banco de idéias nº 52 - set/out/nov - 2010

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    ndice

    CONSELHODE ADMINISTRAO Arthur Chagas DinizElcio Anibal de Lucca

    Alencar BurtiPaulo de Barros Stewart

    Jorge Gerdau JohannpeterJorge Wilson Simeira Jacob

    Jos Humberto Pires de ArajoRaul Leite LunaRicardo Yazbek

    Roberto Konder BornhausenRomeu Chap Chap

    CONSELHO EDITORIAL Arthur Chagas Diniz - presidente

    Alberto OlivaAlosio Teixeira Garcia

    Antnio Carlos Porto GonalvesBruno MedeirosCndido Jos Mendes PrunesJorge Wilson Simeira Jacob

    Jos Luiz CarvalhoLuiz Alberto Machado

    Nelson Lehmann da SilvaOctavio Amorim Neto

    Roberto FendtRodrigo Constantino

    William Ling

    Og Francisco Leme eUbiratan Borges de Macedo

    (in memoriam)

    DIRETOR / EDITOR Arthur Chagas Diniz

    JORNALISTA RESPONSVELLigia Filgueiras

    RG n 16158 DRT - Rio, RJ

    PUBLICIDADE/ ASSINATURAS:E-mail: [email protected]

    Tel: (21) 2539-1115 - r. 221

    FOTOSImagePlus, Photodisk e Wikipedia.

    INSTITUTOS LIBERAIS

    BRASLIASCLN 107 - Bl. B - sala 20670743-520 - Braslia - DFTelefax: (61) 3447-3149

    E-mail: [email protected] GERAIS

    E-mail: [email protected]

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    Internet: www.institutoliberal.org.br

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    Telefax: (51) 3332-2376E-mail: [email protected]: www.il-rs.com.br

    SOPAULOE-mail: [email protected]

    Think Tank - A Revista da Livre-Iniciativa

    Ano XIV - no 52 - Set/Out/Nov - 2010

    Expediente

    ESPECIAL 14

    POLTICA

    AS IDEIAS SOCIALISTAS AVANAM,REALMENTE, NAAMRICALATINA?

    Armando de la Torre

    MATRIADE CAPA

    MERCADOE REGULAODO SETORDE SADE SUPLEMENTARNO BRASIL

    Sandro Leal Alves

    DESTAQUE

    A DIPLOMACIABRASILEIRAEO CONSELHODE SEGURANADAS NAES UNIDAS

    Georges D. Landau

    11

    15

    5

    LIVROS

    O BOM, O MAUEO FEIOUma viso liberal do fato

    BRASILE FRICA: UMANOVAETAPANO RELACIONAMENTO?

    Roberto Fendt

    26INTERNACIONAL 21

    REALIZAO

    BANCODE IDIAS uma publicao do Instituto Liberal. permitida areproduo de seu contedo editorial, desde que mencionada a fonte.

    PAN-AFRICANISMOSEM RACISMOpor Rodrigo Constantino

    NOTASNOVOCDIGO FLORESTAL

    Nesta Edio

    TO SERVEAND PROTECTpor Jos L.Carvalho

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    EditorialSua opinio da maior impor-

    tncia para ns. Escreva paraBanco de Idias.

    Leitores

    Envie as suas mensagens paraa rua Rua Maria Eugnia, 167 -Humait - Rio de Janeiro - RJ -22261-080, ou [email protected].

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    s tentativas do Brasil de par-ticipar do Conselho de Segu-

    rana das Naes Unidas comomembro permanente datam dasconferncias iniciais que consti-turam a ONU. O Professor de Re-laes Internacionais da FAAP,Georges D. Laundau, nos conduzpelos caminhos trilhados pela Di-plomacia Brasileira, por iniciativaprpria ou induzida pela Presidn-cia da Repblica, na busca de umlugar permanente em to seletogrupo. Nesse passeio pela hist-ria diplomtica do Brasil o autorexamina com acuidade as impli-caes da diplomacia presidencialdo governo Lula ao responder pergunta: Em que consiste essadiplomacia essencialmente ideo-lgica?

    Muitos tm se alarmado coma aparente expanso, na Amri-ca Latina, das teses reunidas sobo manto do socialismo do sculoXXI. Estariam as idias socialistas

    realmente prosperando na Am-rica Latina? Destacando o cresci-mento do autoritarismo de esquer-da de alguns governos da regio,assim como o benigno exibicio-nismo dos autodenominados so-cial-democratas, o professor Ar-mando de La Torre, Diretor daEscola Superior de Cincias So-ciais da Universidade FranciscoMarroquin, na Guatemala, res-ponde a essa pergunta com um

    sonoro no.O professor de economia daUniversidade Santa rsula e ge-rente-tcnico da Federao Na-cional de Sade Suplementar,Sandro Leal Alves, analisa os prin-cipais impactos da regulamenta-o imposta pela ANS ao setor desade suplementar. De forma cla-ra e didtica o autor faz uma ra-diografia do setor, demonstrandosua importncia quantitativa, para

    ento debruar-se sobre a regu-lamentao influenciada por umvis sanitarista. A natureza dosservios de sade impede o bomfuncionamento de um mercadopara tais servios? A despeito daschamadas falhas de mercado, oautor deixa claro que as regula-mentaes impostas ao setor aca-bam por emperrar o funciona-mento do mercado. Em sua an-lise da regulamentao, SandroLeal no s destaca os benefciosque se vem, mas tambm os cus-tos que no se vem.

    Roberto Fendt, Vice-Presidentelicenciado do IL e atualmente as-sessor do Ministro de Estado e daCoordenao Econmica de An-gola, nos guia em uma viagem ata frica, na qual ilustra seus con-vidados sobre as relaes do Brasilcom aquele continente. Com umdiscurso prazeroso e simples nossoguia inicia a jornada no sculo XVcom a chegada dos portugueses.

    Passando pela intromisso deoutras potncias no Atlntico Sul,somos levados a conhecer as re-laes do Brasil com a frica des-de a poca do imprio. Nossaviagem termina com um alerta:chegaram os chineses.

    Na Casa de Meu Pai, do fil-sofo Kwame Anthony Appiah, o livro resenhado por RodrigoConstantino. Nascido em Gana,o autor analisa a noo de pan-

    africanismo e destaca ser a cul-tura mais importante que a raa.NOTAS examina a proposta do

    substitutivo do relator ao PL n1876, o novo cdigo florestal

    Nesta edio voc encontra oresumo do livro To Serve and Pro-tect, de Bruce L. Benson, efetuadopelo Prof. Jos L. Carvalho.

    Encerra esta edio o Bom, oMau e o Feio, destacando fatosocorridos no trimestre em curso.

    AAo Editor,

    Tenho assistido inmeras in-vases de terra, aqui perto doRecife, onde moro. As desocu-paes so muito demoradas,embora os invasores no ques-tionem o direito do proprietrio aessas terras. De um modo geral,eles abatem cabeas de gado,destroem plantaes e, quando oproprietrio consegue retomar ouso de suas terras, no recebenenhuma indenizao pelos pre-juzos incorridos. O que preten-dem esses invasores do MST, eporque a justia brasileira toleniente?

    Paulo Roberto dos SantosRecife PE

    Prezado leitor,

    Embora no exista qualquerjustificativa para lenincia emrelao a crimes que caracteri-zam agresses ao direito de pro-priedade, o aparelho judicirioem alguns estados da Unio pra-

    tica o que chamamos de direitoalternativo. Isso significa que la justia no trata a questo soba tica da legalidade, mas tratadiferentemente os desiguais,contra o que preceitua a lei.Quando autorizada a ao dereintegrao de posse, os pro-prietrios contam com a m von-tade do governo local.

    O MST, que hoje em diauma excrescncia, pratica umapoltica de invases cuja essnciano a ocupao da terra em si, mas o questionamento do

    direito de propriedade. Quantoao ressarcimento de prejuzos, oproprietrio que teve sua terrainvadida no tem nenhum ressar-cimento e paga, ainda, os custosde sua ao penal, porque oMST no existe juridicamente.

    O editor

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    A diplomacia brasileira e o Conselhode Segurana das Naes Unidas

    Georges D. LandauProfessor de Relaes Internacionais da Fundao Armando lvares Penteado (FAAP), So Paulo. Membro do

    Conselho Curador do Centro Brasileiro de Relaes Internacionais (CEBRI), Rio de Janeiro.

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    I. ANTECEDENTES HISTRICOS

    uando, em 1945, aps ofim da II Guerra Mundial a

    Conferncia de So Francisco re-sultou no estabelecimento da Or-ganizao das Naes Unidas(ONU), criou-se como rgo su-premo da Organizao o Con-selho de Segurana (CSNU), in-cumbido de velar pela manuten-

    o da paz e da segurana inter-nacionais. Neste rgo, com 15membros, estipulou a Carta quecinco deles os pases vitoriososno conflito teriam assento per-manente e direito de veto. Ento,como hoje, os membros perma-nentes eram/so: os Estados Uni-dos, a Gr-Bretanha, a Rssia (su-cessora da Unio Sovitica), a Chi-na Popular (sucessora da Repbli-

    ca da China) e a Frana. Os Esta-dos Unidos j eram uma potncianuclear, e subsequentemente osdemais chegaram a s-lo1.

    Foi cogitada em 1945, quan-do da conferncia de DumbortonOaks (preparatria da de SoFrancisco), a participao do Bra-sil como um dos membros perma-nentes do Conselho de Segu-rana, que passariam a ser seis2.

    Q

    Destaque

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    Destaque

    Afinal, nosso pas contribuiu paraa vitria aliada com um contin-gente militar que combateu bra-vamente na Itlia, e foi o nico

    pas latino-americano a faz-lo. Ocemitrio militar de Pistia teste-munha que sangue brasileiro foiderramado nos campos de bata-lha da Europa. Alm de tropas, oBrasil durante toda a II Guerra foium precioso fornecedor de ma-trias-primas, e sem as basesareas estratgicas no Norte eNordeste do Brasil dificilmenteteriam podido os Aliados atacaros redutos do Eixo na frica doNorte. Tudo isso, porm, foi esque-cido em 19453. No intervalo en-tre as duas conferncias foi logodescartada a pretenso brasileira,e a nossa diplomacia, entocaudatria dos Estados Unidos,com isso se conformou4. Passa-ram-se dcadas sem que o Brasil,prestigioso e acatado membro daONU e honrado, desde 1948,com a tradio de abrir todos osanos a Assembleia Geral reivin-dicasse assento permanente no

    Conselho de Segurana, emboramuitas vezes como ocorre ago-ra (binio 2010-11) tenha ocu-pado uma das dez cadeiras ro-tativas e vrias vezes a presidn-cia do rgo. A reivindicao res-surgiu em 1989 no governo Sar-ney, que empreendeu esforosdiplomticos nesse sentido. A Car-ta de So Francisco refletiu a cons-telao de foras do imediatoaps-guerra, e, embora pasescomo a Gr-Bretanha e a Franaestivessem ento exangues eexnimes,5 assim como a URSS ea ento Repblica da China (qual sucedeu em 1949 a Rep-blica Popular)6, todos devastadospela guerra, qualificavam-se ain-da como potncias vitoriosas naII Guerra, e o Brasil foi conside-rado um aliado menor, perifrico.Em sucessivos ensejos subse-quentes e com diferentes matizeso Brasil expressou interesse por

    ocupar um assento permanenteno Conselho de Segurana, re-nunciando inclusive explicitamen-te ao direito de veto caso fosse

    necessrio. A demanda foi sem-pre individual, e no se revestiudo carter de uma representaoregional latino-americana, quealis teria sido contestada, comoo foi, pela Argentina e pelo M-xico. Em 1989, no discurso quepronunciou ao inaugurar a As-sembleia Geral das Naes Uni-das, o presidente Jos Sarney

    postulou formalmente o ingressodo Brasil como membro perma-nente do CSNU, abdicando dodireito de veto. Mas a propostano foi adiante7.

    Durante a presidncia de Fer-nando Collor o chanceler CelsoLafer, ao proferir, em setembro de1991, o discurso de abertura daAssembleia Geral, invocou o ar-gumento da necessidade dedemocratizao do sistema inter-nacional e o da representati-vidade do Conselho de Seguran-a. Props o ministro Lafer queos reajustes a este, reivindicadospor numerosos pases, fossemconsiderados com prudncia,

    mas com perspectivas de futuro.J na presidncia de Itamar Fran-co, estando frente do Itamaratyo ministro Fernando Henrique Car-

    doso, este, em outubro de 1992,preconizou a volta do Brasil aoConselho como membro no per-manente (o que efetivamenteocorreu no ano seguinte, aps 13anos de ausncia), e encareceu oimperativo da democratizao doCSNU. Em sua primeira gesto,sob a presidncia de Itamar Fran-co, o ministro Celso Amorim pro-nunciou-se no mesmo sentido, naAssembleia Geral de 1993. Entre-tanto, apenas cinco pases, e nodos maiores, apoiaram a preten-so brasileira, que no vingou.Com a presidncia de FernandoHenrique Cardoso (1995-2002),sendo chanceler (at 2001) LuizFelipe Lampreia, mudou a nfasedo pleito brasileiro, passando estea ter importncia secundria; oBrasil no mais praticaria umapoltica de prestgio, embora simdefendesse a necessidade de re-forma do sistema institucional das

    Naes Unidas, para que melhorrefletisse a diversidade de visesdo mundo. Este tema foi reite-rado ante a Assembleia Geral eem vrias outras oportunidadespelo presidente e pelo chanceler.Em novembro de 2001, ao abriros debates da 56 Assembleia Ge-ral, o presidente FHC reclamou aampliao do CSNU, em nome deuma ONU forte e gil, e defen-deu a criao de assentos perma-nentes para pases em desenvol-vimento credenciados para exer-cer as altas responsabilidadesque o Conselho demandava. Em2002, novamente chanceler,Celso Lafer reiterou que o Brasilestava pronto a dar a sua contri-buio para o trabalho do CSNU,e a assumir todas as suas respon-sabilidades.

    Pode-se afirmar, em resumo,que durante o governo de FHC aquesto foi suscitada, mas no de

    Foi cogitada em1945, quando daconferncia de

    Dumborton Oaks(preparatria da

    de So Francisco),a participao doBrasil como umdos membrospermanentes

    do Conselho deSegurana,que passariam

    a ser seis.

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    Destaque

    forma proativa. Com efeito, o pre-sidente FHC temia melindrar aArgentina, inequivocamente opos-ta pretenso brasileira, e o mi-

    nistro Lampreia, conhecedor dasdificuldades de uma reformainstitucional das Naes Unidas,manifestava-se ctico em face doxito de uma hipottica reivindica-o. Lampreia tinha conhecimen-to de que o aumento do nmerode membros permanentes, possi-velmente mediante alguma moda-lidade de representao regional,exigiria a reforma da Carta de SoFrancisco. Isso equivaleria a abrira caixa de Pandora, com conse-quncias imprevisveis, e, na con-juntura internacional dos anos90, como na de hoje, as grandespotncias, desejosas de preservaruma situao privilegiada quepara vrias delas dificilmente se-ria sustentvel na atualidade, pre-feriram ignorar o problema.

    Em novembro de 2003 umComit Internacional de Notveis,nomeado pelo Secretrio-GeralKoffi Annan e integrado inclusive

    pelo embaixador brasileiro JooClemente Baena Soares, ex-Secre-trio-Geral da OEA, havia formu-lado propostas de reforma daONU, e em particular a limitaodo direito de veto no seio doCSNU.8 O Secretrio-Geral KoffiAnnan apresentou em 21 de mar-o de 2004 as suas propostas,amplas e abrangentes, para areestruturao das Naes Uni-das, inclusive a reforma do Con-selho de Segurana, com a espe-rana de que tais reformas fossemadotadas no ano seguinte pela Assembleia Geral comemorativados 60 anos da Organizao.Contudo, tal no ocorreu. A ONUestava demasiado polarizada coma guerra do Iraque. Koffi Annanprops a expanso do nmero demembros do Conselho de 15para 24, para torn-lo mais re-presentativo e compatvel com arealidade geopoltica daquela con-

    juntura, e outras medidas proces-suais. Se adotadas, o Brasil decer-to teria sido aquinhoado com umadas novas vagas permanentes.9

    II. TEMPOS ATUAIS:ADIPLOMACIADO GOVERNO LULA

    J na presidncia de LuizIncio Lula da Silva, estando no-vamente frente do Itamaraty oministro Celso Amorim,10 o Brasilincorporou-se ao G-4 (Alemanha,ndia, Japo e, a partir desse mo-mento, o Brasil). Como tal,apoiou uma das opes de Annan, a que aumentava o n-mero de membros permanentespara seis novos, i.e., os do G-4mais dois africanos. No mbito doG-4 a Alemanha e o Japo (am-bos perdedores da II GuerraMundial, mas hoje entre os gran-des pases lderes da economiaglobal), e a ndia, integram o se-leto clube de aspirantes a umacadeira vitalcia no Conselho. Sea participao do Brasil nessegrupo no sofre maiores contes-

    taes, salvo as dos hermanoslatino-americanos, o mesmo nose pode dizer dos demais pasescandidatos. A ndia tem as suas

    credenciais questionadas peloPaquisto, o Japo conta com oveto da China (bem lembrada dasatrocidades cometidas emNanjing) e a Alemanha sofre opo-sio da Espanha e da Itlia. As-sim, a proposta de reforma doConselho gorou. Realisticamente,no se pode esperar a curto pra-zo uma soluo favorvel da rei-vindicao brasileira, agoraindissocivel dos seus parceirosno G-4. Em termos de estratgiadiplomtica, ao vincular a suacandidatura ao G-4, dadas asresistncias aos demais membrosdeste, o Brasil debilitou a sua pr-pria aspirao.

    No seu discurso de posse nachefia do Itamaraty, em 2003,Celso Amorim, chanceler duran-te todo o governo Lula, advogoua incluso no CSNU de pases emdesenvolvimento como membrospermanentes, de modo a refor-

    Em 2003, um Comit Internacional de Notveis, nomeado pelo ento Secretrio-Geral Koffi Annan, havia formulado propostas de reforma da ONU.

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    ar a legitimidade e a repre-sentatividade [do Conselho]. Lulae seu chanceler iniciaram a par-tir do comeo do mandato uma

    campanha proativa para obter aambicionada cadeira cativa noCSNU.

    Com efeito, o G-4 em dezem-bro de 2004 expressou a opiniocoletiva dos seus membros de queas reformas propostas pelo Se-cretrio-Geral Koffi Annan supri-miriam as deficincias estruturaisdo Conselho, e em maro de2005 o Brasil, na presidnciarotativa deste e apoiado pelosoutros trs membros do G-4, pro-ps formalmente AssembleiaGeral a reforma do CSNU. Emjulho do mesmo ano o Embaixa-dor Ronaldo M. Sardenberg, Re-presentante Permanente do Bra-sil ante as Naes Unidas, apre-sentou em nome de 29 pases umprojeto de resoluo (com pou-cas assinaturas latino-america-nas: Haiti, Honduras e Paraguai)sobre a reestruturao do Con-selho. A resoluo no vingou,

    graas basicamente oposioda Unio Africana que pleitea-va para os seus membros trs emvez de dois assentos permanen-tes. Contudo, em sucessivos dis-cursos do presidente Lula e arti-gos do ministro Amorim, entre2005 ano do 60 aniversrioda ONU e 2007, o Brasil ex-pressou a esperana de um des-fecho favorvel para o projetoque ampliaria o Conselho.11Note-se que a poltica africana dopresidente (que at o presente fezonze visitas oficiais regio) nologrou angariar o apoio dos pa-ses africanos reivindicao bra-sileira.

    III. CUSTO-BENEFCIODADIPLOMACIAPRESIDENCIAL

    No h como negar que oprotagonismo pessoal do presi-

    dente Lula elevou o Brasil a umnovo patamar nas relaes inter-nacionais do pas. O que cabe

    discutir o custo-benefcio dessadiplomacia presidencial. No cam-po comercial, por exemplo, o pre-sidente tem desempenhado, comcerto xito, um papel que melhorteria correspondido ao ministroda pasta pertinente. Entretanto, oBrasil, sob a hipoteca diplomti-ca de sua participao no Mer-cosul, no logrou firmar duranteesses oito anos um nico acordode livre comrcio. No competea um chefe de estado ser caixeiro-viajante, ainda que o faa comxito. Mas certo que o imensocarisma do presidente, que se re-flete tanto no campo interno comono externo, tem grangeado aopas uma atuao invejvel nosforos multilaterais.

    Entre estes, sobressaem o G-8e o G-20, e particularmente nes-te ltimo, que ante a relativa inr-cia e a obsolescncia dos orga-

    nismos internacionais tradicio-nais, tanto universais como re-gionais, vem assumindo um papel

    crucial na governana global. evidente que o mundo atual dife-re fundamentalmente daquele dedepois da Segunda Guerra, e jque parecem ser insuperveis asdificuldades para a reforma es-trutural das Naes Unidas e seusOrganismos Especializados, foipreciso criar novos mecanismosde governana global. Estes, po-rm, no subtraem ao Conselhode Segurana a sua responsabi-lidade central pela manutenoda paz e da segurana interna-cionais.

    Uma das consequncias dadiplomacia presidencial, altamen-te personalizada, que caracteri-za o governo Lula, a sua ideo-logizao. Ao esposar, no inciode seu governo, em 2003, osprincpios fundamentais da ges-to econmica de seu predeces-sor, o presidente FHC, Lula optou

    Destaque

    No h como negar que o protagonismo pessoal do presidente Lula elevou oBrasil a um novo patamar nas relaes internacionais do pas.

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    por satisfazer a ala radical doPartido dos Trabalhadores me-diante uma poltica externa quedestoa da poltica econmica in-

    terna, relativamente conserva-dora, que praticou ao longo dosseus dois mandatos (especial-mente do primeiro), e que contri-buiu para a atual prosperidadedo pas.

    Um dos fatores responsveispor tal ideologizao da polticaexterna do pas foi a entrega, pelopresidente, de uma parcela cadavez maior da sua conduo aoassessor presidencial para assun-tos internacionais, o Prof. MarcoAurlio Garcia, idelogo do PT, edurante uma dcada responsvelpelas relaes exteriores do Par-tido com todas as esquerdas doplaneta, refletidas no Foro de S.Paulo. A partir do Palcio do Pla-nalto, Garcia pratica uma esp-cie de diplomacia paralela doItamaraty, e nem sempre con-soante com esta. O Servio Exteriordo Brasil um corpo de elite naadministrao brasileira, cultiva tra-

    dicionalmente um profissionalismoque honra o pas, mas que muitasvezes esbarra numa poltica deorientao ideolgica que tem le-vado o Brasil e seu governo asituaes constrangedoras.

    Obviamente, no se contestaaqui o direito de um governanteque, democraticamente eleito ereeleito por expressiva maioria,queira imprimir sua poltica ex-terior o seu vis poltico, que co-incide com o do partido ao qualpertence. Da as prioridades diplo-mticas da gesto Lula nfasena direo Sul-Sul, com especialrelevncia para o entorno latino-americano e o africano, simpatiapor governos de esquerda (quevo do rosa plido ao prpuracarregado), e at um certo anti-americanismo primrio. A execu-o dessa poltica externa se ca-racteriza por uma assertividade

    internacional cada vez maior, emsi salutar, mas no raro remi-niscente do Brasil potncia doregime militar, e igualmente des-

    provida de substncia. Trata-seda projeo externa de um na-cional-desenvolvimentiano socia-lizante, cujos excessos como aestatizao desabrida implicamaltssimo custo, e s prejudicamo pas.

    nesse contexto que se devesituar a atuao do governo Lulaem muitos mbitos externos.

    cada um dos quais correspondeum voto, segue-se, na concepodo presidente Lula, que devem serindividualmente cultivados muitos

    desses Estados, sobretudo osemergentes, mediante o exercciode uma diplomacia da generosi-dade, que o governo Lula, nes-ses quase oito anos de mandato,tem praticado com afinco.

    Em que consiste essa diploma-cia essencialmente ideolgica? Nacriao de inmeras embaixadasde duvidosa utilidade nos pasesem desenvolvimento, inclusive osmais insignificantes; no perdo devultosas dvidas de pasesinadimplentes, na tolerncia degestos de indisfarada hostilidade,como a da expropriao pela Bo-lvia, mediante uma indenizaopfia, de duas refinarias da Pe-trobras; na aceitao de violaes,reiteradas e cabais, das regras doMercosul e da OMC por pasesvizinhos; da renegociao do tra-tado de Itaipu (1973) com o Pa-raguai, sob condies que, seaprovadas pelo Congresso, cus-

    taro ao consumidor brasileiro deeletricidade mais de US$5 bilhesao longo dos prximos 13 anos;no silncio complacente do Brasilquando o Conselho de DireitosHumanos das Naes Unidas votasanes a pases que so contu-mazes violadores desses direitos;na recusa da extradio Itliado terrorista Battisti, condenadopor quatro homicdios em seu pas,ao passo que foram devolvidos aCuba dois atletas cubanos quepediram asilo ao Brasil aps osJogos Pan-americanos de 2007;nas desastradas tentativas de me-diao no Oriente Mdio (repelidapor ambos os lados em conflito) ecom o Ir, em flagrante desafioaos atuais cinco membros perma-nentes do CSNU; na ridcula con-cesso do refgio na embaixadado Brasil em Honduras ao golpistaManuel Zelaya, aliado boliva-

    Uma das linhas mestras da suaatuao consiste precisamente nabusca de um assento permanen-te, com ou sem direito de veto, noConselho de Segurana das Na-es Unidas. As dificuldadesinstitucionais em lograr tal objeti-vo j foram mencionadas. Mas,no altar dessa aspirao tm-sesacrificado muitos outros interes-ses nacionais, em detrimento dacidadania e do contribuinte brasi-leiro. Dado que a reforma da Car-ta da ONU e a reestruturao doCSNU passam pela Assembleia-Geral da Organizao, hoje comquase 200 Estados-membros, a

    Destaque

    Em sucessivosdiscursos dopresidente Lula e

    artigos do ministroAmorim, entre2005 ano do

    60 aniversrio daONU e 2007, o

    Brasil expressou aesperana de um

    desfecho favorvelpara o projeto que

    ampliaria oConselho.

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    Destaque

    riano de Hugo Chvez; e emmuitas outras iniciativas, onerosasquer para o prestgio do pas, querpara o bolso do contribuinte.

    Alm da acolhida dada a umbom nmero de refugiados de va-riada procedncia, h um nicoexemplo bem-sucedido da diplo-macia da generosidade, empre-endida pelo presidente Lula, comvistas a robustecer o seu pleito deum assento permanente noCSNU: o da participao bra-sileira na Minustah, a misso dasNaes Unidas de estabilizaoe segurana no Haiti, com umexpressivo contingente militar e ocomando de um general brasilei-ro. O Brasil no passado teve ati-va participao em numerosasmisses de paz das Naes Uni-das, que credenciam o pas comoum membro responsvel da Or-ganizao, e, como no casoatual, do seu Conselho de Segu-rana. A misso no Haiti se dis-tingue ao representar um esfor-o significativo em termos ma-teriais e humanos em prol da

    estabilidade do pas mais pobredo continente, mormente aps orecente terremoto que devastouo pouco que lhe restava. Tantoassim que ao contingente mili-tar vieram somar-se representa-es de outros rgos pblicos ede numerosas ONGs humani-trias, que enaltecem o prestgiodo Brasil.

    IV. CONCLUSO

    Ao longo desses oito anos dapresidncia Lula, a poltica exter-na do pas tem sido extremamen-te ativa. O presidente da repbli-ca visitou mais de 60 pases, mui-tos deles mais de uma vez evrios como primeiro manda-trio brasileiro a visit-los. Fezonze viagens frica, o que noimpediu pases africanos de sa-botarem o pleito brasileiro de umassento permanente no CSNU.

    Empenhou-se a fundo pela con-cluso da Rodada de Doha, masno pde impedir pases africa-nos de torpedear o acordo final,

    de transcendental importnciapara o Brasil. Tampouco a parce-ria estratgica com a Frana im-pediu que esta inviabilizasse oacordo de livre comrcio entre aUnio Europia e o Mercosul, sobnegociao h seis anos. Outrosparceiros votaram contra as can-didaturas brasileiras em vrios or-ganismos internacionais, como aOMC e o BID. No se trata aquide fazer uma crtica geral pol-tica externa do governo Lula, queteve aspectos extremamente po-sitivos.12 Trata-se, sim, de demons-trar que a insistente busca de umaposio privilegiada no Conselhode Segurana das Naes Uni-das, a de titular de um assentopermanente, representou um altonus para a diplomacia brasilei-ra e a nao, no condizente comas realidades e aspiraes dopas.

    No se vislumbra por ora a

    realizao da aspirao brasilei-ra, velha de 65 anos, de uma ca-deira permanente no Conselho deSegurana. Os mritos do Brasilpara candidatar-se a esse galar-do so hoje bem maiores e maisreconhecidos que ao tempo daCarta de So Francisco. Tambm bem mais ntida a capacidadebrasileira de exercer tal mandatose e quando for obtido, e de as-sumir as grandes responsabilida-des da decorrentes. No depen-de de ns a obteno do assentopermanente, ser um corolrio daconjuntura global. O Brasil fez oque pde, e at mais. No gover-no Lula pagou um altssimo pre-o diplomtico por lograr a satis-fao de uma antiga ambionacional. A busca da cadeira noCSNU permeou toda a polticaexterior do Brasil durante o gover-no Lula e suas relaes bilaterais,assim como multilaterais.

    1 No requisito que os membros perma-

    nentes sejam potncias nucleares. Tambmo clube atmico se expandiu, e o mono-plio do arsenal nuclear no mais se confi-na, como h meio sculo atrs, aos cincomembros permanentes do CSNU; mais re-centemente ndia, Paquisto, Israel, Coriado Norte e provavelmente o Ir, alm deoutros pases, j tm ou, em breve, teroarmamentos nucleares e meios de deton-los. Com o fim do apartheid, a frica do Suldesistiu de ter uma capacidade nuclear.

    2 Comentrios do chanceler brasileiro,Pedro Leo Velloso, ao Plano de DumbortonOaks de Criao das Naes Unidas (1945),em Fernando de Mello Barreto (Os Suces-sores do Baro, v.1 (1912-1964). S. Pau-lo: Paz e Terra, 2001, pp. 156-162. Houveum acordo entre o Ministro Leo Velloso eo Secretrio de Estado americano, Stettinius,

    no sentido de que se fosse criada uma sextavaga no CSNU ela corresponderia ao Bra-sil, mas os Quatro Grandes de ento, (EUA,Gr-Bretanha, URSS e China) recusaram aproposta, oferecendo apenas ao Brasil umassento no permanente com mandato dedois anos.

    3 Soubessem ento os EUA e os demaisaliados ocidentais que dois anos mais tardese abateria sobre a Europa uma Cortina deFerro, e que com ela se iniciaria a GuerraFria, talvez tivessem insistido na participaodo Brasil no Conselho de Segurana, masisso mera especulao.

    4 Os antecedentes histricos sugeririam ocontrrio. Ao tempo da Sociedade das Na-es (SDN), em 1926, o Brasil deixou aorganizao quando a Alemanha (derrotadano conflito de 1914-18), e no o Brasil, foiconvidada a integrar o Conselho Permanen-te da SDN. Veja-se Eugnio V. Garcia, oBrasil e a Sociedade das Naes. Braslia:Fundao Alexandre de Gusmo.

    5 Para reerguer economicamente a Europae salv-la do proselitismo sovitico foipreciso que os EUA implementassem o Pla-no Marshall a partir de 1948.

    6 Nas Naes Unidas a substituio fez-seem 1971, aps a visita do Presidente Nixon China.

    7 Luiz Felipe Seixas Corra, A Palavra doBrasil nas Naes Unidas. Braslia: FundaoAlexandre de Gusmo, 1995, p.p 503-4.

    8Baena Soares integrou, a convite de KoffiAnnan, o Painel de Alto Nvel sobre Amea-as, Desafio e Mudana.

    9 Maria Helena Tachinardi, A volta da ve-

    lha senhora in Desafios do Desenvolvimen-to (IPEA, Braslia), ed. 10, agosto de 2004.10A alternncia dos chanceleres pode pres-

    tar-se a alguma confuso: Celso Lafer foichanceler de Fernando Collor em 1992 eoutra vez de FHC em 2001-2; CelsoAmorim foi chanceler de Itamar Franco em1993-94 e outra vez de Lula, em seus doismandatos (2003 ao presente).

    11 Fernando de Mello Barreto. Os Suces-sores do Baro, tomo III (volume em prepa-rao, consultado por deferncia especialdo autor).

    12 Luiz Felipe dvila e Oliver Stuenkel. Odesafio de tornar a poltica externa relevantepara o Brasil. S. Paulo: CLP Papers, n 3,2010.

    NOTASE REFERNCIAS

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    o creio nisso, e at meinclino a pensar o contrrio.

    O acelerado crescimento do au-toritarismo de esquerda durantea ltima dcada na AmricaLatina (sendo os mais extremadosos de Cuba, Venezuela, Bolvia,Nicargua) provoca muita retricabarulhenta na mdia interna-

    cional.Ainda mais, o benigno exibi-cionismo de alguns outrosgovernos da regio, que se dizemsocial-democratas (o de Correano Equador, o de Lula no Brasil,o de Colom na Guatemala), lhesserve como uma caixa de resso-nncia para aumentar em algunsdecibis aaaaamaismaismaismaismaisos seus pronun-ciamentos.

    O clebre socialismo dosculo XXI, contudo, se mostrou

    nada mais que uma reciclagemexausta e superficial de idiasgastas e obsoletas, retiradasimpulsivamente das diversasverses do socialismo real dosculo XX.

    O fato que isso se traduziuem um enfraquecimento dosdireitos de propriedadepropriedadepropriedadepropriedadepropriedade e na

    hostilidade governamental, emcertos pases, contra a l ivrelivrelivrelivrelivreexpressoexpressoexpressoexpressoexpresso do pensamento, semque se tenha chegado, todavia,exceto em Cuba, s violentascoletivizaes estatizantes cujosmbolo mais gritante, o Muro deBerlim, foi derrubado com estr-pito em 1989, pondo fim a maisde 70 anos de desumanizaosistemtica.

    Se alguma coisa tornou opalavrrio demaggico de Hugo

    Chvez mais ressonante foi, semdvida, o suporte de abundantespetrodlarespetrodlarespetrodlarespetrodlarespetrodlares que o acompa-nham, diferentemente do atualdiscurso moribundo de FidelCastro.

    Inclusive, esse experimentocomunista em Cuba j vistomundialmentemundialmentemundialmentemundialmentemundialmente como um fra-

    casso total, at mesmo por muitosdaqueles que se manifestam emsintonia com o socialismo dosculo XXI. muito fcil perceberesse fato: a esquerda atual-mente faz apenas aluses aodesempenho de Fidel Castro nopassado.

    Por outro lado a Venezuela,enquanto Estado benfeitorbenfeitorbenfeitorbenfeitorbenfeitor,caminha inevitavelmente emdireo a uma condio deestado falido, e essa realidade

    As ideias socialistas avanam,realmente, na Amrica Latina?

    Armando de la TorreDiretor da Escola Superior de Cincias Sociais da Universidade Francisco Marroqun, na Guatemala, desde 1977.

    N

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    Poltica

    comea a calar at as massaschavistas da prpria repblicabolivariana que sentem na carne,hoje em dia, a maior inflao

    galopante do hemisfrio, aprogressiva escassez dos artigosde consumo da cesta bsicafamiliar, os mais altos ndices decriminalidade urbana de toda suahistria, a ausncia de investi-mentos estrangeiros que geravamemprego, a contrao da pro-duo agrcola e industrial, apolarizaosocialsocialsocialsocialsocial cada vez maisaguda, a corrupo generalizadanos processos da justia civil,penal e processual que atinge a

    todos, a ausncia de represen-tao em um parlamento semmembros da oposio, os cho-ques com a Igreja no planointerno e, no plano externo, asdesavenas com sua vizinhaColmbia, com os EUA, Israel,Unio Europia, Mxico, Peru e ato Chile.

    Soma-se a tudo isso umaconstante e macia fuga decapitais e a emigrao cada diamais volumosa de talentos nativos,

    algo parecido com a nefastaexperincia dos cubanos nadcada de 1960, embora demaneira um pouco mais lenta.

    Porm, nossas classes mdiasprogressivamente mais edu-edu-edu-edu-edu-cadascadascadascadascadas se mostram mais beminformadas sobre essas reali-reali-reali-reali-reali-dadesdadesdadesdadesdades em todos os quadrantesda Amrica Latina.

    Do mesmo modo, os xitoscontemporneoscontemporneoscontemporneoscontemporneoscontemporneos do livre mer-cado, apesar da recente crise

    financeira mundial e do custo daluta contra o terrorismo islmico,estimulam paralelamente oavano pela consecuo oupreservao de estados de direitogenunos, como no Chile, Co-lmbia, Peru, Uruguai, Panamou Costa Rica, ressaltando paranossos povos uma alternativaalternativaalternativaalternativaalternativavlida, em seu futuro, frenteao mentiroso socialismo dosculo XXI.

    Tambm no se podem es-quecer os sucessivos milagresmilagresmilagresmilagresmilagreseconmicoseconmicoseconmicoseconmicoseconmicos ocorridos desde ofim da Segunda Grande Guerra,

    a partir da Alemanha na dcadade 1950 e, mais ainda, entre aseconomias nacionais da sia (osfamosos tigres asiticos),enfatizando desde o incio apromoopromoopromoopromoopromoo dasdasdasdasdas exportaesexportaesexportaesexportaesexportaes eno a sua substituio ao con-trrio dos conselhos de nossostericos da dependncia (em tor-no de Ral Prebisch e da CEPAL),que tanto influenciaram os te-logos catlicos da libertao.

    Outros exemplos mais re-

    centes, como os de algumas eco-nomias ressurgentes no antigobloco sovitico (Estnia, Eslovnia,Repblica Tcheca), se elevam comouma imponente e reiteradaadvertncia endereada ao maisao maisao maisao maisao maiselementar sentido comumelementar sentido comumelementar sentido comumelementar sentido comumelementar sentido comumcontra o desacerto de qualquerenfoque coletivista.

    Tambm, essa colaborao defachada cada vez mais estreitaentre os autoproclamados so-cialistas do sculo XXI e os

    autocratas islmicos, associadospela opinio pblica ao terrorismoda jihad, os torna cada vez maisrepugnantes aos olhos dosamantes da liberdade e da paz.

    O sonho das utopias cole-tivistas j foi sonhado, mas ossocialistas do sculo XXI no seaperceberam.

    Ainda se poderia citar oincidente hondurenho de quaseum ano atrs como uma provaadicional da paulatina mudana

    da mar da opinio poltica latino-americana, que nos afasta cadavez mais do socialismo do sculoXXI.

    Porm, no deveramos nospreocupar tanto com esse pre-tenso socialismo do sculo XXI,pois isso perturba nossa buscasistemtica para identificar o quequeremos na realidade.

    Aqui entra o tpico inevitvelde nossa obrigao de nosde nossa obrigao de nosde nossa obrigao de nosde nossa obrigao de nosde nossa obrigao de nos

    educarmos e educareducarmos e educareducarmos e educareducarmos e educareducarmos e educar. Isto , derefinar nossos conceitos e hip-teses no pressuposto de Pascal deque o esforo mental para

    aclarar as idias o fundamentode toda vida moral.A ticaticaticaticatica pblica ficou esque-

    cida em excesso, entre ns, pormuitos anos. Talvez o esforoobsessivo para construir Estadosbenfeitores modernos nos tenhadesviado do dever de prestar aten-o prioritariamente dimensoticaticaticaticatica em nossas opes pblicas.E assim chegamos prticapouco questionada de que empoltica, sobretudo no que se

    refere justia social, o fimo fimo fimo fimo fimjustifica os meiosjustifica os meiosjustifica os meiosjustifica os meiosjustifica os meios (Crdenas, Vargas, Pern, Castro e quetais...)

    Por isso mesmo o xito local epassageiro do chavismo daltima dcada na Amrica do Sulno deve nos distrair desseesforo educativo, muitssimomais importante do que descobrircomo tornar impossvel sua recor-rncia: o sentido deliberadoo sentido deliberadoo sentido deliberadoo sentido deliberadoo sentido deliberadode obrigao moralde obrigao moralde obrigao moralde obrigao moralde obrigao moral ao escolher

    ou utilizar os mtodos para obternossos objetivos. Sob o estritoponto de vista da experinciahistrica, nossa primeira linha dedefesa deveria ser constituda pelareafirmao vigorosa dos direitosde todos propriedade privada,inclusive a do subsoloinclusive a do subsoloinclusive a do subsoloinclusive a do subsoloinclusive a do subsolo . Estamatria no recebeu a devidaimportncia da parte de nossosjuristas latino-americanos. Creioque isso uma herana doesmagador positivismo cientfico

    de August Comte (sobre o qual seconstruiu, mais tarde, o posi-tivismo jurdico de Hans Kelsen),entronizado em fins do sculo XIXe que abriu espao para asrevolues sociais do sculo XX.Esquecemo-nos de que osescravos foram o que foramporque seu direito propriedadeno foi reconhecido, o queconsequentemente os deixavaindefesos por no disporem de

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    Poltica

    meios com os quais pudessemdefender todos os seus outrosdireitos, comeando pelos direitos liberdade e vida.

    O caso de Cuba talvez seja

    mais transparente. Fidel Castrovaleu-se espertamente por meiosculo da supresso dedededede fatofatofatofatofato dapropriedade privada na ilha paraconsolidar sua frrea ditaduratotalitria, enquanto desviavanossa ateno de suas aesatrozes contra os direitos hu-manos ao pr em prtica umvirulento antiamericanismo.

    Uma segunda linha de defesaque poderamos adotar deveria sera salvaguarda incondicionalincondicionalincondicionalincondicionalincondicional do

    direito livrelivrelivrelivrelivre expressoexpressoexpressoexpressoexpresso. Semesse direito os povos se arrastams cegas para seu prprio des-penhadeiro, que neste caso osocialismo do sculo XXI aoestilo venezuelano.

    Uma terceira linha de resis-tncia seria constituda pelavontade solidriavontade solidriavontade solidriavontade solidriavontade solidria de todos oshomens e mulheres que acreditemque viver subjugado por tiranos a nica coisa que no se pode

    aceitar, e isso desde o primeiroe isso desde o primeiroe isso desde o primeiroe isso desde o primeiroe isso desde o primeirogesto de despotismogesto de despotismogesto de despotismogesto de despotismogesto de despotismo. No somosilhas, muito menos tomos sepa-rados...

    Tal vontade solidria se con-

    cretizou exemplarmente emHonduras, onde o povo, em suamaioria e atravs de suas ins-tituies mais representativas (oCongresso, a Corte Suprema, aCorte de Constitucionalidade, aControladoria de Contas, oMinistrio Pblico), com o apoiomoral das igrejas, impediu asintenes golpistas de ManuelZelaya, que seguia a linha orde-nada por Hugo Chvez.

    Lamentavelmente, essa mesma

    vontade solidria para com opovo hondurenho no ocorreu naOEA, entre os embaixadores das Amricas, devido intromissoilegtimailegtimailegtimailegtimailegtima de Lula da Silva, DanielOrtega e, uma vez mais, dosirmos Fidel e Ral Castro, demos dadas com seu financiador,Hugo Chvez.

    No h mal que dure 100anos nem corpo que resista atanto, diz um velho ditado cas-

    telhano. Os dissidentes cubanosparecem divisar as primeiras luzesdo fim do longussimo tnel emque vegetaram por mais de meio

    sculo, enquanto ao mesmotempo os socialistas do sculo XXI percebem as sombras quehavero de engoli-los definitiva-mente em um prazo relativamentemdio.

    A antipatia dos governos doCanad, EUA e Mxico em rela-o ao socialismo do sculo XXIse soma s graduais medidasrestritivas da Unio Europeia, deIsrael e do Japo ao intercmbiocomercial com esses regimes que

    se qualificam como pseudosso-cialistas.Devemos nos voltar todos para

    um pacto pan-americano quedestaque, como proclamou nosculo XIX o mexicano BenitoJurez, a obrigao, tanto porparte dos estados como dosindivduos, de sempre ter emmente este lema primordial: orespeito ao direito alheio a paz.

    Isso implicaria, naturalmente,algumas reformas profundas em

    nossos cdigos civil, penal eprocessual, para assegurar maisefetivamente a integridade daspessoas e de seus bens diante dasagresses dos poderosos, visveisvisveisvisveisvisveisvisveisou noou noou noou noou no.

    Para isso cada um de nsprecisa fazer um profundo examede conscincia sobre nossosrespectivos contratos sociaisconstitucionaisconstitucionaisconstitucionaisconstitucionaisconstitucionais. Temos fracas-sado repetidamente porque noreconhecemos a importncia

    fundamental da clusula de se-de se-de se-de se-de se-parao dos poderes supre-parao dos poderes supre-parao dos poderes supre-parao dos poderes supre-parao dos poderes supre-mos autnomos e iguais en-mos autnomos e iguais en-mos autnomos e iguais en-mos autnomos e iguais en-mos autnomos e iguais en-tre sitre sitre sitre sitre si, a essncia de qualquerrepublicanismo, de modo querealmente contemos com rep-rep-rep-rep-rep-blicasblicasblicasblicasblicas que respeitem as minorias,e no com monarquias presiden-ciais eleitas por prazos de quatro,cinco ou seis anos.

    Mas esse assunto ficar parauma outra ocasio.

    Em Cuba, Fidel Castro valeu-se espertamente por meio sculo da supresso de fato dapropriedade privada na ilha para consolidar sua frrea ditadura totalitria.

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    exta-feira, 8 de agosto de 2010:Augusto Nunes mostra no blog

    Direto ao Ponto, na Veja Online,vdeo revelador sobre o PresidenteLula e o governador do Rio, SrgioCabral, na inaugurao de conjuntohabitacional em Manguinhos, zonanorte do Rio. O jovem Leandro, de17 anos, se aproxima do Sr.Presidente e do Sr. Governador esua entourage para indagar sobrea no existncia de quadras de tnise sobre o acesso piscina, fechada.Surpreso com a interpelao, oPresidente justifica que tnis coisade burgus. Quanto impossibilidade de uso da piscina,Lula reage com um palavro evolta-se para um assessor, advertindosobre o custo poltico de umapiscina fechada num fim de semana.O Governador tambm sedestempera e qualifica o jovem deotrio, procurando intimid-lo numbate-boca revelador, talvez assustado

    com a coragem do adolescente. Eraum dia de capitalizar politicamenteas propaladas benesses da parceriapoltica entre o governo federal e oestadual para a populao maiscarente. O vdeo foi gravado emmaio de 2009, mas s agora vema pblico. So 73 segundos de purarevelao da verdadeira face dosdois polticos. A coragem de Leandroe a tecnologia hoje disponvel abaixo custo tornaram possvel aomorador de Manguinhos arevelao.

    um mal para a democracia noBrasil a homogeneidade, tanto

    de propostas quanto de ideologia,dos candidatos Presidncia daRepblica. Estamos manietados pelopoliticamente correto. A mesmicepredomina devido aos riscos de serdiferente, de propor algo novo.

    A ausncia de diversidade limita asescolhas. Isso no ocorre por acaso.Nosso sistema poltico sempre teve

    como alimento o fisiologismo comum forte componente arrivista.Todos querem estar com o vencedor,inclusive os financiadores decampanha. Temos uma gigantescadeficincia de homens e mulheres deconvico, maior ainda entre ospolticos. Convices so forjadas nafamlia e na escola. Nosso ndicede desenvolvimento nestes doisquesitos muito baixo, no poracaso. Hayek identificou a seleoadversa na poltica: os cidadosmais bem preparados raramente setornam polticos profissionais, equando tentam, no so eleitos,no dominam o idioma das urnas.No Brasil, o custo moral de seaprender esse dialeto muitoelevado. Os empresrios jperceberam que mais fcil eproveitoso comprar a simpatia dosdirigentes em favor de seus negciosdo que lutar abertamente porliberdade. Aqueles convictos dosideais libertrios vivem entre a cruze a caldeirinha, em um exercciopermanente para manteremseus negcios.

    entir feio, aprendemos nainfncia, tanto em casa quanto

    na escola. Entretanto, os polticos doPT agem como se nunca tivessemaprendido isso, ou se esqueceram.Mentem e dizem meias verdades. Apessoa que se vale da mentira paraatingir seus objetivos torna-se umviciado em mentir. Mesmo que novenha a tirar partido de umaafirmao mentirosa, ela incapaz

    de dizer a verdade. O vcio aidentifica com a mentira. Esse pareceser o caso da candidata DilmaRousseff. Sua propaganda eleitoralest recheada de mentiras sobre asrealizaes do atual governo. Umadelas que ele criou o ProUni.Mentira, o ProUni resultou demodificaes introduzidas no jexistente crdito educativo, Creduc.O programa Minha Casa Minha

    Vida, apontado repetidamente comoresponsvel pela construo, esuposta entrega, de 400 milunidades em um ano, at agostotinha produzido e entregue apenas0,9% do que foi prometido.Entretanto, a propaganda, emmeia- verdade, s se refere ao totalprogramado. As realizaes do PACapresentadas como investimentosefetivamente realizados so, narealidade, apenas intenes, comono caso da Rocinha meia verdadedesmascarada pela imprensa.

    A estratgia do PT insistir com amesma mentira muitas vezes atque ela seja vista como verdade.

    Alm de feio, imoral.

    EspecialUma viso liberal do fato

    S M

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    aturalmente, nem a dilign-cia dos mortais comuns nem

    as energias de uma economiacompetitiva podem detectar, pre-venir ou corrigir todos os azares,

    negligncias e fraudes da vida.Portanto, nada mais natural quenos voltarmos para aquele centrode autoridade, aquele depositrioda virtude e da benevolncia,aquela fonte de justia o Esta-do, para prover a mais ampla pro-teo ao consumidor. Em conse-quncia, convivemos hoje com umregime luxuriante e prolixo de leise agncias para proteger o con-sumidor.

    1. INTRODUO

    O sistema de sade brasileiro tido pelos sanitaristas como sen-do a maior e mais bem-sucedidaexperincia de poltica social nopas. Ao final do perodo militar,no esteio da chamada reformasanitria e, mais concretamente,na promulgao da Carta Magnade 1988, foram constitudos ospilares de sustentao de umsistema de sade universal, inte-gral e hierarquizado de vis bis-marquiano. O Sistema nicode Sade (SUS) no consegue su-prir as demandas crescentes dasociedade por servios de assis-tncia sade de forma igualit-ria e universal, e no precisogrande esforo demonstrativo

    Matria de Capa

    Mercado e regulao do setor de

    sade suplementar no BrasilSandro Leal AlvesEconomista, Mestre em Economia, Professor-assistente do Instituto de Cincias Econmicas e Gesto

    da Universidade Santa rsula e gerente-tcnico da Federao Nacional de Sade Suplementar.

    N

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    para comprovar tal resultado.Basta ler os jornais e assistir aosnoticirios que teremos a dimen-so das dificuldades que per-meiam o oferecimento pblico

    de servios de sade e que re-sultam em filas interminveis ebaixa qualidade de atendimento,penalizando principalmente osmais pobres.

    No constitui objetivo deste en-saio buscar as causas para a ine-ficincia do SUS, que vo desdeos objetivos definidos constitucio-nalmente, colocando a sadecomo um direito fundamental, atas mazelas que atingem todo osistema poltico, como a ocupao

    de espaos pblicos por gruposde interesses. Ao contrrio, bus-caremos neste artigo analisar al-gumas das razes pelas quais omercado de sade suplementar

    no consegue atender o desejo demuitos consumidores.Para dar maior realismo ao ar-

    gumento, imaginem as seguintessituaes hipotticas. Um cida-do deseja adquirir um plano desade que cubra o tratamentode apenas algumas doenas bemespecficas, como cncer oudoenas coronarianas, que ele,por razes prprias, tema e bus-

    (George Stigler, prmio Nobel de

    Economia de 1982, em The Theoryof Economic Regulation. Bell Journalof Economics and Management Science,

    n 3, pp. 3-18 Traduo Livre)

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    Matria de Capa

    que proteo fora do setor pbli-co. Imagine outra situao ondenuma localidade do interior exis-tam apenas algumas clnicas par-

    ticulares que queiram vender paraos moradores da regio planosde sade com cobertura restritaqueles servios disponveis. Ima-gine uma terceira situao. Umempresrio deseja oferecer umplano para seus funcionrios quecontemple apenas alguns tipos deconsultas e exames.

    Todas as situaes anterior-mente caracterizadas tm em co-mum o fato de, por fora da re-gulamentao, no existir casa-mento entre a oferta e a deman-da de mercado. Nestes e em in-meros outros casos no h equi-lbrio entre o desejo de ofertantese compradores, pois o Estado en-tende que na rea da sade oconsumidor hipossuficiente e in-capaz de decidir pelo seu consu-mo. A regulamentao do setorbuscou a proteo dos consumi-dores a partir do estabelecimentode coberturas mnimas obrigat-rias, do controle dos reajustes dosplanos individuais, da criao deregras para a entrada, operaoe sada do setor, dentre muitasoutras. Com o argumento de seproteger o consumidor, a regula-

    mentao criou uma srie de difi-culdades para o oferecimento denovos planos, e muitas operado-ras optaram por atuar apenas no

    mercado corporativo, deixando omercado de planos individuais,que precisa da constante entradade novos consumidores para sus-tentar o princpio do mutualismo.Com o envelhecimento da popu-lao brasileira (daqui a quarentaanos teremos trs vezes mais onmero de idosos), ficamos como risco de inviabilizar soluesadvindas do setor privado devido proteo excessiva dada aosconsumidores atuais. A proteoatual gera custos aos consumido-res do futuro.

    Aps uma breve apresentaodo setor passaremos a discutir,sob o enfoque da economia daregulao, algumas das polticaspblicas adotadas e seus efeitosimediatos e secundrios.

    2. RAIO X DO SETOR

    O setor de sade suplementar,segundo dados da Agncia Na-cional de Sade Suplementar (ANS), constitudo pelas denominadasoperadoras de planos de assistn-cia sade, que oferecem cober-tura para 56 milhes de benefi-

    cirios de planos mdicos e odon-tolgicos, cerca de 29% da popu-lao. Atualmente, operam no se-tor 1.658 empresas, sendo que

    1.195 operam no segmento mdi-co-hospitalar e 463 no odontolgico.Existem diferentes modalidades

    de operadoras, como as segura-doras especializadas em sade, asempresas de medicina de grupo,as cooperativas mdicas, as filan-trpicas, as empresas de auto-gesto, as administradoras, asodontologias de grupo e as coo-perativas odontolgicas. Essasmodalidades variam na sua cons-tituio jurdica e tributria, masessencialmente na forma de pres-tao de servios mdicos. Porexemplo, as seguradoras no po-dem, por fora de lei, possurredes de hospitais, enquanto asdemais podem. As cooperativasso regidas pelo cooperativismo,alm da legislao especfica dosetor de sade suplementar, e osmdicos so, em tese, ao mesmotempo prestadores e donos do ne-gcio. As empresas de auto-gesto so constitudas sob o pa-trocnio de uma empresa que de-seja oferecer o benefcio sadeaos seus funcionrios. As admi-nistradoras apenas procedem gesto do benefcio, enquanto as

    Tabela 1 Distribuio dos Beneficirios de Planos de Sade por Modalidade (Mar/2010)

    Autogesto 244 14,7 5.328.492 9,4

    Cooperativa Mdica 339 20,4 15.431.176 27,3Filantropia 97 5,9 1.472.185 2,6Medicina de Grupo 479 28,9 17.527.980 31Seguradora Especializada em Sade 13 0,8 6.750.078 11,9Cooperativa Odontolgica 133 8,0 2.371.443 4,2Odontologia de Grupo 330 19,9 7.692.238 13,6Administradora 23 1,4 0 0,0Total do Mercado 1.658 100,0 56.573.592 100,00

    Nmero deModalidade Operadoras % Beneficirios %

    Fonte: Caderno de Informaes de Sade Suplementar (ANS - Jun/2010)

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    Matria de Capa

    operadoras de odontologia degrupo e cooperativas odonto-lgicas oferecem apenas planosodontolgicos.1 A Tabela 1 resu-

    me as estatsticas dessas modali-dades.Esse conjunto de empresas foi

    responsvel pelo pagamento deR$ 53 bilhes de despesas assis-tenciais no ano de 2009, o queequivale a aproximadamente 44%do oramento pblico destinado sade para a cobertura da to-talidade da populao brasileira.Para fazer frente a essas despe-sas o setor arrecadou voluntaria-mente da sociedade, empresas eindivduos cerca de R$ 65 bilhes,e constituiu cerca de R$ 10 bi-lhes em provises tcnicas paragarantir eventos futuros. Nessemesmo ano o setor foi respon-svel pela realizao de 223 mi-lhes de consultas mdicas eodontolgicas e aproximada-mente 5 milhes de internaeshospitalares.

    3. MERCADOE REGULAO

    A sade suplementar foi regu-

    lamentada pela Lei n 9.656 de1998, aps dez anos em trami-tao no congresso nacional.Como resultado tivemos a ampli-ao e a padronizao das co-berturas mnimas obrigatrias, anecessidade de cumprimento derequisitos tcnicos e financeirospara a entrada e continuidade nonegcio, a proibio da seleode riscos por doena ou leso pre-existente, o controle atuarial so-bre os preos de venda, o estabe-

    lecimento de faixas etrias para aprecificao dos contratos e a re-gulamentao dos perodos decarncia. Criada pela Lei n9.961, de 2000, a ANS a agn-cia reguladora das operadoras e uma autarquia sob regime es-pecial, vinculada ao Ministrio daSade.

    Na prtica, o que se observa que a regulao desse setor foi

    historicamente influenciada pelasdiretrizes do sanitarismo, cuja aver-so ao setor privado notria.Parte da explicao deve-se ao

    fato de a ANS ser uma agnciavinculada ao Ministrio da Sade,portanto muito mais perto deuma regulao da assistncia doque da regulao tcnico-econ-mica. Duas mximas, pode-se di-zer, so adotadas pelos sanitaris-tas: 1)O mercado imperfeito eo governo dotado de qualida-des morais superiores para re-gul-lo de forma a atender as de-mandas da sociedade, e 2) Nose aplica a teoria econmica tra-dicional para estudar o funciona-mento dos mercados de sade,pois sade um bem diferente.Partidrios do sanitarismo brasi-leiro acreditam que a atuao pri-vada na rea da sade deve serevitada, e a regulamentao re-flete esse pensamento. Retirandoas digitais ideolgicas da regula-mentao, pode-se buscar por ar-gumentos que respaldem deter-minadas intervenes, como aproduo pblica de vacinas de-vido a externalidades positivasque produz na sociedade.

    3.1. Organizao doMercado

    O setor de sade suplemen-tar est organizado, pelo lado daoferta, por um conjunto de rela-es contratuais (formais ou in-formais) entre as operadoras deplanos de sade, os prestadoresde servios de assistncia mdi-co-hospitalar e odontolgica, a

    indstria de medicamentos e, fi-nalmente, a indstria de mate-riais e equipamentos. Pelo lado dademanda temos os consumidoresindividuais, pessoas fsicas, e osclientes corporativos, pessoas ju-rdicas.

    A literatura de falhas de mer-cado bastante ampla, mas nocaso dos planos de sade a pre-sena de informao assimtrica

    tem sido a justificativa econmicabsica para a interveno. A eco-nomia da sade reporta s deno-minadas assimetrias informa-

    cionais a causa de distores queafetam o mercado de sade su-plementar, de modo que este noopere com o mesmo grau de efi-cincia que os mercados em con-corrncia perfeita. Ao menos trsproblemas resultam da existnciade assimetrias de informao en-tre os participantes desse merca-do: risco moral, seleo adversae a induo de demanda.

    O risco moral ocorre quando,na presena de seguro (ou plano),a estrutura de incentivos que o se-gurado se depara se altera, favo-recendo a utilizao de serviospara alm do limite em que esteutilizaria caso incorresse direta-mente no pagamento dos servios.Como o custo (monetrio) mar-ginal da utilizao zero, o bene-ficirio no tem incentivo suficien-te para racionalizar sua deman-da e provoca muitas vezes a utili-zao desnecessria de servios,alterando a distribuio de proba-bilidades associada ocorrnciado evento indenizvel. O riscomoral pode ser atenuado median-te mecanismos de compartilha-mento de risco entre a operadorae o segurado, como a coparti-cipao deste no pagamento dosservios. A literatura mostra quea utilizao desses mecanismos capaz de reduzir as perdas de bem-estar provocadas pelo risco moral.Adicionalmente, quanto maior fora cobertura, maior o estmuloao risco moral, produzindo um

    trade-offentre grau de coberturae risco moral.J o fenmeno da seleo ad-

    versa ocorre no caso em que asoperadoras no so capazes deconhecer perfeitamente o riscodos indivduos (a probabilidade deadoecimento) antes de aceit-losem sua carteira. Assim, caso aoperadora estabelea um preobaseado na mdia de risco des-

    1 Veja a Resoluo de Diretoria Colegiada da ANS n 39 de 2000 para maiores detalhes das modalidades.

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    ses indivduos teremos como re-sultado que os indivduos de nvelde risco superior mdia do mer-cado contrataro o plano de sa-

    de. Ao contrrio, aqueles indiv-duos com risco inferior ao riscomdio no aderem ao contrato,pois seria caro demais para eles.No final do processo apenas osindivduos com sade precriaparticipariam dos contratos, o queinviabilizaria a existncia do mer-cado privado diante da no pos-sibilidade de diluio dos riscosentre os seus consumidores. Em-piricamente, entretanto, diversosestudos demonstraram que naprtica este efeito muito reduzi-do ou inexistente: as empresas pro-curam reduzir a assimetria de in-formao que lhes desfavorvelatravs de, por exemplo, uma ava-liao individual do risco (ques-tionrios mdicos), pelo estabele-cimento de carncias e de contra-tos diversificados.

    Uma caracterstica interessanteno setor de servios mdicos quea responsabilidade pelo diagns-tico e, muitas vezes, pelo trata-mento uma tarefa que o pa-ciente delega ao mdico (ou den-tistas, hospitais etc.), em funoda assimetria de informao en-tre ambos. Quem compra no quem decide, na grande maioriadas situaes. Nesse contexto, ocorpo clnico e o mdico so osprincipais responsveis pelo di-recionamento do paciente dentrodo setor mdico-hospitalar, e o mdico quem determina emgrande parte a alocao dos re-cursos escassos do setor. Surge

    dessa forma a possibilidade decriao de demanda pelos seusprprios servios creditada, nova-mente, assimetria de informa-o entre o mdico e o paciente eentre o mdico e a operadora deplano. Tal fenmeno conhecidocomo induo de demanda pelaoferta. O mecanismo adotadopelas operadoras na remunera-o dos prestadores influencia di-retamente o comportamento des-tes com relao utilizao dos

    e incentiva a seleo adversa ao es-tipular regras para a precificaopor faixas etrias. Ao aumentar ascoberturas a cada dois anos o re-

    gulador estimula a utilizao des-ses procedimentos, e por mais quepossam ter recomendao cient-fica, acabam aumentando os pre-os dos planos. No caso dasfaixas etrias, como h uma re-gra que estabelece que a lti-ma faixa etria no pode cus-tar mais do que seis vezes a pri-meira, os preos dos planosacabam sendo caros para os jo-vens para subsidiar os mais ido-sos, incentivando a entradadaqueles com maior tendnciade utilizao.

    Como fruto da prpria expe-rincia humana com o objetivo defacilitar o processo de trocasnuma sociedade, o mercado, talqual o ser humano, no perfei-to. Entretanto, a utilizao do sis-tema de mercado tem sido a for-ma mais indicada para resolverdiversos problemas de alocaode recursos escassos a partir dointeresse pessoal e da coordena-o pelo sistema de preos, masest longe da perfeio. O mer-cado, tratado muitas vezes comose fosse um ser dotado de conhe-cimento e desejos, nada mais doque o conjunto de escolhas inde-pendentes realizadas por sereshumanos imperfeitos, mas que,na ausncia de distores, fun-ciona de forma superior ao ofere-cimento pblico estatal de bens eservios.

    Em que pese estarem as cha-madas falhas de mercado bem

    identificadas e com elevados in-centivos para sua autocorreo,a experincia mostra que a regu-lao que vem sendo implemen-tada no setor ultrapassa os limi-tes da regulao econmica, in-duzindo as empresas de planosde sade a oferecerem cobertu-ras amplas e serem cada vez maisresponsveis pelo resultado desua gesto assistencial. Nesse sen-tido, duas vertentes regulatriassero examinadas no sentido de

    servios. O sistema fee-for-ser-vice (pagamento por procedi-mento realizado) est associado induo de demanda, enquan-

    to outros mecanismos de remu-nerao, como pacotes, porexemplo, procuram reduzir tal in-centivo. Na prtica, o sistema deincentivos do setor leva a umaproduo exagerada de consul-tas, exames e internaes, o queno necessariamente acompanha

    o interesse do paciente, que aca-ba pagando a conta na forma demaiores mensalidades.

    3.2. Regulao

    Olhando de um prisma neo-clssico, o arcabouo regulatrioem mercados privados de sadedeveria se limitar a garantir aproduo de bens com grandesexternalidades positivas e, no limi-te, contribuir para se evitar o riscomoral e a seleo adversa, almde garantir direitos de propriedade.No Brasil, tais parmetros nuncaforam respeitados. Ao contrrio,a regulamentao incentiva o ris-co moral ao ampliar coberturas,

    Matria de Capa

    O setor de sadesuplementar est

    organizado, pelo lado daoferta, por um conjuntode relaes contratuais(formais ou informais)entre as operadorasde planos de sade,os prestadores de

    servios de assistnciamdico-hospitalar e

    odontolgica, a indstriade medicamentos e,

    finalmente, a indstriade materiais eequipamentos.

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    que elas ultrapassam a raciona-lidade econmica para interven-o no mercado e produzemcustos sociais elevados que, se fo-

    rem mantidos tendem a ser trans-mitidos s futuras geraes.

    3.2.1. Regulao de Preos

    O controle de preos demons-tra ser uma prtica to antigaquanto ineficiente. Datada pelomenos do Cdigo de Hamurabi(2000 a.c.),2 que controlou pre-os e salrios, teve seu apogeuna poca do Imperador Dio-cleciano que determinava simples-mente a pena capital para aque-les que ousassem elevar os seuspreos.3 Como resultado, tivemosa reduo da oferta no mercado.Por mais rigorosa que seja umalegislao restritiva, como noscasos acima mencionados, noh como revogar as leis da de-manda e da oferta.

    A teoria econmica moderna,longe de prescrever punies mor-tais como a do Imperador roma-no, capaz de identificar um con-junto de situaes em que a re-gulao dos preos pode ser efi-caz. Entretanto essas so poucas,e muito bem delimitadas situaes,como no caso de um monoplionatural.4 Nesse caso, como noexiste mercado para forar umareduo de preos aos nveis com-petitivos, a empresa monopolistase vale de seu poder de mercadopara cobrar preos de monop-lio. H quem defenda que mes-mo nesses casos, caso as barrei-ras entrada no mercado sejam

    suficientemente baixas a ponto decontestar o monoplio, a prpriapossibilidade de entrada eliminaa regulao de preos.

    Em mercados onde a compe-tio reduzida, ou seja, existem

    poucos competidores atuando, serecomenda, como poltica pbli-ca, a reduo das barreiras en-trada no mercado, algumas eco-

    nmicas e tecnolgicas e outrasde natureza regulatria, como for-ma de incentivar a competio einibir prticas anticompetitivas. a poltica de defesa da concorrn-cia monitorando a competionos mercados a partir do contro-le dos atos de concentrao, darepresso s prticas de cartel edemais condutas anticoncor-renciais.5

    Talvez mais importante do quebuscar argumentos que justifi-quem interveno pblica nos pre-os vale observar os seus efeitosreais no mercado como um bomindicador da qualidade da polti-ca. A proteo de 7,5 milhes deconsumidores de planos individu-ais resulta em ganhos reais debem estar para a sociedade? Pro-vavelmente para esses consumi-dores a poltica tenha sido ben-fica pois os preos pagos crescemmenos que os custos para os pla-nos. E os consumidores quepoderiam ter coberturas de pla-nos de sade, mas no possuemdevido ao aumento dos preosdos novos produtos? Possivel-mente o mercado ofereceriaprodutos ajustados demandana ausncia da regulao depreos e os consumidores, emsentido amplo, estariam emmelhor situao, pois o merca-do estaria funcionando mais li-vremente.

    A despeito da questo teri-ca, na prtica a regulao dos

    reajustes identificada comoimportante inibidor do cresci-mento do mercado dos planosindividuais e a intensificao doscontroles burocrticos da utili-zao dos planos.

    3.2.2. Rating deOperadoras

    Outra regulao, digamos,

    heterodoxa, a produo pelaANS do ndice de desempenho emsade suplementar (IDSS). O go-verno entendeu ser de responsa-bilidade da operadora o resulta-do final sobre a sade dos bene-ficirios, e cabe a ela perseguirformas de induo a um compor-tamento de qualidade dos seuscredenciados. O seu programa dequalificao segue esta lgicaonde a operadora uma gestora,no de recursos financeiros, masda sade dos seus beneficirios.

    Na prtica, o IDSS procuramedir o desempenho das opera-doras mediante a utilizao dediversos indicadores a fim deauferir os seus nveis de qualida-de. A partir da divulgao dessesdados sociedade, segundo aANS, os agentes econmicos po-dero superar a assimetria in-formacional e melhorar a capaci-dade de escolha. O processo deajustamento do mercado se da-ria no sentido de uma migraodos consumidores para as opera-doras de melhor qualidade, o queestimularia o lado da oferta a seadaptar a esse novo ambiente eintroduzir em suas funes-obje-tivos a melhoria da qualidadecomo forma de atrao e reten-o de clientes.

    No setor financeiro, por exem-plo, as agncias de rating produ-zem servios de avaliao sobrea qualidade de crdito e a proba-bilidade default. Na vida cotidia-

    na existem inmeros exemplos depublicaes que tambm ofere-cem o servio de avaliao de qua-lidade de restaurantes, hotis etc.No setor hospitalar existem enti-dades privadas que tambm pro-

    Matria de Capa

    2 O Cdigo de Hamurabi um dos mais antigos conjuntos de leis j encontrados, e um dos exemplos mais bem preservados desse tipo de documento da antiga Mesopotmia.O objetivo deste cdigo era homogeneizar o reino juridicamente e garantir uma cultura comum. No seu eplogo, Hamurabi afirma que elaborou o conjunto de leis paraque o forte no prejudique o mais fraco, a fim de proteger as vivas e os rfos e para resolver todas as disputas e sanar todos os ferimentos. Fonte: wikipedia.org

    3 Mises, L. As Seis Lies Instituto Liberal, 1998.4 O monoplio natural pode ser descrito como a estrutura de mercado onde a eficincia econmica alcanada com a presena de apenas uma nica empresa devido s

    caractersticas tecnolgicas de produo (elevados custos fixos e baixos custos marginais). Ex. Estaes de tratamento de gua, esgoto, redes de distribuio. Ainda que sejamonopolstica, nada indica que a empresa tenha que ser de capital pblico.

    5 Veja, por exemplo, W. Kip Viscusi, Joseph E. Harrington e John M. Vernon (2005) Economics of Regulation and Antitrust, 4th Ed. MIT Press.

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    duzem servios similares, como aOrganizao Nacional de Acredi-tao e o Consrcio Brasileiro deAcreditao. Os hospitais acredi-

    tados por essas instituies bus-cam voluntariamente a certifi-cao como uma comprovaode diferenciao da qualidadeprocurando com isso angariarmais clientes, melhores taxas definanciamento ou melhores con-dies de negociao.

    No caso da sade suplemen-tar a ANS se apropriou dessa ta-refa e, ao contrrio das demaisagncias reguladoras, que tenha-mos conhecimento, divulga notasde qualidade para as operadorasreguladas numa tentativa deinfluenciar a demanda e o com-portamento das prprias opera-doras, consequentemente.

    4. CONCLUSO

    A concluso a que chegamos que o setor de sade suplementarno teve sua regulao pautadapor critrios tcnicos de raciona-lidade econmica. Ao contrrio,grande parte da interveno p-blica se d no sentido de ampliara cobertura e a responsabilidadedo setor privado como se este fos-se pblico. O argumento prepon-derante da denominada econo-mia do bem-estar social est naassertiva de que cabe ao Estadoremediar as distores e falhasdos mercados, eliminando suasdeficincias. Toda a literatura sedesenvolveu no sentido de identi-ficar falhas no funcionamento dos

    mercados privados e, a partir des-se diagnstico, sugerir a partici-pao do Estado seja regulamen-tando, seja provendo diretamentebens pblicos. Essa escola de pen-samento pressupe que a aopblica sempre bem-sucedidana tarefa de eliminar falhas demercado, ou seja, os governos tmsucesso onde os mercados fa-lham e os recursos so alocadoseficientemente. Ledo engano.

    No setor de sade suplemen-tar os incentivos gerados sopreocupantes. O controle de rea-justes de preos, por exemplo, a

    despeito de proteger 7,5 milhesde consumidores, gera externali-dades negativas sobre os demaisconsumidores, que no acessamo mercado devido ausncia deoferta ou pelos preos majorados. Alm disso, algumas empresasque continuam a oferecer o pro-duto individual utilizam controlesestritos para conter a utilizao.Qual o custo social dessa polti-ca? H tambm um problemaintertemporal. Se as populaes

    jovens no aderirem aos planosde sade devido ao preo eleva-do (em comparao com a suapercepo de risco), como se dara sustentabilidade intergeracionaldiante do envelhecimento da po-pulao?

    Outra poltica abordada nesteartigo diz respeito ao ndice dequalidade adotado pela ANS.Alm de regular e fiscalizar, a ANSatribui notas segundo seus pr-

    prios critrios de performance nomercado. Vale lembrar que nemmesmo o SUS est sujeito atri-buio de notas pelo Ministrio da

    Sade. No longo prazo, cada vezmais o setor se submeter aoscomandos regulatrios sob o ris-co de ter seu maior ativo, sua re-putao, arranhada por critriossubjetivos e mutveis.

    Nossa concluso que o se-tor de sade suplementar de fatonada tem de suplementar ao se-tor pblico no sentido tcnico dovocbulo. Cada vez mais, a regu-lamentao, sob o pretexto deproteger o consumidor, vem intro-

    duzindo obrigaes e coberturasao setor privado que, em tese,seriam de responsabilidade dosetor pblico, sem a necessrialiberdade de reviso de preos.Trata-se, portanto, de um sistemade sade duplicado com redespblicas e privadas, mas que pelaideologia regulatria falta ofertaprivada onde h demanda. Noseria um bom momento para re-ver a regulamentao?

    Matria de Capa

    Nem mesmo o SUS est sujeito atribuio de notas pelo Ministrio da Sade.

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    m 2000, O embaixadorJos Vicente de S Pimentel,

    ento Diretor-Geral do Departa-mento de frica e Oriente Prxi-mo do Ministrio das Relaes Ex-

    teriores do Brasil, observou queos temas africanos tm entre nsuma trajetria peculiar. Suas re-percusses so episdicas e emo-cionais. Talvez por isso as percep-es mais difundidas sobre as re-laes do Brasil com o continenteafricano em geral oscilam entredois polos extremados, um deci-didamente nostlgico, outro ca-tastrfico.1

    O que mudou? A atual polti-ca externa brasileira tem entre

    suas prioridades o estreitamentodas relaes Sul-Sul. Nesse con-texto os pases africanos, em es-pecial os membros da Comunida-de dos Pases de Lngua Portu-guesa (CPLP), estariam entre osprioritrios. Qual a razo dessaprioridade? Que interesses na-cionais se refletem na expansodas relaes Sul-Sul, particular-mente com relao frica? Oque justifica hoje o interesse nabacia do Atlntico Sul na polticaexterna brasileira?

    PRIMRDIOS: UMADIGRESSONECESSRIA

    O incio do relacionamento da frica com a Europa assimdescrito por David Birmingham:Cerca de 1.488, BartolomeuDias, um navegador portugus,chegou ao Cabo da Boa Esperan-a, na ponta mais longnqua dafrica meridional. Esta foi a lti-ma fase da explorao portugue-

    Brasil e frica: uma nova etapa

    no relacionamento?Roberto Fendt

    O autor economista e vice-presidente licenciado do Instituto Liberal.Atualmente assessora o Ministro de Estado e da Coordenao Econmica de Angola.

    sa na costa atlntica e suas ilhas.Foi tambm o comeo de cincosculos de relaes muitas vezestensas entre a Europa e a fricameridional.2

    As razes para a busca de co-lnias ultramarinas estavam napobreza do pas e nas dificulda-des de transporte do interior dePortugal para o litoral. Diferente-mente de outros Estados contem-porneos, o fechamento do Me-diterrneo pela expanso turca

    teve pouco a ver com essa polticade expanso ultramarina.3 o queafirmou Celso Furtado na For-mao econmica do Brasil.

    O desenvolvimento econmicode Portugal no sculo XV a ex-plorao da costa africana, a ex-panso agrcola nas ilhas doAtlntico, e finalmente, a abertu-ra da rota martima das ndiasOrientais constitui um fenme-no autnomo na expanso comer-cial europia, em grande parte in-

    E

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    dependente das vicissitudes cres-centes criadas ao comrcio doMediterrneo oriental pela pene-trao otomana. A produo deacar na Madeira e So Tomalcanou seus pontos altos nasegunda metade do sculo XV,poca em que os venezianos ain-da conservavam intactas suas fon-tes de abastecimento nas ilhas doMediterrneo oriental. O mesmose pode dizer do comrcio dasespeciarias das ndias, pois a ocu-pao do Egito entreposto prin-cipal pelos turcos s ocorreuum quarto de sculo depois daviagem de Vasco da Gama.4

    A produo de acar no foi

    a primeira tentativa de Portugalde superar as limitaes da me-trpole com a expanso ultrama-rina.

    David Birmingham identificouseis fases da expanso portugue-sa na frica. A primeira comeoucom a colonizao dos Aores (apartir de 1420) e da Madeira (apartir de 1427), com o objetivode suprir de trigo a metrpole. Omodelo era o de plantations commo de obra suprida por colonosportugueses e escravos obtidosdas costas berberes. Procurava-secom isso minimizar os problemase custos de acesso de Lisboa aointerior de Portugal, alm das li-mitaes naturais do tamanho eda topografia do territrio.5

    A segunda fase envolveu a ten-tativa de estabelecer uma inds-tria vincola no ultramar, de formaa superar os problemas de trans-porte do vinho do Porto em umrio problemtico como o Douro.As ilhas Canrias foram o territrio

    escolhido para esse experimento.O sistema de explorao conti-

    nuava a ser uma combinao detrabalho livre vindo de Portugalcombinado com trabalho escra-vo, trazido de Tenerife.

    A terceira fase teve por cen-rio as ilhas de Cabo Verde (a par-tir de 1460). Agora, o objetivo erasuprir Portugal de algodo. Se-guindo o modelo das fases ante-riores, combinava mo de obracomprada no oeste do continen-te africano com artesos portu-gueses que transferiam a tecno-logia de tecelagem. Os tecidosproduzidos nas ilhas eram troca-dos no continente por mais escra-vos para a expanso da produo.

    Na quarta fase o alvo era a

    ilha de So Tom, ao largo do del-ta do Nger, iniciada em 1471. Lfoi introduzida pela primeira veza cana-de-acar, contando coma ampla oferta de escravos a par-tir dos entrepostos de So Jorgeda Mina e de Axim, no continente.Diferentemente dos experimentosanteriores, o acar exigia umagrande escala de produo, deforma a amortizar os investimen-tos em engenhos e alambiques.Era tambm a cultura mais ade-quada para uma economia escra-vagista, dadas as demandas portrabalho intenso nas pocas decolheita.

    A quinta fase deu-se com aexplorao mineira. Os escravosdas plantations nas ilhas do Atln-tico foram transferidos para asminas de ouro no continente, pas-sando as ilhas a funcionar comoentrepostos de escravos.

    Finalmente, na ltima fase desua expanso colonial, em Ango-la deu-se um experimento diver-

    so. Ali, os portugueses tentaramum modelo de colonizao em

    terra firme e em parceria com osnativos. Nessa colnia, todo tipode comrcio interessava aos co-lonizadores portugueses; a com-pra de escravos era apenas umaentre essas atividades. De resto,j a partir de 1441 o comrciode escravos havia se tornado suaprincipal atividade.

    A partir da dcada de 1570evidenciou-se a impossibilidade daescravido dos indgenas no Bra-sil e iniciou-se o trfico de escra-vos africanos para a colnia ame-ricana. Por mais odioso que sejadiz-lo, a rentabilidade do investi-mento em escravos africanos eraalta. Na primeira metade do s-

    culo XVII o pay back nesse inves-timento macabro era de 13 a 16meses. Em razo disso, estima-seque entre 1550 e 1855 cerca dequatro milhes de escravos afri-canos foram levados ao Brasil.6

    No sculo XVI a principal ori-gem dos escravos eram as costasda Guin e da Mina. A partir dosculo XVII a origem desloca-separa o Congo e Angola. Os por-tos de embarque so Cabinda,Luanda e Benguela. No sculoseguinte, estima-se que 70%dos escravos provinha de Ango-la. O pagamento pelos escravosnas praas de destino, Salvadorou Rio de Janeiro, era feito oucom aguardente de cana e tirasgrossas de tabaco curado commelao.7

    INTRUSOSNO ATLNTICO SUL

    O sucesso do modelo de colo-nizao portuguesa e as riquezasgeradas com o trabalho escravo

    nas plantations de cana e nasminas de ouro de prata, nos im-

    Internacional

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    Cerca de quatro milhes de escravosafricanos foram levados ao Brasil.

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    prios portugus e espanhol atraiu outros Estados europeuspara o Atlntico Sul.

    Primeiro vieram os franceses.Em 1555-1560 se estabelece-ram no Rio de Janeiro, e em 1612-1615 em So Luiz, no Maranho.Foram expulsos, como se sabe.

    Depois vieram os holandeses.Se o perodo entre 1637 e 1644foi de paz sob o governo de Mau-rcio de Nassau, o perodo entre1645 e 1654 a reconquista foi de guerra. Em 1654 os ho-landeses capitularam. Durantesua permanncia no Brasil os ho-landeses procuraram mater os flu-xos de escravos africanos. Para

    isso, os holandeses ocuparamLuanda e Benguela, em Angola,em 1641.

    Salvador Correia de S e Bene-vides, que em 1625 combateu osholandeses na defesa da Vila doEsprito Santo e na reconquista dacidade do Salvador, na Bahia, co-mandou as foras que em 1647expulsaram os holandeses deLuanda. Como que explicitando oestreito relacionamento entre ascolnias brasileira e africana, Sal-vador Correia de S e Benevidesfoi Governador da Capitania doRio de Janeiro entre 1637 e1642, Governador-geral da An-gola portuguesa em Luanda en-tre 1648 e 1652, e novamentegovernador do Rio de Janeiro en-tre 1659 e 1660. Joo FernandesVieira e Andr Vidal de Negreirostambm participaram da adminis-trao da Luanda restaurada.

    Novos desenvolvimentos trou-xeram outros europeus para oAtlntico Sul. O ouro foi desco-

    berto em Minas Gerais por voltade 1700, e em 1710 o corsriofrancs Charles Duclerc atacou oRio de Janeiro, e logo depois foi avez do almirante Duguay-Trouinsaquear a cidade.8

    Pela poca da independnciaa Inglaterra j substitura h mui-to Portugal como a grande potn-cia colonial. Desde a metade dosculo XVIII a Inglaterra j inicia-ra sua Revoluo Industrial, cujosfundamentos foram descritoscom maestria por Adam Smith.9

    Preocupados em assegurarsuas rotas para a ndia e com aabertura ao comrcio para suasmanufaturas, a marinha realbri-tnica restringiu progressivamen-te o trfico de escravos no Atln-tico Sul. Em 1823, com o enfra-quecimento do imprio portu-gus, soldados e colonos de Ben-guela promoveram uma rebelioseparatista. Os rebeldes procla-maram o desejo de formar umaconfederao com o Brasil, aConfederao Braslica, com oobjetivo de manter o trfico deescravos entre os dois lados doAtlntico.10 O comrcio entre Sal-vador, Bahia, e o Golfo da Guin,

    e entre o Rio de Janeiro e Luanda,definhava.

    O IMPRIO,AS RELAESBRASIL-FRICA, E DEPOIS

    A contestao britnica su-premacia de Portugal, e depois doimprio do Brasil, nas rotas doAtlntico Sul, consolidou-se coma progressiva reduo do trficonegreiro entre a costa africana eo Brasil, e com a abertura do ca-nal de Suez em 1837. O golpefinal se daria com a abertura docanal do Panam em 1914. OAtlntico Sul, aos poucos, no lon-go sculo XIX que termina em1914, se tornando um vazio soba gide da Pax Britannica.11

    Encerrado o trfico, com aperda de significado econmicodo Atlntico Sul, paulatinamentedefinha o relacionamento do Bra-sil com a frica. O predomnio daRoyal Navy na regio, assegura-do pelo Acordo de Simonstown de

    1955 com a frica do Sul, somen-te seria questionado pela Argenti-na, com trgicas consequnciasna Guerra das Malvinas (Falk-lands).12

    A Guerra Fria cristalizaria oespao do Atlntico Sul como re-serva estratgica do Ocidente.13Restava pouco para basear obje-tivamente um relacionamento en-tre o Brasil e a frica, exceto a his-tria, a tradio e uma indefinidaprojeo dos interesses estratgi-cos em torno de um espao re-

    gional dos pases da regio, nota-damente Brasil, Argentina e fri-ca do Sul.

    Iniciativas isoladas, como apoltica externa independente (PEI)de San Tiago Dantas e do chan-celer Arajo Castro, no tiveramconsequncias duradouras. A PEIteve resultados mais concretos, nocampo poltico, com o chamadoecumenismo do governo dospresidentes Ernesto Geisel e JooBaptista Figueiredo. O presidenteSarney e o chanceler Abreu Sodrprocuraram consolidar os ganhosdiplomticos com a realizao daPrimeira Cpula dos PasesLusfonos e a criao do Institu-

    to Internacional de Lngua Portu-guesa.Ainda no campo poltico o Bra-

    sil condenou explicitamente a po-ltica do apartheid sul-africano eimps sanes econmicas aopas. Ainda por iniciativa brasilei-ra, em 1986 resoluo da ONUaprovou a declarao de Zona dePaz e Cooperao do Atlntico Sul(ZOPACAS), com o objetivo depromover o uso pacfico do Atln-tico Sul pelos Estados ribeirinhos.

    Eram tempos de descolo-nizao (iniciada nas dcadas de1950-60 e concluda em 1975na frica portuguesa) e redemo-cratizao, a ltima nos dois la-dos do Atlntico. Um novo mar-co na nova poltica externa brasi-leira com relao frica foi acriao da Comunidade dosPases de Lngua Portuguesa(CPLP). Expandiu-se a rede de re-presentaes diplomticas doPas, a um tempo em que o n-mero de misses diplomticas

    africanas em Braslia passou de16 (em 2003) para 24.No campo econmico, em-

    preiteiras brasileiras comearama participar em obras de infra-estrutura viria, urbana e ener-gtica em Angola e em outrospases da regio. Essa presena,com apoio creditcio do governobrasileiro, enfatizou a inteno deampliar a insero internacionaldo Brasil. O objetivo de nossa di-plomacia era colocar a frica nocentro da afirmao brasileira de

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    potncia regional. Justificandoesse intento, criou-se um novoconceito de vizinhana: a fron-teira oriental do outro lado doAtlntico Sul.

    A principal motivao para aZopacas era o jogo diplomticoem tempos de Guerra Fria. O fimdesse perodo retirou a maior partedo contedo dessa iniciativa. Ecom ela modificou-se tambm aagenda da cooperao regional,que passa a privilegiar o espaogeogrfico dos pases vizinhos naAmrica Latina.

    O fim da Guerra Fria d tam-bm nova configurao ao Con-selho de Segurana. Reunidas ali

    as superpotncias que agora jsuperaram muitas de suas rivali-dades e passam a agir de formamais concertada nos conflitos desuas periferias, reduz-se mais ain-da a importncia dos arranjos re-gionais no Atlntico Sul. 14

    O CRESCIMENTODOCOMRCIO BILATERAL

    A atual administrao enfatizaa prioridade do relacionamentohorizontal Sul-Sul e, dento dele,

    com a frica em particular. Ocrescimento do comrcio tem sidoapontado como o motor do novorelacionamento, desde que a ini-ciativa da Zopacas perdeu muitode sua consistncia como promo-tor da coordenao poltica daZona.

    Mais importante passou a sera iniciativa de conformao deblocos econmicos regionais oMercosul, em um dos lados doAtlntico, e a SADC do outro.15

    A busca de cooperao entre ospases-membros desses dois blo-cos substitui em larga medida asboas intenes de coordenaopoltica da Zopacas, cujos resul-tados prtico ficaram aqum dodesejado.

    Isso no quer dizer que as ini-ciativas polticas tenham sido des-providas de resultados. Coerentecom a inteno de promover a paze a cooperao no Atlntico Sul,o Brasil condenou o apartheid nafrica do Sul e imps sanes ao

    pas. O Brasil foi tambm o pri-meiro pas a reconhecer a inde-pendncia de Angola, em 11 deNovembro de 1975. E, em 20 denovembro de 1994, para apoiaro Acordo de Paz assinado em Lu-saca, tropas brasileiras integra-ram as foras de manuteno depaz da ONU, a UNAVEM III, nototal de sete mil homens, junta-mente com tropas da ndia,Romnia e Zimbabue.

    que a corrente de comrcio au-mentou a uma taxa mdia anualde 23,8%. O valor da corrente decomrcio aumentou quase 11,5vezes, passando de US$ 1,5bilho em 1989 para US$ 17,2bilhes em 2009. As exporta-es brasileiras para o continentecresceram muito mais rapidamen-te que as exportaes do Paspara outros destinos, acumulan-do uma taxa mdia de crescimen-to de 11% ao ano. O crescimentodas importaes foi ainda maisexpressivo, acumulando cresci-mento mdio anual de 14,3%ao ano.

    Considerados os 20 anos de

    comrcio aqui cobertos (1989-2009), nossas trocas com a fri-ca revelaram um saldo negativoacumulado de US$ 14,5 bilhesnominais. Esse saldo foi positivoentre 1989 e 1995 (US$ 2,3 bi-lhes). Tornou-se negativo a par-tir de ento, acumulando umdeficit de US$ 17 bilhes entre1986 e 2009, com particular ex-presso nos ltimos dois anos(US$ 8,4 bilhes).

    Por esse indicador singelo, ocomrcio Brasil-frica cresceumais acentuadamente que o co-mrcio com os demais parceiros.Essa concluso, contudo, deve serconsiderada com uma pitada decautela, j que ela ignora a com-posio do nosso comrcio e aimportncia do petrleo em nos-sas importaes em boa parte doperodo aqui considerado.

    O FUTURO: CHEGARAMOS CHINESES

    At aqui nos detivemos na an-lise dos fluxos de comrcio entreo Brasil e seus parceiros africanos.Para avaliar at que ponto a sim-ples extrapolao das tendnciasrecentes pode ser equivocada, tor-na-se necessrio introduzir umnovo ator no palco do comrciobilateral: os chineses.

    As construtoras chinesas tmpenetrado agressivamente emtoda a frica, deslocando antigosfornecedores desses servios,como as construtoras chinesas, e

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    A PROVA DO PUDIM:ASRELAES COMERCIAIS

    BRASIL-FRICA

    Entre 1989 e 2009 a corren-te de comrcio brasileira cresceua uma taxa mdia de 7,6%

    ao ano, passando de US$ 52,6bilhes para US$ 280,6 bilhes.As exportaes totais do Pas cres-ceram a uma taxa mais modesta,de 6,4% ao ano. J as importa-es aumentaram a uma taxamdia de 9,4% ao ano, recupe-rando nesse perodo de 20 anosas dcadas de forte represso quecaracterizou o comrcio exteriorbrasileiro antes da abertura daeconomia.

    Os mesmos clculos para ocomrcio Brasil-frica mostram

    As construtoraschinesas tm

    penetrado agressi-vamente em toda africa, deslocando

    antigos