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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS - MAPP
RITA DE CÁSSIA ARAÚJO
O PROGRAMA SAÚDE DO ADOLESCENTE – PROSAD E A LEI 12.015/09:
UMA AVALIAÇÃO DOS PROFISSIONAIS ENVOLVIDOS
FORTALEZA
2017
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RITA DE CÁSSIA ARAÚJO
O PROGRAMA SAÚDE DO ADOLESCENTE - PROSAD E A LEI 12.015/09:
UMA AVALIAÇÃO DOS PROFISSIONAIS ENVOLVIDOS
Dissertação apresentada à Banca do programa
de Mestrado em Avaliação de Políticas
Públicas - MAPP da Universidade Federal do
Ceará - UFC, como requisito parcial a
obtenção do grau de Mestre em Avaliação de
Políticas Públicas.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Américo Leite
Moreira
FORTALEZA
2017
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RITA DE CÁSSIA ARAÚJO
O PROGRAMA SAÚDE DO ADOLESCENTE - PROSAD E A LEI 12.015/09:
UMA AVALIAÇÃO DOS PROFISSIONAIS ENVOLVIDOS
Dissertação apresentada à Banca do programa
de Mestrado em Avaliação de Políticas
Públicas - MAPP da Universidade Federal do
Ceará - UFC, como requisito parcial a
obtenção do grau de Mestre em Avaliação de
Políticas Públicas.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Américo Leite
Moreira
Aprovada em: ______/ ______/ 2017.
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________
Prof. Dr. Carlos Américo Leite Moreira (Orientador)
Universidade Federal do Ceará (UFC)
___________________________________________
Prof.ª. Drª. Linicarla Fabiole de Souza Gomes
Faculdade Metropolitana da Grande Fortaleza (FAMETRO)
__________________________________________
Prof. Dr. Gil Célio de Castro Cardoso
Universidade Federal do Ceará (UFC)
4
A Deus, meu auxílio e refúgio em tempo de
tribulação. Aos meus pais, saudades e conforto
de um reencontro eterno.
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por toda a sua fidelidade por não me deixar cair nas tribulações,
mesmo nos momentos mais difíceis: Tu és o meu refúgio e a minha fortaleza, meu Deus, em
quem confio.
Agradeço ao meu pai Orlando Oliveira e a minha mãe Maria Edilce, que não estavam
presentes em corpo, mas em meu coração e mente. Quando obtive a aprovação no mestrado,
se estivessem ainda nesta Terra, teriam ficado orgulhosos pelo feito. Pessoas de qualidades
raras e que merecem todo o meu apreço e dedicação.
Minha gratidão aos meus amados irmãos, companheiros inseparáveis, refúgio e
fortaleza nas angústias.
Agradeço ao meu orientador Prof. Dr. Carlos Américo por sua paciência e por me
ajudar a dirimir as dúvidas deste trabalho.
Agradeço as funcionárias do Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas (MAPP),
Vânia e Katiane, pelo auxílio prestado.
Agradeço a professora Dra. Linicarla Fabiole, amiga e professora dedicada, por me
tirar dúvidas e prestar socorro em alguns momentos neste trabalho e pelas importantes
contribuições a esta pesquisa. E ao professor Dr. Gil Célio, pela disponibilidade em participar
da banca: o meu obrigada.
Agradeço aos colegas que fiz durante o mestrado, pessoas de bem e que procuraram
ter um espírito de equipe sempre ajudando uns aos outros.
Aos profissionais da saúde, que trabalham na Maternidade Escola, que se
disponibilizaram em participar desta pesquisa.
6
“É que, para não ser um ato de violência
contra o cidadão, a pena deve ser
essencialmente pública, pronta, necessária, a
menor das penas aplicáveis nas circunstâncias
dadas, proporcionada ao delito e determinada
pela lei”. (Cesare Beccaria, Dos Delitos e das
Penas, 1764, p. 107).
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RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar a execução da lei de estupro de vulneráveis e
da atenção integral à saúde de adolescentes e jovens. Este estudo foi analisado sob a ótica dos
profissionais da saúde, em uma maternidade de referência, verificando o que a lei 12.015, de
07 de agosto de 2009, trouxe de novo. Não só para a sociedade em geral (através da mudança
comportamental, diante do diploma jurídico, instituído pela mesma), mas com objetivo de
apresentar uma reflexão acerca da vulnerabilidade retratada no artigo 217-a, caput, do Código
Penal Brasileiro. Assim, foi realizada uma breve discussão sobre a presunção relativa e
absoluta do dispositivo, bem como foram apontadas direções que levaram tal discussão a uma
compreensão da relativização, por alguns doutrinadores, da vulnerabilidade da vítima maior
de 12 e menor de 14 anos. A pesquisa teve como enfoque os profissionais da área da saúde,
que lidam com adolescentes com o perfil acima mencionado, em uma maternidade pública de
Fortaleza. Trabalhamos com a pesquisa descritiva por entendermos que, em suas diversas
formas, a mesma atua sobre dados ou fatos colhidos da própria realidade, não interferindo nos
mesmos. Para a operação de coleta utilizou-se como principal instrumento a aplicação de
entrevistas semiestruturada, com perguntas direcionadas ao objeto de estudo, que nos
ajudaram a conhecer a opinião dos pesquisados, seus pensamentos e sentimentos. Os
objetivos específicos desse estudo foram: verificar a compreensão dos profissionais sobre a
Política de Atenção Integral à Saúde dos adolescentes e jovens e a lei de estupro de
vulnerável; identificar como a equipe multiprofissional compreende o dispositivo penal que
versa sobre estupro de vulneráveis; verificar possíveis conflitos enfrentados pelos
profissionais para o cumprimento da lei; identificar fluxos e encaminhamentos da instituição
para o cumprimento do dispositivo penal. Como resultado do nosso trabalho constatamos ser
necessário um urgente alerta para se criar meios eficientes e específicos de atendimento às
jovens grávidas, de forma integral, abordando aspectos físicos, psicológicos e sociais,
envolvendo e dando suporte às famílias, de forma a amenizar os impactos e as pressões
causadas por essa nova situação, garantindo à jovem o direito de ter sua sexualidade
garantida, tranquila e saudável.
Palavras-chave: Abuso de vulnerável. Profissional da saúde. Direito. Política Pública..
Presunção relativa e absoluta.
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ABSTRACT
The present study aims to analyze the implementation of the law of rape of vulnerable and
comprehensive health care of adolescents and young people, from the perspective of health
professionals, in a reference maternity, verifying what law 12.015, of 07 August 2009 brought
again, not only for society in general through behavioral change, before the legal diploma,
instituted by it; but with the purpose of presenting a reflection about the vulnerability
portrayed in article 217-a, caput of the Brazilian Penal Code, making a brief discussion about
the relative and absolute presumption of the device, as well as pointing the directions that led
such discussion to an understanding of the relativization, by some of the doctrinaires, of the
vulnerability of the victim over 12 and under 14; the research focused on health professionals
who deal with adolescents with the profile mentioned above in a public maternity hospital in
Fortaleza. We work with the descriptive research, because we understand that in its various
forms, it works on data or facts taken from reality and does not interfere with them. In order
to enable this important collection operation, it was used as the main instrument, application
of semi structured interviews, with questions directed to the object of study, which helped us
to know the opinion of the respondents, their thoughts and feelings. The specific objectives of
this study were: to verify the professionals' understanding of the Comprehensive Health Care
Policy for adolescents and young people and the law of rape of the vulnerable; identify how
the multiprofessional team understands the penal device that deals with rape of vulnerable;
verify possible conflicts faced by professionals for compliance with the law; identify flows
and referrals of the institution to comply with the penal system. Finally, there is an urgent
need to create efficient and specific means of attending to pregnant young women, in a
comprehensive way, addressing physical, psychological and social aspects, involving and
supporting families, in order to mitigate the impacts and the pressures caused by this new
situation, guaranteeing the girl the right to have her sexuality guaranteed, quiet and healthy.
Keywords: Abuse of vulnerable. Health professional. Right. Public policy. Relative and
absolute presumption.
9
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Notificações ao Conselho Tutelar, distribuídos por ano ............................ 101
Quadro 2 – Percepção dos profissionais, frente à notificação compulsória ao
Conselho Tutelar. Fortaleza, 2017 .............................................................
102
Quadro 3 – A lei 12.015/09 veio para proteger os menores de 14 anos dos crimes de
pedofilia, em sua opinião: se uma menor de 14 anos tiver relação sexual
com uma pessoa maior de 18 anos, sem violência, essa ação deveria ser
criminalizada, por quê? Fortaleza, 2017....................................................
110
Quadro 4 – Respostas dos profissionais acerca da lei 12.015/09. Fortaleza, 2017....... 111
10
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Distribuição dos profissionais segundo a realização de treinamento para
cuidado da criança e adolescente. Fortaleza, 2017 ....................................
92
Gráfico 2 – Apresentação das ações desempenhadas pela MEAC para programar as
políticas públicas para jovens e adolescentes segundo os participantes
do estudo. Fortaleza, 2017..........................................................................
98
Gráfico 3 – Notificação compulsória ao Conselho Tutelar. Fortaleza, 2017................. 106
Gráfico 4 – Dever profissional. Fortaleza, 2017........................................................... 117
11
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Distribuição da caracterização dos sujeitos da pesquisa. Fortaleza,
2017...........................................................................................................
89
12
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
BIRD Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento
CEP Comitê de Ética e Pesquisa
CF Constituição Federal
CLT Consolidação das Leis do Trabalho
CP Código Penal
CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
COFINS Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
CONAES Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior
CNS Conselho Nacional de Saúde
CPMI Comissão Parlamentar Mista de Inquérito
DST Doença Sexualmente Transmissível
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica
GM Gabinete Ministerial
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
LOAS Lei Orgânica da Assistência Social
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MAPP Mestrado Profissional em Avaliação de Políticas Públicas
MEC Ministério da Educação e Cultura
MEAC Maternidade Escola Assis Chateaubriand
MS Ministério da Saúde
MJ Ministério da Justiça
ONU Organização das Nações Unidas
OMS Organização Mundial da Saúde
PDE Plano de Desenvolvimento da Educação
PLS Projeto de Lei do Senado
PNAD Pesquisa Anual por Amostra de Domicílios
PROSAD Programa Saúde do Adolescente
SAM Assistência ao Menor
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STJ Superior Tribunal de Justiça
SUS Sistema Único de Saúde
SINASC Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos
SINASE Sistema Nacional Socioeducativo
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância
UNFPA Fundo de População das Nações Unidas
UFC Universidade Federal do Ceará
14
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 19
2 ABUSO DE VULNERÁVEL: UMA LEGISLAÇÃO DE CRENÇAS SILENCIOSAS ...... 34
2.1 Vulnerabilidades e suas definições à luz da Lei nº 12.015/09 .............................................. 39
2.2 Sexualidades x Estupro de Vulnerável x Preconceitos .......................................................... 42
2.2.1 Os direitos da criança e do adolescente à luz da Constituição Federal de 1988 e a lei
8.069 de 1990 ........................................................................................................................ 44
2.2.2 Adolescentes e jovens como sujeitos de direito .................................................................... 45
2.3 Idade do consentimento e idade cronológica ......................................................................... 54
2.3.1 O direito penal mínimo .......................................................................................................... 57
2.4 Métodos e tipos de interpretação da norma .......................................................................... 58
3 PROGRAMA SAÚDE DO ADOLESCENTE (PROSAD): TEXTOS E CONTEXTOS ..... 61
3.1 Marco legal como consolidador de direitos ........................................................................... 68
3.2 O histórico da política pública do Brasil a partir da nova ordem constitucional ................... 71
3.3 Do PROSAD x Lei 12.015/09 ............................................................................................... 79
3.4 Contextos familiares e a contribuição da equipe multidisciplinar na execução das políti
cas de proteção à criança e ao adolescente ............................................................................ 85
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES ......................................................................................... 88
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 121
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 129
APÊNDICE A – CRONOGRAMA ..................................................................................... 138
APÊNDICE B – QUADRO DE NOTIFICAÇÕES AO CONSELHO TUTELAR, DIS
TRIBUÍDOS POR ANO ...................................................................................................... 139
APÊNDICE C – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .............. 140
APÊNDICE D – ORÇAMENTO ........................................................................................ 141
APÊNDICE E – INSTRUMENTO DE COLETAS DE DADOS ....................................... 142
ANEXO A – CARTA DE ANUÊNCIA ............................................................................... 146
ANEXO B – NESAR .......................................................................................................... 147
ANEXO C – DECLARAÇÃO DE CONCORDÂNCIA ..................................................... 148
ANEXO D – TERMO DE COMPROMISSO PARA UTILIZAÇÃO DE DADOS DE
PRONTUÁRIOS MÉDICOS .............................................................................................. 149
ANEXO E – FOLHA DE ROSTO ...................................................................................... 150
ANEXO F – TERMO DE FIEL DEPOSITÁRIO ............................................................... 151
19
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho trata sobre a análise e execução da lei de estupro de vulneráveis e sua
aplicação, bem como das relações com o Programa Saúde do Adolescente (PROSAD), sob a
ótica dos profissionais da saúde, que prestam atendimento a menores de 14 anos grávidas, na
Maternidade Escola Assis Chateaubriand (MEAC), situada no município de Fortaleza. A
pesquisa começou no início de novembro de 2016 e estendeu-se até maio de 2017.
A investigação tem o compromisso de observar a execução do trabalho dos
profissionais da saúde, na referida instituição, onde em suas práticas diárias estão envolvidos
o enfrentamento às violências que se materializam em nível e contexto particulares do setor
saúde, especificamente, as questões inerentes à lei, que trata do crime de abuso de vulnerável.
A lei 12.015, criada em 07 de agosto de 2009, veio para modificar de forma
significativa o Título VI da parte especial do Código Penal Brasileiro, especificamente, no
que tange em seu artigo 217-A.1 Essa alteração veio com o objetivo de colocar a dignidade da
pessoa humana em um patamar mais elevado por tratar e combater as diversas espécies de
violência sexual. Essa modificação refletiu na política pública de atenção integral à saúde do
adolescente e jovem, iniciada pelo PROSAD, formulada na década de 1980, logo após a
promulgação da Constituição Brasileira em 1988.
Trabalhar a gravidez na adolescência não é algo novo no histórico brasileiro. Com o
advento de recursos para o armazenamento de dados, diante do aparelhamento estatal, pode-se
mensurar com maior precisão os números de partos, as faixas etárias e a frequência que os
mesmos acontecem através dos bancos de dados das instituições hospitalares em todo o país,
e a melhora da acessibilidade por parte dos meios de comunicação e da população em geral.
A gravidez na adolescência hoje é considerada um problema de saúde pública,
segundo nos mostra os dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), sobre
adolescentes e jovens brasileiros. Onde se constata que, segundo Reis (2012), 32,8% de
adolescentes com a idade na faixa etária de 12-17 anos são ativos sexualmente. Deste
percentual, 61% são do sexo masculino e 39% do sexo feminino; estas com média de idade da
primeira envergadura sexual, variando entre 15-16 anos e variando um pouco entre os
meninos entre 13-15 anos.
Esse problema não é novo – apenas o seu conceito – e, ao longo dos anos, tornou-se
reprovável. É preciso recordar que o casamento precoce no cenário brasileiro em séculos
1 Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: pena-reclusão, de 8
(oito) a 15 (quinze) anos.
20
passados era visto de forma natural em sua época. Vejamos:
[...] submeter-se, sem contestação ao poder do patriarca, aliando a ignorância uma
imensa imaturidade. Casavam-se, via de regra, tão jovens que aos vinte anos era
praticamente consideradas solteironas. Era normal que aos quinze anos a mulher já
estivesse casada e com um filho, havendo muitas mães que se tornavam mães aos
treze anos. Educadas em ambiente rigorosamente patriarcal, essas meninas-mães
escapavam ao domínio do pai para, com o casamento, caírem na esfera de domínio
do marido. (SAFFIOTI, 1979, p. 168).
Tais percepções nos levaram a querer pesquisar sobre o assunto pelo crescente
volume de notificações aos Conselhos Tutelares do Município de Fortaleza, em torno de
69,5% dos casos atendidos, entre ambulatório e o setor assistencial. Isso segundo dados
estatísticos do ambulatório de adolescentes da instituição pesquisada (EPINFO, 2017).
Em 2006, das 333 adolescentes entre 12 e 18 anos atendidas no pré-natal, 81 tiveram
o início da vida sexual antes dos 14 anos (EPINFO, 2017). Fazendo um cotejo de 2006 até o
mês de julho de 2016, das 207 adolescentes – entre 12 e 18 anos atendidas no corrente ano,
com vida sexual ativa –, 91 eram menores de 14 anos, totalizando 43%. O que podemos
observar é que em 10 anos esse número quase que duplicou.
Podemos considerar esses números maiores, diante do atendimento do ambulatório
de adolescentes Infanto-Puberal, pois estamos apenas falando de pacientes gestantes. O
serviço também oferece a parte de ginecologia e, nestes dados, excluímos as pacientes
atendidas nesta especialidade, além dos números subnotificados, pois se somássemos as duas
áreas, com certeza teríamos um número maior. Portanto, deste contexto, poderíamos concluir
que, segundo a lei vigente, todos esses parceiros deveriam estar sofrendo ação penal
incondicionada2 ou medida socioeducativa.
3
Assim, por entender que a educação permanente das equipes de saúde constitui um
elemento-chave para a garantia, promoção e fortalecimento das políticas de saúde pública e
por trabalhar em um ambulatório específico para criança e adolescentes, que atende um
público de 0 aos 18 anos, no Município de Fortaleza, duas questões foram determinantes para
a escolha dessa temática. A primeira que está associada às inquietações do fazer diário, onde
vivenciamos na crescente demanda de gravidezes entre a faixa etária de 12 a 14 anos e a
procura de pré-natal, dados esses que foram chancelados pelo IBGE em seu último censo. A
2 É a ação que deve ser iniciada pelo Ministério Público mediante a apresentação da denúncia ao Judiciário,
independentemente de qualquer condição, ou seja, não é preciso que a vítima ou outro envolvido queira ou
autorize a propositura da ação. 3 Medidas socioeducativas são medidas aplicáveis a adolescentes autores de atos infracionais e estão previstas no
art. 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Apesar de configurarem resposta à prática de um delito,
apresentam um caráter predominantemente educativo e não punitivo.
21
segunda questão: estar cursando uma disciplina do curso de Direito específica para Crianças e
Adolescentes, despertando o interesse pela temática relacionada ao crime de abuso de
vulnerável.
A redação do dispositivo penal trouxe uma nova tipificação penal4: a descrição de um
fato ilícito em um código ou lei e que, portanto, implica a cominação de uma pena, que veio
de encontro com o cotidiano das equipes que fazem atendimentos às menores de 14 anos.
Essa perspectiva, a partir desse novo olhar, fez-nos repensar no Dever Ser profissional 5, ou
seja, a partir do dispositivo apresentado toda menor de 14 anos, atendida no ambulatório ou
em qualquer dependência da Maternidade Escola, deveria ser notificada ao Conselho Tutelar.
Adicionada a discussão do novo enxerto no Código Penal, na referida disciplina do
Curso de Direito, a norma em questão nos chamou a atenção, conduzindo-nos a avaliar
criticamente sobre os impactos, obstáculos e fragilidades geradas pelo novo dispositivo,
diante aos objetivos da política pública, especificamente, na área da saúde sexual e
reprodutiva para adolescentes e jovens atendidos em instituições hospitalares, no Brasil. Desta
forma, entendemos que a política pública de saúde reprodutiva e sexual – destinada aos
adolescentes e jovens, com o advento da lei posta no Código Penal em 2009 – deveria ter
melhorado o patamar da gravidez precoce no nosso país entre menores de 14 anos.
Diante dessa exposição, como os profissionais da área da saúde poderão trabalhar
essa questão? A lei obriga a notificação compulsória6, mas, por outro lado, temos que avaliar
os vínculos gerados com as adolescentes grávidas em uma consulta de pré-natal. Só assim
teremos a certeza do seguimento ininterrupto do mesmo, garantindo o estreitamento dos laços
entre a equipe multiprofissional, ganhando a assistência familiar sem quebra de vínculos e
prevenindo, além de outras doenças, o trabalho de parto prematuro.
Essas indagações ainda estão longe de serem respondidas, mas cabe à sociedade civil
exigir estas respostas ao Poder Público: não adianta fazer leis mais rígidas se o Estado não
tem como dar conta dos seus desdobramentos.
4 Conjunção carnal refere-se à introdução do pênis na vagina. A intromissão pode ser completa ou incompleta,
pouco importa. Também é irrelevante que ocorra ou não a ejaculação. (...). Ato libidinoso é toda manifestação
física que tem por objetivo satisfazer a lascívia (coito oral, anal, vulvar, inter femura, introdução de dedos ou
objetos na vagina, no anus, contato das mãos com o corpo, lambidas etc.). É fundamental que exista efetivo
contato corporal com a vítima, sem o que, não há falar em estupro. (FUHER, 2009). 5 Definimos como: o que vem primeiro? A atuação do profissional ou o dever imposto pelo Estado juiz.
6 Uma informação emitida pelo Setor Saúde ou por qualquer outro órgão ou pessoa, para o Conselho Tutelar,
com a finalidade de promover cuidados sociossanitários voltados para a proteção da criança e do adolescente,
vítimas de maus-tratos. O ato de notificar inicia um processo que visa a interromper as atitudes e
comportamentos violentos no âmbito da família e por parte de qualquer agressor.
22
Tal temática justifica-se por ser importante estarmos diante de uma problemática
social de grande relevância. Inclui, ainda, a possibilidade do estreitamento ou o alargamento
da relação dos profissionais, que estão inseridos no contexto do pré-natal, com a saúde
obstétrica da mãe/bebê.
Pelo complexo e de difícil entendimento para a seara jurídica, que, sem querer, a
equipe, está inserida devido ao atendimento diário a menores de 14 anos, grávidas, com seus
dilemas pessoais, sensos comuns, códigos de ética e suas responsabilidades perante o
ordenamento jurídico brasileiro. Isso porque a relação sexual entre essa faixa etária, mesmo
consentida, é crime, segundo o artigo apresentado.
Nesse cenário, quando notificado o caso e, seguido o rito processual, com o devido
processo legal, o pai da criança – mesmo coabitando maritalmente com a menor de 14 anos –
poderá ficar recluso pela prática desse crime por até 15 anos. Daí questiona-se: Como o
profissional da saúde poderá trabalhar os sujeitos com um olhar diferenciado como demanda
as diretrizes do programa governamental para o adolescente? Tem-se diante de si uma norma
de padrões rígidos, não deixando a resolutividade dos casos sob o crivo da equipe de saúde.
Se o entendimento é de que se judicialize todos os casos de relação sexual, mesmo
consentida, com menores de 14 anos, levando todos os casos a tutela do poder judiciário,
iremos criar outro problema: aumento da população carcerária de forma vertiginosa.
Justifica-se, assim, o ponto de partida teórico-metodológico em torno da
compreensão do profissional da saúde acerca do adolescer, crescer, amadurecer e da
compreensão de saúde numa perspectiva, integral, holística e interdisciplinar.
Os procedimentos metodológicos que serão apresentados neste capítulo, numa
abordagem quanti/qualitativa e onde recolhemos diversos tipos de informações, foram
organizados por etapas da seguinte forma:
Tipo de estudo
Sujeitos da pesquisa
Cenário do estudo
Definição da amostra
Coleta e análise dos dados
Tratamento dos dados
Cronograma
Aspectos éticos da pesquisa
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Gil (1999) considera que a pesquisa exploratória tem como objetivo principal
desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias no intuito de formular problemas mais
precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. Costumam envolver, também,
pesquisa bibliográfica e documental, entrevistas não padronizadas e estudos de casos e não
apresentam muita rigidez no planejamento nem se utilizam de procedimentos de amostragem
e técnicas quantitativas de coleta de dados.
A pesquisa descritiva pode assumir diversas formas, segundo Andrade (2007, p. 114),
que ao fazer menção à pesquisa descritiva (fator fundamental de nossa escolha) fez-nos
entender que essa via iria nos direcionar melhor ao que nos propomos estudar.
Soma-se o fato de que a pesquisa descritiva observa, registra, analisa e correlaciona
atos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los, pois entendemos que em suas diversas
formas a mesma trabalha sobre dados ou fatos colhidos da própria realidade não interferindo
nos dados. Procura, também, descobrir, com precisão possível a frequência com que um
fenômeno ocorre, sua relação e conexão com outros, sua natureza e características. Busca
ainda conhecer as diversas situações e relações que ocorrem à vida social, política, econômica
e demais aspectos do comportamento humano, tanto no indivíduo tomado isoladamente como
de grupos e comunidades mais complexas, cujo registro não consta de documentos. Nesse
caso, os dados, por ocorrerem em seu habitat natural, precisam ser coletados e registrados
ordenadamente para seu estudo propriamente dito.
Numa abordagem quantitativa e qualitativa, utilizamos o estudo documental e de
campo, onde recolhemos diversas informações através de técnicas e instrumentos elaborados,
documentos, relatórios, publicações na área jurídica, na área social, em âmbito nacional e
internacional. Procuramos nos inteirar de dados epidemiológicos e estatísticos oficiais, com
produções nas esferas municipal, estadual e nacional, focando em conteúdo especificamente
para esta pesquisa, tendo como cenário a Maternidade Escola Assis Chateaubriand (MEAC).
Sobre o assunto, Minayo afirma que:
A diferença qualitativo/quantitativo é de natureza. Enquanto cientistas sociais que
trabalham com estatística apreendem dos fenômenos apenas a região “visível,
ecológica, morfológica e concreta”, a abordagem qualitativa aprofunda-se no mundo
dos significados das ações e relações humanas, um lado não perceptível e não
captável em equações, médias e estatísticas. O conjunto dos dados quantitativos e
qualitativos, porém não se opõem. Ao contrário, se complementam, pois, a realidade
abrangida por eles interage dinamicamente, excluindo qualquer dicotomia.
(MINAYO, 2002, p. 22).
Portanto, a partir das contribuições da Antropologia, a pesquisa qualitativa tem
ganhado cada vez mais espaço em diversas áreas de estudo e adquirido relevância maior ainda
24
quando se refere a avaliação de políticas, programas e projetos sociais. A opção por este tipo
de pesquisa ocorreu em razão dos diferentes aspectos, que estão imersos em um programa
social, cujo exame minucioso exige a contextualização destes fatores no ambiente onde o
mesmo se desenvolve.
A abordagem qualitativa contribuiu com a investigação contida nos objetivos
específicos para ajudar na compreensão dos mesmos. Sem a ajuda dos entrevistados não
teríamos conteúdo suficiente para: verificar a compreensão dos profissionais sobre a Política
de atenção integral à Saúde dos adolescentes e jovens e a lei de estupro de vulneráveis;
identificar como a equipe multiprofissional compreende o dispositivo penal que versa sobre
estupro de vulneráveis; verificar possíveis conflitos enfrentados pelos profissionais para o
cumprimento da lei e identificar fluxos e encaminhamentos da instituição para o cumprimento
do dispositivo penal.
Na abordagem quantitativa os dados contribuíram no estabelecimento de parâmetros
para a construção de agrupamentos para melhor compreensão da distribuição do número de
profissionais da MEAC, conforme características sócio demográficas como: sexo; faixa etária;
estado civil; ocupação; área de trabalho; tempo de instituição; tipo de vínculo; vínculo
empregatício em outras instituições. Os dados quali/quantitativos somados fundamentaram as
análises de dados, conteúdos, hipóteses e conclusões deste trabalho de pesquisa.
Após analisar as correntes metodológicas – estudadas ao longo da disciplina de
Metodologia do Trabalho Científico –, visualizamos uma vertente analítica Marxiana pelos
autores estudados, com o objetivo de compreender os fenômenos relativos ao processo de
desenvolvimento do adolescente.
Assim, partimos da abordagem de Vygotsky sob a ênfase do materialismo histórico e
do materialismo dialético por ele executado. Recorremos, também, a outros autores da nossa
contemporaneidade para uma análise política, histórica, jurídica e psicossocial do tema
proposto. Consultamos: Rodrigues (2008, 2011); Minayo (2009); Bardin (2009); Andrade
(2008); Greco (2007, 2009, 2011); Nucci (2009, 2010, 2014), dentre outros.
Utilizou-se o método crítico-reflexivo, abordando os métodos quanti/qualitativo, que
se complementam, favorecendo a reflexão das consequências da lei aos companheiros que
vivem maritalmente com menores de 14 anos, do direito à privacidade, e dos limites impostos
pelo Estado. Dessa forma, buscou-se contextualizar a égide da política pública, que teve início
com o PROSAD, logo depois a criação de uma política específica para adolescentes e jovens,
com enfoque no Programa do Governo para a Saúde Sexual do Adolescente, a partir de várias
visões envolvidas na política.
25
Nesse sentido, acreditamos que, conforme afirma Triviños (1987), o estudo
descritivo permite ao investigador aumentar sua experiência em torno de determinado
problema, que, partindo de uma hipótese, “aprofunda seu estudo nos limites de uma realidade
específica, buscando antecedentes”, ampliando conhecimentos.
A pesquisa foi realizada com 15 profissionais da saúde que prestam serviços diários a
crianças e adolescentes de 0 (zero) a 19 anos incompletos, escolhidos de forma aleatória,
identificando cada entrevistado com a letra “E” seguida de um número cardinal para não
comprometer o sigilo de sua identificação e nem a pesquisa.
Foram entrevistados profissionais do serviço ambulatorial, emergência, sala de parto
e unidade de internação na especialidade de obstetrícia7 por situarem-se como setores de
entrada de gestantes em busca do pré-natal, intercorrências obstétricas, resolução do parto e
pós-parto respectivamente. Vale considerar que o conjunto de profissionais entrevistados
atendeu o critério de saturação dos dados. Acrescenta-se o fato de que, especificamente, nos
detivemos aos profissionais que estavam de plantão nos dias da abordagem enquanto
prestavam atendimento ao parto, puerpério ou ao pré-natal.
A pesquisa foi realizada na Maternidade Escola Assis Chateaubriand, uma instituição
pública no Município de Fortaleza vinculada à Universidade Federal do Ceará (UFC),
pertencente à Rede da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), estatal e
vinculada ao Ministério da Educação, que administra atualmente 39 hospitais universitários
federais, criada com o objetivo de aperfeiçoar os serviços de atendimento à população por
meio do Sistema Único de Saúde (SUS) e de promover o ensino e a pesquisa nas unidades
filiadas. O órgão, criado em dezembro de 2011, também é responsável pela gestão do
Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (REHUF), que
contempla ações nas 50 unidades no país, pois segundo Sodré:
Sob a justificativa de maior autonomia no uso dos recursos, legalização dos
contratos de trabalho e aprimoramento do processo de gestão das instituições de
ensino e saúde, o governo Lula se despede de seu mandato, deixando a herança das
Fundações Estatais de Direito Privado, ainda que sob nova roupagem: a EBSERH.
Após a rejeição da MP n. 520 no Senado, em 2011, a então presidente da República,
por meio da Lei n. 12.550, autoriza a criação da EBSERH, empresa com
personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio. (SODRÉ, 2013, p.
371).
A MEAC está localizada na Rua Coronel Nunes de Melo, s/n, Rodolfo Teófilo,
Fortaleza - CE, 60430-270, que tem como missão promover o ensino, a pesquisa e a
7 Ambiente no qual ficam internadas às puérperas que pariram ou esperando o parto na instituição pesquisada.
26
assistência terciária à saúde, atuando de forma integrada e como suporte aos demais níveis de
atenção do modelo de saúde vigente onde encontramos o tripé de ensino, pesquisa e
extensão. Nessa ótica, a interdisciplinaridade toma parte de seu cotidiano, direcionando
principalmente no cuidado ao núcleo familiar. Vejamos o que diz Ribeiro:
[...] a Maternidade Escola Assis Chateaubriand (MEAC), que compõe os hospitais
universitários da Universidade Federal do Ceará, tendo como funções primordiais o
ensino, a pesquisa e a assistência médico-hospitalar. Caracteriza-se por prestar
assistência às mulheres e aos recém-nascidos em nível terciário, configurando-se
como referência no Município de Fortaleza e no Estado do Ceará quanto às suas
especialidades (obstetrícia, ginecologia e neonatologia), sendo ainda reconhecidas
pelo Ministério da Saúde como maternidade de excelência em atendimento as
gestantes de alto risco. (RIBEIRO, 2013, p. 252).
A instituição é referência na assistência materna-infantil do setor público a qual
dispõe de um ambulatório para adolescentes, onde a promoção da saúde é à base de todo o
atendimento e onde há execução de programas educativos e informativos para adolescentes
com idade de 10 a 19 anos incompletos.
O ambulatório de adolescentes da MEAC segue sob a ótica do que foi preconizado
pelo Programa Saúde do Adolescente (PROSAD), atuando prioritariamente em orientação e
prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, bem como problemas relacionados à
gravidez precoce, questões como sexualidade, infecções sexualmente transmissíveis
(IST’s/AIDS) e relações de gênero.
A Maternidade Escola faz parte de um mecanismo de Estado, que coopera na geração
de uma população jovem e saudável, buscando estabelecer um momento de interação entre
profissional e cliente, respeitando seus valores, conceitos e visão de mundo. Oliveira enfatiza
que:
A educação em saúde como um instrumento de construção da participação popular
nos serviços de saúde e, ao mesmo tempo, de aprofundamento da intervenção da
ciência na vida cotidiano das famílias e sociedades. O desafio principal da educação
em Saúde é trazer abertura para debates no âmbito governamental, com os
profissionais e a população. Com isso terá um avanço apontando para a construção e
difusão do saber e do conhecimento visando à melhoria na qualidade de vida. (DE
OLIVEIRA, 2004, p. 761).
A MEAC tem um ambulatório específico para promoção da saúde infanto-juvenil,
criado em 1985, para atender especificamente crianças e adolescentes. É a principal porta de
entrada desse público na instituição, demandando profissionais com formação generalista,
capazes de trabalhar em equipe onde há execução de programas educativos e informativos
para crianças e adolescentes que procuram o serviço. Por esse motivo, transformou-se em um
de nossos ambientes da pesquisa, visto que em média, mensalmente, são atendidas 100 (cem)
27
adolescentes no referido serviço, provenientes da rede de referência e contrareferência da
Prefeitura de Fortaleza e de outros municípios do Estado. Dados esses retirados do programa
Epi Info versão 6 (seis) do ambulatório de adolescentes, lembrando que, em uma pesquisa
qualitativa, não há necessidade de utilização do processo de amostragem com grande número
de entrevistados (GIL, 2010, p. 54).
Neste estudo, ouvimos opiniões dos profissionais que recebem menores de 14 anos
grávidas, com o objetivo de responder questões pertinentes dentro do contexto que o ambiente
os insere, através das diretrizes nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e
jovens na promoção, proteção e recuperação da saúde. Analisamos, também, como esses
profissionais percebiam a lei 12.015/09.
A escolha desse recorte se fundamenta pelo fato de esse projeto ter como público-alvo
os/as Profissionais da Área da Saúde, com suas atividades voltadas para o atendimento de
adolescentes e jovens, na área de obstetrícia.
Tivemos dificuldades no delinear de nossa pesquisa quando constatamos que quase a
metade dos profissionais entrevistados, 46,6%, afirmaram desconhecer a existência de alguma
Política Pública de Saúde para adolescentes e jovens do governo federal.
Na população de 15 profissionais entrevistados 4 (quatro) tiveram dificuldades em
responder à pergunta de número 13: O que você conhece a respeito do PROSAD?8. Do
mesmo número de profissionais anteriormente destacados, não souberam responder à
pergunta de número 14, onde questionamos sobre: Qual ação a MEAC viabiliza para o
cumprimento das políticas públicas para jovens e adolescentes no Município de
Fortaleza?
Dos 15 entrevistados, 4 (quatro) pularam a questão de número 16 por desconhecer a
lei 12.015/09, não sabendo opinar quando questionados sobre: O senhor (a) enfrenta alguma
dificuldade ou conflitos na execução da lei 12.015/09 no seu dia a dia profissional? Obs.:
caso a sua resposta na questão de nº 14 tiver sido: “NÃO CONHEÇO”, pule esta
questão.
Nas questões abertas, os respondentes relataram suas atitudes e enfrentamentos em seu
dia a dia, acerca do conhecimento ou não da política pública para jovens, da lei 12.015/09 e o
PROSAD. As questões abertas corresponderam a maior parte dos objetivos específicos
propostos no trabalho.
8 O Programa Saúde do Adolescente (PROSAD) tem como objetivo promover a saúde integral de adolescentes e
jovens, favorecendo o processo geral de seu crescimento e desenvolvimento, formulando uma política nacional a
ser desenvolvida a nível Federal, Estadual e Municipal.
28
É importante salientar, pela complexidade do tema, que a população participante desta
pesquisa foi informada dos objetivos da pesquisa e só depois resolveram aceitar ou não serem
entrevistados, respeitando assim sua autonomia e problemas éticos.
Como critério de inclusão consideramos os profissionais do ambulatório de
adolescentes, referência no Estado do Ceará, pelo atendimento a crianças e adolescentes.
Hoje, único local no Estado do Ceará específico para atendimento ao público citado,
especialista no atendimento do gênero feminino de 0 (zero) a 19 (dezenove) anos
incompletos.
Ainda na categoria “inclusão” escolhemos profissionais de outros setores, que no seu
lidar diário atendam menores de 14 anos grávidas, com relação sexual consentida, e que
procuram o serviço para resolução da gestação ou já estão no pós-parto.
A média de partos da Maternidade Escola é de 253 partos mensais e, dentre este
número, 45% das parturientes tem entre 12 - 19 anos incompletos (MEAC, 2017).
Usamos como critério de exclusão os atendimentos a mulheres vítimas de abuso
sexual, pois o instituto violência não é objeto de nosso estudo e nem tão pouco o atendimento
ao gênero masculino. Pelo aspecto “violência” foram excluídas todas as mulheres de qualquer
idade, mesmo amparadas pela lei 12.015/09.
Em outro caráter de exclusão, deixamos de computar em números as menores de 14
anos atendidas pelo serviço de ginecologia, com vida sexual ativa, embora albergados pela lei
12.015/09. Isso porque a proposta do estudo era cotejar os impactos da lei, junto a Política
Pública sexual e reprodutiva da adolescente grávida menor de 14 anos na tentativa de
identificar quais os benefícios que a lei 12.015/09 poderiam proporcionar para a vida da
menor no decorrer do pré-natal e no pós-parto.
A nossa principal preocupação quando iniciamos a pesquisa foi a compreensão da
equipe multidisciplinar, diante do dispositivo penal e que versa sobre estupro de vulnerável,
em uma relação sexual consentida.
Verificamos, através das falas das profissionais entrevistadas, conflitos enfrentados por
elas para o cumprimento da lei. Identificamos fluxos e encaminhamentos da instituição para o
cumprimento da lei, observando a eficácia e a eficiência dessa lei.
Analisou-se a gravidez, a política integral do adolescente para menores nesta faixa
etária com relação sexual consentida e as repercussões do fazer diário dos profissionais no seu
dia a dia.
29
Essa etapa configurou-se bastante produtiva e surpreendente, pois nos trouxe várias
descobertas e muitas outras indagações, que inviabilizariam suas respostas neste trabalho, ao
que decidimos guardá-las para explorar analiticamente em outra futura pesquisa.
Portanto, neste trabalho, procurou-se expor a concepção dos profissionais da saúde em
sua ótica de atendimento a menores de 14 anos grávidas. Buscou-se percorrer os contextos
dos atendimentos de cada profissional entrevistado no sentido de fazer um cotejo de fluxos e
encaminhamentos da instituição, procurando entender a elaboração e execução da política
dentro da instituição de acordo com os objetivos da Política de Saúde Integral dos
Adolescentes e Jovens para o público no qual essa política se destina.
O convite para a participação da pesquisa foi realizado por meio da exposição da
temática. Durante essa experiência, pontuamos a relevância da participação do profissional e a
sua contribuição social neste trabalho mediante os resultados que seriam obtidos, através de
suas percepções diárias, visto a escassez de bibliografia sobre o assunto.
Do ponto de vista analítico instrumental o conceito é fundamental para a compreensão
dos dados que foram fornecidos nas entrevistas. Ele permitiu explicitar e sistematizar o
conteúdo das mensagens e a expressão deste conteúdo, a partir de um conjunto de técnicas
parciais e complementares. O objetivo desta abordagem foi efetuar deduções lógicas e
justificativas, referentes à origem das mensagens do estudo. O material de estudo
compreendeu na utilização de entrevistas semiestruturada.
Os dados foram colhidos através de entrevistas que continham perguntas abertas e
fechadas no período de abril a maio de 2017. A construção teórica foi apoiada em pesquisas
de livros, revistas, resenhas e documentos, que nos ajudaram a assimilar as ideias veiculadas
por autores nacionais, levando o referencial teórico à realidade investigada, bem como o do
ordenamento jurídico brasileiro, fazendo um cotejo do que manda a lei.
As entrevistas foram aplicadas aos profissionais, que consentiram com a pesquisa,
através de termo livre e esclarecido assinados em duas vias, ficando uma via com a
pesquisadora e a outra com o entrevistado. As abordagens foram feitas em seu local de
trabalho e selecionados segundo o critério de acessibilidade. Não utilizamos procedimentos
estatísticos para a escolha da amostra, onde foram escolhidos pela logística de atendimento:
emergência, sala de parto, posto do 2º andar, e ambulatório de adolescentes.
A partir das respostas coletadas foi possível, em algum momento, a análise dos dados
para aproximação da realidade.
A comunicação através da fala, muito valiosa para a raça humana e tão rica, apresenta
um grande número de significados numa só palavra, que, nesta visão polissêmica, permite ao
30
pesquisador qualitativo uma variedade de interpretações, conforme aponta Laurence Bardin
sobre a análise de conteúdo:
No plano metodológico, a querela entre a abordagem quantitativa e a abordagem
qualitativa absorve certas cabeças. Na análise quantitativa, o que serve de
informação é a frequência com que surgem certas características do conteúdo. Na
análise qualitativa é a presença ou a ausência de uma dada característica de conteúdo
ou de um conjunto de características num determinado fragmento de mensagem que
é tomado em consideração. (BARDIN, 2009, p. 21).
O significado da análise de conteúdo é não somente produzir suposições
subliminares acerca de determinada mensagem, mas embasá-las com pressupostos teóricos de
diversas concepções de mundo e com as situações concretas de seus agentes ou destinatários.
Logo, fazer uma inferência à análise de conteúdo é trabalhar com uma técnica de palavras,
produzindo a aferição de um texto replicável ao seu contexto social.
Nesta técnica, o texto é um meio de expressão do sujeito, onde o analista busca
categorizar as unidades de texto, palavras ou frases que se repetem (CAREGNATO; MUTTI,
2006). Todavia, nem sempre aquilo que se está escrito é o que verdadeiramente o emissor
queria dizer. Ou, por outro lado, existe uma mensagem não muito clara que só percebemos
nas entrelinhas, onde nem sempre as interpretações são manifestas de forma a serem
compreendidas absolutamente, sem sabermos onde acaba a objetividade e começa o figurado.
Desta forma, atualmente, a técnica de análise de conteúdo refere-se ao estudo tanto
dos conteúdos nas figuras de linguagem, reticências, entrelinhas, quanto dos manifestos.
(GOMES, 2004, p. 23). Nesse sentido, os dados foram analisados a partir do que foi colhido
nas próprias respostas dos profissionais da área da saúde que estavam escalados no dia da
coleta. Para isso foi no contexto social que cada entrevista foi analisada e que as respostas
tiveram cunho científico, este responsável pela separação de falas mais relevantes por temas e
associação de falas, com conceitos síntese e com cruzamento de informações em todas as
entrevistas.
Na análise de coleta de dados investigada instrumentamos as respostas em referência
à problemática levantada para possíveis soluções. Na análise exploratória dos dados
quantitativos utilizamos como referência as transcrições das entrevistas e a primeira parte do
formulário da mesma, que continha, nome, idade, formação etc. Cada formulário foi
preenchido pelos entrevistados, com o objetivo de identificar os atributos mais citados por
eles, a distribuição percentual de respostas e a análise para avaliar o grau de importância das
respostas.
31
Realizamos em nossa pesquisa as observações direta e participativa, por entendermos
que o convívio direto com os fatos nos levaria a uma melhor compreensão da problemática e
consequentemente nos direcionaria a possíveis soluções de questionamentos que foram
levantados.
A utilização de entrevistas como estratégia de investigação foi necessária para
contextualizar os discursos dos profissionais entrevistados, as relações pessoais e
compreender as condições sociais dos envolvidos em meio ao tema estudado para entender
produção de seus discursos. A fala e a observação nos possibilitaram descrever e situar os
fatos únicos e os cotidianos, construindo, assim, cadeias de significações.
Foi utilizada a análise de conteúdo como técnica de análise de dados, técnica
particularmente usada para estudos de tipo qualitativo, caracterizada por sua objetividade,
sistematização e inferência (RICHARDSOS, 1989).
Triviños (1995) acrescenta que o emprego deste método é recomendado para o
estudo de motivações, atitudes, valores, crenças, tendências e para desvendá-lo das ideologias
que podem existir nos dispositivos legais, princípios, diretrizes etc.
Nesse sentido, Bardin (2009), por sua vez, define a análise de conteúdo como:
um conjunto de técnicas da análise das comunicações, visando, por procedimentos
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, obterem
indicadores quantitativos ou não, que permitam a inferência de conhecimentos
relativos às condições de produção/ recepção (variáveis inferidas) das mensagens.
(BARDIN, 2009, p. 123).
Este método procura se afastar da ilusão da transparência dos fatos sociais e pretende
compreender para além dos significados imediatos. De forma geral, esta técnica permitiu a
ultrapassagem da incerteza (rigor) e o enriquecimento da leitura, mediante uma leitura atenta,
que possibilitou o esclarecimento de elementos de significações susceptíveis de conduzir a
uma descrição de mecanismos de que, a priori, não detínhamos a compreensão (BARDIN,
2009, p. 122).
Foi neste cenário, portanto, que procuramos realizar uma análise da política pública
cotejada com a lei, seguindo a abordagem metodológica da avaliação em profundidade de
políticas públicas, onde primeiramente a definimos para só depois mostrar os procedimentos
metodológicos. Assim, Rodrigues enfatiza que:
(...) a imersão em uma particularidade do campo de investigação, saliento que no
sentido aqui referido é o de abarcar a um só tempo as dimensões dadas tanto no
sentido longitudinal – extensão no comprimento – como latitudinal – extensão na
largura, amplidão. Assim desta perspectiva, quanto mais mergulhamos na situação
estudada, mais ampliamos o campo de investigação. Olhamos à frente e para os
32
lados, acima e abaixo, porque a compreensão focada, direcionada, certamente a mais
fácil, com certeza será sempre limitada. Ou, mesmo, poderíamos correr o risco de,
na busca de análise tão profunda, perdermos o contato com a superfície (...)
(RODRIGUES, 2017, p. 10).
Neste diapasão, a avaliação em profundidade nos subsidiou na condução a
importantes reflexões, que nos direcionou na investigação de nossos principais
questionamentos. Assim, eis o objetivo de nosso trabalho: analisar a execução da lei de
estupro de vulneráveis e da atenção integral à saúde de adolescentes e jovens, sob a ótica de
profissionais da saúde, em um serviço gineco-obstétrico para adolescentes, ao que citamos
novamente Rodrigues quando afirma que:
Uma avaliação em profundidade não poderá se restringir a um olhar focado apenas
na averiguação do cumprimento das metas propostas pela política e seus resultados,
ou nos itens priorizados por um programa, bem como tão somente no atendimento às
suas diretrizes. (RODRIGUES, 2011, p. 57).
Desse modo, definimos o objeto a ser investigado e a população da pesquisa. O
roteiro das entrevistas e o termo livre esclarecido, dentre outros, estão nos anexos no final
deste trabalho. Os referidos documentos foram apresentados às pesquisadas, que receberam
orientação sobre a sua participação voluntária e sobre como a pesquisa traria benefícios não
só para o sujeito da pesquisa, mas para a instituição e para a promoção da saúde. Por
profissionais da área da saúde entende-se por: assistente social, enfermeiro, médico, psicólogo
e técnico de enfermagem.
O trabalho atendeu as exigências científicas e éticas de acordo com as Normas e
Diretrizes que regulamentam pesquisas. O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Maternidade Escola Assis Chateaubriand (CEP/MEAC/UFC) e os procedimentos
utilizados obedeceram aos Critérios da Ética na Pesquisa com Seres Humanos, do Conselho
Nacional de Saúde – Ministério da Saúde, Resolução nº 466/12 CNS/MS de 12 de dezembro
de 2012, publicada no diário oficial, em 12 de dezembro de 2012, (BRASIL, 2012).
O projeto foi registrado com CAAE nº 60517316.0.0000.5050 recebeu nº de parecer
1783285, aprovado em reunião do dia 20 de outubro de 2016, termo em ANEXO, conforme
Protocolo CONEPE nº. 45/07.
A tabulação e análise dos dados foram realizadas com o Pacote Estatístico para
Ciências Sociais, versão 12 para Windows (SPSS 12.0). Inicialmente são apresentadas as
análises estatísticas descritivas de frequências e percentagens dos dados biosociodemográficos
dos participantes, relativos à idade, sexo profissão, idade etc.
33
Entender a égide, a estrutura e a dinâmica da avaliação de políticas públicas em
profundidade, considerando seus fatos mais significativos, levou-nos a uma visão crítica do
que pesquisávamos para uma compreensão e apreensão do nosso objeto. Possibilitou, ainda,
perceber o nosso objeto de análise à distância, em ampla perspectiva, para um resultado
acadêmico que fomentou e auxiliou uma mudança no universo trabalhado. Por sermos
servidores da Universidade Federal do Ceará, muitos desses objetivos foram indagações do
nosso dia a dia, que nos levaram à construção desse problema.
No que concerne à estrutura este trabalho tem quatro capítulos. O primeiro,
contabilizado a partir desta introdução, o segundo, onde trabalhamos a parte jurídica,
mostrando ao leitor toda a legislação atualizada do crime de abuso de vulnerável, explanando
como a doutrina recebeu esse novo diploma jurídico, explorando a incidência da lei e seus
reflexos no campo fenomênico e social.
No terceiro capítulo, analisamos o principal marco histórico garantidor da criação e
permanência da política pública específica para crianças, adolescentes e jovens no país, e suas
diretrizes nacionais para a atenção integral à saúde sexual, bem como o seu delinear histórico
desde a promulgação da Carta Constitucional de 1988 até a atualidade.
No quarto e último capítulo expomos as conclusões da pesquisa, com os resultados
das entrevistas sob a ótica do referencial teórico trabalhado, tornando a análise e tabulação
dos dados em viés científico, que viabilizou uma melhor compreensão de seus resultados.
34
2 ABUSO DE VULNERÁVEL: UMA LEGISLAÇÃO DE CRENÇAS SILENCIOSAS
O que é necessário é uma nova maneira de pensar sobre
o desafio da gravidez na adolescência. Em vez de ver a
menina como o problema e a mudança de seu
comportamento como a solução, os governos,
comunidades, famílias e escolas devem considerar como
reais desafios à pobreza, a desigualdade de gênero, a
discriminação, a falta de acesso a serviços, e as opiniões
negativas sobre meninas e mulheres. (UNFPA, 2013, p.
14).
Com a inclusão no bojo constitucional do artigo 227, o legislador definiu quem teria
o dever de assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, assistência absoluta, passando de
objetos a sujeitos de direito. A partir desse dispositivo, abriu-se o debate para a família,
sociedade e Estado trabalharem em conjunto, repensando as políticas públicas específicas
para a construção de práticas de atenção integral à saúde, dentre as quais, a de atenção e
cuidados à saúde sexual e reprodutiva.
Quando a sociedade clama por leis, seja por transformações na vida cotidiana, seja
devido o surgimento de novas demandas sociais, advindas das modificações coletivas, não
significa que quando positivada e colocada no ordenamento jurídico a lei promulgada consiga
atender seus anseios de forma ampla e em sua totalidade.
Dadas essas considerações, neste capítulo, exploraremos a hipótese de incidência da
lei, assim entendida como a situação descrita em lei, recortada pelo Congresso Nacional entre
inúmeros fatos do mundo fenomênico. Explanaremos ainda o que o legislador entende como
crime e como o profissional da saúde percebe este dispositivo penal no seu dia a dia e no seu
dever profissional, tendo que se adequar ser cair em omissão diante da obrigação punitiva
imposta pelo Estado.
O enfrentamento da problemática faz-se necessário, primeiramente, com uma
abordagem técnica e clara do assunto, uma vez que não é mascarando o problema que ele
deixará de existir.
Houve análise da conjuntura política atual, bem como em contextos passados, com o
intuito de comparar quais influências positivas ou negativas sobre o enxerto feito à Lei para
realizar uma avaliação de seus possíveis reflexos nas vidas das adolescentes menores de 14
anos grávidas e seus contextos familiares.
É nesta perspectiva que delinearemos o nosso estudo na parte jurídica, sem querer
esgotá-lo nesta pesquisa, instigando o leitor a repensar as contradições do Estado frente à
criação de políticas públicas para jovens e adolescentes, na área sexual, onde tem na doutrina
35
da proteção integral seu suporte de ações. Analisamos, ainda, como este mesmo Estado afasta
a efetivação dessas ações através de leis fora da realidade social, dificultando sua execução.
Assim, iniciamos esse momento lançando uma questão: Como conciliar norma e
política pública para adolescentes e jovens no que se refere à educação sexual e reprodutiva?
Se a norma e política pública inviabilizam o pleno desenvolvimento da saúde desse segmento,
deslocando a realidade, erigindo obstáculos à política e criando uma fragilidade para o pleno
desenvolvimento da mesma dentro do ambiente hospitalar? Será que, reprimindo a
sexualidade entre os adolescentes e jovens, diminuiremos os números de gravidezes entre
eles? Segundo Foucault:
Existe, talvez, outra razão que torna para nós tão gratificante formular em termos de
repressão as relações do sexo e do poder: e o que se poderia chamar o beneficio do
locutor. Se o sexo e reprimido, isto e, fadado a proibição, a inexistência e ao
mutismo, o simples fato de falar dele e de sua repressão possui como que um ar de
transgressão deliberada. Quem emprega essa linguagem coloca-se, ate certo ponto,
fora do alcance do poder; desordena a lei; antecipa, por menos que seja, a liberdade
futura. Daí essa solenidade com que se fala, hoje em dia, do sexo. (FOUCAULT,
1999, p. 103).
Portanto, antes de adentrarmos essa seara jurídica, explicando o que a lei trata sobre
vulnerabilidade, precisamos explicar a vulnerabilidade de forma ampliada, buscando abordar
algumas definições fora do compêndio legal.
É mister definir o termo nos afastando um pouco do âmago forense de forma que
possamos ter melhor entendimento do assunto e partirmos para o que é prescrito e descrito
dentro da norma pátria, situando a temática no tempo e espaço.
Não podemos descartar a ocorrência de uma revolução sexual no final do século XX,
que designou intensas modificações na cultura e na sociedade, atuando decisivamente no
amadurecimento precoce da criança e principalmente do adolescente.
Algumas implicações como o fim da presunção de violência, tratada no título
anterior, revogado, com certeza já era previsível, pois deu lugar a um dispositivo com sansões
mais rígidas, já que o legislador optou por criar um novo instituto denominado “crime de
abuso de vulnerável”, afastando do ordenamento jurídico o instituto da presunção de
violência.
Vale transcrever parcialmente o fundamento do projeto, que com a edição da Lei nº
12015/09, de 7 de agosto de 2009, nos trouxe o artigo 217-A9, tipificando como crime o
dispositivo elencado, substituindo o regime de presunção de violência contra criança ou
9 Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena-reclusão, de 8
(oito) a 15 (quinze) anos.
36
adolescente menor de 14 anos, que era previsto no art. 22410
do Código Penal. (BRASIL,
2004).
Esse resultado ocorreu por conta das novas demandas sociais no sentido de moldar
nosso Código Penal Brasileiro às atuais realidades e necessidades urbanas. Por iniciativa da
Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Exploração Sexual de Crianças e
Adolescentes, elaborou-se o Projeto de Lei do Senado - PLS nº 253 de 2004, que mais tarde
findou na promulgação da Lei 12.015/2009, que alterou significativamente o Título VI do
Código Penal. Por força desta Lei, tivemos a introdução de uma nova figura típica penal em
nosso ordenamento jurídico: o artigo 217-A do CP.
O referido artigo mudou o conceito de estupro e passou a contemplar a figura
masculina, pois na perspectiva anterior antes somente a mulher poderia ser estuprada. Com a
nova redação, o homem deixa de ser somente sujeito ativo, do tipo penal, para também fazer
parte do rol dos sujeitos passivos do crime.
O legislador poderia ter inovado ainda mais, equiparando a idade do consentimento
com a definição de adolescente do ECA, prescrito no art. 2º da citada norma, quando
especifica a idade, diferenciando a criança do adolescente e os atos infracionais, pois, quando
menor de 12 anos, aplicam-se medidas protetivas e quando maior de 12 anos medidas
socioeducativas.
Se aos 12 (doze anos) um adolescente, por infração, pode responder por medidas
sócias-educativas, acompanhada por agente policial, então por analogia, poderia estar capaz
de consentir nos atos da sua vida sexual. Citando Nucci:
(...) ora é preciso considerar então se esta vulnerabilidade é absoluta (não admitindo
prova em contrário) ou relativa (admitindo prova em contrário). Partimos do
seguinte ponto básico: o legislador, na área penal, continua retrógrado e incapaz de
acompanhar as mudanças de comportamento reais na sociedade brasileira, inclusive
no campo das definições de criança e adolescente. Perdemos uma oportunidade
ímpar para equiparar os conceitos com o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou
seja, criança é a pessoa menor de 12 anos, adolescente, quem é maior de 12 anos.
Logo a idade de 14 anos deveria ser eliminada desse cenário. A tutela do direito
penal, no campo dos crimes sexuais, deve ser absoluta quando se tratar de criança
(menor de 12 anos), mas relativa ao cuidar do adolescente (maior de 12 anos). Desse
modo continuamos a sustentar ser viável debater a capacidade de consentimento de
quem possua 12 ou 13 anos, no contexto do estupro de vulnerável. Havendo prova
de plena capacidade de entendimento da relação sexual, (ex. pessoa prostituída) não
tendo violência ou grave ameaça, real, nem mesmo qualquer forma de pagamento, o
que poderia configurar o crime do art. 218 B, o fato pode ser atípico ou comportar
desclassificação. Entretanto manter relação sexual com pessoa menor de 12 anos
com ciência disso provoca o surgimento da tipificação do art. 217-A, de modo
absoluto, sem admissão de prova em contrário. (NUCCI, 2010, p. 830).
10 Art. 224 - Presume-se a violência, se a vítima: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90 (Revogado pela Lei nº 12.015, de
2009).
37
Portanto, entende-se que, nos termos do artigo 1º, VI, da Lei nº 8.072/90, o estupro
de vulnerável é crime hediondo, devendo inicialmente o cumprimento da pena se dar em
regime prisional fechado.
Após a promulgação da lei 12.015/09 já seria presumível as divergências de diante
do novo mandamento jurídico pelas mudanças técnicas e de entendimento, que trouxe em seu
corpo normativo. Isso porque retirou a compreensão da presunção de violência, introduzindo
o termo vulnerável, sem, contudo, oferecer uma definição clara e objetiva ao termo.
Percebe-se, portanto, que o novo diploma jurídico nasceu causando muitas dúvidas,
criando severos debates entre os doutrinadores pátrios, levando os juízes a tomarem decisões
diversas e divergentes no campo jurídico.
Precisamos compreender o pensamento do legislador ao lançar a proposta de um
enxerto de lei, que a priori surge de uma necessidade social. Pelo menos essa é a principal
prerrogativa de um projeto de lei por entendermos que o Congresso existe por força de
delegação social, através de sufrágio universal, pois vivemos em uma democracia
representativa.
O fato é que a nova lei veio eivada de interpretações diversas, culminando em uma
leva de ações em todos os tribunais brasileiros, levando o Supremo Tribunal de Justiça (STJ),
em agosto de 2015, a sobrestar todas as ações de todo o país, relacionadas ao tema, no intuito
de em uma única sentença torná-la vinculante11
naquele Tribunal, servindo de parâmetro para
o Estado brasileiro. Vejamos a tese assentada no STJ em 26 de agosto de 2015:
Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável, previsto no artigo 217-A do
Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato
libidinoso com pessoa menor de 14 anos. “O consentimento da vítima, sua eventual
experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso entre o agente
e a vítima não afastam a ocorrência do crime.” Resp. 1480881/PI, Relator: Ministro
Rogério Schelli Cruz, terceira seção do STJ, unânime, Data de julgamento:
26/08/2015. (REVISTA DOS TRIBUNAIS, 2015, p. 89).
Portanto, embora o dispositivo em questão preveja o crime prescrito no artigo 217-A,
que tem como título dos Crimes Sexuais Contra Vulnerável, o legislador perdeu a
oportunidade de definir o termo “vulnerabilidade”, pois o instituto veio para abolir a
presunção relativa e o novo termo ficou sendo interpretado de forma subjetiva, sem definição
certa, tornando o entendimento do crime mais conflitante. Citando Greco:
11 A Súmula Vinculante é forma de tratamento da consequência do assoberbamento do Poder Judiciário, e não
ataca diretamente a causa, mantendo o Poder Judiciário refém de um modelo burocrático e atrasado, que afasta a
celeridade e efetividade das decisões judiciais, com evidente prejuízo da população em geral, em especial, dos
menos favorecidos e, portanto, vulneráveis a toda sorte de injustiças. (MARTINS, 2012).
38
O art. 217-A, que tipifica o estupro de vulnerável, substitui o atual regime de
presunção de violência contra criança ou adolescente menor de 14 anos, previsto no
art. 224 do Código Penal. Apesar de poder a CPMI advogar que é absoluta a
presunção de violência de que trata o art. 224, não é esse o entendimento em muitos
julgados. O projeto de reforma do Código Penal, então, destaca a vulnerabilidade de
certas pessoas, não somente crianças e adolescentes com idade até 14 anos, mas
também a pessoa que, por enfermidade ou deficiência mental, não possuir
discernimento para a prática do ato sexual, e aquela que não pode, por qualquer
motivo, oferecer resistência; e com essas pessoas considera como crime ter
conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso; sem entrar no mérito da violência
e sua presunção. Trata-se de objetividade fática. (GRECO, 2009, p. 63).
Porém, sem essa definição, aumentaram as controvérsias, na esfera jurídica,
afrontando diretamente ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, bem
como a inviolabilidade da vida privada, descrito no artigo 5º da CF, inciso X.
A lei obriga a notificação compulsória ao Conselho Tutelar de todos os casos que
impliquem menores de 14 anos, que já tenham relação sexual comprovada, mesmo sem
violência.
Nesse cenário o profissional se vê diante de dois dilemas ao atender menores de 14
anos grávidas. Primeiro: garantir a efetivação do pré-natal, de forma a incentivar seu
comparecimento em todas as consultas marcadas, prevenindo o trabalho de parto prematuro e
seus agravos ao bebê, à mãe e à sociedade, garantido um pré-natal e um atendimento de
atenção integral. Segundo: notificar cada atendimento ao Conselho Tutelar, mesmo sem
violência de forma compulsória. É neste cenário pantanoso, portanto, que iremos delinear este
capítulo com seus títulos e subtítulos.
Diante das controvérsias precisamos fazer reflexões para a correta longa mão do
judiciário. Devemos considerar a maior de 12 e menor 14 anos de idade absolutamente
vulnerável? A ponto de seu consentimento para o ato sexual ser completamente ineficaz,
mesmo com comprovada experiência sexual?
Com esta indagação estaremos pisando em um cenário crítico e paradoxal. É possível
relativizar a vulnerabilidade em alguns casos, através de profissionais qualificados, pelo grau
de maturidade da menor para a prática do ato sexual e do contexto no qual está inserida. Esse
posicionamento nos parece o mais correto. O legislador não poderá, jamais, modificar a
realidade da sociedade e suas mutações ao longo dos anos, bem como afastar o princípio da
ofensividade e a aplicação da intervenção mínima do Estado.
Com essa breve introdução, na seara jurídica, será a intervenção estatal no direito
penal uma intervenção mínima?
39
2.1 Vulnerabilidades e suas definições à luz da Lei n° 12.015/09
Precisamos de um olhar mais sensível pós-lei 12.015/09 diante do novo título penal,
que a mesma trouxe ao ordenamento jurídico brasileiro.
Há a necessidade de definirmos a palavra vulnerabilidade para podermos entender os
limites que foram impostos ao profissional da saúde, pois o que percebemos é que, por um
lado, temos no país uma política específica para jovens e adolescentes, com cuidados à saúde
sexual e reprodutiva, que mobiliza profissionais da área da saúde a realizar de forma cotidiana
a saúde educativa como forma diferenciada de atendimento.
Por outro lado, com o advento da lei, somada a tal política, temos que ter um olhar
atento ao que a norma incorporou sob o título “abuso de vulnerável”, tornando a conjunção
carnal ou prática de qualquer ato libidinoso, com menor de 14 anos, mesmo consensual como
criminosa e punível com reclusão de 8 a 15 anos. Como leciona Nucci:
Vale observar que não há qualquer parâmetro justificativo para a escolha em tal faixa
etária, sendo tão somente uma idade escolhida pelo legislador para sinalizar o marco
divisório dos menores que padecem de vício de vontade, a ponto de serem
reconhecidos pelo status de vulneráveis, daqueles que possam vivenciar práticas
sexuais sem impedimentos. Verifica-se, pois, que a definição de patamar etário para
a caracterização da vulnerabilidade é baseada numa ficção jurídica, que nem sempre
encontrará respaldo na realidade do caso concreto, notadamente quando se leva em
consideração o acentuado desenvolvimento dos meios de comunicação e a
propagação de informações, que acelera o desenvolvimento intelectual e capacidade
cognitiva das crianças e adolescentes. (NUCCI, 2010, p. 395).
Antes de adentramos no campo jurídico do que seria o estupro de vulnerável,
precisamos primeiramente buscar algumas definições de vulnerabilidade de forma mais
ampliada.
Segundo Masten e Garmezy (1995), vulnerabilidade associa-se mais estritamente ao
indivíduo e às suas susceptibilidades ou predisposições a respostas ou consequências
negativas. É interessante frisar a relação que existe entre vulnerabilidade e risco. E, de acordo
com Cowan et al. (1996), acontece a vulnerabilidade apenas quando o risco está presente;
sem risco não existe vulnerabilidade.
A vulnerabilidade deve ser entendida como a percepção negativa ou positiva, que
certos fatores causam, variando de cada indivíduo, ou seja, é a reação do sujeito frente às
externalidades do mundo cognitivo. Para Ayres (1999), a identidade analítica está composta
pelo indivíduo-coletivo, onde o fazer individual dependerá de como é percebido pela
coletividade.
40
Ayres (1999), nesta mesma linha de pensamento, propõe a operacionalização do
entender subjetivo através da Vulnerabilidade Individual, que se refere ao grau e à qualidade
da informação que os indivíduos dispõem sobre os problemas de saúde, sua elaboração e
aplicação na prática. A Vulnerabilidade Social, portanto, que avalia a obtenção das
informações, o acesso aos meios de comunicação, a disponibilidade de recursos cognitivos e
materiais.
Como cada pessoa reage de forma diferente devemos analisar cada indivíduo, em
suas características individuais, e não tratar o sujeito como conceitos prontos, pressupondo
que a fragilidade gerada em certa população terá sempre uma variação. Por isso que os
conceitos devem ser regidos pela dialética quanto à presença de um resultado negativo.
Poderemos, em contrário momento, esperar outro totalmente oposto ou simplesmente não
esperar dano nenhum: no lugar da perda, o nascer de outros conceitos.
A vulnerabilidade tratada no crime de abuso de vulneráveis, introduzida pela lei
12.015/09, surgiu após um acirrado trabalho no Congresso Nacional, que montou uma
Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), com deputados e senadores, encerrando
seu trabalho em agosto de 2004. Como resultado, a produção do projeto de Lei 253/04, após
profundos debates, resultou na Lei 12.015, de 07 de agosto de 2009. À época de sua
promulgação e publicação provocou profundas alterações ao Código Penal, mais precisamente
ao Título do Código Penal em que tratamos de “Crimes Contra a Dignidade Sexual”,
anteriormente denominado de “Crime contra os Costumes”.
O tema deste capítulo versa sobre a inovação trazida ao ordenamento jurídico penal
pela lei, que revogou o art. 224 do Código Penal, que, por sua vez, tratava da presunção de
violência nos crimes sexuais contra, entre outros indivíduos, os menores de 14 anos,
elencados no art. 217-A.
Desse mesmo diploma legal emergiu a figura do estupro de vulnerável, recolocando
a outrora e polêmica presunção de violência contra o menor de 14 anos, se absoluta ou
relativa, isto é: que prove em contrário; fora do diploma jurídico, dando vida ao termo
estupro de vulnerável, não admitindo prova em contrário.
O crime de estupro de vulnerável vem previsto no Art. 217-A do código penal e foi
introduzido pela lei n° 12.015/09, que teve por objetivo abolir e atualizar matérias constantes
do título, que trata sobre os crimes contra a dignidade sexual: “Ter conjunção carnal ou
praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: comete crime”.
Anteriormente, para tratar claramente do assunto, ou seja, da sexualidade do
adolescente, o legislador separou a questão em dois crimes: o estupro e o atentado violento ao
41
pudor. Ambos eram crimes separados e cada um tinha uma presunção de violência caso a
pessoa fosse menor de 14 anos.
Hoje, diante da nova redação dada ao dispositivo, temos os dois crimes inseridos no
mesmo artigo. Como leciona Rogério Greco:
Através desse novo diploma legal, foram fundidas as figuras do estupro e do
atentado violento ao pudor em um único tipo penal, onde se optou pela manutenção
do nomem iuris de estupro (art. 213). Além disso, foi criado o delito de estupro de
vulnerável (art. 217-A), encerrando-se a discussão que havia em nossos Tribunais,
principalmente os Superiores, no que dizia respeito à natureza da presunção de
violência, quando o delito era praticado contra vítima menor de 14 (catorze) anos.
(GRECO, 2009, p. 56).
A definição de vulnerabilidade, como está definido no Código Penal, está longe de
ser a mais correta. Vulnerável deveria ser criança até atingir 12 anos, como está colocado pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990, em seu artigo 2º,
onde define a criança e adolescente para efeitos legais. O mesmo documento define a criança
como pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescentes aquela entre doze e dezoito
anos de idade.
Nota-se que o Estatuto, apesar de ter mais de 20 anos, definiu de modo mais apurado
o bem jurídico tutelado do que a lei em questão, quando coloca que o menor de 14 anos não
pode consentir com seu ato sexual.
Nos dias atuais, onde há adolescentes com vida sexual ativa, com relacionamentos
amorosos estáveis e com respaldo familiar, é notório o começo da vida sexual entre os 12, 13
ou 14 anos, e, não muito distante, estarem buscando atendimento de pré-natal nesta tenra
idade.
Os profissionais da área da saúde precisam de mecanismos que o liberem do Dever
Ser imposto pela lei 12.015/09. Eles são respaldados por sua formação acadêmica e por um
olhar diferenciado, pois o quadro de trabalho é composto por equipe multidisciplinar.
Ao ser detectado uma gestante entre essa idade, a equipe não precisaria ser
compelida compulsoriamente a cumprir um princípio mandamental, sem ao menos avaliar o
caso. Esse agir, ao meu ver, seria o mais correto, pelas transformações sociais que vivemos na
área da saúde sexual dos jovens. Nesse sentido, Bruns coloca que o ser humano já nasce
sexuado:
A sexualidade da criança? O que é isto? Criança é sexuada? Essa perplexidade se faz
presente ainda nos dias atuais, não só entre pais e educadores, como também entre a
maioria dos adultos. A descoberta do corpo pela criança, sua curiosidade para ver,
tocar seus órgãos genitais, ou os dos pais, perguntas de como entrou na barriga da
42
mãe ainda desencadeiam mal-estar no adulto. (BRUNS, 2007, p. 324).
Infelizmente o ato sexual ainda é um tabu em nossa sociedade e enquanto tratarmos
desta forma, o mesmo será visto de forma permissiva e proibitiva pelos indivíduos como se
não pudesse existir o ato sexual pelo simples prazer e como se a conduta fosse tida, somente,
como lícita se feita como fonte de procriação.
2.2 Sexualidades x Estupro de Vulnerável x Preconceitos
No abuso de vulnerável o bem jurídico maior tutelado, segundo Nucci (2014), é a
dignidade sexual das pessoas tidas por incapazes em razão da idade, não podendo, portanto,
esquecer a evolução dos costumes e, por conseguinte, do entendimento pela “vítima” da
prática do ato por ela cometido e a opção manifestada de assim proceder, sem precisar dar
satisfação à sociedade pelo ato. Assim, segundo Bruns (2007),
cabe, portanto, a cada unidade, família, classe social e momento histórico engendrar
de modo singular, tabu, mitos, preconceitos, repressão sexual e segredos familiares.
O que significa que o ethos familiar é historicamente construído e, portanto, é
dinâmico e singular. (BRUNS, 2007, p. --).
Hoje, quando discutimos acerca de qual idade mínima seria o ideal para o início da
relação sexual, percebe-se que o tema não somente nesta área interfere também em um
assunto bastante polêmico: a menor idade penal. Deparamo-nos com o quão complexo é o
assunto, porque qualquer lei após ser posta para a sociedade, porque a lei é feita para ela,
ganha vida no mundo real e fenomênico através do mundo jurídico.
Dentre as mais significativas alterações que a Lei 12.015/09 trouxe, segundo Grecco
(2009), quando a lei cita o artigo 217-A leciona que a alegada ferramenta jurídica veio para
resguardar as pessoas, com deficiência mental ou outras patologias, que possam diminuir ou
acabar com o discernimento para a prática dos atos sexuais, bem como todas as outras que a
lei cita no mesmo dispositivo, dentre estas, os menores de 14 anos.
Poderíamos até dizer claramente que o artigo do código penal brasileiro trouxe como
principais preocupações do legislador a liberdade e a dignidade sexual do menor. Mas quando
o artigo fecha a idade em torno dos 14 anos não estaria cerceando a liberdade individual
preconizada pelo artigo 5º da nossa Carta Magna e ferindo o princípio da dignidade da pessoa
humana no lugar de protegê-la?
A disposição do corpo, no que diz respeito aos atos sexuais, mesmo para os menores
de 14 anos, não deveria ter essa rigidez. Isto é, não deveria haver a presunção objetiva de um
43
crime ao ponto de a menor de 14 anos grávida – ciente das implicações de procurar uma
instituição para dar início ao seu pré-natal – escolher entre iniciar o pré-natal, mesmo
correndo o risco de seu companheiro sofrer uma ação penal ou deixar a sua gestação à própria
sorte por não querer se submeter a tal sofrimento.
Essa segunda opção seria danosa para a saúde pública em relação às gestantes e seus
conceptos. Se o legislador não tivesse deixado a lei engessada, as equipes multidisciplinares
poderiam agir no sentido de verificar caso a caso.
Assim, no entendimento do Estado uma pessoa com idade entre 12 e 14 anos ainda
não tem um preparo para a vida sexual. Além do que um crime dessa natureza, quando
cometido, pode trazer problemas sérios para o desenvolvimento sexual do menor.
Concordamos em gênero, número e grau quando o ato for resultado de violência contra o
menor.
Sem dúvida, o agente que obriga o maior de 12 e o menor de 14 anos ao ato sexual é
merecedor de reprovação social e penal. Não estamos questionando o dispositivo quando vai
de encontro a esse fato, longe disso. Mas e nos casos em que há o consentimento do menor?
Não caberia ao mesmo decidir sua vida sexual? Não comportaria, pois, cada caso, uma análise
mais minuciosa, a exemplo das equipes multidisciplinares existentes nos ambientes de saúde?
Qualquer tipo de violência tem que ser punida severamente. O que estamos
questionando são os moldes rígidos nos quais estão sustentados esse dispositivo penal.
A vulnerabilidade da gestante menor de 14 anos, sob a égide da redação dada ao
Código Penal a partir do artigo em estudo, provoca hoje conflitos entre os profissionais da
área da saúde, levando o profissional a um difícil Dever Ser, considerando cada um dos
motivos ou razões que o legislador levou para não continuar com os conceitos de presunção
absoluto ou relativo criando outro conceito: a vulnerabilidade, como já definido
anteriormente.
Devemos refletir sobre os reflexos que a não relativização da vulnerabilidade pôde
ser capaz de provocar no que concerne à responsabilização penal objetiva para o
companheiro, que já vive maritalmente com a menor de 14 anos, alterando o entendimento do
Código Penal e a mínima intervenção do Estado.
Verificamos em nossa sociedade inúmeras adolescentes que já tiveram a experiência
da maternidade e que vivem maritalmente com outro adolescente. Essa realidade torna-se, nos
dias de hoje, pública e notória12
. Portanto, a quem iremos imputar o crime se ambos são
12 Nas Unidades Básicas de Saúde de nossas cidades e do nosso país.
44
menores e vulneráveis? Quem estuprou quem? De acordo com os nossos costumes e a
evolução deles fica difícil saber. Logo, essa lei entra em choque com os costumes da nossa
sociedade. Porque lei é para regulamentar os fatos ocorridos em determinado estágio da
sociedade e o estágio que estamos vivenciando choca diretamente com tais modelos.
A doutrina, a respeito da vulnerabilidade, estaria dividida – a exemplo de Rogério
Grecco, que defende o seu caráter absoluto –, não comportando qualquer prova em contrário,
uma vez que tão objetivo já se revela o critério da idade. Há, porém, defensores da
relativização da vulnerabilidade.
Clara é a lição de Mirabete (2006), ao qual nos filiamos e embasamos nossa
pesquisa, e é nesta perspectiva que devemos considerar o caso em concreto em suas
circunstâncias especiais, que no seu Manual de Direito Penal, leciona:
Não se caracteriza o crime, quando a menor de 14 anos se mostra experiente em
matéria sexual; já havia mantido relações sexuais com outros indivíduos; é
despudorada e sem moral; é corrompida; apresenta péssimo comportamento. Por
outro lado, persiste o crime ainda quando menor não é mais virgem, é leviana, é fácil
e namoradeira ou apresenta liberdade de costumes [...]. (MIRABETE, 2006, p. 203).
Assim, para o indivíduo ser punido, no ato de um crime, ele deve ter a consciência da
reprovação de sua ocorrência ante o ordenamento jurídico vigente. Entretanto, a lei abre
espaço para a intervenção do Estado na ocorrência de crimes no quais se observa uma
ausência de culpabilidade.
É nesta seara dificultosa que o profissional da saúde está inserido, ante ao cuidar e o
cercear ao mesmo tempo.
2.2.1 Os direitos da criança e do adolescente à luz da Constituição Federal de 1988 e a lei
8.069 de 1990
Crianças e adolescentes estão colocados de forma prioritária e absolutamente
amparados por direitos fundamentais consagrados no artigo 5º, da Constituição Federal de
1988. Esta prevê uma série de garantias não só aos brasileiros, mas aos estrangeiros residentes
no País. Da mesma forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) propõe em seu
artigo 15º que a criança e o adolescente são titulares de direito à liberdade, ao respeito e à
dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento.
É uma das prerrogativas do Estado, se não a sua própria essência, a tutela individual
e a coletiva para permanecer nesse prisma, mantendo o equilíbrio do sistema, que de certa
forma impõe à sociedade, que o mantém no poder imposições, regras e limites.
45
Assim, a coletividade delega o direito de o sistema agir em prol de si para o bom
funcionamento do todo. Grosso modo, a imposição de regras pode até ser dicotômica, mas o
que queremos dizer é que sem o cerceamento estatal não há harmonia social, posta em
benefício de toda a coletividade, pois há de haver limites para haver paz social.
Um exemplo sofisticado de análise crítica do modelo jurídico-institucional do
Estado regulador no Brasil e o conceito de “aneis burocráticos” do Estado.
Formulado por Fernando Henrique Cardoso, esse conceito buscou analisar a
organização política da sociedade brasileira e o papel desempenhado pelo Estado no
processo de industrialização enquanto Estado planejador desenvolvimentista. (MATTOS, 2016, p. 143).
Porém, o Estado não pode extrapolar esses limites, pois deverá fazer uso do mínimo
possível para que esse mesmo sistema continue a viver em simbiose, usando as garantias de
maneira positiva por ser cada indivíduo sujeitos de direito. Até porque a própria sociedade já
se beneficia de seus próprios mecanismos de defesa, impondo suas próprias sanções, a
exemplo da moralidade coletiva na qual busca internalizar nos indivíduos, desde a tenra idade,
conceitos e pré-conceitos, dependendo de rótulos culturais e normatizações sociais próprias,
seguindo o posicionamento de Bruns:
Assim, esse conjunto de procedimentos sociais e institucionais, primordialmente
repressores, é sutilmente internalizado pela estrutura psíquica da criança, que, de
modo consciente ou inconsciente, decodificada os códigos de permissão, proibição,
punição e a expressa em atos e ações no decorrer da sua existência, estando esses
atos e ações em sintonia ou não com as normas e valores morais e sexuais de cada
sociedade. (BRUNS, 2007, p. 325).
Isto é, a liberdade é construída em cima de padrões sociais. É a faculdade ou poder
outorgado à pessoa para que possa agir segundo a sua própria determinação, respeitando as
normas legais. O direito à liberdade, preconizada no artigo 16º da ECA, compreende em
síntese a convivência familiar e comunitária, o direito de ir vir e estar em locais públicos, bem
como a liberdade de opinião, expressão, crença e culto religioso.
2.2.2 Adolescentes e jovens como sujeitos de direito
Após a promulgação da Carta Constitucional de 1988, o Estado deixou claro a sua
preocupação com a proteção da criança e do adolescente, precisamente em seu artigo 227,
onde prescreve que:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao
jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
46
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL,
1988, p. 75).
Afirma-se, com efeito, que o artigo 227 da Constituição Federal consagrou a
Doutrina da Proteção Integral para as crianças e os adolescentes em substituição a “Doutrina
da Situação Irregular”, albergada pelo Código de Menores de 1979. O legislador originário
deu um grande passo para a concretização dos novos avanços em defesa da proteção da
criança e do adolescente por não ter sido na conjuntura anterior priorizado pela atuação do
Estado.
Assim, somente com a Constituição atual foram implantadas medidas concretas que
entraram em nosso ordenamento jurídico, estabelecendo novos modelos da proteção estatal
para os menores de 18 anos, dando início a concretização aos mecanismos específicos de
tutela para a criança e para o adolescente. Nas palavras de Amin:
Vivemos um momento sem igual no plano do direito infanto-juvenil. Crianças e
adolescentes ultrapassam a esfera de meros objetos de proteção e passam a condição
de sujeitos de direitos, beneficiários e destinatários imediatos da doutrina da
proteção integral. A sociedade brasileira elegeu a dignidade da pessoa humana como
um dos princípios fundamentais da nossa República, reconhecendo cada indivíduo
como centro autônomo de direitos e valores essenciais à sua realização plena com
pessoa. (AMIN, 2017, p. 43).
Da doutrina de proteção integral nasceu o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA) – Lei nº 8069 de 13 de julho de 1990, que veio para concretizar o que a Constituição já
havia esboçado. Um mecanismo para efetivar os direitos da criança e do adolescente em
forma de estatuto, dando uma ampla tutela a esses menores, que deixaram de ser alvo apenas
de proteção e assistência para serem titulares ativos da sociedade, com direitos subjetivos e
prioritários dos direitos fundamentais por serem sujeitos que requerem maior proteção,
justamente, por ser pessoa em desenvolvimento. Toda essa gama de proteção deve vir junto
com outros direitos garantidos constitucionalmente, como o direito à privacidade, o direito à
expressão, à ampla defesa etc.
Nem mais nem menos, não devemos, portanto, com a bandeira de proteção integral,
extrapolar essa chancela. Deve-se, porém, entender a dinâmica social, mais precisamente, a
sexualidade dos adolescentes, segundo o que é preconizado na Cartilha feita pelo Ministério
da Saúde pelo Departamento de Ações Pragmáticas e Estratégicas aos Aspectos jurídicos do
atendimento às vítimas de violência sexual, com perguntas e respostas para profissionais da
saúde, onde verificamos:
47
É preciso verificar se ela, objetivamente, concretamente, em razão de sua capacidade
de discernimento, de sua história e de sua experiência de vida, era ou não
‘vulnerável’, ou seja, se ela tinha ou não condições pessoais para consentir com a
prática do ato. Se ela tinha discernimento bastante para consentir com o ato e tinha
condições pessoais de oferecer resistência, não há que se falar em vulnerabilidade. É
evidente, pois, que, hoje, como acontecia nos casos em que se considerava relativa à
presunção, não pode ser considerada ‘vulnerável’, por exemplo, a menor com 13
anos que vive com aquele que com ela praticou relações sexuais, com a ciência e a
aprovação dos pais. E se não for esse o entendimento, todas as pessoas menores de
14 anos estarão condenadas à absoluta abstinência no âmbito da sexualidade, pois,
de acordo com a atual descrição típica do ‘estupro de vulnerável’, se essas pessoas
praticarem qualquer ato libidinoso, o crime de ‘estupro de vulnerável’ estará
caracterizado (CP, artigo 217-A). E isso seria inaceitável. (BRASIL, 2011, p. 25).
A dialética social, a qual está inserida, muda de acordo com o pensamento social do
seu momento histórico. Assim, o que em determinado momento verificamos como verdade,
dependendo do momento mostra-se o inverso daquilo tido como conduta normalmente
determinada. Dessa forma, estereótipos saem do não aceitável para o aceitável, virando na
atualidade comportamento admissível socialmente, e o inverso, por sua vez, passa a ser
considerado verdadeiro, o que se tinha como razoável, virando atitude socialmente proibida.
Referimo-nos, por exemplo, ao fato de a virgindade ter sofrido uma valoração totalmente
oposta.
No passado, não muito distante, quando uma jovem se dizia não ser mais virgem,
havia uma correspondente não aceitação social. Nem mesmo no seu meio etário tinha uma
apreciação positiva. Já hoje, uma jovem de seus quinze anos, ao ser questionada sobre o
momento da sua iniciação sexual, terá receio de dizer que ainda se encontra virgem e ser
colocada como figura estranha ao meio e ficar à margem de seus pares, temendo ser alvo de
chacotas e gozações por parte de seus colegas e amigos.
As transformações sociais, muitas vezes, não são objeto de acompanhamento por
todos os sujeitos, quebrando a dinâmica tida como harmônica. Vejamos o que Eduardo
Campos em seu artigo escreve sobre esse tema:
Há uma evolução natural que impulsiona a sociedade. Há a também natural,
resistência por parte dos mais conservadores, contudo o presente se impõe tal que os
resistentes se tornam minoria. Para gerir essas relações interpessoais, entre maiorias
e minorias, é necessário que os Poderes Constituídos, principalmente o Legislativo e
o Judiciário, adaptem-se às novas demandas da sociedade com a finalidade de
solucionarem eventuais conflitos. (CAMPOS, Online).
Assim, o crime de abuso de vulnerável trouxe uma modificação significativa no
Código Penal Brasileiro, instituindo um tipo penal independente, com elementos próprios.
Para Nucci (2016), o dispositivo em sua nova roupagem desprezou os costumes no sentido de
como as pessoas deveriam se comportar sexualmente perante a sociedade, justificando-se sob
48
o aspecto cultural em que vivia a sociedade brasileira na década de 1940, pois somente as
mulheres de família, ou seja, as mulheres que se casavam virgens eram dignas de receber a
tutela jurisdicional.
Sabemos que os desejos sexuais estão fadados ao cerceamento por parte da sociedade
desde os idos de séculos passados. Sendo público e notório tal comportamento será que essa
sociedade, na conjuntura atual, comporta esse tipo de pensamento e atitudes? Citando Bruns:
[...] e durante longos séculos para a teologia cristã, foi dramática a imagem da
infância. A criança era considerada o símbolo do pecado nessa época. E esse modelo
priorizava a superioridade, autoridade e não a compreensão do pai, em relação ao
lugar da criança e da mulher-esposa. A esta também não era permitida expressar ao
homem-marido afetos e desejos sexuais. (BRUNS, 2015, p. 325).
Os tempos mudam, os costumes também e com eles a norma posta pelo Estado tende
a criar vida ao entrar na esfera social, acompanhando a sociedade, adequando-se e adaptando-
se a ela. Se assim não for, tornar-se-á lei morta, sem força, sem eficiência, eficácia e sem
efetividade social. Porém, a nova redação não pôs fim às controvérsias referente ao tema, ou
seja, não foi razoável para emudecer a discussão a respeito do caráter absoluto ou relativo da
presunção de violência, que se pode entender conforme Nucci menciona:
Discute-se aqui se o legislador ordinário, em que pese à induvidosa necessidade de
se tutelar penalmente a dignidade sexual das pessoas tidas por incapazes em razão da
idade, não terá olvidado a evolução dos costumes e, por conseguinte, da
compreensão pela “vítima” do ato por ela realizado e a vontade por ela manifestada
de assim proceder (ausência de coação física e também psicológica). (NUCCI, 2009,
p. 378).
Entretanto, alguns doutrinadores já se posicionam, acerca da relativização da
presunção de violência, tendo vários julgamentos reativando esse entendimento a discussão
acerca da possibilidade de relativização da chamada vulnerabilidade no meio jurídico. Nota-se
que já se tem vários precedentes jurisprudenciais, que seguem os mesmos caminhos da
presunção de violência. Isso porque o legislador, ao conceituar “vulnerável”, apenas estipulou
as antigas hipóteses que a lei considerava nos casos de presunção.
Nas palavras dos Professores João José Leal e Rodrigo José Leal (2009), seguindo a
linha que a presunção relativa pode ser seguida, mesmo após a promulgação da norma em tela
e
[...] a exemplo da violência presumida, a presunção de vulnerabilidade do menor de
14 anos pode, também, ser afastada diante da prova inequívoca de que a vítima de
estupro possui experiência da prática sexual e apresenta comportamento
incompatível com a regra de proteção jurídica pré-constituída. Mas pode perder o
seu estado de inocência e de ingenuidade, ou seja, de ‘pessoa vulnerável’, que e o
fundamento ético- jurídico do princípio da proteção integral, principalmente se
49
aparentar idade superior e complexão física precocemente desenvolvida. Nesses
casos, a inexistência de violência real e grave ameaça podem eliminar a tipicidade
da conduta de manter relação sexual ou qualquer ato libidinoso com menor de 14
anos de idade. (LEAL & LEAL, 2009, p. 56).
O legislador, quando coloca a presunção como sendo objetiva, não cabendo prova em
contrário, retira do sujeito passivo a capacidade de esboçar seus desejos. Mesmo sendo
menores de 14 anos, os mesmos são socialmente responsáveis pelos seus atos, cabendo-lhes
medidas socioeducativas, como bem explicado nos parágrafos pretéritos.
O argumento de presunção de violência, segundo Nucci, aponta que:
Pode-se argumentar, num primeiro momento, ter a lei 12015/09, ao criar o tipo penal
do art. 217-A, sem nenhuma menção a presunção de violência, provocado à
eliminação do debate acerca do grau de incapacidade para a compreensão do ato
sexual. Em outros termos, a vulnerabilidade seria absoluta. Ter relações sexuais com
menor de 14 anos seria sempre estupro. Assim não pensamos. A alteração da forma
típica descrição do estupro da pessoa incapaz de consentir na relação sexual foi
positiva, mas não houve descriminalização da conduta. Ao contrário, gerou elevação
da pena. Portanto, tendo ocorrido a simples inovação da redação do tipo, não há
força suficiente para alterar a realidade, nem tão pouco os debates havidos, há anos,
nas cortes brasileiras, ao menos em relação à presunção de violência ser absoluta ou
relativa quanto ao menor de 14 anos. (...) (NUCCI, 2010, p. 829).
Em entendimento contrário do relatado no parágrafo anterior, com o advento da Lei
nº 12.015/2009, verifica-se que não há o que se falar em presunção relativa, pois o legislador
endureceu o entendimento da lei. Isto é: foi intolerante em sua redação, sem pesar nos ônus
futuros desse ato.
Desta forma, o parlamento criou um instituto penal diferente do entendimento da
presunção relativa ou absoluta, formando uma situação jurídica que não contempla a
diferenciação do que seria relativo ou absoluto anterior à lei. Foi criado, portanto, um tipo
penal (estupro de vulnerável) e um novo entendimento dos crimes contra a dignidade sexual,
com o maior de 12 e menor de 14 anos sendo incapaz de consentir validamente para a prática
do ato sexual, seja como sujeito passivo, seja como sujeito ativo, sendo totalmente
indisponível seu consentimento e sua liberdade sexual. Em outras palavras: a vulnerabilidade
é absoluta e, assim sendo, praticar atos sexuais com menor de 14 anos sempre será tipificado
como crime de estupro.
É nesse sentido que buscamos compreender o que levou o legislador a adotar a
presunção objetiva como entendimento do artigo 217-A, causando enorme celeuma na seara
jurídica, objetivando o que antes era relativo.
Devemos pontuar uma inovação importante nesta categoria de violação, quando há
presunção de violência absoluta, pois com o advento da nova lei 12.015/09 a presunção de
50
violência passa a ser em tese, absoluta, e não mais relativa.
Encontram-se já jurisprudências que fazem referência a esta temática, que diz que o
estupro cometido contra menor de quatorze anos gera presunção de violência caráter absoluto.
HABEAS CORPUS. PENAL. ESTUPRO COMETIDO CONTRA MENOR DE
QUATORZE ANOS. PRESUNÇAO DE VIOLÊNCIA. CARÁTER ABSOLUTO.
CONSENTIMENTO DO MENOR. IRRELEVÂNCIA. A violência presumida,
prevista no art. 224, a, do Código Penal, tem caráter absoluto, afigurando-se como
instrumento legal de proteção à liberdade sexual do menor de quatorze anos, em face
de sua incapacidade volitiva. 2. O consentimento do menor de quatorze anos é
irrelevante para a formação do tipo penal do estupro, pois a proibição legal é no
sentido de coibir qualquer prática sexual com pessoa nessa faixa etária. 3. Ordem
denegada. (STJ - HC 30873 / MG Habeas Corpus 2003/0177117-6). (REVISTA
JURÍDICA, 2015, p. 36).
Em uma das partes do acórdão do STJ de 27 de agosto de 2015, citado acima, os
desembargadores do STJ, apesar de terem alcançado o entendimento no Tribunal – após o
sobrestamento de todos os processos com o mesmo teor, abuso de vulnerável – não terminou
de forma alguma a celeuma jurídica. Pode até ter resolvido os infinitos recursos ao STJ, mas a
polêmica está longe de ser resolvida nos Tribunais de todo o país, pois quando afastou da área
jurídica a relatividade do crime, aumentou os efeitos deletérios de uma ação penal imposta ao
indivíduo, limitando o leque de soluções possíveis.
Se houvesse a opção de encaminhar a tutela jurisdicional – somente os casos de
absoluta violência sexual coloca a responsabilidade para outros órgãos não jurisdicionais, a
exemplo: as equipes multiprofissionais dos ambientes hospitalares, dentre eles, médicos,
enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, dentre outros – teríamos mais celeridade e
segurança nos processos de casos de violência comprovada. Assim, seria possível agir com a
rigidez que a lei requer nos processos de violência sexual entre os menores de idade,
amparados pela lei 12.015/09, retirando a intervenção jurisdicional desnecessária, separando
da seara jurídica os fatos da vida cotidiana e levando somente para a tutela jurisdicional os
casos esdrúxulos. Vejamos, por exemplo, o julgado do TJRJ a seguir:
TJRJ. Estupro de vulnerável. Consentimento da vítima. Presunção relativa de
violência em face de idade (admite a prova em contrário). Adolescente. Ofendida
com 12 anos de idade. CP, art. 217-A. ECA, art. 2º. “Prática sexual com a plena
concordância da pretensa vítima, durante oito meses de namoro”. Laudo psicológico
e prova oral produzida, coerente e segura, quanto à conduta do acusado, o
consentimento da vítima e sua maturidade biopsicossocial superior à idade
cronológica - discernimento a respeito do ato sexual - afastada a presunção de
vulnerabilidade - caráter relativo da presunção a ser verificado na hipótese.
Atipicidade material. Provimento do recurso para absolver o réu. (REVISTA
JURÍDICA, 2015, p. 15).
51
Os casos de violência sexual deverão ser compulsoriamente notificados. Segundo o
Ministério da Saúde (2011),
a notificação é uma comunicação obrigatória de um fato. Assim, nos casos do artigo
66 da Lei das Contravenções Penais, do artigo 13 do Estatuto da Criança e do
Adolescente e do artigo 269 do Código Penal, a comunicação do fato é feita
mediante notificação.(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2011),
Assim, o que se busca justamente é o atendimento humanizado, diferenciado, sem
rótulos para uma clientela que está fora da categoria violência, albergada pelo presente
dispositivo aqui estudado, dando a liberdade ao profissional habilitado e o poder de decidir,
juntamente, com toda equipe multiprofissional. Essa mesma equipe, pelas transformações do
conceito saúde, vem exigindo cada vez mais profissionais qualificados de todas as áreas,
formando um novo conceito de equipe biopsicossocial.
Não é nosso foco querer abrandar a prática de crimes sexuais contra menores e nem
em relação às práticas de pedofilias existentes, que cresceram de forma assustadora nos
últimos anos, com o advento da tecnologia. É um dispositivo relevante e de grande
importância pela atual conjuntura internacional, que levou o legislador a mudar a
nomenclatura e o entendimento dos Crimes Contra os Costumes.
Queremos um meio termo, pois novos conceitos não foram feitos para ficar
engessados. Até porque estamos diante de fatos do cotidiano, como disserta Eduardo Campos
em seu artigo, citando Miguel Reale (On line) em sua Teoria Tridimensional e o culturalismo
jurídico:
[...] A Teoria Tridimensional de Miguel Reale, na verdade, é a principal
manifestação do culturalismo jurídico de Miguel Reale. Com isso queremos dizer
que na Teoria Tridimensional do Direito há uma dimensão ontológica, pela qual
Reale disseca o ser jurídico, há uma dimensão axiológica, pela qual Reale demonstra
que a essência do fenômeno jurídico é sempre e necessariamente valorativa e,
portanto, cultural. Por fim, há uma dimensão gnosiológica, que representa a esfera
normativa, isto é, a forma própria de conhecimento do ser jurídico, que é a realidade
normativa. (REALE, 1994, p. 24).
O jurista em tela, buscando uma compreensão mais ampla do Direito, criou uma
concepção estrutural capaz de afastar um conceito que só leve em conta o aspecto normativo
do Direito.
Segundo a Teoria Tridimensional do Direito, podemos considerar o direito como um
fenômeno que reúne três aspectos: 1. O Direito Fático, que existe como realidade histórico-
social e cultural; 2. O Direito é Valor, que é sempre o reflexo dos valores adotados pela
sociedade; 3. O Direito é Norma, ou seja, é um conjunto de regras, uma ordenação.
52
A importância desta concepção é que ela imprime ao Direito um impulso dialético,
mostrando-o dinâmico e em contato com a realidade social, livrando-o de ser concebido como
um conjunto de normas tuteladas pelo Estado.
Ainda nessa mesma linha de pensamento, segundo a relatora, Ministra Thereza de
Assis Moura (2015), não se pode considerar crime ato que não viola o bem jurídico tutelado –
no caso, a liberdade sexual – apesar da forte referência ao artigo 213, fora de vigência, na
atualidade, do Código Penal.
Apesar de buscar a proteção de ente mais desfavorecido, para a relatora o magistrado
não pode ignorar situações nas quais o caso concreto não se insere no tipo penal. Partes da
decisão da Ministra em decisão do STJ menciona que:
O direito não é estático, devendo, portanto, se amoldar às mudanças sociais,
ponderando-as, inclusive e principalmente, no caso em debate, pois a educação
sexual dos jovens certamente não é igual, haja vista as diferenças sociais e culturais
encontradas em um País de dimensões continentais. (BRASIL, Online).
Desta forma, torna-se salutar constantemente a revisão de novos conceitos,
entendendo que a sociedade vive de forma dinâmica, mudando seus costumes e criando
outros. Não se pode, diante do entendimento da própria esfera jurídica, obrigar o profissional
da saúde a compreender de forma sistemática o que ainda não foi pacificado nos compêndios
jurídicos. Não podemos deixar de lado o olhar diferenciado de profissionais que acompanham
de perto os casos de adolescentes menores de 14 anos, com vida sexual ativa. Definimos
adolescentes os regidos pelo artigo 2º do ECA, a partir de 12 anos, como já citado.
É nesse sentido que devemos mudar o foco do entendimento do dispositivo aqui
elencado: retirando a obrigatoriedade do profissional da área da saúde, o peso da notificação
compulsória ao Conselho Tutelar, levando ao descrédito da gestante quanto ao atendimento
Humanizado preconizado pelo Ministério da Saúde em instituições hospitalares.
A gestante, ao ser admitida em uma maternidade, leva consigo sentimentos inerentes
ao momento, dentre eles: o trabalho de parto, a saúde do recém-nascido, o medo do
desconhecido etc. Imagine, somado a tudo isso, o próprio momento das transformações
inerente à fase do crescer e do adolescer que por si só geram inúmeros conflitos internos e
externos.
Adicionados ao medo do ambiente hospitalar e da incerteza do tratamento, que será
submetida, como será acolhida pela equipe etc., quais profissionais ela gostaria de encontrar
diante do contexto formado? O profissional repressor ou aquele que, diante de suas dores, a
acolherá, proporcionando conforto e apoio?
53
O momento da consulta do pré-natal é a atmosfera ideal para se fazer toda uma
abordagem referente às condições nas quais ocorreram a gravidez. Na falta da abordagem no
pré-natal, quando a gestante tiver feito as consultas em local diverso do local do parto, o
momento do acolhimento emergencial e/ou em unidade de sala de parto será suprido pelas
equipes de acolhimento de plantão, detectando possíveis casos de abuso sexual ou outros tipos
de violência.
O atendimento às gestantes, menores de 14 anos, com relação sexual consentida é
uma realidade em nossa sociedade. Não podemos fechar os olhos para esses fatos. As
mudanças de paradigmas fazem parte da natureza humana e o legislador não pode ser
indiferente a esse fato quando coloca o nível de proteção como absoluto e não relativo.
Vejamos o que descreve o Manual do Ministério da Saúde sobre o assunto:
Portanto, a presunção relativa foi, na realidade, uma criação doutrinária e
jurisprudencial, que nasceu para arrostar a inflexibilidade da presunção absoluta, que
acarretava imensas injustiças. E foi exatamente por isso que a Lei nº 12.015/2009
abandonou totalmente o criterio da “presunção” e adotou um novo paradigma: a
“vulnerabilidade”. Assim, atualmente, a vulnerabilidade não pode ser interpretada
com base nos mesmos critérios que informaram a concepção da presunção absoluta,
mas, sim, com base naqueles que empolgaram a adoção da presunção relativa.
Portanto, atualmente, de acordo com o novo paradigma estabelecido pela Lei nº
12.015/2009, não basta que a menor conte menos de 14 anos de idade para a
caracterização do “estupro de vulnerável” (CP, artigo 217-A35). É preciso verificar
se ela, objetivamente, concretamente, em razão de sua capacidade de discernimento,
de sua história e de sua experiência de vida, era ou não “vulnerável”, ou seja, se ela
tinha ou não condições pessoais para consentir com a prática do ato. Se ela tinha
discernimento bastante para consentir com o ato e tinha condições pessoais de
oferecer resistência, não há que se falar em vulnerabilidade. (BRASIL, 2011, p. 25).
Antes do advento da Lei nº 12.015/2009, a jurisprudência e doutrina dominante
expressavam uma valoração relativa e não absoluta aos casos; diferente do que é preconizado,
majoritariamente, hoje, com o termo vulnerabilidade.
Assim, existiam casos em que a violência ficta era afastada, tendo em vista a análise
de suas consequências e suas compatibilidades, com a presunção de inocência. Esse
entendimento deveria ser o prevalente na atualidade e não somente nesses casos. Não
devemos lidar com os fatos como algo pronto, com uma compreensão generalista, retirando
do julgador a liberdade de ponderar de acordo com a valoração dos fatos.
Devemos sensibilizar a sociedade para mostrar a importância da participação social
para que as Políticas Públicas se efetivem. O ECA, no seu Artigo 4º, dispõe que:
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público
assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à
54
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
(BRASIL, 1990).
A análise da conduta ofensiva e o bem jurídico tutelado não deveriam nunca ser
dissociados dos critérios para a construção de um projeto de lei.
Adiante, veremos a teoria do direito penal mínimo, que por inúmeros entendimentos
doutrinários, que serão elencados, fundamentam os argumentos por ora expostos, pois, apesar
de não ter previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro, ao longo dos anos vem ganhando
força e sendo defendido por inúmeros doutrinadores estudiosos do Direito.
2.3 Idade do consentimento e idade cronológica
No ano da publicação do Código Penal, no século passado, ainda vigente, o menor de
1940 com menos de 14 anos era tido como absolutamente incapaz de compreender o sentido
ético dos atos sexuais. Hoje no século XXI e com o advento do Estatuto da Criança e do
Adolescente – onde o menor é considerado adolescente a partir dos 12 anos de idade – essa
mesma definição de 1940 continua em vigor. O legislador, ao enxertar no Código Penal a lei
12.015/09, poderia ter equiparado a idade de consentimento com a idade que o Estatuto
definiu como adolescente.
Quando o Estatuto trata dos atos infracionais13
, prescrito no art. 103, separa os
sujeitos em seu compêndio por faixa etária no intuito de sopesar os atos pela idade. A criança,
pessoa de até 12 anos incompletos, se praticar algum ato infracional será encaminhada ao
Conselho Tutelar e estará sujeita às Medidas Protetivas previstas no art. 101.14
Já o
adolescente, pessoa a partir de 12 anos, ao praticar ato infracional responderá de acordo com o
artigo 112, que trata das medidas socioeducativas.15
Os segundos serão ouvidos pela
13 Segundo Aquino (2012) cabe aplicação de medidas socioeducativas ao adolescente que complete 18 anos se à
data do fato era menor de 18 anos. 14
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar,
dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de
responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias
em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à
família, à criança e ao adolescente; IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção,
apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; (Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016); V -
requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI -
inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
VII - abrigo em entidade; VII - acolhimento institucional; (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência;
VIII - colocação em família substituta; VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar; (Redação dada
pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência; IX - colocação em família substituta. (Incluído pela Lei nº 12.010, de
2009) Vigência. 15
Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes
medidas: I- advertência; II- obrigação de reparar o dano; III – prestação de serviços à comunidade; IV- Liberdade
55
autoridade judiciária e resguardados conforme os princípios constitucionais da ampla defesa e
do contraditório. Só após o devido processo legal poderão receber as “sanções” previstas no
art. 112 do ECA qualificada como “Medida Socioeducativa”. Veja a explicação de Aquino em
relação as “sanções” para os menores de 18 anos:
No caso do art. 103, embora a prática do ato seja descrita como criminosa, o fato de
não existir a culpa, em razão da imputabilidade penal, a qual somente se inicia aos
18 anos, não será aplicada a pena às crianças e aos adolescentes, mas apenas
medidas socioeducativas. Dessa forma, a conduta delituosa da criança ou
adolescente será denominada tecnicamente de ato infracional, abrangendo tanto o
crime como as contravenções penais, as quais constituem um elenco de infrações
penais de menor porte, a critério do legislador e se encontram elencadas na Lei das
Contravenções Penais. (AQUINO, 2012, p. 18).
Se o próprio Estatuto trata os maiores de 12 anos como sujeitos aptos a sofrer
medidas socioeducativas, segundo os incisos IV, V e VI, subordinados a liberdade assistida,
inserção em regime de semiliberdade e a internação em estabelecimento educacional, porque
não poderiam consentir com seus atos sexuais? Chega a ser contraditório, pois em um
momento são tratados como totalmente incapazes de responder por seus atos sexuais,
extrapolando os limites da vida privada; em outro, quando o assunto versa sobre atos
infracionais, o Estado se sente no direito de puni-los de acordo com os três incisos
mencionados anteriormente, promovendo “sanções” mais rígidas, dentre elas, internação em
estabelecimento educacional, não comportando prazo determinado e sendo reavaliados a cada
seis meses.
Nesse contexto, quando falamos em presunção de violência, atendemos a uma
interpretação sociológica, segundo João Baptista Herknhoff (1986), que escreve: “processo
sociológico conduz à investigação dos motivos e dos efeitos sociais da lei”, no sentindo de
que a sociedade muda, bem como seus costumes. E sistemática da norma penal, como observa
Carlos Maximiliano (2011), quando escreve sobre a mesma: “O Processo Sistemático consiste
em comparar o dispositivo sujeito a exegese com outros do mesmo repositório ou de leis
diversas, mas referentes ao mesmo objeto”.
Assim, as leis não devem ser interpretadas de forma literal ou gramatical, não
albergando outras interpretações, como afirma Mário Pimentel Albuquerque:
A interpretação literal não excede em muito essa atividade preliminar. Limita-se a
fixar o sentido do texto legal, inquinado de obscuridade, mediante a indagação do
significado literal das palavras, tomadas não só isoladamente, mas em sua recíproca
assistida; V-Inserção em regime de semiliberdade; VI- internação em estabelecimento educacional; VII-qualquer
uma das previstas no art. 101, I a VI.
56
conexão. Atende à forma exterior do texto; preocupa-se com as acepções várias dos
vocábulos; graças ao manejo relativamente perfeito e ao conhecimento integral das
leis e usos da linguagem, procura descobrir qual deve ou pode ser o sentido de uma
frase, dispositivo ou norma. (ALBUQUERQUE, 1997, p. 150).
Não se concebe nos dias atuais, em se tratando da sexualidade, pelos tabus existentes
e ainda mal resolvidos pela sociedade, esse tipo de norma, que não dá margem às
interpretações histórico-evolutiva.16
Isto é, que o maior de 12 e menor de 14 anos, quando
consentido o seu ato sexual pela positivação penal, não detenham capacidade de consentir,
validando seus desejos sexuais. Não se pode, analisando friamente e superficialmente a
realidade, pois a mesma nos mostra que na seara da liberdade sexual muita coisa
se transforma em razão de mudanças ocorridas na sociedade, mudanças comportamentais e
fatos que trazem reflexos relevantes às relações sociais, políticas e familiares.
Assim, não há como pensar e olhar de outra forma o comportamento humano, pois é
dinâmico e é dialético. É como banhar-se num lago: se dermos vários mergulhos, cada vez
que retornarmos e nos banhamos novamente teremos outro momento. Da mesma forma o
legislador de hoje não poderá olhar os fatos sociais como o legislador dos idos de 1940.
Os números falam mais do que qualquer outra coisa. O que devemos realmente
sopesar é o cerceamento da sexualidade por conta de um entendimento equivocado do
legislador. Este que, muitas vezes, está sendo diplomado no poder legislativo por alvo de
protestos do eleitorado brasileiro, quando figuras desconhecidas se lançam no pleito e ganham
não por sua competência, mas pela insatisfação popular. Entram na tribuna sem nem mesmo
saber definir qual papel irá desempenhar no Congresso. Ou mesmo aqueles que, para
demonstrar a sociedade diante dos crimes contra crianças e adolescentes, tentam dar respostas
imediatas na ânsia de tentar resolver de forma austera, esquecendo-se que na sociedade o
Estado não pode dar lugar a normas que comportem cognições diversas. Logo, precisamos de
entendimentos que busquem se adequar a todos os casos.
As leis foram criadas para evitar o estado anárquico, não para o Estado se sobrepor
de tal forma a querer cercear a liberdade de seus cidadãos. Portanto, cabe ao mesmo exigir a
adequação de suas normas, levando-se em conta as transformações sociais.
Devemos, no entanto, exigir um Estado com mínima intervenção sob a vida dos
16A interpretação histórico-evolutiva: Esse método de interpretação conhecido também como progressivo,
conforme se divide em duas modalidades distintas. Uma delas, a extremada, é aquela pela qual o intérprete deve
adaptar o texto legal às novas condições sociais inexistentes ao tempo de sua formação, embora tenha de afastar-
se inteiramente da letra e da vontade do primitivo legislador ou de atribuir a primeira um sentido forçado. A
outra modalidade, por sua vez, é aquela pela qual o intérprete considera apenas aquelas mudanças de conteúdo
que vão surgindo após sua elaboração; e, ainda, é aquela admissível quando o pensamento novo tenha já
penetrado na legislação de alguma forma.
57
sujeitos. Se assim não for, seremos meros expectadores de normas impostas. Não podemos ser
apenas executores sem o equilíbrio de nossos atos, sem sopesarmos seus reflexos a curto e
longo prazo, até para não sermos massificados e coisificados por eles.
2.3.1 O direito penal mínimo
A tese defendida por juristas pátrios e internacionais coloca a necessidade de
adequação razoável entre o bem jurídico tutelado e a conduta ofensiva, destarte que o Direito
Penal só venha a interferir quando houver uma real ofensividade ao bem jurídico, quando não
couber qualquer possibilidade de reparação por outro ramo do direito. A teoria minimalista
penal defende evitar excessos na aplicação do Direito Penal. Sobre a matéria, o jurista Paulo
Queiroz trata o tema da seguinte forma:
Dizer que a intervenção do Direito Penal é mínima significa dizer que o Direito
Penal deve ser a 'ultima ratio, limitando e orientando o poder incriminador do
Estado, preconizando que a criminalização de uma conduta somente se justifica se
constituir um meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico. O
Direito Penal somente deve atuar quando os demais ramos do Direito forem
insuficientes para proteger os bens jurídicos em conflito (QUEIROZ, 2013, p. 33).
Defendendo esta compreensão, alguns juristas fundamentam-se nas garantias
constitucionais17
, tais como: a liberdade, legalidade, contraditório, liberdade de opinião e
expressão, a vida privada etc. E, em princípios do Direito, podemos citar: o da insignificância,
da proporcionalidade, da adequação social, intervenção mínima, dignidade da pessoa humana,
dentre outros.
Aliada à Constituição e aos seus dispositivos também podemos enumerar que
vivemos em um estado democrático de direito, sendo, portanto, inegável que o Direito Penal
deve adequar-se a estas garantias e princípios constitucionais. Necessita, portanto, de uma
política criminal que busque restringir a aplicação do Direito Penal quando o bem jurídico na
esfera penal sofrer efetivamente uma lesão que autorize a aplicação da medida que venha
suprimir a liberdade do cidadão, pois a privação de liberdade precisa ser a última forma de
intervenção do Estado. Nesse sentido, segundo Rassi (2008),
Somente podem ser incriminadas as condutas lesivas à bem jurídicos determinados.
Direito penal deve tutelar condutas graves e ofensivas à bem jurídicos relevantes
17 Os direitos fundamentais são normas jurídicas, segundo Marmelstein (2011, p. 20), que está ligado à ideia de
dignidade da pessoa humana e de limitação de poder, positivados no plano constitucional de determinado Estado
Democrático de Direito, que, por sua importância axiológica, fundamentam e legitimam todo o ordenamento
jurídico.
58
evitando-se a excessiva invasão dos direitos individuais que cabem a cada ser
humano. Em um Estado Democrático de Direito, a norma penal, não é somente
aquela que formalmente descreve um fato como infração penal, ao contrário, a lei
deverá obrigatoriamente selecionar, dentre todos os comportamentos humanos,
somente aqueles que realmente possuem lesam e ofendem a sociedade. (RASSI,
2008, p. 65).
Certamente pensava o legislador, em 2009, que a nova redação do tipo legal, e a sua
definição autônoma como crime de estupro de vulnerável, dissociado do até então art. 224 do
Código Penal, acabaria com a polêmica e passaria a ser visto com a neutralidade que alguns
imaginam possível nos textos legais. Ora, bastava então dizer que ter conjunção carnal ou
praticar um ato libidinoso, com menor de catorze anos, é crime que não mais se questionaria
se existe ou não violência na conduta. Com esse entendimento, o Estado deixa a conduta
minimalista, do Direito Penal mínimo, passando a uma conduta opressora. Dessa forma, a
violência ou passa a ser um elemento indissociável da própria conduta ou simplesmente não é
sequer exigida.
Imaginemos um suposto pai que está diante da nefasta polêmica de registrar ou não o
filho, que tem como genitora uma garota entre seus 12 e 14 anos de idade. Se ele registrar
poderá sofrer processo penal e pegar uma pena longa de reclusão; se ficar calado, é excluído
da paternidade e dos seus efeitos. Qual seria a melhor atitude naquele momento diante do fato
e suas consequências? Entendemos que só irá corroborar com o aumento dos índices de
crianças sem o nome do pai no Registro de Nascimento.
2.4 Métodos e tipos de interpretação da norma
A Ação Penal Pública Incondicionada18
procede-se à vítima se menor de 18 anos ou
pessoa vulnerável. Assim sendo, qualquer que seja o crime sexual, a titularidade para
promover a ação será sempre do Estado, por meio do Órgão Ministerial em caráter privativo,
que independe da vontade da vítima para que o fato seja processado e julgado. A ação penal
incondicionada aqui colocada, assim, não se discute o desejo da vítima.
Se o desejo não pode ser discutido, o problema perpassa a vítima, atingindo também
18 A ação penal pública é condicionada à representação, e incondicionada nos demais casos. A ação penal
pública incondicionada em decorrência das lesões de natureza leve ou grave decorre da súmula do Supremo
Tribunal Federal nº. 608, segunda a qual prescreve que: “nos crimes de estupro, praticado mediante violência
real, a ação penal e publica incondicionada”. O artigo 225 do CP com a edição da nova lei aboliu a ação penal
privada dos crimes sexuais, passando a ação penal pública condicionada à representação sendo a regra geral, a
única exceção, que a faz incondicionada, quando a vítima for ou menor de 18 anos ou pessoa vulnerável. Dessa
forma, a nova redação do artigo 225 compõe que: Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título,
procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.
59
a criança que possa ser fruto de uma relação consentida, por conta da redação da lei
12.015/09, decorrente da vulnerabilidade absoluta.
A autoridade em Direito Penal, Francisco Dirceu Barros, assegura que a não
relativização atenta contra o princípio da paternidade responsável e contra o princípio da
harmonia familiar, pois a garota menor de 14 anos de idade, ao engravidar de um rapaz, o
mesmo não vai querer assumir a paternidade por conta das sanções penais pela mão do
Parquet19
, através da ação incondicionada pública, crime hediondo, cuja pena varia entre 8
(oito) e 15 anos de reclusão, com causa de aumento de pena. Causa-se, dessa forma, um mal
irreparável para o futuro daquela criança, que não terá o reconhecimento de paternidade em
seu registro de nascimento.
Diante disso, não poderá o direito de filiação ficar prejudicado pela intervenção do
Estado, condenando esse jovem ao crime de estupro de vulnerável, acarretando em muitos
contrassensos. Dentre eles, poderemos citar as ações da Corregedoria Nacional de Justiça do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (Online), que participa do esforço nacional para erradicar
o sub-registro de nascimento. Vejamos o provimento nº 13, que dispõe sobre o assunto:
O registro de nascimento solicitado pela Unidade Interligada será feito no cartório
da circunscrição de residência dos pais ou no local de nascimento, conforme opção
dos interessados. Em alguns Estados o serviço já existe e visa facilitar a vida dos
pais na hora da emissão do registro civil de nascimento. O provimento, contudo,
torna o processo muito mais seguro e dinâmico. Caso a criança não tenha a
paternidade reconhecida, a informação será remetida a um juiz, que chamará a mãe e
a facultará de informar o nome e o endereço do suposto pai, a fim de que a
responsabilidade imputada possa ser averiguada e confirmada. (CNJ, Online).
De um lado há um esforço por parte das autoridades na busca ativa do pai; do outro,
temos uma lei “engessada”, que dificulta a mesma, na concretização de outro dispositivo de
lei. Outros dois problemas que podemos citar é: esse mesmo rapaz, ao ser abordado em um
estabelecimento de saúde, passa a ser alvo de indagações entre os profissionais da área por
conta da tenra idade da menor e da obrigatoriedade da notificação por parte dos profissionais.
A equipe poderia estar preocupada neste momento só nos cuidados do binômio mãe/bebê e
em formar laços familiares, porém, mesmo uma relação consensual consentida, o rapaz
receberá a notícia que o caso será levado ao Conselho Tutelar.
O que estamos colocando aqui é a liberdade do profissional de analisar e avaliar,
diante de cada caso, se leva ou não ao conhecimento do Órgão, responsável e habilitado, os
casos concretos ao juizado da infância e da juventude.
19 Ministério Público.
60
Uma última situação, ainda sobre uma relação sexual consentida, mas sob outro
sujeito: a mulher se estiver sendo acusada de ter abusado sexualmente por ter mantido relação
sexual com menor de 14 anos. Lembrando: a lei vale para meninas e meninos menores de 14
anos.
É evidente, como já falamos e reiteramos, que o menor precocemente amadurecido
nas coisas do sexo, seja qual for o motivo que conduz a essa condição, não deixa de merecer a
proteção especial do Direito. Na atualidade, uma menor de 14 anos manter um relacionamento
sexual amoroso é fato na atual conjuntura do nosso país. Vejamos:
Os dados do governo demonstram que o número de adolescentes entre 10 e 19 anos
que se tornam mães no Brasil vem aumentando nos últimos quatro anos. Só no ano
passado, elas responderam por cerca de 30% do total de partos realizados nos
hospitais do SUS. Cerca de 300 mil mulheres nessa faixa de idade foram submetidas
à curetagem pós-aborto. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) indicam que o número de adolescentes grávidas também está crescendo no
país. Entre 2011 e 2012, o total de filhos gerados quando as mães tinham entre 15 e
19 anos quase dobrou: de 4.500 para 8.300. Ainda segundo o IBGE, nessa faixa de
idade 18% das mulheres já engravidaram ao menos uma vez. (CARLOS, 2013, p. 3).
Contra fatos não há argumentos. Devemos manter nas equipes de saúde o diferencial
no acolhimento das adolescentes, diante de tantos conflitos pela própria idade e pelo momento
gestacional vivido, buscando o aprimoramento no atendimento e não o distanciamento,
portanto, devemos repensar esse entendimento majoritário do dispositivo penal.
Ante ao que foi trazido neste segundo momento, verificamos o quão importante se
faz a temática para a sociedade, pois sabemos que as relações sociais entram em constante
metamorfose. Da mesma forma, a norma precisa seguir essa dialética para não perder a sua
eficácia e eficiência social.
Diante do exposto nesse capítulo, verificamos alguns questionamentos e procuramos
responder outros, como: será o cerceamento sexual para adolescentes menores de 14 anos a
solução para outros tipos de práticas, como a pedofilia?
No próximo capítulo, estudaremos a política pública que trata o adolescente e o
jovem como sujeito de direito, delineando a trajetória da política ao longo dos anos, até os
dias atuais.
61
3 PROGRAMA SAÚDE DO ADOLESCENTE (PROSAD): TEXTOS E CONTEXTOS
Muitos países assumiram a causa da prevenção da
maternidade na adolescência, geralmente por meio de
ações voltadas à mudança de comportamento das
meninas. Está implícita em tais intervenções uma crença
de que a menina é responsável pela prevenção da
gravidez e um pressuposto de que, se ela engravidar, ela
é a culpada. Tais abordagens e pensamentos estão
equivocados, uma vez que não conseguem dar conta das
circunstâncias e pressões sociais que conspiram contra
as adolescentes e torna a maternidade um resultado
provável de sua transição da infância para a idade
adulta. (UNFPA, 2013, p. 58).
Há anos nos deparamos com a preocupação do Estado, em resguardar as crianças e
os adolescentes da exploração sexual e de seus efeitos nefastos e, principalmente, no que
tange ao avanço da prática da pedofilia nos meios internacionais. A ocorrência da pedofilia
tem várias aparências, interdisciplinar e complexa. Seu estudo envolve médicos, psicólogos,
assistentes sociais, enfermeiros, operadores do direito, dentre outros profissionais. Em nosso
país o alto índice de pedofilia é um dos fatores de a lei 12.015/09 ter saído do papel.
Neste capítulo, trataremos do Programa Saúde do Adolescente (PROSAD) e seus
contornos ao longo dos anos, como política pública, criado como auxiliar nas mudanças do
perfil de tratamento das crianças e adolescentes, após a promulgação da Constituição de 1988,
passando de objetos a sujeito de direito.
O PROSAD foi o principal protagonista nas ações destinadas ao público jovem e,
principalmente, precursor de políticas criadas na área da saúde sexual no Brasil, tornando-se
um de nossos objetos de investigação.
As políticas públicas para jovens e adolescentes têm sido cada vez mais alvo de
atenção do Estado, principalmente, a saúde sexual e reprodutiva não só no Brasil, mas dos
organismos internacionais, como fonte de pesquisas e debates para a melhoria da saúde desse
seguimento.
Em 05 de agosto de 2013, para concretizar as Políticas Públicas para esse
seguimento, foi promulgado no Brasil o Estatuto da Juventude a ser aplicado aos jovens entre
a idade de 15 e 29 anos de idade e, excepcionalmente, ser aplicado quando na falta de lei aos
adolescentes com idade entre 15 e 18 anos de idade. Nele podemos destacar o artigo 20,
inciso I e III do Estatuto da Juventude.
A política pública de atenção à saúde do jovem será desenvolvida em consonância
com as seguintes diretrizes: I - acesso universal e gratuito ao Sistema Único de Saúde (SUS) e
a serviços de saúde humanizados e de qualidade, que respeitem as especificidades do jovem;
62
II - desenvolvimento de ações articuladas entre os serviços de saúde e os estabelecimentos de
ensino, a sociedade e a família, com vistas à prevenção de agravos. Assim, em conformidade
com o documento do SUS Brasil (2013), a saúde sexual e reprodutiva de adolescentes e
jovens no Brasil, em parceria com o Fundo de População das Nações Unidas, relata que:
De acordo com os dados do Censo 2010 a população jovem, que engloba
adolescentes e jovens na faixa dos 10 aos 24 anos, e de mais de 50 milhões de
pessoas hoje no Brasil, representando cerca de 26,9% do total da população e
conformando, portanto, um dos maiores segmentos populacionais. (BRASIL, 2013,
p. 16).
Muitas vezes as questões sobre a saúde dos adolescentes não têm nenhuma ligação
com patologias e sim com a organização de sua vida nos aspectos biopsicossociais. A saúde
sexual e reprodutiva do adolescente, apesar dos avanços tecnológicos na área médica, ainda
causa controvérsias pelos tabus que envolvem o assunto, ainda muito arraigados em nossa
cultura, principalmente, no seio familiar.
Segundo Gonçalves (2007), geralmente os pais não tiveram as informações
necessárias na infância e, por isso, certamente, tiveram muitas dificuldades na adolescência.
Desse modo, toda aparente liberação da prática sexual ainda carrega conceitos arcaicos sobre
o direito ao exercício da vida sexual de cada um.
Para realizar uma pesquisa avaliativa de uma política pública, que questiona a
utilização de modelos inspirados em avaliações técnico-operativas, devemos primeiramente
fazer uma análise crítica-reflexiva, com um olhar distante do objeto, para não comprometer o
resultado da pesquisa. Isso porque, segundo Guba & Lincoln (2011, p. 27), não existe uma
forma correta de definir avaliação, pois, se existisse, colocaríamos um fim na discussão de
como a avaliação deve ser conduzida e como seriam seus propósitos.
A avaliação precisa estar sempre em constante construção e está bem fundamentada e
esclarecida, pois os referidos autores sugerem que, ao passar do tempo, mesmo que essa
avaliação se torne adequada, ela precisará de reformulações, refinamento, ampliações. Enfim,
a avaliação precisa andar de forma dialética com o fator contextual.
Assim, devemos pensar nossa avaliação com um olhar diferenciado por se travar em
um ambiente hospitalar e pelos estereótipos gerados pela própria atmosfera desenhada em
nossa pesquisa. Portanto, qualquer pessoa que se encontra aguardando um atendimento, seja
para uma simples consulta, seja para um procedimento na área da saúde, depara-se com o
desconhecido, o que pode ser dito ou feito. Todo desconhecido, por melhor que possa parecer-
nos, causa medos e receios e isso é natural do ser humano.
63
Por isso que entre o profissional e o cliente deve ser criado um clima de harmonia,
confiança e segurança. Desta forma, trace esse cliente como: uma adolescente, grávida e
menor de 14 anos.
Uma visita ao médico já nos causa desconforto pelas incertezas e dificuldades de
acesso ao sistema público de saúde. Imagine, após uma consulta de pré-natal, que no mínimo
acontecerá com uma periodicidade de uma vez ao mês. Na sequência, o profissional da saúde
informa que, além do retorno às consultas, a adolescente receberá o Conselho Tutelar em sua
residência, pois pela natureza compulsória e por força de lei, o hospital é obrigado a
comunicar seu caso de gravidez precoce ao mesmo.
Desta forma, seguindo os moldes avaliativos de Guga & Lincoln (2011, p. 59), nos
deparamos com a avaliação de quarta geração, onde, segundo os autores, versa de um modelo
de avaliação em que as reivindicações, preocupações e questões dos grupos de interesse ou
interessados servem como enfoques organizacionais, que são executadas de acordo com
preceitos metodológicos do paradigma de investigação construtivista. Não seria interessante,
antes de levar o caso ao Conselho Tutelar, o profissional de saúde ter sua opinião válida para
avaliar caso a caso?
A equipe precisa comunicar os casos ao Conselho Tutelar e/ou Vara da Infância, de
acordo com o artigo 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente, deixar o médico, professor
ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de Ensino Fundamental, pré-escola
ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento,
envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente e, se não o
fizer, poderá responder por infrações administrativas.
Entende-se que para a prevenção de certos agravos relacionados à adolescência,
bastam simples intervenções em orientação sexual, ou seja, a equipe, interagindo com sua
clientela, analisando os casos e buscando soluções. Novamente nos utilizando de Guba e
Lincoln (2011, p. 57), a substituição da metodologia avaliativa convencional pela
construtivista, não significa que “vale tudo” e que o profissional não ficará vinculado ao olhar
da lei; porém, o seu saber profissional deve ser colocado em questão.
Assim, partimos do pressuposto de que a prevenção é o melhor caminho para frear os
agravos sociais que oneram a nossa sociedade, mas, para isso, as políticas públicas devem
andar de mãos dadas com todos os seguimentos que se possa utilizar para conseguir seus
objetivos.
Devemos avaliar a forma como o combate aos problemas – como gravidez na
adolescência e o crescente aumento de doenças sexualmente transmissíveis em adolescentes –
64
apresentam como estratégia de reorganização na atenção à saúde, que se caracteriza por um
modelo centrado no usuário, demandando das equipes a incorporação de discussões à cerca da
necessidade de humanizar a assistência médico-sanitária em nosso Estado.
No censo de 2000 não houve a coleta de dados do quantitativo de casos de
gravidezes entre menores de 14 anos. A menor faixa de idade pesquisada pelo IBGE em
termos de fertilidade foi a de 15 a 19 anos. Todavia, no último censo de 2010 houve a
necessidade de reduzir esse limite até os 10 anos para avaliar o que estava sendo constatado
pelo aumento de casos de gravidez registrados em hospitais públicos.
Com vida sexual iniciada cada vez mais precocemente e, na maioria das vezes, em
condições de grande vulnerabilidade social, a sexualidade vivenciada precocemente muitas
vezes é acompanhada de gravidez. (ENDERLE et al., 2012).
Segundo dados referentes ao período de 2006 a 2015, divulgados pelo Fundo de
População das Nações Unidas (UNFPA / 2017), o Brasil tem a sétima maior taxa de gravidez
entre adolescente da América do Sul, empatando com Peru e Suriname, com um índice de 65
gestações para cada mil meninas de 15 a 19 anos.
A gravidez na adolescência não é algo novo no histórico do nosso país. Apenas com
o advento da socialização das comunicações e o melhor aparelhamento estatal, no sentido de
ter havido uma atenuada redução de partos em domicílio, foi possível mensurar o número de
gestações pelo banco de dados das instituições hospitalares, sofrendo um maior
sancionamento do Estado e, por parte da sociedade, pela ampla disseminação dos meios de
comunicação de todo o país. Mas sabemos que é bem verdade que nos idos de nossos avós
temos histórico de gravidezes tão precoce quanto na atualidade.
A equipe de saúde deve entender que a seara de cuidados do adolescente é, por
muitas vezes difícil, assim como é o fato de tomar cuidado para não permear suas ações do
dia a dia com valores pessoais, dificultando ou impedindo o ingresso do adolescente ao
serviço de saúde que lhe seja necessário.
Os profissionais devem estar treinados para saberem avaliar o nível de
vulnerabilidade a que esses adolescentes possam estar expostos. A equipe multiprofissional
tem que ter em mente que a unidade de saúde atua para oferecer serviço e não cercear direitos,
pois a ação do profissional não deverá aumentar a vulnerabilidade que a idade já os coloca.
Como fortalecer um vínculo com a equipe multidisciplinar de uma unidade de saúde,
se o profissional tem a obrigação de informar o seu atendimento ao Conselho Tutelar nesses
casos?
65
Como organizar essa estratégia de política educativa na área sexual, tão importante
para minimizar os agravos da gravidez precoce, adequando-se à execução e à disseminação da
lei 12.015/09 entre os profissionais da saúde? Pois uma menor de 14 anos grávida,
independentemente se houve ou não violência, será tida como vítima do crime de abuso de
vulnerável mesmo numa relação consensual, segundo a lei penal vigente.
As leis são importantes em toda a sociedade, até porque são criadas na grande
maioria das vezes em meio a grande repercussão social. Porém, a lei nua e crua não tem o
poder de mudar certas realidades por si só.
Se por algum motivo houver algum atendimento que o profissional da saúde, em sua
tomada decisão, cause conflitos é aconselhável que o faça após discutir com toda equipe
multiprofissional. Se mesmo assim o problema persistir, a rede existe para encaminhar e
buscar soluções e, nos casos de abuso de qualquer tipo, o Poder Judiciário poderá ser
acionado.
A organização de programas voltados a saúde do adolescente requer, efetivamente, a
consideração das dimensões social e coletiva abordadas de forma multiprofissional e
interdisciplinar, envolvendo os diferentes aspectos que interagem no cotidiano dos
adolescentes e no contexto em que estão inseridos, procurando adaptar os conteúdos desses
programas as diferentes modalidades de demandas individuais e coletivas. (FORMIGLI,
2013).
Através das experiências dos profissionais da saúde em sua abordagem diária,
experiências essas que buscaremos entender a dinâmica, os processos e como a política é
executada de forma a entendê-la destaca que as instituições também podem ser pensadas
como texto em seus contextos. Pois, segundo LEJANO (2012), “Vemos o hiato entre texto e
contexto manifestado em numerosas ocasiões [...] tome-se o modelo de governo centrado no
Estado que em sua forma moderna e nada alem do modelo regulatório de governo”.
Para que a nossa convivência em sociedade seja harmoniosa, devemos nos abster, ao
máximo, de praticar comportamentos que causem constrangimentos às pessoas. E, como se
sabe, os comportamentos com conotação sexual são aqueles que maior poder possuem para
despertar sentimentos diversos, como a curiosidade, a libido ou mesmo a indignação.
(GRECO, 2009, p. 605).
Neste viés, este capítulo se propõe a situar a política de proteção do menor em uma
conjuntura mais ampla de mudanças históricas e políticas, que envolveram a ocorrência e
consolidação das políticas sociais destinadas ao atendimento integral da criança e do
66
adolescente no Brasil ao longo dos últimos séculos, principalmente, no começo do século XX
e início do atual, pois
A crise do comércio internacional de 1929 e o movimento de 1930 aparecem como
movimentos centrais de um processo que leva a uma reorganização das esferas
estatal e econômica, apressando o deslocamento do centro motor da acumulação
capitalista das atividades de agro exportação para outra de realização interna.
(IAMAMOTO, CARVALHO, 1983, p. 2).
Buscaremos primeiramente nos dedicar a documentos históricos, procurando a
definição do termo criança e adolescente, fazendo um cotejo com documentos da atualidade e
que tratam dos sujeitos dessa faixa etária na busca de compreender a forma como o Estado
concebeu as políticas de proteção e em que contextos sociais se ativeram a essa concretização.
Pois de acordo com
[...] a análise de contexto da formulação da política, devemos realizar um
levantamento de dados sobre o momento político, condições socioeconômicas, com
atenção para as articulações para as esferas local, regional, nacional, internacional
[...]. (RODRIGUES, 2011, p. 59).
As condições de vida de um determinado segmento social ou parte de uma população
mantém conexão direta com as políticas públicas executadas pelo Estado em seus diferentes
graus de gestão. Nos indivíduos que formam o público infanto-juvenil se torna mais apurada
esse paralelismo, pois estes são dependentes de pais, irmãos, responsáveis, cujas condições de
vida retratam a situação das políticas públicas existentes. Ou seja, as condições de vida podem
ser usadas então como forma de avaliação das políticas públicas na maneira que elas intervêm
na vida dos cidadãos e as reações que provocam (CRUZ NETO; MOREIRA, 1999).
O real conhecimento dos agravos sociais pela sociedade brasileira e a luta pela
garantia ao acesso universal à educação, à saúde e à uma distribuição de renda justa, somado
ao respaldo Constitucional de uma Carta Magna com uma preocupação aos direitos
individuais, estabeleceu uma série de garantias. Dentre elas, podemos destacar as garantias
individuais, assegurando ao cidadão todo o básico necessário para a sua existência digna.
Quando o Estado trabalha em simbiose com a sociedade civil consegue criar e
programar direitos através das demandas formada dessa parceria, com o objetivo de
minimizar seus agravos e aumentar as possibilidades de alcançar a tão sonhada paz social.
Segundo Souza (2016), as políticas públicas repercutem na economia e nas sociedades. Daí
porque qualquer teoria da política pública precisa também explicar as inter-relações entre
Estado, política, economia e sociedade.
67
Para que os direitos individuais possam ser alcançados plenamente, pelo cidadão
comum, os mesmos precisam ser disponibilizados de forma clara no mundo real através de
normas20
criadas pelos seus representantes, apesar do seu custo por imprimir limitações
individuais e coletivas.
Para conseguir este objetivo, é preciso estimular a participação de todos, no sentido
de haver uma compreensão de verificar se o que está sendo legislado está exercendo a paz
social. Para atingir esses objetivos, precisamos fazer duas reflexões: qual reação a norma está
imputando ao mundo fático e se está havendo mudanças sociais positivas, no sentido de
reverter às contradições e mazelas da sociedade. Um bom exemplo disso são as Políticas
Públicas, criadas com o objetivo de diminuir as vulnerabilidades sociais, tratando os desiguais
de forma equitativa, garantindo uma nação, desenvolvida, forte e saudável.
É importante propor linhas de ações, e atender aos anseios sociais pelo legislar, mas
importa também prosseguir nas metas traçadas, acompanhá-las até à sua efetivação,
(re)avaliar, produzir e devolver os resultados.
A criança e o adolescente, por muitas décadas, figuraram como objetos e não sujeitos
de direito21
. A construção de uma legislação específica somente ocorreu pós República Nova.
A Política de Saúde do Adolescente e Jovem institucionaliza um novo olhar sobre o
adolescente, apresentando arcabouço teórico que estimula a reflexão sobre novos
conceitos, estratégias e ações na área de promoção da saúde voltada para esse grupo
etário (RAPOSO, 2016, p. 40).
Falar em futuro da nação, é vislumbrar as gerações vindouras; é focar mais
intensamente no desenvolvimento e execução dos direitos humanos, de sujeitos que serão os
principais atores da nação, permitindo melhorar e acelerar a luta contra a pobreza, a
iniquidade e a discriminação de gênero, na construção de uma sociedade melhor e igualitária.
A reorientação do modelo de atenção à saúde deu-se em 1988, a partir da criação do
Sistema Único de Saúde (SUS). Todavia, ainda trilhamos caminhos a procura da
universalidade, integralidade, equidade e participação social para o ser adolescente,
cidadão que deveria ter prioridade nas políticas públicas, considerando o ECA. A
20 Na verdade, o Direito, que constitui o objeto deste conhecimento, é uma ordem normativa da conduta humana,
ou seja, um sistema de normas que regulam o comportamento humano. Com o termo “norma” se quer significar
que algo deve ser ou acontecer, especialmente que um homem se deve conduzir de determinada maneira. É este
o sentido que possuem determinados atos humanos que intencionalmente se dirigem à conduta de outrem.
(KELSEN, 1960, p. 3). 21
A inserção na agenda pública brasileira da atenção integral à saúde de adolescentes e jovens decorre da
mudança de paradigma expressa na concepção ampliada de saúde como direito social e dever do Estado e na
doutrina da proteção integral preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). (...) regulamenta a
proteção da infância e da adolescência e reconhece as crianças e os adolescentes como sujeitos de direitos e
portadores de necessidades especiais. Nesse sentido, este marco legal configura uma perspectiva de análise para
contextualização dos direitos da adolescência e juventude no âmbito da saúde.
68
partir dessas orientações é criado o Programa de Saúde do Adolescente (PROSAD,
com propostas de saúde integral aos jovens, porém suas diretrizes mostraram-se
incipientes, fragmentadas e pontuais). Outros autores mencionam que os objetivos
eram limitados com ações desarticuladas, sem a participação juvenil e com falta de
prioridade e de legitimidade política. Com a insuficiente aderência do PROSAD no
contexto nacional, emerge o Programa de Saúde da Família (PSF/ESF), e os
adolescentes passam a serem vistos como membros da família e redirecionados para
o atendimento geral, desconsiderando suas especificidades e identidades. (BRASIL,
2013, p. 41).
3.1 Marco legal como consolidador de direitos
A consolidação e reconhecimento desses sujeitos pelo Estado só foi constituído com
o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 13 de julho de 1990. Este veio
para garantir a doutrina de atenção integral e configurou-se um marco legal dos direitos da
adolescência e juventude no âmbito da saúde.
Na essência do ECA foram elencados – especificamente no título II, capítulo I,
artigos22
que tratam do direito à vida e a saúde (arts. 7 ao14), logo depois no mesmo título no
capítulo II nos arts. 15 aos 1823
– que a criança e o adolescente não serão mais tratados como
objeto de direitos, mas como sujeito de direitos, outorgando-lhes direito à liberdade, ao
respeito e à dignidade.
A Organização Mundial de Saúde (OMS), por sua vez, define a adolescência como o
período da vida que vai precisamente dos 10 anos até os 19 anos, 11 meses e 29 dias. Nessa
fase, ocorrem três processos significativos para o desenvolvimento humano: do ponto de vista
social a passagem da infância para a vida adulta, com a admissão de papéis adultos e a
emancipação em relação aos pais; do ponto de vista biológico a puberdade, com a maturidade
sexual e reprodutiva; e, do ponto de vista psicológico, a organização de uma identidade
marcada para a subjetividade (OMS, 2012).
22 Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas
sociais públicas (grifo nosso) que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em
condições dignas de existência. (...) (Incluído pela Lei nº 13.257, de 2016) § 9o A atenção primária à saúde
fará a busca ativa da gestante que não iniciar ou que abandonar as consultas de pré-natal, bem como da
puérpera que não comparecer às consultas pós-parto. (Grifo nosso). (Incluído pela Lei nº 13.257, de 2016)
Art. 11. É assegurado acesso integral às linhas de cuidado voltadas à saúde da criança e do adolescente, por
intermédio do Sistema Único de Saúde (SUS), observado o princípio da equidade no acesso a ações e serviços
para promoção, proteção e recuperação da saúde (...). 23
Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade,
ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos
civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.
69
Ainda segundo a OMS24
, a adolescência é o período de transição entre a infância e a
vida adulta, caracterizado pelos impulsos do desenvolvimento físico, mental, emocional,
sexual e social e pelos esforços do indivíduo em alcançar os objetivos relacionados às
expectativas culturais da sociedade em que vive.
A puberdade, portanto, não deve ser confundida como sinônimo da adolescência,
visto que a puberdade faz parte da adolescência. No aspecto conceitual, o processo de
adolescer pressupõe amadurecimento corporal, sexual, psicológico e social, finalizando
quando assume sua identidade pessoal e profissional (FORMIGLI; COSTA; PORTO, 2012).
Segundo a UNICEF (2011), há duas etapas na adolescência, considerando-se como
fase inicial da adolescência o período que se estende dos 10 aos a 14 anos de idade. Em geral,
é nessa etapa que começam as mudanças físicas, normalmente, com uma aceleração repentina
do crescimento, seguida pelo desenvolvimento dos órgãos sexuais e das características
sexuais secundárias. Essas mudanças externas frequentemente são bastante óbvias e podem
ser motivo de ansiedade, assim como de entusiasmo ou orgulho para o indivíduo cujo corpo
está passando pela transformação.
A segunda fase da adolescência vai dos 15 aos 19 anos de idade. A essa altura, as
principais mudanças físicas normalmente já ocorreram, embora o corpo ainda se encontre em
desenvolvimento. O cérebro continua a se desenvolver e a se reorganizar, bem como a
capacidade de pensamento analítico e reflexivo é bastante ampliada. No início dessa fase, as
opiniões dos membros de seu grupo ainda são importantes, mas essa influência diminui à
medida que o adolescente adquire maior clareza e confiança em sua própria identidade e em
suas opiniões (UNICEF, 2011).
Utilizamos neste trabalho a definição cronológica da OMS que considera como
adolescente o indivíduo de 10 a 19 anos de idade, compatível com a referência dos serviços de
saúde, que foi nosso ambiente de pesquisa. Essa definição se justifica pelo fato de o indivíduo
iniciar a partir dos 10 anos várias transformações no seu corpo, no seu crescimento, na sua
vida emocional, social e nas suas relações afetivas.
Verificamos a importância da atenção integral da saúde do adolescente por conta das
transformações sofridas nesta faixa etária, pois o adolescente vive sob uma fase
24 A adolescência se inicia com as mudanças corporais da puberdade e termina quando o indivíduo consolida seu
crescimento e sua personalidade, obtendo progressivamente sua independência econômica. Além da integração
em seu grupo social, é um período em que ocorrem mudanças biológicas e fisiológicas. É neste momento que o
corpo se desenvolve físico e mentalmente tornando-se maduro, dando capacidade para o adolescente gerar filhos.
(OMS, 2012).
70
transformadora biopsicossocial. Este momento é tão importante que suas consequências terão
reflexos permanentes e influenciarão positivamente ou negativamente em sua vida adulta.
Segundo Alencar (2017), a adolescência é uma fase de transformações
biopsicossociais. No âmbito familiar compreende um período no qual o indivíduo não é mais
visto ou tratado pelos pais como criança, mas também não é um adulto. Por esta razão, com
objetivos comuns e requerendo a participação de todos, o poder público, a sociedade e
especificamente os trabalhadores da saúde devem trabalhar de forma conjunta e
interdisciplinar no sentido de executar as políticas públicas destinadas ao público juvenil.
O atendimento ambulatorial dos adolescentes visa prestar direcionamentos e
esclarecimento quanto à orientação em planejamento familiar, Infecções Sexuais
Transmissíveis (IST’s), em seu amplo sentido, informando quanto aos metodos contraceptivos
e usando uma abordagem simples e accessível ao usuário.
Mesmo com carência de recursos humanos e financeiros tenta-se levar uma prática
eficaz, buscando, junto à população usuária, mecanismos de combate à desinformação, pois é
na informação que está o principal mecanismo de combate a certos agravos da saúde do
adolescente, com uma ampla divulgação em tempo hábil de informação para total
homogeneização do conhecimento e com quebras de tabus relevantes aos momentos que as
usuárias estão atravessando.
Na vida, tudo se transforma e por que não os costumes de uma época? O olhar
dialético que transforma as ações e estruturas, a partir da concepção de que os sujeitos se
constroem estabelecendo relações consigo mesmo e com o meio que interage, não pode ser
esquecido.
Ao estudarmos os fenômenos in loco o nosso olhar e o pensar dialético foram ao
longo do tempo agregando valores e enriquecendo as manifestações objetivas e subjetivas de
cada fenômeno de cada sujeito, que se movimentavam e configuravam ao processo de
elaboração dos acontecimentos. Ou seja, para o encontro de algumas respostas da
problematização da pesquisa, em sua configuração conteve em sua produção: histórias, seu
conteúdo marcado por mediações, diálogos, vivências e transformações decorrentes do nosso
processo de apropriação dos saberes para que, em outro momento analítico, pudesse embasar
os nossos resultados.
Devemos refletir sobre políticas públicas no sentido de pensá-las como um desafio,
diante dos dados crescentes de gravidezes entre adolescentes, onde a dificuldade maior será a
efetivação da lei, a longa mão coercitiva do Estado e a reversão do quadro do descaso, desse
público em tenra idade.
71
3.2 O histórico da política pública do Brasil a partir da nova ordem constitucional
O primeiro Código de Menores do País surge no contexto de profundas
transformações globais, políticas e estruturais. Esse período representa um divisor de águas
para a política protetiva da infância e um período que se caracteriza pela forte reestruturação
do Estado e da economia.
Em 1997, o XL Conselho Diretor da Organização Pan-americana da Saúde (OPAS),
Escritório Regional da Organização Mundial da Saúde (OMS), recomendou aos
países membros que incluíssem em suas agendas públicas políticas de atenção à
saúde e preocupação com o desenvolvimento dos adolescentes e jovens. (TANAKA;
MELO, 2001, p. 9).
O país começa a perceber a criança e o adolescente como sujeitos merecedores de
tratamento diferenciado. Mesmo em meio à adversidade de finalidade já se percebe um ganho
para o norteamento das futuras ações para o público infanto-juvenil.
No arcabouço normativo da primeira codificação exclusiva voltada para tratar dos
interesses destinados à criança e ao adolescente não houve uma definição clara de infância,
justiça e igualdade. Para Cohn (2005, p. 14) a ideia de infância pode não existir, pois esses
três termos elencados são frutos de um esquecimento institucional de uma época autoritária e
patriarcalista.
Diante da conjuntura política institucional, o governo do país não teve a preocupação
com o problema do menor no sentido de acolhê-lo, entendê-lo, mas, sim, buscar soluções
paliativas, que resolvessem problemas pontuais. Como remarca Paes Leite,
O cenário político e social nacional, no início do século XX, eram bastante
conturbados, período onde se estabelece a preocupação com a criminalidade juvenil.
Nesse contexto nasce à primeira codificação exclusivamente voltada para tratar dos
interesses das crianças e adolescente, qual seja o Código de menores, sancionado em
1927, o chamado “Código Mello Mattos”, em homenagem ao autor do projeto.
Nesse diapasão, o Estado assume a responsabilidade legal pela tutela da criança órfã
e abandonada. A criança desamparada, nesta fase, fica institucionalizada, e recebe
orientação e oportunidade para trabalhar. A primeira codificação voltada para os
menores tornou-se um marco referencial, cumprindo papel histórico. (PAES; LEITE,
2013, Online).
Percebe-se que nestes primeiros documentos legais o objetivo maior não era a
proteção do menor e sim a regulamentação dos atos infracionais.
O Golpe Militar de 64 posicionou o Brasil, frente ao panorama internacional da
guerra fria, em linha com os países capitalistas. Uma ditadura militar foi instituída,
interrompendo por mais de 20 anos o avanço da democracia no país. Em 1967,
houve a elaboração de uma nova Constituição, que estabeleceu diferentes diretrizes
para a vida civil. A presença autoritária do estado tornou-se uma realidade. Restrição
72
à liberdade de opinião e expressão; recuos no campo dos direitos sociais e
instituição dos Atos Institucionais que permitiam punições, exclusões e
marginalizações políticas eram algumas das medidas desta nova ordem trazidas pelo
golpe. Como forma de conferir normalidade a está prática de exceção foi
promulgada em 1967, nova constituição Brasileira. O período dos governos militares
foi pautado, para a área da infância, por dois documentos significativos e
indicadores da visão vigente: A Lei que criou a Fundação Nacional do Bem-Estar do
Menor (Lei 4.513 de 1/12/64) ƒ O Código de Menores de 79 (Lei 6697 de 10/10/79).
(LORENZI, 2017, p. 58).
Nesse contexto nasce o termo “menor em situação irregular”. É nessa estrutura que,
timidamente, o Estado brasileiro vem assumindo a responsabilidade legal pela “proteção da
criança órfã e abandonada”.
O “Código de Mello Mattos”, que vigorou até 1979, trouxe em seu corpo legal
inovações para o público infanto-juvenil, porém, deixou uma grande lacuna em sua estrutura
normativa não contendo a definição de seus sujeitos.
Em 1927, por meio do Decreto nº 17.943-A, foi constituído o Código de Menores,
que se tornou conhecido como Código Mello Mattos, consolidando as leis de
assistência e proteção, aos menores. O código divide os menores em abandonados e
delinquentes. Tipificam os menores em vadios (artigo 28), mendigos (artigo 29) e
libertinos (artigo 30). No artigo 159, o código determina: recebendo o menor, o juiz
o fará· recolher ao abrigo, mandar· submetê-lo a exames médicos e pedagógicos, e
iniciar· o processo que na espécie couber. (BAPTISTA, 2016, p. 25).
Revogado pela criação do segundo Código de menores (lei nº 6.697/79) a doutrina da
situação irregular incorporou a nova concepção assistencialista à população infanto-juvenil.
Entretanto, mais uma vez os legisladores da época foram omissos na definição do termo
criança ou adolescente em seu arcabouço legal.
Assim, o advento do ECA (lei nº 8.069/90), em um contexto de fortes mudanças
sociais no país, veio para revogar o segundo Código de menores. Focado na doutrina de
proteção integral, tutelado pelo artigo 227 da Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e do
Adolescente veio claramente definir seus sujeitos, deixando de serem objetos a sujeitos de
direito.
O legislador do atual Código, em seu primeiro artigo, prescreveu como principal
objetivo a proteção integral à criança e ao adolescente. Já no artigo seguinte houve a definição
dos seus sujeitos de direitos nos termos do ECA/90 que afirma: “Considera-se criança, para os
efeitos desta lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos e, adolescente aquela entre doze
e dezoito anos de idade”. (ECA, 1990).
Esses primeiros dispositivos marcaram uma nova era para a legislação de proteção à
criança e ao adolescente no país. O moderno estatuto trouxe uma nova visão da situação do
73
menor, tratando-o de forma diferenciada, diferentemente dos antigos Códigos que
consideravam o menor em pé de igualdade com os outros sujeitos infratores.
Nesse sentido, o Estatuto apresentou um novo direcionamento, apesar da nova ordem
social implantada pelas políticas neoliberais, onde a busca por novos mercados fez com que
os mesmos se adequassem às novas dimensões capitalistas. Logo,
É sob esse prisma, da dimensão transgressora da palavra, que se pode talvez avaliar
o efeito devastador da corrosão dos direitos em curso no país. As possibilidades do
campo democrático construído nos últimos anos parecem, hoje, na segunda metade
da década de 90, desafiadas por um projeto conservador que já se traduz em práticas
reais, no qual a neutralização da dimensão ética da justiça e da igualdade em nome
dos critérios de eficácia e racionalidade técnica da economia, passa pela imposição
de uma ordem pública subtraída das esferas políticas de representação, negociação e
interlocução. (TELLES, 1996, p. 8).
Percebe-se, portanto, que o ECA representa um divisor de águas no histórico da
proteção integral infanto-juvenil no Brasil. Além dos direitos para todas as crianças e
adolescentes brasileiras, criou medidas protetivas e socioeducativas. O Estado se mostrou
garantista das necessidades básicas desses sujeitos, chamando à responsabilidade a família e
toda a sociedade, levando em conta as diversas necessidades desse público.
Contextualizando a política para o “menor”, marcaremos como ponto de partida os
primeiros anos do século XX, onde em 1922 foi inaugurado o primeiro estabelecimento
público para “menores” no Rio de Janeiro. Logo após esse período, em 1924, houve a criação
do Tribunal de Menores: arcabouço jurídico que serviu de base para o primeiro Código de
Menores brasileiro. É a sociedade brasileira experimentando os primeiros planos jurídico-
institucionais direcionados para o público infanto-juvenil.
Em um dos primeiros momentos da história da ditadura do nosso país, nos idos de
1930, o governo de Getúlio Vargas criou o Ministério da Educação e Saúde Pública. Esse
processo leva à formulação do conceito de menor marginalizado como uma maneira
ideológica de ocultar as condutas da ditadura brasileira.
Entretanto, esse conceito foi questionado pelos movimentos sociais da época. Em
decorrência, radicalizou-se uma insubmissão ao regime autoritário, culminando com a criação
de um novo conceito de movimento nacional de meninos e meninas de rua na conquista de
direitos. Esse fato constitui-se um marco importante dos movimentos sociais de todo o país
em prol da garantia de direitos desses sujeitos.
Já na década de 40, um acontecimento relevante para a legislação brasileira foi a
promulgação do Código Penal Brasileiro, decreto Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940,
que só veio a vigorar em 1942, sob a égide do então presidente Getúlio Vargas, decreto esse
74
criado durante o período do Estado Novo. Este Código definiu a idade do consentimento (14
anos) que perdura até a atualidade, observação importante para o nosso estudo.
Em 1942, o Governo criou o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), órgão do
Ministério da Justiça (MJ), que funcionava como um “sistema penitenciário para a população
menor de 18 anos”. Nesse mesmo período, precisamente em 1943, tivemos a promulgação da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e obrigatoriedade do Ensino Fundamental.
Em nossa contextualização, não poderíamos deixar de citar a promulgação da
Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948, ferramenta normativa de abrangência
internacional que inspirou alguns dispositivos de legislações futuras, dentre eles o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA). Esse documento foi proclamado pela Assembleia Geral das
Nações Unidas, em Paris, como uma norma comum a ser alcançada por todos os povos e
nações, estabelecendo pela primeira vez a proteção universal dos direitos humanos.
Instalado em João Pessoa/Paraíba, chegando ao Brasil quatro anos após seu
surgimento no exterior, o Fundo das Nações Unidas (UNICEF do Brasil) em 1950 trouxe para
o país programas de proteção à saúde da criança e da gestante nos estados do Nordeste do
Brasil. Seu principal objetivo era promover a defesa dos direitos, ajudando a dar resposta às
suas necessidades.
Na década de 50, especificamente em 20 de novembro 1959, ano da promulgação da
Declaração Universal dos Direitos da Criança, houve um aumento do elenco dos direitos
aplicáveis à população infantil. Inspirado nessa declaração foi criado, em 2005, o Conselho
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), que tem como base
fundante o respeito aos direitos da liberdade, estudos e convívio social das crianças.
Como já citado anteriormente, revogado o Código de Menores Mello Mattos em
1927, surge o Código de Menores de 1979, incorporando a nova concepção assistencialista à
população infanto-juvenil. Com este segundo Código, a legislação brasileira dá mais um
passo para a consolidação e definição dos direitos da Criança e do Adolescente no país.
O novo Código surge em um contexto de constituição de movimentos sociais
compostos por diferentes organizações da sociedade civil. Era um momento de bastante
agitação no país orquestrado pela problemática de combate à inflação e controle de preços.
Como avalia Carvalho:
É fato inconteste a ampliação do Estado na relação com a sociedade civil,
mobilizada em suas lutas por direitos, inclusive, direitos sociais de interpelar o
próprio Estado. Assim, o artigo 6º da Constituição Federal estabelece como direitos
sociais: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social,
proteção à maternidade e à infância e, finalmente, a assistência aos desamparados.
75
Assim, os direitos fundamentais – pelo menos formalmente – se convertem no
núcleo básico do ordenamento constitucional brasileiro. (CARVALHO, 2008, p. 20).
Em meio a essa turbulência política e econômica, a sociedade civil criou em 1985 o
Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, de várias partes do país, reconhecendo
pela primeira vez, crianças e adolescentes como sujeitos participativos.
Atualmente, tendo como prioridade o cumprimento do Estatuto da Criança e do
Adolescente, o movimento atua como um fiscal da defesa e promoção dos direitos da criança
e do adolescente das camadas populares do Brasil, assegurando as políticas públicas como
alvo principal nos diversos níveis do sistema de tutelas para a garantia de direitos espalhados
no país. E, pela importância da matéria, teve que vir com força constitucional no sentido de
“ser parte ativa na consolidação e definição de seu lugar na sociedade” (COHN, 2005). Ainda
na avaliação do autor:
(...) a criança dos estudos estrutural-funcionalistas se vê relegada a protagonizar um
papel que não define. Suas ações e representações simbólicas não precisam ser
estudadas, portanto, para que se defina seu lugar no sistema: são dados pelo próprio
sistema. (...) recusa-se às crianças, portanto uma parte ativa na consolidação de
definição de seu lugar na sociedade: elas são vistas como um receptáculo de papéis
funcionais que desempenham, ao longo do processo de socialização, nos momentos
apropriados. (COHN, 2005, p. 10).
Em 1986, diante de toda essa pressão dos seguimentos da sociedade civil, houve a
criação da Comissão Nacional da Criança Constituinte. Neste mesmo ano ocorreu a criação da
Frente de Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes, fazendo parte de um dos
principais e mais importantes marcos históricos brasileiros. Essas iniciativas aconteceram um
pouco antes da promulgação da Constituição Federal do Brasil, onde faz referência tardia a
inclusão da concepção universalista de direitos sociais, como destaca:
Esta Constituição, encarnando as lutas democráticas, outorga uma importância
substancial aos direitos humanos fundamentais, convertendo todos os direitos
consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos em Direitos Legais,
constituindo, assim, a referência fundadora de uma modernidade democrática.
(CARVALHO, 2008, p. 20).
Durante a confecção da futura carta magna do país, “um grupo de trabalho se reuniu
para concretizar os direitos da criança e do adolescente”, resultando no artigo 227, que foi a
base para a futura elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Essa sustentação, uma vez consolidada na realidade brasileira, deu um viés crítico à
realidade social e governamental do país, no sentido de criar uma política que atendesse de
forma abrangente e integral o público-juvenil, como uma categoria de interpretação
transformadora à nova Doutrina Jurídica de Proteção Integral à Infância.
76
Um dos mais importantes tratados de direitos humanos foi a elaboração da
Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em 1989, ratificado por todos os países
membros da ONU, com exceção dos Estados Unidos e da Somália.
Concebido da participação de vários segmentos sociais, a partir de amplo debate em
1990, o ECA é considerado um documento exemplar de direitos humanos. Materializa os
mais substanciais avanços democráticos do país ao tornar regulamentados os direitos da
criança e do adolescente.
Em 1994, a Conferência Mundial de População e Desenvolvimento realizada no
Cairo incorporou o Plano de Ação de direitos reprodutivos na normativa internacional,
legitimando os adolescentes como sujeitos que deverão ser alcançados pelas normas,
programas e políticas públicas (MANUAL DE ATENÇÃO À SAÚDE DO ADOLESCENTE,
2008).
Com a sanção da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), em 1993, ficou
definido que a assistência social é um direito do cidadão e dever do Estado. Três anos depois,
o país define e regulamenta o sistema de educação do Brasil, com base nos princípios
constitucionais da Constituição Brasileira, sancionada a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB). E mais tarde, em 2000, aprova o Plano Nacional de Enfrentamento à
Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, marcando a consolidação da luta contra a
violência sexual Infanto-Puberal.
A materialização das políticas sociais brasileiras e a luta por direitos não é algo novo
no país. Para entendermos esse processo, torna-se crucial analisar o tecido contraditório dessa
sociedade orquestrado pela dominação do capital que tem que se renovar de vez em quando
para poder se firmar no mercado em busca de novas estratégias para perdurar na hegemonia
do poder mundial.
O que se verifica na instituição trabalhada, após análise dos dados colhidos nas falas
dos profissionais, é que há predominância de profissionais regidos pelo regime celetista em
um hospital público federal, reflexo de uma política mercantilista e privatista da saúde
brasileira. Com o discurso de melhoria na gestão, transparência nos gastos públicos,
ampliação e modernização dos hospitais universitários brasileiros, a Empresa foi criada pela
Lei 12.550 de 15 de dezembro de 2011, ao final do governo de Luís Inácio Lula de Silva,
Sob a justificativa de maior autonomia no uso dos recursos, legalização dos
contratos de trabalho e aprimoramento do processo de gestão das instituições de
ensino e saúde, o governo Lula se despede de seu mandato, deixando a herança das
Fundações Estatais de Direito Privado, ainda que sob nova roupagem: a EBSERH.
Após a rejeição da MP n. 520 no Senado, em 2011, o então presidente da República,
77
por meio da Lei n. 12.550, autoriza a criação da EBSERH, empresa com
personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio. Com o discurso da
ineficiência da gestão pública e o alto custo dos hospitais federais, decorrentes da
burocracia da legislação brasileira, a EBSERH é apontada pelo governo como
"única" solução e tem ganhado espaço e adesão junto às universidades federais.
(SODRÉ, 2013, p. 365).
Além de constatar a falta de treinamento para os profissionais que entraram após o
conjunto de ações empreendidas pelo Governo Federal, em 2011, no intuito de recuperar os
hospitais vinculados às universidades federais do país, ocorreu dentre essas ações a
reestruturação da composição do quadro de pessoal, que há anos encontra-se deficitária por
diversos motivos, como o grande número de aposentadorias sem reposição ao longo dos anos.
Isso porque
Os Hospitais Universitários Federais, espalhados pelo território brasileiro,
totalizando 46, apresentam problemas comuns, como: o quadro de servidores
deficitários, fechamento de leitos e serviços, sucateamento de aparelhagem e espaço
físico, flexibilização e precarização dos recursos humanos (DRAGO, 2012, p. 87).
Devemos estabelecer ações para poder superar os desafios no avanço nas políticas
públicas de proteção e garantia de direitos. Precisamos trabalhar no sentido de priorizar
acesso aos direitos, a fim de podermos caminhar para um país livre da miséria. É preciso
lembrar que adolescentes e jovens são o futuro da nossa nação e que muitos estão dentro das
famílias mais pobres, o que exige um olhar especial e políticas públicas específicas voltadas
para essa população.
Quando os profissionais foram indagados sobre ter algum conhecimento de políticas
públicas de saúde para adolescentes e jovens do Governo Federal, 8 (oito), isto é, 53,3% dos
profissionais, mais da metade dos pesquisados, afirmaram “desconhecer” ou “não sei nada”
sobre as políticas públicas voltadas para a juventude, reflexo de uma sociedade que por
muitos anos não reconheceram os jovens como sujeitos, mas objetos de direito.
Neste ponto destaca-se um fator importante e limitador da pesquisa, pois como
indagar e questionar os profissionais entrevistados sobre as Políticas Públicas voltadas para
adolescentes e jovens do governo federal se a grande maioria desconhecia o que está sendo
feito a nível federal, estadual e municipal a este seguimento social?
A sociedade precisa estar em sintonia com as ações governamentais, não só no que
rege direitos de adolescentes e jovens no ordenamento jurídico brasileiro. Precisa estar atenta
para saber o momento de exigir e não somente permanecer em sua zona de conforto.
Em 1999, a ONU formulou um processo de acertos e apreciação da execução do
programa (Cairo+5), dando um salto nos direitos dos jovens. Na revisão do documento,
78
deixou de ser incluído o direito dos pais em todas as conferências aos adolescentes,
garantindo o direito dos adolescentes à privacidade, à assistência, à saúde reprodutiva, à
informação, ao consentimento informado, à educação e ao sigilo inclusive sexual no currículo
escolar (BRASIL, 2008).
Dando continuidade aos avanços, em relação a forte legislação de proteção para a
população infanto-juvenil, em nome da erradicação do trabalho infantil, foi aprovado em 2003
o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador
Adolescente, um importante aliado contra a exploração infantil.
Em junho de 2003, o Comitê de Direitos da Criança traçou recomendação específica
(Recomendação Geral nº4, de 6 de junho de 2003) sobre o direito à saúde dos adolescentes,
fixando o alcance dos princípios da Convenção Internacional dos Direitos da Criança e as
obrigações dos estados em promovê-lo.
Buscando solucionar direitos que ainda não foram efetivados e garantidos pelo
Estado, foi aprovado em 2006 o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito
de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária e o Sistema Nacional
Socioeducativo (SINASE), forte ferramenta de inclusão social.
No início de 2016, o Congresso Nacional sancionou a Lei Nº 13.257/08 de março de
2016, marco legal para a Primeira Infância. A referida lei estabelece princípios e diretrizes
para a formulação e a execução de políticas públicas em atenção à especificidade e à
relevância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do
ser humano, em consonância com as diretrizes da Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990 (ECA),
onde alterou vários artigos da citada Lei.
A ocorrência dos crimes sexuais, principalmente o estupro, com o advento e a
facilidade de acesso aos meios de comunicação e a criação de redes de combate à violência de
forma ampliada consolida a cultura da notificação de violência contra a criança e o
adolescente, que vem aumentando sensivelmente na sociedade brasileira ao longo dos anos,
ganhando novas configurações legais, como é o caso do crime de estupro de vulnerável.
Imaginemos uma jovem menor de 14 anos grávida, buscando um serviço de saúde
para dar início ao seu pré-natal preconizado pelo Ministério da Saúde, ao ser abordado pelo
profissional após a consulta, que receberá a visita do Conselho Tutelar, pois seu companheiro
cometeu uma tipicidade penal, mantendo conjunção carnal com maior de 12 e menor de 14
anos. Qual o bem jurídico maior a ser tutelado: o que é preconizado pelo Ministério da Saúde
ou o que a lei tutela?
79
A gravidez e o parto constituem-se em eventos essencialmente fisiológicos na vida
da mulher. No entanto, caracterizam-se por provocar variadas e profundas alterações
físicas e emocionais na mulher, o que requer um acompanhamento continua por
parte da família e dos profissionais de saúde. É preconizado pelo Ministério da
Saúde que a assistência pré-natal é de competência da equipe de saúde a qual deve
acolher a gestante desde o primeiro contato na unidade de saúde ou na própria
comunidade. No sentido de iniciar o desenvolvimento do vínculo afetivo nessa fase,
devem ser valorizadas as emoções, os sentimentos e as histórias relatadas pela
mulher e seu parceiro, de forma a individualizar e a contextualizar a assistência pré-
natal. (MS, 2000, p. 34).
Não são só as diretrizes preconizadas ao pré-natal, regido pelo Ministério da Saúde,
que poderão ser atingidas por essa contradição de normas, mas o direito da criança, fruto
desse relacionamento, também poderá ficar cerceado. Pois qual sujeito, sabendo que poderá
responder pelo crime de abuso, irá comparecer para registrar seu filho? Sabendo que a
qualquer profissional, caberá a notificação ao Conselho Tutelar e estando em iminência de
responder uma ação penal? Mesmo diante de uma relação consentida até mesmo vivendo
maritalmente, por ter cometido um pecado capital de ter como companheira uma maior de 12
e menor de 14 anos, que segundo, o legislador, não tem discernimento ou maturidade sexual
para ter uma relação sexual consentida.
3.3 Do PROSAD x Lei 12.015/09
A adolescência é marcada por mudanças corporais e comportamentais, que causam
diversos conflitos. É uma etapa do desenvolvimento humano marcada por profundas
transformações, não apenas físicas, mas também é o início da transição psicológica da
infância para a idade adulta (HOPKINS, 1983).
O artigo 227 da Constituição Federal/CF reconhece a importância da abordagem
integral para a saúde do adolescente: a mesma deve ser vista como básica para o
desenvolvimento social saudável da nação brasileira. Neste contexto, a Emenda à
Constituição em 2010 reforçou que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Com a introdução desse artigo em nosso ordenamento jurídico constitucional, cria-se
a obrigatoriedade do poder público de formular políticas direcionadas para a proteção e
desenvolvimento da criança e dos adolescentes como sujeitos de direito e não como meros
80
objetos de intervenção no mundo adulto e, dentre algumas políticas criadas, o PROSAD25
consta como um marco nesse contexto.
A legislação de proteção da infância e do adolescente ganhou argumentos
importantes, pós Constituição de 1988, para criação de lei específica que garantisse o amparo
integral desse seguimento social. Vejamos o que diz o artigo 227 parágrafos 1º de nossa
Magna Carta:
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do
adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais,
mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos: (Redação dada
Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010).
Com o intuito de fortalecer os direcionamentos de políticas específicas para esse
grupo etário, para a Promoção de Saúde, o programa foi lançado para identificar grupos de
risco, entendendo que os programas de atenção ao adolescente e jovem devem levar em conta
as diferenças socioculturais entre os gêneros, detectando precocemente os agravos de saúde
para tratamentos adequados e reabilitação, respeitadas as diretrizes do Sistema Único de
Saúde (SUS) garantidas pela Constituição Brasileira de 1988.
Neste sentido, chancelado pela nova ordem constitucional, foi criado em 21 de
dezembro de 1989 pelo Ministério da Saúde (MS), através da Portaria nº 980 do Gabinete
Ministerial, o PROSAD.
Dessa forma, o Ministério da Saúde define objetivos, diretrizes e estratégias para o
Programa "Saúde do Adolescente" (PROSAD) que tem a finalidade de promover,
integrar, apoiar e incentivar práticas nos locais onde será feita a implantação e aonde
essas atividades já vêm sendo desenvolvidas, seja nos estados, municípios,
universidades, organizações não governamentais e outras instituições. Deve interagir
com outros setores no sentido da promoção da saúde, da identificação dos grupos de
risco, detecção precoce dos agravos, tratamento adequado e reabilitação dos
indivíduos dessa faixa etária, sempre de forma integral, multisetorial e
interdisciplinar. (BRASIL, 1996, p. 6).
De acordo com dados do Programa (BRASIL, 2011), seu público-alvo seguiria a
faixa etária de jovens entre 10 e 19 anos. Entre os principais objetivos dessa Política de
Promoção da Saúde, destacam-se a identificação de grupos de risco e a detecção precoce dos
25 As iniciativas na área de saúde remontam a 1989, quando o Ministério da Saúde se voltou para a saúde do
adolescente com a criação do Programa Saúde do Adolescente (PROSAD). Em 1999, foi criada a Área de Saúde
do Adolescente e do Jovem (ASAJ), no âmbito da Secretaria de Políticas de Saúde. Essa nova área, então,
tornou-se responsável pela articulação dos diversos projetos e programas do Ministério da Saúde, que lidam com
questões relativas à adolescência e à juventude, em decorrência da percepção da necessidade de uma política
nacional integrada de atenção específica aos indivíduos de 10 a 24 anos. (SPOSITO, 2003, p. 25).
81
agravos, com tratamento adequado e reabilitação, com o propósito de assegurar os princípios
básicos da universalidade, equidade e integralidade de ações.
Teve como principais estratégias a execução em todos os estados brasileiros, pelo
Governo Federal, promovendo estratégias intersetoriais que aumentassem o alcance do
programa e mantivesse um canal de informação e atualização entre as esferas central, estadual
e municipal Brasil (1996). Tinha também como objetivo principal treinar e capacitar
profissionais e voluntários para atender e acolher os adolescentes.
Dentre os programas que surgiram ao longo do tempo para o público juvenil, pode-se
reconhecer que muitas das ações voltadas para a melhoria da saúde dos mesmos não deram
certo em virtude do eixo estreito e da desordem dos trabalhos governamentais.
A política meramente curativa, posta em prática antes do PROSAD, não atendia os
determinantes da morbimortalidade que poderiam decorrer de causas externas e da prática
sexual desprotegida. Desse modo, precisava-se de uma política que abrangesse atividades de
promoção, prevenção e atenção ao adolescente, tendo em vista os aspectos culturais, afetivos
e psicossociais. Nisto, o programa veio para poder dirimir essas questões, que antes não
poderiam ser nem imaginadas. (RUZANY, 2000).
O objetivo principal do PROSAD era garantir aos adolescentes o acesso à saúde,
com ações de caráter multiprofissional, de forma a promover os cuidados com várias
categorias de profissionais, dando um olhar diferenciado e em vários contextos. Como
exemplo podemos mencionar o intersetorial – com uma relação reconhecida entre uma ou
várias partes do setor saúde, visando alcançar resultados de saúde de uma maneira mais
efetiva, eficiente ou sustentável – e o interinstitucional, no sentido de trabalhar em grupo, com
vários parceiros, numa relação de envolvimento de uma ou mais instituições que se
identifique com o projeto, compartilhando problemas, experiências e objetivos comuns.
(BRASIL, 1996).
Nesta linha de conhecimento das diretrizes do programa, que veio para promover a
saúde de forma integral, multissetorial e interdisciplinar, com ações pautadas no respeito pela
adolescência, a iniciativa visou também entre outros aspectos: crescimento e
desenvolvimento; sexualidade; saúde mental; saúde reprodutiva; saúde sexual; saúde na
escola; violência e maus tratos; família; prevenção de acidentes; trabalho e lazer (BRASIL,
2011).
Nos chamou a atenção a saúde reprodutiva da adolescente menor de 14 anos pelo
fato de trabalharmos em um ambulatório de crianças e adolescentes. Verificarmos, ao longo
dos 13 anos de experiência ambulatorial, os contrastes da política descrita focada na
82
integralidade das ações, somada à lei 12.015/09 e à inserção do artigo 217-A, que tratam dos
crimes de abuso de vulneráveis, tutelando os menores de 14 anos. Soma-se a realidade
vivenciada pelos profissionais da saúde, tendo que atender uma demanda crescente de
menores de 14 anos grávidas e a limitação de uma lei rígida.
Segundo o último censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) o percentual dos partos em adolescentes de 10 a 19 anos, realizados na rede SUS,
chegou a 25,79%. Em relação à sexualidade, existem dados demonstrando que o nível de
fecundidade de adolescentes entre 15 a 19 anos aumentou entre 1970 e 1980, havendo
também incremento da fecundidade na faixa entre 10 e 14 anos. (IBGE, 2010).
Com a introdução dos cuidados de puericultura, melhores condições nutricionais,
programas de vacinação, entre outros, tem havido diminuição da mortalidade
infantil, o que resulta no aumento da população de adolescentes. No Brasil,
corresponde a 20,8% da população geral, sendo 10% na faixa de 10 a 14 anos e
10,8% de 15 a 19 anos, estimando-se que a população feminina seja de 17.491.139
pessoas. (YAZLLE, 2016, p. 443).
Dados do IBGE (2010) descrevem que só no Brasil cerca de 700 mil menores estão
sendo mães precocemente todos os anos e, desse montante, 2% tem entre 10 e 14 anos. Nessa
faixa etária, podemos seguramente afirmar que essas jovens não têm nenhuma maturidade
para assumir a maternidade e nem a vida adulta, que, compulsoriamente, com a maternidade,
faz com que sejam arrancadas de suas infâncias. E o mais grave: sem nenhuma preparação
psicológica e nem financeira para poder dar um bom futuro a essas crianças.
A pesquisa do mesmo instituto mencionado demonstra que o número de adolescentes
entre 10 e 19 anos que se tornam mães no Brasil vem aumentando nos últimos quatro anos.
Em 2012, elas responderam por cerca de 31% do total de partos realizados nos hospitais do
Sistema Único de Saúde. (IBGE, 2010).
Segundo o Instituto, o número de adolescentes grávidas também está crescendo no
país. Entre os anos 2011 e 2012, o número de filhos gerados quando as mães tinham entre 15
e 19 anos quase dobrou, passando de 4.500 para 8.300. Nessa faixa de idade, 18% das
mulheres já engravidaram ao menos uma vez. Com esses dados, a constatação é que a cada
dia no Brasil aumenta o número de jovens que tem a sua vida marcada por uma gravidez
precoce.
As questões ligadas a sexualidade e fecundidade adolescentes tem despertado
crescente atenção. Há um caloroso debate no país sobre a necessidade de regulação
da sexualidade juvenil. O suposto desregramento das práticas sexuais juvenis tem
sido um argumento forte comumente invocado para justificar a reprodução nessa
fase da vida e seus desdobramentos perversos nas trajetórias juvenis. Identificar
representações e práticas de jovens de diferentes segmentos no que tange a gestão da
83
vida íntima e de suas conexões com as instituições da família, escola, serviços de
saúde, grupo de pares, se coloca hoje como via importante para a reflexão
sociológica no campo da saúde coletiva. (ALVES, 2015, p. 234).
O PROSAD, apesar de apresentar diversas mudanças na sua estrutura desde sua
implantação, serviu de alicerce para toda a outra Política Pública e promoção da saúde dos
adolescentes e jovens a despeito de sua criação ter sido principalmente pelas mudanças
sociais, presentes no seu contexto e seus fundamentos. Pois, desde a sua constituição, veio
enfrentando o desafio de aprimorar o modelo para alcançar outros mais eficazes, dentre eles: a
ampliação da participação dos adolescentes nos serviços; a sua participação na gestão; a
avaliação e reconstrução dos serviços, possibilitando o empoderamento dos jovens para
resultados mais efetivos e de maior abrangência. É digno de nota o crítico reconhecimento do
programa sobre a pouca participação dos jovens no planejamento, na execução e na avaliação
das atividades oriundas de políticas públicas.
Logo após a criação do PROSAD, dando seguimento ao cenário das políticas para o
público juvenil, em 13 de julho de 1990, foi sancionado pelo então Presidente da República
Fernando Collor de Melo o Estatuto da Criança e do Adolescente, ratificando os cuidados com
os menores de 18 anos, regulamentando os direitos das crianças e dos adolescentes e inspirado
pelas diretrizes fornecidas pela Constituição Federal. Assim, o ECA internalizou uma série de
normas internacionais, como a Declaração dos Direitos da Criança, Regras Mínimas das
Nações Unidas para a administração da Justiça da Infância e da Juventude, dentre outras.
(BRASIL, 1996).
O ECA veio substituir o Código de Menores (Lei n. 6.697/79), que vigorou de 1979
até 1990. A argumentação desse dispositivo foi a execução e o desenvolvimento de uma nova
e específica política de atendimento à infância e à juventude, expressa pelos princípios
constitucionais basilares da descentralização político-administrativa e da atuação da sociedade
civil em várias partes.
Houve, assim, a garantia de que as crianças e adolescentes passassem a ser tratados
como sujeitos de direitos fundamentado, no art. 7º do ECA, pois antes só eram reconhecidos
como simples objetos de ação da família e do Estado. Apesar deste reconhecimento no corpo
constitucional, essa parcela da população não foi visualizada nas políticas públicas como
protagonista de sua história, com identidade própria. (KERBAUY, 2013; LEÃO, 2013).
Constituído como principal instrumento de garantia de direitos da criança e do
adolescente, o Estatuto foi uma valiosa ferramenta para o atendimento integral da criança e do
84
adolescente. O mesmo exige do estado brasileiro e dos grupos sociais a continuidade dos
resultados impostos pelo artigo 227 da Constituição Federal.
O referido artigo visa à produção, execução, acompanhamento e controle social de
políticas constitucionais e estatutárias capazes de mudar os conceitos arcaicos de infância e
juventude presente no dia a dia da dinâmica social da população.
O Estado tem o dever de criar, programar e organizar, políticas, planos, programas e
serviços para o público infanto-juvenil, pois eles serão os futuros cidadãos de nossa nação.
Na avaliação da agência da ONU, a desigualdade econômica reforça e é reforçada
por outras desigualdades. Por exemplo, a desigualdade enfrentada pelas mulheres
mais pobres no acesso a serviços de saúde, onde apenas algumas privilegiadas
conseguem planejar sua vida reprodutiva, reflete-se na incapacidade de desenvolver
habilidades para integrar a força de trabalho remunerado e alcançar poder
econômico. (UNFPA, 2017, p. 13).
De acordo com o que está assinalado no corpo textual do artigo 227 da CF/88 e
reflexivamente no ECA, a criança e o adolescente devem estar assegurados por políticas
públicas de proteção, promoção e direitos, bem como a tutela de suas respectivas famílias.
Em função da vulnerabilidade, adolescentes e jovens vivenciam inúmeros problemas,
dentre estes, a gravidez indesejada, violências e maus tratos, DST/AIDS e desrespeito aos
seus direitos de cidadãos de acordo com o Ministério da Saúde:
A vulnerabilidade desta faixa etária é outra questão que faz com que ela necessite de
um cuidado ainda mais amplo e sensível. Essa maior vulnerabilidade aos agravos,
determinada pelo processo de crescimento e desenvolvimento, pelas características
psicológicas peculiares dessa fase da vida e pelo contexto social em que está
inserido, coloca o adolescente na condição de maior suscetibilidade às mais
diferentes situações de risco, como gravidez precoce, doenças sexualmente
transmissíveis (DST), acidentes, diversos tipos de violência, maus tratos, uso de
drogas, evasão escolar, etc. (BRASIL, 2006).
O legislador, assim, imaginou que iria solucionar vários problemas com uma norma
mais rígida, principalmente os casos de pedofilia que todos os dias estampam as folhas de
jornais. Porém, infelizmente, verificamos com o advento desse novo dispositivo penal várias
controvérsias atingem os sujeitos que a lei alcança diretamente e indiretamente. Exemplos
disso são as menores de 14 anos grávidas com relação consensual e os profissionais da área da
saúde, que tem a obrigação de notificar ao Conselho Tutelar todos os casos independentes de
ter havido abuso ou não.
85
3.4 Contextos familiares e a contribuição da equipe multidisciplinar na execução das
políticas de proteção à criança e o adolescente
Já não nos causa tanto espanto o número crescente de meninas maiores de 12, 13 ou
14 anos com vida sexual ativa e consequentemente grávida, bem como a procura pelas
Unidades Básicas de Saúde, portando algum tipo de infecção sexualmente transmissível
(IST’s).
Com o advento da socialização da informação, que cada vez se dissemina com mais
rapidez e mais acessibilidade, resta-nos uma pergunta: o que levaria então essas adolescentes
a engravidar de forma tão precoce ou adquirirem determinadas doenças, que poderiam ser
evitadas usando métodos de barreira? Nunca foram tão divulgados os meios contraceptivos
para evitar a gravidez como nos dias atuais e, mesmo assim, o número de adolescentes
grávidas cada vez mais cresce. Existem vários fatores que contribuem para esse quadro,
conforme podemos observar:
Mais que considerar este um problema ‘dos outros’, questionar e denunciar o lugar
que a mídia ocupa no momento atual é dever de cada um de nós. Assim, faz-se
necessário: rever e recriar valores que visualizem a criança a partir do ethos dos
fatores sociopolítico, econômico e cultural, que ressoam de modo singular nas
unidades familiares, bem como da interferência dos imperativos e apelos da mídia
nas reorganizações psíquica. Urge dizer que essa caótica realidade poderia ser
amenizada se houvesse uma política de educação sexual contínua, voltada para a
formação de profissionais da educação, da saúde e de áreas afins, uma vez que todos
têm profunda influência na formação das crianças e dos adolescentes. (BRUNS,
2012, p. 330).
Isto é, a falta de um projeto educativo de orientação sexual nas igrejas, nas escolas,
nos bairros, comunidades e na própria família levam os jovens a seguirem seus instintos, sem
se preocuparem com as consequências.
A mídia é outra vilã nessa questão, exagerando na erotização do corpo feminino. O
voto do Ministro Março Aurélio no HC 73.662 - MG, 2ª Turma, favorável à presunção relativa
da vulnerabilidade, é por demais esclarecedor quando menciona alguns fatores referentes ao
que já foi citado:
[...] A presunção de violência prevista no artigo 224 do Código Penal (atualmente
revogado pela Lei 12.015/2009) cede à realidade. Até porque não há como deixar de
reconhecer a modificação de costumes havida, de maneira assustadoramente
vertiginosa, nas últimas décadas, momento na atual quadra. Os meios de
comunicação de um modo geral, e, particularmente, a televisão, é responsável pela
divulgação maciça de informações, não as selecionando sequer de acordo com
medianos e saudáveis critérios que pudessem atender às menores exigências de uma
sociedade marcada pela dessemelhança. Assim é que, sendo irrestrito o acesso à
mídia, não se mostra incomum reparar-se a precocidade com que as crianças de hoje
86
lidam, sem embaraços quaisquer, com assuntos concernentes à sexualidade, tudo de
uma forma espontânea, quase natural. Tanto não se diria nos idos dos anos 40, época
em que exsurgia glorioso e como símbolo da modernidade e do liberalismo, o nosso
vetusto e ainda vigente código penal. Àquela altura, uma pessoa que contasse doze
anos de idade era de fato considerada criança, e como tal, indefesa e despreparada
para os sustos da vida. [...] (NUCCI, 2012, p. 965).
Nesse sentido, os ídolos que são vistos nas passarelas, revistas, cinemas e televisão
são para os adolescentes verdadeiros espelhos, heróis e modelos que passam uma imagem de
liberação sexual, onde tudo é permissivo e possível, vendendo uma falsa imagem de super-
homens ou supermulheres, dando uma sensação de imbatíveis.
Outro ponto importante é a falta de informações dos pais de adolescentes, fator
primordial para compreendermos o que acontece de fato, pois os medos e receios do passado
poderão ser reflexos do que seus filhos passam no presente.
Como responder às inquietações dos seus filhos se no passado os pais sofreram com
as mesmas dúvidas? O tempo passa, mas as sensações são as mesmas. Grosso modo, a
puberdade será a mesma para todos que a vivenciam, pois é inerente ao desenvolvimento
humano, fazendo parte de seu crescimento. Perguntas sufocadas pelo tempo, escondidas nos
erros e acertos, sujeitos separados por um fator: geração. Logo, como esperar do adolescente
comportamento diverso se seus pais tiveram dificuldades em falar sobre sexualidade, quando
expostos pelo mesmo processo de amadurecimento?
Por outro lado, o acesso às informações, com esse mundo globalizado, torna os
meios de informações mais acessíveis, todavia, essas mesmas fontes são facas de dois gumes
já que o certo pode se tornar errado e o errado o certo, dependendo do ditame da moda.
Assim, tudo o que concerne ao sentimento de inquietude em relação aos desejos
sexuais são inerentes a qualquer ser humano. Muda o tempo, o sujeito, o objeto de desejo,
porém, o comportamento em relação aos medos e receios é apenas diferenciado pela geração
que vive na determinada dinâmica chamada tempo.
A realidade é que, socialmente, tenta-se esconder, mas temos um alto índice de
gravidez na adolescência. Dados de 2006 do IBGE apontam que 51,4% (1.512.374) dos
nascidos vivos notificados ao Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC) eram
filhos de mães com idade até 24 anos. Destes 0,9% (27.610) de mães de 10 a 14 anos; 20,6%
(605.270) de mães com idade de 15 a 19 anos; e 29,9% (879.493) eram mães com idade de 20
a 24 anos. Em 2000, esses grupos correspondiam, respectivamente, a 0,9% (28.973), 22,5%
(721.564) e 31,1% (998 523).
A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (IBGE, 2012) aponta que, para o Brasil,
28,7% dos adolescentes em idade escolar já tiveram relação sexual alguma vez na vida. O
87
indicador corresponde a 40,1% entre os meninos e de 18,3% entre as meninas, nessas
proporções. Destes 30,9% se referem aos estudantes de escolas públicas e 18,2% aos
estudantes de escolas privadas. A Região Norte apresentou o maior percentual (38,2%) de
escolares para este indicador, seguida das Regiões Centro-Oeste (32,1%), Sudeste (29,1%),
Sul (27,3%) e Nordeste (24,9%). Ainda, segundo fonte estatística da Maternidade Escola, dos
5 (cinco) mil partos realizados na MEAC por ano, em média, cerca de 25% são adolescentes.
É nessa sociedade que somos criados e é para a sua própria sobrevivência que o
Estado existe, intervindo minimamente e garantido o bem-estar social. Tudo que ultrapassar
das garantias estatais ou da sua intervenção passa a não ser mais visto de maneira salutar para
os indivíduos que compõem essa dita sociedade.
Se a lei veio como meio de coibir os atos libidinosos contra menores de 14 anos, por
que os números de notificações ao Conselho Tutelar a cada ano só aumentam? Segundo dados
estatísticos da instituição pesquisada, se a Política Pública para adolescentes e jovens veio
para prevenir os agravos contra adolescentes e jovens será que os profissionais entrevistados
estão se emponderando dela? Como os profissionais da MEAC estão lidando com esse
paradoxo, lei versus Política Pública?
No próximo e último capítulo procuraremos analisar essas questões, pois estaremos
expondo justamente o que os profissionais da Maternidade Escola Assis Chateaubriand
pensam sobre o assunto.
Será através das respostas às perguntas, referentes ao assunto abordado, que
analisaremos a execução da lei de estupro de vulnerável entre a equipe multiprofissional,
fazendo um cotejo do que é oferecido dentro da política de atenção integral à saúde de
adolescentes e jovens, especificamente na área da educação sexual e sob a ótica desses
profissionais.
Identificaremos como a equipe multiprofissional compreende o dispositivo penal,
que versa sobre estupro de vulnerável, e verificaremos possíveis conflitos enfrentados pela
mesma para o cumprimento da lei, identificando fluxos e encaminhamentos da instituição
para o cumprimento do dispositivo penal.
88
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
A análise dos dados coletados emergiu como principal categoria nesta pesquisa sobre
a deficiência na formação dos profissionais da saúde, por focarem, mesmo após a reforma
sanitária, em práticas hospitalares curativas e não preventivas. Soma-se a consequente
dificuldade de desenvolvimento de práticas mais integrais e resolutivas de cuidado para
implementar atividades de promoção e prevenção, como preconiza as políticas públicas para
jovens e adolescentes, precisamente na área da saúde sexual e reprodutiva.
Quando falamos de cuidados com a saúde integral de adolescentes e jovens
precisamos de uma política que esteja sempre em sintonia com as necessidades vigentes,
focada no momento, modificando-se e em constante transformação no intuito de atender seus
objetivos de forma satisfatória.
O Ministério da Saúde, em 2007, lançou o marco legal: saúde um direito de
adolescentes, no sentido de concretizar o que havia sido preconizado pelo artigo 227 da
Constituição Federal, em 1988. Um pouco mais à frente, consolidado com a criação do
PROSAD em 1989, buscou também nortear os programas, projetos e políticas específicas
para esses sujeitos, apontando para um diálogo e sintonia com outros seguimentos sociais,
como as instituições hospitalares.
Segundo o documento, produzido pelo Ministério da Saúde, trabalhar as questões na
atenção à saúde dos adolescentes e jovens difere da assistência clínica individual e da simples
informação ou repressão.
O Manual do MS fala que o modelo de programas, projetos e política a ser
desenvolvido deve permitir uma discussão sobre as razões da adoção de um comportamento
preventivo e o desenvolvimento de habilidades, que permitam a resistência às pressões
externas, a expressão de sentimentos, opiniões, dúvidas, inseguranças, medos e preconceitos,
de forma a dar condições para o enfrentamento e a resolução de problemas e dificuldades do
dia a dia.
No conjunto de circunstâncias do debate sobre a saúde de adolescentes e jovens do
SUS, de acordo com a UFPNA (2013), os direitos sexuais e direitos reprodutivos dos mesmos
devem receber uma atenção especial para o fortalecimento da autonomia desses indivíduos.
Vejamos:
O reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos entre os direitos fundamentais
da população jovem está alinhado aos compromissos assumidos pelo Estado
brasileiro durante a Conferência Mundial de Direitos Humanos, Viena 1993; na
89
Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), Cairo 1994;
bem como aos princípios da Convenção para Erradicar, Sancionar e Punir a
Violência contra as Mulheres (CEDAW), também de 1994. Esses eventos e os
documentos dele derivados, em especial o Programa de Ação da CIPD, foram
essenciais para a inserção das e dos adolescentes como sujeitos do direito a saúde
sexual e reprodutiva a ser alcançado por normas, programas e políticas públicas.
(UFPNA, 2013, p. 21).
A família deve ser repensada como a primeira experiência em sociedade no sentido
de viabilizar o fortalecimento desses sujeitos de direitos políticos, pois a cidadania plena
depende de uma progressiva reformulação de conceitos.
Dadas essas considerações, neste capítulo colocaremos os relatos dos profissionais
entrevistados acerca da temática, esta já bastante discutida nos moldes teóricos e técnicos nos
capítulos anteriores.
Assim, tentaremos descobrir o grau de conhecimento do profissional da área da
saúde sobre o tema proposto, bem como perceber como estão sendo trabalhados esses
projetos, programas e políticas para adolescentes e jovens no ambiente hospitalar, a fim de
facilitar o acesso e diminuir as vulnerabilidades que a idade impõe. Dessa forma, será possível
notar quais sentimentos, medos, conhecimentos e receios estão inseridos no cotidiano desses
profissionais, resultados esses que serão discutidos à luz dos referenciais pesquisados.
Inicialmente realizou-se a captação dos dados sociodemográficos e dados
profissionais dos sujeitos da pesquisa. Como descritos na tabela a seguir:
Tabela 1 – Caracterização dos sujeitos da pesquisa. Fortaleza, 2017.
VARIÁVEIS FREQUÊNCIA(F) PORCENTAGEM (%)
PROFISSIONAIS (n=15) — 100
SEXO
Masculino 00 00,0
Feminino 15 100,00
FAIXA ETÁRIA
18 a 25 anos — —
26 a 35 anos 04 26,6
36 a 45 anos 04 26,6
Acima de 45 anos 07 46,6
ESTADO CIVIL
Casado 09 60,0
Divorciado 01 6,6
Separado — —
Solteiro 04 26,6
90
União Estável 01 6,6
Viúvo — —
OCUPAÇÃO
Assistente social 03 20,0
Enfermeiro 03 20,0
Médico 04 26,6
Psicólogo 03 20,0
Técnico de Enfermagem 02 13,3
ÁREA DE TRABALHO
Ambulatórios 04 26,6
Emergência 04 26,6
Unidades de Internamento 01 6,6
UTI Neo 01 6,6
Sala de Parto 03 20,0
TEMPO DE INSTITUIÇÃO
Menos de 1 ano — —
1 a 5 anos 10 66,6
6 a 10 anos 02 13,3
Acima de 10 anos 03 20,0
TIPO DE VÍNCULO
EMPREGATÍCIO
Funcionário Público 03 20,0
Colaborador Terceirizado — —
Colaborador Celetista
(EBSERH)
12 80,0
Outros — —
VÍNCULO EMPREGATÍCIO
EM OUTRA INSTITUIÇÃO
Sim 07 46,7
Não 08 53,3
Fonte: Elaborada pela autora
Como se pode observar houve um predomínio dos respondentes do sexo feminino na
pesquisa de 100%. Essa hegemonia do sexo feminino é um reflexo das transformações do
mundo do trabalho. Na atualidade, verificamos a inversão da preponderância masculina, com
mudança do cenário que se configura na atualidade, como fenômeno mundial, segundo afirma
Bruschini:
91
Panorama da situação das mulheres no mercado de trabalho brasileiro. Com base em
estatísticas oficiais, como as do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, do
Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério da Educação, o texto destaca
algumas das principais tendências da inserção laboral das brasileiras, que é marcada
por progressos e atrasos. (BRUSCHINI, 2012, p. 4).
A média de idade entre os entrevistados foi de 45 anos, variando entre 36 e acima de
45 anos. O estudo contou com a participação de 15 profissionais da área da saúde, que
compõem a equipe da Maternidade Escola Assis Chateaubriand, maior maternidade do Norte
e Nordeste.
Dentre os profissionais entrevistados foram escolhidos médicos, enfermeiros,
psicólogos, assistente social e técnico de enfermagem, separados por 5 (cinco) setores:
emergência, ambulatório, sala de parto, unidade neonatal e unidades de internação. Dos 15
profissionais, quatro (26,6%) são médicos, três (20,0%) são enfermeiros, três (20,0%)
assistentes sociais, três (20,0%) são psicólogas, duas (13,3%) são técnicas de enfermagem.
Quanto ao processo de contratação 80% são regidos pelo regime celetista,
concursados pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), empresa de direito
público privado vinculada ao Ministério da Educação, que é responsável pela gestão dos
Hospitais Universitários Federais do Brasil.
O MEC junto ao MPOG elabora a Medida Provisória n. 520, assinada em 31 de
dezembro de 2010, a qual autoriza o Poder Executivo a criar a Empresa Brasileira de
Serviços Hospitalares S. A. (EBSERH), que tem, entre outras competências,
administrar unidades hospitalares, bem como prestar serviços de assistência médico-
hospitalar e laboratorial à comunidade, no âmbito do SUS (BRASIL, 2010b).
Dos 15 entrevistados, 20% são profissionais efetivados por meio de concurso público
pela Universidade Federal do Ceará (UFC), regidos pelo Regime Jurídico Único (RJU), ou
seja, são servidores públicos federais estatutários.
Dos 15 profissionais que responderam à pesquisa 10 tinham tempo de serviço entre 1
(hum) a 5 (cinco) anos, equivalente ao percentual de 66,6%. Dentre o total dos profissionais
pesquisados 2 (dois) responderam ter entre 6 (seis) a 10 anos de serviço na instituição,
correspondendo a 13,3% do total. O restante dos pesquisados, que equivalem a 20% no total
de 3 (três), tem tempo de serviço acima de 10 anos.
O que se verifica, após análise destes dados, é que há predominância de profissionais
regidos pelo regime celetista em um hospital público federal, reflexo de uma política
privatista da saúde brasileira. Com o discurso de modernização dos hospitais universitários
brasileiros, a Empresa foi criada pela Lei 12.550, de 15 de dezembro de 2011, ao final do
governo de Luís Inácio Lula de Silva.
92
Sob a justificativa de maior autonomia no uso dos recursos, legalização dos
contratos de trabalho e aprimoramento do processo de gestão das instituições de
ensino e saúde, o governo Lula se despede de seu mandato, deixando a herança das
Fundações Estatais de Direito Privado, ainda que sob nova roupagem: a EBSERH.
Após a rejeição da MP n. 520 no Senado, em 2011, o então presidente da República,
por meio da Lei n. 12.550, autoriza a criação da EBSERH, empresa com
personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio. Com o discurso da
ineficiência da gestão pública e o alto custo dos hospitais federais, decorrentes da
burocracia da legislação brasileira, a EBSERH é apontada pelo governo como
"única" solução e tem ganhado espaço e adesão junto às universidades federais.
(SODRÉ, 2013, p. 365).
Diante deste quadro, justifica-se a maioria dos profissionais entrevistados serem
regidos pelo regime celetista em uma unidade do Complexo Hospitalar da Universidade
Federal do Ceará, instituição de ensino superior, constituída como autarquia educacional de
regime especial e vinculada ao Ministério da Educação e do Desporto, hoje, ligada à rede da
Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).
No gráfico a seguir, questionou-se se os profissionais receberam treinamento
específico para trabalhar com crianças e com adolescentes.
Gráfico 4.1 – Distribuição dos profissionais segundo a realização de treinamento para
cuidado da criança e adolescente. Fortaleza, 2017.
Fonte: Elaborado pela autora.
Verificamos que dos 15 profissionais entrevistados seis (40%) receberam treinamento
específico para trabalhar com crianças e adolescentes. Deste total, somente dois (33,3%)
relataram ter recebido treinamento na MEAC, porém, informalmente. A maioria dos que
receberam orientações para lidar com crianças e adolescentes relataram ter recebido
treinamento em outras instituições por possuírem outros vínculos empregatícios ou procurado
curso de capacitação por conta própria, percentual equivalente a (66,6%).
Chamou-nos atenção o fato de uma instituição – que mantém um ambulatório
específico para crianças e adolescentes, único no Estado do Ceará – lidar com questões de
prevenção e complicações clínicas na sexualidade dentre outros. Nota-se que há pouca
93
preocupação em disponibilizar treinamento para seus profissionais, que, diariamente, recebem
adolescentes e jovens à procura de cuidados ginecológicos e obstétricos, seja na parte
ambulatorial, seja na parte assistencial.
Ressalta-se a importância de que o profissional precisa estar capacitado para
trabalhar com determinado seguimento social, a fim de poder compreender e viabilizar o bom
andamento das ações. Segundo Pinho (2016), as ações estratégicas voltadas para a promoção
da saúde do adolescente devem requerer o envolvimento de sujeitos e coletivos, visando
desenvolver a autonomia. Dessa forma, compreende-se que a participação conjunta na
construção de ambientes saudáveis pode reduzir não somente o adoecimento, mas esse
comprometimento favorece, também, a sustentabilidade e a efetividade das ações
intersetoriais que podem se configurar no SUS.
Como dito anteriormente a instituição pesquisada tem em seu portfólio um
ambulatório específico para crianças e adolescentes criado nos moldes do PROSAD, que a
colocou como uma maternidade de referência no Estado do Ceará, mantendo o atendimento
infanto-puberal destes 1985.
Com uma equipe multi e interdisciplinar, focada na melhoria da qualidade de vida do
indivíduo e da coletividade, a Maternidade Escola tornou-se referência no atendimento desse
seguimento no sentido de instituir uma Educação Sexual como um processo de transmissão e
de transferência, isto é, um processo de caminho cumulativo.
A Educação Sexual está voltada para a melhoria da qualidade de vida do individuo e
da coletividade. Ela utiliza os grandes ensinamentos da Educação Preventiva
Integral e, atraves da expressão de um comportamento sexual sadio, procura
combater, de modo efetivo, a gravidez indesejável a transmissão das DSTs/AIDS, ao
mesmo tempo em que fortalece o individuo contra a ilusão do uso das drogas,
estimulando a criação de valores positivos de convivência. A família, a escola e a
sociedade são as instituições básicas para o desenvolvimento das ações educativas.
(BRASIL, 1994, p. 7).
Infelizmente, essas ações ainda se mantêm pelo comprometimento de profissionais,
que fizeram parte nos idos da implantação da política na instituição. Todavia, se não houver
investimento em capacitação suas práticas poderão se perder no tempo, pois os novos
profissionais que estão sendo inseridos no quadro de funcionários da instituição não estão
sendo treinados ou capacitados, como mostram as respostas. Por consequência, com o tempo,
poderá perder seus objetivos que levaram a criar um ambulatório específico para crianças e
adolescentes, ainda modelo de atendimento no Estado do Ceará.
Percebeu-se também que nove (60%) dos entrevistados nunca receberam treinamento
para trabalhar na faixa etária da clientela abordada. O que confirma as ponderações analisadas
94
e debatidas ao longo deste trabalho sobre as prioridades das políticas públicas específicas
voltadas para tutelar criança e adolescente. Legado esse deixado pelo constituinte originário,
que preconiza
como sendo dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, a liberdade e a convivência familiar e comunitária’ [...] (ARTIGO 227 da
CF/88).
Os números refletem também as mudanças que sofreram os hospitais universitários,
após a lei 12.550, já comentada anteriormente, norma que criou a EBSERH, renovando
através de seleção pública, a força de trabalho dos Hospitais Universitários, quando indagados
sobre o tempo de serviço na instituição, corroborando com a nova face dos Hospitais
Universitários brasileiros, já analisada em poucas linhas neste trabalho por não ser o foco
principal.
Verificamos que (66,6%) dos profissionais que responderam à pesquisa tem de 1
(hum) a 5 (cinco) anos de serviço, ou seja, dos 10 profissionais que responderam (o
equivalente a 66,6%) tem menos de 6 (seis) anos de serviço na instituição. Além disso,
constatou-se a falta de treinamento para os profissionais que entraram após o conjunto de
ações empreendidas pelo Governo Federal no sentido de recuperar os hospitais vinculados às
universidades federais. Dentre essas ações, a composição do quadro de pessoal deficitária pela
precarização. Vejamos:
Os Hospitais Universitários Federais, espalhados pelo território brasileiro,
totalizando 46, apresentam problemas comuns, como: o quadro de servidores
deficitários, fechamento de leitos e serviços, sucateamento de aparelhagem e espaço
físico, flexibilização e precarização dos recursos humanos (DRAGO, 2012, p. 30).
Devemos estabelecer ações para poder superar os desafios no avanço nas políticas
públicas de proteção e garantia de direitos, trabalhando com o foco de priorizar um país livre
da miséria. Lembrando: adolescentes e jovens que também estão nas famílias mais pobres, o
que exige um olhar específico e políticas públicas específicas voltadas para essa população.
Uma das formas de solucionar a carência de treinamento entre os profissionais da
saúde, focando nas questões de sexualidade – como determina a Política de Educação Sexual
para adolescentes e jovens do Governo Federal – seria a obrigatoriedade na grade de ensino,
seja no ensino superior ou em cursos profissionalizantes, debates sobre questões de
sexualidade humana. Isso no sentido de não apenas voltar para o ensino de doenças, agravos
ou transtornos da área da saúde em geral, mas para a abordagem de assuntos específicos da
95
sexualidade dos seres humanos, desmistificando mitos e tabus a respeito do tema e retirando
valores e pré-conceitos de crenças silenciosas26
criadas ao longo dos séculos.
O MS descreve que a ocorrência de gravidez entre menores de 18 anos tem que ser
abordada e tratada diferente da gestação de um adulto pelas seguintes razões:
•Pela complexidade da situação, marcada pela dependência da família, pela falta de
autonomia financeira e de espaço próprio, pelas dificuldades nas relações pessoais e
sociais e por contextos de violência doméstica e urbana;
•Porque a família geralmente se constitui como uma determinante central,
exercendo forte pressão sobre as decisões de manter ou interromper a gravidez,
sobre o processo de assistência, a relação conjugal e o estilo de vida do casal durante
e, se for o caso, depois da gravidez e do parto;
•Pelas especificidades da própria faixa etária, em especial a compreendida entre os
10 e os 14 anos, que exige uma assistência à saúde diferenciada tanto para o pré-
natal quanto para o parto, o puerpério e a contracepção;
•Por estarem em processo de crescimento e desenvolvimento biopsicossocial,
adolescentes de ambos os sexos podem apresentar pouca maturidade emocional para
as decisões que devem ser tomadas no processo e para as mudanças advindas com a
maternidade em condições como as descritas anteriormente (BRASIL, 2012).
Por esses e outros motivos que o profissional precisa estar preparado para o
enfrentamento das vulnerabilidades em decorrência da idade.
Os profissionais entrevistados, quando abordados sobre o conhecimento de políticas
públicas de saúde sexual para adolescentes e jovens do Governo Federal, 8 (oito), isto é,
53,3% das respondentes (mais da metade das pesquisadas) afirmaram “desconhecer “ou “não
saber nada” sobre as políticas públicas voltadas para a juventude. Cenário que reflete uma
sociedade que por muitos anos não reconheceram os jovens como sujeitos, mas objetos de
direito. Neste ponto emergiu um fator importante e limitador da pesquisa: como indagar e
questionar os profissionais entrevistados sobre as Políticas Públicas voltadas para
adolescentes e jovens? Se desconheciam o que está sendo feito a nível federal, estadual e
municipal a este seguimento social?
A sociedade precisa estar em sintonia com as ações governamentais, não só no que
rege direitos de adolescentes e jovens no ordenamento jurídico brasileiro. Precisa estar atenta
para saber o momento de exigir e não somente permanecer em sua zona de conforto.
Todos os dispositivos elencados nesta pesquisa convergem para que a sociedade
esteja atenta às políticas públicas para jovens, que na atualidade ainda se constituem como um
desafio ao exercício pleno da cidadania.
26 Crença silenciosa é a aceitação tácita de evidências que nunca questionamos porque nos parecem naturais,
óbvias (CHAUÍ, 1995, p. 8).
96
A seguir, elencamos nas próximas falas, algumas respostas das profissionais
entrevistadas sobre as Políticas Públicas do Governo Federal27
e programas para adolescentes
e jovens:
“Não sei se isso e política, mas nos dias atuais, o governo insere os adolescentes
com certa autonomia para decidir sobre sua vida sexual e planejamento familiar. A
opinião, ideias e pensamentos dos adolescentes são respeitados, garantindo o
segredo medico e o acesso a saúde”. (E1).
“Saúde na escola, Estatuto da Criança e do adolescente”. (E10).
“A Política Nacional de Humanização (PNH) no que se refere ao adolescente; já
ouvi falar do PROSAD; Assistência ao adolescente em situação de vulnerabilidade;
proteção ao adolescente, vítima de violência sexual; Disque denúncia e Disque 100”.
(E8).
“Diretrizes para a saúde integral do adolescente; linha de cuidados em situação de
violência; Programa Saúde do Adolescente e o Estatuto da juventude”. (E7).
“Conheço apenas o PROSAD”, só lembro-me deste agora”. (E15).
“Conheço o PROSAD, atraves de ações pontuais voltadas para a prevenção de
agravos. Como não trabalho diretamente com este público, não conheço com mais
detalhes sobre a execução dos programas”. (E6).
“A única política que me vem a mente neste momento e a Saúde do Adolescente”.
(E11).
O quadro de respostas teve pouco conteúdo pela dificuldade da coleta nesta
questão.28
Assim, 7 (sete) das profissionais entrevistadas pediram para pular a pergunta por
não terem opinião formada sobre o assunto e não se sentirem aptas a responder, alegando
complexidade do tema.
As profissionais também foram perguntadas sobre o conhecimento específico do
Programa Saúde do Adolescente (PROSAD).29
Dentre elas, 9 (nove) alegaram desconhecer o
programa. Argumentando dificuldade na resposta, paramos por momentos o roteiro das
perguntas para explicar sobre Política Pública, a quem se destina e seus objetivos. Tais
resultados estão apresentados a seguir:
“Na realidade, eu nunca li sobre o programa, conheço atraves de propagandas e nas
conversas em ambiente de trabalho”. No entanto, sem me aprofundar no assunto.
[...]” (E11).
[...] “Ações de prevenção e gestação precoce” [...]. (E13).
27 Você conhece alguma Política Pública de Saúde para Adolescentes e jovens do governo federal?
28 Quais políticas públicas o governo federal disponibiliza para adolescentes e jovens.
29 O que você conhece sobre o Programa Saúde do Adolescente (PROSAD) do Governo Federal? Que tem como
objetivo promover a saúde integral de adolescentes e jovens favorecendo o processo geral de seu crescimento e
desenvolvimento, formulando uma política nacional a ser desenvolvida a nível Federal, Estadual e Municipal?
97
“Ações de prevenção as doenças sexualmente transmissíveis” [...] “Assistência ao
pré-natal e pós-parto”. (E1).
“Acredito ser uma política de proteção a agravos e promoção da saúde a jovens e
adolescentes” [...]. (E4).
[...] “Não conheço sua efetividade, nem o que e feito no município de Fortaleza a
respeito... sei que tem algumas metas referente à gravidez precoce, sexualidade,
mais voltada para atenção básica... Estimular o protagonismo juvenil. O principal
seria conhecer ações efetivas, mas desconheço em Fortaleza. Exceto a elaboração da
caderneta do ou da adolescente. Também existe o programa saúde na Escola. Diante
dos desmonte das políticas públicas, no atual governo, não sei se continua este
programa”. (E5).
“Conheço as ações do governo que são desenvolvidas na atenção básica, vacinação,
prevenção de Infecções Sexuais Transmissíveis; as desenvolvidas nas escolas; saúde
do adolescente, enquanto tema transversal; as que usam o Estatuto da Criança, como
asseguradora de direitos; prioridade no atendimento médico” [...]. (E8).
“Em teoria nada, mas já ouvi falar”[...]. (E12 ).
“São um conjunto de diretrizes que buscam a saúde, na sua ação mais ampla, dos
adolescentes. Engloba desde o ambiente escolar, direito ao atendimento médico,
vivência da sexualidade, avaliação de riscos ou vulnerabilidades deste grupo”.
(E10).
Mesmo após uma breve explanação sobre o PROSAD, percebemos o grau elevado de
desconhecimento sobre a matéria. Achávamos que a incompreensão poderia ter sido pela
complexidade das perguntas. Mas o que percebemos é que em muitos momentos houve
confusão quando abordamos o tema Política Pública para Adolescentes e jovens. Com a
exceção de (E10), que refletiu uma compreensão sobre a política bem diferenciada dos outros
profissionais. Isto é, ele não seguiu à maioria: demonstrou segurança na resposta e coerência
em suas colocações.
Na sequência, dos 15 profissionais entrevistados 8 (oito) não responderam a
pergunta. Na realidade pediram para pular a questão. Dos 7 (sete) profissionais que
responderam 2 (dois) afirmaram desconhecimento do programa governamental e 2 (dois)
responderam de forma vaga sobre o assunto. Somente 3 (três) responderam de forma coerente.
Chegamos aqui em um dilema: como o profissional pode ter conflitos se a grande maioria
desconhece a política pública?
Quanto às ações que a MEAC viabiliza para programar as políticas públicas para
jovens e adolescentes no município de Fortaleza, a mais lembrada entre os profissionais
entrevistados foi o planejamento familiar para adolescentes pelo fato da instituição
disponibilizar um ambulatório para crianças e adolescentes. Dentre os 15 profissionais
entrevistados 9 (nove) fizeram referência ao mesmo.
98
Esse aspecto é reflexo de uma política educativa voltada à prevenção dos agravos e
riscos inerentes aos jovens, planejada nos princípios do PROSAD, pois o ambulatório foi
criado na década de 80, sofrendo uma forte influência da nova tendência mundial à época,
tratando criança e adolescente não mais como objetos mais sujeitos de direito. Os achados
estão descritos no gráfico a seguir:
Gráfico 2 – Apresentação das ações desempenhadas pela MEAC para programar as políticas públicas para jovens
e adolescentes segundo os participantes do estudo. Fortaleza, 2017.
Fonte: Elaborada pela autora.
Com uma equipe multi e interdisciplinar, voltada para a melhoria da qualidade de
vida do indivíduo e da coletividade, a Maternidade Escola tornou-se referência no
atendimento desse seguimento no sentido de instituir uma Educação Sexual, como um
processo de transmissão, de transferência e um processo de caminho cumulativo.
No Brasil, os adolescentes e jovens (de 10 a 24 anos) estão expostos às mais elevadas
taxas de mortalidade por causas externas. Além do que, a fecundidade das mulheres nessa
faixa etária, atualmente, tem contribuído para o aumento da gravidez na adolescência
(BRASIL, 2010). Portanto, devemos fomentar momentos seguros e de acolhimento no pré-
natal, garantindo seu seguimento e estimulando o seu retorno através das palestras educativas
atreladas ao acolhimento.
Portanto, o acesso a serviços de saúde que acolha as necessidades e seja eficaz na
integralidade da atenção à saúde e nas especificidades que essa faixa etária exige é
imprescindível para a efetivação das diretrizes dispostas na Política Nacional de
Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens. (PINHO, 2016, p. 11).
99
Não é tendência as escolhas dos espaços públicos, como os serviços de saúde, pelos
adolescentes como espaços de trânsito. Por conseguinte, é indispensável que nas ações,
programas ou políticas de saúde possam ser formuladas estratégias para encontrar esse
adolescente e não afastar de dentro da unidade.
Segundo Pinho (2016) é importante que você consiga conhecer e compreender o
adolescente e entender os espaços que ele frequenta para organizar todas as ações de saúde
voltadas para esse público. Ainda segundo a autora:
No modelo de atenção integral à saúde, o propósito é que o profissional possa
ampliar suas possibilidades de atuação, tendo foco não somente no indivíduo, mas
que possa compreender que a organização dos serviços e o conhecimento da
realidade são instrumentos potencialmente capazes de modificar suas práticas.
Trazendo essas reflexões para a assistência à saúde do adolescente, o que deve ser
compreendido é que o profissional da saúde deve pautar sua conduta considerando o
meio ambiente como um fator de importância capital na compreensão da
problemática do adolescente. (PINHO, 2016, p. 16).
A equipe de saúde deve, portanto, ser capaz de compreender que a necessidade dos
jovens em relação às questões que envolvam saúde está muito mais voltada a assuntos de
ordem subjetiva, como: busca de compreensão das mudanças vividas, autopercepção,
orientações, sexualidade, dentre outras (SILVA; RANÑA, 2006).
Outro ponto de extrema relevância foi conhecer a cognição dos profissionais
entrevistados sobre a lei 12.015/09, especificamente, sobre a redação do artigo 217-A. Segue
trechos das entrevistas apresentadas abaixo:
“Sei que aos menores de 14 anos e crime ter relações sexuais ou qualquer ação que
desperte o desejo da criança”. (E11).
“Sei que e crime ter relações sexuais ou outro ato libidinoso com menor de 14 anos”.
(E10).
“É considerado crime ter relação sexual ou ato libidinoso com adolescentes abaixo
de 14 anos. O governo vê os adolescentes menores de 14 anos como incapazes para
decidir sobre sua vida sexual nessa faixa etária, pois poderiam ser facilmente
manipulados e induzidos a isso”. (E12).
“Tenho conhecimento que existe uma lei que resguarda o menor de crimes sexuais”.
(E5).
“Compreendo que seja enquadrado como estupro, quando ocorre relação sexual
envolvendo menores, mesmo que tenha sido consentida pela adolescente”. (E2).
“Esta lei configura o ato sexual, as relações sexuais, com menores de 14 anos, como
crime de violência sexual, estupro hediondo, inafiançável”. (E3).
“Conheço superficialmente. Sei que a relação mesmo consentida tem que ser
notificada para órgãos competentes, com a finalidade dos mesmos tomarem
intervenções necessárias”. (E6).
100
“A lei considera crime, ou seja, estupro de vulneráveis, manter relação sexual com
menores de 14 anos. A lei não tem como parâmetro qualquer outra argumentação a
não ser a idade. A idade e o elemento central para esse entendimento”. (E4).
“A lei e bastante clara! Não deixa margem para interpretações. Para a lei, menor de
14 anos não tem discernimento para consentir, embora a realidade atual, com a
gravidez cada vez mais precoce, precisou encontrar estratégias eficazes, não
somente para a proibição, mas a educação, formação dos adolescentes e seus
familiares”. (E1).
“Eu conheço a lei, ela garante as crianças e adolescentes o acesso a profilaxia das
doenças sexualmente transmissíveis, ao aborto legal, no caso de gestação, ao
atendimento multiprofissional.”. (E9).
“Mesmo que com 12 ou 13 anos, a menina permita ou deixe o ato sexual e crime. A
idade manda, e uma criança, não pode ter idade para consentir mesmo”. (E8).
“Não conheço detalhes, o que sei e que e crime por já ter escutado falar sobre o
assunto” (E7).
Dos 15 (quinze) profissionais entrevistados 86,6% responderam conhecer a lei30
e a
redação do artigo. Já 13,3% dos entrevistados disseram não ter a mínima ideia da lei e nem da
redação da mesma, configurando-se que o desconhecer da lei não é fator que limite a
aplicação do dispositivo penal na instituição pesquisada.
Em outra análise – e nem pode ser alegado, pois nenhum cidadão poderá alegar
desconhecimento da lei para poder aplicá-la –, Greco (2009) descreve que ninguém pode
alegar o desconhecimento da lei como tese de defesa, pois o Código Penal, art. 21, dispõe que
o desconhecimento da lei é inescusável.
A lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, Decreto-lei nº 4.657, de 4 de
setembro de 1942, em seu Art. 3º prescreve: “Ninguem se escusa de cumprir a lei, alegando
que não a conhece”. Para o exercício da cidadania, portanto, o conhecimento da legislação
sempre é importante e fundamental, pois somente assim poderemos fazer com que nossos
direitos sejam respeitados e assegurados.
Assim, quando se fala em sociedade é necessário ter o mínimo conhecimento de
que para tal entidade social evoluir. Desse modo, faz-se necessário a ocorrência de
códigos que regulam e norteiam a vida dos indivíduos pertencentes àquele grupo social
chamado de sociedade. Nota-se ainda que a legislação em países de direito escrito e com
30 Qual seu conhecimento sobre a lei 12.015 de 07 de agosto de 2009 que inseriu o artigo 217-A no Código Penal
Brasileiro, que trata do crime de “estupro de vulnerável”? Que tem como redação: “Ter conjunção carnal ou
praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos”? Melhor explicando: (Ter relações sexuais, MESMO
CONSENTIDA, ou outro ato que venha satisfazer o desejo sexual do agente ativo, isto é, satisfação de seus
desejos ou apetite sexual com menor de 14 anos).
101
Constituição rígida31
é a principal fonte formal estatal de controle das ações praticadas
pelos cidadãos.
Dadas essas considerações, o que verificamos pelas respostas dos profissionais é que
eles podem até não ter profundo conhecimento da lei, porém, nenhum profissional relatou
desconhecimento do dispositivo penal, fator importante para execução social de uma lei.
No ano de 201632
a MEAC notificou ao conselho tutelar 59 casos de abuso de
vulnerável e, até julho deste ano, já tinham 46 casos registrados, ou seja, os casos notificados
no meio do ano de 2017 já quase superam do ano todo de 2016.
Quadro 1 – Notificações ao Conselho Tutelar, distribuídos por ano.
Ano Ano Jan/Jun.
Notificações por categorias 2015 2016 2017
S. Social 02 44 39
Psicologia 08 15 05
S. Social/Psicologia 00 03 00
Enfermagem 00 00 02
Médico/Outras 00 00 00
Total 10 62 46
Fonte: Psicossocial MEAC, 2017.
Corroborando com as resposta da entrevista33
, sobre a obrigação de notificação ao
Conselho Tutelar, verificamos que o ônus da notificação é delegada ao Serviço Social (ver
falas dos entrevistados). Ao analisarmos o número de notificações por categorias
profissionais, notamos que o assistente social é o profissional mais acionado para realizar este
tipo de atendimento, fato que não desobriga outros profissionais por não ser atribuição
privativa da profissão, ou seja, qualquer profissional pode e deve notificar. Vejamos:
No Brasil, os maus-tratos contra a criança só passaram a merecer maior atenção no
final dos anos 80. Nessa época, os maus-tratos foram tratados na Constituição
Federal (art. 227) (Brasil, 1988) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
(Brasil, 1990), que tornaram obrigatória a notificação de casos suspeitos ou
confirmados (art. 13), prevendo penas para os médicos, professores e responsáveis
por estabelecimentos de saúde e educação que deixassem de comunicar os casos de
seu conhecimento (art. 245) (...) A legislação sobre maus-tratos no Brasil tem
adotado como parâmetro o modelo americano no que diz respeito à obrigatoriedade
de notificar estabelecida para profissionais, à necessidade de encaminhamento da
notificação a um organismo designado em lei e à punição para o profissional que
não notifica. (GONÇALVES, 2012, p. 316).
31 Constituição Rígida é a somente alterável mediante processos, solenidades e exigências formais especiais,
diferentes e mais difíceis que os de formação das leis ordinárias ou complementares. 32
Fonte Serviço Social da MEAC. 33
Você sabia que ao atender uma menor de 14 anos grávida, mesmo não tendo sofrido violência sexual, é
obrigado (a) notificar este atendimento ao Conselho Tutelar do Município de origem, do bairro ou Regional da
Instituição que houve o atendimento?
102
Como percebemos no quadro acima, o número de notificações compulsório, ao
Conselho Tutelar, só cresce. Até junho o número de notificações já estava na casa das
quarenta notificações quando observamos o quadro do ano passado. Número esse expressivo,
visto que só estava no meio do ano vigente.
Esse dado só corrobora com a ideia de que as políticas de educação sexual, junto à
norma posta desde 2009, não estão atingindo seu objetivo. Nem quanto à prevenção da
gravidez precoce entre os adolescentes e nem quanto a coibir, imputando como crime,
qualquer ato libidinoso com menor de 14 anos.
Diante do já exposto, mostraremos no quadro a seguir a percepção dos profissionais
acerca da notificação compulsória ao Conselho Tutelar diante de uma relação consentida.
Quadro 2 – Percepção dos profissionais frente à notificação compulsória ao Conselho Tutelar. Fortaleza, 2017.
Fonte: Elaborada pela autora.
103
Sobre a aplicação da ficção jurídica34
da lei 12.015/09, que veio para proteger os
menores de 14 anos dos crimes de pedofilia35
, quando não há violência se deveria haver
criminalização. Dos profissionais entrevistados 7 (46,6%) responderam que “sim”. Notou-se
também que a categoria “maturidade intelectual para tomada de decisão é muito importante”
estava presente em quase todas as respostas e o contexto que os fatos aconteceram.
Percebemos que outra categoria “relatividade” estava muito presente, uma vez que
nada pode ser rígido. Destacaram-se também expressões como dos propósitos do “rapaz”; das
“Condições sociais dos dois”, do “cumprimento da lei pela lei” e “responsabilizar e modificar
os meios de comunicação pela perversidade e impiedade, como tratam os jovens”; “mais
condições as famílias na assistência aos seus filhos”.
Outra categoria bastante lembrada entre as entrevistadas foi família, o núcleo
familiar, o pai e a mãe que não dedicam tempo para ficar com os filhos. Outro elemento que
ficou bem claro nas respostas dos profissionais foram as instituições responsáveis por esse
seguimento social, o Poder Judiciário na figura juizado do menor e os Conselhos Tutelares,
escola e comunidade.
A família, ainda se figurando como a primeira escola e na falta dela uma sociedade
anencéfala, onde dos que se lembraram dessa categoria, colocaram o problema e a solução na
mesma, atribuindo a responsabilidade da educação sexual dos filhos à célula familiar.
Vejamos o que fala Oliveira:
A gravidez e o risco de engravidar podem também estar associados a uma baixa
autoestima, ao funcionamento intrafamiliar inadequado ou à menor qualidade de
atividades do seu tempo livre. A falta de afeto e apoio da família, em uma
adolescente cuja autoestima é baixa, com mau rendimento escolar, grande
permissividade e disponibilidade inadequada do seu tempo livre, poderiam induzi-la
a buscar na maternidade precoce um meio para suprir suas carências, conseguindo
um afeto incondicional, talvez uma família própria, reafirmando assim o seu papel
de mulher, ou sentir-se ainda indispensável a alguém. (OLIVEIRA, 2013, p. 45).
Verificamos que 3 (três), isto é, 20% dos entrevistados no momento do depoimento
não souberam responder à pergunta, preferindo pular a questão, enquanto 5 (cinco), ou seja,
33,3% responderam que: “não deveria ser crime, quando consentida a relação sexual”,
34 Nesse sentido disserta Borges: Ficção jurídica é um conceito criado pela doutrina do Direito para explicar
situações que aparentemente são contrárias à própria lei, mas que precisam de soluções lógicas, satisfazendo os
interesses da sociedade. 35
A lei 12.015/09, veio para proteger os menores de 14 anos dos crimes de pedofilia, na sua opinião: se uma
menor de 14 anos tiver relação sexual com uma pessoa maior de 18 anos, sem violência, essa ação deveria ser
criminalizada, porquê?
104
“poderia não ser compulsória a notificação, pois deveria haver a avaliação do contexto, de
como ocorreu o fato, dando importância na avaliação psicológica e social”.
Estas foram colocações predominantes e as mais lembradas nas respostas. Soma-se
que a aparente maturidade foi fator que fez com que o profissional de saúde ponderasse em
dizer que: “se a adolescente apresentar um desenvolvimento corporal e se houve
consentimento dos pais e uma relação com o rapaz de forma respeitosa”, o fato deveria ser
considerado, inclusive, sem o aval da família. Nesse caso, seria dada prioridade à questão de a
jovem ter maturidade para poder consentir com o ato sem a interferência de terceiros.
Os entrevistados, quando indagados sobre o consentimento da relação, 40%
afirmaram que sendo consentida não há nenhum problema. Porém, o que nos chamou atenção
foram as profissionais que afirmaram que, se o consentimento viesse da família, o problema
estaria resolvido. Isso significa que o consentimento da família supre o da adolescente,
significando na realidade que 53% dos entrevistados, ou seja, mais da metade não veem
problema nenhum quando uma adolescente menor de 14 anos pratica relação sexual
consentida.
A nova tipificação penal deu-se, assim, de forma objetiva, sem qualquer ilação sobre
a presunção de violência, superando-se a polêmica, tendo a lei vedada objetivamente
à conduta de ter conjunção carnal com menor de 14 anos. Diz-se tenha o legislador
imprimido um “verdadeiro golpe de mestre” na discussão quanto a validade da
presunção nos crimes sexuais, não se podendo, a partir de então, falar em alguma
presunção, mas simplesmente na existência de uma proibição legal com sanção
penal para aquele que pratique essas espécies de condutas. (REVISTA JURÍDICA
ESMP-SP, v.5, 2014, p. 69-98).
Dos outros profissionais somados, 47% deles disseram que, mesmo consentida pela
menor, consideram abuso o ato sexual. Isto é: pelas respostas, mais da metade não veem como
crime o ato sexual praticado por menor de 14 anos se houver consentimento. Senão, vejamos:
Têm-se como foco da polêmica os casos em que a vítima, menor de 14 anos, já
experimentara relações sexuais anteriores, mormente crianças e adolescentes
prostituídos, tendo, assim, consentido com a prática sexual. Para aqueles que
advogavam a tese da presunção relativa, comprovada situação em que a vítima
apresentara vida sexual ativa – ausente o constrangimento, restaria apenas à
absolvição do réu –, posto não se configurar a elementar violência. Para aqueles, por
sua vez, que se filiavam à corrente da presunção absoluta, a demonstração de
aspectos subjetivos da vítima que concluíssem pela ausência de violência real não
seria obstáculo à condenação. (MONTEIRO, 2014, p. 72).
Nota-se, assim, que a situação da família expressa a possibilidade da prática sexual
na adolescência em motivações inconscientes de afeto.
105
Este é mais um reflexo da educação de pais modernos, onde a busca de melhor
qualidade de vida faz com que pai e mãe fiquem mais tempo fora de casa e muitas vezes os
valores como a moral e a ética, que foram perpassados de pai para filho, fiquem no passado.
Um momento marcante do estudo foi quando se questionou a existência de
conflitos36
dos profissionais na implementação da lei 12.015/09 tais achados estão descritos a
seguir:
“Sim, porque muitas vezes esses homens que despertam a libido ou mesmo tem
relações sexuais é de comum acordo com as adolescentes, isso torna difícil ser
tratado como crime”. (E1).
“Verifiquei que a dificuldade e que, muitas vezes, o homem que se relaciona com a
pessoa com menos de 14 anos é o provedor de toda a família extensa, da pessoa
menor de 14 anos, em alguns casos, à tira também de uma situação de violência
intrafamiliar”. (E2).
“Não tenho dificuldades, pois não trabalho diretamente com menores nesta
situação”. (E3).
“Acho que um ponto de conflito enfrentado no dia a dia profissional e a
compreensão da equipe multiprofissional de que é necessário notificar. Nem todos
os profissionais acham necessária a notificação”. (E4).
“Aqui na MEAC não sinto dificuldades, porém em alguns serviços por onde já
trabalhei, eu tive sim, muita dificuldade”. (E5).
“Sim primeiro por se tratar de algo trabalhoso, e com implicações legais, pois nem
todo profissional se disponibiliza a notificar e informar ao Conselho Tutelar, ficando
um ônus para poucos, além de fazer outras orientações a adolescente e seus
familiares a gente ainda tem que notificar. Segundo por se tratar de algo ainda não
muito bem trabalhado na sociedade, existem muitas dúvidas sobre a lei”. (E6).
“Sim, tenho muitas dificuldades, conflitos pessoais em fazer a notificação, em uma
hora você atende a adolescente e a família, cria vínculos, daqui a pouco comunica
que terá que notificar ao conselho tutelar porque a garota é menor de 14 anos, muitas
vezes o companheiro está do lado, como vou dizer isso pra ele e pra ela, é difícil...”
(E7).
“Na realidade, essa parte e mais vista pela assistente social, confesso que não me
sinto inserida nesse contexto, nesse fazer profissional. Na maioria das vezes, a
adolescente está acompanhada pelos familiares ou por seu parceiro... sei que é pra
notificar, mas delego esse ônus a assistente social. ” (E8).
“Sim, porque muitas vezes a atribuição de identificar, notificar e encaminhar fica
exclusiva de uma categoria profissional, mas a lei não fala que tem que ser
notificada por categoria A ou B, a notificação é de qualquer profissional”. (E13).
“Enfrento sim, pois observo nas adolescentes abaixo de 14 anos com maturidade e
um alto grau de comprometimento com sua saúde. Fica difícil classificar como
estupro a vida sexual desses adolescentes, quando não há violência. Fica difícil,
entender uma lei que te ordena de forma compulsória notificar, quando claramente
eles optam por seus relacionamentos”. (E15).
36 Respostas dos profissionais que responderam sim ao enfrentamento de dificuldades ou conflitos na
implementação da lei 12.015/09.
106
As falas nos remetem aos conflitos enfrentados diariamente pelos profissionais da
saúde, sob a égide das políticas públicas dos jovens e adolescentes, entrando em choque com
as limitações que a lei 12.015/09 impõe aos mesmos. De um lado o fazer educativo,
preventivo e, do outro, o repressivo coercitivo.
Gráfico 3 – Notificação compulsória ao Conselho Tutelar. Fortaleza, 2017.
Fonte: Elaborada pela autora.
Quando os profissionais da área da saúde foram perguntados sobre a obrigação de
notificar de forma compulsória ao Conselho tutelar às menores após a consulta foi respondido
que: sete (46,6%) dos profissionais entrevistados responderam que sempre comunicavam ao
Conselho. Outros dois (13%) afirmavam que sabiam, porém, nem sempre comunicavam. Já
outros dois (13,3%) dos entrevistados relataram que sabiam, porém, nunca comunicavam. Por
fim, dois (13,3%) dos profissionais não sabiam que precisavam notificar o caso ao Conselho
Tutelar.
Ao fazermos uma comparação do gráfico, que mostra sobre o conhecimento da lei
12.015/09 entre os profissionais entrevistados, podemos verificar que a não notificação nem
sempre é por desconhecimento da lei, visto que 13 (86%) dos entrevistados afirmam ter
conhecimento sobre a redação da lei. Porém, a maioria dos respondentes não sabem que o
órgão responsável, em primeiro momento, seria o Conselho Tutelar para a partir de então dar
seguimento ao processo de encaminhamento a outros órgãos competentes, como o Juizado da
Infância. Ação que reflete o que é certo fazer, mas que nem sempre é observada na prática
diária.
Quando indagadas sobre se as instituições hospitalares estão preparadas para essa
nova realidade – todo atendimento a menor de 14 anos grávida, mesmo sem violência, deveria
ser notificado ao Conselho Tutelar – catalogamos algumas falas dos entrevistados:
107
“Sim, enquanto não ficar oficializada por súmula vinculante, prevalece à lei e a lei
deve ser cumprida”. (E11).
“Quanto as outras instituições, não sei responder. Mas quanto a MEAC, com certeza
é uma instituição bem preparada para notificar ao Conselho Tutelar”. (E10).
“Não sei dizer das outras com profundidade, mas pelo que vejo aqui na MEAC pelo
o envolvimento da equipe, com certeza. Não há preparo nem nas instituições, seja
ela hospitalar ou jurídica, nem na família, que a meu ver é o berço das instituições.
Pois e nela que se começa a moldar o caráter de todo ser humano”. (E15).
“Não, vejo que nenhuma está! Com esta sociedade contaminada, cheia de vícios,
levamos a mesma sociedade que está lá fora, pra cá, pra dentro dos muros da
MEAC, e de qualquer outra instituição. Você tira os problemas pelas instituições
brasileiras, a maioria falida, reflexo de uma sociedade alienada”. “Ainda não estão
preparados, muito menos os profissionais, uma vez que a sociedade acha natural
quando a menor realiza o ato sexual, só causa polêmica quando e um ato forçado.”
(E15).
“Sim, está! Acho que está. É uma maternidade grande, com uma equipe
multidisciplinar bem grande também (Creio que sim, pelo menos, é pra estar
preparada”...). (E6).
“Não conheço outras realidades, mas na MEAC não há consenso entre os
profissionais, alguns notificam, outros são omissos, por quererem ser omissos, não
querem sair da sua zona de conforto, por medo? Enfrentar o companheiro? A
família? O namorado? Alguns acreditam que está relacionado diretamente com a
liberdade da adolescente em fazer suas escolhas, acredito nisso... cada um deve ser
livre para poder escolher, onde está o direito a privacidade? Outros acreditam que é
quebra de sigilo profissional. Mas muitas vezes está relacionado ao
desconhecimento”. (E3).
“Acredito, sinceramente que não, se nós não estamos as instituições tambem não!
Recebemos na MEAC, inúmeras crianças e adolescentes de outras instituições que
não fazem este tipo de atendimento, quando converso com alguns colegas sobre este
fato – atender menor de 14 anos grávida e falo que é crime- eles me ignoram, dizem
que não vão perder tempo com isso, e me perguntam: onde estão os transgressores
deste tipo de crime, estão presos? Se forem prender, vai faltar cadeia”. (E2).
“Não, não estamos nós preparados, imagine os hospitais, a família que e o berço da
educação, isso tambem e falta de educação, estrutura familiar”. “Em minha opinião
deve haver um esclarecimento Multidisciplinar’, ou seja, diversos setores da
Instituição independentemente de participarem do atendimento direto, ou seja, uma
abrangência multi-setorial”. (E1).
“Não, o Estado joga a lei, mas não nos preparam pra isso, pensam que e só fazer lei,
jogar na sociedade e pronto, como um passe de mágica tudo acontece. Existem
instituições que já fazem essa abordagem. Resta saber como essas informações são
conduzidas, muitas vezes passamos informações através de formulários e não
obtemos retorno. Tem que funcionar a multidisciplinaridade”. (E9).
“Tenho conhecimento que a MEAC está se preparando por ocasião da contratação
de mais funcionários pela EBSERH, entretanto não houve capacitação para esses
novos profissionais, ainda nesse assunto, eu mesma já tenho dois anos de MEAC,
ainda não recebi capacitação, nenhuma! Sei sobre esse assunto porque escuto dos
outros profissionais mais antigos que é obrigado à notificação ao Conselho Tutelar,
eu mesma quando entrei não sabia sobre essa obrigação, também me formei e logo
entrei pelo concurso da EBSERH”. (E11).
108
“Nenhuma instituição hospitalar está preparada, nenhuma! Não estão preparadas
para notificar todas as pacientes menores de 14 anos grávidas, isso não existe, os
hospitais vivem lotados, ninguém vai perder tempo notificando todas menores que
chegam grávidas, hoje tem crescido muito o número de menores grávidas, muitas
delas nem aparentam a pouca idade, se formos notificar tudo (...). Por enquanto não
estão cientes da nova realidade, e as implicações da lei. Reflexo da sociedade que
vivemos”. (E13).
“Acredito que não! Nem todo profissional acredita que e necessário notificar ou se
prontificar para isso, visto que a relação é consensual... se é consensual não houve
violência. Qual a violência? Hoje está tão comum o sexo entre os adolescentes, a
virgindade caiu em desuso. Preparadas não estão mesmo, faz-se necessário à
presença de pessoas que conheçam a lei e que nos falem sobre ela e suas
implicações”. (E1).
“Na realidade a lei deve ser divulgada para ser cumprida. Confesso que tive
conhecimento da lei durante essa entrevista. Mas eu acredito que a partir do
momento que o homem assume a adolescente, não há que intervir na vida dos dois.
Os profissionais devem ser capacitados para não estarem julgando essas menores e
sim orientá-las a se cuidarem durante o ato sexual”. (E14).
“Não estão preparadas. Nossos medicos em sua maioria se recusam a fazer o aborto
legal. Imagine outras coisas. As instituições estão longe de estarem preparados,
reflexos da omissão social. O que acontece é que estamos enxergando, mas não
queremos ver, os tempos são outros a sociedade mudou. As instituições não estão
preparadas porque a própria sociedade também não está. Se a criminalização
resolvesse, seríamos o país mais bem organizado do mundo, não é impondo leis que
a indivíduo internaliza o fazer ou o não fazer. Se lei resolvesse não estaríamos nesse
caos! Mas de uma maneira geral, a MEAC, está! ” (E6).
“Confesso que fico alheia”. Não fico perguntando a Assistente Social se ocorreu a
notificação ao Conselho Tutelar. Me esquivo, talvez por acreditar que a
responsabilidade seja do serviço social, mas de outra forma... a assistente social não
está vendo meu atendimento, como ela vai adivinhar? Estou sendo omissa (...).
(E11).
“Acredito que nem todas as instituições estão preparadas. Só fiquei sabendo da
obrigação dos profissionais, através dessa pesquisa. Acho que nossa obrigação é
orientar a família quanto à lei. E estas procurarem os órgãos competentes para
aplicar tal medida”. (E7).
Notamos precariedade em capacitação na área, pois os profissionais reconhecem a
falta de conhecimento do tema e demostram que a grande maioria das entrevistadas acha que
as instituições não estão preparadas, por vários fatores, dentre os citados, à infraestrutura e ao
lidar com a natureza humana, como um todo, a fim de melhor servir à sociedade. Fator esse
que é preocupante por denotar o despreparo dos profissionais da saúde em lidar com essa
clientela, que cresce cada vez mais em busca de atendimento especializado na área de
obstetrícia.
Ao analisarmos algumas falas, notamos a necessidade de capacitação entre os
profissionais entrevistados, que reconhecem ter na equipe multiprofissional uma boa
ferramenta para o aprimoramento do atendimento. Porém, é notória a ausência de
109
aprofundamento da temática, faltando-lhes fundamentação para a problemática da gravidez na
adolescência, dentre outras já citadas:
Gravidez e o risco de engravidar podem também estar associados a uma baixa
autoestima, ao funcionamento intrafamiliar inadequado ou à menor qualidade de
atividades do seu tempo livre. A falta de afeto e apoio da família, em uma
adolescente cuja autoestima é baixa, com mau rendimento escolar, grande
permissividade e disponibilidade inadequada do seu tempo livre, poderiam induzi-la
a buscar na maternidade precoce um meio para suprir suas carências, conseguindo
um afeto incondicional, talvez uma família própria, reafirmando assim o seu papel
de mulher, ou sentir-se ainda indispensável a alguém (OLIVEIRA, 2003, p. 12).
Essa realidade chama atenção uma vez que os serviços públicos, tradicionalmente,
têm se caracterizado por um perfil de usuários de poder aquisitivo abaixo da classe média;
muitas delas, retornado no ano seguinte e buscando novamente a consulta de pré-natal,
mesmo sendo disponibilizados métodos contraceptivos.
A não procura aos postos de saúde é muitas vezes fundamentado pelo não
atendimento de suas necessidades específicas pelo Serviço de Saúde. Aspecto esse decorrente
das grandes mudanças biológicas, psicológicas e sociais pelas quais estão passando. Seriam
esses outros motivos que levariam as jovens adolescentes a “esconder” o maior tempo
possível seus medos e anseios sobre sua sexualidade e gravidez. Além dessa contribuição, o
serviço de saúde também tem sua parcela de responsabilidade na ocorrência desse tipo de
gravidez na medida em que raramente promove ações educativas de prevenção e orientação
voltadas para o público adolescente jovem.
O crescente desenvolvimento tecnológico e o alto custo dos serviços de saúde e da
medicina privada nos leva a pensar numa melhor qualidade de serviços. Só não dizem como e
onde a população terá recursos para pagar por esses serviços, assim como não expõe o que
significa saúde e educação, por exemplo, vistas como mercadoria (PAIM, 2002).
Esse crescimento também parece ter contribuído para mudar o perfil dos usuários,
englobando os segmentos de classe média, que, apesar da dificuldade de acesso ao sistema
público, têm preferido este atendimento. Considere-se, ainda, que a despeito das dificuldades
enfrentadas este Sistema tem buscado sua melhoria e investido em qualidade no atendimento
à população. Nesse sentido, o SUS prevê a estruturação universal no acesso igualitário no
atendimento assistencial e equânime na distribuição dos recursos (BRASIL, 1993).
Este contexto de mudança coloca o desafio para as instituições hospitalares buscarem
conhecer, com mais profundidade o perfil das adolescentes, suas necessidades e significados a
fim de realizar uma abordagem focada em sua dinâmica. Observemos, agora, o quadro a
seguir:
110
Quadro 3 – A lei 12.015/09 veio para proteger os menores de 14 anos dos crimes de pedofilia, em sua opinião:
se uma menor de 14 anos tiver relação sexual com uma pessoa maior de 18 anos, sem violência, essa ação
deveria ser criminalizada, por quê? Fortaleza, 2017.
53% Responderam: NÃO, porque37
:
47% Responderam: SIM, por que:
“Porque os menores de 14 anos são bem
orientados quanto à educação sexual. Muitas delas se
prostituem ou praticam atos libidinosos com idosos
só por dinheiro. Iludidas jamais!” (E14). ·.
“Pelo simples fato de ser menor de idade, ser
incapaz de consentir”. (E3).
“Se foi consentida ela já não e mais inocente”.
(E13).
“Porem e uma prática rotineira, nas famílias.
Ficando complicado para as próprias pessoas
permitirem a criminalização diante da legislação
vigente. Por se tratar de pessoas que já fazem parte
do dia a dia da família, já se criou vínculos
familiares”. A lei tem que ser melhor divulgada. (E5). “Não porque, mesmo com menor de 14 anos, eles
já têm discernimento para a prática de atos sexuais,
se já podem até sofrer medida sócio educativa,
segundo o próprio Estatuto (Estatuto da Criança).
Porque não consentir com o seu corpo?!” (E1).
“Porque esse procedimento iria inibir outros
casos”. (E2).
“Se a relação for consentida, não deve ser
criminalizada, pois a menor de 14 anos, na sociedade
atual, e consciente e sabe o que está fazendo”. (E8).
“Já e uma lei vigente”. Apesar de mal divulgada.
(E11).
“Deveria existir mecanismos educativos desde a
tenra idade para evitar que o fato ocorresse, Começa
a prevenção na família”. (E10).
“Porque a lei existe para ser cumprida”. (E4).
“Não conheço o vies da lei. Gostaria de saber
lidar com esse tipo de situação. Entende-se que
menores de 14 anos mesmo bem instruídas ainda não
conseguem decidir pelo que e melhor para si”. (E6).
“Acho que sim, porem deve ser divulgada. No
caso as adolescentes também devem ser instruídas
com (Educação Sexual)”. (E7).
“Punição criminal, acho muito pesado uma vez
que foi com consentimento da menor, mas deveria
ter um acompanhamento psicossocial, seria uma boa
alternativa, pois muitas vezes destes atos surgem às
gravidezes. Trabalho para as equipes
Multidisciplinares”. (E9).
“Pelo risco de gravidez. Uma gravidez indesejada
é uma condição de pobreza para a família e para a
adolescente. Gravidez precoce é um desastre, pois
este ser humano irá pular etapas de sua formação
como ser humano”. (E15).
“Sendo consentida não há desacordo social ou
uso de força, abuso. Assim sendo, não existe Crime”.
(E12).
Fonte: Elaborada pela autora.
Verifica-se, ao observar o quadro, que apesar de 47% dos profissionais da saúde
terem assinalado que, mesmo sendo consentida a relação, o sujeito ativo deve sofrer sanção
penal, pois há crime. Nota-se, ainda, que no momento de argumentar o porquê de estarem
escolhendo essa opção, faltaram-lhes argumentos. Não vislumbramos segurança em suas
colocações, muitas vezes, deixando a resposta vaga sem muito aprofundamento ou convicção.
E15 toma uma postura de não ser a favor pelo risco de gravidez, que gera pobreza,
(“queimará etapas [...]”). Isto e, em momento algum colocou a sua argumentação por achar
abuso o ato sexual em menor de 14 anos.
37 Respostas dos respondentes com relação a criminalização do ato sexual consentido.
111
Já E11, corroborando com E7, também se preocupa com a educação sexual. Sem
citar sua reprovação ao sujeito ativo pelo fato do ato sexual, segue em suas colocações que a
lei deve ser divulgada. Todavia, será que com mais divulgação da lei teremos o
recrudescimento dos casos de gravidez precoce?
A entrevistada E5 reconhece ser uma prática rotineira atender adolescentes menor de
14 anos grávida, apesar de valores éticos intrínsecos tomarem posicionamento favorável à
criminalização do agente ativo.
Assim, mesmo todos esses entrevistados tendo tomado partido pela criminalização
do ato, verificamos uma fuga na argumentação, transparecendo pouco conhecimento do
assunto abordado. Apesar do lidar diário com essa clientela, a rotina não os permitiu um
aprofundamento do assunto.
As próximas respostas terão a finalidade de analisar se os profissionais entrevistados
consideram se a lei 12.015/09 facilitou a implementação das políticas públicas para
adolescentes e jovens.
Quadro 4 – Respostas dos profissionais acerca da lei 12.015/09. Fortaleza, 2017.
33,3% Responderam: NÃO
66,6% Responderam: SIM
“Ate o momento não vejo mudanças, ela, a lei é
muito pouca conhecida, principalmente pelas
próprias adolescentes. Falamos em protagonismo
juvenil; mas não facilitamos o conhecimento das
próprias leis, nem os políticos o fazem. Garantir
direitos está relacionado a conhecimento e também
condições de vida da população, sobretudo às que
se encontram em situação de vulnerabilidade”.
(E13).
“Não sei ate que ponto. Ainda não liguei uma coisa a
outra. A resposta é difícil, não sei avaliar. Até porque
vejo de forma reservada a referida lei”. Mas acredito
que sim. (E1)
“Vejo que não facilita em nada, a implementação da
Política Pública. Essa lei é muito complexa, de
difícil entendimento”.(E14).
“Acredito que sim! Não sei opinar sobre isso”. (E5).
“Não! Melhor dizendo para deixar mais claro. Pois
o não, por si só, não seria suficiente (...). Em parte
não! Tomar a idade cronológica como recorte num
país de tanta diversidade sociocultural não é à
medida que teria maior impacto para esse objetivo.
Porém, concordo que ao inibir os possíveis
agressores ela se torna importante”. (E10).
“Acho que sim! Difícil falar sobre isso. Não sei de
forma aprofundada sobre as políticas públicas
destinadas aos jovens. Sinceramente, não sei fazer o
parâmetro das duas coisas, podemos pular essa
resposta?”. (E6).
“Não, porque tira o poder de decisão desses
adolescentes. Seu direito à autonomia e segredo
ético. Além de ofertar mais para esses adolescentes
da política de PREVENÇÃO à GRAVIDEZ e isto
“Acho que sim! No momento não sei como responder
essa pergunta. Vixe (...) que difícil. Nunca pensei nisso.
Olha como estamos despreparados, não sabemos nem
falar da política pública. E olha que trabalhamos com
112
se é crime ela ter relação sexual, como falar de
métodos contraceptivos e conduta de risco com esse
grupo? Acabam se tornando um público com
maiores riscos a essa realidade. Daqui a pouco falar
de gravidez entre os adolescentes, será fazer
apologia à gravidez. Definitivamente, não vejo que
a lei facilite a implementação da lei, pelo
contrário”!(E11).
eles (Jovens e adolescentes). Preciso de ajuda para
responder essa pergunta (...)” (E7).
Nunca li a lei em sua íntegra. Mas partindo do
princípio do que sempre acontece no Brasil, creio
que a lei deve ser interessante no papel, mas está
muito aquém da nossa realidade, tornando-a
inviável, ou quando se concretiza; não ocorre de
forma completa. ”(E4).
“Não sei responder essa pergunta, me falta
embasamento pra isso”. (E2).
“Não percebo uma interferência ou prejuízo a
implementação da política pública. Vejo como um
instrumento que veio resguardar os direitos desse
público”.(E3).
“Avalio que seja apenas uma normativa para a política
pública. Difícil dizer (...) preciso de ajuda para
responder essa pergunta (...). É uma norma que ajuda
na sua implementação. Simples assim!”(E8).
“Sim ajuda, só não sei detalhar que tipo de ajuda. Mas
se é lei, deve ajudar. A política Pública precisa da ajuda
da sociedade, e quando a sociedade tem leis que
possam ser aplicadas, e bem aplicadas ajuda e muito”.
(E9).
Sim, acho que ajuda. Não sei bem fazer a comparação
da lei com a política, pois não tenho domínio de
nenhum dos dois assuntos. Aí fica difícil a gente falar
de algo que não domina, e principalmente comparar
uma com a outra, impossível fazer isso.” (E12).
“Sim, com certeza ajuda! Ajuda e fundamenta a visão
de crime nesses casos. Já é uma ajuda quando existe
lei.” (E15).
Fonte: Elaborada pela autora.
Apesar de termos uma média de respostas de 66,6% dos entrevistados, afirmando
que a lei supracitada veio para facilitar a política pública – contra 33,3% contrários a esta
afirmativa – a consistência dos discursos dos profissionais que negaram essa afirmativa teve
um volume maior em suas fundamentações.
Portanto, os argumentos empregados dos 2/3 dos entrevistados, em sua grande
maioria, afirmaram não conhecer a Política Pública e nem a lei, precisando de mais
fundamentação para opinar acerca do assunto. Mesmo assim, afirmaram que a lei veio para
113
facilitar a Política Pública, tornando o discurso no mínimo contraditório. Como posso afirmar
que algo veio para facilitar se desconheço o assunto? Isso, mais uma vez, afirma a
necessidade de treinamento para os profissionais que atendem adolescentes e jovens nesta
instituição, pois quando passamos a entender o problema38
, enfrentamos melhor, procurando
soluções.
Apresentaremos a seguir as falas das entrevistadas quando indagadas sobre a lei que
regulamenta o crime de estupro de vulnerável e como a mesma interage com as políticas
públicas destinadas às adolescentes e jovens.
“Ainda precisa haver políticas públicas destinadas as adolescentes e jovens. É
necessário preparar melhor os profissionais de saúde para compreender e praticar o
funcionamento da lei, independente de seus conceitos intrínsecos com relação ao
assunto abordado. Sabe-se que são bastante altos os índices de estupro em crianças e
adolescentes, principalmente praticados por alguém da família. Inserir este assunto
como problema social político dentro das instituições hospitalares é viável. Deve
haver mais divulgação. A lei existe, é um fato, mas poucos a conhecem ou a
compreendem.” (E1).
“Em primeiro lugar, acredito que a medida que os profissionais, família,
adolescentes, tomarem conhecimento da lei, poderemos repensar em algumas ações
educativas, mas, sobretudo de promoção à saúde. As condições de vida destes
adolescentes, estão relacionados com educação, moradia, segurança, etc. A saúde
não pode ser reduzida à ausência de doença, nas condições em que vive a população,
promover a intersetorialidade e interdisciplinaridade, que é um objeto da política
pública, vai fazer com que as condições de atendimento melhorem, ratificando o seu
objetivo, da implementação da educação sexual em unidades de saúde. Isso faria
com que o conhecimento da educação sexual, pudesse auxiliar no recrudescimento
da gravidez em menores de 14 anos. Se ELE (o profissional) tem respaldo legal.
Deve sim notificar, mas uma notificação consciente, notificação que estará ajudando
a resolver problemas, e não criar problemas.” (E15).
“Acho que interage muitas vezes de forma negativa, causando afastamento do
homem do universo do pré-natal, do acompanhamento da mãe, do bebê. O homem já
é tão ausente nesse acompanhamento da gestante. Por isso tem que ser visto caso a
caso. deveremos orientar a família quanto ao artigo da lei que protege o menor de 14
anos. E a família procurar (se decidir) denunciar o indivíduo à justiça. Acho que
seria dever do profissional, quando a situação não fosse consentida ou não tivesse
discernimento. É um pouco contraditória as coisas, o Estado dá com uma mão e tira
com outra. Tipo assim, organiza as políticas públicas, pra garantir direito, como
exemplo o pré-natal, mas quando estou fazendo o pré-natal, estou lá garantido o seu
direito, aí chega o momento de falar em Conselho Tutelar, em justiça, eu nem falo,
encaminho pro serviço social. É muito desgastante notificar esses casos, se fosse eu
não voltaria pra outra consulta de pré-natal” (E14).
38 Podemos definir problemas, dando margem a várias interpretações, como: um estado subjetivo da mente, algo
pessoal de cada indivíduo, um desafio, uma situação não resolvida, cuja resposta não é imediata, que resulta em
reflexão e uso de estratégias conceituais e procedimentais, provocando uma mudança nas estruturas mentais.
Vejamos alguns autores com suas definições de problemas: Hennig (1998) define problema como uma situação
de dúvida, ou seja, um estado de tensão psicológica capaz de estimular a curiosidade, o pensamento reflexivo e
provocar a ação em busca de uma solução ou atitude de trabalho. Perales (1993) considera o problema como uma
situação qualquer que produz, de um lado, um certo grau de incerteza e, de outro, uma conduta em busca de uma
solução. Gil Pérez et al. (1992) consideram problema como uma situação para a qual não há soluções evidentes;
já Hayes (1980) definiu problema como a fenda que separa um estado presente de um estado almejado.
114
“A lei favoreceu uma serie de ações para criança e adolescentes, vítima de estupro,
na área da saúde, assistência social. Mas prejudica quando há uma obrigação em
notificar ao Conselho Tutelar, e houver a possiblidade de ser aberto um inquérito
policial. Esse engessamento da lei ficou ruim. Acredito que não deveria ser uma
obrigação se notificar quando a adolescente está vivendo maritalmente e o homem
assume com toda responsabilidade. Os menores com 14 anos já não são mais
inocentes, o que deveríamos ter era mais educação em saúde, principalmente, nas
comunidades mais carentes e esquecidas pelo poder público. Deveria sim haver lei
mais severa para aqueles homens que não assumem suas responsabilidades perante a
menor e o bebê, mas retificando o que eu disse, não é lei mais severas que
precisamos, precisamos é o cumprimento das leis que já existem. Enfim, não acho
que essa lei anda junto com as políticas públicas destinadas a esse público em sua
plenitude, na área social, há falhas em muitos pontos, e não é enrijecendo uma lei
que todos os males serão resolvidos.” (E2),
“A partir do momento que a relação é consentida, não precisaria ser notificada, pois
a menor já vive maritalmente com o seu parceiro, e assim deve ser consciente dos
seus atos. A política pública vem pra ampliar direitos e não diminuir ou restringir. A
meu ver, essa lei do jeito que está não faz parceria com os objetivos da política
pública para os adolescentes e jovens, no sentido de ampliar as medidas educativas
na área da sexualidade. E a lei poderia ajudar como uma normatização no
atendimento e acompanhamento do adolescente, coisa que não faz, só atrapalha.”
(E11).
“Creio que sim, devemos notificar. Porem gostaria que o tema fosse estudado em
grupo para alinhar as ações. O governo tem algum programa para tal? Digo
específico para esse proceder? Procurando assegurar os direitos dos adolescentes
menores de 14 anos? Ou só fica impondo lei e a sociedade que se vire em cumprir o
que fora imposto. É muito fácil formular leis e políticas públicas quando não dá
suporte pra coisa. É assim; ‘veja sociedade estou fazendo a minha parte, agora se
vire para fazer a sua’. A meu ver há um conflito da política com a lei, apesar de não
ter um conhecimento aprofundado dos dois temas, mas vivo esse dia a dia, e vejo
que a coisa é complicada para os profissionais que lidam com adolescentes menores
de 14 anos que estão grávidas” (E10).
“Os Conselho Tutelares são poucos e despreparados para intervir em um assunto tão
complicado, o que adianta uma lei dessa ser tão rígida. Até o judiciário é
despreparado para a própria lei. Tem que ser avaliado o contexto familiar e
psicológico do fato. Não adianta nada ter uma política pública se o governo não dá
suporte para os profissionais poderem programar com plenitude, falta tudo, muito
bom tudo no papel, tudo é lindo redondinho, quero ver as avaliações disso tudo lá na
ponta onde estamos, mas isso não dá voto, quero ver as ações”. (E12).
“É complicado opinar sobre isso, acho que interage positivamente, porem em apenas
algumas instituições, quando na verdade deveria amplamente ser adotada para outras
instituições. Veja bem, a coisa funciona aqui, mas trabalho em outro lugar, não vejo
nada disso. Mas como pode? A lei não está pra todos? veja como a coisa não
funciona uniforme? Daí a gente atende uma adolescente, faz tudo redondinho, como
a lei manda, correndo o risco dela não voltar para a próxima consulta de pré-natal ou
o se houver o próximo parto, a instituição e seus profissionais ficam estigmatizados,
já ouvi relato de acompanhantes e até de pacientes, dizendo que aqui na MEAC,
chamamos o Conselho Tutelar pra tudo. Isso não é bom, quando fazemos o que é
certo, o que a lei manda. Em contrapartida outras instituições não fazem a mesma
coisa, e não vejo punição para isso. Não há fiscalização, então as pessoas não ligam
em fazer, só quando tem um comprometimento, como eu vejo aqui nas equipes
multiprofissional da MEAC. Em caso de lei, devemos notificar ao Conselho Tutelar
para posteriormente serem apurados e averiguados os casos de abuso ou extorsão de
alguma espécie. Cabe também, a nós, manter sigilo pessoal. Embora consentida,
115
pode haver casos de “trocas de favores” entre o menor ou seus parentes e o parceiro,
por isso sou a favor que notifique. Em todo lugar que olhamos há corrupção.” (E3).
“No que concerne a identificação, avaliação criteriosa, preenchimento dos
instrumentais adequados, informações ao Conselho Tutelar, interage bem. Mas a
meu ver, existem casos e casos, deveria haver um consenso e analisar cada situação,
mesmo porque são menores, mas como foram criadas? O que a família consente?
Muitas vezes a mãe desta, iniciou sua vida sexual precocemente. Então quando o ato
não é criminoso é necessário avaliar todas as partes para que haja entendimento, pois
muitas vezes essas adolescentes estão iniciando uma família após esse ato sexual e
será que não irá virar um ciclo vicioso? Precisaria haver uma ampla educação
sexual, para a diminuição dos índices de gravidez precoce entre esse público, o que
adianta só criar lei? Não adianta de nada, se você pegar o histórico dessa menor, vai
ver que a mãe dela engravidou muitas vezes na mesma idade” O que adianta eu fazer
todos os trâmites legais como falei no início, se não vemos retorno de tudo isso.
Nossos poder judiciários está abarrotado de ações, se formos colocar em prática, as
cadeias vão ficar hiper lotadas mais ainda, e o qual foi o benefício gerado por isso?
Vai melhorar o atendimento das futuras gestantes? Das não gestantes? Essa interação
deveria ser assim: pronto, vamos fazer isso, porque a lei manda, porque bem aqui
vai melhorar na política pública nesse momento aqui. Eu não visualizo nada disso.
Só vejo preenchimento de papel. (E4).
“Vai ajudar na interação no que diz respeito a prevenção e diminuição do número de
gravidez na adolescência. Acho que os profissionais devem ser instruídos e ter um
instrumento para notificação respaldado na lei. Caso tenha serviço social na
instituição, esse profissional é o mais adequado para proceder com a notificação.
Fazendo conforme essa lei reduzirá os casos de pedofilia.” (E5).
“Esta lei e totalmente contrária às políticas públicas para o adolescente, deixando
essas adolescentes menores de 14 anos muito mais vulneráveis.” (E6).
“Acredito que há situações em que ela se torna positiva; por exemplo: ao inibir a
ação de pedófilos e/ ou pessoas que visam aproveitar-se da pouca maturidade dos
menores de 14 anos. Porém, nos casos em que o adolescente se encontra
cognitivamente apto e capaz de emitir e tomar decisões. A lei pode desconstruir a
vivência de uma sexualidade sadia e integrada, ao conceituar o ato, a relação sexual
como criminosa e ao expor a intimidade da adolescente, podendo transformar o que
seria um momento sadio e bom, a ser recordado, em uma violência traumática. Não
devemos notificar todo atendimento, depende do caso, se for estupro, sim! O sigilo
profissional vai além dessa lei, pois em primeiro lugar, a menor está à procura de
atendimento obstétrico, ou seja, precisa de uma dupla proteção, atendimento pra ela
e para um ser que ainda nem nasceu. Diante disso, como ficamos ao dizer: ‘diante
do que ouvi e vi, agora tenho que comunicar ao Conselho Tutelar o seu caso, pois o
seu companheiro cometeu um crime em manter relações sexuais com você’. A
jovem, nunca mais iria procurar aquele serviço, e se estivesse procurando para um
pré-natal, deixaria com certeza de buscar novamente proteção para ela e seu filho.
Devemos sopesar o que seria melhor, acho uma lei fora da realidade. (E7).
O que se verifica nas falas, mais uma vez, agora sobre a lei 12.015/09, é um
sentimento de despreparo diante dos fatos do que tange a lei. Observa-se claramente nas
indagações a necessidade de um suporte nessa seara, algo que procuramos mostrar nessa
pesquisa.
Portanto, a sexualidade ainda é um tabu e não só para as maiores de 12 e menores de
14 anos de idade. Falar sobre sexualidade ainda não é uma tarefa fácil, nem mesmo entre
profissionais da saúde. Sobre esse aspecto, segundo Foucault (1984, p. 15), haveria duas
116
formas de apropriação da sexualidade por saberes: via uma scentia sexualis e uma ars erótica.
Enquanto para a ars erótica prevaleceria a preocupação com o prazer e com a subjetividade,
para a scentia sexualis a tônica seria o discurso científico e a preocupação com a reprodução,
afirmando o lugar da medicina no disciplinamento do corpo.
Segundo Cortez e Souza (1997, p. 11-24) ainda hoje, na escola, a ênfase seria tratar
sexualidade por tal via, informando que progressivamente o discurso médico fosse substituído
pelo discurso pedagógico ou que “o sexo se transformasse em assunto pedagógico”.
Separamos as falas das profissionais da saúde sobre o que elas poderiam citar sobre
quais políticas públicas poderiam ser mantidas ou criadas para auxiliar a sociedade na
prevenção da gravidez precoce. Vejamos suas respostas no tópico a seguir:
“Acredito que não há necessidade de criar algum projeto. O que deve ocorrer e faz-
se necessário é uma educação continuada e rotineira, pois infelizmente, as propostas
são boas, mas os índices continuam altos, devido a questões culturais e raciais, e
estes são difíceis de serem identificados”. (E3).
“Melhorar as condições de vida da população, mudar de sistema capitalista para
outro sistema que não seja baseado na exploração do homem pelo homem. Mas até
lá, precisamos fortalecer a compreensão que não há futuro no país que não invista na
infância e na juventude e no respeito aos idosos, e nem nos direitos do cidadão.
Precisamos favorecer a articulação da juventude, como autores de sua própria
história”. (E1).
“Acredito que o esclarecimento sobre os metodos contraceptivos e orientações sobre
os cuidados com o corpo”. (E14).
“Primeiramente, definir gravidez precoce e multiplicar as ações de informação sobre
seus riscos e agravos. Políticas de educação sexual que valorizassem a vivência da
intimidade desprovida do medo de adoecer ou engravidar, mas cultivando a vivência
do sexo seguro por um prisma positivo, que estimule o cuidado para melhorar a
qualidade de vida e não pelo medo do desfecho negativo. Políticas que estimulem o
cuidado com o sexo seguro para uma vida melhor, e não pelo medo de um futuro
difícil”. (E15).
“Programas de educação sexual na escola a partir de 11 ou 12 anos. Autonomia do
adolescente, sem julgamentos de valores. Oferecer acesso ao atendimento
multidisciplinar, com linguagem clara, e própria ao adolescente. Oferecimento de
métodos contraceptivos, principalmente os métodos contraceptivos de longa
duração”. (E2).
“Grupos de Educação em saúde na atenção primária em parceria com as escolas.”
(E5).
“As que existem bastam! Só e preciso efetivá-las. As políticas públicas no Brasil,
enquanto estão na moda, na ‘crista da onda’, são eficientes; passado o tempo, caem
no esquecimento ou marasmo”. (E4).
“Em minha opinião, deveriam ser mantidas: o ensino profissionalizante e o acesso
aos métodos contraceptivos; mais incentivo à educação, no sentido de favorecer o
entendimento das populações mais carentes. A orientação e o acesso ao
conhecimento podem prevenir a gravidez precoce. O acesso à saúde e a educação
contribuem para isso”. (E6).
117
“O que deveria ser criado, em minha opinião, seria programas efetivos de educação
da população jovem, oferecendo perspectivas profissionais e de fácil acesso para
todos”... (E8).
“Fortalecimento de uma política pública para atendimento do adolescente.
Fortalecimento da integração das políticas e do trabalho multi”. (E9).
“Educação em saúde no ensino fundamental e medio; programas junto as famílias
que tenham meninas, para apoiar aos pais na educação sexual das mesmas”. (E10).
Ainda sobre o assunto podemos observar no gráfico a seguir, sobre esse dever
profissional, que:
Gráfico 4 – Dever profissional.
39 Fortaleza, 2017.
Fonte: Elaborada pela autora.
Assim, das competências dos profissionais entrevistados 2 (dois) deles (13,3%)
responderam não ser Dever do profissional e nem acreditam ser da responsabilidade do
profissional da área da saúde a notificação aos órgãos competentes. Vejamos suas respostas:
“Não! Porque há situações em que a adolescente tem plenas condições de tomar a
decisão sobre quando e como iniciar sua vida sexual e nestes casos não cabe à
criminalização. Essa minha resposta tem fundamento no seguinte ponto: a
instituição Conselho Tutelar, não está capacitada, muitas vezes, para a resolução de
situações que seriam de sua competência. Porque precisamos caminhar para a
construção de políticas públicas que visem a maior integração e bem-estar da
população e tentar diminuir aquelas que exercem o controle do Estado sobre o
corpo. Porque uma vez que a multidisciplinariedade é uma realidade na construção
de políticas públicas em saúde, os casos deveriam ser analisados individualmente; e
em equipe multidisciplinar serem acompanhados. A equipe definiria quais casos
seriam notificados e quais casos não se enquadrariam em estupro de vulnerável.”
(E13).
“Não deve ser notificado ao Conselho Tutelar de forma compulsória, de jeito
nenhum! Cada caso é um caso, que deve ser analisado de forma individual, não
39 Resposta dos entrevistados após um breve conhecimento do estudo, se saberiam detalhar quais os limites do
“Dever Ser profissional” diante da lei 12.015/09, que versa sobre “Estupro de Vulneráveis”, diante da Ética
Profissional x Lei, deve-se ou não notificar compulsoriamente ao Conselho Tutelar todo atendimento a menores
de 14 anos grávidas com relação SEXUAL CONSENTIDA?
118
podemos generalizar as coisas, e nem tão pouco vidas! Devemos analisar o benefício
dessa notificação. Porém alguns casos são necessários realmente, e nestes, lógico,
devemos notificar. Os casos de estupro, esses sim! Não se pode nem pensar duas
vezes. Mas os casos que nos deparamos todos os dias, que ela vem acompanhada por
seus companheiros, já vivem até de forma marital, esses nem pensar, pode é ter lei
que diga que tem que notificar, mas eu não faço. Tem tanta coisa errada neste país
que não e pra ser feita, mas fazem”. (E11).
Dos outros profissionais, 4 (quatro), ou seja, 26,6% responderam não ser da sua
competência, mas delegam a outros profissionais a notificação. Ao serem indagados quais
profissionais elegeriam para essa notificação a grande maioria dos entrevistados responderam
ao profissional do serviço social.
A lembrança dos profissionais da área de Serviço Social se caracterizou, dentro das
respostas, como os mais procurados e lembrados pelos entrevistados por eles entenderem ser
atribuição dos mesmos realizarem as notificações. Configurou-se, ainda, como o
direcionamento da maioria dos casos ao profissional do Serviço Social como grande
responsável pelos encaminhamentos ao Conselho Tutelar nesta instituição hospitalar.
Vejamos as respostas:
“Verdadeiramente falando em meu trabalho atual, não me preocupo muito com essa
temática, pois deixo a cargo do profissional assistente social, que já realiza essa
busca rotineira. Realmente, quando estou avaliando às puérperas, e percebo que são
adolescentes, não investigo profundamente a sua relação. Percebo que muitas vezes
são acompanhadas por rapazes que se identificam como parceiros e que tem apoio
da família da jovem. Avaliando um pouco de fora, acho que sou ‘omissa’, nesse
quesito ou simplesmente já interiorizei que a responsabilidade maior é do assistente
social”. (E10).
“Não acho que deva ser notificado de forma compulsória, as meninas chegam ao
consultório ou na sala de parto, como acompanhante o próprio parceiro, depois
vemos a mãe a irmã... enfim a família, todos de comum acordo com essa relação,
porque devemos chamar Conselho Tutelar? Eu deixo essa responsabilidade de
notificação ao serviço social, pra falar a verdade, já vejo isso como rotina, então nem
me preocupo. Não deveria ser crime, uma relação consentida, é mexer na
individualidade das pessoas, o Estado não deveria ir além do que foi delegado a ele.
E a individualidade do cidadão? Tem que haver limites para as interferências do
Estado”. (E1).
Já 9 (nove) dos profissionais pesquisados, representado como a maioria dos
entrevistados (60%), responderam ser “dever” de cada profissional a notificação dos casos de
atendimento a menores de 14 anos grávidas. Vejamos alguns trechos de suas falas a seguir:
“O conselho tutelar, assim que compreendo, e um órgão que protege pelo menos
esse é o objetivo, crianças e adolescentes, garantindo seus direitos. Para que haja
uma atuação efetiva e sejam promovidas ações. O Conselho Tutelar deve ter
conhecimento do fato. Quando a relação sexual for consentida, este fato deve ser
levado em consideração, inclusive, discutido com a família. Dependendo da
situação, deverá haver acompanhamento só a distância pelo Conselho Tutelar”. (E2).
119
“Somos regidos pela Constituição Federal Brasileira, e devemos seguir as leis”. Ate
o presente momento temos a obrigação de notificar ao Conselho Tutelar.
Continuamos notificando; porém acho que devemos rediscutir esse tema a nível
nacional e avaliar o quanto essa lei ajuda a diminuir as taxas de gravidez na
adolescência. (E3).
“Temos que notificar porque auxilia ao órgão em saber a incidência de casos e criar
políticas públicas destinadas às jovens e adolescentes”. (E5).
“Devemos notificar para cumprir a lei pela lei! Já que não existe ainda súmula
vinculante, nem casos de jurisprudência generalizados para todos os Estados
brasileiros”. (E15).
“Sim, pois por acreditar que uma adolescente de 14 anos não possui maturidade
suficiente para conduzir sua vida. Essa notificação deverá, sim, ser feita ao Conselho
Tutelar, que acredito ser o órgão responsável em tomar as devidas providências.
Porque também acredito, que este órgão tem o poder em intervir em algumas
situações dentre elas: evasão escolar, verificar se a gravidez realmente foi consentida
pela adolescente, atuar juntamente com a família para identificar o responsável pelo
ato e assim tentar conduzir da melhor forma, a jovem adolescente, durante sua
gravidez e nos seus projetos futuros de vida”. (E12).
“Sim, para o Conselho Tutelar tome as medidas cabíveis”. (E9).
“Acredito que deve ser notificado, sim! Para que sejam criadas políticas públicas
destinadas aos adolescentes e jovens”. (E14).
“Desde meu ingresso na MEAC, minhas colegas de profissão me repassaram este
dever, como uma de nossas atribuições, não privativas, mas como dever ético de
proteção às crianças e adolescentes. Não é somente uma burocracia. Contudo é
importante refletirmos a respeito. Nós não podemos acompanhar, muitas vezes, esta
adolescente e família pós-alta médica, depende da adesão delas. Então, são estes
órgãos que devem acompanha-las para segurança da adolescente e do bebê. Afinal
de contas é o direito da adolescente, mas também do bebê”. (E4).
“Como profissional, e como dever ser profissional, como e lei! Lei tem que ser
cumprida. Mesmo não concordando com a lei. Se a menor consentiu e vive com o
cônjuge, acredito que não precise ser notificada. Se todos os pacientes menores de
14 anos, grávidas, com relação sexual consentida, tiver que ser notificada de forma
compulsória, ao Conselho Tutelar, ele não vai dar conta do número de adolescentes
grávidas”. (E6).
“Acredito que deva ser notificado os casos conforme previsto em lei. Os dados
oriundos das notificações podem servir de base para a implementação de outras
políticas públicas; a notificação, garante ou deveria garantir a proteção às
adolescentes menores de 14 anos. O profissional ou a equipe que acompanhar a
adolescente, estará atenta as situações de violência”. (E7).
“Na condição de profissional, devemos trabalhar em conformidade com a lei;
notificando todos os atendimentos a menor de 14 anos grávida. Mas são situações
que merecem reflexões para futuras contribuições e amadurecimentos. A realidade
vem nos mostrando que este público está iniciando muito cedo sua vida sexual”.
(E8).
Dessa forma, nos relatos de cada profissional dessa parte da entrevista, percebeu-se a
diversidade de opiniões sobre as políticas públicas regulatórias a que estão sujeitas esse
seguimento de profissionais, bem como sobre as opiniões divergentes sobre a norma e seu
cumprimento.
120
Estas são questões que levam à limitação dos benefícios que a política pública para
adolescentes e jovens pode oferecer às adolescentes menores de 14 anos e gestantes e,
consequentemente, diminui a eficácia da saúde integral garantida por lei constitucional.
121
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa evidenciou que, a despeito do conhecimento já produzido sobre
Políticas Públicas para adolescentes e jovens, não há efetivamente políticas públicas
específicas para esse grupo etário dentro do contexto nacional acerca da sexualidade e
reprodução na adolescência.
Diante do cotejo realizado, em uma interface com as políticas públicas de atenção a
adolescentes e jovens nessa fase do ciclo vital, a lei 12.015/09 de 07 de agosto de 2009 em
nada viabilizou a inclusão social desse seguimento da população e nem direciona os
profissionais da saúde na efetivação da lei na melhoria da educação sexual segundo estudos
do Fundo de População das Nações Unidas:
Como a gravidez na adolescência é o resultado de diversas forças subjacentes
sociais, econômicas e de outras naturezas, ela requer estratégias multidimensionais
orientadas ao empoderamento das meninas e adaptadas a grupos específicos de
meninas, especialmente as marginalizadas e mais vulneráveis. (UNFPA, 2013, p.
13).
Assim, observamos no decorrer desse trabalho que a trajetória a ser percorrida é
extensa e cheia de entraves na seara jurídica e nas três esferas políticas. Na esfera jurídica, a
lei veio para sanar os problemas em decorrência dos crimes sexuais só que ninguém
imaginaria a celeuma que isso causaria.
Nas esferas do poder político, além da criação de uma boa política pública, tem que
haver duas coisas principais: a disseminação da própria política e a continuação da mesma,
pois
Pesquisas mostram que o combate à gravidez indesejada entre adolescentes requer
abordagens holísticas, e, uma vez que os desafios são grandes e complexos, não
existe um único setor ou organização que possa enfrentá-los sozinho. Os obstáculos
ao progresso só podem ser vencidos por meio do trabalho em parceria com todos os
setores e em colaboração com as e os próprios adolescentes. Manter as adolescentes
em trajetórias de vida saudáveis, seguras e afirmativas requer investimentos
abrangentes, estratégicos e direcionados que atendam às múltiplas fontes de
vulnerabilidades, que variam de acordo com a idade, capacidades, faixa de renda,
local de residência e muitos outros fatores. Requer também esforços deliberados
para se reconhecer as diversas circunstâncias dos adolescentes e identificar as
meninas em maior risco de gravidez na adolescência e com maior possibilidade de
maus resultados em termos de saúde reprodutiva. Tais programas multisetoriais são
necessários para a construção de ativos para as meninas em todas as áreas - saúde,
educação e meios de subsistência - mas também para empoderá-las por meio de
redes de apoio social, aumentando seu status em casa, na família, na comunidade e
nos relacionamentos. Intervenções menos complexas, mas estratégicas, também
podem fazer a diferença. (UNFPA, 2013, p. 34).
122
Nesse sentido, o despreparo dos serviços hospitalares e dos profissionais é um fator
impeditivo para a efetivação das políticas, produzindo dificuldades ao acesso do serviço e
deixando a saúde integral amplamente divulgada pelas políticas destinadas aos jovens e
adolescentes em segundo plano. Soma-se ainda o fato de que submete as jovens à experiência
de assistência por profissionais que atuam de forma prescritiva e acrítica, onde verificamos
em muitas falas que a notificação é feita porque a lei obriga, mesmo não concordando com a
mesma, não indo além do fazer mecânico do dia a dia, além de desconsiderar a autonomia e o
contexto vivencial da menor de 14 anos.
Para o pleno exercício de uma assistência ética em saúde para este grupo de
profissionais entrevistados, verificamos que se faz necessário o aprofundamento da política
pública analisada, mediante curso de capacitação voltada ao atendimento a adolescentes e
jovens, bem como uma maior compreensão das atribuições e competência privativas de cada
profissional. Isso porque a incorporação dos conhecimentos de abrangência a esse grupo
pressupõe, entre outros fatores, o conhecimento da lei 12.015/09, notificação ao Conselho
Tutelar e a efetividade dos princípios do SUS, os quais são legitimados pela Constituição
Brasileira, embora ainda seja pouco ou às vezes não praticados no contexto de atenção ao
adolescente e jovem em um ambiente hospitalar.
A relevância dessa pesquisa apresentou-se pelo fato de buscarmos analisar a
implementação da lei de estupro de vulneráveis na esfera social. Precisamente, procurou-se
trabalhar e sentir seus reflexos no atendimento do dia a dia de uma maternidade de Fortaleza,
onde presta atendimento a um segmento populacional que até 2010 nem fazia parte das
estatísticas do IBGE.
Este estudo – que teve como objetivo específico verificar a compreensão dos
profissionais sobre a Política de atenção integral à Saúde dos adolescentes e jovens e a lei de
estupro de vulneráveis – analisou o cotidiano de profissionais que diariamente atendem uma
parcela significativa de adolescentes grávidas. Nesse cenário, nosso maior desafio foi
aprofundar o conhecimento das políticas públicas voltadas a esta temática, cotejando com o
dispositivo penal, bem como achar estudo de casos relacionados ao assunto.
Os resultados coletados refletem uma sociedade que, na grande maioria das vezes,
não se apropria do conhecimento de suas leis e políticas públicas por não achar que esse
entendimento possa fazer parte do exercício de cidadania.
Dessa maneira, percebemos ser necessário a dialética do saber para tentar, através
dos fatos, levarem à compreensão da relativização da vulnerabilidade sexual da adolescente
entre 12 e menor de 14 anos grávida, atendida em uma maternidade pública de Fortaleza.
123
Tema esse que, por suas discussões, não acabará nesse trabalho, pois com certeza ainda
suscitará impetuosos e veementes debates da doutrina pátria, jurisprudência e pelos meios
acadêmicos por sua importância no segmento social.
Examinamos ainda, à luz da Constituição Federal, do Código Penal Brasileiro, do
Estatuto da Criança e do Adolescente, da jurisprudência pátria e da doutrina brasileira, acerca
dos fundamentos para debater sobre a relativização da presunção de violência do dispositivo
em foco sobre o prisma do atual contexto social, garantindo igualdades entre homens e
mulheres e proteção à sexualidade de cada um em respeito ao princípio da dignidade da
pessoa humana.
Os profissionais, ao serem questionados sobre se consideram estupro mesmo diante
de uma relação sexual consentida, entre uma adolescente maior de 12 e menor de 14 anos
grávida, 40% afirmaram que sendo consentida não há nenhum problema. Já 47% deles
disseram que, mesmo consentida pela menor, consideram abuso sexual, o que nos chamou a
atenção. Por sua vez, outros 40% dos profissionais entrevistados afirmam que, se o
consentimento viesse da família, não haveria problema nenhum.
Verificamos também que o importante, segundo as falas dos profissionais, não é a
questão do sexo em si sobre o prisma da preciosidade, mas um adulto, no caso alguém da
família, suprir o consentimento “tudo bem”, não importando o sentimento da jovem.
Essas respostas corroboram com os vários autores no que diz respeito ao conjunto de
procedimentos sociais e institucionais repressores, que fazem com que tratem crianças e
adolescentes como meros objetos de proteção.
Portanto, não basta uma proteção abrangente: é preciso verificar se essa proteção
objetivamente atinge o alvo de não ser apenas de proteção e assistência para serem titulares
ativos da sociedade com direitos subjetivos e prioritários dos direitos fundamentais.
Na investigação sobre os sentimentos gerados pela lei 12.015/09, percebemos que há
a obrigatoriedade de notificar todo atendimento feito a uma adolescente menor de 14 anos
grávida ao Conselho Tutelar, mesmo sabendo que a menor já vive maritalmente com
companheiro ou já vivera outra gravidez.
Uma das categorias mais lembradas entre os profissionais foi a responsabilidade da
família como primeiro berço da educação sexual dos filhos, colocando como o principal fator
da gravidez precoce como o mau funcionamento intrafamiliar, a falta de afeto e apoio da
família como coadjuvantes do problema de saúde pública que é a gravidez precoce.
Ao adentramos no campo sexual, descobrimos que esses menores estão ainda mais
susceptíveis a fragilidades inerentes ao momento que vivem, pois, muitas vezes, por exclusão
124
dos pais, da sociedade e do próprio Estado, caem nas mãos doentias de pedófilos e de
aproveitadores sexuais.
Nesse sentido, seria primorosa a intenção de o legislador pátrio ao criminalizar e
penalizar com maior rigidez os crimes sexuais praticados contra menores de 14 anos, muitas
vezes indefesos e carentes de tudo, não sabendo bem o que fazer. Entretanto, não se pode
deixar de resguardar a questão da relativização jurídica da vulnerabilidade. Não se pode
considerar a presunção absoluta em todos os casos. Isso porque a responsabilidade objetiva
estaria sendo consagrada no nosso ordenamento jurídico, haja vista devermos primar pela
observância dos princípios do contraditório, da ampla defesa e da presunção de inocência, tão
importantes para qualquer cidadão e para a perpetuação do Estado de Direito.
Seria interessante que a sociedade como beneficiária das políticas públicas
participasse efetivamente formando parcerias, avaliando constantemente as práticas,
exercendo seu direito como parte desse processo. Infelizmente, só verificamos muitas vezes
isso no papel, pois a cultura que reina em nossa sociedade é uma coletividade nos moldes
patriarcalista.
Diante da pesquisa realizada foi possível concluir que há anos nos deparamos com a
preocupação do Estado por meio de políticas públicas, em resguardar a juventude,
proporcionando uma política de saúde integral, tendo como já fora dito, seu marco na criação
do SUS, da exploração sexual e de seus efeitos nefastos. E, principalmente, no que tange, ao
avanço da prática da pedofilia nos meios internacionais, sendo a criança e o adolescente até
14 anos as principais vítimas dessa prática. Jovens esses que se encontram num processo de
formação biológica, moral e psicológica, pois só a circunstância por si já é suficiente para se
configurar como caráter de vulnerabilidade. Todavia, suas diretrizes só foram levadas de
forma pontual, uma vez que ficaram fragmentadas ao longo do percurso ou muitas delas não
saíram do papel.
Precisamos, assim, frisar os limites das políticas públicas para adolescentes e jovens
e conciliarmos com os objetivos do PROSAD, que surgiu com a finalidade de promover,
integrar, apoiar e incentivar práticas nos locais que teve implantado suas diretrizes pelo
Ministério da Saúde. Programa esse constituído para a promoção da saúde desses atores, no
sentido de identificar os grupos de risco, detectar agravos precoces, tratar adequadamente e
reabilitar os indivíduos dessa faixa etária de 10 a 19 anos de idade, de forma integral,
multisetorial e interdisciplinar.
Nesse sentido, o advento da lei 12.015/09 poderia ter vindo para auxiliar na prática
dessa política, oferecendo a esses sujeitos vulneráveis pela própria condição etária o auxílio
125
do próprio exercício de cidadania. Porém, infelizmente, trouxe um contrassenso, impondo
limites à política, justamente, na área já fragilizada, por mitos e tabus: a vida sexual. Incluem-
se aí os direitos constitucionais elencados no artigo 5º, cláusulas pétreas, princípios básicos,
que poderiam ratificar seus direitos e lhe sendo retirado. Como exemplo deles podemos citar:
a Dignidade da Pessoa Humana, contraditório e a inviolabilidade da intimidade este descrito
no inciso X do referido artigo, fora outros tantos, não menos importantes.
Se houve abuso, a lei e o Estado tem que punir de forma severa, rígida, inflexível.
Mas e se não há violência? Como não recorrer ao princípio da mínima intervenção do Estado
no Direito Penal? Temos que parar e fazer essa reflexão, pois os mecanismos institucionais
devem andar em simbiose e trabalhar em sintonia para não correr o risco do cercear direitos já
garantidos.
O profissional da saúde além de sofrer com a precarização dos Hospitais
Universitários, com cortes de verbas do Governo Federal na área da saúde, provocando essa
situação cada vez mais latente de sucateamento, ainda tem diante de si o difícil dever ser
profissional, dilema analisado e debatido nesta pesquisa.
Ocorre que o PROSAD, ao longo dos anos, veio perdendo força na instituição, fato
constatado pelos relatos descritos apresentados neste trabalho. Como executar uma Política
Pública diante de tantos limites? Esse é um debate importante que deve ser feito nos meios
sociais, jurídicos e acadêmicos.
Não deve haver um bloqueio social para o tema por simplesmente estar levantando
uma bandeira de proteção, engessando e fechando os olhos para o que é público e notório.
Pois, se assim não o fizer, o Estado deverá se preparar para a construção de vários presídios,
uma vez que não faltarão criminosos para esse tipo penal, fugindo do verdadeiro objetivo das
sanções penais.
Cabe ao Estado zelar pelo bem-estar de todos, buscando o interesse de cada pessoa,
individualmente, contra qualquer ato coletivo ou unitário. Por outro lado, quando assim o faz,
delega ao próprio interessado o exercício do direito de agir quando houver disposição,
dependendo da leitura do caso em concreto e tomando suas atitudes à luz do que a legislação
já disponibiliza. Do contrário, o Estado estará adentrando a esfera de atuação do particular, o
que não se coaduna com a disposição dos direitos individuais assegurados pela nossa Carta
Magna e nem do que se é preconizado pelo entendimento da mínima intervenção possível
pelo mesmo.
Por tudo o que foi apresentado e devido aos motivos elencados que resolvemos
trabalhar a temática e nos filiarmos pela parte da doutrina, minoritária neste momento,
126
defendendo a vulnerabilidade relativa, a fim de evitar que os meios de defesa e os princípios
da carta magna sejam violados, quando colocada a responsabilidade objetiva como regra para
os crimes de estupro de vulnerável.
Cabe ressaltar que a outorga de caráter absoluto à vulnerabilidade ao dispositivo em
estudo é permitir a culpabilidade antecipada do acusado, ferindo a presunção de inocência. É
perigoso quando a maioria aceita como correto esse entendimento, pois a nossa compreensão
e de alguns doutrinadores nos quais nos espelhamos neste trabalho é que vivemos em um
Estado Democrático de Direito que abomina tal percepção.
Ao fazermos uma ressonância nas falas dos profissionais entrevistados, observamos a
dinâmica que envolve os serviços disponibilizados para os adolescentes e jovens na MEAC e
não encontramos uma unicidade de atendimento, estratégias, praticadas e nem de opiniões na
execução do fazer diário pelos profissionais da saúde lotados na mesma.
Acreditamos que a modificação desse cenário se dará pela modificação das práticas
de cada profissional ao lidar com menores de 14 anos em seus contextos e através do
conhecimento e da mobilização social, do reconhecimento de seus direitos a uma assistência
diferenciada e integral, coadunando com o SUS, ECA e as Políticas Públicas destinadas a esse
seguimento.
O que levaremos de contribuição para a instituição pesquisada será a amostra do
trabalho com seus resultados e discussões à reunião do Colegiado Gestor, que se faz uma vez
ao mês, no qual fazemos parte, no intuito de instigar o conhecimento do dispositivo penal de
forma mais aprofundada juntamente à política para adolescentes e jovens com suas ações e
atualizações dos programas.
Percebemos ser necessário fomentar junto aos gestores da MEAC capacitações
voltadas a esta área especificamente, pois, como já foi mostrado nessa pesquisa, há
dificuldade de atendimento a este público. É preciso, portanto, melhorar a maneira de
enxergar a medicina ortodoxa, demandando investigação e inovação nos cuidados em saúde,
tanto na atenção básica quanto na média e alta complexidade.
Assim, acreditamos que a solução para o problema apresentado está na efetivação
das políticas públicas, treinamentos para os profissionais da saúde e no conhecimento mais
aprimorado e aprofundado dos problemas sociais no intuito de auxiliar nas soluções e
empoderamento da norma e política pública apresentada. Analisando, também, cada caso à luz
dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade constitucional e respeitando os demais
princípios que formam o alicerce da legislação pátria que regem a vida em sociedade.
Demonstrando, ainda, que para tudo na vida cotidiana existem as exceções e que não
127
podemos atribuir caráter absoluto a tipos penais. Não se pode negar o direito à ampla defesa e
ao contraditório a qualquer cidadão, pois não devemos criar estereótipos de culpabilidade
antes do transito em julgado de uma sentença.
Sendo assim, acreditamos que esse trabalho teve um relevante papel no que tange à
substituição dos modelos tradicionais de saúde, que trata o indivíduo de forma isolada de seu
contexto familiar e direcionado apenas à doença. Pois a norma e a política pública são feitas
para conhecimento da sociedade e esta deve colaborar na execução de suas diretrizes e
princípios. Fator esse crucial para que a lei torne-se eficaz, pois sem os empoderamentos dos
seguimentos sociais, a lei e a política tornam-se sem eficácia.
Assim, diante de tais considerações, vê-se que o Estado não deveria ter interesse de
modo compulsório, em acionar a máquina jurídica, quando não há violência no fato.
Precisamos minimizar os efeitos dos enxertos feitos à lei, interpretando diante da situação em
si e não simplesmente aplicando a lei, sem verificar o contexto como um todo.
É salutar para a sociedade civil e para o Poder Judiciário fazer parte dos processos
das relações sociais para que tenhamos completa certeza ao aplicar corretamente a norma
posta no ordenamento pátrio, com interpretações corretas e coerentes. Isso sem cairmos na
seara pantanosa de interpretar de forma gramatical a lei imposta, considerando a menor de 14
anos absolutamente vulnerável a ponto de seu consentimento para o ato sexual ser
completamente ineficaz.
Nesse sentido, não seria possível relativizar a vulnerabilidade em alguns casos
especiais, através de profissionais qualificados, mensurando o grau de conscientização da
menor e avaliando se o ato sexual foi consentido ou se houve abuso? Esse posicionamento
nos parece mais acertado.
Faz-se um alerta, portanto, para a urgente necessidade de se criar meios eficientes e
específicos de atendimento às jovens grávidas, e de forma integral, abordando aspectos
físicos, psicológicos e sociais, envolvendo e dando suporte às famílias de forma a amenizar os
impactos e as pressões causadas por essa nova situação, garantindo à jovem o direito de ter
sua sexualidade garantida, tranquila e saudável.
Diante do exposto, podemos afirmar que o trabalho alcançou seu objetivo,
demonstrando o cotejo entre a lei e a política pública de adolescentes e jovens, verificando a
compreensão dos profissionais sobre a política de atenção integral à saúde dos adolescentes e
jovens e a lei de estupro de vulneráveis. Identificou, ainda, como a equipe multiprofissional
compreende o dispositivo penal que versa sobre estupro de vulneráveis através de seus
conflitos enfrentados pelos profissionais para o cumprimento da lei, identificando os fluxos e
128
encaminhamentos da instituição para o cumprimento do dispositivo penal.
Finalmente, as práticas inclusivas e de promoção tornam-se cada vez menos viáveis a
realidade social e familiar, cada vez mais desassistidas e vulnerabilizadas, contribuindo para
que a efetivação das políticas públicas seja cada vez mais ineficaz. Temos, assim, a esperança
de que a consolidação de paradigmas se firme numa essência que priorize a vida e o
atendimento aos direitos humanos, com ênfase na mudança de modelos que violem e excluem
direitos.
129
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APÊNDICE A - CRONOGRAMA
Atividades
Jul.
2016
Ago.
2016
Set.
2016
Out.
2016
Nov.
2016
Dez.
2016
Jan.
2017
Redação do
projeto
X
Revisão
bibliográfica
X
X
X
X
X
X
Submissão ao
Comitê de
Ética
X
X
Aplicação das
entrevistas
X
X
X
Qualificação
X
Sistematização
dos dados
X
X
X
Atividades
Jan. 2017
Fev. 2017
Mar. 2017
Abr.
2017
Mai. 2017
Jun.
2017
Sistematização dos
dados
X
Analise dos dados
coletados
X X X
Redação da Tese X X X
Defesa da Dissertação X
Apresentação do
resultado da pesquisa à
instituição
X
139
APÊNDICE B - QUADRO DE NOTIFICAÇÕES AO CONSELHO TUTELAR,
DISTRIBUÍDOS POR ANO
Ano Ano Jan/Jun.
Notificações por categorias
2015
2016
2017
S. Social
02
44
39
Psicologia
08
15
05
S. Social/Psicologia
00
03
00
Enfermagem
00 00 02
Médico/Outras
00
00
00
Total
10
62
46
Fonte: Psicossocial MEAC, 2017.
140
APÊNDICE C - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Meu nome é Rita de Cássia Araújo, sou aluna do Mestrado Avaliação de Políticas Públicas da Universidade
Federal do Ceará e estou desenvolvendo estudo sobre analisar a implementação da lei de estupro de
vulneráveis e da atenção integral à Saúde de adolescentes e jovens, sob a ótica de profissionais da saúde,
em uma maternidade de referência. Com enfoque na equipe multiprofissional de uma maternidade pública de
Fortaleza que lida com adolescentes grávidas menores de 14 anos. A sua participação se dará por meio de um
questionário com perguntas abertas e fechadas que nos ajudará a conhecer a sua opinião, pensamentos e
sentimentos sobre o tema. Para tanto, convido você para uma pesquisa que será realizada em um local privativo
(sem que outras pessoas nos observem) e seguirá um roteiro. Você mesmo (a) anotará sua resposta que depois
será tabulada junto com todas as outras. Gostaria de informar, ainda, que: O senhor (a) terá acesso a qualquer
tempo às informações sobre procedimentos e benefícios relacionados à pesquisa, inclusive para retirar eventuais
dúvidas; o senhor (a) terá o direito e a liberdade de negar-se a participar da pesquisa ou dela retirar-se quando
assim desejar, sem que isto traga prejuízo moral, físico ou social. As informações e dados coletados serão
divulgados, porém sua identidade (seu nome) será mantida em anonimato (sigilo), bem como qualquer
informação que possa identificá-lo (a); que o termo de consentimento livre e esclarecido será feito em 2 (duas)
vias, ficando uma com o pesquisado (a) e outra com a pesquisadora. Para qualquer outro esclarecimento, estarei
disponível através dos telefones: 32944168 (residência) e 33668506 (trabalho). O senhor (a) também poderá
entrar em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa para quaisquer informações sobre o estudo e/ou sobre sua
participação, através do telefone: 3366-8569 (Comitê de Ética da Maternidade Escola). Agradeço sua
colaboração e apresento meus sinceros agradecimentos.
__________________________________
Rita de Cássia Araújo
Pesquisadora responsável
...............................................................................................................................................
CONSENTIMENTO PÓS-ESCLARECIDO
Declaro que depois de esclarecida pelo pesquisador e tendo compreendido o que me foi
explicado concordo em participar do presente Protocolo de Pesquisa, que versa sobre analisar
a implementação da lei de estupro de vulneráveis e da atenção integral à Saúde de
adolescentes e jovens, sob a ótica de profissionais da saúde, em uma maternidade de
referência.
Fortaleza, ______ de ______________ de 2017.
__________________________________________
Assinatura do Pesquisado (a)
141
APÊNDICE D - ORÇAMENTO
MATERIAL PERMANENTE
DESCRIÇÃO
QUANTIDADE
VALOR UNITÁRIO (R$)
VALOR TOTAL (R$)
PEN DRIVE 1 29.99 29,99
NOTEBOOK 1 2.553,99 2.553,99
IMPRESSORA 1 699,9 699,9
SUBTOTAL 3827,76 3827,76
MATERIAL DE CONSUMO
DESCRIÇÃO
QUANTIDADE
VALOR UNITÁRIO (R$)
VALOR TOTAL (R$)
CANETA 10 1,99 19,99
PAPEL A 4 2 14 28
CARTUCHO DE
TINTA
2 26 52
ENCARDENAÇÕES 4 20 80
COMBUSTÍVEL 210 2,99 627.90
XEROX 80 0.10 8
SUBTOTAL 308 65,08 815,89
TOTAL GERAL 311 608,96 1359,77
As despesas ficarão por conta da pesquisadora, sem nenhum ônus para a instituição
que abrigará o estudo.
142
APÊNDICE E - INSTRUMENTO DE COLETAS DE DADOS
O presente questionário faz parte da pesquisa de dissertação para conclusão do Mestrado em
Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará. O foco deste estudo é analisar
a implementação da lei de estupro de vulneráveis e da atenção integral à Saúde de adolescentes e
jovens, sob a ótica de profissionais da saúde, em uma maternidade de referência. Com enfoque na
equipe multiprofissional da Maternidade Escola Assis Chateaubriand que lida com adolescentes
grávidas menores de 14 anos, cujo título apresenta-se da seguinte forma: O PROSAD e a LEI
12.015/09: UMA AVALIAÇÃO DOS ATORES ENVOLVIDOS. Esta pesquisa trata das alterações
introduzidas pela lei 12.015/09 no Código Penal Brasileiro, mais especificamente no título VI, até
então intitulado de “CRIMES CONTRA OS COSTUMES”, hoje recebendo a designação de
“CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL”. Especificamente no que prescreve o artigo 217-A
que trata sobre “ESTUPRO DE VULNERÁVEIS “e suas repercurções no mundo fático das políticas
públicas que trata de adolescentes e jovens”“. As informações, aqui contidas, serão mantidas em sigilo,
não sendo divulgados nomes ou quaisquer outras informações pessoais dos pesquisados.
DADOS DO RESPONDENTE
1- Nome: __________________________________________________________________
2- Idade: _______anos
3- Sexo:
A. ( ) masculino b. ( ) feminino
4- Estado civil:
a. ( ) casado(a) b. ( ) separado c. ( ) viúvo d. ( ) solteiro(a) e. () União estável
5- Ocupação:
a. ( ) A. Social b. ( ) Enfermeiro c. ( ) Médico. d. ( ) Psicólogo e. () Téc. de
Enfermagem
f. ( ) Outros____________________________
6- Tempo de formação ________ anos
7- Área de trabalho:
a. ( ) Emergência b. ( ) Sala de parto c. ( ) Unid. de internamento d. ( )
Ambulatórios e.( ) Outros_____________________________
8- Tempo de instituição: ________anos
9- Tipo de vínculo com o hospital:
a. ( ) Servidor Público b. ( ) colaborador terceirizado c. ( ) Colaborador Celetista
(EBSHER)
143
10- Possui vínculo empregatício em outras instituições?
a. ( ) Sim b. ( ) Não
11- O senhor (a) Já recebeu algum treinamento para atender adolescentes e jovens?
( ) Sim, onde? ________________________________________________________
( ) Não, nunca
12 - Você conhece alguma Política Pública de Saúde para Adolescentes e jovens do
governo federal?
Sim ( ) Quais?
Não ( )
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
13- O que você conhece a respeito do PROSAD? (Programa saúde do adolescente, que
tem como objetivo promover a saúde integral de adolescentes e jovens favorecendo o
processo geral de seu crescimento e desenvolvimento, formulando uma política nacional
a ser desenvolvida a nível Federal, Estadual e Municipal).
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
14- Qual ação a MEAC viabiliza para programar as políticas públicas para jovens e
adolescentes no Município de Fortaleza?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
15- Qual seu conhecimento sobre a lei 12.015 de 07 de agosto de 2009 que inseriu o
artigo 217-A no Código Penal Brasileiro, que trata do crime de “estupro de vulneráveis”.
Que tem como redação: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor
de 14 anos”. Melhor explicando: (Ter relações sexuais, MESMO CONSENTIDAS, ou
outro ato que venha satisfazer o desejo sexual do agente ativo, isto é, satisfação de seus
desejos ou apetite sexual com menor de 14 anos.).
a. ( )Sim, conheço (explique em poucas palavras) b.( )Não conheço
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
144
16 – O senhor (a) enfrenta alguma dificuldade ou conflitos na implementação da lei
12.015/09 no seu dia a dia profissional? Obs.: caso a sua resposta na questão de nº 14
tiver sido: “NÃO CONHEÇO”, pule esta questão.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
17- Você sabia que ao atender uma menor de 14 anos grávida, mesmo não tendo
sofrido violência sexual, é obrigado (a) notificar este atendimento ao Conselho Tutelar
do Município de origem, do bairro ou Regional da Instituição que houve o atendimento?
( ) Sim, sei e comunico sempre
( ) Não sabia
( ) Sim, mas nunca comuniquei
( )Sim, sei e, comunico às vezes
( ) Outros_________________________________________________________________
18- As instituições hospitalares, estão preparadas para essa nova realidade: todo
atendimento a menor de 14 anos grávida, MESMO SEM VIOLÊNCIA, deve ser
notificado ao Conselho Tutelar?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
19- A lei 12.015/09, veio para proteger os menores de 14 anos dos crimes de pedofilia,
na sua opinião: se uma menor de 14 anos tiver relação sexual com uma pessoa maior de
18 anos, sem violência, essa ação deveria ser criminalizada, porquê?
( ) Sim, porquê?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
( ) Não, porquê?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
145
20- A lei que regula o crime de ESTUPRO DE VULNERÁVEL (lei 12.015/09) facilita a
implementação das Políticas Públicas para adolescentes e jovens?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
21- Na sua opinião, enquanto cidadão (ã) o senhor (a) acha que esta lei, delineada na
questão de n.º 14, que regulamenta o crime de Estupro de Vulnerável Interage de que
forma com as Políticas Públicas destinadas à adolescentes e jovens? Explique.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
22- Na sua opinião que Políticas Públicas podem ser mantidas ou criadas para
auxiliar a sociedade na Prevenção da gravidez precoce?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
23- Agora que o Senhor (a) já teve um pequeno conhecimento do nosso estudo, quais
os limites do “Dever Ser profissional” diante da lei 12.015/09, que versa sobre “Estupro
de Vulneráveis”, diante da Ética Profissional X Lei, deve-se ou não notificar
compulsoriamente ao Conselho Tutelar todo atendimento a menores de 14 anos grávidas
com relação SEXUAL CONSENTIDA? Porquê?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
146
ANEXO A - CARTA DE ANUÊNCIA
147
ANEXO B – NESAR
148
ANEXO C – DECLARAÇÃO DE CONCORDÂNCIA
149
ANEXO D - TERMO DE COMPROMISSO PARA UTILIZAÇÃO DE DADOS DE
PRONTUÁRIOS MÉDICOS
150
ANEXO E – FOLHA DE ROSTO PARA PESQUISA ENVOLVENDO SERES HUMANOS
151
ANEXO F – TERMO DE FIEL DEPOSITÁRIO
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