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RESUMO 1 - INTRODUÇÃO Pinto, Sónia; Tetraplano Engenharia, Lda, Lisboa, Portugal, [email protected] Quintela, Ana; Tetraplano Engenharia, Lda, Lisboa, Portugal, [email protected] Pena, Isabel; Infraestruturas de Portugal, Lisboa, Portugal, [email protected] Pedrosa, Mário; Infraestruturas de Portugal, Lisboa, Portugal, [email protected] A TETRAPLANO Engenharia desenvolveu para a REFER E.P.E. o projeto de estabilização do talude de escavação ao km 124+500, na Linha do Douro, na região do Alto Douro Vinhateiro. Trata-se de um talude com 200 m de desenvolvimento e cerca de 30 m de altura total, com inclinação muito acentuada, prolongando-se em encosta após a crista e intersetando formações grauvacóides. No trecho em estudo, o traçado da via segue em curva, confinado entre taludes de escavação quase verticais com gabarito muito reduzido, havendo um histórico significativo de queda de blocos para a via. Neste contexto, foi ponderada a execução de um pórtico de proteção (falso túnel), complementado pela colocação de redes metálicas e de pregagens. Inserindo-se em pleno Alto Douro Vinhateiro, foi previsto o revestimento com xisto da região de todos os elementos de betão, de forma a minimizar o impacte visual da intervenção. Neste artigo são apresentadas as três fases dos estudos, designadamente: i) a fase de reconhecimento, em que se procedeu à caraterização das formações geológicas, à identificação das patologias existentes e ao levantamento topográfico por varrimento laser; ii) a fase de projeto de execução, com a definição das soluções e os respetivos critérios de dimensionamento, bem como elaboração dos processos de licenciamento ambiental instruídos e; iii) a fase de execução, com o acompanhamento da construção do pórtico e de implementação das soluções para estabilização do talude de escavação. 16º Congresso Nacional de Geotecnia Ponta Delgada, Açores 27 a 30 de maio de 2018 ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO A Tetraplano, Engenharia, Lda. desenvolveu para a REFER E.P.E. o projeto de execução para Estabilização do talude de escavação entre os kms 124+500 e 124+700, na Linha do Douro. Trata-se de um talude com 200 m de desenvolvimento e cerca de 30 m de altura total, prolongando-se em encosta após a crista, com inclinação muito acentuada. Interseta formações grauvacóides, resistentes, caraterizadas por uma alternância de estratos de espessura muito variável. No trecho em estudo, o traçado da via segue em curva, com gabarito muito reduzido, tendo-se previsto a construção de um pórtico de proteção (falso túnel), complementado pela colocação de redes metálicas e de pregagens. A área de intervenção insere-se numa paisagem de elevada qualidade e valor cultural, reconhecida através da classificação da região do Alto Douro Vinhateiro na Lista do Património Mundial da UNESCO. Encontra-se igualmente abrangida pela Reserva Ecológica Nacional que visa a proteção das áreas de maior valor e sensibilidade ecológicos. A Empreitada para execução deste falso túnel decorreu em duas fases, a primeira entre junho de 2012 e setembro de 2013, tendo sido suspensa sem 2 - DESCRIÇÃO SUMÁRIA DA ZONA DE INTERVENÇÃO A Linha do Douro segue desde Peso da Régua até junto a Vale de Figueira ao longo da margem direita do rio Douro, na denominada zona do Alto Douro Vinhateiro (Figura 1). Neste troço, a linha foi implantada ao longo da encosta xistenta e grauváquica, seguindo predominantemente em flanco de encosta. Os taludes de escavação apresentam do lado esquerdo da via uma altura máxima da ordem de 30 m, culminando com os terrenos de vinha centenária que se distribuem até à cumeada. Do lado direito da via, o talude de escavação apresenta uma altura máxima da ordem de 8 m, desenvolvendo-se a topografia, em sentido descendente, até ao plano de água do rio Douro. Este troço apresenta um gabarito reduzido, que embora dentro dos limites regulamentares, associado ao facto de a via se desenvolver em curva acentuada, reduz significativamente a distância de visibilidade na via. Figura 1 - Localização geográfica. Extrato da Carta Militar de Portugal na escala 1:25 000, Folhas 127 (1998) e 128 (1997), editadas pelo IGeoE sem escala associada 3 - CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICA O talude de escavação a estabilizar insere-se numa mancha de rochas xistentas paleozóicas que fazem parte do Super-Grupo Dúrico Beirão, normalmente designado por Complexo Xisto-Grauváquico (CXG), tendo sido alvo de importantes ações tectónicas, as quais originaram intenso dobramento e produziram alguns acidentes do tipo carreamento, cavalgamento e outros tipos de falhas (Figura 2). Litologicamente, os principais litotipos ocorrentes nesta formação correspondem a: (1) metagrauvaques (por vezes metaquartzovaques); (2) xistos negros (filitos negros grafitosos) e (3) filitos. Estruturalmente, a Figura 2 permite perceber que as formações do CXG se desenvolvem segundo bandas orientadas sensivelmente segundo a direção WNW-ESE, conjuntamente com inúmeras variações (ou intercalações) litológicas, aqui assinaladas como se fossem corpos filoneanos, bem como alguns acidentes tectónicos, registando-se ainda alguns planos conjugados das falhas. Do ponto de vista geomorfológico, a região enquadrante ao estudo apresenta uma morfologia típica do substrato xisto-grauváquico, caraterizada por um conjunto de relevos vigorosos com declives acentuados, cumes arredondados, dissecados por uma rede de drenagem pouco hierarquizada com as principais linhas de água a correrem em vales apertados. Km 124 Km 124 STABILIZATION OF THE EXCAVATION SLOPE AT KM 124 OF THE DOURO LINE - ROCK FALL SHED ABSTRACT TETRAPLANO Engenharia developed for REFER E.P.E. the slope stabilization design at km 124+500 on the Douro Line in the Alto Douro Vinhateiro region. It is a 200 m long excavation slope, about 30 m high, very steep, extending in the natural slope after the ridge and intersecting greywacke formations. On this section the railway follows in a curve, confined between almost vertical excavation slopes with very reduced jig, having a significant history of blocks falling on the line. In this context, the execution of a rockfall shed (false tunnel) was considered, complemented by the placement of metallic meshes and nails. Located in Alto Douro Vinhateiro region, the design was made with the concern of minimizing the visual impact of the intervention. In this article the three phases of the studies are presented, namely: i) the recognition phase, in which the geological formations were characterized, the existing pathologies were identified and a topographic survey by laser scanning was performed; ii) the detail design phase, with the definition of the solutions and the design criteria, as well as the elaboration of the environmental licensing processes; (iii) the implementation phase, with the follow-up of the construction of the shed and the implementation of stabilization solutions for the excavation slope. que os trabalhos de construção civil estivessem terminados, e a segunda fase entre maio e novembro de 2014. GROUP I & D I n v e s t i g a ç ã o e D e s e n v o l v i m e n t o A g o s t o 2 0 1 8 Research and Development 35

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RESUMO

1 - INTRODUÇÃO

Pinto, Sónia; Tetraplano Engenharia, Lda, Lisboa, Portugal, [email protected], Ana; Tetraplano Engenharia, Lda, Lisboa, Portugal, [email protected], Isabel; Infraestruturas de Portugal, Lisboa, Portugal, [email protected], Mário; Infraestruturas de Portugal, Lisboa, Portugal, [email protected]

A TETRAPLANO Engenharia desenvolveu para a REFER E.P.E. o projeto de estabilização do talude de escavação ao km 124+500, na Linha do Douro, na região do Alto Douro Vinhateiro. Trata-se de um talude com 200 m de desenvolvimento e cerca de 30 m de altura total, com inclinação muito acentuada, prolongando-se em encosta após a crista e intersetando formações grauvacóides. No trecho em estudo, o traçado da via segue em curva, confinado entre taludes de escavação quase verticais com gabarito muito reduzido, havendo um histórico significativo de queda de blocos para a via. Neste contexto, foi ponderada a execução de um pórtico de proteção (falso túnel), complementado pela colocação de redes metálicas e de pregagens. Inserindo-se em pleno Alto Douro Vinhateiro, foi previsto o revestimento com xisto da região de todos os elementos de betão, de forma a minimizar o impacte visual da intervenção. Neste artigo são apresentadas as três fases dos estudos, designadamente: i) a fase de reconhecimento, em que se procedeu à caraterização das formações geológicas, à identificação das patologias existentes e ao levantamento topográfico por varrimento laser; ii) a fase de projeto de execução, com a definição das soluções e os respetivos critérios de dimensionamento, bem como elaboração dos processos de licenciamento ambiental instruídos e; iii) a fase de execução, com o acompanhamento da construção do pórtico e de implementação das soluções para estabilização do talude de escavação.

16º Congresso Nacional deG e o t e c n i aPonta Delgada, Açores27 a 30 de maio de 2018

ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

A Tetraplano, Engenharia, Lda. desenvolveu para a REFER E.P.E. o projeto de execução para Estabilização do talude de escavação entre os kms 124+500 e 124+700, na Linha do Douro.

Trata-se de um talude com 200 m de desenvolvimento e cerca de 30 m de altura total, prolongando-se em encosta após a crista, com inclinação muito acentuada. Interseta formações grauvacóides, resistentes, caraterizadas por uma alternância de estratos de espessura muito variável. No trecho em estudo, o traçado da via segue em curva, com gabarito muito reduzido, tendo-se previsto a construção de um pórtico de proteção (falso túnel), complementado pela colocação de redes metálicas e de pregagens.

A área de intervenção insere-se numa paisagem de elevada qualidade e valor cultural, reconhecida através da classificação da região do Alto Douro Vinhateiro na Lista do Património Mundial da UNESCO. Encontra-se igualmente abrangida pela Reserva Ecológica Nacional que visa a proteção das áreas de maior valor e sensibilidade ecológicos.

A Empreitada para execução deste falso túnel decorreu em duas fases, a primeira entre junho de 2012 e setembro de 2013, tendo sido suspensa sem

2 - DESCRIÇÃO SUMÁRIA DA ZONA DE INTERVENÇÃO

A Linha do Douro segue desde Peso da Régua até junto a Vale de Figueira ao longo da margem direita do rio Douro, na denominada zona do Alto Douro Vinhateiro (Figura 1). Neste troço, a linha foi implantada ao longo da encosta xistenta e grauváquica, seguindo predominantemente em flanco de encosta.

Os taludes de escavação apresentam do lado esquerdo da via uma altura máxima da ordem de 30 m, culminando com os terrenos de vinha centenária que se distribuem até à cumeada. Do lado direito da via, o talude de escavação apresenta uma altura máxima da ordem de 8 m, desenvolvendo-se a topografia, em sentido descendente, até ao plano de água do rio Douro.

Este troço apresenta um gabarito reduzido, que embora dentro dos limites regulamentares, associado ao facto de a via se desenvolver em curva acentuada, reduz significativamente a distância de visibilidade na via.

Figura 1 - Localização geográfica. Extrato da Carta Militar de Portugal naescala 1:25 000, Folhas 127 (1998) e 128 (1997), editadas pelo IGeoE

sem escala associada

3 - CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICA

O talude de escavação a estabilizar insere-se numa mancha de rochas xistentas paleozóicas que fazem parte do Super-Grupo Dúrico Beirão, normalmente designado por Complexo Xisto-Grauváquico (CXG), tendo sido alvo de importantes ações tectónicas, as quais originaram intenso dobramento e produziram alguns acidentes do tipo carreamento, cavalgamento e outros tipos de falhas (Figura 2).

Litologicamente, os principais litotipos ocorrentes nesta formação correspondem a: (1) metagrauvaques (por vezes metaquartzovaques); (2) xistos negros (filitos negros grafitosos) e (3) filitos.

Estruturalmente, a Figura 2 permite perceber que as formações do CXG se desenvolvem segundo bandas orientadas sensivelmente segundo a direção WNW-ESE, conjuntamente com inúmeras variações (ou intercalações) litológicas, aqui assinaladas como se fossem corpos filoneanos, bem como alguns acidentes tectónicos, registando-se ainda alguns planos conjugados das falhas.

Do ponto de vista geomorfológico, a região enquadrante ao estudo apresenta uma morfologia típica do substrato xisto-grauváquico, caraterizada por um conjunto de relevos vigorosos com declives acentuados, cumes arredondados, dissecados por uma rede de drenagem pouco hierarquizada com as principais linhas de água a correrem em vales apertados.

Km 124Km 124

STABILIZATION OF THE EXCAVATION SLOPE AT KM 124 OF THE DOURO LINE - ROCK FALL SHED

ABSTRACTTETRAPLANO Engenharia developed for REFER E.P.E. the slope stabilization design at km 124+500 on the Douro Line in the Alto Douro Vinhateiro region. It is a 200 m long excavation slope, about 30 m high, very steep, extending in the natural slope after the ridge and intersecting greywacke formations. On this section the railway follows in a curve, confined between almost vertical excavation slopes with very reduced jig, having a significant history of blocks falling on the line. In this context, the execution of a rockfall shed (false tunnel) was considered, complemented by the placement of metallic meshes and nails. Located in Alto Douro Vinhateiro region, the design was made with the concern of minimizing the visual impact of the intervention. In this article the three phases of the studies are presented, namely: i) the recognition phase, in which the geological formations were characterized, the existing pathologies were identified and a topographic survey by laser scanning was performed; ii) the detail design phase, with the definition of the solutions and the design criteria, as well as the elaboration of the environmental licensing processes; (iii) the implementation phase, with the follow-up of the construction of the shed and the implementation of stabilization solutions for the excavation slope.

que os trabalhos de construção civil estivessem terminados, e a segunda fase entre maio e novembro de 2014.

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O local em estudo interessa a Formação de Bateiras, descrita como sendo constituída por um conjunto de intercalações de xistos negros, metagrauvaques e filitos (rochas de granulometria fina).

Continuação

ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

Figura 2 - Enquadramento geológico. Adaptação a partir daCarta Geológica de Portugal na escala 1:50 000, Folha 10-D (SGP, 1989).

O troço em estudo desenvolve-se ao longo de aproximadamente 200 m, o onuma zona em curva, onde o traçado passa da direção N60 E para N25 W.

Do lado esquerdo, a via é bordejada por taludes rochosos vigorosos e irregulares, que atingem 30 m de altura, na maior parte dos casos completamente desnudados e que exibem de forma bem visível a constituição litológica e estrutural, sendo muitas vezes notório o controlo desta última. Do lado direito, os taludes são menos expressivos, com altura máxima que pode atingir 8 m - Figura 3.

Figura 3 - Vista do talude de escavação na fase anterior ao projeto de execução

A estes taludes foi possível adaptar um perfil tipo transversal no qual se podem considerar três sectores, da base para o topo (Figura 4 ):

Ÿ Sector A – junto à base, normalmente não ultrapassa 8 m de altura e nele podem observar-se zonas próximas da verticalidade ou mesmo com pendor negativo, com infraescavações e/ou cavidades;

Ÿ Sector B – zona intermédia que oscila entre 5 e 30 m de altura, com oinclinação geral de cerca de 60 em relação à horizontal. A relação

entre a linha do seu desenvolvimento e a geometria evidenciada pelo perfil topográfico aponta para que este troço se constitua como uma zona em que o processo de recuo do talude se verifique com maior intensidade;

Ÿ Sector C – troço mais suave que exibe normalmente inclinação entre o25 e 35 , desenvolvendo-se em cota muito variável, correspondendo

à morfologia do terreno original.

Figura 4 - Aplicação da setorização considerada

Como bases de apoio utilizaram-se não só os elementos bibliográficos existentes, o reconhecimento de campo, mas também um levantamento topográfico com recurso a varrimento a laser realizado pela empresa 3D Total. Este tipo de levantamento revelou-se muito vantajoso relativamente ao levantamento topográfico tradicional (Figura 5 ).

Foi levantada de uma nuvem de vários milhões de pontos que, depois de tratada, permitiu obter conjuntos de curvas de nível com equidistâncias de 0,1 e 0,2 m, e perfis de terreno espaçados de 10 m, nos quais são facilmente identificáveis as situações de ocorrência de zonas de pendor negativo que definem, zonas de toppling, zonas em consola, e/ou infraescavações, como se pode observar na Figura 6 .

Além da vantagem deste método no que respeita ao detalhe, surge como vantagem adicional a facilidade em relacionar a morfologia das vertentes com a geologia local, concretamente no que respeita às suas condições estruturais (fraturação/diaclasamento).

4 - LEVANTAMENTO DAS CONDIÇÕES LOCAIS4.1 - LEVANTAMENTO POR VARRIMENTO A LASER

Figura 5 - Imagens resultantes do levantamento por varrimento a laser

Figura 6 - Pormenor de um dos perfis de terreno, no qual se adicionou a informaçãorespeitante à fraturação/diaclasamento (linhas a tracejado)

4.2 - LEVANTAMENTO DAS DESCONTINUIDADES

Procedeu-se a um reconhecimento geológico de superfície detalhado, durante o qual se fez o levantamento exaustivo das principais descontinuidades (diaclasamento, fraturação e xistosidade) e dos principais tipos litológicos que poderiam estar a influenciar os taludes rochosos em termos de estabilidade.

O levantamento foi efetuado a partir da base dos taludes dada a dificuldade de acesso às respetivas vertentes. Tomou-se ainda em conta a apreciação de campo no que respeita aos elementos estruturais que condicionavam a

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Continuação

ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

estrutura de forma mais visível e que normalmente produzem grandes blocos (principais) e os que a afetam de forma menos expressiva (secundários) mas que afetam os blocos principais enfraquecendo-os consoante a densidade ou frequência destes planos.

A apreciação dos dados recolhidos revelou dispersão dos planos de fraturação/diaclasamento e dos planos de xistosidade, facto que se deve às variações espaciais que estes elementos estruturais registam.

No que respeita à xistosidade, a Figura 7 permite observar que esta apresenta uma direção média de WNW-ESE, com inclinação a assumir valores próximos da verticalidade, tendo, no entanto, sido registados

oalguns valores de inclinação de 75 e 40 para sul.

Em relação à fraturação principal considerou-se que a mesma se desenvolvia segundo os seguintes planos médios (quase ortogonais):

o o o o oN65 W,70 N a SV e N35 E, com inclinação variável entre 70 N a 90 .

Como tentativa de correlação /verificação destes dados com os compilados a partir da cartografia geológica na escala 1:50 000, procedeu-se à elaboração do diagrama estrutural presente na Figura 7 .

Deste diagrama estrutural pode observar-se que os dados e apreciações de campo se enquadram dentro dos valores recolhidos dos elementos bibliográficos, apresentando no entanto, uma variação espacial mais significativa.

Figura 7 - Diagrama estrutural que integra os elementos de campo e bibliográficos

4.3 - LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO

Durante o reconhecimento de campo foi realizado um exaustivo levantamento fotográfico que permitiu, durante todo o trabalho desenvolvido em gabinete, ter acesso a um alçado virtual do talude, permitindo identificar assim as zonas de blocos instáveis, zonas em consola ou outras singularidades.

4.4 - CONSIDERAÇÕES DE ÂMBITO GEOTÉCNICO.DEFINIÇÃO DO RISCO

No decurso do estudo, procurou-se identificar quais os fatores de risco que poderiam condicionar a estabilidade dos taludes e, consequentemente, o normal funcionamento da via.

Atendendo às dificuldades de acesso, houve necessidade de extrapolar alguma informação recolhida na base dos taludes para as zonas localizadas a cotas superiores, tendo esta sido complementada com a observação visual (local ou apoiada em fotografia).

Procurou-se interpretar o andamento natural da vertente onde se instalou a via e relacioná-lo com o desenvolvimento verificado nos perfis topográficos, com o intuito de perceber se existiriam zonas que tivessem sido alvo de processos erosivos mais intensos (ou que evoluíram de forma mais significativa).

Identificaram-se como principais fatores negativos:

Ÿ Qualidade do maciço rochoso, seu estado de alteração e fraturação (espaçamento, preenchimento e frequência/intensidade);

Ÿ Relação dos planos de fraturação com a face do talude e, consequentemente, com a direção da via nesse local;

Ÿ Zonas em consola, presença de cavidades ou infraescavações;

Ÿ Blocos em maior risco de queda;

Ÿ Presença de água ou indicadores desta (ressurgências, sinais de oxidação, vegetação, etc.);

Ÿ Altura do talude;

Ÿ Setorização do talude (relacionada com o perfil do talude, atrás apresentada na descrição dos troços);

Ÿ Proximidade da via ao talude;

Ÿ Presença de vegetação.

Foram assim definidas três zonas de risco, discretizadas no Quadro 1 e representadas em perfil conforme Figura 8.

Zonas sem problemas de instabilidade visíveis ou previsíveis.

Maciço rochoso com carácter maciço e pouco alterado. diaclasamento/fraturação, em regra, com espaçamento superior a 60 cm (F2), com poucos ou nenhuns sinais de circulação de água. Podem registar-se situações de individualização de blocos rochosos ou de zonas mais fraturadas/diaclasadas mas sem problemas previsíveis de afetação da linha férrea. Declive moderado a baixo.

Zonas que potencialmente podem desenvolver situações de maior risco de queda ou escorregamento de blocos rochosos.

O maciço rochoso pode evidenciar graus de alteração variável entre o alterado e o medianamente alterado (W4 a W3). Diaclasamento/fraturação em regra com espaçamento inferior a 60 cm, com evidências de que a relação geométrica entre estes planos e o definido pela face do talude seja favorável à queda ou ao escorregamento de blocos rochosos. Zonas cuja relação entre o andamento atual verificado em perfil indicie existência de ação mais intensa do processo erosivo (interpretação de recuo da vertente). Declive moderado, por vezes forte.

Zonas em que se verificam situações de subescavações, zonas em consola, maciço rochoso desapoiado, blocos em maior risco de queda (por basculamento ou escorregamento do tipo planar).

O maciço rochoso pode apresentar vários graus de alteração (em regra entre o medianamente alterado (W3-2) e o muito alterado (W5)), podendo existir sinais de circulação de água (zonas húmidas e/ou oxidadas). Fraturação ou diaclasamento muito variável, sendo possível a existência de fraturas abertas.

oDeclive em regra forte, superior a 45 .

BAIXO

MÉDIO

ALTO

Quadro 1 – Zonas de risco

Figura 8 - Zonas de risco

Na identificação das zonas de maior risco o levantamento topográfico por varrimento a laser, bem como o levantamento fotográfico constituíram uma excelente ferramenta.

Na Figura 9 e Figura 10 apresentam-se, a título de exemplo, algumas fotografias em que se pretende apontar os principais problemas relacionados com risco geológico identificado.

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Continuação

ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

Figura 9 - km 124+550 e km 124+600.Maciço rochoso medianamente alterado, com fraturação evidente a inclinar nosentido da linha. Ao km 124+600, pormenor da proximidade da via ao talude,

agravada pela inclinação do comboio em curva. Zona de risco alto a médio

Figura 10 - km 124+610.Cavidade de dimensão métrica controlada estruturalmente e zona de ocorrênciade água, na base do talude e na dependência de uma fratura. Zona de risco alto

Os principais problemas identificados prendem-se assim com os seguintes processos:

Ÿ individualização de cunhas rochosas (normalmente na dependência de planos de descontinuidades);

Ÿ escorregamentos planares de “panos de rocha”;

Ÿ queda de blocos de rocha originados principalmente pelo desconjuntamento dos níveis mais superficiais do maciço;

Ÿ “toppling” ou basculamento de blocos rochosos;

Ÿ existência de consolas, que podem potenciar o maior risco de queda e de desprendimento de blocos para a via.

5 - SOLUÇÃO ESTABILIZAÇÃO5.1 - CONCEÇÃO DA SOLUÇÃO A IMPLEMENTAR EM ZONACLASSIFICADA COMO PATRIMÓNIO MUNDIAL DA UNESCO

A área de intervenção localiza-se na região do Alto Douro Vinhateiro, inserida numa paisagem de elevada qualidade e valor cultural, tendo sido classificada como Património Mundial da UNESCO, encontrando-se igualmente abrangida pelo regime jurídico da Reserva Ecológica Nacional.

Face a este contexto cultural e natural, tornava-se necessário acautelar eventuais efeitos negativos induzidos pela execução de obras para estabilização do talude de escavação.

Assim, a solução definida no projeto teve em conta não só o objetivo de garantir a correta estabilização dos taludes como garantir o menor impacte paisagístico possível, pelo que teve subjacente as seguintes orientações:

Ÿ Limitar ao mínimo possível o desmonte de blocos de pedras que impliquem alterações significativas na morfologia dos taludes;

Ÿ Adotar técnicas de estabilização dos taludes com menor impacto possível, que possibilitem a posterior “renaturalização” das zonas afetadas através da regeneração natural da vegetação ou da introdução de espécies de recobrimento vegetal adequadas;

Ÿ Não deixar visíveis na face do talude superfícies em betão;

Ÿ Aproximar o mais possível o aspeto exterior das intervenções aos materiais, formas, cores e texturas características da paisagem duriense.

Tendo em conta o perfil transversal dos taludes de escavação ao km 124, foi consentâneo que a construção de um pórtico ao longo de grande parte do troço estaria mais “adaptada” à topografia original da encosta do que a realização de importantes escavações/desmontes para obtenção de um perfil estável para o talude. De modo a garantir a integração paisagística desta estrutura, foram consideradas as seguintes opções:

Ÿ construção do lado do rio de um muro vertical, revestido com pedra de xisto da região, de modo a dissimular o apoio da laje de cobertura e “aproximar” formalmente esta construção ao modo tradicional de armação do terreno com socalcos suportados por muros de pedra;

Ÿ utilização do mesmo revestimento em pedra para os emboquilhamentos norte e sul do pórtico - falso túnel (Figura 11 );

Ÿ revestimento vegetal da cobertura do pórtico com vegetação dos estratos herbáceo e arbustivo, de modo a diminuir consideravelmente as superfícies visíveis com material inerte.

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Continuação

ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

Figura 11 - Emboquilhamento do túnel. Desenho do projeto e aspeto final

As superfícies de betão resultantes dos preenchimentos e regularizações pontuais de algumas zonas do talude foram igualmente revestidas com lajes de pedra de xisto da região.

Considerando o crescente interesse pela utilização de tecnologias e materiais tradicionais na recuperação/reconstrução de muros em pedra seca, fazia parte do caderno de encargos do projeto que estes muros fossem executados com recurso a mão-de-obra devidamente qualificada.

5.2 - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

O pórtico de proteção é constituído por uma laje de betão armado que cobre a via existente, de modo a protegê-la da queda de blocos.

Esta estrutura permite absorver o impacto da queda de eventuais blocos e a sua definição geométrica permite redirecioná-los, para que sejam encaminhados para fora da via existente (Figura 12).

No dimensionamento da laje considerou-se o impacto de um bloco com uma configuração intermédia entre o cubo e a esfera, com dimensão média de 0,75 m, ao qual corresponde um peso, W, de 0,77 tf. A dimensão do bloco foi estimada a partir do levantamento geológico do talude sobrejacente.

A força de impacto, Pmax, foi estimada a partir da seguinte formulação (Manual For Slope Protection, Japan Road Association, May 1984):

[1]

Sendo: W – peso do bloco (tf); H – altura de queda (m); – constante de 2 2Lamé (t/m ) que transmite a influência da camada de proteção (100 t/m ).

Admitindo uma altura H de 15 m, obteve-se uma força de impacto, Pmax, de 66 t, para a qual foi necessária considerar uma laje com 1,0 m de espessura.

De modo a reduzir a força do impacto sobre a laje, foi considerada a colocação de uma camada de proteção constituída por material xistoso britado com dimensões entre 1 e 10 cm, com 0,90 m de espessura.

O pórtico tem ao eixo da via uma altura e largura mínima livres de 6,4 e 6,0 m, respetivamente.

Pmax = 2,55 x W x x H23

25

35

Figura 12 - Interior do pórtico. Desenho do projeto e aspeto final

oA laje inclina 15 para o lado do rio Douro de modo a que eventuais blocos que caiam sobre a mesma tendam a rolar e a estabilizar ou a cair diretamente para o rio. Os blocos que porventura fiquem sobre a estrutura poderão posteriormente ser desmontados e/ou empurrados para o rio.

A laje do lado esquerdo da via ficou predominantemente apoiada no maciço rochoso e, no lado direito, sobre uma parede resistente, cobrindo assim a via existente.

Sobre a laje foi colocada a camada de proteção, sobre a qual foi colocada uma camada de terra vegetal com 0,20 m de espessura, potenciando o crescimento de vegetação autóctone. Entre a camada de proteção e laje foram colocadas duas membranas betuminosas, de proteção e de impermeabilização, uma delas com função “anti raiz”, de modo a evitar que as raízes das plantas danifiquem a laje de betão. Sobre as telas foi ainda colocada uma manta geotêxtil, do tipo não tecido, com uma gramagem

2mínima de 600 g/m .

5.2 - GABARITO DA VIA

Durante a primeira fase da Empreitada (2012/2013), ao preparar a construção do pórtico entre os kms 124+560 a 124+570, verificou-se a necessidade de prever um sistema alternativo ao sistema de cimbre que estava a ser materializado, dada a exiguidade do espaço existente do lado esquerdo da via.

De acordo com os elementos fornecidos pela REFER, o traçado nesse troço contemplava uma curva esquerda apertada com um raio de 295 m (curva número 228) e escala de via de 176 mm, existindo um tráfego de passageiros e de mercadorias (cimento), circulando normalmente automotoras diesel da série UTD 592 e locomotivas diesel da série 1900.

De acordo com o referido estudo, elaborado com base no contorno de referência cinemático Ptb+ ter-se-ia que a distância ao eixo da via deveria ser superior a 2,45 m e 1,85 m do lado interior e exterior da curva, respetivamente. Colocando estas distâncias nos perfis entre os kms 124+550 a 124+570 verificou-se, conforme Figura 13, ao km 124+560 que o gabarito intersetava o talude rochoso (linha a azul), o que obrigou a considerar, para essa zona, uma solução que permitisse a execução do pórtico sem recurso aos cimbres e/ou de eventualmente restringir a circulação a determinado material circulante (Figura 14 ).

Figura 13 - Implantação do gabarito da via ao km 124+560

Figura 14 - Restrições do gabarito da via

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Continuação

ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

Para além da execução do pórtico, considerou-se ainda i) o preenchimento com betão das zonas sob as consolas existentes, ii) a remoção dos blocos instáveis e/ou a colocação de pregagens e iii) a colocação de redes metálicas de alta resistência.

5.4 - SOLUÇÕES DE ESTABILIZAÇÃO NO EXTERIOR DOPÓRTICO DE PROTEÇÃO

Figura 15 - Preenchimento de consolas e seu revestimento com pedra da região

Figura 16 - Redes de alta resistência

Numa primeira fase, procedeu-se à identificação pelo projetista dos blocos instáveis, a estabilizar pela colocação de pregagens com 32 mm de diâmetro e/ou a desmontar e remover. Procedeu-se igualmente ao preenchimento de zonas em consola com betão e ao seu revestimento com xisto da região (Figura 15).

Numa segunda fase foram colocadas redes metálicas de alta resistência, num sistema constituído por redes de tripla torção, com arame de 2,7 mm, sobre as quais foram colocados painéis de cabo de aço com 8 mm de diâmetro, com uma malha 300×300 mm, com uma resistência mínima de

21770 N/mm , ligados entre si por cabos com 20 mm de diâmetro. As redes foram fixadas ao talude através de pregagens com 32 mm de diâmetro e 4 m

2de comprimento, distribuídas segundo uma malha de 2,5×5,0 m .

Numa zona entre os kms 124+604 a 124+625, onde o maciço apresentava uma fraturação praticamente horizontal, mas espaçada, foram colocadas pregagens com 32 mm de diâmetro, com 12 m de comprimento, distribuídas segundo a mesma malha.

6 - EXECUÇÃO DA OBRA

As principais condicionantes da execução da obra foram as seguintes:

Ÿ a via estava em exploração, apenas com restrição de velocidade;

Ÿ gabarito estrito, com a passagem de comboios de mercadorias;

Ÿ troço em curva, com reduzida visibilidade;

Ÿ materiais rochosos muito resistentes a desmontar;

Ÿ trabalhos a terem que ser realizados maioritariamente durante os períodos de interdição noturnos, nomeadamente, entre as 22h00 e 6h00.

A Empreitada decorreu em duas fases, a primeira entre junho de 2012 e setembro de 2013 (Obrecol) e a segunda entre maio e novembro de 2014 (Fernandes Remelhe, Lda).

A solução base para o pórtico de proteção previa que a laje de betão armado, com 1 m de espessura, ficasse apoiada de forma contínua do lado esquerdo da via sobre o maciço rochosos xistento, e do lado direito sobre uma parede contínua.

Na primeira fase, recorreu-se para execução da laje a cimbres especiais do tipo Peri (Figura 17). Atendendo à elevada resistência dos materiais a desmontar, e dada a dificuldade de o fazer com recurso a martelo pneumático, recorreu-se a explosivos de fraca potência do tipo Rockracker (Figura 18).

Figura 17 - Execução da laje comrecurso a cimbres do tipo Peri

Figura 18 - Colocação dos explosivos de fraca potência Rockracker

No final da primeira fase, o pórtico encontrava-se construído entre os kms 124+487 a 124+550 e 124+590 a 124+593, sendo que entre os kms 124+550 a 124+590 estavam apenas executadas as paredes laterais, faltando a execução da laje do topo.

Na segunda fase, em que se previa o fecho da laje numa zona em que o espaço disponível era menor, não permitindo a colocação do cimbre, foi necessário prever a execução de uma plataforma provisória e que considerar o apoio da laje em apenas cinco apoios, materializados sobre a forma de nichos abertos na formação rochosa, com dimensão mínima de

30,8×1,0×1,0 m ; estes nichos foram abertos com recurso a corte de fio diamantado ou discos diamantados (Figura 19).

Nesta fase foi ainda permitido ao Empreiteiro proceder a uma ligeira retificação da via, puxando a via alguns centímetros para o lado direito, o que permitiu aumentar o gabarito existente.

Na Figura 20 apresenta-se uma vista atual do pórtico, obtida a partir da margem esquerda do rio Douro.

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Continuação

ESTABILIZAÇÃO DO TALUDE DE ESCAVAÇÃO AO KM 124 DA LINHA DO DOURO - PÓRTICO DE PROTEÇÃO

A Tetraplano Engenharia elaborou para a REFER (atual IP) o projeto de estabilização dos taludes de escavação entre os kms 124+500 e 124+700, na Linha do Douro, localizado na Região do Alto Douro Vinhateiro, classificada como património da Unesco.

Interessava que a solução desenvolvida garantisse não só a circulação ferroviária em segurança durante e após a obra, como também que acautelasse eventuais efeitos visuais negativos, devendo ficar devidamente integrada na paisagem do Alto Douro Vinhateiro.

Foi construído um pórtico (falso túnel) que permite que eventuais blocos que se desprendam do talude e/ou da encosta adjacente não afetem a circulação da via e possam ser encaminhados para o rio Douro. De modo a que ficasse integrado na paisagem procedeu-se ao revestimento das paredes exteriores com pedra de xisto da região.

Figura 19 - Abertura dos nichos

Figura 20 - Vista atual do talude de escavação com o pórtico de proteção na base

7 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

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AGRADECIMENTOSOs autores desejam agradecer às Infraestruturas de Portugal, IP, a oportunidade que lhes foi concedida de desenvolver e colaborar na implementação deste projeto, bem como a autorização concedida para apresentar este caso ao meio técnico nacional.

REFERÊNCIASJapan Road Association (may, 1984). Manual for Slope Protection. Highway

Earth Series

Tetraplano Engenharia (2010). Estabilização dos taludes de escavação entre o km 124+500 e o km 124+700 e entre o km 125+460 e o km 125+810, na Linha do Douro. Projeto de execução.

Tetraplano Engenharia (2015). Estabilização do talude de escavação aos kms 124+500/700, na Linha do Douro. Pórtico de proteção. Projeto de execução.

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RESUMO

1 - INTRODUÇÃO

Bento, Jorge; COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente, Lisboa, Portugal, [email protected]

Pistone, Raúl; COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente, Lisboa, Portugal, [email protected]

Ferreira, Sandra; COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente,Lisboa, Portugal,[email protected]

Ribeiro, Joana; COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente, Lisboa, Portugal, [email protected]

Cacilhas, Filipa; COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente, Lisboa, Portugal, [email protected]

A expansão da rede ferroviária na Argélia, com a nova linha Boughzoul-Djelfa, na zona de transição dos Altos Planaltos para o Atlas Saariano inclui, perto da cidade de Djelfa, um conjunto de túneis ferroviários, dos quais, a COBA elaborou os Projectos de Execução dos designados túneis T1 e T2, com galerias únicas bidirecionais, albergando a plataforma ferroviária, com secção até 122 m² e 13,1 m de vão. O túnel T1, com 600 m de comprimento desenvolve-se no atravessamento de uma crista calco-arenítica cretácica, ligeiramente carsificada, no anticlinal de Djelfa, evitando a afectação, pelo traçado, de núcleo habitacional à superfície. O Túnel T2, com 800 m de desenvolvimento, em zona sem ocupação de superfície, atravessa séries sedimentares cretácicas silto-argilosas e calco-areníticas, interessando ainda uma unidade gipso-margosa triássica, associada a uma falha regional. São descritas as soluções de projecto adoptadas e as adaptações realizadas, resultantes da colaboração com o construtor durante a fase de desenvolvimento dos estudos.

16º Congresso Nacional deG e o t e c n i aPonta Delgada, Açores27 a 30 de maio de 2018

ESTUDOS DE EXECUÇÃO DE TÚNEIS FERROVIÁRIOS NA LINHA BOUGHZOUL-DJELFA, ARGÉLIA

Os estudos de execução das obras subterrâneas elaborados para a COSIDER Travaux Publics, (túneis T1 e T2) estiveram a cargo da COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente, tendo sido desenvolvidos entre Julho de 2013 e Junho de 2015. O dono da infraestrutura é a ANESRIF – Autoridade Ferroviária Argelina. As principais características dos túneis resumem-se no quadro 1.

2 - GEOLOGIA E GEOTECNIA DOS ATRAVESSAMENTOS2.1 - ENQUADRAMENTO GERAL

O troço onde se incluem os túneis, ver figura 1, interessa sobretudo unidades sedimentares cretácicas, ocorrentes no anticlinal de Djelfa, estando o túnel 1 localizado no seu flanco Norte e o túnel 2 no flanco Sul.

Figura 1 – Traçado da via férrea e geologia na envolvente dos túneis Túnel T1 dopk 227+200 ao pk227+800 e túnel T2 do pk 232+600 ao pk 233+400,

adaptado de APS-Avant Projet Sommaire, Systra, Getinsa, Setirail (2011).

No túnel T1 que atravessa uma crista saliente, ocorre exclusivamente a unidade Cretácico Médio (Cn) - Margas e calcários. Esta unidade consiste numa alternância irregular de margas dolomíticas, um pouco arenosas e argilas com cimento carbonatado, castanho claro e às vezes esbranquiçado. As rochas calcárias são pouco dolomíticas, microcristalinas e meso-cristalinas.

A sua estrutura estratificada, visível na figura 2, caracteriza-se por camadas de espessuras centimétricas a decimétricas. A unidade encontra-se dobrada e deformada pela orogenia alpina que afecta o Atlas Sahariano. Essa estrutura apresenta uma inclinação para a estratificação S0 de 85º para Sudeste, no topo da crista que atravessa.

FINAL DESIGN STUDIES FOR THE EXECUTION OF RAILWAY TUNNELS IN THE BOUGHZOUL-DJELFA LINE, ALGERIA

ABSTRACTThe expansion of the rail network in Algeria, with the new line Boughzoul-Djelfa, in the transition zone from the High Plateaus to the Saarian Atlas includes, near the city of Djelfa, several railway tunnels. COBA elaborated the Projects of Execution of the designated T1 and T2 tunnels, with single bidirectional galleries, housing the railway platform with section up to 122 m² and 13,1 m of span. The 600 m long T1 tunnel develops at the crossing of a Cretaceous crest, slightly karsified, on the Djelfa anticlinal, avoiding a residential area in the surface. The T2 tunnel, 800 m long, in an area with no surface occupation, crosses sedimentary Cretaceous silt-clayey and lime-arenitic sedimentary series, and a Triassic gypsum-marl unit, associated to a regional fault. The project solutions adopted and the adaptations carried out, resulting from the cooperation with the constructor during the development phase of the studies, are described.

O desenvolvimento dos estudos implicou uma adaptação do projecto às práticas e possibilidades locais, nomeadamente no que respeita ao suporte primário e metodologia de escavação, (por exemplo a não utilização de fibras metálicas no reforço do betão projectado, entre outras).

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Túnel

Pk inicial

Pk final

Comprimento (m)

Recobrimento máx. (m)

Secção (m²)

Geologia

T1

227+185

227+785

600

77

122

Cn – Cretácico médio- - Calcários e margas

T2

232+592

233+385

793

42

122

Tk – Triássico superior -Facies Keuper

Ci – Cretácico inferior-- Grés e argilas com passagens carbonatadas

Cn – Cretácico médio- – Calcários e margas

Ct – Cretácico médio- -Grés

Quadro 1 - Características principais dos túneis

Túnel T2Túnel T2

Túnel T1Túnel T1

Figura 2 – Aspectos gerais da estratificação de intercalações margo-calcárias daunidade Cn-Cretácico médio no túnel T1.

Na entrada (em vista para Nascente) e na crista (em vista para Poente).

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Continuação

ESTUDOS DE EXECUÇÃO DE TÚNEIS FERROVIÁRIOS NA LINHA BOUGHZOUL-DJELFA, ARGÉLIA

Os relevos apresentados são caracterizados por grandes declives e áreas irregulares devido à erodibilidade dos materiais desta unidade. Devido ao sistema de fracturação particular desta formação, podem ocorrer quedas e deslizamentos de blocos.

Dada a identificação de fenómenos de carsificação na envolvente, no âmbito da campanha de prospecção implementada foram realizados ensaios de permeabilidade do tipo Lugeon e do tipo Lefranc, tendo sido obtidos resultados elevados, 4 a 19 U.L. em regime de dilatação para os

-4ensaios tipo Lugeon e 5,82 x 10 m/s no ensaio Lefranc realizado, confirmando a elevada permeabilidade secundária do maciço.

No túnel T2, além da unidade (Cn) - Cretácico médio descrita para o túnel T1, ocorrem as unidades (Ct) - Cretácico médio (arenito e argilas com episódios carbonatados) e (Ci) - Cretácico inferior (grés argiloso, margas e calcários). Em profundidade, ocorrem ainda materiais do Triássico (Tk) com forte componente gipsífera. A distribuição destas unidades apresenta-se no modelo geológico da figura 3.

Figura 3 – Extrato do desenho planta-perfil geológico-geotécnico do projecto,com o modelo geológico do túnel T2. Sobrelevação: 5x.

A unidade do Cretácico Médio (Ct) - Arenito e argilas com episódios carbonatados é formada por uma série mais ou menos rítmica, em fácies flysch, com arenito e argila. Os arenitos são ocres, castanhos, rosados e esbranquiçados, podendo parecer friáveis ou cimentados pelo carbonato, como visível na figura 4.

Esta unidade é caracterizada pela presença de falhas e deformações frequentes dos materiais, sendo afectada pela orogenia alpina.

Figura 4 - Aspectos da unidade gresosa Ct – Cretácico médio.Em poço aberto sobre a zona central do túnel e à direita aspecto

microbandado de arenito de grão fino em amostra de mão

A unidade do Cretácico inferior (Ci) - Grés e argilas com episódios carbonatados, que consiste numa alternância irregular de grés carbonatados e calcários arenosos, de espessura centimétrica a decimétrica, areias arcósicas, conglomerados quartzíticos com matriz arcósica, silto-argilosa ou argilitos com areia dispersa e tons acastanhados e avermelhados. Na base da série, podem aparecer níveis de granulometria grosseira (conglomerados). As areias apresentam granulometria média a grosseira a muito grosseira, com elementos angulosos e com uma matriz silto-argilosa, parcialmente carbonatada.

O Triássico Superior - Facies Keuper (Tk) é caracterizado por argilas, margas gipsíferas, gesso com algumas intercalações de arenito e dolomito. Consiste assim num conjunto de argilas e margas variegados. Na parte mais baixa da série, aparecem cores acinzentadas, enquanto nas partes mais altas existem tons purpúricos característicos, com listras brancas e avermelhadas. As intercalações de gesso, branco e preto, de argilitos vermelhos e cristais gipsíferos são abundantes. Esta formação constitui relevos isolados entre materiais de diferentes idades. As inclinações são variáveis e a presença de barrancos e superfícies irregulares devido à erodibilidade e solubilidade dos materiais é visível na figura 5.

Figura 5 - Aspectos da unidade triássica Tk, em ocorrência associada a falha àsuperfície (imagens a e b), lateralmente à zona central do túnel T2 e

em profundidade (imagem c) na sondagem S206 (margas com intrusões gipsíferas).

As unidades cretácicas identificadas possuem relevos com inclinação média a alta. A formação de cumes, destacados da envolvente geral de materiais modernos, dependerá do grau de cimentação. Devido ao diferente grau de cimentação e/ou meteorização, podem ocorrer quedas de blocos e/ou deslizamentos. Apresentam uma estrutura estratificada em camadas, com espessuras em geral entre centímetros e decímetros. Encontram-se dobradas e deformadas devido ao episódio orogénico mencionado.

Relativamente ao modelo geológico do túnel T2, interpretou-se com base nos levantamentos de campo e imagens de satélite que o contacto entre os arenitos da unidade Ct e a unidade Cn margo-calcária se faria por intermédio de falha, sendo que os materiais triássicos, de maior plasticidade e identificados na sondagem S206, teriam ascendido através desta.

Sempre que os níveis de água registados se apresentam elevados, a medição foi realizada imediatamente após a furação. Nos restantes casos, os furos de sondagem apresentam-se secos ou com níveis de água baixos.

2.2 - TRABALHOS DE PROSPECÇÃO E ENSAIOS REALIZADOS

No conjunto dos dois túneis foram realizadas, na fase de projecto de execução, dezassete sondagens com um total de 607 m de perfuração. Das sondagens realizadas três delas foram executadas inclinadas com um ângulo de 60º com a horizontal. Esta abordagem veio a revelar-se adequada, pelo facto de terem sido intersectados materiais em falha que, por sua vez, veio a ser atravessada no contacto das unidades Ct e Cn.

Relativamente aos ensaios in-situ, foram realizados ensaios de permeabilidade (tipo Lugeon e tipo Lefranc) que em geral revelaram valores de permeabilidade muito elevados, variando de 7 a 35 U.L. no túnel T2 e entre 4 e 9 U.L. no túnel T1. Embora previstos nos emboquilhamentos, praticamente não se realizaram ensaios SPT, devido à natureza dos materiais interessados.

Em laboratório foram realizados ensaios conducentes à caracterização dos materiais reconhecidos, tendo sido levados a cabo ensaios de identificação. Foram ainda realizadas caracterizações do ponto de vista químico à presença de carbonatos, sulfatos, cloretos e medição de ph em amostras argilosas.

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No que respeita à caracterização da resistência foram realizados trinta e três ensaios de compressão simples, com medição de módulo de deformabilidade em alguns dos provetes ensaiados. Os máximos valores de rotura observados foram de 52,2 MPa em calcário da unidade Cn no túnel T1 e de 101,0 MPa em grés da unidade Ct, no túnel T2. Na unidade Tk obtiveram-se resistências à compressão de 0,9 e 2,0 MPa com módulos de deformabilidade de 65 e 217 MPa respectivamente. Foram também realizados ensaios brasileiros de compressão diametral.

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Continuação

ESTUDOS DE EXECUÇÃO DE TÚNEIS FERROVIÁRIOS NA LINHA BOUGHZOUL-DJELFA, ARGÉLIA

2.3 - ZONAMENTO E PARÂMETROS ADOPTADOS

Com base na informação geológico geotécnica recolhida foi efectuado o zonamento dos maciços atravessados e realizada a classificação geomecânica das zonas geotécnicas atravessadas pelos túneis, (quadro 2).

Zona geotécnica

Formação

Fracturação (SIMR)

REC Percentagem de recuperação (%)

RQD “Rock Quality

Designation” (%)

Resistência à compressão

uniaxial (MPa)

RMR – “Rock Mass Rating”

ZG1

Ci, Cn, Ct

F à F3 4-5

100

> 30*

> 25

> 45

ZG2

Ci, Cn, Ct

F4-5

100

> 10

> 2

35 - 45

ZG3

Tk, Ci, Cn, Ct

F4-5

80-100

0 - 50

< 3

< 35

Quadro 2 - Zonamento geotécnico de projecto estimado para omaciço de escavação dos túneis

*Excepcionalmente >30

Com base neste zonamento foram estimadas, no túnel T1, extensões de ocorrência de 30, 45 e 25% de ZG1, ZG2 e ZG3, respectivamente e no túnel T2 de 28, 35 e 37% de ZG1, ZG2 e ZG3.

Tendo por base os resultados obtidos, devidamente enquadrados por obras já executadas em maciços similares, foram estimados os parâmetros adoptados na modelação das obras a construir, que por sua vez se apresentam no quadro 3.

Quadro 3 – Parâmetros geomecânicos adoptados no projecto dos túneis

Zona geotécnica

Mohr Coulomb c (kPa)

Mohr Coulomb

f (°)

g (kN/m³)

E (GPa)

n

ZG1

450

45

23

10

0,22

ZG2

150

40

22

1

0,24

ZG3 (geral)

100

30

21

0,15-0,50

ZG3 (Tk)

40 - 60

25

19

0,15

0,28

Para os emboquilhamentos, considerando as condições particulares de cada um dos locais foram adoptados os parâmetros, constantes do quadro 4.

Localização Entrada Saída

LitologiaConglomerados

poligénicos e grés

Conglomerados poligénicos alterados e

areias grésificadas

Grés fracturados

Grés alterados e fracturados

Mohr Coulomb c (kPa)

90 40 200 120

Mohr Coulomb

f (°)35 35 45 40

g (kN/m³) 23 22 23 22

Quadro 4 - Parâmetros adoptados nos emboquilhamentos do túnel T2

Os prolongamentos a céu aberto da estrutura definitiva dos túneis, permitiram encarar a parte inferior do tratamento dos taludes dos emboquilhamentos frontais, como taludes provisórios a aterrar posteriormente. Nesse sentido, por se tratarem de soluções provisórias, foi possível aligeirar as soluções de suporte da escavação, por sua vez realizadas à custa de betão projectado e pregagens.

A solução geral, como se mostra na figura 6 para a saída do túnel 1, consistiu na execução de betão projectado numa espessura de 0,10 m, reforçado com malha electro-soldada AQ50 e pregagens de varão de aço f 25 mm, seladas com calda de cimento, com comprimentos variáveis de 4,0 a 8,0 m. A geometria da escavação adoptada foi em geral de 1v:1h, sendo que nos taludes frontais foi adoptada uma inclinação de 2v:1h no pano inferior e de 1v:1,5h no pano superior devido à presença de materiais de natureza terrosa. No emboquilhamento de saída do túnel T2, foram consideradas inclinações de 3v:1h no pano inferior e de 1v:1h nos panos superiores. A altura máxima de escavação foi de 36 m na saída do túnel T2, visível na fotografia apresentada na figura 10.

3 - SOLUÇÕES ADOPTADAS3.1 - EMBOQUILHAMENTOS

Figura 6 – Corte transversal do emboquilhamento de saída do túnel T1,ao pk 227+775. Em baixo, aspectos da execução do mesmo.

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Continuação

ESTUDOS DE EXECUÇÃO DE TÚNEIS FERROVIÁRIOS NA LINHA BOUGHZOUL-DJELFA, ARGÉLIA

A verificação de segurança dos suportes foi efectuada, função do tipo de maciço, recorrendo a cálculos de estabilidade global e ainda a verificações de segurança com elementos discretos, no caso de deslizamento de possíveis cunhas.

3.2 - OBRAS SUBTERRÂNEAS

3.2.1 - SECÇÃO TRANSVERSAL

A secção de escavação foi definida tendo em conta as necessidades do gabarit ferroviário, em especial os aspectos aerodinâmicos, necessários à segurança e conforto dos utentes, para uma velocidade do comboio de 160 km/h. A definição teve também em conta as espessuras necessárias à colocação dos suportes primários e do revestimento definitivo. Resultou assim necessário considerar uma secção de raio único interior, r = 5,88 m, que se prolonga interiormente em 25° abaixo da calote superior, enquanto que no seu lado exterior, a parte terminal dos hasteais apresenta desenvolvimento recto.

Procurou-se ainda garantir a modularidade da geometria, ao nível dos suportes primários e do revestimento definitivo na interface entre diferentes zonas geotécnicas, mantendo-se pontos em comum, por exemplo, ao nível das uniões das cambotas, ao nível do suporte primário, ou na base dos hasteais, nas transições entre trechos com soleira-curva e sapata, com vantagem para a execução do revestimento definitivo e ainda na instalação dos sistemas de impermeabilização e drenagem.

Figura 7 - Secção tipo com inserção do gabarit ferroviário eelementos de segurança ferroviária.

3.2.2 - ESCAVAÇÃO E SUPORTE PRIMÁRIO

Numa primeira aproximação aos suportes primários a considerar, foram inicialmente utilizados métodos empíricos como as classificações e/ou recomendações de suporte propostas por Bieniawski, (1989), Grimstad e Barton, (1993) e Romana, (2000). Posteriormente, na verificação da segurança recorreu-se a métodos numéricos de tensão-deformação, utilizando o programa de cálculo Phases2 V8.0 da Rocsience. Os resultados foram também enquadrados por experiências recolhidas em obras já executadas, em maciços similares.

2Figura 8 – Análise tensão-deformação (Phases V8.0), no túnel 2. Em cimaStrength Factor na zona geotécnica ZG1 (Strength Factor de 1,0 representado

a laranja, sendo, quando da ordem de 2,0 a 3,5, representado a verde).Em baixo, deslocamentos totais na secção em ZG3

(a amarelo deslocamentos totais da ordem dos 35 mm e averde da ordem dos 25 mm). Ambos os casos utilizando um coeficiente k=1 (sh/sv).

Foi ainda analisada a possibilidade de formação e queda de cunhas no interior da secção no atravessamento dos trechos rochosos, com recurso ao programa Unwedge 3.0 da Rocsience.

Após a verificação da segurança, especificaram-se os suportes primários que constam do quadro 5, sendo a metodologia de escavação e suporte indicada na figura 9, para as zonas ZG1, ZG2 e ZG3.

Com base nas deformações estimadas, cujo valor máximo vertical foi de 33 mm, no eixo da abóbada em ZG3, foi definida a tolerância construtiva de 3 cm a introduzir no raio de escavação. Foram ainda definidos valores ao nível dos critérios de alerta e de alarme, que serviram como referência durante a escavação das deformações registadas pelo sistema de auscultação previsto, constituído por convergências, marcas de nivelação precisa e extensómetros. A título de exemplo, refira-se que o limite de alerta para fase de escavação da calote superior variou entre 0,6 e 25 mm, respectivamente em ZG1 e em ZG3, sendo os correspondentes valores de deslocamento para o limite de alarme de 0,8 e 30 mm.

Os cálculos realizados em 2D permitiram estimar valores, em regime de deformação plana, cuja ordem de grandeza ronda os 3 cm, em média (figura 8). A fim de reproduzir do modo o mais realista possível o faseamento construtivo associado a cada zona geotécnica, foi considerado o faseamento da escavação bem como a aplicação de suporte correspondente a cada fase.

Zona geotécnica

Avanço calote (m)

Betão projectado esp. (m)

Soleira curva

Pregagens L (m) A (m²)inf

Cambotas Af.(m)

Enfilagens L (m) Af.(m) Sobreposição (m)

Entrada 1,00 0,25 Sim f25 mm L = 4 A =1,50 (hasteais)inf. HEB140 Af=0,75 a 1,00 Duplo chapéu f32 mm L=12 Af.=0,5 S=3

ZG3 0,75 a 1,00 0,25 Sim f32 mm L = 6 A =1,50 (hasteais)inf. HEB140 Af=0,75 a 1,00 f32 mm L=12 Af.=0,3 S=3

ZG2 1,50 0,20 - f25 mm L = 4 A =1,50 (hasteais)inf. HEB140 Af=1,50 Forepoling a 45°. f25 mm L=8 Af.=1,5

ZG1 3,00 0,10 a 0,15 - Tipo swellex (100 kN) L = 4 A =2,25 inf. - -

Saída 1,00 0,20 - - HEB140 Af= 1,00 f32 mm L=12 Af.=0,4 S=3

Quadro 5 - Suportes primários adoptados no túnel T2

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Continuação

ESTUDOS DE EXECUÇÃO DE TÚNEIS FERROVIÁRIOS NA LINHA BOUGHZOUL-DJELFA, ARGÉLIA

Além do indicado no quadro 5, na frente da escavação foram ainda consideradas pregagens de fibra de vidro, do tipo Y35, nos emboquilhamentos de entrada e também em ambos os túneis na presença da zona geotécnica ZG3.

3.2.3 - REVESTIMENTO DEFINITIVO

Para o revestimento definitivo foram definidas quatro secções tipo principais, tendo sido para cada uma, caracterizados os diferentes tipos de armaduras, consoante a zona geotécnica atravessada (quadro 3). Para as seções sem soleira curva, considerou-se fundação directa através de sapatas e estrutura do revestimento com espessura de 0,30 m em ZG1, e 0,40 m para ZG2 e nos emboquilhamentos. A partir desta última foi desenhada a secção do falso túnel (prolongamento da estrutura interior) na qual se considerou um hasteal recto vertical abaixo do eixo horizontal. Por último, foi considerada uma secção com 0,40 m de espessura e soleira curva com espessura de 0,50 m em ZG3 (figura 7).

O cálculo dos esforços a considerar na verificação da segurança do revestimento definitivo foi realizado com recurso a métodos de elementos finitos, também utilizados para verificar os suportes primários, considerando assim a interacção solo-estrutura com interfaces adequadas (num cenário de longo prazo, conservador, onde o reequilíbrio das tensões já ocorreu na íntegra). Foram feitas análises de sensibilidade para as diversas zonas geotécnicas, tendo sido retida e considerada como representativa deste caso o modelo desenvolvido considerando um coeficiente k = 1 (sh/sv).

Em paralelo, para as zonas de maciço rochoso (em ZG1 e em ZG2 e no emboquilhamento de saída do túnel T2), foram verificadas recorrendo a modelos de elementos lineares elasticamente apoiados, duas situações de carga correspondentes uma ao destacamento de um bloco em posição excêntrica (também utilizado no dimensionamento do suporte primário) e uma segunda considerando o volume de maciço destacável resultante da metodologia empírica de Rocha, (1976). O estudo das diferentes secções

3.2.4 - DRENAGEM E IMPERMEABILIZAÇÃO

A estrutura do túnel foi considerada drenada, tendo para tal sido previsto um sistema de impermeabilização e drenagem. O sistema de drenagem é constituído por um conjunto de drenos colectores DN 150 mm em PVC na base dos hasteais, com ligações transversais ao colector central em betão DN 500 mm, a cada 20 m, criando assim uma segurança adicional do sistema, uma vez que os drenos longitudinais não seriam visitáveis. Onde necessário, a definir durante a fase de obra, previu-se o reforço da drenagem do contorno de escavação com recurso a drenos planos.

O sistema de impermeabilização previsto é constituído por uma tela em PVC de 2 mm, protegida por um geotêxtil de características adequadas, com 500 g/m² de gramagem, colocado no intradorso do suporte primário. Nas juntas de betonagem foram considerados elementos hidro-expansivos.

3.2.5 - ASPECTOS CONSTRUTIVOS

A zona central do túnel T2, onde foi prevista a presença de materiais triássicos (margas com gesso) que à partida se afigurava como o trecho de maior dificuldade, ao apresentar-se totalmente seca e sem fenómenos evolutivos significativos a registar após contacto com o ar e principalmente com a água utilizada nas furações, acabou por ser atravessada com o suporte correspondente a ZG3 (Quadro 5), sem qualquer tipo de dificuldade a assinalar. Pelo motivo anterior, o faseamento da escavação acabou por ser simplificado (figura 9), tendo-se recorrido a apenas duas fases horizontais, ao contrário das três inicialmente previstas na versão inicial dos estudos de projecto.

seguiu o método das reacções hiperestáticas, recorrendo ao programa de cálculo automático SAP 2000.

Na verificação da segurança os esforços adoptados foram os mais condicionantes dos vários cenários analisados.

Figura 9 - Metodologia de escavação e suporte primário previstas para as zonas geotécnicas ZG1, ZG2 e ZG3 dos túneis, em Études d'exécution, COBA (2015).

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Continuação

ESTUDOS DE EXECUÇÃO DE TÚNEIS FERROVIÁRIOS NA LINHA BOUGHZOUL-DJELFA, ARGÉLIA

Em termos executivos importa referir que, ao contrário do que é habitual neste tipo de obras, o reforço do betão projectado aplicado no revestimento primário, foi conseguido à custa da incorporação de malha electro-soldada #150 x 150 x 6mm, com toda a problemática associada ao tempo de aplicação e possibilidade de criação de zonas de sombra com menor contacto maciço-suporte (não foi possível utilizar fibras metálicas). Note-se que tecnologias consideradas ao dia de hoje como correntes são ainda de difícil aplicação noutras geografias, em particular quando afastadas dos grandes centros urbanos como é o presente caso, obrigando a adaptar as soluções aos materiais disponíveis na zona. Ainda no que respeita a este tipo de vicissitudes executivas, refira-se também, por exemplo, a impossibilidade de incorporação em obra dos extensómetros previstos em projecto.

Figura 10 - Aspectos diversos da fase construtiva. Imagens cedidas pela COSIDER-TP.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a todos os que tornaram possível a concretização desta obra, em particular ao pessoal presente no estaleiro M-26 da COSIDER-TP.

REFERÊNCIAS

Bieniawski, Z.T. (1989) – Engineering Rock Mass Classification. John Wiley & Sons, New York.

COBA (2015) - Réalisation des Tunnels de la nouvelle Ligne Electrifie Khemis-Djelfa. Tronçon 2 Boughezoul – Djelfa. Études d'exécution : Série 200 – Hypothèses géotechniques ; Série 300 – Tunnel en mine et Portails ; Série 400 - Faux Tunnel et Tranchée, Tunnel 1 et Tunnel 2. (não publicado).

Grimstad, E. & Barton, N. (1993) in Practical Rock Engineering de Evert Hoek, disponível em

, acedido em 01 de Março 2018.

Rocha, M. (1976) – Estruturas Subterrâneas. Reedição LNEC de 2013, Lisboa.

Romana, M. (2003) - Nuevas Recomendaciones de Excavación y Sostenimiento para Túneles y Boquillas. Jornadas Hispano-Lusas sobre Obras Subterráneas. Madrid, 15-16 septiembre 2003, disponível em acedido em 01 de Março 2018.

SYSTRA, GETINSA, SETIRAIL (2011) - Étude APD et DCE de la ligne nouvelle électrifie Boumedfaa – Djelfa (266 km). (não publicado).

https://www.rocscience.com/documents/hoek/corner/Practical-Rock-Engineering-Full-Text.pdf

http://www.stmr.es/recursos/articulos/?1,

Escavação em ZG3 em areias da unidade Cn-Cretácico médio no túnel T2,com faseamento simplificado em duas fases horizontais.

Furação para avanço da frente na unidade Ct- Cretácico superiorno túnel T2.

Posicionamento da cofragem junto à saída do túnel T2

Aspecto do túnel T2, com a contrabóbada e armaduras da base dospasseios/caleira de equipamentos e de arranque da abóbada instaladas.

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RESUMO

1 - INTRODUÇÃO

Freitas, Rui; COBA, Consultores de Engenharia e Ambiente, Lisboa, Portugal, [email protected]

O peculiar enquadramento geológico e geomorfológico da ilha da Madeira, caracterizado pela natureza vulcânica que se desenvolve em encostas inclinadas talhadas por linhas de água encaixadas, confere características únicas à região tornando-se determinante na definição de novas vias de acesso rodoviário e uma das principais condicionantes do tipo de soluções de obras a adotar.

Na conferência em referência abordam-se os principais aspetos geológico-geotécnicos de âmbito geral da ilha da Madeira, nomeadamente a natureza das formações e a sua estrutura, os problemas geotécnicos mais comuns e um enquadramento geral relativo à caraterização geotécnica das formações. Relacionam-se ainda com algumas obras rodoviárias recentes.

16º Congresso Nacional deG e o t e c n i aPonta Delgada, Açores27 a 30 de maio de 2018

ASPETOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOS ASSOCIADOS A OBRAS RODOVIÁRIAS EMAMBIENTE VULCÂNICO (ILHA DA MADEIRA)

A ilha da Madeira caracteriza-se morfologicamente por uma sucessão de relevos intensamente dissecados pela erosão vertical e horizontal, que contribui para a existência de vales profundamente encaixados, de declives e perfis longitudinais extremamente acentuados, e para uma morfologia costeira de elevada altitude, composta por arribas alcantiladas. É, portanto, uma ilha de relevo contrastante e vigoroso, que se considera desprovida de litoral, com arribas irregulares derivado da intensa erosão.

Esta morfologia exuberante e acidentada expressa a atuação de diversos fatores que, embora diferenciados, modificam e contribuem para a modelação do relevo, tais como: a estrutura, a forma e a idade do edifício vulcânico; a natureza litológica dos seus materiais e respetiva disposição; e o “tipo e intensidade dos agentes externos próprios da respetiva situação geográfica”, os quais dependem da atuação dos processos e mecanismos associados ao quadro climático local.

É neste contexto, intrinsecamente vulcânico, que obras rodoviárias encontram os principais condicionantes ao seu planeamento e execução, observando-se não raramente situações de complexidade geológico-geotécnica locais que condicionam grandemente as soluções técnicas implementadas.

GEOLOGICAL AND GEOTECHNICAL ISSUES RELATED WIH ROAD WORKS INVOLCANIC ENVIRONMENT (MADEIRA ISLAND)

ABSTRACTThe peculiar geological and geomorphological environment of the island of Madeira, characterized by the volcanic nature that develops on steep slopes carved by embedded streams, confers unique characteristics to the region becoming determinant in the definition of new road access roads and one of the main constrains of the type of work solutions to be adopted.

In this conference, the main geological and geotechnical aspects of the island of Madeira are approached, namely the nature of the formations and their structure, the most common geotechnical problems, as well as a general framework about the formations geotechnical parameters. They are also related to some recent road construction works.

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2 - ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO GERAL2.1 - GEOLOGIA, ESTRUTURA E TECTÓNICA

A história geológica do arquipélago da Madeira está intrinsecamente ligada à abertura e expansão do Atlântico, iniciada há cerca de 200 Ma, durante o Triássico, a qual prossegue ainda no tempo corrente. Expansão essa que dita o afastamento do arquipélago ao Rift, o que contribui também para que a sismicidade no Arquipélago da Madeira, seja, na maior parte das ocorrências, o reflexo dos abalos que afetam o Arquipélago dos Açores e Portugal Continental, cujos focos se situam, na maior parte dos casos, na direção Açores – Gibraltar.

O Arquipélago da Madeira está situado na placa africana, mais concretamente, na região intraplaca limitada a oeste pela crista média atlântica, a norte pela complexa estrutura Açores-Gibraltar e a sudeste pelo cratão oeste-africano (Figura 1). A atividade sísmica de tal região é baixa sendo, na maior parte dos casos, reflexo dos sismos que são gerados na fronteira de placas Açores-Gibraltar ou nas falhas ativas que retalham as plataformas continentais oeste-ibérica e africana (Moreira, 1991 in Mata et al., 2013).

Figura 1 – Enquadramento tectónico do arquipélago da Madeira.Grupo Madeira-Desertas-Porto Santo e batimetria da zona envolvente,

com indicação das zonas de rift da posição aproximada daCrista do Funchal (in Mata, J. et al., 2013)

A forma alongada do edifício insular emerso (E-W a NW-SE) reflete a atividade vulcânica em dois sistemas de fracturação distintos. A zona de rift de direção E-W parece ter sido a estrutura responsável pelo vulcanismo ocorrido durante as duas primeiras fases eruptivas, expressas nos complexos vulcânicos Inferior e Intermédio, enquanto o sistema fissural de direção geral NW-SE, terá controlado estruturalmente o vulcanismo de idade mais recente relativo ao Complexo Vulcânico Superior (CVS).

Identificam-se três sistemas de fraturas com direções NW-SE, E-W e NNE-SSE, encontrando-se representados por falhas, sistemas de filões, alinhamentos de cones do CVS, traços geomorfológicos lineares e lineamentos deduzidos de análise de imagem de satélite e fotografia aérea (Fonseca et al., 1998 in Mata et al., 2013). Este autor identificou cerca de uma centena de lineamentos com comprimentos superiores a 1 km, totalizando cerca de 450 km (Figura 2).

Figura 2 – Lineamentos tectónicos na ilha da Madeira(Fonseca et al., 1998, in Mata J. et al. 2013).

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O maior deles (Lineamento Seixal–Machico), identificável numa extensão de 38.5 km e com uma direção quase paralela ao alongamento da ilha (N108º), foi confirmado por observações de campo como correspondendo a uma falha normal, com abatimento do bloco norte e com uma expressiva componente de desligamento direito.

A componente de abertura deste acidente em regime direito, está também expressa pelo padrão cartográfico dos filões da região central da ilha. Com espessuras na maioria das vezes superiores a 10 metros, estes filões apresentam direções N150º compatíveis com uma abertura de fendas escalonadas em regime direito. A observação de encraves de natureza ultramáfica em alguns deles e a emergência de águas com teores de CO e 2

temperaturas elevadas em fraturas intersetadas por túneis (Fonseca et al, 2000) é de alguma forma sugestiva de um enraizamento profundo de alguns destes acidentes, apontando para a presença de sistemas vulcanotectónicos ativos na ilha da Madeira (Mata, J. et al., 2013).

O conhecimento da localização exata e da orientação destes grandes acidentes é de grande importância do ponto de vista económico, sendo instrumento indispensável ao planeamento e projeto quer de grandes obras de engenharia (e.g. túneis rodoviários), quer de captações de água. Refira-se o túnel de prospeção de água da Fajã da Ama onde se obtiveram caudais entre os 285 e 350 l/s na dependência de uma única zona de fratura (N80º) que funciona como zona preferencial de fluxo subterrâneo (e.g. Fonseca et al., 2000).

A ilha da Madeira corresponde à parte emersa de um grande edifício vulcânico de tipo escudo, de idade miocénica a holocénica (7 Ma), construído sobre crosta oceânica de idade cretácica, na Placa Africana. A sua edificação ocorreu, por atividade vulcânica submarina e, posteriormente, por empilhamento de erupções subaéreas geradas maioritariamente por atividade vulcânica fissural, ao longo de um eixo principal de direção aproximada E-W.

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Figura 3 – Carta geológica da ilha da Madeira (Madeira, J. et al, 2007)

Continuação

ASPETOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOS ASSOCIADOS A OBRAS RODOVIÁRIAS EMAMBIENTE VULCÂNICO (ILHA DA MADEIRA)

As suas lavas são alcalinas, predominando os litótipos de carácter pouco diferenciado como basanitos e basaltos alcalinos, estando as rochas intermédias como mugearitos e traquitos representadas em raros afloramentos.

Na ilha da Madeira foram identificados três complexos vulcânicos compostos por um total de sete unidades ou formações estratigráficas principais, limitadas por superfícies de inconformidade expressas à escala regional da ilha (Madeira, J. et al., 2007; Brum da Silveira, A et al., 2010).

O Complexo Vulcânico Inferior (CVI) (Miocénico > 5,57 Ma) representa o final da fase submarina do vulcão escudo e subdivide-se em:

Ÿ Formação de Porto da Cruz (CVI1) - constituída por rochas muito alteradas de origem hidromagmática (hialoclastitos, brechas hialoclastíticas e derrames lávicos submarinos), cortadas por uma rede densa de filões;

Ÿ Formação dos Lameiros (CVI2) - constituída por uma sequência fossilífera de sedimentos carbonatados marinhos de baixa profundidade. Encontra-se exposta a 400 m de altitude na região dos Lameiros, sugerindo importante levantamento da ilha.

O Complexo Vulcânico Intermédio (CVM) (Plio-Plistocénico ~ 5,57 – 1,8 Ma) corresponde à principal fase de construção subaérea do vulcão escudo, subdividindo-se em:

Ÿ Formação da Encumeada (CVM1) - caracterizada por erupções de estilo estromboliano e vulcaniano em cones ou sistemas fissurais situados ao longo de uma zona de rift de direção E-W, abrangendo os atuais setores central e oriental da ilha, observando-se em alternâncias de derrames lávicos com tufos de piroclastos de queda, ocasionalmente com níveis constituídos por brechas vulcânicas e depósitos de fluxo piroclástico;

Ÿ Formação da Penha de Águia (CVM2) - caraterizada por numerosas erupções (de estilo estromboliano e havaiano) que emitiram derrames lávicos volumosos a partir de centros eruptivos localizados no Maciço Montanhoso Central, aumentando significativamente o volume insular imerso. As sequências de derrames lávicos formam grandes empilhamentos de escoadas de basaltos e basanitos de espessura reduzida intercaladas com níveis de piroclastos de queda distais (lapilli e cinzas), bem como tufos de escórias e ocasionalmente produtos de atividade freato-magmática;

Ÿ Formação do Curral das Freiras (CVM3) - caracterizada por vulcanismo de estilo essencialmente havaiano (ou estromboliano) em bocas fissurais situadas provavelmente na região do Paul da Serra, correspondendo à fase de crescimento da ilha no sector oeste. É constituída, no geral da ilha, por escoadas basálticas, por vezes espessas, com intercalações de piroclastos de queda (escoras, lapilli e cinzas), tufitos e produtos freato-magmáticos.

O Complexo Vulcânico Superior (CVS) (Plisto-Holocénico ~ 1,8 – 0,007 Ma) corresponde à fase de revestimento vulcânico da ilha e vulcanismo pós-erosivo, em centros eruptivos ou sistemas fissurais situados ao longo de zonas de rift vulcânico de direção NW-SE a WNW-ESE, sendo formado por:

Ÿ Formação dos Lombos (CVS1) - etapa de revestimento vulcânico insular em posição morfológica culminante e, nalguns casos, preenchendo vales relacionados com a morfologia atual;

Ÿ Formação do Funchal (CVS2) - etapa de vulcanismo pós-erosão, isto é, contemporâneo da morfologia atual.

Depósitos sedimentares epiclásticos de brechas e conglomerados estão presentes nas várias unidades estratigráficas e testemunham, entre outros, importantes movimentos de massa (enxurradas, deslizamentos, etc.) relacionados com o forte relevo da ilha.

Para além das formações mencionadas, destacam-se ainda rochas granulares que ocorrem no Complexo Vulcânico Inferior – Unidade do Porto da Cruz (CVI1); filões e massa filonianas de que são exemplos o Maciço Montanhoso Central e a Ponta de São Lourenço; areias de praia; depósitos eólicos; depósitos glaciares e periglaciares.

2.2 - PERIGOSIDADE GEOLÓGICA

Os depósitos de movimentos de massa ocorrem um pouco por toda a ilha, resultantes fundamentalmente da ação da gravidade sobre as vertentes de pendor elevado e grande desnível, e potenciados mais geralmente por condições climatéricas adversas, podem envolver volume de massa de grandes proporções, destacando-se os mais importantes por tipologia:

a) Penha de Águia e Cabo Girão (desabamentos);

b) Ribeira dos Socorridos (tombamento);

c) Curral das Freiras, Fajã do Marques, Boaventura e Fajã da Nogueira (deslizamentos rotacionais);

d) Arco de São Jorge, Arco da Calheta (deslizamentos translacionais).

Estes depósitos gerados por deslizamentos podem apresentar associações de fácies brechoides, conglomeráticas e areníticas, ou ocorrerem como “fácies de mega-bloco”, incorporando grandes blocos de rocha muito fraturada e vários níveis de sequências vulcânicas.

A última erupção data de há cerca de 6850 anos, sendo que atualmente ainda ocorrem manifestações de vulcanismo secundário, tais como libertação de gases (CO ) e águas termais, de que é exemplo a emergência 2

de águas com teores de CO superiores a 2000 ppm e temperaturas 2Cpróximas de 30º em fraturas intersetadas pelos túneis da Encumeada e

Machico-Porto da Cruz (Fonseca et al., 2000) e o caso da captação da Fajã da Ama onde a interseção de uma zona de falha ocasionou a libertação de grandes quantidades de gás (cerca de 100% de CO e pequena parte de gás 2

222Radão ( Rn). Estes factos apontam para a presença de sistemas vulcanotectónicos ativos na ilha da Madeira, podendo afirmar-se que,

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Continuação

ASPETOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOS ASSOCIADOS A OBRAS RODOVIÁRIAS EMAMBIENTE VULCÂNICO (ILHA DA MADEIRA)

embora reduzido, o risco de uma erupção na ilha da Madeira não é nulo (Mata, J. et al., 2013).

Historicamente a sismicidade registada na Madeira é fraca e sentida com baixa intensidade, tendo os epicentros dos últimos sismos sido registados a cerca de 70 km a sul do Funchal. O principal perigo decorrente dos sismos é a possibilidade de despoletar movimentos de massa em locais com condições precárias de estabilidade.

Os fluxos de detritos e de lamas (aluviões) associados a episódios de grandes inundações, são um dos perigos naturais de maior incidência na Madeira. Vários fatores contribuem para este risco, nomeadamente o próprio relevo, com encostas muito evolutivas que fornecem gradualmente o material sólido aos ribeiros, e os fortes declives dos talvegues favorecendo condições para grande velocidade de escoamento, associados a períodos de forte e persistente pluviosidade.

Por outro lado, as mesmas encostas ocorrem desprendimentos ocasionais de grandes massas de material sobre o leito dos ribeiros, ora estreitando o leito ora bloqueando-o, contribuindo para uma concentração de importantes caudais e carga sólida a jusante. No registo geológico observam-se várias situações de depósitos conglomeráticos resultantes de eventos deste tipo, encontrando-se intercalados com outras unidades geológicas, permanecendo fossilizados. O episódio mais recente ocorreu em 2010 acarretando grandes prejuízos na zona do Funchal.

3 - CARACTERIZAÇÃO GEOMECÂNICA DASFORMAÇÕES VULCÂNICAS

Na sequência da caracterização geológica é necessário realizar a campanha de investigação geotécnica com vista à definição dos parâmetros geotécnicos de projeto. Os trabalhos de prospeção geotécnica e ensaios de laboratório mais utilizados não diferem muito dos realizados em materiais de ambientes não vulcânicos.

As formações geológicas vulcânicas têm sido correntemente caracterizadas no âmbito de projetos de investigação e de projetos de engenharia. Os ensaios mais utilizados na caracterização das formações rochosas são os ensaios de compressão uniaxial com determinação da tensão de rotura e módulo de deformabilidade, bem como a determinação do peso volúmico. No caso das amostras de índole mais terrosa os ensaios de caracterização de resistência têm sido a compressão triaxial e corte direto.

Contudo, face à heterogeneidade das formações e à dificuldade de colheita de amostras de qualidade adequada para os ensaios laboratoriais normalmente preconizados, com impacto negativo na quantidade de amostras que se pode considerar como mínima para uma caracterização adequada deste tipo de materiais, é comum recorrer-se a dados bibliográficos compilados de outras obras que interessaram as mesmas formações geológicas.

Assim, comparam-se os resultados obtidos em algumas das principais obras realizadas nos últimos 15 anos na Madeira com outros publicados que abrangem um maior número de obras e de ensaios, referentes a materiais

da ilha da Madeira. Desta comparação, conclui-se que na generalidade existe uma dispersão razoável de resultados, quer no caso das rochas piroclásticas, quer no caso das brechas, quer no caso dos basaltos, facto que é devido à diversidade das amostras, pois a comparação englobou amostras de materiais com diferentes compacidades e estados de alteração. Apesar desta dispersão, os valores obtidos enquadram-se nos valores existentes na bibliografia. Na Figura 4 apresentam-se os resultados obtidos no presente trabalho (a preto) com outros publicados (a cores) por Lourenço et al. (2010) sobre materiais da ilha da Madeira. Os resultados obtidos enquadram-se com os resultados existentes na bibliografia.

Na Figura 5 apresentam-se os resultados que correlacionam os valores da resistência à compressão uniaxial e do peso volúmico seco obtidos no presente trabalho (a preto) com outros publicados (a cores) por Lourenço et al. (2010) sobre materiais da ilha da Madeira e com outros resultados publicados por Serrano et al. (2007) sobre materiais das ilhas Canárias. Os resultados obtidos enquadram-se com os resultados existentes na bibliografia.

Figura 4 - Comparação dos resultados obtidos em ensaios de compressão uniaxial com resultados publicados por outros autores, para i) basaltos; ii) brechas e iii) tufos

Figura 5 - Comparação dos resultados obtidos comresultados publicados por outros autores.

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Continuação

ASPETOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOS ASSOCIADOS A OBRAS RODOVIÁRIAS EMAMBIENTE VULCÂNICO (ILHA DA MADEIRA)

No que se refere à determinação dos parâmetros de resistência, tem-se verificado muito dificuldade em obter amostras suficientemente homogéneas para a realização de ensaios específicos e em quantidade suficiente que permita uma análise fundamentada e criteriosa da gama de resultados obtidos. Como meio de obviar a insuficiência de ensaios de base para a determinação deste tipo de parâmetros, utilizam-se outro tipo de abordagens, nomeadamente a correlação com os ensaios SPT realizados in situ em materiais mais terrosos. Quando os estudos estão numa fase mais preliminar, e, portanto, sem resultados de ensaios atempadamente, recorre-se à utilização de ábacos que foram desenvolvidos com base em resultados obtidos e experiência adquirida em outras obras, como aquele que se apresenta na Figura 6.

Figura 6 – Ábaco de definição de parâmetros geotécnicos de resistência(Lourenço, et al, 2010).

Com base em toda a experiência adquirida a partir das missões de reconhecimento geológico e de análise contínua das formações vulcânicas em sondagens, afloramentos e escavações em obras, foi possível definir intervalos de referência de valores típicos de GSI. Na Figura 7 apresenta-se uma classificação proposta por Lourenço et al. (2010) para as formações vulcânicas segundo o seu grau de alteração, e que, grosso modo, corrobora a experiência acumulada em outras obras.

Figura 7 – Classificação GSI proposta para as formações vulcânicas da ilha da Madeira(Lourenço, et al, 2010).

4 - ASPETOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOSASSOCIADOS A ALGUMAS OBRAS

Em seguida apresentam-se 3 casos de obra onde as particularidades de natureza geológico-geotécnica revelaram aspetos determinantes no decurso das obras.

Figura 8 – Localização das obras rodoviárias em análise.1) Acesso Oeste ao Porto do Funchal,

2) Variante à Madalena do Mar, 3) Ligação Vasco Gil / Fundoa

O Acesso Oeste ao Porto do Funchal envolve várias infraestruturas numa extensão de 1,2 km, nomeadamente um viaduto de 120 m, várias estruturas de contenção, uma ponte de 100 m e ainda um túnel urbano de 600 m. A cidade do Funchal, localiza-se num anfiteatro natural com morfologia agressiva caracterizado por encostas inclinadas talhadas por linhas de água encaixadas. A este quadro acrescem ainda dificuldades geotécnicas resultantes da heterogeneidade litológica e da sua variação espacial, consequência da natureza vulcânica da ilha. Nas condições geomorfológicas, geológicas e geotécnicas em que se desenvolve o traçado, foi necessário suportar os estudos por um total de 550 m de sondagens e ensaios associados.

4.1 - ACESSO OESTE AO PORTO DO FUNCHAL

Figura 9 – Enquadramento do Acesso Oeste ao Porto do Funchal.

4.2 - VARIANTE À MADALENA DO MAR

As principais condicionantes originais do projeto envolveram a fundação de um encontro do viaduto em solos de cones de escórias desagregadas com mais de 60 m de profundidade, a presença de falhas atravessando o túnel, e o baixo recobrimento do túnel com importantes edifícios sobre o seu alinhamento.

O traçado da Variante à Madalena do Mar, localizado na zona Sudoeste da ilha da Madeira, desenvolve-se essencialmente ao longo de dois túneis rodoviários de tipo bidireccional que, juntamente com as galerias de emergência associadas, totalizam cerca de 4 775 m de escavações subterrâneas.

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Os túneis desenvolvem-se nas proximidades de arribas costeiras, interessando fundamentalmente alternâncias de escoadas lávicas com depósitos piroclásticos, ambos pertencentes ao complexo vulcânico intermédio. Junto aos emboquilhamentos ocorrem ainda depósitos de vertente. Estes depósitos de vertente, na entrada do primeiro túnel, encontram-se associados a uma grande massa escorregada, na zona central entre túneis, associados à Ribeira da Madalena de grande dinâmica erosiva e, na zona terminal do traçado na saída do segundo túnel, à ação erosiva marinha.

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Continuação

ASPETOS GEOLÓGICO-GEOTÉCNICOS ASSOCIADOS A OBRAS RODOVIÁRIAS EMAMBIENTE VULCÂNICO (ILHA DA MADEIRA)

Figura 10 – Enquadramento da Variante à Madalena do Mar.

Foi dado especial enfoque às soluções construtivas adotadas no atravessamento de depósitos piroclásticos finos de carácter evolutivo e de depósitos de vertente.

4.3 - LIGAÇÃO VASCO GIL / FUNDOA (COTA 500)

Dada a urbanização em terrenos muito inclinados, as vias rápidas que circundam o litoral foram sendo construídas a distintas cotas, cada vez mais elevadas. À Cota 500 o projeto de uma ligação ao noroeste do Funchal, entre as localidades de Vasco Gil e Fundoa, relativamente curta, de cerca de 4.1km, requereu um projeto de 7 túneis viários bidirecionais, totalizando cerca de 1 750m de comprimento total.

A obra começou a ser construída em 2008 e parou em 2011 por falta de financiamento. Os restantes 500m de obra foram retomados em 2018 prevendo-se terminar os viadutos V4 e V5 e o túnel T2 até abril de 2019.

No trecho relativo à Fase 1, que incluiu os túneis T1 e T2, o túnel T1 tem 361m de comprimento e foi construído pelo método convencional. O túnel T2 consiste numa estrutura de betão construída em trincheira pelo método de “cut & cover”.

Juntamente com o trecho da Fase 2, cujo concurso foi adiado em 2011, a obra da Cota 500 terá 7 túneis, 8 viadutos, 10 PS/PI/pontões e várias dezenas de estruturas de contenção de várias tipologias situadas quer na plena via quer associadas às fundações das obras de arte, numa extensão de cerca de 4,1 km.

O traçado da via foi implantado em terrenos do complexo vulcânico pós-miocénicos basálticos com intercalações piroclásticas, interessando também depósitos recentes coluvionares e aluvionares. São também interessados pontualmente depósitos de vertente de espessura reduzida.

Figura 8 – Enquadramento da Ligação Vasco Gil / Fundoa, à Cota 500

As principais condicionantes observadas em obra deveram-se essencialmente à interseção dos depósitos de vertente nas escavações e aterros das ligações à rede viária existente ao longo da encosta. É de salientar que a maior preocupação com este tipo de material de cobertura, por vezes de grande espessura, mesmo não sendo interessada pela obra, é o

fato de episodicamente puderem afetar as vias, conforme sucedeu em fevereiro de 2010, período de grande temporal e precipitação intensa.

A execução de obras lineares com desnivelamento transversal às linhas de drenagem, neste tipo de morfologia jovem, muito acidentada, em ambiente geológico vulcânico de características muito heterogéneas a que acresce o enquadramento urbano, obriga em sede de projeto a optar por soluções abrangentes do ponto de vista geotécnico, que permitam uma resposta de largo espectro e uma fácil adaptação em obra à realidade encontrada, nomeadamente nos túneis, na fundação das obras de arte e nas obras de contenção.

No presente caso as obras pautaram-se por um rigoroso controlo de execução e pelo acompanhamento geológico-geotécnico das escavações em geral.

Durante a Assistência Técnica à fase construtiva, a comunicação entre a obra (Dono de Obra/ Adjudicatário e Fiscalização) e a engenharia de projeto foi fundamental na adequação e adaptação das soluções previstas. Tendo por base a versatilidade das soluções abrangentes e também apoiando as decisões num apertado controle geológico dos terrenos encontrados nos trabalhos à medida que vão sendo realizados, contribuiu-se para a execução das obras em segurança, com rapidez e economia acrescida.

A abordagem adotada, no que diz respeito às metodologias de projeto, revelaram-se adequadas para ultrapassar as dificuldades criadas pelas diferentes condicionantes inerentes à execução das obras em maciço vulcânico em meio urbano.

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

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A e B) e notícia explicativa da Carta Geológica da Madeira à escala 1:50000. Secretaria Regional do Ambiente e recursos Naturais. Governo Regional da região Autónoma da Madeira. Dezembro 2007.

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