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Os Ditadores da República Organizadores: Bruna de Almeida Farias Everson Barcelos Santos

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Os Ditadores da República

Os Ditadores da República

Os Ditadores da República

Organizadores:

Bruna de Almeida Farias

Everson Barcelos Santos

Brasília

2015

Arte da capa: Vinicius N. Aquino

Diagramação: Bruna de Almeida Farias

Revisão: Eliphas Bruno de M. Rodrigues

D615

Os ditadores da república / Bruna de Almeida Farias, Everson

Barcelos Santos (orgs.). – Brasília: [s.n.], 2015. – XXX p. – Livro

organizado pelos alunos de biblioteconomia da Faculdade de

Ciências da Informação da Universidade de Brasília.

1. História. 2. História do Brasil. 3. Ditadura militar no Brasil.

I. Farias, Bruna de Almeida. II. Santos, Everson Barcelos

CDU 981.088

Agradecimentos:

Ao professor de história Eliphas Bruno que se dispôs a nos ajudar, orientando-nos na pesquisa e revisando essa obra para nós.

Ao Vinícius Aquino que nos ajudou a com a arte da capa.

Ao professor Cássio que nos indicou a melhor gráfica.

À professora Michelli Costa, que nos ajudou muito com sua oficina de diagramação.

Por fim, mas não menos importante, ao nosso amigo Luis Carlos que foi quem sugeriu o título.

Sumário

Agradecimentos:3

Sumário5

Prefácio8

Introdução9

O que foi o Regime militar?10

Por que ocorreu o Golpe de 1964?12

O Golpe Militar de 196417

Humberto de Alencar Castelo Branco (1964-1967)26

Artur da Costa e Silva48

Passeata dos cem mil:58

Junta Governativa Provisória (31 de agosto de 1969 a 30 de outubro de 1969)62

Aurélio de Lyra66

Augusto Rademaker67

Márcio Melo68

Emílio Garrastazu Médici (1969-1974)70

Ernesto Geisel (1974-1979)82

João Figueiredo (1979-1984)94

Diretas Já!105

Cronologia do regime militar e alguns desdobramentos108

Referências Bibliográficas129

Prefácio

Essa obra foi organizada com o intuito de ser um livro dos mais completos da ditadura militar, focando nos governos de seus presidentes, ou, como preferimos chamar aqui, ditadores que governaram o Brasil nessa época.

Mesmo com poucas impressões e com a impossibilidade de ser comercializado, esperamos que essa obra possa vir ajudar quem pesquisa ou se interessa sobre o tema.

Introdução

Os Ditadores da República

Bruna de Almeida Farias

128

O que foi o Regime militar?

Tendo seu início com o golpe militar de 31 de março de 1964 e indo até a eleição de Tancredo Neves em 1985, foi o período da política brasileira em que militares conduziram o país (Exército, Marinha e Aeronáutica). Nesta época, os chefes de Estado, ministros e indivíduos instalados nas principais posições do aparelho estatal pertenciam à hierarquia militar, sendo que todos os presidentes do período eram generais do exército. Época que ficou marcada na história do Brasil através da prática de vários Atos Institucionais que colocavam em prática a censura, a perseguição política, a supressão de direitos constitucionais, a falta total de democracia e a repressão àqueles que eram contrários ao regime militar. Partidos políticos, sindicatos, agremiações estudantis e outras organizações representativas da sociedade foram suprimidas ou sofreram interferência do governo. O gesto dos militares era interpretado como saneador da vida social, econômica e política do país, livrando a nação da ameaça comunista e alinhando-a internacionalmente com os interesses norte-americanos, trazendo de volta a paz e ordem sociais.

Durante o regime militar, ocorreu um fortalecimento do poder central, sobretudo do poder Executivo, caracterizando um regime de exceção, pois o Executivo se atribuiu a função de legislar, em detrimento dos outros poderes estabelecidos pela Constituição de 1946. O Alto Comando das Forças Armadas passou a controlar a sucessão presidencial, indicando um candidato militar que era referendado pelo Congresso Nacional.

A década de 1960 iniciou também, um período de grandes transformações na economia do Brasil, de modernização da indústria e dos serviços, de concentração de renda, de abertura ao capital estrangeiro e do endividamento externo.

O Regime militar tem como principais características a cassação de direitos políticos de opositores; repressão aos movimentos sociais e manifestações de oposição; censura aos meios de comunicação; censura aos artistas (músicos, atores, artistas plásticos); aproximação dos Estados Unidos; controle dos sindicatos; implantação do bipartidarismo: ARENA (governo) e MDB (oposição controlada); enfrentamento militar dos movimentos de guerrilha contrários ao regime militar; uso de métodos violentos, inclusive tortura, contra os opositores ao regime; “Milagre econômico”: forte crescimento da economia (entre 1969 a 1973) com altos investimentos em infraestrutura; aumento da dívida externa.

Já no início da "Revolução" ficou evidente uma característica que permaneceria durante todo o regime militar: o empenho em preservar a unidade por parte dos militares no poder, apesar da existência de conflitos internos nem sempre bem resolvidos. O medo de uma "volta ao passado" (isto é, à realidade política pré-golpe) ou de uma ruptura no interior das Forcas Armadas estaria presente durante os 21 anos em que a instituição militar permaneceu no controle do poder político no Brasil. Mesmo desunidos internamente em muitos momentos, os militares demonstrariam um considerável grau de união sempre que vislumbravam alguma ameaça "externa" à "Revolução", vinda da oposição política.

Por que ocorreu o Golpe de 1964?

Os antecedentes do Regime Militar podem ser encontrados no período Vargas, entre os responsáveis pela sua derrubada em 1945, pondo fim ao Estado Novo. Este contingente de oposição se agruparia logo depois na UDN, União Democrática Nacional, partido de orientação liberal-conservadora. Com a volta de Getúlio por meio de eleições diretas em 1951, tal grupo continuaria fazendo oposição à sua política, considerada “populista”. Tal pressão acabaria por provocar o “suicídio” do presidente. Este gesto, apesar de frear o movimento das forças conservadoras, não impediu algumas tentativas, em especial a manobra para que o presidente eleito, Juscelino Kubitschek, não tomasse posse. Uma intervenção de um grupo militar não ortodoxo garantiria a posse de Kubitschek.

Quando Jânio Quadros foi eleito, parecia finalmente que as forças que dariam respaldo aos militares subiriam ao poder, mas, o temperamento ímpar do novo presidente e sua surpreendente renúncia implodiram o projeto conservador.

O presidente João Goulart assumiu a presidência após a inesperada renúncia de Jânio Quadros (PTN), em 1961. Sua posse foi bastante conturbada e só foi aceita pelos militares e pelas elites conservadoras depois da imposição do regime parlamentarista. Essa fórmula política tinha como propósito limitar os poderes presidenciais, subordinando o Executivo ao Legislativo. Goulart, contudo, manobrou politicamente e conseguiu aprovar um plebiscito, cujo resultado restituiu o regime presidencialista.

O governo de João Goulart foi marcado pela abertura às organizações sociais. Estudantes, organizações populares e trabalhadores ganharam espaço, causando a preocupação das classes conservadoras como, por exemplo, os empresários, banqueiros, Igreja Católica, militares e classe média. Todos temiam uma guinada do Brasil para o lado socialista. Este estilo populista e de esquerda, chegou a gerar até mesmo preocupação nos EUA, que junto com as classes conservadoras brasileiras, temiam um golpe comunista. Vale lembrar, que neste período, o mundo vivia o auge da Guerra Fria.

Goulart, entretanto, continuou a não dispor de uma base de apoio parlamentar que fosse suficiente para aprovar seus projetos de reforma política e econômica. A saída encontrada por ele foi a de pressionar o Congresso Nacional por meio de constantes mobilizações populares, que geraram numerosas manifestações públicas em todo o país.

Ao mesmo tempo, a situação da economia se deteriorou, provocando o acirramento dos conflitos de natureza classista, entre os que defendiam reformas e distribuição de renda e os opositores a estas medidas. Todos esses fatores levaram, de forma conjunta, a uma enorme instabilidade institucional, que acabou por dificultar a governabilidade. Os partidos de oposição, como a União Democrática Nacional (UDN) e o Partido Social Democrático (PSD), acusavam Jango de estar planejando um golpe de esquerda e de ser o responsável pela carestia e pelo desabastecimento que o Brasil enfrentava.

Outra vez as ideias de Vargas estavam representadas por um de seus mais aplicados discípulos, Goulart, que tinha o talento de atrair a repulsa de todos os movimentos um pouco mais à direita do espectro político. O medo de que Goulart implantasse no Brasil uma república sindicalista com o apoio discreto do Partido Comunista Brasileiro acabou lançando a classe média contra o presidente, entendendo que o Brasil caminhava para o caos do socialismo operário e campesino.

Nessa conjuntura, o governo tentou mobilizar setores das Forças Armadas, como forma de obter apoio político, mas a medida colocou em risco a hierarquia entre os comandos militares e serviu como estímulo para o avanço dos militares golpistas.

Do mesmo modo que acreditavam estarem mantendo a legalidade ao garantir a posse de Juscelino, quase dez anos antes, os militares decidiram entrar em cena novamente e destituíram do poder o presidente. Isso asseguraria a ordem e a legalidade.

Em 1964, a sociedade brasileira se polarizou. As classes médias, as elites agrárias e os industriais se voltaram contra o governo e abriram caminho para o movimento golpista.

No dia 13 de março de 1964, João Goulart realiza um grande comício na Central do Brasil (Rio de Janeiro), onde defende as Reformas de Base. Neste plano, Jango prometia mudanças radicais na estrutura agrária, econômica e educacional do país. Seis dias depois, em 19 de março, os conservadores organizam uma manifestação contra as intenções de João Goulart. Foi a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que reuniu milhares de pessoas pelas ruas do centro da cidade de São Paulo.

Em 20 de março de 1964, a Associação dos marinheiros e dos fuzileiros navais pediu a demissão do ministro da Marinha, Almirante Sílvio Mota, fato que demonstrava grave indisciplina. O governo da República colocou-se numa posição favorável aos marinheiros.

O clima de crise política e as tensões sociais aumentavam a cada dia. No dia 31 de março de 1964, tropas de Minas Gerais e São Paulo saem às ruas. As Forças Armadas desencadeiam o movimento que iria depor João Goulart. Os Generais Olímpio Mourão Filho e Carlos Luís Guedes alertaram suas tropas, recebendo o apoio do então governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto. Logo a seguir, quase todos os estados se aliaram ao golpe militar. Para evitar uma guerra civil, Jango deixa o país refugiando-se no Uruguai. Os militares tomam o poder.

O Golpe Militar de 1964

O Golpe Militar de 1964 marca uma série de eventos ocorridos em 31 de março de 1964 no Brasil, e que culminaram em um golpe de estado no dia 1 de abril de 1964. Esse golpe pôs fim ao governo do presidente João Goulart, também conhecido como Jango, que havia sido de forma democrática, eleito vice-presidente pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

A falta de reação do governo e dos grupos que lhe davam apoio foi notável. Não se conseguiu articular os militares legalistas. Também fracassou uma greve geral proposta pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) em apoio ao governo. João Goulart, em busca de segurança, viajou no dia 1º de abril do Rio de Janeiro para Brasília e, em seguida para Porto Alegre, onde Leonel Brizola tentava organizar a resistência com apoio de oficiais legalistas, a exemplo do que ocorrera em 1961. Apesar da insistência de Brizola, Jango desistiu de um confronto militar com os golpistas e seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepultado, em 1976. Antes mesmo de Jango deixar o país, o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, já havia declarado vaga a presidência da República. O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, assumiu interinamente a presidência, conforme previsto na Constituição de 1946, e como já ocorrera em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros. O poder real, no entanto, encontrava-se em mãos militares. No dia 2 de abril, foi organizado o autodenominado "Comando Supremo da Revolução", composto por três membros: o brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo (Aeronáutica), o vice-almirante Augusto Rademaker (Marinha) e o general Artur da Costa e Silva, representante do Exército e homem-forte do triunvirato. Essa junta permaneceria no poder por duas semanas.

A falta de resistência ao golpe de 1964 não deve ser vista como resultado da derrota diante de uma bem articulada conspiração militar. Foi clara a falta de organização e coordenação entre os militares golpistas. Mais do que uma conspiração única, centralizada e estruturada, a imagem mais fidedigna é a de "ilhas de conspiração", com grupos unidos ideologicamente pela rejeição da política pré-1964, mas com baixo grau de articulação entre si. Não havia um projeto de governo bem definido, além da necessidade de se fazer uma "limpeza" nas instituições e recuperar a economia. O que diferenciava os militares golpistas era a avaliação da profundidade necessária à intervenção militar.

Uma ideia fundamental para os golpistas era que a principal ameaça à ordem capitalista e à segurança do país não viria de fora, através de uma guerra tradicional contra exércitos estrangeiros; ela viria de dentro do próprio país, através de brasileiros que atuariam como "inimigos internos" – para usar uma expressão da época. Esses "inimigos internos" procurariam implantar o comunismo no país pela via revolucionária, através da "subversão" da ordem existente – daí serem chamados pelos militares de "subversivos". Diversos exemplos internacionais, como as guerras revolucionárias ocorridas na Ásia, na África e principalmente em Cuba, serviam para reforçar esses temores. Essa visão de mundo estava na base da chamada "Doutrina de Segurança Nacional" e das teorias de "guerra antissubversiva" ou "antirrevolucionária" ensinadas nas escolas superiores das Forças Armadas.

Os militares que assumiram o poder em 1964 acreditavam que o regime democrático que vigorara no Brasil desde o fim da Segunda Guerra Mundial havia se mostrado incapaz de deter a "ameaça comunista". Com o golpe, deu-se início à implantação de um regime político marcado pelo "autoritarismo", isto é, um regime político que privilegiava a autoridade do Estado em relação às liberdades individuais, e o Poder Executivo em detrimento dos poderes Legislativo e Judiciário.

Imediatamente após a tomada de poder pelos militares, foi estabelecido o AI-1 (um "Ato Institucional" – uma invenção do governo militar que não estava prevista na Constituição de 1946 nem possuía fundamentação jurídica). Com 11 artigos, seu objetivo era justificar os atos de exceção que se seguiram: dar ao governo militar o poder de modificar a constituição, anular mandatos legislativos, interromper direitos políticos por 10 anos e demitir, colocar em disponibilidade ou aposentar compulsoriamente qualquer pessoa que fosse contra a segurança do país, o regime democrático e a probidade da administração pública, além de determinar eleições indiretas para a presidência da República.

Nos primeiros dias após o golpe, uma violenta repressão atingiu os setores politicamente mais mobilizados à esquerda no espectro político, como, por exemplo, o CGT, a União Nacional dos Estudantes (UNE), as Ligas Camponesas e grupos católicos como a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Ação Popular (AP). Milhares de pessoas foram presas de modo irregular, e a ocorrência de casos de tortura foi comum, especialmente no Nordeste. O líder comunista Gregório Bezerra, por exemplo, foi amarrado e arrastado pelas ruas de Recife.

Começa então um período de exceção, arbitrariedade, desrespeito aos poderes estabelecidos, aos direitos dos cidadãos, à sua integridade física, bem como sua liberdade de expressão. Certos de que realizavam um gesto de "purificação" do poder, o projeto de aparência edificante dos militares descamba para a repressão de toda uma nação. A Constituição seria rasgada, o judiciário perderia sua independência, e pior, os membros do legislativo seriam depostos de seus cargos como representantes legítimos do povo.

Ao longo do mês de abril de 1964 foram abertos centenas de Inquéritos Policiais-Militares (IPMs). Chefiados em sua maioria por coronéis, esses inquéritos tinham o objetivo de apurar atividades consideradas subversivas. Milhares de pessoas foram atingidas em seus direitos: parlamentares tiveram seus mandatos cassados, cidadãos tiveram seus direitos políticos suspensos e funcionários públicos civis e militares foram demitidos ou aposentados. Entre os cassados, encontravam-se personagens que ocuparam posições de destaque na vida política nacional, como João Goulart, Jânio Quadros, Miguel Arraes, Leonel Brizola e Luís Carlos Prestes.

Entretanto, o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, da Igreja católica, vários governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara, Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Ademar de Barros, de São Paulo) e amplos setores de classe média pediram e estimularam a intervenção militar, como forma de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise econômica. O golpe também foi recebido com alívio pelo governo norte-americano, satisfeito de ver que o Brasil não seguia o mesmo caminho de Cuba, onde a guerrilha liderada por Fidel Castro havia conseguido tomar o poder. Os Estados Unidos acompanharam de perto a conspiração e o desenrolar dos acontecimentos, principalmente através de seu embaixador no Brasil, Lincoln Gordon, e do adido militar, Vernon Walters, e haviam decidido, através da secreta "Operação Brother Sam", dar apoio logístico aos militares golpistas, caso estes enfrentassem uma longa resistência por parte de forças leais a Jango.

Desde o início havia uma nítida diferenciação entre, de um lado, militares que clamavam por medidas mais radicais contra a "subversão" e apoiavam uma permanência dos militares no poder por um longo período e, de outro lado, aqueles que se filiavam à tradição de intervenções militares "moderadoras" na política – como havia acontecido, por exemplo, em 1930, 1945 e 1954 – seguidas de um rápido retorno do poder aos civis. Os mais radicais aglutinaram-se em torno do general Costa e Silva; os outros, do general Humberto de Alencar Castelo Branco.

Articulações bem-sucedidas na área militar de um grupo de oficiais pró-Castelo e o apoio dos principais líderes políticos civis favoráveis ao golpe foram decisivos para que, no dia 15 de abril de 1964, Castelo Branco assumisse a presidência da República, eleito, dias antes, por um Congresso já bastante expurgado. O novo presidente assumiu o poder prometendo a retomada do crescimento econômico e o retorno do país à "normalidade democrática".

A ideia era de que quando o Marechal Humberto Castelo Branco assumisse o poder, logo o devolveria a um representante civil, garantindo mesmo as eleições previstas para 1965. Castelo Branco pertencia ao grupo moderado do movimento, chamado de "Grupo de Sorbonne". Logo, porém, os radicais assumiriam o controle do movimento, forçando a permanência dos militares no poder, em plena crença de que os entes responsáveis pelos males políticos do país ainda poderiam voltar a comandar o país. É por isso que o ano de 1964 representa um marco e uma novidade na história política do Brasil: diferentemente do que ocorreu em outras ocasiões, desta vez militares não apenas deram um golpe de Estado, como permaneceram no poder.

É por obra dos radicais que ocorre a posse de Costa e Silva como segundo presidente militar, e onde se inicia o período mais pesado da repressão. Das perseguições a parlamentares da gestão anterior, os militares decidiram fechar o Congresso Nacional em 1968, através do infame Ato Institucional número 5. Costa e Silva morre em pleno mandato, e mais uma vez o grupo radical conspira para que o vice presidente, Pedro Aleixo, um civil, não assuma; no lugar, o poder seria entregue a uma Junta formada por três militares, um de cada força. A repressão chegaria ao seu auge com o presidente seguinte, Emílio Médici, que acaba com qualquer movimento armado da oposição, dando a ideia da completa predominância e popularidade do regime, sob pleno "Milagre Econômico", em meio à conquista definitiva da Taça Jules Rimet na Copa do México de 1970.

Ao aproximar-se a Primeira Crise do Petróleo, sobe ao poder justamente o presidente da Petrobrás, General Ernesto Geisel, confrontado com o disparo da inflação e fim do milagre. Moderado, ele é incumbido de preparar a volta à normalidade, fazendo a distensão "lenta, gradual e segura". Apesar de casos infames como a morte do jornalista Vladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho, Geisel parece conseguir seu objetivo, entregando o poder ao último general da era militar, João Batista Figueiredo. Apesar da crise econômica, que começava a atingir níveis insuportáveis, da concreta "quebra" do Brasil no plano econômico, e da impunidade de vários personagens da época da repressão, Figueiredo irá, depois de 21 anos de ditadura, transferir o poder a um civil, ainda indiretamente eleito: Tancredo Neves, que morre antes de subir ao poder. Seu vice, José Sarney, proveniente dos quadros políticos da ditadura, acabaria incumbido de guiar o país até as tão esperadas eleições diretas em mais de 25 anos, previstas para 1989.

Introdução

Bruna de Almeida Farias

127

Humberto de Alencar Castelo Branco (1964-1967)

Os Ditadores da República

Os Ditadores da República

Castelo Branco (1900-1967) nasceu em Fortaleza no Ceará no dia 20 de setembro. Foi político, militar e o primeiro Presidente do Brasil depois do golpe militar de março de 1964.

Filho do General Cândido Borges Castelo Branco e Antonieta Alencar Castelo Branco. Seu nome completo era Humberto de Alencar Castelo Branco. Por parte de mãe era descendente do romancista José de Alencar. Aos oito anos foi estudar no Recife. Aos 14 anos estudou no Colégio Militar de Porto Alegre. Estudou também na Escola Militar do Realengo, quando se alistou em 1918, na IV Companhia de Estabelecimento, escolhendo a arma de Infantaria, onde se destacou como um dos mais brilhantes membros da Sociedade Acadêmica da Escola Militar. Estudou na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais da Armada, em 1923, como primeiro tenente. Frequentou a Escola do Estado Maior, ainda como primeiro tenente, concluindo o curso em dezembro de 1931, em primeiro lugar, com menção honrosa.

Em 1938 foi promovido a capitão. Em 1943, promovido a tenente coronel. Em 1958, a general. Em 1962, a general do exército e finalmente, em 1964, a marechal da reserva, quando em 15 de abril assumiu a Presidência da República. Castelo Branco quando capitão cursou a Escola Superior de Guerra na França. Quando tenente coronel estagiou no Fort Leavenworth War School nos Estados Unidos. Durante a Segunda Guerra Mundial foi chefe de seção de Operações da Força Expedicionária Brasileira, na Itália.

Nomeado pelo Congresso, ficou no poder de 15 de abril de 1964 até 15 de março de 1967. Foi um dos principais articuladores do golpe militar de 1964, que depôs o presidente João Goulart. Durante o período de transição, o presidente da Câmara, Paschoal Ranieri Mazzilli, assumiu temporariamente a presidência da República enquanto a alta cúpula militar preparava a substituição definitiva. O regime militar que passou a vigorar a partir de sua nomeação era baseado na política de fortalecimento do poder Executivo e na ideia de Segurança Nacional, sendo criado o SNI (Serviço Nacional de Informação). A principal proposta de Castelo Branco era barrar o comunismo e recuperar a credibilidade internacional do País.

No dia 9 de abril de 1964, o supremo Comando Militar, composto pelo Exército, Marinha e Aeronáutica decretou o AI-1 (Ato Institucional número 1), o primeiro de uma série de AIs que marcaram o período militar. De acordo com o documento, que em princípio teria validade de seis meses, a partir daquela data todas as garantias de vitaliciedade e estabilidade em cargos públicos estabelecidos pela Constituição foram suspensas; o presidente passava a ter o direito de cassar mandatos e suspender direitos políticos por 10 anos de qualquer cidadão e de propor emenda à Constituição e declarar estado de sítio.

Dois dias depois da publicação do AI-1, o marechal Castelo Branco foi eleito pelo congresso Nacional como representante para assumir a presidência da república em 15 de abril de 1964. O regime militar que passou a ser vigorado a partir desta data era baseado na política de fortalecimento do poder Executivo e na ideia de "segurança nacional". O governo iniciou esta política com uma ação que foi denominada de "operação limpeza", que teve início com os inquéritos policiais-militares, as prisões, as suspensões de direitos políticos e as cassações de mandatos de vários cidadãos, entre eles João Goulart, Leonel Brizola, Juscelino Kubitschek e Jânio Quadros.

Sindicatos e federações operárias sofreram intervenções e foram extintas as ligas camponesas e todas as organizações que defendiam as reformas de base do governo anterior. As perseguições e as prisões se multiplicaram. Foram presos líderes sindicais, líderes operários, líderes religiosos, estudantes, professores, camponeses e militares acusados de subversão.

A vitória de Israel Pinheiro em Minas Gerais e a de Negrão de Lima na Guanabara, no Rio de Janeiro, agitaram os meios militares, pois esses candidatos eram acusados de serem contra o regime militar e eram aliados de Juscelino. Apesar da pressão de muitos militares, chamados de "durões" da revolução, Castelo Branco garantiu a posse dos eleitos. Em 27 de outubro de 1965, foi decretado o AI-2, que instituiu a eleição indireta para presidente e a extinção de todos os treze partidos políticos até então existentes, no Brasil. A partir desta data, passaram a existir apenas dois partidos no Brasil: Arena (Aliança renovadora nacional) e MDB (Movimento Democrático Brasileiro).

Em 5 de fevereiro de 1966, foi decretado o AI-3 que estabelecia eleições indiretas para os governadores e para os prefeitos das capitais. Em janeiro de 1967, o Congresso Nacional, que estava fechado desde outubro de 1966, foi reaberto apenas para aprovar a nova Constituição por determinação do AI-4, que foi decretado em 7 de dezembro de 1966.

Na área econômica, o governo lançou mão de um plano de combate à inflação e de recuperação econômica, chamado PAEG (Plano de Ação Econômica do Governo), que visava garantir aos empresários nacionais e estrangeiros o aumento dos seus lucros para que eles investissem mais capital no Brasil. O governo assumiu o pleno controle da economia, reduziu o crédito bancário, aumentou os impostos e iniciou a prática da redução dos salários, que ficou conhecida como política de arrocho salarial. Foi instituído o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) que substituiu a garantia da estabilidade no emprego e a unificação dos institutos de aposentadoria e pensões com a criação do INPS (Instituto Nacional de Previdência Social).

Em janeiro de 1967, a nova Constituição federal entrou em vigor sob duras críticas, inclusive no meio político. Em dezembro do ano seguinte, era instituído o AI-5, um dos atos institucionais que criou mais polêmica por acabar com a liberdade de imprensa e restringir a liberdade de expressão.

Seu ministério era formado por um elemento da chamada "linha dura" do exército Costa e Silva, e especialmente por antigos componentes do tenentismo e participantes da revolução de 1930, como Cordeiro de Farias, Eduardo Gomes, Juraci Magalhães, Juarez Távora, Ernesto Geisel e o próprio Castelo Branco. Fizeram parte do ministério políticos apoiadores do golpe militar de 1964, como José de Magalhães Pinto. A economia ficou sob o comando da dupla de economistas liberais chamada de Campos-Bulhões (Roberto Campos e Otávio Gouveia de Bulhões), os quais haviam exercido cargos de expressão nas gestões anteriores, em estatais federais ou no Ministério da Fazenda.

Em seu governo surgiu o Cruzeiro Novo como unidade monetária, Criou a correção monetária, para diminuir o impacto da inflação na economia. Otávio Gouveia de Bulhões e Roberto Campos deram alegada prioridade ao combate à inflação e a modernização do estado e da economia brasileira. Foi criada a Zona Franca de Manaus e foram iniciadas as negociações com o Paraguai visando à construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu.

Castelo Branco criou o Código Tributário Nacional, o Estatuto da Terra, o Banco Nacional da Habitação, o Banco Central do Brasil, a Polícia Federal, a Lei do Mercado de Capitais, a Casa da Moeda do Brasil, o código eleitoral e o Código de Mineração. Em 18 de novembro de 1966, criou a EMBRATUR, para o desenvolvimento do turismo.

Em seu governo ainda foram tomadas as seguintes medidas:

· Reforma Agrária: Castelo Branco aprovou o regulamento geral do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA), atual INCRA, que na prática, jamais promoveu a reforma agrária durante o regime militar;

· Internacionalização da economia: No plano econômico, acentuou-se a internacionalização da economia para a entrada de capitais estrangeiros no país para construção de obras rodoviárias, liberação e financiamento governamental de facilidades tributárias para fabricantes de equipamentos e insumos rodoviários;

· Medidas contra a inflação: Para combater a inflação tomaram-se medidas monetárias realizadas por Roberto Campos. A inflação caiu acentuadamente de 1964 para 1967;

· Previdência Social: Castelo Branco unificou os institutos de previdência IAPI, IAPC, IAPTEC, entre outros, em um único, o INPS, atual, INSS;

· Crédito para consumo: Foram criadas muitas linhas de crédito para a classe média aumentar seu poder de compra, assim causando grande aumento nas vendas de eletrodomésticos e automóveis. A classe média havia apoiado o golpe militar de 1964;

· Obras de engenharia: Os projetos pendentes da construção de ferrovias para a interligação Norte-Sul, Leste-Oeste, passando por Brasília, iniciados por Juscelino Kubitschek, foram abandonados pelos militares. Os projetos e construções de rodovias, devido ao custo elevado, foram financiados por instituições internacionais como o BID, Banco Mundial, FMI, entre muitos outros, e tiveram apoio de grandes empreiteiros; Foram iniciadas as obras da rodovia BR-163, chamada de Rodovia Cuiabá-Santarém. A Rodovia Belém-Brasília, iniciada por Juscelino foi ampliada. Foi duplicada a Rodovia Presidente Dutra que liga São Paulo ao Rio de Janeiro, entre outras obras que foram incentivadas e aceleradas no governo militar sob o binômio segurança e desenvolvimento. BR-010, BR-210, Transamazônica, BR-230, Transbrasiliana, BR-153, Rodovia Castelo-Branco.

Para combater a crescente inflação e o déficit do setor público, o governo federal incentivou as exportações, atraiu investimentos externos, aumentou a arrecadação e reduziu as despesas do governo. Arrochou salários e extinguiu a estabilidade no emprego, direito alcançado pelo trabalhador que alcançasse dez anos na mesma empresa. Em seu lugar, criou-se o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Entre outras medidas, o governo também incentivou a entrada do capital estrangeiro, revogando para isso a lei de remessa de lucros que estabelecia restrições à remessa de lucros ao exterior.

A linha descrita por Castelo Branco em sua obra O Poder Nacional defendia ações com o objetivo de impedir a quem fosse considerado obstáculo para a efetivação de novos planos políticos de atuar. Para tal, teriam que convencer o Congresso Nacional a aprovar a Emenda da Inelegibilidade que afastava de disputas eleitorais os adversários do regime, a fim de conseguir permissão para a Justiça Militar julgar civis por crimes políticos. Os atos institucionais, (especialmente o AI-2), com o fechamento do Congresso Nacional, a Lei de Imprensa, o fechamento de organizações subversivas e de esquerda e a criação do SNI foram outras duas providências visando assegurar o poder do regime militar.

Após as eleições parlamentares e para governadores de outubro de 1966, tendo o Congresso Nacional sido fechado pelo AI-2, o Presidente da Câmara dos Deputados, Adauto Lúcio Cardoso, manteve o plenário aberto, em desafio ao ato ditatorial. Diante da resistência, Castelo Branco ordenou a ocupação do Congresso Nacional, ordenando que o coronel Meira Matos comandasse a tropa do Exército que invadiu e fechou o prédio. O Congresso após o recesso foi reaberto e aprovou nova Constituição de 1967, que institucionalizou o regime militar.

O Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), as ligas camponesas e a União Nacional dos Estudantes (UNE), foram algumas das instituições atingidas pela política de repressão ao comunismo desencadeada pelo governo militar. Algumas das principais lideranças pró-comunismo do país foram presas, torturadas e enquadradas na Lei de segurança nacional e responderam a Inquérito Policial Militar (IPM). Também empresários foram investigados. Foi o caso dos donos da Panair do Brasil, a maior companhia aérea do país, na época, que teve a sua licença para voar cassada e o patrimônio temporariamente, e depois permanentemente, confiscado “porque o grupo acionário, segundo as justificativas apresentadas pelo governo federal, era ligado a líderes comunistas e a Juscelino Kubitschek". Na verdade, a intenção do governo seria destruir a Panair do Brasil para entregar suas linhas e parte de seu patrimônio à Varig, cujo dono, Rubem Berta era amigo e apoiador de alguns elementos ligados ao regime militar.

Castelo Branco promoveu uma profunda alteração nas forças armadas. Acabou com a patente de marechal, que passou a ser usada apenas por generais aposentados que tinham participado da segunda guerra mundial. Mudou a estrutura da cúpula militar brasileira ao alterar o sistema de cálculo para a aposentadoria compulsória, o que veio a alterar radicalmente tanto a natureza quanto a intensidade da participação dos militares brasileiros na política, apesar de que os efeitos desta reforma só puderam ser de fato sentidos a partir de 1985:

· Generais: aos limites para passagem para reserva de 62 anos para general-de-brigada, 64 anos para general-de-divisão e 66 para general-de exército, adicionou os seguintes critérios: nenhum oficial pode ser general por mais de doze anos e cada nível de generalato dever renovar pelo menos 25% de seu quadro a cada ano. Quando isto não acontece naturalmente, os mais velhos passam à reserva compulsoriamente.

· Coronéis: não podem permanecer menos de sete nem mais do que nove anos na mesma patente.

· Nenhum oficial pode passar mais de dois anos em cargos civis sem se desligar das Forças Armadas.

Com estas alterações, casos como o do general Cordeiro de Farias não acontecem mais: general em 1942 passou a reserva somente ao atingir os 67 anos de idade, completando 25 anos de generalato, 13 como quatro estrelas. Além disso, chefiou a polícia de São Paulo por três anos, foi interventor do Rio Grande do Sul por outros três anos e governou Pernambuco por mais quatro anos.

Castelo Branco criou assim as condições para que, no futuro, os generais mais antigos deixassem de serem as figuras políticas brasileiras longevas e proeminentes, que foram desde a Proclamação da República.

Em 21 de Julho de 1965 Castelo Branco foi agraciado com o Grande-Colar da Ordem do Infante D. Henrique, a mais importante ordem de Portugal.

Castelo Branco Escreveu alguns ensaios militares que condiziam com sua doutrina e sua carreira: Alto Comando da Tríplice Aliança na Guerra do Paraguai, A Doutrina Militar Brasileira, A Estratégia Militar, A Guerra, O Poder Nacional, Tendências do Emprego das Forças Terrestres na Guerra Futura. Além de seus ensaios deixou cerca de três mil documentos manuscritos.

Em 1962, em seu ensaio A Guerra escreveu suas ideias:

“A guerra revolucionária é uma luta de classes, de fundo ideológico, imperialista, para a conquista do mundo; tem uma doutrina, a marxista-leninista. É uma ameaça para os regimes fracos e uma inquietação para os regimes democráticos. Perfaz, com outros, os elementos da guerra fria.”

“A guerra fria foi concebida por Lênin para, de qualquer maneira, continuar a revolução mundial soviética. É uma verdadeira guerra global não declarada. Obedece a um planejamento e têm objetivos a conquistar, desperta entusiasmo e medo em grupos sociais e reações contrárias na opinião pública.”

“Seus objetivos capitais: dissociação da opinião pública, nacional e internacional, criação da indecisão e, o principal, retirar das nações a capacidade de luta.”

“O nacionalismo é uma posição decisiva para uma nação, sobretudo na época atual. Não pode ser uma panaceia para os seus males, nem uma operação de guerra, e muito menos uma conspiração de sentido internacional. Seus grandes males atuais são principalmente dois nos países subdesenvolvidos: um, o desvinculamento com o meio; outro o de ser, às vezes, um instrumento nacional e internacional do comunismo soviético. É também um grande penacho dos ditadores e candidatos a ditador.”

“As divisões que têm lavrado no Exército são mais consequências de lutas político-partidárias do que separações existentes nos meios militares (…). Legalistas e revoltosos, a partir de 1922 e por pouco tempo. Em 1930 surge a alternativa revolucionários e antirrevolucionários, que desaparece pouco a pouco. A partir de 1955, governistas e golpistas, em meio a ódios e ressentimentos mantidos pelos comunistas e pela política partidária fardada e à paisana. Em seguida, esses mesmos elementos lançaram a injúria sobre o Exército de que seus oficiais se dividiam entre nacionalistas e entreguistas, enquanto a oficialidade era fiel à honra do Brasil e à sua independência política e econômica. Agora, renasce a teimosia, com a divisão alardeada em legalistas e golpistas. Politiqueiros e comunistas estão interessados em que tal exista. Isso amofina o Exército.”

“Forças Armadas não fazem democracia. Mas garantem-na. Não é possível haver democracia sem Forças Armadas que a garantam. Daí, dizer Forças Armadas democráticas. Como é isto, então? Sim. Entra na sua doutrinação o fim de defender as instituições democráticas (…). Muita gente diz que as Forças Armadas são democráticas quando há militares políticos e que conhecem a máquina de conduzir o Estado. Os generais aprendem isso para melhor situarem-se no cumprimento da destinação das Forças Armadas.”

“Qual o militar que não tem ouvido, desde jovem tenente, a frase enunciada por doutores, congressistas, banqueiros, comerciantes, industriais e nunca pelo chamado homem do povo: 'O Exército precisa tomar conta disso!"? É permanecer no regime legal ou marchar para a ilegalidade (…). “A questão tem interessado muito mais ao meio civil que ao próprio Exército.”

“Acreditam os senhores que o Exército tenha dentro de suas fileiras um conflito ideológico? Já se pode dizer que a luta entre duas ideologias que, de fato, lavra em setores da nossa nação, tenha se prolongado no Exército? Pessoalmente, eu não acredito. O Exército tem em suas fileiras alguns comunistas, uns atuantes, outros de ação bem dissimulada e vários timidamente embuçados. Tais elementos não constituem, porém, uma parte apreciável de um grande todo, a ser, então, considerado como dividido ideologicamente.”

“As Forças Armadas não podem atraiçoar o Brasil. Defender privilégios de classes ricas está na mesma linha antidemocrática de servir a ditaduras fascistas ou sindico-comunistas.”

Castelo Branco morreu em 18 de julho, quando o avião do Exército em que viajava, chocou-se no ar com um Jato da FAB (Força Aérea Brasileira). Após visitar Rachel de Queiroz em seu sítio na região de Quixadá, o marechal Castelo Branco embarcaria junto com sua comitiva no Piper Aztec, prefixo PP-ETT, do governo cearense. A aeronave era comandada pelo comandante Celso Tinoco Chagas tendo como copiloto seu filho, Emílio Celso Chagas. Além do marechal Castelo Branco, embarcariam no Piper a escritora Alba Frota, o major Manuel Nepomuceno e Cândido Castello Branco, irmão do marechal.

A aeronave decolaria por volta das 9 h da manhã de 17 de julho e tinha como destino a Base Aérea de Fortaleza. Ao mesmo tempo em Fortaleza, decolariam quatro jatos Lockheed T-33, comandados pelo Tenente Areal. Essa esquadrilha tinha como objetivo realizar um voo de treinamento rotineiro.

Por volta das 9h 30 min, o Piper voava a 5 mil metros sobre o circuito aéreo da Base de Fortaleza, quando seria atingido por uma das asas do Lockheed T-33 nº 4325, pilotado pelo aspirante Alfredo Malan d'Dagrogne. A colisão arrancaria um dos tanques de combustível suplementares do T-33, que severamente avariado realizaria um pouso de emergência na base aérea. Já o Piper PP-ETT perderia seu estabilizador e cairia numa área descampada nas proximidades da base aérea. A queda levaria cinco dos seis passageiros do Piper ao óbito, tendo sobrevivido apenas o copiloto Emílio Celso Chagas. Os corpos seriam resgatados com muita dificuldade pelo 23º batalhão de caçadores do exército. Após o pouso, o aspirante Malan seria conduzido a um hospital militar.

A morte de Castelo Branco causaria comoção em parte da população e nos círculos militares. O presidente Costa e Silva seria informado sobre o acidente pelo ministro Rondon Pacheco às 14h45 min, tendo decretado oito dias de luto nacional.

Pouco tempo depois seria iniciado um inquérito militar para investigar as causas do acidente. Por conta de o inquérito ter sido conduzido numa das fases mais duras do regime militar, poucas informações seriam divulgadas para a imprensa na época. Posteriormente seria divulgado que o acidente fora atribuído ao piloto do Piper, que teria invadido inadvertidamente uma área restrita ao treinamento dos pilotos do 1º/4º Grupo de aviação. Ao mesmo tempo, um inquérito sigiloso seria aberto pelo Serviço de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, tendo sido apresentado ao presidente da república em novembro de 1967. A existência desse inquérito seria descoberta apenas 39 anos depois

O inquérito oficial seria marcado por contradições em relação aos dados colhidos pela equipe de investigação. Os pontos mais controversos seriam:

· Tipo de colisão: segundo o relatório oficial, a asa do T-33 arrancaria a cauda do Piper. Porém as fotos tiradas pela equipe de investigação mostravam que apenas o leme da aeronave fora arrancado;

· Danos: a aeronave teria sido parcialmente incendiada. No entanto, as fotos e testemunhos demonstram que não houve incêndio a bordo. Durante o resgate dos corpos, a aeronave seria destruída a golpes de machado, prejudicando as investigações.

Durante algum tempo foi especulado por alguns historiadores e setores da mídia que a morte do marechal fora um atentado, por conta do seu suposto envolvimento em um movimento, liderado pelo senador Daniel Krieger, que era contrário ao endurecimento do regime militar. Essa versão ganharia força pelo fato do tanque de combustível suplementar do T-33 que colidiu com o estabilizador do Piper estava vazio. Porém os adeptos dessa teoria nunca conseguiram explicar o porquê do Piper ter invadido uma área restrita de treinamento da FAB.

Em 1991, Rachel de Queiroz contaria que Castelo Branco ordenara ao piloto sobrevoar uma linha de transmissão construída em sua gestão para que apreciasse uma de suas obras. Apesar da oposição do piloto, a mudança da rota foi efetuada, de forma que o Piper invadiria a área de treinamento da FAB, assumindo o risco de colisão com os jatos de treinamento.

Exposições Virtuais - presidente Castelo Branco com o jogador Garrincha.

O Aztec acidentado: apenas um sobrevivente. Fonte: Cultura Aeronáutica

Castelo Branco

Everson Barcelos Santos

Artur da Costa e Silva (1967-1969)

Os Ditadores da República

Os Ditadores da República

Militar, nascido na cidade de Taquari, estado do Rio Grande do Sul, em 3 de outubro de 1899. Estudou no Colégio Militar de Porto Alegre, na Escola Militar de Realengo, na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais da Armada e na Escola de Estado-Maior do Exército. Integrou o movimento tenentista (1922), participando da Revolta de 5 de julho tendo sido preso e anistiado. Participou da Revolução de 1930, e em 1932 aliou-se às forças que lutaram contra a revolução constitucionalista de São Paulo. Foi diretor da Escola de Motomecanização do Exército (1941-1943), encarregado de organizar a unidade blindada da Força Expedicionária Brasileira (FEB) em 1943, comandante do 9º Regimento de Infantaria sediado em Pelotas (1946-1948), chefe do estado-maior da 3ª Região Militar (RM) com sede em Porto Alegre (1948-1949), e adido militar junto à embaixada do Brasil na Argentina (1950-1952). Comandou o Núcleo de Divisão Blindada no Rio de Janeiro (1952-1954), a 2ª Brigada de Infantaria em Caçapava (1954-1955), a 3ª RM (1957-1959), e a 2ª Divisão de Infantaria em São Paulo (1959-1961). Promovido a general-de-divisão (1961), assumiu o comando do IV Exército, em Recife (1961-1962). Chefiou ainda o Departamento Geral de Pessoal do Exército, no Rio de Janeiro (1962-1963), e o Departamento de Produção e Obras (1963-1964). No governo João Goulart, reprimiu as manifestações estudantis no Nordeste, mas acabou afastado do comando do IV Exército. Foi um dos principais articuladores do golpe de 1964, que depôs o presidente João Goulart, e integrou o Comando Supremo da Revolução, ao lado do brigadeiro Correia de Melo e do almirante Augusto Rademaker.

No final do governo do Marechal Castelo Branco, a nova constituição entrava em vigor. Essa nova Constituição institucionalizava o regime militar e criava a nova Lei de Segurança Nacional, que fortalecia ainda mais o governo militar. Ministro da Guerra durante o governo Castelo Branco (1964-1966) e conhecido pelas suas ideias radicais de direita desincompatibilizou-se do cargo para candidatar-se às eleições indiretas. Em 3 de outubro de 1966, candidato único pela ARENA, Arthur da Costa e Silva foi eleito presidente pelo Congresso Nacional. Ele e Pedro Aleixo foram eleitos, respectivamente, presidente e vice-presidente, com a abstenção de toda a bancada do MDB, partido oposicionista. Em 15 de março de 1967 foi empossado na presidência, sendo o segundo presidente do regime militar que assumiu o poder depois do golpe de 1964.

Em agosto de 1969 afastou-se do cargo em virtude de um derrame cerebral, seu vice, Pedro Aleixo, chegou a ser cogitado a substituí-lo no governo, mas o Alto Comando das Forças Armadas organizou uma Junta Militar Governativa, formada pelos três ministros militares (Exército, Aeronáutica e Marinha) que assumiu provisoriamente o governo, até que o próximo presidente, Emílio Médici, pudesse assumir. Costa e Silva faleceu no Rio de Janeiro, em 17 de dezembro de 1969.

Se por um lado o Governo de Castelo Branco (1964-1967) marcou por mostrar a faceta repressiva da Ditadura Militar, mesmo que sob pretexto de ser temporária, o governo de Arthur Costa e Silva foi o principal responsável pela institucionalização do regime autoritário. O que era um regime militar difuso transformou-se numa ditadura que eliminou o que restava das liberdades públicas e democráticas. Enquanto Ministro da Guerra no governo anterior, ele criticava com tom mordaz o alastramento de grupos oposicionistas e cobrava bastante para que atitudes drásticas fossem tomadas. E foi durante seu governo que a Ditadura deu os primeiros passos para legitimar seu caráter repressivo.

Costa e Silva assumiu a Presidência da República e imediatamente foi intensificando a repressão policial-militar contra todos os movimentos, grupos e focos de oposição política. Os dois primeiros anos de seu governo foram de intensa atividade política, pois crescia o movimento de oposição ao regime militar. Também, nos dois primeiros anos ocorreram várias manifestações contra o regime militar, contra o cerceamento da liberdade e contra o arrocho salarial.

Os movimentos e grupos de oposição responsabilizaram o próprio governo pela situação de instabilidade política vivenciada pelo país. Havia três principais focos de oposição que incomodaram o governo Costa e Silva: a Frente Ampla; os grupos e organizações de esquerda; e o movimento estudantil (UNE).

Carlos Lacerda, agitador político que outrora havia apoiado o Regime Militar para depor seu rival político João Goulart (Jango) do poder, articulava um movimento de oposição conhecido como Frente Ampla. Ele contava com o apoio dos ex-presidentes exilados Juscelino Kubitschek e, com algum tempo depois, o próprio Jango, que estava exilado no Uruguai. A Frente Ampla ganhou adeptos até mesmo entre os políticos que haviam apoiado o golpe militar de 1964, mas que entraram em discordância com o governo diante dos rumos da política nacional. Entre esses políticos, estavam Magalhães Pinto, Adhemar de Barros e Carlos Lacerda. De caráter oposicionista, ela pressionou o governo reivindicando anistia, uma assembleia constituinte e eleições diretas para governador de estado e presidente da República. As lideranças políticas da Frente Ampla procuraram também obter o apoio popular articulando-se aos mais importantes sindicatos trabalhistas.

O Partido Comunista Brasileiro (PCB) , que foi posto na ilegalidade assim que a ditadura se consolidou, deu origem a vários outros grupos e organizações de esquerda. Diversos grupos transgressores com inclinação aos ideais esquerdistas surgiram. Esses grupos e organizações defendiam um projeto revolucionário socialista para o país em substituição ao sistema capitalista vigente. Enquanto o PCB defendia o caminho pacífico para a implantação do socialismo no país (por meio de reformas estruturais), os grupos e organizações de esquerda dissidentes defendiam o emprego da guerra revolucionária, ou seja, a chamada "luta armada", para derrubar a ditadura militar e em seguida implantar o socialismo. Alguns militantes chegaram a organizar atos de sequestro ou roubo a bancos para confrontar com os militares. Justificaram a prática como resposta diante da repressão policial-militar desencadeada pelo estado militarizado. Em 1967 foi descoberto o foco de guerrilha rural na serra de Caparaó, Minas Gerais.

Na década de 1960, a progressiva expansão do sistema de ensino superior público ocasionou o aumento das vagas nas universidades e consequente crescimento do número de estudantes universitários. Os estudantes também formaram um grande grupo de resistência à Ditadura Militar. Após ser colocada na ilegalidade por mostrar tendências esquerdistas, a União Nacional dos Estudantes (UNE) se articulou clandestinamente, organizando passeatas e exigindo o restabelecimento do sistema democrático. A UNE atuou na coordenação e direção do movimento estudantil em âmbito nacional. Mesmo na ilegalidade, as lideranças estudantis mantiveram a UNE em funcionamento e tentaram reorganizar o movimento estudantil. As maiores passeatas e protestos de rua contra o governo de Costa e Silva foram promovidos pelo movimento estudantil.

Os universitários eram contra o acordo do Ministério da Educação (MEC) com uma instituição americana, a Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID) para controlar o sistema educacional do país, que estava inclinado à privatização. Em outubro, a UNE realizou um congresso clandestino em Ibiúna (SP), que, descoberto, resultou na prisão dos líderes estudantis.

O ano de 1968 foi marcado pela intensificação dos protestos e a imediata reação do governo. As manifestações estudantis, que denunciavam a falta de verbas para educação e se opunham ao projeto de privatização do ensino público, ganharam nova dimensão com a morte do estudante secundarista Edson Luís, em conflito com a Polícia Militar no Rio de Janeiro. Em resposta, a UNE intensifica seus protestos contra o regime, houve uma greve estudantil nacional, comícios e manifestações urbanas com a participação de amplos setores da sociedade, cujo ponto alto foi a Passeata dos Cem Mil, ocorrida no Rio de Janeiro, pedindo o fim da Ditadura. O ambiente político tornou-se ainda mais tenso, e em abril o governo proibiu a Frente Ampla, tornando ilegais suas reuniões, manifestações e publicações.

No movimento trabalhista ocorreram duas importantes greves, em Contagem (MG) e Osasco (SP), com a intervenção do governo no sindicato dos metalúrgicos desta cidade. Ocorreram às primeiras ações da guerrilha urbana em São Paulo, com a explosão de uma bomba no consulado americano, o assalto a um trem pagador em Jundiaí e o roubo de armas do hospital militar do Cambuci.

Em setembro, o deputado Márcio Moreira Alves, do MDB, discursou na Câmara dos Deputados, responsabilizando os militares pelas violências praticadas contra os estudantes. Seu pronunciamento foi considerado ofensivo às forças armadas, e resultou no pedido de cassação de seu mandato pelo governo, negado pela Câmara dos Deputados em 13 de dezembro de 1968. A derrota do governo no episódio Moreira Alves, e a intensificação das manifestações contra o regime militar levaram à promulgação, ainda em 13 de dezembro, do Ato Institucional nº 5 (AI-5), que dava totais poderes ao presidente. O AI-5 foi o instrumento jurídico que suspendeu todas as liberdades democráticas e direitos constitucionais, permitindo que a polícia efetuasse investigações, perseguições e prisões de cidadãos sem necessidade de mandado judicial, o fechamento do Legislativo pelo presidente da República, a suspensão dos direitos políticos e garantias constitucionais, a intervenção federal em estados e municípios, a demissão e aposentadoria de funcionários públicos, entre outras medidas. O fechamento do Congresso foi acompanhado pela cassação de diversos parlamentares. A suspensão de todas as garantias constitucionais e individuais aos cidadãos brasileiros acarretou graves abusos e violações dos direitos humanos por parte dos órgãos oficiais encarregados da segurança e repressão política.

Costa e Silva, apesar de ficar irritado com as vozes da oposição, por vezes acenou com a possibilidade de retorno à normalidade institucional, mostrando-se adepto ao retorno da democracia, inclusive chegando a conversar com os líderes estudantis Franklin Martins e José Dirceu. Mas o presidente justificou a permanência dos militares no poder e a gradual radicalização do regime como uma resposta diante do avanço das oposições. Nenhum pedido dos estudantes foi acatado e, com a promulgação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), ele acabaria de vez com as reivindicações, permitindo que líderes contrários ao regime fossem perseguidos, torturados e presos sem a necessidade de uma intervenção judicial. Além do mais, os presos políticos não tinham direito ao recurso do habeas corpus, fazendo com que as liberdades individuais e direitos constitucionais fossem suspensos.

Na área econômica, o período foi de crescimento, conciliando expansão industrial, facilidade de crédito, política salarial contencionista e controle da inflação em torno de 23% ao ano. No campo administrativo, o governo criou, em 1967, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) e transformou o Serviço de Proteção ao Índio (SPI) em Fundação Nacional do Índio (FUNAI). Foram criadas ainda a Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer) e a Companhia de Pesquisa e Recursos Minerais (CPRM).

Passeata dos cem mil:

No dia 26 de junho de 1968, foi marcado por um dos acontecimentos mais importantes da História do nosso país: a Passeata dos 100 mil. Cerca de cem mil pessoas ocuparam as ruas do centro do Rio de Janeiro e realizaram o mais importante protesto contra a ditadura militar até então. A manifestação, iniciada a partir de um ato político na Cinelândia, pretendia cobrar uma postura do governo frente aos problemas estudantis e, ao mesmo tempo, refletia o descontentamento crescente com o governo; organizada pelo movimento estudantil e contou com a participação de intelectuais, artistas e demais setores da sociedade brasileira. A marcha teve início às 14 horas, com aproximadamente 50 mil pessoas presentes. Cerca de uma hora depois, esse número havia dobrado, chegando aos 100 mil manifestantes, tornando-a uma das mais expressivas manifestações populares da história da República do Brasil. Com uma enorme faixa à frente, onde se lia “Abaixo a Ditadura. O Povo no poder”, a passeata durou três horas, encerrando-se em frente à Assembleia Legislativa, sem confrontos com a polícia que acompanhou o protesto durante o seu percurso.

Desde 67, o movimento estudantil tornou-se a principal forma de oposição ao regime militar. Nos primeiros meses de 68, várias manifestações tinham sido reprimidas com violência. O movimento estudantil manifestava-se não apenas contra a ditadura, mas também à política educacional do governo, que revelava uma tendência à privatização. A política de privatização tinha dois sentidos: era o estabelecimento do ensino pago (principalmente no nível superior) e outro, o direcionamento da formação educacional dos jovens para o atendimento das necessidades econômicas das empresas capitalistas (mão de obra especializada). Essas expectativas correspondiam a forte influência norte-americana exercida através de técnicos da USAID que atuavam junto ao MEC por solicitação do governo brasileiro, gerando uma série de acordos que deveriam orientar a política educacional brasileira. As manifestações estudantis foram os mais expressivos meios de denúncia e reação contra a subordinação brasileira aos objetivos e diretrizes do capitalismo norte-americano.

Prisões e arbitrariedade eram as marcas da ação do governo em relação aos protestos dos estudantes, e essa repressão atingiu seu apogeu no final de março com a invasão do restaurante universitário "calabouço", onde foi morto Edson Luís, de 17 anos.

O fato, que comoveu e revoltou todo o país, serviu para acirrar os ânimos e fortalecer a luta pelas liberdades. Durante o velório do estudante, o confronto com policiais ocorreu em várias partes do Rio de Janeiro, sendo que o cortejo fúnebre foi acompanhado por 50 mil pessoas. Nos dias seguintes, manifestações sucediam-se no centro da cidade, com repressão crescente até culminar na missa da Candelária (2 de abril), em que soldados a cavalo investiam contra estudantes, padres, repórteres e populares.

Nos outros estados o movimento estudantil também ampliava seu nível de organização e mobilização; em Goiás, a polícia baleou 4 estudantes, matando um deles, Ivo Vieira.

Durante todo o ano de 68 as manifestações estudantis ocorreram, assim como se intensificou a repressão, até a decretação do AI-5, em 13 de dezembro.

Posse do presidente Costa e Silva (1967). Foto: Arquivo/Agência Senado

Passeata dos Cem Mil. Fonte: theo1968.blogspot.com.br

Costa e Silva

Everson Barcelos Santos

Os Ditadores da República

Os Ditadores da República

Junta Governativa Provisória (31 de agosto de 1969 a 30 de outubro de 1969)

A Junta Governativa Provisória de 1969, também conhecida como Segunda Junta Militar foi um triunvirato governamental composto por três ministros militares. Após o afastamento de Costa e Silva do poder da república, uma Junta Militar assumiu o poder por dois meses. Como o Alto Comando das Forças Armadas temesse a reabertura do Congresso e a suspensão dos atos institucionais em vigor, foi editado em 31 de agosto o Ato Institucional nº 12 (AI-12), que impedia a posse do vice-presidente Pedro Aleixo, que seria o sucessor natural de Costa e Silva. A Junta foi integrada pelos ministros Aurélio de Lyra Tavares (Exército), Augusto Rademaker (Marinha), e Márcio Melo (Aeronáutica).

Após o sequestro do embaixador americano Charles Elbrick no Rio de Janeiro, o governo militar decretou mais dois atos institucionais, o AI-13, que estabeleceu a pena de banimento em caso de ameaça à segurança do Estado, e o AI-14, que instituía a prisão perpétua e a pena de morte sob casos de guerra, reformando a Constituição de 1969 e impondo a lei de Segurança Nacional. Também foi decretada a reabertura do Congresso, depois de meses de recesso. Em outubro de 1969, a junta militar editou o AI-16, que declarou vagos os cargos de presidente e vice-presidente, marcando nova data para a eleição presidencial. Numa manobra política para acabar com a oposição à indicação do general Emílio Garrastazu Médici, foi instituído ainda o AI-17, que mandava para a reserva os militares considerados ameaçadores à coesão das Forças Armadas. Com o objetivo de reprimir os movimentos de esquerda, alteraram a Constituição de 1967 através da Emenda Constitucional n° 1, incluindo os instrumentos de repressão aos movimentos já referidos. A Junta diz adeus à Presidência da República no final de outubro de 1969, quando o Congresso Nacional foi reaberto e os parlamentares elegem Emílio Médici para substituí-la.

Aurélio de Lyra

Aurélio de Lyra Tavares nasceu na cidade da Paraíba (atual João Pessoa), na Paraíba, em 7 de novembro de 1905. Aluno da Escola Militar do Realengo, no Rio de Janeiro, formou-se também em direito e em engenharia. Fez parte do Estado-Maior do Exército em 1943, onde foi encarregado de organizar a Força Expedicionária Brasileira (FEB) e comandou o IV Exército durante o governo de Castelo Branco. Em 1966, assumiu a Escola Superior de Guerra (ESG) e, durante o governo Costa e Silva, foi nomeado ministro do Exército entre 1967 e 1969. Foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras em abril de 1970. Depois de deixar a Junta Militar, foi embaixador do Brasil em Paris, de 1970 a 1974. Morreu no Rio de Janeiro, em 18 de novembro de 1998, aos 93 anos de idade.

Augusto Rademaker

Augusto Hamann Rademaker Grünewald nasceu no Rio de Janeiro em 11 de maio de 1905. Começou os estudos militares aos 18 anos, na Escola Naval do Rio de Janeiro, em 1923. Almirante com cursos de especialização realizados nos Estados Unidos participou de operações na Segunda Guerra Mundial. Ativo colaborador do golpe militar que depôs o presidente João Goulart em 31 de março de 1964. Foi membro do Conselho Supremo da Revolução e Ministro da Marinha na segunda passagem de Ranieri Mazzilli pela Presidência da República. Morreu na sua cidade natal em 13 de setembro de 1985.

Márcio Melo

Márcio de Sousa Melo nasceu em Florianópolis em 26 de maio de 1906. Integrou, ao lado de Costa e Silva e Correia de Melo, a Junta Militar Comando Supremo da Revolução que, juntamente com o presidente interino Ranieri Mazzili, governou o país até a posse de Castelo Branco. Foi marechal-do-ar e ministro da Aeronáutica nos governos Castelo Branco, de 15 de dezembro de 1964 a 11 de janeiro de 1965, e Costa e Silva, de 15 de março de 1967 a 31 de agosto de 1969. Continuou ministro da Aeronáutica, como membro da Junta Militar durante a sua duração, e também no governo de Médici, de 30 de outubro de 1969 a 29 de novembro de 1971. Morreu no Rio de Janeiro em 31 de janeiro de 1991.

Junta Governativa Provisória

Os Ditadores da República

Emílio Garrastazu Médici (1969-1974)

“Homem da fronteira, creio em um mundo sem fronteiras entre os homens”.

“Neste momento eu sou a oferta e a aceitação. Não sou promessa. Quero ser verdade e confiança, ser a coragem, a humildade e a união. A oferta de meu compromisso ao povo, perante o congresso de seus representantes, quero-a um ato de reverdecimento democrático. A aceitação da faixa presidencial faço-a um auto de justiça e confissão de minhas crenças. Faço a justiça de proclamar o equilíbrio e a serena energia, o patriotismo e a grandeza com que se houveram os três ministros Militares no exercício temporário da Presidência da República, que a mim transmitem, no símbolo dessa faixa, pelas mãos honradas de sua excelência, o Almirante Augusto Hamann Rademaker Grünewald.

Faço a justiça de dizer, já agora ouvindo a Nação, a cuja frente o destino me trouxe, faço a justiça de assinalar a total dedicação do grande presidente Costa e Silva à causa pública, o empenho tanto, que se fez imolação da própria voz. Venho como sempre fui. Venho do campo, da fronteira, da família; venho do povo, da caserna; venho de minha terra e de meu tempo.” [...]

(Discurso de posse de Médici, Mundo sem fronteiras).

Apesar do seu belo discurso de posse, onde coisas como união, igualdade e liberdade são exaltadas, devemos nos lembrar de que ao longo do governo de Médici, a ditadura militar atingiu seu pleno auge, com controle das poucas atividades políticas toleradas, a repressão e a censura às instituições civis foram reforçadas e qualquer manifestação de opinião contrária ao sistema, foi proibida. Foi um período marcado pelo uso sistemático e de meios violentos como a tortura e o assassinato. Seu período na presidência ficou conhecido historicamente como Anos de Chumbo.

Emílio Garrastazu Médici nasceu em Bagé, no Rio Grande do Sul, no dia 4 de dezembro de 1905. Filho de um rico fazendeiro de origem italiana, Emílio Médici, e da uruguaia de origem basca, Júlia Garrastazu. Foi casado com Scila Médici e pai de Sérgio Nogueira Médici (um agropecuarista, falecido em maio de 2008) e de Roberto Nogueira Médici (um engenheiro e professor universitário). Ambos nasceram em Bagé, no Rio Grande do Sul, e foram Comendadores (20 de julho de 1972) e Grandes-Oficiais (26 de julho de 1973) da Ordem Militar de Cristo. Médici Estudou no Colégio Militar de Porto Alegre e seguiu carreira no Exército.

Em 1957 assumiu a chefia do Estado Maior da 3° Região Militar de Porto Alegre a convite do general Arthur da Costa e Silva, então comandante daquela unidade, com quem estabeleceu forte amizade. Promovido a general-de-brigada em 1961, foi nomeado comandante da Academia Militar das Agulhas Negras, no Rio de Janeiro, e apoiou o golpe de 1964, que depôs o presidente João Goulart.

Foi nomeado delegado brasileiro na Junta internacional de Defesa Brasil-Estados Unidos, em Washington. Em 1967, sucedeu a chefia de Golbery do Couto e Silva no SNI (Serviço Nacional de Informações) e, em 1969 assumiu o comando do 3º Exército, no Rio Grande do Sul. Com o afastamento definitivo do presidente Costa e Silva, assumiu a presidência provisória da república, dentro de uma junta militar, pelo período de um mês, no qual fez uma consulta a todos os generais do exército brasileiro, que escolheu ele mesmo como novo presidente da república.

Médici exigiu que, para sua posse na presidência, o Congresso Nacional fosse reaberto. E assim foi feito: em 25 de outubro de 1969, Emílio Garrastazu Médici foi eleito presidente da república por uma sessão conjunta do Congresso Nacional, obtendo 293 votos, com 75 abstenções. Tomou posse no dia 30 de outubro de 1969, tendo consciência do caráter de exceção do regime e prometendo restabelecer a democracia até o final de sua gestão. As guerrilhas urbana e rural foram derrotadas durante este período, permitindo que seu sucessor, Ernesto Geisel, iniciasse a abertura política. As denúncias de tortura, morte e desaparecimentos de presos políticos, que ocorreram na década de 1970, provocaram embaraço para o governo brasileiro no cenário internacional. O governo atribuiu as críticas a uma campanha da esquerda comunista contra o Brasil.

No campo político, o governo Médici foi responsável pela eliminação das guerrilhas comunistas rurais e urbanas. Ancorada pelo Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968, a repressão às manifestações populares e às guerrilhas foi bastante pesada. A resistência passou a ser armada, com assaltos aos bancos para obter esse artifício; atentados contra militares; sequestros de pessoas beneficiadas pelo regime e treinamento de guerrilhas. Por outro lado, a repressão endureceu. Começaram a ocorrer desaparecimentos, prisões e torturas. O militante político Carlos Marighella, por exemplo, que já havia sido torturado e preso diversas vezes por ser um idealista comunista, foi morto durante o governo Médici.

Nas duas eleições ocorridas durante seu governo, a Arena, partido de sustentação do regime militar, saiu amplamente vitoriosa, fazendo, em 1970, 19 senadores contra 3 do MDB e, em 1972, elegendo quase todos os prefeitos e vereadores do Brasil. Os três ministros mais importantes de seu governo, que tinham grande autonomia, eram Delfim Neto, que comandava a economia, João Leitão de Abreu, como coordenador político, e Orlando Geisel, que comandava o combate à chamada subversão.

O seu governo também ficou marcado por excepcional crescimento econômico, que ficou conhecido como o Milagre Brasileiro. Houve um grande crescimento da classe baixa e da classe média. Cresceu muito o consumo de bens duráveis e a produção de automóveis, tornando-se comuns, nas residências, o televisor e a geladeira. Em 1972, passou a funcionar a televisão em cores no Brasil.

O termo “milagre” está relacionado com este rápido e excepcional crescimento econômico pelo qual passou o Brasil neste período. Houve melhorias significativas na infraestrutura do país; crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) entre 7% e 13% ao ano; aumento do nível de emprego, devido ao investimento nos setores de infraestrutura e indústria; e também um significativo desenvolvimento industrial, alavancado pelos investimentos nos setores de siderurgia, geração de eletricidade e indústria petroquímica. O setor foi puxado, principalmente, pelo crescimento e fortalecimento das empresas estatais.

Isso gerou um clima de otimismo. Com a Copa de 1970, o nacionalismo aflorou, com o lema: "Ninguém segura esse país". Assim, a resistência perde forças e a repressão fica mais amena. Apesar de tudo, o modelo era insustentável devido à dependência do capital externo. O Brasil não utilizava o dinheiro de sustentação de obras para pagar a dívida, mas para construir outras.

Apesar do nome, existiram diversos aspectos negativos no Milagre Econômico, como por exemplo, aumento da dívida externa. O desenvolvimento econômico foi bancado, principalmente, com empréstimos no exterior. Esta dívida prejudicou o desenvolvimento do Brasil nos anos futuros, pois criou uma dependência com relação aos credores e ao FMI (Fundo Monetário Internacional), além de comprometer uma significativa fatia do orçamento para pagamento de juros da dívida; e embora a economia tenha crescido consideravelmente, não houve distribuição de renda e, portanto, aumentou ainda mais as desigualdades sociais no país com o aumento da concentração de renda nas mãos dos mais ricos.

O fim do milagre econômico se deu com uma crise mundial provocada pelo “choque do petróleo”. O elevado aumento do petróleo no mercado mundial afetou diretamente a economia brasileira. Os combustíveis derivados do petróleo aumentaram muito, elevando a inflação. A balança comercial brasileira ficou com déficit elevado em função da importação de petróleo a preços exorbitantes.

Durante o governo Médici e o Milagre Econômico, também ocorreram diversos projetos desenvolvimentistas, como o Plano de Integração Nacional (PIN), que permitiu a construção das rodovias Santarém-Cuiabá, a Perimetral Norte, a Transamazônica e a Ponte Rio-Niterói, além de grandes incentivos fiscais à indústria e à agricultura, que foram à tônica do período. Assim, os ministros mais famosos do governo Médici foram o da Fazenda, Delfim Neto, e o dos Transportes, Mário Andreazza, além de Jarbas Passarinho, devido ao Mobral. Nessa época, também foram construídas casas populares através do Banco Nacional da Habitação (BNH). No seu governo, concluiu-se o acordo com o Paraguai para a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu Binacional, na época, a hidrelétrica de maior potência instalada do mundo.

No campo social, foi criado o Plano de Integração Social (PIS) e o Programa de Assistência Rural (PRORURAL), ligado ao FUNRURAL, que previa certos benefícios de aposentadoria e o aumento dos serviços de saúde, até então concedidos aos trabalhadores rurais. Foi feita uma grande campanha de alfabetização de adultos através do MOBRAL, e outra para a melhoria das condições de vida na Amazônia, com a participação de jovens universitários, o chamado Projeto Rondon. Esse projeto foi reativado em 19 de janeiro de 2005. As principais estatais criadas no seu mandato foram: Embrapa (agropecuária), Infraero (indústria aeroportuária) e Telebrás (telecomunicações).

Ao fim de seu mandato como presidente, Médici abandonou a vida pública. Declarou-se contrário à anistia política, assinada pelo presidente João Figueiredo (que havia sido chefe da Casa Militar durante seu governo), qualificando-a como "prematura". Foi sucedido, em 15 de março de 1974, pelo general Ernesto Geisel. Médici morreu em 9 de outubro de 1985, aos 79 anos de idade, na cidade do Rio de Janeiro, vítima de insuficiência renal aguda e respiratória, devido a um Acidente Vascular Cerebral (AVC). Foi sepultado no Cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro.

Médici e o presidente dos Estados Unidos, Nixon.

Emílio Médici

Everson Barcelos Santos

Os Ditadores da República

Bruna de Almeida Farias

Ernesto Geisel (1974-1979)

Militar, nascido na cidade de Bento Gonçalves, estado do Rio Grande do Sul, em 3 de agosto de 1907. Teve seu ano de nascimento alterado para 1908, para atingir a idade máxima para admissão no Colégio Militar de Porto Alegre, o qual concluiu como o 1º da turma (1921-1924). Apoiou a Revolução de 1930 e em 1932 aliou-se às forças que lutaram contra a Revolução Constitucionalista de São Paulo, e participou da repressão à Revolta Comunista de 1935. Sufocou em Recife uma revolta que visava derrubar o interventor federal no estado. Foi militar brasileiro por toda sua vida até ingressar na carreira política em 1964, quando o presidente Castelo Branco o nomeou Chefe da Casa Militar de seu governo. Em 1967, chegou ao cargo de Ministro do Superior Tribunal Militar. Até que, em 1974, foi eleito de forma indireta como Presidente da República, com 80% dos votos em uma chapa da ARENA que contava com o vice Adalberto Pereira dos Santos. O militar gaúcho Ernesto Geisel era da linha mais branda do exército. Integrou, inclusive, o grupo que se opôs à candidatura de Costa e Silva à Presidência da República. Logo, quando Ernesto Geisel assumiu o poder, recebeu muitas críticas da Linha Dura.

Em 15 de março de 1974, o general Ernesto Geisel assume a presidência, sucedendo Garrastazu Médici e sendo o quarto presidente dentro do Regime Militar brasileiro. Teve seu governo marcado, desde seu início, pelo processo denominado pelo próprio presidente como de distensão lenta, gradual e segura, com vistas à reimplantação do sistema democrático no país. Esse interesse em retomar a democracia não era um reflexo do desejo do governo ou de seus aliados. Com diversos governos militares, as Forças Armadas encontravam-se enfraquecidas e acreditavam que essa medida era uma forma de garantia para uma saída pacífica dos militares do poder. Durante o governo de Ernesto Geisel, ocorreram mobilizações de militares radicais que não queriam a retomada da democracia. A oposição a essa medida foi maior junto aos grupos militares que realizavam a repressão militar. Mesmo após a destruição das guerrilhas, o regime ainda realizava duras repressões ao que era considerado subversivo. Porém, esses grupos continuaram com as ações violentas e geraram crises políticas que ameaçaram o governo de Geisel.

Seu governo coincide com o fim do milagre econômico e com a insatisfação popular em altas taxas. A crise do petróleo e a recessão mundial interferem na economia brasileira, no momento em que os créditos e empréstimos internacionais diminuem. O binômio desenvolvimento e segurança, formulado pela ESG, foi mantido durante seu governo, caracterizado pela convivência entre uma política de tendência liberalizante e a atuação dos órgãos de segurança implantados após o golpe de 1964.

O Brasil vinha do período mais aguda da Ditadura Militar, pois em 1968 havia sido publicado o Ato Institucional número 5 que suspendia direitos políticos, institucionalizava a censura e dava amplos poderes ao governo militar. Foi entre os anos de 1968 e 1973 também que o Brasil viveu o chamado Milagre Econômico, período no qual o país cresceu economicamente em níveis altos. O fim desta fase já fazia florescer o questionamento da população. Sendo assim, o Governo de Ernesto Geisel ficou caracterizado pela abertura política que promoveria certa amenização do rigor vigente na Ditadura Militar.

Geisel anuncia a abertura política lenta, gradual e segura e, em 1974, o governo permitiu a realização de propaganda eleitoral, proibida desde a edição do AI-5, e os candidatos do MDB à Câmara dos Deputados e ao Senado obtiveram uma expressiva vitória nos principais estados do país, aumentando consideravelmente a bancada oposicionista nas duas casas. A oposição política começa a ganhar espaço. O MDB conquista 59% dos votos para o Senado, 48% da Câmara dos Deputados e ganha a prefeitura da maioria das grandes cidades. No início desse ano havia expirado o prazo de suspensão dos direitos políticos dos primeiros cassados pelo AI-1, como os ex-presidentes Juscelino Kubitschek e Jânio Quadros e, em 1975, teve fim a censura prévia ao jornal O Estado de São Paulo, medida estendida mais tarde a outros órgãos da imprensa.

As iniciativas liberalizantes não evitaram, entretanto, os recuos autoritários do governo, registrando-se, durante todo o período Geisel, a repressão às organizações clandestinas e ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e a utilização, em diversas ocasiões, do AI-5. Os militares de linha dura, não contentes com os caminhos do governo Geisel, começam a promover ataques clandestinos aos membros da esquerda. A morte do jornalista Vladimir Herzog, ainda em 1975, nas dependências do DOI-CODI de São Paulo, resultou em manifestações políticas contra o governo e evidenciou a existência de divergências com os setores militares contestadores da política de distensão; ele foi encontrado enforcado e os militares afirmaram tinha ocorrido um suicídio. No ano seguinte, a morte do operário Manuel Fiel Filho, no mesmo local e nas mesmas condições, levaria à exoneração do comandante do II Exército, general Ednardo D'Ávila Melo, e ao confronto entre o governo e os militares que se opunham ao processo de abertura do regime. Essa era uma das primeiras medidas de Ernesto Geisel contra os militares radicais e, em outubro de 1977, ele demitiu o ministro do Exército que pretendia se candidatar a presidência nas próximas eleições.

A Igreja Católica também teve atuação de destaque. Os setores progressistas do clero católico sempre incomodaram os governos dos generais. Em pleno governo Médici, influentes membros da hierarquia Católica, como o cardeal-arcebispo de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns, e o bispo de Olinda e Recife, dom Hélder Câmara, entre outros, denunciaram publicamente casos de tortura, desaparecimento de cidadãos e prisões políticas. No governo Geisel, a oposição de setores da hierarquia da Igreja contra a ditadura militar cresceu significativamente. Já não era possível ao governo reprimir com desmesurada violência os movimentos oposicionistas que afloravam. As relações entre a Igreja e o governo acirraram-se, em 1976, com o sequestro do bispo de Nova Iguaçu (RJ), D. Adriano Hipólito, e o assassinato do padre João Bosco Burnier, em Mato Grosso, ambos envolvidos na formação de comunidades eclesiais de base e em movimentos populares.

Ainda em 1976, foi elaborada a Lei Falcão, que alterou a propaganda eleitoral, impedindo o aparecimento de candidatos ao vivo no rádio e na televisão. Em 1977, o Congresso Nacional foi fechado por 14 dias, em virtude da não aprovação da proposta de reforma do Poder Judiciário encaminhada pelo governo. Para assegurar a maioria governista no Legislativo, instituiu-se, em seguida, o chamado "pacote de abril", que incluía uma série de medidas, dentre as quais a manutenção de eleição indiretas para governadores; a eleição indireta de um terço dos membros do Senado, que resultaria na criação da figura do "senador biônico"; a ampliação das restrições impostas pela Lei Falcão e a extensão do mandato do sucessor de Geisel para seis anos.

Em outubro desse mesmo ano, foi demitido o ministro do Exército, general Sílvio Frota, cuja candidatura à sucessão presidencial era articulada por setores militares identificados com a chamada linha-dura. Registrou-se, em maio de 1978, a primeira greve de operários metalúrgicos desde 1964, em São Bernardo do Campo, salientando-se, na ocasião, a liderança de Luís Inácio da Silva, o Lula, presidente do sindicato da categoria.

Desde o início do governo Geisel, imprimiu-se nova orientação à política externa brasileira. Evitou o alinhamento incondicional aos Estados Unidos. Reconheceu regimes socialistas no mundo, privilegiado nos períodos anteriores, pela ampliação de relações diplomáticas e comerciais com países da África, Ásia e Europa. Nesse sentido, o Brasil foi o primeiro país a reconhecer o governo português formado em seguida à derrubada da ditadura salazarista, em 25 de abril de 1974. Foram reatadas relações com a República Popular da China, o que fez aumentar as críticas da Linha Dura. Foram também estabelecidas embaixadas em Angola, Moçambique, Guiné Equatorial, entre outras iniciativas.

No que se refere à política econômica, as principais metas do governo Geisel foram estabelecidas no II Plano Nacional do Desenvolvimento, para manter a economia aquecida pós-Milagre Econômico. Este plano priorizava os investimentos no setor energético e em indústrias básicas, com o intuito de adequar a economia à crise internacional do petróleo e ao estágio de desenvolvimento industrial do país, e de reduzir o capital estrangeiro em setores considerados infraestruturais. Nesse sentido, foi lançado, em 1975, o Programa Nacional do Álcool (Proálcool) e assinado o acordo nuclear Brasil-Alemanha. O plano econômico do governo ressentiu-se, entretanto, do impacto da crise do petróleo, do aumento da dívida externa e do desequilíbrio da balança de pagamentos. Nesse contexto, uma das medidas defendidas pelo governo, em outubro de 1975, foi a adoção de contratos de risco entre a Petrobras e empresas estrangeiras para a prospecção de petróleo no país. Em 1978, no final do governo Geisel, os principais problemas da economia continuavam sendo o crescimento da taxa de inflação e da dívida externa. A hiperinflação ajudou a intensificar os problemas monetários, deixando um estado de recessão para seu sucessor.

Foi um desenvolvimentista, responsável por inaugurar as primeiras linhas de metrô em São Paulo e no Rio de Janeiro e por buscar novas fontes de energia, como o álcool. Foi Geisel também que construiu grande parte da Usina Hidrelétrica de Itaipu.

Em 31 de dezembro de 1978, o presidente Geisel revogou o AI-5, restaurando o habeas-corpus e dando um passo decisivo no processo de redemocratização do país. Preparando também o terreno para o retorno dos exilados, o que aconteceria no governo de seu sucessor.

Deixou a presidência no dia 15 de março de 1979 e foi sucedido por João Figueiredo. Continuou influente no exército e apoiou Tancredo Neves nas eleições de 1985. Faleceu em 12 de setembro de 1996, vítima de câncer.

Ernesto Geisel

Bruna de Almeida Farias

João Figueiredo (1979-1984)

Nascido na cidade do Rio de Janeiro, em 15 de janeiro de 1918. Estudou no Colégio Militar de Porto Alegre, na Escola Militar de Realengo (1935-1937), quando recebeu o espadim de Getúlio Vargas por ter sido o primeiro aluno. Integrou os Dragões da Independência. Esteve no III Exército. Membro da missão militar brasileira de instrução junto ao Exército paraguaio (1955-1958). Trabalhou no Conselho de Segurança Nacional (1961). Durante o governo Jânio Quadros integrou a Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional. Participou do movimento político-militar que originou o golpe de 1964, tendo sido nomeado chefe da agência do Serviço Nacional de Informações (SNI) no Rio de Janeiro (1964-1966). Chefe do Gabinete Militar do governo Médici (1969-1974), tornou-se ministro-chefe do SNI durante o governo Geisel (1974-1979), sendo promovido a general-de-exército em 1977. Através de eleição indireta, passou a exercer o cargo de presidente da República em 15 de março de 1979. Tão logo foi declarado vitorioso nas urnas, João Figueiredo prometeu ao povo brasileiro promover o processo de democratização do país.

Ao término do mandato de Geisel, em 1979, a sociedade brasileira tinha sofrido muitas transformações. A repressão havia diminuído; as oposições políticas, o movimento estudantil e os movimentos sociais começaram a se reorganizar. O general Figueiredo assumiu a presidência da República reafirmando o projeto de abertura política iniciado no governo anterior. Foi o último general presidente (1979-1985), encerrando o período da ditadura militar, que durou vinte e um anos.

Em fevereiro de 1978 foi criado, no Rio de Janeiro, o primeiro Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA). O CBA foi o resultado da agregação de várias correntes políticas de oposição (liberais e de esquerdas democráticas), de familiares de presos, mortos, desaparecidos e exilados políticos, e também de setores progressistas da Igreja Católica. O general acelerou o processo de liberalização política, em agosto de 1979, quando, pressionado por setores da sociedade, aprova a Lei de Anistia. que dava anistia a todos aqueles que foram punidos pela ditadura militar, concedendo o direito de retorno ao Brasil, pouco a pouco, para os políticos, parlamentares cassados desde 1964, artistas e demais brasileiros exilados e condenados por crimes políticos. A Lei também concedeu perdão para estes. Inicialmente, o projeto de anistia não iria beneficiar todos envolvidos com crimes políticos, no entanto, o projeto de lei sofreu alterações que perdoava todos os acusados de praticar tortura e devolvia direitos políticos plenos aos exilados. Apesar das restrições, também beneficiou cidadãos destituídos de seus empregos. Mas a anistia não foi irrestrita, milhares de militares punidos não puderam voltar normalmente às forças armadas. A anistia foi mútua, ou seja, se por um lado voltaram os exilados, por outro, os militares envolvidos em ações repressivas que provocaram torturas e o desaparecimento de cidadãos ficaram impunes, garantindo a liberdade destes acusados. Só não foi concedida anisti