enquanto as gerações com que os direitos estão ligados são as

gerações passadas. Assim, os direitos das gerações futuras estão ligados às obrigações da

geração presente. Já no contexto intrageracional, obrigações e direitos planetários existem

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entre os membros da geração atual. Assim, as obrigações intergeracionais para conservar

o planeta fluem da geração atual para as gerações futuras e entre os próprios membros da

geração atual, que têm o direito de usar e desfrutar do legado planetário.

Se as obrigações da geração presente não estão relacionadas com os direitos, a atual

geração tem um forte incentivo para polarizar a definição dessas obrigações em favor de

si mesmo em detrimento das gerações futuras. Direitos intergeracionais têm maior força

moral do que obrigações. Assim, cada geração tem a responsabilidade de definir critérios

para ações que violem esses direitos.

Estes direitos intergeracionais podem ser considerados como direitos de grupo, ou

seja, distintos dos direitos individuais, no sentido de que as gerações possuem esses

direitos como os grupos em relação a outras gerações - passado, presente e futuro. Eles

existem independentemente do número e identidade dos indivíduos que formam cada

geração.

A evolução do direito internacional fora do domínio do ambiente faz a aceitação

dos direitos intergeracionais uma evolução natural e desejável. Na verdade, o direito

internacional dos direitos humanos (para citar dois exemplos: a convenção de genocídio,

bem como a proibição contra a discriminação racial) são dirigidas tanto para a proteção

do futuro como para a proteção das gerações.

Estratégias para a implementação desta igualdade entre gerações devem ser

estabelecidas.

Primeiramente, as gerações futuras não são efetivamente representadas nos

processos de tomada de decisão hoje, embora as decisões que tomamos vão determinar o

seu bem-estar inicial. Uma abordagem para esta questão é a designação de um

ombudsman para as gerações futuras. A Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento recomendou que os países considerem a adoção de um ombudsman

nacional.

Por outro lado, para a professora Edith, com a finalidade de incentivar a cooperação

entre os países e entre as comunidades para cumprir as obrigações para com as gerações

futuras, é útil elaborar e codificar as normas relevantes da equidade intergeracional. A

codificação reduz as ambiguidades sobre o comportamento esperado e distingue o

comportamento cooperativo do comportamento não cooperativo.

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Regimes internacionais para gerenciar ou para coordenar as medidas de gestão de

determinados recursos naturais são importantes. Eles facilitam o desenvolvimento e o

intercâmbio de informações, tornando mais difíceis defeitos, e podem contribuir para o

desenvolvimento de novas normas. É importante que os estados relevantes participem do

regime, a fim de evitar “paraísos da poluição” ou “caronas na comunidade

internacional”. Isto exige que os Estados ofereçam incentivos e desincentivos para

encorajar a participação.

Para implementar a equidade entre gerações, é necessário, ainda, uma nova

ética. Isso exige elevar a consciência pública e educar as pessoas sobre o desenvolvimento

ambientalmente sustentável. A revolução da informação ajudará a fornecer as

informações necessárias para fazer isso, bem como na mobilização da participação

pública no desenvolvimento e implementação de medidas para o alcance da equidade

intergeracional.

Dessa forma, analisando o progresso da comunidade internacional para enfrentar as

preocupações ambientais intergeracionais nas duas últimas décadas, pode-se concluir que

este é altamente insuficiente. Mas, se compararmos onde estamos hoje com 1972 (data da

Declaração de Estocolmo, que iniciou tal preocupação), é impressionante a aprendizagem

rápida dos países para abordar tais questões.

Recebido em 16/03/2014

Aceito em 02/04/2014