monografia alice registro fonseca 2009
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A CULTURA MATERIAL KARAJÁ COMO FONTE PRIMÁRIA PARA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO: INTERFACES ENTRE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E PROPOSTA TRIANGULARTRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA FACULDADE DE ARTES, FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS
DEPARTAMENTO DE ARTES PLÁSTICAS
ALICE REGISTRO FONSECA
A CULTURA MATERIAL KARAJÁ COMO FONTE PRIMÁRIA PARA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO: INTERFACES ENTRE EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL E PROPOSTA TRIANGULAR
UBERLÂNDIA 2009
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA FACULDADE DE ARTES, FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS
DEPARTAMENTO DE ARTES VISUAIS
ALICE REGISTRO FONSECA
A CULTURA MATERIAL KARAJÁ COMO FONTE PRIMÁRIA PARA A
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO: INTERFACES ENTRE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E PROPOSTA TRIANGULAR
Monografia apresentada ao Departamento de Artes Visuais da Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal de Uberlândia, como parte do requisito para conclusão do curso de Graduação em Artes Plásticas: licenciatura e bacharelado.
Orientação: Profa. Ms.Raquel Mello Salimeno Sá
UBERLÂNDIA
2009
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Alice Registro Fonseca
A cultura material Karajá como fonte primária para a construção do conhecimento: interfaces entre Educação Patrimonial e Proposta Triangular.
Monografia apresentada ao Departamento de Artes Visuais da Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal de Uberlândia, como parte dos requisitos para conclusão do curso Graduação em Artes Plásticas: licenciatura e bacharelado.
Banca Examinadora: Uberlândia, 10 de julho de 2009. _________________________________________________________________
Orientadora: Profa. Ms. Raquel Mello Salimeno Sá - FAFCS- UFU
_________________________________________________________________ Membro: Profa. Dra. Luciana Mourão Arslan - FAFCS - UFU
_________________________________________________________________ Membro: Profa. Ms. Lídia Maria Meirelles – Universidade Católica de Uberlândia
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AGRADECIMENTOS
Como uma forma de agradecer a oportunidade de realizar o curso de Artes Plásticas,
ofereço à Universidade Federal de Uberlândia, à Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências
Sociais, ao Departamento e aos professores de Artes Visuais, e em especial dedico à minha
orientadora Raquel Mello Salimeno Sá que confiou em mim.
Agradeço à minha orientadora e companheira de pesquisa Raquel, pois se não a tivesse
conhecido não teria me aventurado no estágio no Museu do Índio e na realização dessa
pesquisa. No estágio, eu tenho que agradecer tanto a Lídia Meirelles, diretora do mesmo
museu, que acreditou na minha capacidade, me possibilitou o contato com as Bonecas Karajá
e me permitiu usar o espaço do museu para a oficina aqui relatada; como também a educadora
Valéria Silva de Lima, que me encantou pelas suas experiências, idéias e companheirismo de
trabalho. No museu ainda conheci várias pessoas especiais que sempre me escutaram e
apoiaram.
Ter amigos por perto é sempre importante; eu tive sorte de conhecer pessoas
maravilhosas na Faculdade e tê-las perto de mim em vários momentos decisivos. Lizandra
Calife Soares e Maísa Carvalho Tardivo são essas pessoas iluminadas que foram minhas
companheiras mesmo em algumas épocas com muita distância territorial. Elas sempre
estavam por perto para me animar. Outras amigas que também participaram da minha vida
nesses quatro anos e meio, foram a Samantha Soares, e a Franciele Monai, com as quais dividi
experiências dentro e fora da faculdade.
Morar fora de casa pode ser uma experiência sofrida para algumas pessoas, mas no
meu caso eu consegui aproveitar esse momento para me conhecer, e de quebra ainda criei
uma amizade com a minha companheira de apê, a Clarissa. Na faculdade ela também me
ajudou muito, como a carregar muitos trabalhos, e me pegar nas aulas à noite; e no apê ela
entendia as bagunças por causa das disciplinas.
Tenho muito a agradecer também à companhia de transporte Viação São Bento Ltda,
ao advogado João Fernando Jorge Estevão, ao meu avô Anivaldo Registro e o meu pai
Aluisio Antonio Fonseca pela oportunidade de deixar a distância entre Ribeirão Preto e
Uberlândia mais curta, me possibilitando viajar todo final de semana, durante todo o curso na
faculdade. Essa ajuda foi de extrema importância, pois pude estar sempre perto da minha
família e de ficar junto do Rafael.
Aos meus pais, Aluisio e Marisa, que me apoiaram, incentivaram, acreditaram nessa
jornada de estudos, eu dedico com toda minha paixão por vocês essa monografia. Mãe saiba
que você é meu espelho de mulher, e pai, você é um companheiro de aventuras. Não posso
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deixar de lembrar da minha irmã Luísa que completa a família trazendo alegria, emoção e
carinho. Guardo um lugarzinho em especial para todas as pessoas da minha família. Às tias
Márcia, Tânia, Regina, Rita, Cacá, obrigada pelos seus ensinamentos e carinhos. Aos primos
Gabriela, Coralina, Pedro e Ricardo, obrigada pelas brincadeiras, aventuras e trocas de
conversas. Aos meus avós presentes em meu coração Dito e Didi, agradeço os momentos
felizes que agora estão bem guardados na memória; e à Jeni e Anivaldo obrigada pelas várias
oportunidades de fazer arte.
Ao Rafael e sua família tão carinhosa, Laila, Rogério, Karime e Rogerinho que sempre
me ajudaram nos trabalhos de pintura, escultura, serigrafia e mostraram interesse e agrado
pelos meus trabalhos. Rafael, agradeço em especial, a compreensão e o respeito pelos meus
momentos de ansiedade e nervosismo frente aos desafios da faculdade -iniciação científica,
estágios e essa monografia. E mais do que tudo, por passar esses sete anos da minha vida me
amando, ajudando e respeitando.
Obrigada a todos os mencionados, e saibam que cada um está gravado em minha
memória nesse período de amadurecimento intelectual, e na mulher que sou hoje.
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“A valorização do patrimônio cultural brasileiro
depende, necessariamente, de seu conhecimento.
E sua preservação, do orgulho que possuímos de
nossa própria identidade.”(HORTA, 1999, p.5)
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RESUMO
O presente estudo teve como objetivo analisar a metodologia da Educação Patrimonial
e a Proposta Triangular, identificando suas similaridades quanto às atividades e às finalidades.
Para tal discussão, estudamos a característica comum entre elas, que compreende uma
educação voltada à cultura do aprendiz aliada à concepção da diversidade cultural. Criamos
desenhos e tabelas que possibilitaram a identificação das semelhanças entre as etapas
educacionais de ambas. A partir desses estudos foi possível aplicar uma oficina que atendesse
a tais objetivos. A fonte fundamental do desenvolvimento dessa oficina foi na Arte figurativa
em cerâmica dos índios Karajá, as bonecas ou litxokó. Os participantes foram agentes
comunitários, educadores, estudantes de graduação e profissionais à frente da divulgação da
cultura, pois essa oficina fez parte do Projeto de Extensão Universitária - Educação, Arte e
Cultura: conceitos e métodos - aprovado pelo MINC ( Ministério da Cultura), na sua segunda
edição. A oficina propiciou o contato com uma atividade plástica - a modelagem da argila e o
desenho – relacionando à discussão investigativa e exploratória da cultura material dos índios
Karajá. O desenvolvimento da oficina supriu a necessidade de colocar em prática os nossos
estudos, verificando a possibilidade de haver um ensino instrumentalizado pela parte teórica e
sensibilizada pela parte prática, pois acreditamos que uma esteja em relação com a outra. O
resultado de todo esse processo, as fotos e as aulas em power-point, encontram-se em anexo
no Cd.
PALAVRAS-CHAVES: Arte indígena; Boneca Karajá; Educação Patrimonial; Proposta
Triangular;
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LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1- Quadro explicativo do tronco linguístico Macro-Jê 26
FIGURA 2 – Bonecas Karajá (cerâmica moderna) 30
FIGURA 3- Ceramista Karajá. 31
FIGURA 4– Cerâmica Karajá antiga 32
FIGURA 5– Cerâmica Karajá moderna 34
FIGURA 6- Harabié (cena de casamento “harabié”, quando 34
o noivo é carregado por um parente até a casa da noiva).
FIGURA 7– Figuras Antropomórficas Karajá (cerâmica moderna) 36
FIGURA 8- Inãrásonuésonué (Karajá com muitas cabeças) 36
FIGURA 9- Kboí e hãbú (antepassado místico de grande barriga, 36
e homem triangular com dois orifícios.
FIGURA 10- Cena do Parto, posição em cócoras 37
FIGURA 11-Cerimonial do enterro, quando o morto é levado dentro de uma esteira. 37
FIGURA 12- Índia Karajá preparando a argila para a modelagem. 39
FIGURA 13- Duas índias Karajá modelando bonecas com a criança ao lado. 40
FIGURA 14- Índia colocando as litxokó em cima da chapa 41
no fogo para secá-las.
FIGURA 15- Índia Karajá com sua extensa produção de litxokó. 42
FIGURA 16- Índia Karajá fazendo uma boneca ao lado de sua filha. 46
Ensinando a técnica de argila, os costumes e as lendas.
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FIGURA 17- Participantes fazendo o desenho de observação das 47
peças em exposição
FIGURA 18- Desenho de observação com vista de duas posições. 48
FIGURA 19- Terceiro momento da aula, a criação plástica livre com a argila. 49
FIGURA 20- Duas criações com argila, de diferentes participantes, na primeira aula. 50
FIGURA 21- Criação por um participante de uma figura animal. 51
FIGURA 22- Criação de argila realizada na primeira aula, dia 23 abril 2009. 53
FIGURA 23- Criação de figuras com argila na segunda aula, dia 30 abril 2009. 53
FIGURA 24- Pintura Diária. 54
FIGURA 25- Pintura da Passagem de Weryry a jyre. 54
FIGURA 26- Pintura da Moça Karajá. 55
FIGURA 27- Pintura da Moça Karajá. 55
FIGURA 28- Pintura Corporal Adulto. 55
FIGURA 29- Pintura Corporal para pessoas mais velhas. 55
FIGURA 30- Pintura da Boneca. 56
FIGURA 31- Participante restaurando sua peça rachada. 57
FIGURA 32- Desenho de observação. 59
FIGURA 33- Boneca de argila, modelada e pintada. 59
10
FIGURA 34- Desenho de observação. 60
FIGURA 35- Figura em cerâmica. 60
FIGURA 36- Figura em cerâmica. 60
FIGURA 37- Desenho de Observação. 61
FIGURA 38- conjunto de figuras em argila criadas por uma participante. 61
FIGURA 39- conjunto de figuras em argila criadas por uma participante. 62
FIGURA 40- Desenho de Observação, feito pela índia participante da oficina. 63
FIGURA 41- Boneca de cerâmica, feita pela índia participante da oficina. 63
FIGURA 42- Desenhos de observação. 64
FIGURA 43- Figuras em cerâmica. 64
FIGURA 44- Criação em argila de uma figura bem elaborada, 65
participante compareceu apenas na primeira aula.
FIGURA 45- Modelagem em argila de uma figura criativa, 65
participante compareceu apenas na primeira aula.
FIGURA 46- Mesma figura em argila vista de dois ângulos, 65
participante compareceu apenas na primeira aula.
FIGURA 47- Modelagem em argila, participante compareceu apenas na primeira aula. 66
FIGURA 48- Gráfico das categorias profissionais dos participantes. 67
FIGURA 49- Gráfico mostrando as idades dos participantes. 67
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 11
CAPÍTULO 1
A INSERÇÃO DA CULTURA MATERIAL INDÍGENA NA EDUCAÇÃO:
NOVAS METODOLOGIAS 17
1.1.O multiculturalismo como essência metodológica 18
1.2. As possibilidades emancipatórias da Proposta Triangular 20
e da Educação Patrimonial
CAPÍTULO 2
A FIGURAÇÃO NA ARTE DOS ÍNDIOS KARAJÁ 25
2.1.Técnicas de confecção da cerâmica karajá 39
CAPÍTULO 3
PROJETO EDUCATIVO: MUSEU E EDUCAÇÃO 43
3.1 A multiplicação educacional: A figuração cerâmica dos índios 44
Karajá
3.2. Reflexões a cerca dos Resultados 58
CONSIDERAÇÕES FINAIS 71
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 73
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 76
ANEXO A- Questionários Aplicados na oficina 77
12
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo promover uma reflexão sobre o modo como a
Educação Patrimonial e a Proposta Triangular podem contribuir para a inserção do estudo da
cultura indígena na educação - formal e informal - relacionando as potencialidades
emancipatórias, fundamentadas no Multiculturalismo.
A aproximação de diferentes métodos de ensino que consideram o objeto cultural como
principio “instrumental” para a construção do conhecimento – tendo em vista que os objetos
artísticos/culturais são uma realidade a serem exploradas, investigadas e discutidas –
constituem, basicamente, a questão explorada nesta pesquisa:
É possível a aproximação de diferentes métodos de ensino que consideram o objeto
cultural como fonte primária de conhecimento, com a intenção de contribuir para a inserção
da cultura indígena na educação formal e informal?
Quais são os pressupostos pedagógicos nas metodologias de ensino que consideram o
objeto cultural como fonte primária de conhecimento?
Esses pressupostos possuem relação com as diferentes metodologias?
A possibilidade deste estudo monográfico aconteceu por meio de várias experiências e a
convivências com pessoas exemplares durante o curso de Artes Plásticas da Universidade
Federal de Uberlândia.
Depois da iniciação cientifica, voltada para a questão teórica sobre a atribuição de valor
histórico na identificação de Patrimônio; do contato direto com o acervo de cultura material
indígena no Museu do Índio de Uberlândia; das experiências desenvolvidas na disciplina de
Prática de Ensino 2 e 3, com a professora e orientadora Raquel Mello Salimeno Sá; e do
entrosamento com profissionais como Lídia Maria Meirelles e Valéria Silva de Lima do
mesmo museu, foi possível delimitar um estudo que mais se aproximasse dessas vivencias.
O fato de não ter feito, anteriormente, uma reflexão mais aprofundada sobre arte-
educação, foi também uma das razões que me instigaram a buscar essa experimentação.
Pensando no educador como difusor cultural imaginamos que ele possui, pelo menos, um
conhecimento crítico sobre as culturas de sua nação. Contudo, há indícios de que ainda
existem professores que não atuam com esta postura na sala de aula.
A experiência da diversidade cultural – ou a experiência da vivência democrática - de
relacionar a vida dos alunos com as outras culturas, gera um conhecimento abrangente do
mundo e de si mesmo. Desta forma, o ensino da arte não deve prender-se a uma única
concepção de arte e a uma cultura especificas.
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Nesse sentido propomos, oferecemos aos educadores - formais e informais - uma oficina
de arte, por meio do Projeto de Extensão Universitária - Educação, Arte e Cultura: conceitos
e métodos - aprovado pelo MINC (Ministério da Cultura), na sua segunda edição, procurando
somar esta a outras experiências já realizadas por estudantes do curso de artes visuais que
também trataram do tema em questão.1
A oficina foi planejada tendo como objeto de estudo a cerâmica figurativa encontrada
entre os índios Karajá, e que hoje existe uma parte no Museu do Índio de Uberlândia.
O conhecimento artístico e cultural desenvolvido por essa oficina foi direcionado a
professores, estudantes, e profissionais envolvidos com a educação e interessados em
participar dessa oficina piloto. A oficina teve o acervo do Museu do Índio de Uberlândia,
especificamente, a coleção das Bonecas Karajá como fonte primária para a construção do
conhecimento, e ao desenvolvimento da expressão artística e criativa.
Acreditando ser preciso que as novas gerações cresçam com o sentimento de interação
entre as diferentes culturas que as cercam e valorizando nossos antepassados para a
construção do presente, procuramos aliar ao crescimento expressivo e criativo individual as
marcas indígenas encontradas em nossa civilização até o momento atual, tornando possível o
desenvolvimento de projetos de ensino espelhados nessa cultura, raiz da nossa história.
A responsabilidade social está expressa nesse projeto, já que existe um compromisso com
a difusão e a preservação da cultura indígena, além de proporcionar aos educadores e a
futuros educadores o contato com o fazer artístico.
Repetindo as palavras de Ana Mae Barbosa (1975), verifica-se que a importante relação
entre educador e aluno está sendo trabalhada e compreendida de forma completa e totalizante.
É preciso que os professores saibam que não é qualquer método de ensino da Arte que corresponde ao objetivo de desenvolver a criatividade, da mesma maneira que é preciso localizar a Arte da criança no complexo mais totalizante da criatividade geral do individuo. (BARBOSA, 1975, p.89)
A intenção da oficina, realizada durante a pesquisa, foi oferecer um contato ainda
pouco explorado pelos envolvidos na educação com as culturas base da nação brasileira -as
indígenas, que muitas vezes são mantidas à distância. É preciso que as crianças se aproximem
dessas culturas não só no Dia do Índio, para eliminar o surgimento dos estereótipos que geram
ações preconceituosas contra esses povos, necessitando-se para isso da ampliação da nossa
visão de mundo e dos sentimentos de direitos humanos. 1 Referimo-nos às monografias do curso de licenciatura em Artes Plásticas de Marcelo Messias Ponchio – “O grafismo indígena na pintura corporal: do corpo ao papel”, e de Fabiana Barbosa Sedoguchi – “A tecelagem dos indígenas brasileiros”.
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Sabe-se que a criança e o adolescente são capazes de compreender e enriquecerem- se
com outras culturas, pois estão numa fase de crescimento intelectual e criativo, abertos a
novas experiências e contatos. Portanto, ensinando um pouco da cultura indígena aos
profissionais da educação e aos futuros educadores, é possível atingir muitas crianças ao
longo do tempo. Pensamos nesses educadores como multiplicadores desses conhecimentos.
A oficina estabeleceu uma relação entre os provedores de saberes, o Museu e a cultura
dos povos indígenas utilizando recursos atualizados, que estimularam o interesse pela
pesquisa e pela criação em arte.
O principal objetivo foi gerar novas percepções visuais sobre sua constituição cultural,
que sobrepusessem àquela imagem capitalista, consumista e sem muita graça, quanto à
criação e à inovação das artes manuais. Propiciamos o contato com uma atividade plástica: a
modelagem da argila e o desenho, junto com uma discussão investigativa e exploratória da
cultura material dos índios Karajá.
Os participantes fizeram “parte do museu”, no qual puderam sentir-se mais próximos
desse ambiente e dessa cultura, e onde foram tocados pelo respeito aos valores que eles
abrigam.
Esta pesquisa entra em consonância com as intenções atuais do governo de valorização
da cultura indígena, pois foi aprovada e sancionada a Lei 11.465/08 pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, no dia 10 de março de 2008, que diz respeito à inclusão, no currículo
oficial da rede de ensino, a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e
Indígena”. Nelson Inocêncio, coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da
Universidade de Brasília (UnB) e outros estudiosos do assunto, acreditam que, depois da
criação da lei, houve um pequeno aumento no número de publicações e oficinas sobre essa
questão. Entretanto, o problema não está só na falta de ensino da cultura Afro-Brasileira e
Indígena, e sim na má qualidade do ensino.
A lei é fundamental, mas a eficácia dela depende do processo de qualificação das
pessoas que vão estar em sala de aula ensinando. Segundo Lucia Fernanda Jófej, diretora
executiva do Instituto Indígena Brasileiro de Propriedade Intelectual, é um passo
importantíssimo que pode ajudar a corrigir os erros históricos de omissão ou equívoco das
escolas quanto à cultura indígena, uma vez que uma parcela das escolas conta a história de um
ponto de vista eurocêntrico.2
O “mercado educacional” abrirá caminhos para estudos mais aprofundados sobre a
história da África e dos africanos, a luta e a cultura dos negros e indígenas no Brasil,
2 JUNGMANN, Mariana. Lei inclui ensino sobre a cultura indígena no currículo escolar. Disponível em <http://www.nossasaopaulo.org.br/portal/node/372> Acesso em 15 fev. 2009.
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abrangendo uma demanda de professores interessados em se especializar. É possível que
demore algum tempo para que a maioria das escolas tenha profissionais capazes de ensinar
com profundidade, adotando tal abordagem, mas é com esse incentivo que as mudanças
poderão acontecer.
A medida vale para as escolas de ensino fundamental e médio, públicas e privadas, e
deverá fazer parte de todo o currículo escolar, especialmente nas áreas de educação artística,
literatura e história. A proposta tem a finalidade de enfatizar a contribuição desses grupos para
as áreas social, econômica e política na formação da população brasileira.
Portanto, esse é um momento importante para trabalhar com os professores
interessados em se qualificarem e conhecerem a cultura indígena muito além dos padrões
descontextualizados como falar de ocas, cocares e caciques. Há muito a ser explorado e
desenvolvido em sala de aula. Observando a necessidade expressa pelos próprios professores
que participaram da oficina, essa experiência pode ser uma fonte de estudo para os
interessados em abordar a cultura indígena nas aulas.
O desenvolvimento deste trabalho foi estruturado conforme as discussões
metodológicas e culturais nele apresentadas.
A construção dos conceitos e das relações entre as metodologias se deram de forma
ordenada. No primeiro momento percorremos os pontos essenciais para a compreensão de
duas abordagens que apontam para as metodologias de ensino. Dessa forma foi possível
conhecer as noções gerais de cada metodologia para que assim as analisássemos como
parceiras de ideais.
Tanto para a concretização desta pesquisa como da oficina, foi preciso realizar um
levantamento teórico que fundamentasse essa possível relação metodológica entre as
propostas de ensino, com o intuito de promover uma ação em favor da inserção da cultura
indígena na educação dos não indígenas. Verificando a discussão sobre ambas, constatamos
que consistem em provocar situações de aprendizado sobre o processo cultural, seus produtos
e manifestações, despertando nos alunos o interesse em resolver questões significativas para
sua vida pessoal e coletiva.
É evidente a importância dos conhecimentos culturais, além das disciplinas básicas
como português, matemática, história, ciência e geografia. A arte-educação, como também
essas, tem o papel e o dever de provocar situações de aprendizado que envolva na
conhecimento, o interesse e o questionamento de seus ambientes culturais, facilitando assim a
conscientização dos patrimônios e da história que constituem sua nação e sua vida.
16
Esse estudo de cunho exploratório poderá ser mais uma referência, que somada a
outras igualmente importantes, poderá auxiliar alunos e professores de artes visuais que
queiram atuar nessa área de dimensão social, artística, pedagógica e antropológica.
17
CAPÍTULO 1
A INSERÇÃO DA CULTURA MATERIAL INDÍGENA NA EDUCAÇÃO:
NOVAS METODOLOGIAS
Neste capítulo, a atenção será voltada para as noções gerais quanto à abordagem da
educação, essencializada no patrimônio cultural como um transmissor de signos expressivos.
A cultura deve ser entendida como, segundo Vidal e Silva (1995), um código simbólico
partilhado pelo mesmo grupo social, atribuindo significações ao mundo e expressando a
compreensão da vida. Na essência do patrimônio haverá a presença da cultura, abarcando uma
memória individual e/ou coletiva.
A construção da identidade de cada indivíduo, e também de uma comunidade, nasce
das experiências vivenciadas e compartilhadas, cujos significados e sentidos são expressos e
representados por signos que compõem o patrimônio cultural, e sua concretização pode ser
material ou imaterial. (VIDAL; SILVA, 1995)
Nesse mesmo sentido, pode-se dizer, em noções gerais, que o Patrimônio se constitui
em uma rede simbólica do homem relacionado ao conhecimento acumulado - à memória. “A
memória se concretiza, muitas vezes, em artefatos que vão desde um documento escrito até os
grandes monumentos arquitetônicos. Esses bens patrimoniais tornam próximo o que é distante
no tempo e no espaço.” (MEIRA, 2004, p.36)
O sentido de Patrimônio pode abrigar dezenas de conceitos diversos. Na sua origem
latina, - patrimonium - encontra-se a associação entre a noção de paternidade e de pátria;
pressupondo ainda as noções de herança, legado, posse. Já Lemos (1985), define como
Patrimônio Cultural tudo o que está ligado às construções antigas e seus pertences,
representativos de gerações passadas.
Portanto, o Patrimônio pode ser compreendido como o próprio ecossistema do
homem, e também como o ambiente que fabrica para si, situando-se, ele próprio, no âmago
desse processo de construção, usualmente chamado de cultural. Neste sentido, vale lembrar
que o significado dos artefatos culturais não se encontra neles próprios, mas é dado pelas
múltiplas e dinâmicas inter-relações que se estabelecem entre estes e o homem. Compreender,
neste contexto, o dinamismo destas inter-relações, é fundamental, pois os significados em
jogo não são estáticos, mas pelo contrário, se encontram em permanente movimento,
transformando-se continuamente através dos diversos deslocamentos que estes artefatos
sofrem -temporais, culturais, sociais, históricos, etc.
18
Nesta pesquisa tanto as metodologias como a temática indígena estudadas fazem parte
do universo da cultura como experiência humana, que intermediam as relações de indivíduos,
entre si, e com a natureza. A noção de cultura é a base para a compreensão e definição deste
estudo, e relacionado a este a Arte Karajá encontra-se como código simbólico a ser explorado
nas duas metodologias que têm seus fundamentos ligados ao multiculturalismo.
Maria Horta, importante e atuante pesquisadora do processo educacional baseado no
diálogo entre as diversas culturas diz que:
Trabalhar educacionalmente com o patrimônio cultural não pode ser apenas uma tarefa de passagens de informações e discursos pré-fabricados (...) mas levar o aluno ou o aprendiz, no processo de conhecimento, a identificar os ‘signos’ e os significados atribuídos às coisas por uma determinada cultura, a mergulhar no universo dos sentidos e correlações que elas oferecem à descoberta (...) e finalmente, a envolver-se afetivamente com elas, através de vivências e experimentações, de modo a ser capaz de apropriar-se desses ‘signos’ e textos culturais, incorporando-os ao sistema de sua ‘enciclopédia’ mental. (HORTA, 1979, p. 31)
Essa reflexão vai além do acúmulo de conhecimentos, devendo-se empreendê-la
dentro de um processo contínuo de transmissões de crenças, valores e saberes. Pode-se dizer
assim que o Patrimônio cultural exprime um conjunto de valores tangíveis e intangíveis,
expressos por imagens, palavras, objetos, monumentos, celebrações, a serem identificados e
compartilhados pela comunidade. Com essa definição em mente, é possível compreender que
a cultura compõem-se de significados, ideias e concepções, acompanhando o dinamismo da
própria vida. Esses significados se expressam através de práticas sociais, através do discurso e
das manifestações artísticas de um povo.
Abordando a questão indígena pode-se, por exemplo, desenvolver no aluno a
percepção de que uma panela de cerâmica foi elaborada tecnicamente, por indivíduos com a
capacidade de produção de diversas formas e estéticas, e também levá-lo a compreender os
costumes e crenças desse povo. Segundo Horta (1999), quando um individuo conhece a idéia,
o significado, a técnica de criação e a importância do objeto para a cultura material específica
de uma comunidade, consegue dar um valor para esse objeto no interior de si. Esse indivíduo
torna-se capaz de ser um cidadão consciente frente às singularidades culturais.
O sistema de objetos, no sentido amplo do termo, pelo fato de apresentar um lado sensível, visual, auditivo, configura-se em um recurso pedagógico inestimável para uma compreensão rápida e direta de contextos transculturais, e menos sujeito a preconceito e a atitudes estereotipadas frente a povos sobre os quais estudantes e professores podem ter, ainda, relativamente pouco conhecimento. (VIDAL; SILVA, 1995, p.370)
19
O objeto cultural indígena, como também de outra cultura, pode possibilitar um
aprendizado de técnicas, crenças e tradições para os estudantes não índios, transportando os
dois mundos, de forma a permitir vivências diversas. A educação, como comunicadora de
culturas, é capaz de apresentar aspectos fundamentais da existência humana, como:
inteligência, criatividade, sensibilidade, e levar os alunos a reconhecerem as diferentes
concepções de mundo. (VIDAL; SILVA, 1995)
Para se entender uma cultura, a antropologia aconselha a nos dirigirmos ao encontro
do sistema de objetos/artes para conhecermos as formas expressivas da cultura do povo que os
produziu, pois esses são produtos de uma história. Através do objeto é possível investigar qual
seria a ideia e o propósito de construção do mesmo, identificando aspectos cognitivos e
simbólicos. Ou seja, o objeto, como cultura material, remete também a tradições e aos modos
de vida variados que o identificam e simbolizam como único e específico –mesmo que os
homens tenham influências de outras culturas, é possível encontrar as tendências próprias.
(VIDAL; SILVA, 1995)
Por “aspectos cognitivos” entende-se todos os conhecimentos relativos às matérias-primas (identificação, seleção, manuseio) e a técnicas de produção do objeto, incluindo todos os procedimentos mentais (perceptivos, lógicos, matemáticos) e sensíveis (relativos à estética e à criatividade artística) necessários para a fabricação e utilização dos objetos que ultrapassam o seu sentido literal mais imediato. (VIDAL; SILVA, 1995, p.380)
O importante nessa reflexão é entendermos como o fato dos objetos da cultura
material estão além da relação entre os domínios material e não material de cada cultura, nos
quais é possível perceber a criatividade e a originalidade. A cultura torna o homem capacitado
a relacionar, valorizar e atribuir pensamentos simbólicos, que sempre estarão em constante
transformação. Por conseguinte a educação que aprofunda sua força no conhecimento e na
interação dos povos e suas culturas possibilita o desenvolvimento de um sujeito crítico e
atuante no mundo.
1.1 O MULTICULTURALISMO COMO ESSÊNCIA METODOLÓGICA
Na mesma sequência de raciocínio a educação e o conhecimento estão intimamente
ligados à cultura, pois esta constitui a base de pensamento que uma determinada sociedade
possui, podendo ser identificada e analisada através de seus objetos/artes, materiais ou
imateriais. A escola, como difusora da cultura, acabou caindo, em alguns momentos, numa
20
situação em que reproduz somente os modelos culturais estabelecidos por economias, poderes
sociais e políticas. A metodologia conhecida como Multiculturalista acabou reescrevendo a
história da educação, pois introduziu a ideia de diversidade cultural como ponto de
democratização dos saberes. (FRANÇA, 2003)
A expressão multiculturalismo, definida por Santos, aponta para a coexistência de
formas ou grupos culturais caracterizados por costumes, valores e sabedorias diferentes,
situados no seio das sociedades modernas. Foram construídas outras definições, com base
nessa abordagem, que receberam muitas críticas contrárias ao termo. (apud SÁ, 2007).
A denominação multicultural se encontra enraizada na literatura de várias áreas como
da educação, das artes, dos movimentos sociais, da política e da Arte-Educação pela não
existência de uma cultura homogênea e única, mas múltiplas culturas que se relacionam.
(BARBOSA, 1998)
Segundo Barbosa (1998), a intenção do multiculturalismo está voltada para um
fortalecimento da diversidade cultural ao ponto em que leve à democratização da
aprendizagem (através da procura das igualdades e diferenças), e não a uma forma de
cooptação das forças da minoria. O ensino da arte não deve se limitar a uma só arte e cultura
mas deve se opor às formas etnocêntrica ou eurocêntrica. A experiência da diversidade,
cultural ou da vivência democrática, de aprofundar e de relacionar a vida dos alunos com as
outras culturas gera um conhecimento abrangente do mundo e de si. A educação
multiculturalista permite ao aluno lidar com a diferença de modo positivo na Arte e na Vida.
As principais questões que norteiam a atitude multiculturalista no ensino da Arte são:
entender que grupos culturais diferentes têm também necessidade da Arte, mas que o próprio
conceito de Arte pode diferir de um grupo cultural para outro. Multiculturalidade não é fazer
cocar no Dia do Índio, nem tampouco fazer ovos de Páscoa ucranianos ou dobraduras
japonesas ou qualquer outra atividade clichê de outra cultura. É preciso manter uma atmosfera
investigadora na sala de aula a cerca das culturas compartilhadas pelos alunos, tendo em vista
que cada um participa, no exercício da vida cotidiana, de mais de um grupo cultural.
(BARBOSA, 1998)
O crítico McLaren (apud SÁ, 2007) classifica o multiculturalismo a partir de alguns
pontos relevantes. O que ele caracteriza como conservador é o que disfarça falsamente a
igualdade cognitiva de todas as raças, e acusa as minorias malsucedidas de terem “bagagens
culturais inferiores”, reduzindo os grupos étnicos a apêndices da cultura dominante. McLaren
relaciona esse multiculturalismo a uma visão colonizadora e à construção de uma cultura
comum, cuja estratégia é adotar um idioma só, que se sobrepõe a dialetos regionais. McLaren
ainda acrescenta a existência de outras formas de multiculturalismo, como as intermediárias
21
liberal e liberal de esquerda, que se situam entre o multiculturalismo conservador e crítico de
resistência ou emancipatório. “O entendimento do conceito de multiculturalismo passa pelo
conceito de cultura.” (SÁ, 2007).
Nesse sentido, a aplicação do multiculturalismo no ensino, depende da visão e da
postura que o professor possui em relação à diversidade cultural. Assim, a metodologia
multiculturalista adotada pelo professor vai refletir no conceito de cultura que ele possui (SÁ,
2007). Se ele tiver uma posição que “compreende a representação de raça, classe e gênero
como resultado de lutas sociais mais amplas” (MCLAREN, apud Sá,2007) isso será refletido
na ação em sala de aula.
O importante é frisar que essas noções de multiculturalismo afetam a aplicação da
Educação Patrimonial e da Proposta Triangular, conforme a postura do professor perante a
diversidade cultural. Um exemplo clássico é quando se apresenta um vaso da Antiguidade
Clássica como arte e um vaso criado pelos índios como um artesanato. Essa visão pode ser
considerada como posicionada no multiculturalismo conservador. Agora, se o educador
considerar e discutir com seus alunos outras concepções de arte, poderá caminhar para uma
postura emancipatória, apontando questionamentos sobre a resistência de um posicionamento
único. Na sistematização da Proposta Triangular, Ana Mae viu a possibilidade de uma
revolução no ensino nacional que caminhasse para a direção emancipatória. Contudo,
verifica-se a existência de professores aplicando a Proposta Triangular sob a visão
conservadora demonstrada acima. Os motivos para tal postura são vários. Nos propomos não
a discutir com profundidade esses motivos, mas a apontar algumas saídas metodológicas no
que se segue.
1.2 AS POSSIBILIDADES EMANCIPATÓRIAS DA PROPOSTA TRIANGULAR E
DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
Com o 1º Seminário sobre o “Uso Educacional de Museus e Monumentos”, realizado
em 1983, no Museu Imperial em Petrópolis, inspirado no trabalho desenvolvido na Inglaterra,
o Heritage Education, foi introduzida, em termos conceituais e práticos, a proposta
metodológica para o desenvolvimento das ações educacionais voltadas para o uso e a
apropriação dos bens culturais -a Educação Patrimonial. Contudo, verifica-se, desde a década
de 1940, que atividades e práticas já envolviam as cidades com áreas tombadas pelo IPHAN.
Eram atividades extracurriculares que objetivavam reconhecer e valorizar as referências
culturais locais, regionais ou nacionais. (HORTA, 1999)
22
A Educação Patrimonial consiste em provocar situações de aprendizado sobre o processo cultural e seus produtos e manifestações, que despertem nos alunos o interesse em resolver questões significativas para a vida pessoal e coletiva. (DWORECKI; KRULIKOWSKI, 2008, p.17)
Tal abordagem funciona como um suporte, uma ideia básica para se adotar. Ela se
constitui mais como um ideal a se seguir do que um roteiro metodológico. Esse ideal abrange
o campo da memória individual e coletiva dos cidadãos que envolvam toda a cultura e a
história herdada, ou seja, um patrimônio cultural que foi legado para esses no presente. Pode-
se utilizar das heranças dos mesmos e de outras nações, levando à compreensão de uma
diversidade cultural. Nessa definição percebe-se a influência do Multiculturalismo.
O conhecimento crítico do patrimônio pelas comunidades gera o fortalecimento dos
sentimentos de identidade e cidadania, para que assim exerçam a preservação sustentável
desses bens. Como proposta educacional, pode ser explorada, pelo seu potencial em diversas
áreas além das artes, possibilitando também aliar a história, matemática, geografia, educação
física e ciências. Os professores podem utilizar como peças-chave nas suas aulas os objetos
culturais ou, em alguns casos, as próprias edificações. É fundamental em todas as áreas do
ensino a utilização dos objetos culturais, podendo cada qual explorar e investigar conforme a
especificidade de cada área. Também pode ser adotada fora da escola, em outras instituições:
museus, teatros, hospitais, e até mesmo dentro da própria casa que carrega toda uma história
familiar. Ou seja, são legados deixados no presente, que se referem a uma história, costumes e
culturas de uma região.
As metodologias da Educação Patrimonial podem ser aplicadas em qualquer tipo de
manifestação cultural e evidência material, pois consistem em dialogar de maneira que
estimule e facilite a comunicação e interação entre as comunidades e os agentes responsáveis
pela preservação, fortalecendo parcerias para a proteção e valorização desses bens. Têm como
princípio o contato direto com os bens patrimoniais e as manifestações culturais para
conseguir sua compreensão, internalização e valorização. Ou seja, esse processo educacional
é centrado no Patrimônio Cultural como fonte primária do conhecimento e enriquecimento
individual e coletivo, entre crianças e adultos. Seu processo ativo desenvolve o conhecimento,
a apropriação e a valorização de sua herança cultural. (HORTA, 1999)
As etapas metodológicas que podem ser adotadas na Educação Patrimonial consistem:
na observação (a identificação do objeto, sua função e significado); no registro (a fixação do
conhecimento percebido, desenvolvimento da memória e do pensamento lógico, intuitivo e
operacional); na exploração (a análise do problema, o levantamento de hipóteses, discussão,
avaliação); e na apropriação (o desenvolvimento da capacidade de auto-expressão,
valorizando o bem cultural). (HORTA, 1999)
23
No início da década de 1980, aparece a Proposta Triangular que, revolucionando o
ensino, aliou-se aos ideais do multiculturalismo e suas possibilidades emancipatórias.
(SÁ, 2007) Este vem sustentando uma nova maneira de se ensinar arte em muitas escolas
brasileiras, a ponto de constituir referência nos Parâmetros Curriculares Nacionais/Arte
(PCN/Arte). Essa proposta foi testada, de 1989 a 1992, no Museu de Arte Contemporânea
da USP, pelas escolas municipais de São Paulo, que utilizaram-se da leitura das obras de
arte originais. (BARBOSA, 1994) Acreditamos, assim, que da forma como esta proposta
foi aplicada, houve uma semelhança da Proposta Triangular com a Educação Patrimonial,
pois esta se situa no ambiente do museu que preserva, salvaguarda e expõe uma cultura
considerada de valor patrimonial para o país.
Desde a década de 1940, não se percebia alguma mudança importante do rumo na
Arte-Educação. No momento dos “ismos”, do modernismo, despontam ideias, no cenário
internacional de Lowenfeld e nacional com Rodrigues, que impactaram o ensino de arte
com ênfase na livre-expressão da criança. Era uma arte contra o vigente ensino rígido de
arte. Contudo, ao longo do tempo, isso acabou gerando um esvaziamento conteudístico.
Na década de 60, destacam-se na cena internacional alguns pensadores que propunham a
volta do conteúdo. Esse movimento se cristalizou na década seguinte com o aparecimento
do DBAE (Discipline Based Art Education) nos Estados Unidos. No Brasil, calcada nesta
formulação, Ana Mae Barbosa desenvolve um conjunto de ideias que alguns estudiosos
denominam de pós-modernismo na arte-educação, a Proposta Triangular. (BERG, 1994)
Nos anos entre 1987 e 1993, a proposta foi intensamente pesquisada, influenciando
também na orientação epistemológica e metodológica do artigo 26, parágrafo 2º da LDB No.
9.394 de 1996, de forma a considerar o ensino de arte importante componente do currículo
escolar, favorecendo o desenvolvimento cultural do aluno. E em 1997, a Proposta Triangular
foi referência para as PCNs da área da Arte que, não bem explicada e exemplificada, criou
equívocos e desentendimentos no que deveriam ser a leitura e a interpretação da imagem.
(FRANÇA, 2003)
Na Proposta Triangular, a natureza epistemológica relaciona três ações
consideradas como os vértices da triangulação: a produção artística, a apreciação estética,
e a informação histórica. Responsável pela sistematização desta proposta, Ana Mae,
defende a ideia de um ensino multicultural que reforce as alianças entre a arte e estética
dos alunos com base no seu ambiente. Esta proposta provoca, na atualidade, discussões
em torno do multiculturalismo na educação e na cultura visual. (SÁ, 2007).
Na área de Ensino da Arte, têm ocorrido muitos estudos em torno de teorias de ensino-
aprendizagem no intuito de compreender, operacionalizar e responder: como os alunos
24
aprendem Arte; o que é importante ser ensinado em artes; como os conteúdos de
aprendizagem em artes podem ser organizados. (BARBOSA, 2002)
Ana Mae apresentou e aplicou a Proposta Triangular no ensino da Arte de modo a
envolver o inter-relacionamento entre a Arte e o aluno, por meio de três ações básicas: ler ou
observar, o fazer, e o contextualizar. Maria de Lourdes Parreira Horta propõe para a Educação
Patrimonial: decodificar/ codificar, experimentar, informar e refletir; esta apropria-se de um
objeto (podendo ser artístico, cultural ou histórico) como fonte primária de estudo e reflexão,
aquela, da arte no seu sentido mais amplo.
Reconhecendo as possibilidades emancipatórias de ambas, a finalidade do que se
segue é compreender as possíveis semelhanças entre a Educação Patrimonial e a Proposta
Triangular. Em ambas, a proposta educacional é centrada numa fonte primária de
conhecimento, uma criação cultural, que gera o enriquecimento do aprendizado a partir das
experiências e do contato direto com essas evidências e manifestações da cultura. A
valorização da cultura depende, assim, da busca do conhecimento. (HORTA, 1999)
As duas ações educacionais passam pelo mesmo processo de aprendizado cultural: a
Educação Patrimonial permeia a capacidade de observação, análise e interpretação, de forma
a ampliar o conhecimento do mundo, e a Proposta Triangular percorre o caminho da
interpretação de uma manifestação artística e cultural com o mesmo objetivo. Outro momento
passado por ambas é o da exploração e fixação do conhecimento observado na evidência
cultural estudada. Na Educação Patrimonial essa etapa é conhecida como Registro; já na
Proposta Triangular, quando é desenvolvida a atividade de compreensão da temática,
relaciona a cultura material ou imaterial com alguma comunidade, esta é conhecida como
Contextualização.
O último momento, que pode ser trabalhado em qualquer etapa da proposta
educacional, é quando os alunos têm a possibilidade de desenvolver a capacidade criativa de
expressar suas ideias, podendo ser feitas atividades plásticas e também outras atividades,
como por exemplo, dramatizações. Portanto, é possível observar que as duas propostas
educativas resultam no mesmo processo de construção de conhecimento. E, nesse sentido, foi
montado um desenho demonstrativo das ações metodológicas de cada uma. Criou-se também
uma tabela exemplificativa, identificando a semelhança entre as atividades e objetivos de cada
etapa, de forma simplificada e de fácil visualização das similaridades dos resultados.
25
1- PROPOSTA TRIANGULAR 2- EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
Contextualizar Exploração / Registro
Fazer Analisar Apropriação Observação
PROPOSTA TRIANGULAR EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
ETAPAS ATIVIDADES OBJETIVOS Contextua- lizar
Seminários, pesquisas, busca de informações em outros lugares, pesquisa com a família, etc.
Compreender conexões lógicas e históricas entre a cultura material ou não com alguma comunidade.
Fazer
Desenho, pintura, escultura, gravura, colagem, modelagens, fotografias, releituras, etc.
Desenvolver expressão plástica e dominar técnicas de produções artísticas.
Leitura/ Análise
Conversas, debates, discussões, jogos com imagens, através de perguntas, etc.
Despertar a capacidade crítica, ampliar o vocabulário de Arte, conseguir compreender e interpretar uma obra de arte.
ETAPAS ATIVIDADES OBJETIVOS Exploração
Registro
- Análise do problema, levantamento de hipóteses, discussão, avaliação, pesquisa em outras fontes. - Desenhos, descrição verbal ou escrita, gráficos, fotografias, maquetes, mapas e plantas baixas.
- Desenvolvimentos das capacidades de análise e julgamento crítico, interpretação das evidências e significados. -Fixação do conhecimento percebido, aprofundamento da observação e análise crítica; desenvolvimento da memória e do pensamento lógico,intuitivo e operacional.
Apropriação Recriação, releitura, dramatização, interpretação e expressão pela pintura, escultura, dança, etc.
Envolvimento afetivo, internalização, desenvolvimento da capacidade de auto-expressão, apropriação, participação criativa, valorização do bem cultural.
Observação
Exercícios de percepção visual / sensorial, por meio de perguntas, manipulação, experimentação, medição, etc.
Identificação do objeto, sua função e significado; desenvolvimento da percepção visual e simbólica.
Fonte: Tabela de Educação Patrimonial. Horta, 1999.
26
CAPÍTULO 2
A FIGURAÇÃO NA ARTE DOS ÍNDIOS KARAJÁ
Mesmo que os objetos indígenas tenham, na maioria dos casos, o propósito funcional e
não apenas contemplativo, e que os indígenas tenham outra relação com o que nós chamamos
de arte, esses objetos, assim como os da Antiguidade Clássica que também são funcionais
deveriam ser considerados objetos artísticos pela sociedade ocidental já que, assim como os
objetos ocidentais, também representam a expressão e a estética de uma sociedade.
A vontade artística confunde-se com o propósito de atender a necessidades sociais: deve-se pensar na produção de objetos destinados a transporte e armazenagem, ou constituindo peças de mobiliário como redes e bancos, entretanto evidenciando muitas vezes um gosto pela elaboração formal, presente nas combinações colorísticas e no que concerne aos padrões ornamentais de desenho, e também em detalhes de acabamento. (COSTA, 1983, p. 7)
Arte é uma categoria criada pelo homem ocidental. E, mesmo no Ocidente, a sua
consideração está longe de ser um consenso. Então, como dizer da aplicação desse termo em
manifestações plásticas de povos que nem ao menos possuem palavra correspondente em suas
respectivas línguas? E qual a diferença de significação cultural entre os artefatos indígenas e
os clássicos do ocidente? Ambos são uma representação estética de uma dada época e de uma
sociedade, que observava de forma diferente seu ambiente e o convívio cotidiano. Conhecer
esses objetos artísticos é permitir um respeito valorativo pela vida e cultura do outro.
Há diferenças significativas de valores na produção estética ocidental e indígena, as
quais podem ser observadas na figuração em cerâmica Karajá. Na arte escultórica de tradição
ocidental, são dignificadas as de maiores proporções e em materiais mais nobres. Entre os
Karajá, por exemplo, a sua arte figurativa tem o caráter de miniatura e a utilização do barro e,
algumas vezes, da madeira. Diante dos não índios a arte Karajá pode parecer pobre, até pelo
fato da não importância de o artista ser conhecido, não há obras assinadas, nem premiações.
Em cada cultura deve-se valorizar e observar as maneiras diferentes de ver o mundo, com
mútuo respeito. (FARIA, 1959)
Na realidade o valor de arte Karajá não pode ser aferido por aqueles escalões. Nem mesmo os critérios ordinários, dominantes na crítica de arte erudita, podem ser empregados na análise do seu sentido, da sua importância e do seu significado como linguagem plástica, que fala de um universo de valores que não é o nosso. (FARIA, 1959, p.14)
27
As formas de manipular os materiais naturais, como pigmentos, plumas, fibras
vegetais, argila, madeira, pedra e outros materiais é que conferem a singularidade da produção
ameríndia. Isto é o que a diferencia da arte ocidental, como também da produção africana ou
asiática. Através de uma visão geral, as artes indígenas têm características comuns, mas
quando analisadas separadas por povos e línguas, verificam-se diferenças e semelhanças, pois
cada povo possui particularidades na sua maneira de se expressar e de conferir sentido às suas
produções. As distinções entre povos são identificadas pelos antropólogos e etnólogos através
do dialeto linguístico. (FILHO, 1999)
Hoje, estima-se existir no Brasil cerca de 180 línguas indígenas, das quais umas são
mais semelhantes entre si do que outras, revelando origens comuns e processos de
diversificação ocorridos ao longo do tempo. Os especialistas expressam essas comparações
através da ideia de troncos e famílias lingüísticas. A sentido de tronco está relacionado a uma
língua que tem origem em tempos passados. As línguas de uma mesma família mostram o
resultado das separações linguísticas de um mesmo tronco. Dentro de uma mesma família é
onde se encontram as maiores semelhanças. No Brasil, existem dois grandes troncos, Tupi e
Macro-Jê; e outros dois troncos, o Karib e o Aruak, que estruturam as línguas indígenas.
(FILHO, 1999)
Ver o quadro explicativo do tronco linguístico Macro-Jê que deu origem à língua
falada pelos índios Karajá.
FIGURA 1- Quadro explicativo do tronco linguístico Macro-Jê.
FONTE: http://pib.socioambiental.org/pt
28
Segundo as pesquisas apontadas no Museu do Índio do Rio de Janeiro, estima-se que a
população indígena atual está distribuída em 562 regiões, com cerca de 315.000 índios. A
maioria (70%) dos 206 povos (ou etnias) está concentrada numa parcela da Amazônia Legal,
que engloba os Estados: Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia, Mato Grosso, Amapá,
Rondônia, Tocantins, Pará e parte oeste do Maranhão. Há, ainda, 40 povos isolados na
Amazônia Ocidental. (DIVERSIDADE, 2008)
Hoje, há Terras Indígenas (TIs) que precisam ser demarcadas e outras que estão em
processo de reconhecimento; infelizmente há terras não demarcadas que sofrem com conflitos
e polêmicas. Por parte do Estado, esse capítulo de reconhecimento das Terras Indígenas ainda
não está encerrado, agravando as péssimas condições dos índios que necessitam da natureza
para a sobrevivência.
Os índios Karajá fazem parte dos povos que habitam há séculos as margens do rio
Araguaia, que percorre os Estados de Goiás, de Mato Grosso, do Pará e do Tocantins. Apesar
da grande utilização deste rio hà vários séculos, eles mantiveram os costumes tradicionais do
grupo como: a língua nativa, as bonecas de cerâmica, as pescarias familiares, os rituais como
a Festa de Aruanã e da Casa Grande (Hetohoky), os enfeites plumários, a cestaria, artesanato
em madeira e as pinturas corporais, como os característicos dois círculos na face. Contudo,
estudos antropológicos verificaram uma mudança estética, mas que não alterou por completo
suas artes. (FILHO, 1999)
Segundo a Funai, encontram-se aproximadamente 2.532 índios Karajá no Brasil,
distribuídos por 29 aldeias, localizadas preferencialmente próximas aos lagos e afluentes do
rio Araguaia e do rio Javaés, assim como no interior da ilha do Bananal. Cada aldeia
estabelece um território específico de pesca, caça e práticas rituais, demarcando internamente
espaços culturais conhecidos por todo o grupo. (FILHO, 1999)
Quanto à situação jurídica das terras dos Karajá, podemos relacionar: Parque Indígena do Araguaia (Ilha do Bananal) — área total de
1.358.500 hectares, homologada e registrada. Karajá de Aruanã — Área I (GO) com 14 hectares, Área II (MT) com
893 hectares e Área III (GO) com 705 hectares, todas homologadas e registradas.
São Domingos, com 5.705 hectares, no município de Luciara (MT), homologada e registrada.
Maramduba, com 375 hectares, no município de Santana do Araguaia (PA), homologada.
TI Tapirapé/Karajá, com 66.166 hectares, no município de Santa Terezinha, Lumiara e Pomodoro
Karajá/Santana do Araguaia, com 1.485 hectares, no município de Santa Maria Barreiras (PA), homologada e registrada. (FILHO, 1999)
29
São os índios Karajá responsáveis por um tipo de atividade artística peculiar, a
confecção da representação plástica de figurinhas humanas, zoomórficas e místicas, que os
ocidentais chamam de bonecas Karajá. Eles superam em muito na interpretação da morfologia
humana ou zoológica, com excelente observação da realidade, outros grupos indígenas do
Brasil e, segundo Mario Simões, quiçá das Américas.
A origem das bonecas Karajá é antiga, de uma época alheia ao contato com a
civilização ocidental. Existe uma lenda que conta Wexiru, uma jovem mãe Karajá, não
possuindo um brinquedo para a sua filha, fabricou para ela a primeira litxokó, fazendo-a
porém em cera de abelha. Como esse material não era bom para essa finalidade, Wexiru
providenciou outra matéria-prima mais consistente e, de experiência em experiência, chegou à
boneca de barro dos dias atuais. (SIMÕES, 1992)
Os índios Karajá habitam as margens do curso médio do Rio Araguaia, na região
centro-oeste do Brasil. A língua Karajá, do tronco linguístico Macro-Jê, apresenta três
distinções: Karajá, Javaé e Xambioá, e estas comportam maneiras diferenciadas de falar de
acordo com o sexo do falante. Em algumas aldeias, em decorrência do processo de contato
com a sociedade urbana, a língua portuguesa passou a ser dominante. (COSTA, 2005)
Desde o século XVIII, este rio faz parte do sistema fluvial onde mantém a
comunicação permanente entre as zonas centrais dos Estados de Mato Grosso e Goiás, e as
localidades situadas ao sul do Rio Amazonas. Como consequência dessa utilização antiga do
sistema fluvial Araguai-Tocantins, os índios Karajá, que habitavam essa região, sempre
tiveram contato com a população de cultura ocidental. Apesar do contato ser pacifico,
etnólogos e antropólogos que analisaram as bonecas em cerâmica de diferentes épocas,
verificaram uma alteração. Dentre os trabalhos mais importantes, encontram-se os de
Ehrenreich (em sua viagem em 1888), de Fritz Krause (do inicio do século XX), e do
antropólogo norte-americano W. Lipkind em 1939. Contudo, L. de Castro Faria afirma que,
nas obras desses estudiosos não há uma contribuição significativa a respeito da arte figurativa
desses índios, nem do ponto de vista estético e nem da etnologia, mesmo que Ehrenreich
tenha apontado que essa produção em barro seja “a atividade artística mais importante dos
Karajá”, ele apenas descreve de forma concisa algumas das 52 peças de sua coleção. (FARIA,
1959)
Nas obras em geral encontram notas pequenas e até inexpressivas ao mesmo material,
como por exemplo por Gastão Cruls na obra As Artes Plásticas no Brasil, considerava as
peças são tratadas simplesmente como “bonecos de cerâmica” e “brinquedos para as
crianças”. (FARIA, 1959)
30
O rio Araguaia é a grande referência para os Karajá. A vida social e mitológica gira
em torno da ilha do Bananal, a maior ilha fluvial do mundo. As aldeias são edificadas
próximas aos lagos e afluentes do Araguaia, do rio Javaés e no interior da ilha, com seus
territórios específicos de pesca e caça, além daqueles reservados ao cultivo de plantas
utilitárias e comestíveis, nas florestas de galeria. Na época da estiagem, constroem casas
temporárias às margens dos rios e lagos para a pesca de peixes e de tartarugas. (COSTA,
2005) “A arte figurativa dos índios Karajá é representada principalmente por pequenas figuras humanas
modeladas em barro, com atributos morfológicos ou culturais que identificam não só o sexo, como a
idade e até mesmo a condição social.” (FARIA, 1959, p.4)
Essas figuras, designadas como bonecas Karajá apresentam uma forma singular, que
as tornam inconfundíveis. É possível que os etnólogos não tenham dedicado maior atenção ao
estudo dessas peças por causa das conotações culturais entre boneca e brinquedo de criança,
os quais são muitas vezes desconsiderados pelos etnólogos, ou seja, não são identificados
inicialmente como peças de arte. (FARIA, 1959)
O reconhecimento de uma particular expressão estética como Arte lhe confere
atributos maiores na cultura, e essa atividade em cerâmica dos Karajá, como as pinturas
corporais, as peças de vestuário e de adornos indígenas se tornaram uma arte singular
indígena. Muitas delas indicam a idade e estado social. Assim, essa arte representa o Karajá -
o homem, a mulher, casado ou solteiro, jovem ou velho.
A escolha do corpo e das representações associadas, na cerâmica Karajá, não é ao
acaso. Os índios consideram o corpo como um material simbólico, pelo qual expressam
ideias, valores éticos e estéticos. O corpo é como um instrumento de reprodução da vida diária
indígena (ver figura 2) -corta, adorna, perfura e pinta-o. (GONÇALVES, 2008)
31
FIGURA 2 – Bonecas Karajá (cerâmica moderna)- Foto: Maikon Rangel- Acervo Museu do Índio
Uberlândia
Os índios que habitam as margens do rio Araguaia possuem distinções funcionais na
aldeia entre homem e mulher. Cabe aos homens: A defesa de seu território, fabricar objetos de uso pessoal e coletivo feitos com algodão, penas, palhas, conchas, minerais e madeira, como a canoa e remos; caçar e pescar, construir casas. Celebram também os rituais da Casa Grande e da Festa de Aruanã, relacionados à subida e descida das águas do Araguaia. Preparam a terra para o plantio do milho, batata, feijão, cará, amendoim e algumas espécies de frutas. É também tarefa dos homens, representar seu povo através das associações e nas câmaras de vereadores para intermediar o contato com a sociedade não índia. (COSTA, 2008)
As mulheres Karajá têm a obrigação de educar seus filhos, meninos até a idade do
ritual de iniciação e as meninas por mais tempo. Ela lhes ensina o preparo dos alimentos e a
confecção de artefatos. Por essa ser uma atividade exclusivamente feminina, desde pequenas
as meninas observam suas mães a moldarem argila. Além da cerâmica utilitária, as mulheres
também fabricam a cerâmica figurativa que tem principalmente a função de criar brinquedos
para as crianças.As bonecas, conhecidas como litxokó, encenam a vida cotidiana, religiosa,
cerimonial e mitológica, e contribuem para a socialização das meninas. (ver figura 3). As
figuras representando animais como a onça, a tartaruga, o tatu e outros têm, como as bonecas,
uma função lúdica (COSTA, 2008)
32
FIGURA 3- Ceramista Karajá. Foto: Vladimir Kozak –Fonte: Museu Paranaense s.d
Em informações de 1959, as peças mais antigas dessa arte figurativa Karajá, datadas
por volta de 1870, estão situadas na coleção do Museu Nacional. Desse período para os mais
“recentes” (meados do século XX) estudos apontam uma distinção entre coleções
consideradas da fase antiga (ver figura 4) e as coleções da fase moderna (ver figuras 2, 5 e 6)
analisadas por Darcy Ribeiro nos anos de 1950. Elas registraram uma alteração dos padrões
tradicionais. (FARIA, 1959)
Pesquisadores comprovaram que, pelo menos, desde 1940 o número de peças da fase
moderna é superior as da produção das obras de fase antiga – podendo este ser um elemento
característico. (FARIA, 1959)
As figuras humanas dessa fase apresentam caráter de miniaturas, pois na observação
de Faria (1959) as peças não passam de vinte e cinco centímetros, e a menor tem menos de
sete. A modelagem em geral, seja masculina ou feminina, apresenta os membros inferiores
reduzidos a simples massas redondas, e dentro desse padrão há uma liberdade de formas que
diferem em seus volumes. Um dos elementos característicos da arte Karajá é o constante jogo
entre os volumes numa mesma peça.
Apesar de que, de uma forma geral, os Karajá representam de maneiras diferentes os
homens e mulheres. Faria os distingue principalmente pela morfologia dos órgãos sexuais
33
expostos nos homens, ou cobertos com tanga nas mulheres. Mas, é possível observar os
elementos culturais que cada um possui.
Nas figuras femininas, entretanto, o ventre é quase sempre moldado forte. A linha de contorno, a partir dos seios, inclina-se acentuadamente para fora e vai morrer pouco abaixo do umbigo, de encontro ao novo plano, que daí por diante se inclina, ao contrário, para dentro. (...)Essa saliência, por vezes, bastante exagerada, adquire um indisfarçável sabor caricatural. Trata-se, no entanto, da representação de uma realidade morfológica, apenas um tanto deformada. (FARIA, 1959, p.7)
FIGURA 4– Cerâmica Karajá antiga - Foto: Maikon Rangel –Acervo Museu do Índio Uberlândia
Segundo Faria (1959), são raras as peças com a presença de braços, servindo “de
suporte para a paramentália de circunstância”. Já o umbigo é representado em sua grande
maioria. A representação da face é esquemática, na qual aparece, muitas vezes, a tatuagem
tribal de forma circular nas maçãs do rosto.
Na fase antiga encontram-se alguns padrões na figuração cerâmica, os membros
inferiores aparecem reduzidos a simples volumes, mal diferenciados; a região dos glúteos pelo
contrário, aparece delimitado, revelando um certo sensualismo, uma expressividade plástica
onde surge uma verdadeira esteatopigia. O estudioso Fritz Krause descreve esses caracteres da
população Araguaia “nádegas de rica adiposidade constituem um elemento ideal da beleza
dos índios”. (FARIA, 1959, p.8)
Essas peças podem apresentar um modelo um tanto variável nos membros inferiores.
A melhor forma de identificação da cerâmica antiga é que, na sua maioria, não se vêem os
braços, e como as peças possuem suas formas reduzidas a volumes representativos dos
34
membros inferiores (podendo variar as formas esféricas das coxas, das nádegas, das pernas, e
dos pés em pequenas saliências). A parte inferior que há nessas distinções corpóreas são
diferenciadas e separadas por meio do estrangulamento, usando os fios de algodão para
diferenciar as partes. (FARIA, 1959)
O uso dessas amarras nas pernas é uma das características culturais dos índios Karajá,
pois eles colocavam essas faixas, ainda quando crianças, e só as tiravam quando o individuo
contraía matrimônio. A marca dessa amarração só desaparecia com a idade avançada e,
segundo etnólogos, era tida “como traço de beleza”. (FARIA, 1959)
As figuras de ambos os sexos apresentam muitas vezes adornos especiais nos braços e
pernas que os diferenciam.Os adornos como punhos e ligas, ou ataduradas para panturrilhas e
tornozelos são elementos que distinguem os indivíduos solteiros e os viúvos. (FARIA, 1959)
Outro elemento essencial na caracterização cultural das figuras Karajá é a pintura. A
expressão da pintura corporal se desenvolve sobre a superfície simétrica e harmoniosa, mas
com modelado desigual que reproduz a morfologia humana. A coloração vermelha na
decoração nos corpos é obtida com a trituração do urucum, e a preta é fornecida pelo suco de
jenipapo. Na pintura corporal, existem tanto largas manchas, como também desenhos lineares,
executados com pauzinhos molhados na tinta. Ehrenreich e Krause observam que a pintura
corporal, na sua forma altamente estilizada, representa figuras de animais, quer por simples
desenhos de silhuetas (como no caso dos morcegos), quer pelo mosaico de escamas (como na
placa colorida das serpentes). (FARIA, 1959)
Ainda sobre a pintura corporal, dizem que ela é representada geralmente da linha
mediana do ventre para o dorso, e da face anterior das coxas para as nádegas. O umbigo serve
tanto para separação dos dois planos recobertos pela pintura, como também é o centro do
desenho decorativo. (FARIA, 1959)
No primeiro momento da figuração Karajá, na cerâmica antiga, os índios não
colocavam para o cozimento essas estatuetas de barro. Contudo, todas as outras peças de
cerâmica eram cozidas com esmero. Faria (1959) comenta que, apesar da evidente escolha dos
Karajá em não cozerem essas peças por motivos fortes, nenhum dos etnólogos se preocupou
com a questão. Há um reduzido número de peças desse período.
Outra característica da cerâmica antiga observada por Faria (1959), é a maneira
exclusiva das figuras estarem sempre em pé, sem variações cênicas e composições de
posturas. Também nesse período a “arte animalista” não floresceu de uma maneira particular.
O momento conhecido como da cerâmica moderna (ver figuras 2, 5 e 6) refere-se à
concretização de experimentos revolucionários. É por volta de 1950 que a arte Karajá se
transfigura. O dinamismo criador e a procura incessante de novas formas de expressão
35
plástica a identificam como moderna. O domínio da composição é conquistado, dando-lhes a
oportunidade de realizar diversos e extravagantes ensaios escultóricos. A arte Karajá adquire
um caráter cenográfico com grande expressividade e de forte poder de sugestão. Representa
figuras agrupadas ou cenas da vida cotidiana. (FARIA, 1959)
FIGURA 5– Cerâmica Karajá moderna - Foto: Maikon Rangel –Acervo Museu do Índio Uberlândia.
Nesse período, que se estende aos dias atuais, aparecem representações em diversas
posturas, feitas com maior habilidade e liberdade na modelagem. Conseguiram representar os
braços, as pernas e o tronco com maior desenvoltura. Em consequência, as figuras deixam de
ser estáticas e adquirem movimento (ver figura 6).
FIGURA 6- Harabié (cena de casamento “harabié”, quando o noivo é carregado por um parente até a
casa da noiva). Foto: Luiz Cláudio Marigo Fonte: SIMÕES, 1992
36
Outro elemento que constitui essa fase moderna é a policromia. Como Faria mesmo
diz:
Hoje essa pintura adquiriu evidentemente uma nova feição, de fereza singular. Na intensidade do colorido, nas extensões das áreas cobertas, na irregularidade do ritmo e na falta quase geral de apuro, evidencia-se uma transformação crescente. Os cabelos e os penteados, por sua vez, que antes eram reproduzidos por meio de cilindros de cera negra, hoje são também apenas coloridos. (FARIA, 1959, p.13)
Outro elemento peculiar dessa fase são as alterações morfológicas da figura humana,
não propriamente caricatural, mas relacionada muitas vezes aos mitos e crenças (ver figura 7),
como, por exemplo, a criação de figuras bicéfalas, bonecas com várias cabeças, e quatro ou
mais seios (ver figura 8). Nesse campo parece que o artista faz inúmeros ensaios, “talvez
simples entretenimentos para o seu espírito recém-liberto de padrões mais ou menos rígidos e
monótonos”. ((FARIA, 1959, p.12)
Na fase moderna é possível encontrar também influências da fase antiga, ou seja,
segundo os padrões antigos, resgatando as expressões estilísticas. Faria (1959) aponta que
essas transformações podem ser explicadas como uma consequência da crescente solicitação
dos produtos da arte indígena por parte de viajantes. É possível observar essa influencia nas
cerâmicas ventrudas, que são figuras esféricas e sem braços, uma caricatura (ver figura 7 e 9)
com variados significados, podendo ser Kboí (homem de barriga grande), toriritxokô (boneca
de tori); e nas cerâmicas triangulares (ver figura 9) representando figuras masculinas, são
caracterizadas como antigas por preocupar em apenas simbolizar o homem com formas
geométricas. (SIMÕES, 1992)
37
FIGURA 7– Figuras Antropomórficas Karajá (cerâmica moderna) - Foto: Maikon Rangel –Acervo
Museu do Índio Uberlândia.
FIGURA 8- Inãrásonuésonué (Karajá
com muitas cabeças)
Foto: Luiz Cláudio Marigo
Fonte: SIMÕES, 1992
FIGURA 9- Kboí e hãbú (antepassado místico de grande
barriga, e homem triangular com dois orifícios
Foto: Lamônica Fonte: SIMÕES, 1992
Na cerâmica moderna o Karajá procura fixar aspectos importantes da sua vida tribal. A
figura sentada aparece nessa fase como exigência dessa composição cênica. Contudo,
surgiram alguns problemas na criação, como por exemplo, o uso da tanga na representação
das mulheres quando houve algumas dificuldades, no momento da queima da peça, não
souberam como conservar aquele elemento do vestuário feminino. E, talvez por isso, nessas
figuras tenham acentuado os seios. A “´prenhez” também é reproduzida com freqüência e
com um realismo incomum, o umbigo, por exemplo, que é representado por um orifício nas
38
mulheres grávidas, ganha forma protuberante, com volume, até exagerado, de certo modo
caricatural (ver figura 10 na encenação do parto). (FARIA, 1959)
Segundo Faria (1959), as representações cênicas com maior beleza plástica são as
constituídas por canoas tripuladas por inúmeras figuras, e algumas vezes, estão carregadas de
caça ou de pescados. A representação da atividade econômica e de rotina diária é considerada
documental, pois descreve em linguagem plástica os acontecimentos importantes da vida
tribal.
Não valem apenas como peças de arte, mas também como narração histórica figurativa, ao invés de simplesmente escrita ou verbal, da vida Karajá, ou daquilo que ela possui de mais importante e merecedor de registro, no conceito do artista e do próprio grupo para o qual este produz as suas obras. (FARIA, 1959, p.13)
FIGURA 10- Cena do Parto, posição em cócoras.
Foto: Alice Registro- Acervo Museu do Índio Uberlândia. FIGURA 11- Cerimonial do enterro,
quando o morto é levado dentro de uma
esteira.
Foto: Luiz Cláudio Marigo -Fonte:
(SIMÕES, 1992)
Faria lembra que, já nos tempos de Krause, os Karajá utilizavam as peças como
material de permuta, hoje elas adquiriram um caráter de comércio. “Desenvolveu-se assim
uma motivação muito diversa daquela que os estimulava em épocas passadas”. (FARIA,
1959, p.14)
39
Visto que o texto de Faria é de 1959, e aquela época é apontada como um momento
grave de confronto de ideais e de sobrevivência, em que há conformidade integral aos padrões
da própria cultura e o desejo de corresponder às exigências de novos padrões. Hoje essa
cultura de troca de saberes, fundamentada entre os índios pode ter desaparecido, restando
apenas o comércio para a subsistência, que antes era retirada da própria natureza. Faria
comenta que, apesar de um possível caminho para a universalização dos elementos
fundamentais, em 1959 a arte Karajá nada havia perdido de seu caráter.
Após a exposição da classificação feita por Faria entre cerâmica antiga e moderna,
mostrando que há diferenças na estrutura formal entre as bonecas, convém frisar que existem
algumas características que envolvem toda essa arte, como por exemplo, a necessidade de
representação dos acontecimentos da vida cotidiana (modo de vida na aldeia, a subsistência,
os mitos e as crenças). Em estudos recentes como o de Anna Linhares, que cataloga e analisa
as peças do Museu Paraense Emílio Goeldi (2006), comentam-se que as bonecas antigas não
representavam os movimentos, podendo haver uma evolução estética quanto à educação dos
pequenos índios pela figuração. É possível chegar à conclusão de que a arte figurativa sempre
foi significativa para os Karajá, pois eles demonstraram interesse em aprimorar sua estética e
técnica para facilitar sua utilização e manuseio.
40
2.1 TÉCNICAS DE CONFECÇÃO DA CERÂMICA KARAJÁ
. O pesquisador Mário Simões estabeleceu um estudo que visava a produção dos índios
Karajá que habitavam a Ilha do Bananal, às margens do rio Araguaia. Em seus cadernos de
campo, Simões deteve-se na confecção da cerâmica Karajá, abordando os aspectos de escolha
e preparo do barro, da modelagem, da secagem, do cozimento e da decoração. Da mesma
forma e ordem é apresentado, na sequência, todo esse processo que a argila percorre para
tornar-se a litxokó. (SIMÕES, 1992)
Primeiramente, envolve a escolha do barro, quando o homem vai até o rio e mergulha
para pegar a argila da parte mais funda do rio. Esse barro tem cor acinzentada, diferente
daquele encontrado nas margens. O melhor barro é o branco, porém é difícil de se apanhá-lo,
pois é preciso cavar muito fundo. O homem o coloca na canoa e leva para a mulher preparar a
argila. (SIMÕES, 1992)
A manipulação da argila é conhecida entre as índias iwidyky, que fazem pequenas
bolas de 15cm de diâmetro, secando-as, a fim de guardá-las (ver figura 12). Depois de secas,
essas bolas podem ser misturadas com água, tornando-se novamente massa plástica. Para isso
é acrescentado a água, a cinza da árvore cega-machado e o mawycide para dar consistência e
resistência necessárias ao barro. Após a massa estar perfeitamente amassada, são feitas bolas
novamente com uma textura mais fina, denominadas de rexihura, com cerca de 20cm de
diâmetro. E para sua utilização será somente necessário acrescentar água. Há índias que
também aproveitam os vasos quebrados durante a secagem, os quais são triturados, até
apresentarem uma textura fina, e que misturados à água se transformam em matéria para
modelagem. (SIMÕES, 1992)
FIGURA 12- Índia Karajá preparando a argila para a modelagem. - Fonte: SIMÕES, 1992
41
As mulheres realizam a modelagem, tanto das bonecas como das panelas, dos potes e
dos pratos, sentadas em cima de uma esteira, e tendo ao seu alcance uma cabaça ou vasilha
qualquer com água. É preciso amassar a bola de barro para que aos poucos surja o formato do
corpo da boneca (ver figura 13). Feito o esboço, a mulher vai retocando a figura com os dedos
molhados, até alcançar o efeito desejado. (SIMÕES, 1992)
Já a modelagem dos utensílios para cozinhar - panelas, potes e pratos - é diferente,
podendo ser de duas formas: em rolinhos ou em placas sobrepostas. A mulher tem que
amassar bem a bola de argila e achatá-la de forma manual, obtendo uma uniformidade plana.
Para as placas, primeiro são feitas a base e as paredes do fundo, espera-se secar um pouco
para conseguir uma dureza maior, para depois acrescentar outra parede, e assim
sucessivamente até alcançar a altura desejada. (SIMÕES, 1992)
FIGURA 13- Duas índias Karajá modelando bonecas com a criança ao lado. - Fonte: SIMÕES, 1992
Com as peças prontas, as mulheres deixam as bonecas secando antes de levá-las para o
fogo, colocando-as geralmente ao sol ou, em caso de chuva, elas as levam para o interior das
casas. Quando as peças estão ligeiramente secas, são levadas para uma chapa colocada sobre a
fogueira (ver figura 14). (SIMÕES, 1992)
Estando completamente secas, são levadas ao fogo, onde permanecem cerca de 1 a 2
horas, dependendo de seu tamanho. Com a ação do fogo as peças vão perdendo sua
tonalidade, até ficarem completamente claras, indicando a hora de retirá-las. Há diversas
42
maneiras de colocar as peças no fogo, tanto com lenha em volta da peça, como em buracos no
chão, encobertos por cinzas e madeiras. (SIMÕES, 1992)
FIGURA 14- Índia colocando as litxokó em cima da chapa no fogo para secá-las. - Fonte: SIMÕES,
1992
Depois de totalmente esfriadas e completamente secas, as peças são pintadas com
argila (tabatinga) vermelha (xubure), urucum, jenipapo e calcário. Nas bonecas, são pintados
primeiro os traços em preto, utilizando talo de palmeira de buriti. (SIMÕES, 1992)
Há ainda uma tinta preta retirada da árvore ixarurina, que é um ótimo fixador. A casca
da árvore é batida e macerada com pedra, misturada com água e fuligem de panelas.
Terminada a pintura em preto, a boneca é deixada a secar e, na sequência, é pintada com a cor
vermelha. Há dois tipos de pintura em vermelho, o urucum e a argila vermelha, mas com essa
última a peça deve ser pintada antes da queima. Já o urucum, consiste em ferver suas
sementes com água até formar uma pasta vermelha, que depois de seca, é guardada em bolas
pequenas. Para sua utilização, o urucum é misturado ao óleo de babaçu. (SIMÕES, 1992)
Um dos primeiros etnógrafos a estudar os Karajá, Luis Castro Faria, observou a
técnica de trituração do urucum que, comparada com a descrição de Simões, mostra uma
possível mudança em tais hábitos.
43
A argila vermelha é mais duradoura do que o urucum que, com o tempo, fica com
aparência desbotada. É importante lembrar que as bonecas da fase antiga não eram cozidas, e
logo após a secagem eram pintadas. (SIMÕES, 1992)
FIGURA 15- Índia Karajá com sua extensa produção de litxokó.- Fonte: SIMÕES, 1992
A figura 15 mostra a larga produção das bonecas que deverá ser, provavelmente,
comercializada. Contudo, mesmo com esta finalidade, o processo de criação dessa peça é
ainda acompanhado pela criança, que observa a técnica e acaba brincando com as bonecas.
Nessa foto é possível identificar as bonecas da fase moderna, pois há presença de braços e
pernas bem definidos, outras em movimento, dentro das canoas, com pote entre as pernas, e
duas figuras interagindo. A produção em larga escala também é uma característica da fase
moderna, pois demonstra o aperfeiçoamento da técnica, que evita a quebra das peças.
44
CAPITULO 3
PROJETO EDUCATIVO: MUSEU E EDUCAÇÃO
A ideia de trabalhar com a temática indígena numa oficina surgiu nas aulas de Pratica
de Ensino 2 com a professora Raquel Salimeno, hoje a orientadora desta pesquisa, para a qual
tive que produzir um projeto educativo que envolvesse a comunidade. Nesse momento
chegaram várias propostas, porém uma se destacou pelo fato de, no mesmo período, iniciar
um estágio no Museu do Índio. O principal interesse era trabalhar com a proposta da
Educação Patrimonial.
Dentro do Museu do Índio, pensou-se em trabalhar com a questão patrimonial, voltada
para a memória da cultura indígena. Primeiramente, a ideia era desenvolver a temática das
habitações indígenas, que abordaria tanto os hábitos cotidianos, os afazeres, a relação entre
pessoas, como também as diferentes construções. Apesar dessa ideia ser interessante, e com
amplo conteúdo, ainda não estava satisfeita, faltava algo de especial.
O momento do amor à primeira vista foi quando pude entrar em contato com as
Bonecas dos índios Karajá, ou litxokó, fazendo uma limpeza superficial da sujeira, embalando
e encaixotando-as para a mudança do Museu. Isto despertou meu interesse em estudá-las e
conhecer um pouco mais sobre elas. Como a professora Raquel já tinha uma experiência em
trabalhar no ensino dos não indígenas com a questão dessas bonecas3, fui incentivada e
cativada por elas.
Analisadas de perto, essas bonecas possuem diversas formas, o que demonstra o
quanto as índias que as produziram eram habilidosas e criativas, pois não há nenhuma igual a
outra. Cada boneca é única, e como sua função inicial era auxiliar na educação das crianças,
resolvemos utilizá-las também como propagadoras de conhecimentos da cultura indígena e no
desenvolvimento da criação e da observação das formas.
Com a proposta definida para a realização de uma oficina piloto, surgiu um problema
com o espaço onde íamos desenvolvê-la. Como o projeto foi todo esboçado para a oficina ser
no ambiente do Museu do Índio, ele teve que ser adiado para o semestre seguinte (o 2º
semestre de 2008), pois o museu estava no processo de mudança de sede e de reestruturação.
No entanto, no semestre seguinte ainda não foi possível sua concretização, mesmo já na sede
nova, porque o Museu ainda não estava aberto para exposição.
No 2º semestre de 2008, foi feita a primeira parte deste estudo, na disciplina Projeto 1,
quando ficou decidido aplicar a oficina no primeiro semestre de 2009. A proposta inicial 3 Desde o ano de 2002, as professoras Raquel Salimeno e Valéria Carrilho desenvolvem oficinas contextualizadas, focalizando as culturas indígenas, dirigidas a professores e estudantes do ensino básico e agentes comunitários.
45
consistia em realizar oficinas para as crianças que estudassem perto do Museu. Seria uma
oficina com três aulas em uma mesma semana. Poderíamos, num mês, oferecer quatro
oficinas para turmas diferentes, pois o interesse era possibilitar o contato com a cultura
indígena para o máximo de estudantes.
No inicio de 2009, essa proposta voltada para as crianças acabou sendo reformulada
para uma oficina dirigida a profissionais já atuantes e a alunos da graduação porque houve a
oportunidade de ministrar essa oficina dentro do Projeto de Extensão: “Educação, Arte e
Cultura: Conceitos e Métodos”, coordenado pela professora Raquel Salimeno Sá. Nele a
proposta era disponibilizar cursos diversos, abarcando temáticas de várias áreas culturais e
patrimoniais.
Estes cursos visam estimular profissionais das diversas áreas do ensino básico, bem como agentes culturais comunitários, a desvendarem, preservarem, promoverem, reconhecerem, e difundirem o patrimônio cultural coletivo na sua diversidade, e a desenvolverem programas ou projetos, que articulem a diversidade cultural presente nos espaços da educação formal e informal na cidade de Uberlândia, inserindo aí, conteúdos multiculturais que partam dos saberes e fazeres, tanto das culturas tradicionais como das culturas emergentes, considerando que a educação através da arte passa por processos de intensas transformações provenientes das novas exigências dos movimentos sociais na pós-modernidade. (SÁ, 2009)
Mesmo mudando o público alvo da oficina, foram mantidos alguns aspectos
metodológicos, como: três dias de oficinas, a metodologia da Educação Patrimonial ou
Proposta Triangular. Como o curso era voltado para os educadores do ensino básico, arte-
educadores, estudantes de artes visuais e agentes comunitários, a proposta da oficina pôde
abarcar um conteúdo teórico mais profundo, possibilitando um aprendizado cultural novo que,
por sua vez, poderá ser transmitido aos alunos dos professores participantes. Além disso, esse
público é menos inquieto e impaciente que as crianças frente a uma matéria teórica.
3.1 A MULTIPLICAÇÃO EDUCACIONAL: A FIGURAÇÃO CERÂMICA DOS
ÍNDIOS KARAJÁ
A oficina foi elaborada para se desenvolver em três dias, explorando noções teóricas
como: o manuseio da argila; as fases estéticas das bonecas, o processo de criação, a origem e
a finalidade das bonecas litxokó, e também apresentando algumas pinturas corporais. Teve
como objetivo a valorização da cultura indígena, a partir do acervo museológico expositivo e
fotografias, como uma fonte primária de conhecimento para o desenvolvimento das criações
das bonecas.
46
Por ser o público da oficina constituído de educadores, estudantes de graduação e
profissionais da educação são citados neste trabalho como participantes. A oficina foi um
momento de experimentação de uma atividade plástica que, no futuro, poderá ser ensinada aos
alunos do ensino formal e informal.
No primeiro dia, da aula, realizada em 23 de abril de 2009, foi dividida com a
professora Raquel Salimeno, que ficou com a primeira hora, iniciando uma reflexão sobre a
arte indígena em geral e a importância da inserção do estudo das culturas indígenas no ensino
formal.
Primeiramente os participantes se apresentaram citando o nome, a profissão ou o curso
de graduação que freqüenta e se já havia experimentado trabalhar com argila. Dessa forma,
foi possível verificar que havia uma mistura de profissionais, tanto professores do ensino
infantil e fundamental, como alunos de diversas áreas - letras, pedagogia, ciências sociais e
artes visuais.
No início houve uma aula expositiva, referente à etapa da Contextualização da
Proposta Triangular, e a Exploração e Registro da Educação Patrimonial. (ver em anexo a
aula no Cd) Achei importante mostrar para os participantes a diversidade cultural indígena,
apresentando a divisão de etnias pelas línguas faladas situando também as estimativas
populacionais dos índios. Calcula-se que no Brasil já chegaram a existir de 6 a 10 milhões de
índios, falando aproximadamente 1500 línguas diferentes. Atualmente, estima-se existir perto
de 400 mil índios, distribuídos em 220 grupos, e cerca de 180 línguas faladas. Foi explicado
também que a organização das nações indígenas é feita pela língua, e que existem dois
grandes troncos que estruturam as línguas indígenas: o Macro-jê e o Tupi; e outros dois
troncos, o Karib e o Aruak.
Foi apresentada a tabela linguística do tronco Tupi e Macro-jê, identificando, neste
último, a família Karajá com as suas três línguas –o Javaé, o Karajá e o Xambioá. Localizei
no mapa do Brasil as regiões em que os índios da família Karajá vivem atualmente, nos
estados de Goiás, Mato Grosso, Pará e Tocantins, indicando-lhes que o habitat desses índios
fica há séculos nas margens do rio Araguaia, que percorre esses estados. O rio Araguaia nasce
no planalto central e ruma em direção à região amazônica, numa zona de transição entre o
cerrado e a floresta. Aproximadamente no meio do trajeto, ele se bifurca, recebendo o nome
do desvio à direita de Braço Menor ou Javáe (o nome de uma língua da família Karajá).
Forma-se assim a ilha do Bananal, que possui um contorno que lembra uma elipse, e com
300km de extensão. A ilha do Bananal reflete a transição dos ecossistemas das duas regiões
que o rio corta, tanto o cerrado como a floresta.
47
Mudando o foco do assunto, apresentou-se a questão da vida dos Karajá, enfatizando a
importância que a distinção de atividades entre homens e mulheres tem para a compreensão
inicial da produção das litxokó, pois elas são apenas feitas pelas mulheres. A origem das
bonecas pertence a uma época alheia ao contato com a civilização ocidental, e a sua finalidade
era ajudar as garotas no manuseio do barro, e era outra forma de conhecer os costumes e
lendas, além do caráter lúdico do brinquedo. Associavam assim, o divertimento ao
aprendizado (ver figura 16). Atualmente essas bonecas passaram a ser também um artigo de
comércio, uma garantia de subsistência.
FIGURA 16- Índia Karajá fazendo uma boneca ao lado de sua filha. Ensinando sobre a técnica de
argila, os costumes e as lendas. - FONTE: (SIMÕES, 1992)
A aula foi finalizada com a explicação da técnica de confecção de figuras em cerâmica
pelos Karajá – desde a escolha do barro até a pintura final. Todo esse processo foi exposto no
capítulo anterior, e consta no Cd em anexo. Antes de fechar a parte teórica da aula, foram
mostradar as cenas do próximo capítulo –o que seria visto na próxima aula: a evolução técnica
do manuseio da argila pelos Karajá nas diferentes fases de produção (fase antiga e fase
moderna). E por fim mostrou-se a bibliografia consultada.
Após a contextualização com a localização, costumes, cultura, e a produção das
figuras em cerâmica pelos Karajá, os participantes foram convidados a conhecerem as peças
que estão na exposição do Museu do Índio. Como forma de percepção visual, foi sugerido que
fizessem um desenho rápido, quase um esboço, de observação de alguma figura que lhes
interesse na exposição. Ao invés de questioná-los sobre a leitura das peças de forma oral,
proporcionei a identificação do objeto pelo exercício individual do desenho. Como eram
muitos participantes e o espaço expositivo não comportava todos, alguns tiveram que observar
48
primeiramente de longe. Na figura 17 é possível verificar como ficaram bastante agrupados
em torno das peças.
FIGURA 17- Participantes fazendo o desenho de observação das peças em exposição.- Foto: Alice
Registro Fonseca
Os participantes conseguiram absorver muitos detalhes e características no desenho, o
que é útil para o momento de criação de uma figura na argila. Alguns desenharam mais de
uma boneca, e outros, posições diferentes de uma mesma peça, como o exemplo da figura 18.
Em seguida ao lanche, voltamos à oficina para o primeiro contato com a argila.
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FIGURA 18- Desenho de observação com vista de duas posições. - Foto: Alice Registro Fonseca
A diversidade dos participantes acarretou na importância de se dar mais atenção ao
ensino da modelagem da argila, pois constatamos que a maioria não havia tido essa
experiência antes e que seria preciso explicar melhor como preparar e manusear a argila, o
que foi esclarecido na aula seguinte. Houve vários motivos para que a modelagem da argila,
nesse primeiro dia, não tivesse sido tão proveitosa. A argila não estava fácil de se manusar,
sendo necessário amassar e bater bastante para se conseguir uma textura homogênea da
massa, e acabamos não enfatizando muito essa parte por causa da ansiedade deles em obter
um resultado rápido, e pelo nosso nervosismo na primeira aula. Como já havíamos gasto 2h30
na aula explicativa, tanto da minha parte como a da Raquel, sobrou pouco tempo para
modelarem a argila, então, tiveram que se apressar. O tempo também foi para conversar
individualmente com todos porque nessa primeira aula, havia grande parte da turma, 22
alunos (ver figura 19). Notamos que eles não saíram muito satisfeitos com o que haviam
produzido, mas isso demonstra que eles se interessaram pela aula, pois queriam fazer uma
criação bonita, que não caísse, rachasse e quebrasse.
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FIGURA 19- Terceiro momento da aula, a criação plástica livre com a argila.
Foto: Alice Registro Fonseca
Apesar das falhas, a proposta dessa primeira aula foi atingida, e consistia em
possibilitar um primeiro contato com a argila, deixando os participantes livres na criação, para
que na próxima aula já pudessem realizar uma boneca, consertando os erros cometidos nessa
primeira aula.
Aqueles que tinham experiência anterior conseguiram brincar com a argila, modelando
formas mais criativas e desenvolvidas na técnica. O contato entre eles foi enriquecedor, pois
acabavam dando dicas importantes e mostrando a possibilidade do outro ver o que é possível
fazer com a argila. Alguns fizeram cestinhas, bolinhas, e outros já criaram personagens mais
elaborados, como a representação de animais e de figuras variadas.
As duas figuras que seguem a seguir (figura 20) demonstram claramente essa
diferença, que no resultado final da oficina (na terceira aula), foi possível verificar uma
evolução.
51
FIGURA 20- Duas criações com argila, de diferentes participantes, na primeira aula.
Foto: Alice Registro Fonseca
No segundo dia de oficina, houve três momentos: a apresentação teórica da diferença
estética e técnica entre a produção de cerâmica da fase antiga e a da fase moderna; em
seguida, foi um momento de reflexão sobre o que tinha sido contextualizado; e por último, o
momento mais esperado pelos alunos, a modelagem em argila. A intenção foi relacionar a da
Proposta Triangular de Ana Mae, aos recursos da Educação Patrimonial.
Para os participantes, a parte de contextualização foi mais monótona, apesar de
abrirmos discussão algumas vezes (ver em anexo a aula no Cd). No entanto, ela foi
fundamental para o esclarecimento de certos pontos, para possibilitar um conhecimento que
seria aplicado na própria produção de bonecas e também para que eles pudessem observar e
analisar com olhos mais críticos. Quando os alunos descobriram que uma cerâmica era uma
figura masculina e não feminina, como haviam pensado, eles ficaram entusiasmados. Na fase
antiga, a diferença entre os sexos não era clara e, na primeira aula, vários alunos desenharam a
figura achando que era feminina.
Sobre a fase antiga, apontei como características principais as pernas torneadas e
arredondadas, os braços indicados no prolongamento dos cabelos; a preocupação em retratar
os estereótipos de ambos os sexos, com representação dos seios muito destacados, e no ventre
a representação do umbigo e do plissamento para as mulheres, e já a figura masculina era
adornada com cabelo de cera, mas caído para trás, e com topete característico (o casí). A
figura, quase sempre, encontrava-se na posição em pé, estática. Não apresentava
movimentação nem dinamismo, pelo fato da técnica com o barro ainda não sofrer o processo
de cozimento, sem o qual era impossível fazer a modelagem das extremidades sem o risco de
fragmentação após a secagem. Tanto nas figuras masculinas como nas femininas não se
52
esquematizava o rosto: usavam apenas um traço vermelho na vertical e dois semicírculos
opostos no sentido transversal. (FARIA, 1959)
Sobre a fase moderna, explicamos que, por volta de 1940-50, com experimentos
revolucionários, e com o domínio maior da composição, surgir uma boneca mais dinâmica,
em diversas posturas. Com o aprimoramento da técnica em argila, a figura tornou-se
representativa, deixando de ser puramente estilizada. A índia descobriu novas formas de
expressão plástica. (FARIA, 1959)
Peculiar da fase moderna, e que alguns participantes da oficina exploraram nas suas
bonecas, foram as alterações morfológicas da figura humana, relacionadas algumas vezes a
mitos, lendas e animais (ver figura 21). Outros, exploraram as narrações históricas e
figurativas também dessa fase, que estavam ilustradas em alguma cena. (FARIA, 1959)
FIGURA 21- Criação por um participante, de uma figura animal.- Foto: Alice Registro
Fonseca.
Após a aula teórica, que tentamos tornar mais breve e com apresentação de muitas
imagens para parecer mais uma conversa do que um momento teórico, pedi a opinião deles
sobre a produção das bonecas em cerâmica dos Karajá, que tinham acabado de conhecer.
Denominamos esse momento de Reflexão, no qual eles relacionam todas as informações
adquiridas sobre essa cultura.
A reflexão consistia em que cada participante escolhesse uma palavra que significasse
a representação e a produção das bonecas, e depois a revelasse para todos, de forma a
53
relembrar todas as impressões registradas por eles. Foi uma forma de avaliar como
assimilaram o conhecimento em torno dessa arte. As palavras fertilidade, diferença,
educação, igualdade, perfeição, expressão cultural, natureza e fertilidade, corpo –expressão,
força – marca - linhas fortes, tradição, virilidade, estilo, personalidade da mulher
originalidade, foram as que eles encontraram para definir o que as litxokó passaram a
significar para eles.
Foi aí que pedimos para que cada um pegasse seu trabalho, para conversarmos
individualmente sobre o resultado. Foi importante essa reavaliação, pois eles mesmos
enxergaram os problemas que surgiram. Enfatizamos que trabalhar com argila precisa de
tempo e paciência, pois se transforma naquilo que quisermos, mas a forma não emerge tão
rápido, porque depende de que as etapas sejam bem executadas..
Apresentamos também imagens que os ajudassem a compreender como é possível
trabalhar com a argila. Alguns participantes, já experientes no assunto, que fizeram
comentários construtivos também haviam levado suas ferramentas. Destacamos um ponto,
que muitos deles ainda não tinham notado, a importância de amassar bem a argila para a
obtenção de uma massa homogênea, sem rachaduras, bolhas ou muito molhadas. A argila
utilizada nesse dia também favoreceu a modelagem e muitos perceberam que estava mais
mole, fácil de trabalhar. Foi sorte ter comprado mais argila e de estar boa para o manuseio,
pois a possibilidade de passar as argilas na maromba4 da UFU foi descartada, em fator de não
mudar a tonalidade da argila.
Como essa aula foi numa véspera de feriado, muitos dos participantes faltaram, e
apenas 13 compareceram. A aula foi, por isso, mais tranqüila e proveitosa, pois além de mais
espaço, pudemos auxiliar mais aqueles que precisavam de ajuda e conselhos.
Vários participantes que mostraram dificuldades na primeira já conseguiram um
melhor resultado. É visível essa evolução no emprego da técnica pelas figuras 22 e 23, que
comprovam que a criação da primeira limitou-se a uma forma bastante simplificada do que
seria uma figuração, e a figura modelada na segunda aula apresentou mais detalhes e
características das litxokó lendárias sem cabeça. Essa participante teve problema na primeira
aula porque a argila ficava rachada ou ficava encharcada de água, e ela não conseguiu chegar
a uma figura bem acabada.
4 Maromba é um instrumento utilizado para amassar argila, e deixá-la mais fácil de manusear. Deve-se limpá-la sempre que mudar o tipo de argila, ou usar apenas o tipo.
54
FIGURA 22- Criação de argila realizada na
primeira aula, dia 23 abril 2009.
Foto: Alice Registro Fonseca
FIGURA 23- Criação de figuras com argila na
segunda aula, dia 30 abril 2009.
Foto: Alice Registro Fonseca
No último dia de oficina, primeiramente, comentamos que seria feita a conclusão das
bonecas, realizando a sua pintura. Contudo, alguns participantes ainda estavam chegando para
sua a primeira aula, assim, foram três que ficaram trabalhando com a modelagem da argila.
Para a pintura, sentimos a necessidade de explorar com eles muitas imagens, de forma que
fossem se aprofundando no assunto por uma contextualização mais acentuada.
Resolvi ser sucinta e direta na explicação sobre a pintura corporal, porque a próxima
oficina seria também sobre a pintura corporal. A partir das observações que fiz nas duas
primeiras aulas, que os participantes mostravam-se cansados de ficar escutando muita teoria,
tornei a exposição do conteúdo mais rápida e dinâmica, e pedi para os alunos que fizessem
anotações a respeito das pinturas que eles poderiam utilizar nas próprias bonecas. (ver a aula
em anexo no Cd)
Sobre os Karajá, expliquei que quando jovens, de ambos os sexos, recebem a pintura
omamura, tatuagem riscada com dente de peixe-cachorro que representa dois círculos nas
maçãs do rosto, à base de jenipapo e fuligem de carvão. É uma identidade Karajá,
representando o Sol e a Lua. Nos dias atuais os jovens não querem mais se tatuar, por
vergonha, apenas se pintam nas festas e rituais. (POLECK, 1994)
55
Aprendem a pintura quando criança, com a idade de 7 e 8 anos, olhando, e depois
imitando a mãe quando está fazendo a cerâmica, fazendo desenho na areia à beira do rio, na
terra e com carvão,. Os desenhos que as crianças aprendem são os mesmo que elas irão pintar
no corpo de outro Karajá quando ficarem maiores. (POLECK, 1994)
Os locais mais frequentementes pintados são: tronco, braços e pernas. Na sua
totalidade são representações de objetos da natureza. Apresentei diferentes pinturas usadas
conforme a idade, o sexo e as festividades, dentre elas foram: Pintura Diária; Pintura da
Passagem de Menino para Menino Jovem de Weryry à jyre; Pintura do Bòdu; Pintura e
Adorno de Moça Karajá na festa de Aruanã; Pintura Corporal Adulto; Pintura Corporal feita
em pessoas mais velhas e Pintura Corporal e adorno Javaé. (POLECK, 1994)
Os desenhos de corpo mais comuns dos Karajá são as listas e faixas pretas, pintadas
nos braços e pernas e igualmente reproduzidas nas bonecas (ver figura 24). São
principalmente os mais velhos que gostam de usá-las, por serem discretas e de fácil execução.
Segundo Maria Heloisa Fénelon Costa, existem ainda algumas pessoas que se pintam de
acordo com o agrado, mesmo sendo inadequado para sua idade. Essa ocorrência indica que
hoje tem pintura de corpo com finalidade decorativa, sem implicações com a vida social que
condicionava o emprego de padrões. (POLECK, 1994)
FIGURA 24- Pintura Diária
Fonte: POLECK, 1994
FIGURA 25- Pintura da Passagem
de Weryry à jyre.- Fonte: POLECK, 1994
Quando o menino Karajá – Weryry - deixa a infância, ele tem que participar do ritual
Hetohoky, com pintura corporal específica. Pinta o corpo inteiro com tinta de jenipapo e raspa
a cabeça. Ficando reconhecido então como jyre –o menino jovem (ver figura 25). Nesse
56
período em que o menino está todo pintado e o cabelo ainda não cresceu, ele deve fazer tudo
para os mais velhos, buscar água, lenha, comida. As mulheres mandam recados para os
homens pelo jyre. (POLECK, 1994)
Já com 13 anos, o rapaz é chamado de Bodú. A pintura usada chama-se tõsõ, pintura
de pica-pau. Usam vários enfeites no braço e no pescoço com várias voltas, de cores variadas
como: branco, amarelo, vermelho, azul, preto e verde. O cabelo do Bodú é bem comprido.
(POLECK, 1994)
A pintura e adorno para a festa de Aruanã da moça Karajá, que está de costas (ver
figura 26) nos braços e nas pernas é a pintura de jabuti, e nas coxas, o desenho do urubu
caçador. A índia que está de frente (ver figura 27) exibe o grafismo do peixe (Haru) nas coxas
e nos braços, e no tronco, a ave (Raradié). (POLECK, 1994)
FIGURA 26- Pintura
da Moça Karajá.
Fonte: POLECK, 1994
FIGURA 27- Pintura da
Moça Karajá.
Fonte: POLECK, 1994
FIGURA 28- Pintura
Corporal Adulto.
Fonte: POLECK, 1994
FIGURA 29- Pintura
Corporal para
pessoas mais velhas.
Fonte: POLECK,
1994
A pintura corporal do adulto, na figura 28, quer dizer gancho. Quem pinta tem a
liberdade de escolher o que será pintado, podendo assim haver outras representações. Quando
é dia de festa, os mais velhos se pintam com formas mais simples (ver figura 29), nas pernas a
pintura é do peixe pacu, nas coxas, chama-se oe oe, e no peito, de lado, o desenho é do rabo
de quati. Muitas vezes, os homens separam a pintura de forma simétrica no corpo, repartindo-
o ao meio. Apenas eles podem pintar uma massa preta no tórax, enquanto as mulheres podem
pintar algo parecido com uma cruz no abdômen, representando a fertilidade. (POLECK, 1994)
57
Achei importante mostrar um slide com varias pinturas desde as bonecas, fotos de
índias, e os desenhos que os índios Karajá produziram, representando suas pinturas5. Percebi
que muitos se espelharam nesses exemplos, mas os recriaram nas próprias bonecas. Pedi que
pintassem tanto as figuras feitas na primeira aula como as das aulas seguintes. Nessa aula a turma estava maior, porém havia participantes que só tinham aparecido
na primeira aula, por isso não obtiveram um resultado esperado na confecção. A maior parte
dessa aula foi para a pintura, mais ou menos 2h15. Alguns foram mais rápidos, e outros,
dedicados em realizar uma pintura diferenciada, delicada, que exigia concentração, paciência
e tempo. Recomendei que usassem apenas as cores preta e vermelha, que são as usadas nas
litxokó feitas pelas índias, porém discordando, alguns alunos coloriram com amarelo e outros
pintaram um fundo de branco e de vinho (ver figura 30). Posso dizer que ficoram fora do
padrão “desejado” as pinturas de fundo, mas me surpreenderam quanto à resolução, porque
podiam identificar com clareza as pinturas corporais
.
FIGURA 30- Pintura da Boneca.- Foto: Alice Registro Fonseca
Conhecendo melhor os participantes, consegui auxiliar individualmente aqueles que
pediram minha ajuda, e mesmo conversar com os que ficaram calados, para ter certeza de que
não precisavam de algo. Como na última aula, os participantes que tinham algumas dúvidas
também recorriam aos colegas mais experientes no assunto. Acredito que houve uma troca de
idéias e conhecimentos tanto entre os alunos como entre mim e eles. 5 POLECK, Lydia.(org.) Adornos e Pintura Corporal Karajá. Goiânia: MEC/SEF/SEE-TO, FUNAI, UFG.
1994.
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Nessa aula, uma mulher se destacou dos demais pela maneira como conhecia a
modelagem de argila, apesar de não estar fazendo a pintura, ela trouxe a boneca que tinha
terminado em casa, pois na primeira aula não teve tempo. O que deixou todos impressionados
foi o fato de ela conseguir restaurar sua boneca, que havia chegado para a aula com várias
rachaduras. Ela não estava acompanhando a aula, que seguia com a pintura, mas mostrou a
seus colegas formas possíveis para se recuperar uma peça de argila ainda molhada. (ver figura
31)
FIGURA 31- Participante restaurando sua peça rachada. -Foto: Alice Registro Fonseca
O meu objetivo nessa aula foi transmitir um novo conhecimento sobre a pintura
corporal aplicada e a exploração da técnica de pintura na argila. Mesmo que alguns alunos
ainda estivessem ocupados com a modelagem de argila das primeiras aulas, posso dizer que
os alunos que tiveram a oportunidade de participar de pelo menos uma aula, tiveram a chance
não só de conhecer mais a produção figurativa em cerâmica das mulheres Karajá, como
também de experimentar a modelagem em argila, de forma que os levasse a pensar no
trabalho e na dedicação dessas índias. Muitos dos alunos comentaram que, depois de trabalhar
com a argila visualizaram a produção litxokó de outra forma, conseguindo compreender o
processo pelo qual as índias passaram.
59
3.2 REFLEXÕES A CERCA DOS RESULTADOS
Nessa última parte do capítulo, exponho os resultados plásticos da oficina, fazendo
uma reflexão sobre eles e, identificando o desenvolvimento dos participantes quanto à técnica
de modelagem em argila. Observei a criatividade de cada um ao recriar as formas das
bonecas, tendo como referência os desenhos realizados por eles. Também avaliei a
compreensão da produção da cerâmica Karajá e a metodologia adotada por mim esta oficina.
Com o objetivo de mostrar a evolução da técnica de modelagem aliado à criatividade
de expressão dos participantes, selecionamos alguns trabalhos que refletem, no seu conjunto,
essas características. Os trabalhos dos demais participantes estão gravados em imagens no Cd
em anexo.
A primeira boneca a ser explorada foi a de uma participante que compareceu apenas
na primeira e na última aula, não confeccionando uma litxokó com maior dimensão e detalhes
(ver figura 33), porém, conseguiu relacionar ao desenho da boneca observada na exposição do
Museu, no primeiro dia de aula. Como se pode inferi,r essa participante recorreu ao próprio
desenho (ver figura 32), no qual havia detalhado as características tanto da modelagem como
da pintura.
Ainda que os detalhes no desenho tenham algumas falhas, como a distinção das fases
das litxokó, a participante atingiu o objetivo do desenho, de ser um esboço que apresentasse
certos detalhes importantes. Em vista do resultado positivo, a boneca não sofreu rachaduras,
quebras, falhas ou outros problemas na modelagem, demonstrando que a participante já
possuía uma experiência anterior à oficina. Nota-se a influência Karajá na identidade
expressiva da participante que mesmo tendo faltado a um dia de oficina, conseguiu boa
compreensão da criação das litxokó e das possibilidades exploradas na modelagem em argila.
60
FIGURA 32- Desenho de observação.
Foto: Alice Registro Fonseca
FIGURA 33- Boneca de argila, modelada e
pintada pela participante.- Foto: Alice Registro
Fonseca
Outra participante também explorou, já na primeira aula, a modelagem de uma
boneca, enquanto outros faziam apenas experiências com argila. Da mesma forma que a
primeira participante, ela se baseou no próprio desenho de observação para a criação da
primeira boneca (ver o desenho na figura 34). Ela conseguiu resolver o problema das
protuberâncias do corpo como a forma das nádegas, da barriga e dos seios, enquanto muitos
outros ainda mal trabalhavam o cabelo, mostrando, ter experiência com argila, anterior à
oficina.
Na outra figura (ver figura 36), a participante explora o movimento e a dinâmica que
as litxokó da fase moderna possuem, acrescentando, além dos braços e pernas definidos, uma
ação que envolve um outro objeto. O equilíbrio é bem resolvido com a contraposição de peso
nas pernas e o jogo do corpo, no qual, mesmo com o aumento da massa do corpo com o pote
que a figura segura, é possível a ela parar em pé, sem nenhum auxílio. Na face, acrescenta
uma identidade significativa dos índios Karajá, a representação dos círculos, além de criar um
personagem único, com traços bem marcados, como por exemplo, o nariz.
61
FIGURA 35- Figura em cerâmica FIGURA 36- Figura em cerâmica
É interessante observar como uma mesma peça muda de aparência depois que sofre a
pintura. Mesmo que seja com a tinta guache, não profissional, o resultado é totalmente
FIGURA 34- Desenho de observação.
Foto: Alice Registro Fonseca
62
diferente quanto a sua estética. Torna-se visualmente mais trabalhado, acrescentando à figura
formas geométricas e cores, complementando a composição da peça. (Ver as figuras 35 e 36)
A próxima análise envolverá as criações de duas participantes, pois elas mostraram
evolução na técnica e compreensão das variadas formas das litxokó. A primeira que destaco
(ver figura 38) já teve comentada uma foto de suas primeiras criações (ver figura 22), pois ela
demonstrou dificuldades com a homogeneização da massa da argila para a modelagem da
primeira figura, não conseguindo a formação de uma figura mais detalhada, fazendo apenas
três figuras simplificadas. No segundo dia, com o auxílio da aula explicativa, com fotos do
preparo da argila e a modelagem com uma argila melhor, mais macia para o manuseio, essa
participante explorou mais a forma das litxokó, e foi criativa ao aproveitar o desenho de
observação da boneca que não representa a cabeça, (ver figura 38), ou seja, utilizou o mesmo
recurso das bonecas Karajá, que não possuem braços, pernas e cabeças definidas para
produzir um resultado melhor na forma.
FIGURA 37- Desenho de
Observação. Foto: Alice Registro
Fonseca
FIGURA 38- conjunto de figuras em argila criadas por uma
participante. Foto: Alice Registro Fonseca
Outra participante, que mostrou evolução na técnica, realizou primeiramente formas
variadas com argila, mas sem o cuidado com a finalização da peça. Há duas possibilidades
para as primeiras peças não apresentarem um bom resultado: o desconhecimento da técnica da
modelagem ou a argila não estar tão favorável ao manuseio. Na segunda aula, a participante
pôde ver como suas peças estavam inacabadas perto de outras figuras dos colegas, e esse
63
diálogo foi importante para que ela conseguisse fazer uma peça mais elaborada. É possível
observar na figura 39 que as peças localizadas à direita têm muitas rachaduras e imperfeições,
ao contrário da figura pintada que demonstra cuidados em deixar a superfície da argila mais
lisa e homogênea. Até o momento da conclusão desse trabalho, essas duas figuras à direita
quebraram e suas partes em relevo se soltaram, mas aquela com pintura encontrava-se inteira,
sem sofrer modificações com o passar do tempo. Ou seja, quem conhece a técnica de
manuseio com argila sabe o quão difícil é saber manter a peça, depois de seca, na mesma
forma em que foi criada.
FIGURA 39- conjunto de figuras em argila criadas por uma participante. Foto: Alice Registro Fonseca
A única participante indígena, que vive atualmente em Uberlândia e já participou de
outras oficinas desenvolvidas no Museu do Ìndio, modelou apenas uma boneca de argila –
contudo, muito significativa por expressar a sua visão dessa arte (ver figura 41). Ela comentou
não ser experiente nessa arte com argila, mas mostrou um pouco do seu conhecimento ao
realizar um figura com a representação dos braços e das pernas. Para a boneca se sustentar de
pé, fez um apoio nas costas da figura, que depois de seca acabou quebrando, mas ainda assim
a figura parava em pé.
64
Tanto o desenho (ver figura 40) como a figura em argila dessa participante carregam
traços característicos de sua história de vida diferenciando desde as linhas, da pintura até a
forma de construção –sendo diferente das outras produzidas por seus colegas de oficina.
FIGURA 40- Desenho de Observação, feita pela
índia participante da oficina. Foto: Alice Registro
Fonseca
FIGURA 41- Boneca de cerâmica, feito pela índia
participante da oficina. Foto : Alice Registro
Fonseca
Dentre os participantes que fizeram suas figuras tridimensionais em argila, conforme o
desenho de observação, seguem essas três imagens (ver figuras 42 e 43). Nelas é possível
identificar como souberam aproveitar sua própria análise das variações de formas das litxokó
nos seus bonecos, expressas tanto na forma como nas pinturas. Na primeira imagem, por
exemplo, está a mesma figura sentada, sem os braços, e na pintura, a presença dos dois
círculos no rosto, a divisão da pintura no tronco de forma simétrica, e os desenhos que
parecem losangos nas pernas. E a mesma comparação pode ser feita com as outras figuras,
nos quais tanto a estrutura como as pinturas das bonecas observadas foram desenvolvidas na
argila.
65
FIGURA 42- Desenhos de observação.
FIGURA 43- Figuras em cerâmica.
Houve ainda quem participasse apenas da primeira aula, no dia 23 abril. Alguns
demonstraram algum conhecimento do trabalho com argila ou facilidade com a modelagem,
pois suas criações foram elaboradas de uma forma bem complexa (ver figuras 44, 45, 46). E
houve alunos que não demonstraram conhecimento e habilidades, mas que não compareceram
em mais nenhuma aula (ver figura 47).As figuras que foram bem trabalhadas são
66
representações de corpos, humanos ou imaginados. As três figuras abaixo apresentam traços
do alisamento da superfície argilosa, e a concepção teve desenvolvimento de volumes
protuberantes como seios, pernas, braços e outros.
FIGURA 44- Criação em argila de uma figura
bem elaborada, participante compareceu apenas
na primeira aula.- Foto: Alice Registro Fonseca
FIGURA 45- Modelagem em argila de uma
figura criativa, participante compareceu apenas na
primeira aula. -Foto: Alice Registro Fonseca
FIGURA 46- Mesma figura em argila vista de dois ângulos, participante compareceu apenas na
primeira aula. - Foto: Alice Registro Fonseca
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FIGURA 47- Modelagem em argila, participante compareceu apenas na primeira aula.
Foto: Alice Registro Fonseca.
A partir da avaliação dos trabalhos realizados, é possível perceber o grau de
envolvimento dos participantes em relação ao conteúdo apresentado. Outra forma de verificar
o aprendizado, e também de descobrir a percepção do mecanismo de desenvolvimento na
oficina, foi através da aplicação de um questionário que os participantes preencheram. As
perguntas tinham como objetivo verificar a motivação, as dificuldades, o nível de apreensão
do tema, e solicitar sugestões e comentários. Foram no total cinco perguntas, respondidas por
17 participantes. Dentre aqueles que declararam a idade, havia:
- 1 com 8anos; 1 com 17anos; 1 com 19anos; 1 com 47anos;
- 2 com 22anos; 2 com 24anos; 2 com 28anos; 2 com 61anos; 2 não declararam;
- 3 com 44anos;
Entre os 17 participantes que responderam o questionário de avaliação, havia: 3
estudantes que eram professores também, 3 professores, 9 estudantes, dos quais 5 eram de
pedagogia, e outras 2 pessoas que eram uma bibliotecária e uma artesã. Com predominância
feminina no curso, apenas um homem respondeu o questionário.
Em forma de gráfico podem-se apresentar todos esses dados:
68
02
46
810
1214
1618
Estudantes eProfessores
Professores Estudantes Outros Total
FIGURA 48- Gráfico das categorias profissionais dos participantes.
02468
1012141618
8 ano
s
17 an
os
19 an
os
22 an
os
24 an
os
27 an
os
28 an
os
44 an
os
47 an
os
61 an
os
não d
eclarad
ostot
al
FIGURA 49- Gráfico mostrando as idades dos participantes.
Serão apresentadas apenas algumas das respostas dos participantes, utilizando como
critério a escolha de alguns estudantes, professores, aqueles que fazem as duas coisas e
também algum dos outros. Estão no anexo A, a cópia da folha de respostas de alguns
participantes, e a cópia de todo os 17 participantes estão em anexo no Cd.
A primeira questão foi: “Defina em uma palavra a experiência e o aprendizado na
oficina”. Todas as respostas demonstraram que os participantes gostaram da oficina,
escrevendo palavras como: excelente, interessante, experimentação, trocas, conhecimento,
maravilhosa, ótima, interessantíssimo, legal, e outras. Contudo, por essa primeira questão não
é possível saber o quanto os alunos aproveitaram da oficina e suas opiniões a respeito da
metodologia abordada. Nesse sentido, a próxima pergunta tentou explorá-los quanto à
apreciação das aulas, sendo ela: “Teve algum momento da oficina que você acharia melhor
ser de outra forma?”
69
Respostas:
“- Acredito que não. Quando se aprende sobre algo novo é sempre bom colocar o conhecimento em
prática. A oficina, acredito, buscou isso.” (Jordânia, 22 anos - Estudante-Professor)
“- Não. Acredito que a forma exposta foi interessante válida. Talvez se estivesse sido de outro jeito
teria também suas validades, mas acredito que a troca, conversa, envolvimento, entre outros é o
importante para validar-se.” (Lara, 28 anos - Estudante-Professor)
“- Poderia fazer assim trabalhar com fibra de bananeira. Do tronco de bananeira. Para trabalhar com
tronco. Eu explico depois tá.” (Ramona, 61 anos – Estudante e representante de uma etnia indígena)
“- Sim, gostaria que estivesse mais crianças.” (Emanuellen, 8 anos - Estudante)
“- Não, nunca tinha participado de uma oficina na qual pratica-se o que estava sendo exposto pelo
“palestrante” (ministrante) do curso. Achei proveitosos e válidos todos os momentos da oficina.”
(Elisângela, 28 anos- Professor)
Na resposta à segunda pergunta, houve ainda vários participantes que apenas
colocaram “não”, de forma a não expressar opinião detalhada sobre a oficina como um todo.
Houve respostas inesperadas como a visão da única criança que, acompanhando a mãe, sentiu
falta da presença de outras crianças, e também por considerarem importante as trocas e
conversas entre eles. A terceira pergunta referia-se ao momento em que os participantes se
sentiram mais interessaram. Seguem abaixo as respostas selecionadas, em que a maioria
expressa surpresa e satisfação pela experiência plástica:
Respostas:
“- O momento de confecção e pintura das bonecas Karajá. Nunca havia trabalhado com argila antes.
Amei!” (Jordânia, 22 anos- Estudante-Professor)
“- Fazer as bonecas.” (Lauci, 47- bibliotecária)
“- Interessei mais sobre cerâmica e pintura.” (Ramona, 61 anos- Estudante e representante de uma
etnia indígena)
70
“- Particularmente, não tenho habilidade para modelar ou pintar, mas foi interessante fazer algo que
nunca tinha feito antes, mas o que mais me interessou foram as explicações apresentadas com auxilio
de textos e imagens.” (Elisângela, 28 anos- Professor)
“- Poder decifrar os desenhos indígenas.” (Gladys, 44 anos- Professor)
“- Os momentos que abordam a cultura indígena, e a apresentação das comunidades indígenas e suas
respectivas pinturas corporais e também a modelagem em argila.” (Olaia, 61 anos- Professor)
A quarta pergunta foi para que os participantes refletissem em todo o conteúdo da
cultura Karajá apresentado a eles, e revelassem o que julgaram importante na produção de
cerâmica desses índios. A questão era: “Hoje, de forma resumida, o que você falaria sobre a
produção de cerâmica dos índios Karajá?”
É possível observar que várias das respostas demonstraram a assimilação do conteúdo
pelos participantes trazendo, como referência, os conhecimentos adquiridos anteriormente.
Seguem abaixo alguns exemplos:
Respostas:
“- Que é uma pratica cultural brasileira belíssima, alto grau de elaboração e que para além da produção
material nos revela uma produção cultural, pedagógica que deveria ser mais divulgado pelas escolas
de uma forma geral para poder desmistificar e desalienar a concepção de arte submissa aos padrões
europeus e norte-americanos. E de fundamental importância conhecermos nossa própria história.”
(Pablo, 27anos- estudante-professor)
“- A cerâmica dos índios Karajá é o reflexo de uma cultura que possui suas particularidades, ou seja,
nenhuma tribo indígena não é igual a outra. O índio não é um ser único de cultura e expressividades.
Portanto, é bom perceber que a cerâmica Karajá é o reflexo de uma localidade geográfica, recursos e
desejos.” (Lara, 28 anos- estudante-professor)
“- Após as aulas passei a ter uma outra visão sobre a cerâmica, agora percebo a sua importância
educacional dentro do grupo e sua importância histórica para que nos passamos conhecer mais sobre a
forma de pensar e viver dos Karajá.” (Gabriela E.- artesã)
“- Admiro a criatividade pessoal dos Karajá no formato dos objetos e desenhos dos mesmos.”
(Ramona, 61 anos- estudante e representante de uma etnia indígena)
71
“- Uma criação perfeita, com detalhes impressionantes, as esculturas dos índios Karajá são
interessantes.” (Valéria- estudante)
“- Uma arte educacional.” (Maria Elizabeth, 44 anos- estudante)
“- Diria que é uma cultura fantástica, exótica, única, singular, que merece ( e deve) ser ensinada ou
apresentada a todos os brasileiros, afinal, faz parte das nossas raízes históricas, merece toda admiração
e respeito.” (Elisângela, 28 anos- professor)
“- Os desenhos são representativos do cotidiano Karajá e não são meros simetrias. Possuem
significado da flora e fauna. As crianças participam e o feito que os índios cuidam das crianças é
muito legal.” (Gladys, 44 anos- professor)
Alguns participantes aliaram a finalidade inicial da criação das bonecas pelas índias
Karajá, de ser um artefato lúdico, educativo, à uma possibilidade de apresentar essa arte
dentro das escolas não indígenas, completando a ideia do ensino de saberes da proposta inicial
de incluir os saberes de outras culturas no ensino fundamental e médio. Os participantes
também demonstraram admiração pela criatividade expressiva após a experiência dos Karajá
com o manuseio da argila e a compreensão da sua estética.
Essa pergunta obteve melhores resultados quanto ao desenvolvimento reflexivo sobre
o assunto discutido na oficina, indicando o quanto foi produtivo apresentar a parte teórica
seguida de uma pratica, na qual os participantes puderam explorar a própria matéria
referenciada.
A última pergunta, mais objetiva, era para saber a quantidade de aulas de que eles
participaram. Isto nos ajudaria a compreender algumas respostas, como exemplo, as duas
pessoas que participaram apenas da última aula, escreveram sobre aquele pouco que puderam
vivenciar.
72
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste estudo, respondemos as perguntas formuladas diante dos problemas defrontados
durante a pesquisa. As mesmas serão reapresentadas, com a intenção de facilitar a exposição
de nossas considerações finais.
É possível a aproximação de diferentes métodos de ensino que consideram o objeto
cultural como fonte primária de conhecimento, intencionando uma contribuição na inserção
dos estudos da cultura indígena na educação formal e informal? Quais são os pressupostos
pedagógicos nas metodologias de ensino, que considera o objeto cultural como fonte primária
de conhecimento? Esses pressupostos possuem relação nas diferentes metodologias?
Julgamos satisfatória a reflexão inicial sobre as duas teorias metodológicas para
posteriormente executá-las. Verificamos que os conceitos de ambas podem exercer uma
colaboração mútua.
Procurando respostas para as perguntas propostas neste estudo, criamos uma
ferramenta para uma melhor visualização do que afirmamos acima. Ficou clara a semelhança
entre as atividades e os objetivos das etapas das duas abordagens. O que Horta diz ser o
momento de Observação, para Ana Mae é o momento de Leitura ou análise; já a etapa da
Apropriação de Horta é possível se comparar ao Fazer de Ana Mae; e por fim na mesma
sequência, as etapas do Registro e da Exploração que consideramos ser semelhantes à
proposta da Contextualização.
O principal pressuposto no cerne das duas abordagens, e que sustenta suas atividades,
é a cultura como fonte primária para a construção do conhecimento. Por esse fator ser
decisivo, criamos uma oficina com três aulas baseadas nas duas abordagens. Os processos
vivenciados foram importantes para compreendermos, na prática, as teorias estudadas.
Instrumentalizadas pela parte teórica e sensibilizadas pela prática, conseguimos atingir nossos
objetivos.
Quando os participantes tiveram contato com as técnicas, a leitura estética e histórica
das litxokó, apreenderam diversos conceitos. Nas aulas práticas, perceberam a preciosidade e
a dificuldade da técnica de modelagem. Envolveram-se mais nesse processo do que no da
aprendizagem sobre a história das bonecas. Vários participantes comentaram que “é
trabalhosa a criação de uma boneca”. Eles não imaginavam a precisão técnica necessária para
sua construção quando observaram as bonecas expostas no museu.
Quanto à execução da oficina, verificamos ser viável percorrer a abordagem das duas
metodologias. Tanto a Contextualização como a Exploração da temática foram desenvolvidas
em todas as aulas como um apoio para o momento do Fazer ou Apropriação. Não
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esquecemos também da etapa de reflexão sobre as vivências experimentadas nas aulas – o
momento de Análise, Leitura ou Observação, que despertou a capacidade crítica e o
desenvolvimento da percepção visual e simbólica.
Os participantes solicitaram a criação de uma apostila ou a disponibilização das aulas
montadas em power-point, como material didático, que os auxiliasse nas atividades com os
seus alunos. Nesse sentido, esta monografia, com o Cd em anexo, poderá servir de orientação
para aqueles interessados na temática das bonecas Karajá. Está presente nesta pesquisa, a
análise crítica de cada aula, apontando as atividades desenvolvidas – e identificando
problemas e acertos ocorridos no percurso. Acreditamos que, pela temática estar sendo
requisitada pelas escolas, por meio da Lei 11.465/08, outros professores interessados poderão
se utilizar desta monografia como ferramenta de estudo, e como também para o surgimento de
novas pesquisas.
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ANEXO A - Questionários Aplicados na oficina
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