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CONTRAPONTO

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Luís Fernando Pozzi

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RAE Light • v. 6 • n. 3 • p. 2-3 • Jul./Set. 1999

Parodiando Martin Luther King,eu tive um sonho: decidido a pas-sar um fim de semana divertidocom a minha família, optei por umespetáculo cada vez mais concorri-do na grande metrópole paulistana:assistir a um jogo do meu time, oCorinthians S.A., contra a Inter deMilão, pela Liga MundialInterclubes, ou Opel Cup, como émais conhecida.

Como acionista do Corinthianse detentor de um assento reservadopor toda a temporada 2009/2010,decido respirar futebol por doisdias, hospedando-me no complexoturístico/esportivo do clube, oCorinthians Nike Meliá Center1,onde o clube manda seus jogos, nosábado pela manhã.

Logo ao chegar, estaciono meucarro num lugar coberto e reserva-do para mim, deixo minhas coisasno quarto e vou tomar café da ma-nhã no restaurante temático docomplexo, repleto de troféus, cami-sas, chuteiras, bolas, fotos echarges alusivas às grandes con-

quistas do clube. Neste ambiente,todo decorado em preto e branco,minha esposa, meu casal de filhose eu nos sentamos a uma mesa, ten-do como companhia, além de ou-tros acionistas e turistas de passa-gem pela cidade, os próprios joga-dores, concentrados para a partidado dia seguinte.

Uma vez terminado o café, osjogadores colocam-se à disposiçãodos presentes para uma sessão deautógrafos. Solícitos, atendem a to-dos, preocupando-se especialmen-te em atender às crianças e respon-der às suas dúvidas, já que todosno clube-empresa sabem que a con-tinuidade do sucesso dentro decampo depende das gerações futu-ras de torcedores, o que, por suavez, reflete nos resultados fora decampo. Ao final do café, meus fi-lhos saem com seus troféus: a ca-misa do clube assinada por seusídolos.

Após esse contato inicial comseus ídolos, os hóspedes têm umasérie de alternativas, desde as mais

tradicionais, como piscinas,gincanas e atividades físicas, quevisam agradar aqueles que nem li-gam para o futebol, mas buscam di-versão, até aquelas voltadas para ostorcedores mais fanáticos, comoacompanhar o último treino do clu-be antes do jogo ou participar declínicas na escolinha de futebol,onde ídolos do passado do clubepassam dicas de sua “arte” para agarotada.

Enquanto meus filhos aprimo-ram seus “dotes futebolísticos” naescolinha, aproveito para dar umapassadinha na megastore NikePassion2, onde encontro todo equalquer produto possível eimaginável com o distintivo e ascores do clube, dispostos de manei-ra visualmente tão atrativa, que éimpossível resistir. Obviamente, aNike tem um espaço de destaque,onde vende com exclusividade to-dos os artigos por ela fabricados,desde bola até relógios, óculos epôsteres, passando pelos uniformesoficiais do clube.

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2010: UMA ODISSÉIA ESPORTIVA

RAE Light • v. 6 • n. 3 • Jul./Set. 1999

As marcas dos demais fabrican-tes são mais uma garantia de quali-dade, o que me faz levar um pre-sente para cada membro da famí-lia. Assustado com o valor dessadespesa inesperada, resta-me umconsolo: usando o meu cartão deafinidade, tenho direito a um des-conto de 10%, além de acumularpontos que servirão de desconto nacompra dos ingressos para a tem-porada seguinte.

Ao final da tarde, encontramosnossos lugares reservados na salade imprensa, onde os jogadores e acomissão técnica explicarão aosjornalistas como foi a preparação equais as expectativas para o jogo.Terminada a coletiva, mais umaoportunidade para interagirmoscom os craques.

Após jantarmos e despacharmosnossos futuros craques para a cama,eu e minha esposa decidimos daruma passadinha no Heineken Black& White Cafe, bar temático que,além da decoração futurista e acon-chegante, dos pratos e drinks comnomes dos craques do passado e dopresente, das atendentes vestidascom uniformes estilizados do clubee com um pista de dança com o for-mato do distintivo do clube, contacom jogos eletrônicos interativos emesas para os amantes do eternofutebol de botão. O bar é estrategi-camente localizado, o que possibi-lita uma visão panorâmica do cam-po de jogo, para quem não quer sedar ao trabalho de descer ao campo.

No dia seguinte, ainda encontra-mos tempo para mais uma ativida-de antes do grande espetáculo: umavisita ao museu interativo Micro-soft Nação Corinthiana, onde aspessoas podem acessar a história doclube em estações multimídia, comfotos, imagens e sons das grandesglórias esportivas.

Finalmente, chega o horário dojogo, e os hóspedes do complexosão levados aos seus assentos poruma entrada independente. Apesar

da transmissão do jogo inclusivepara São Paulo, pelo sistema depay-per-view, o estádio está total-mente tomado, aliás como em qua-se todos os jogos do time, já que asvendas antecipadas de ingressospara a temporada respondem pelagrande maioria das receitas totaisde bilheteria.

Grande parte dos torcedoreschegaram ao estádio de metrô3, jáque há uma estação que desembar-ca na porta do estádio. Para os quevieram de carro, estacionamentossubterrâneos transformaram osflanelinhas em espécimes extintas,que sobrevivem apenas como per-sonagens de ficção nas históriascontadas pela nossa geração. Jádentro dos estádios, os torcedorescontam com várias opções de fast-food, além do Black & White Cafe.Complementando o cenário, ba-nheiros limpos, stands com peque-nas lembranças do time, seguran-ças particulares, serviço impecávelde informações...

Apesar do temporal que desabalá fora – certas coisas nunca mu-dam –, o clima dentro do estádio éagradável, graças ao sistema de co-bertura móvel do teto e de ar con-dicionado. Antes de os times entra-rem em campo e da execução doshinos nacionais, os telões de altadefinição encarregam-se de coman-dar os gritos de guerra da torcida eo compasso das músicas, ao mes-mo tempo em que todas as empre-sas que tenham alguma associaçãocom o evento aproveitam para pas-sar suas mensagens ao público edetonar todo o tipo de ação promo-cional – distribuição de brindes,descontos na compra de seus pro-dutos, sorteios de torcedores paradar o pontapé inicial, acompanharo jogo do banco de reservas, oubater um pênalti no goleiro do seutime etc.4

Para os torcedores mais fiéis –detentores dos ingressos para atemporada –, uma surpresa: o sor-

teio de três viagens para a partidade volta, em Milão, com todas asdespesas pagas e direito a acompa-nhante. E, como este sonho é meu,não poderia dar outra: fui um dosescolhidos!

Ao final do primeiro tempo, oshow continua: gols dos outros jo-gos da rodada e melhores momen-tos no telão, coreografias no cam-po, sessões de fotos com os masco-tes dos times e do torneio e maispromoções!

Enfim, termina o jogo! Interes-sado em saber o resultado? Since-ramente, depois de um fim de se-mana repleto de bons momentos,até o mais fanático torcedor teráque concordar que o balanço serápositivo, mesmo que o clube saiaderrotado em campo.

Como diz a letra da música, “umsonho a mais não faz mal”. Apesarde tudo, sou um otimista e acreditoque, quando as pessoas que lidamcom o esporte passarem a tratá-locomo entretenimento, sonhos comoesses estarão bem próximos de serealizarem.

Obs.: Todos os nomes utilizadossão fictícios.

NOTAS

1. O complexo usado para beisebol e futebol americanode Toronto inclui um hotel.

2. Uma das megastores mais famosas do mundo fica den-tro do estádio do Manchester United (Old Trafford), quetambém conta com um museu interativo e um bar temático,o Red Cafe.

3. Uma linha de metrô deixa os torcedores dentro do está-dio do Ajax de Amsterdã, que também conta com váriasopções de alimentação.

4. As promoções durante as partidas são uma constantenas principais ligas profissionais norte-americanas de fu-tebol americano (NFL), basquete (NBA), beisebol (MLB) ehóquei (NHL).

Luís Fernando Pozzi é Professor deMarketing Esportivo da EAESP/FGV e

autor do livro A grande jogada: teoria eprática do Marketing Esportivo.


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