amaral, o. o que sabemos sobre a organização dos partidos políticos

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[REVISTA DEBATES, Porto Alegre, v.7, n.2, p.11-32, maio-ago. 2013] O que sabemos sobre a organização dos partidos políticos: uma avaliação de 100 anos de literatura What we know about political partiesorganization: an evaluation of one hundred years of literature Oswaldo E. do Amaral Resumo Diante da importância dos partidos políticos para o funcionamento dos regimes democráticos contemporâneos, é fundamental compreender como essas organizações se estruturam e como se desenvolveram ao longo do tempo. Como as decisões são tomadas no interior dos partidos? Quais são os elementos que provocam transformações no desenho organizacional dos partidos políticos? Indagações como essas vêm sendo objeto de preocupação por parte de pesquisadores desde o início do século passado e uma longa tradição na Ciência Política foi construída desde o clássico trabalho de Michels, publicado em 1911. O objetivo deste artigo é descrever, sistematizar e discutir as principais contribuições da Ciência Política, tanto em âmbito internacional quanto nacional, para o estudo da organização dos partidos políticos. Para isso, nos concentramos nas abordagens que tratam, preferencialmente, da estrutura e do funcionamento interno e da relação com filiados e com organizações da sociedade civil. Palavras-chave Partidos Políticos; Partidos Políticos Organização; Partidos Políticos Desenvolvimento. Abstract Political parties have been acknowledged as essential organizations for the functioning of democratic regimes. Because of that, Political Science has developed a long tradition in analysing and explaining how these organizations work and evolved over time. Since the work of Robert Michels, published in 1911, scholars have been asking themselves the following questions: How does the decision making process work inside the parties? How and why political parties change? The main aim of this paper is to review and discuss the main contributions of Political Science, both abroad and in Brazil, to the study of party organization. In order to do that, we focus on the works that analysed the internal functioning of political parties and the relationship between parties, their members and other civil society organizations. Keywords Political Parties; Party Organization; Party Development.

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Debate sobre a organização interna dos partidos políticos

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  • [REVISTA DEBATES, Porto Alegre, v.7, n.2, p.11-32, maio-ago. 2013]

    O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos: uma avaliao de 100 anos de literatura What we know about political parties organization: an evaluation of one hundred years of literature Oswaldo E. do Amaral

    Resumo Diante da importncia dos partidos polticos para o funcionamento dos regimes democrticos

    contemporneos, fundamental compreender como essas organizaes se estruturam e como se

    desenvolveram ao longo do tempo. Como as decises so tomadas no interior dos partidos? Quais

    so os elementos que provocam transformaes no desenho organizacional dos partidos polticos?

    Indagaes como essas vm sendo objeto de preocupao por parte de pesquisadores desde o

    incio do sculo passado e uma longa tradio na Cincia Poltica foi construda desde o clssico

    trabalho de Michels, publicado em 1911. O objetivo deste artigo descrever, sistematizar e

    discutir as principais contribuies da Cincia Poltica, tanto em mbito internacional quanto

    nacional, para o estudo da organizao dos partidos polticos. Para isso, nos concentramos nas

    abordagens que tratam, preferencialmente, da estrutura e do funcionamento interno e da relao

    com filiados e com organizaes da sociedade civil.

    Palavras-chave Partidos Polticos; Partidos Polticos Organizao; Partidos Polticos Desenvolvimento.

    Abstract Political parties have been acknowledged as essential organizations for the functioning of

    democratic regimes. Because of that, Political Science has developed a long tradition in analysing

    and explaining how these organizations work and evolved over time. Since the work of Robert

    Michels, published in 1911, scholars have been asking themselves the following questions: How

    does the decision making process work inside the parties? How and why political parties change?

    The main aim of this paper is to review and discuss the main contributions of Political Science,

    both abroad and in Brazil, to the study of party organization. In order to do that, we focus on the

    works that analysed the internal functioning of political parties and the relationship between

    parties, their members and other civil society organizations.

    Keywords Political Parties; Party Organization; Party Development.

  • 12 | Oswaldo E. do Amaral

    Introduo1 H mais de cem anos, os estudiosos da poltica reconhecem a importncia

    e a necessidade dos partidos polticos para o funcionamento dos regimes

    democrticos. por meio deles que as democracias se estruturam e a competio

    poltica se organiza. Embora exista muita divergncia sobre como as agremiaes

    polticas funcionam e se comportam, h praticamente um consenso em torno de

    sua importncia para a viabilidade das democracias representativas. Nesse sentido,

    ainda no final do sculo XIX, James Bryce concluiu o seguinte: Os partidos so inevitveis. Nenhum pas livre no conta com eles. Ningum at agora

    demonstrou como os governos representativos podem funcionar sem eles. Eles

    ordenam o caos para a multido de eleitores (BRYCE apud WHITE, 2006, p. 7). A estreita ligao apontada pela Cincia Poltica entre os partidos polticos

    e o funcionamento da democracia representativa deriva das funes que as

    agremiaes desempenham. possvel, de forma simplificada, indicarmos ao

    menos trs funes essenciais: a) Estruturar a competio eleitoral; b) Agregar

    interesses; c) Governar e conduzir os trabalhos legislativos.

    Diante da inegvel relevncia dos partidos polticos para o funcionamento

    dos regimes democrticos contemporneos, fundamental compreender como

    essas organizaes se estruturam e como se desenvolveram ao longo do tempo.

    Como as decises so tomadas no interior dos partidos? Como agem as lideranas

    partidrias? Quais so as relaes entre os partidos e seus membros? Quais so os

    elementos que provocam transformaes no desenho organizacional dos partidos

    polticos? Indagaes como essas vm sendo objeto de preocupao por parte de

    pesquisadores desde o incio do sculo passado e uma longa tradio na Cincia

    Poltica foi construda desde a clssica obra de Robert Michels [1911]. Apesar da

    quantidade de trabalhos e abordagens, os estudos sobre a organizao dos partidos

    no seguiram uma trajetria uniforme e ainda h muitas lacunas a preencher. No

    caso brasileiro, o cenrio no diferente. Apesar de muitas monografias de boa

    qualidade sobre diversas agremiaes e alguns trabalhos com abordagem

    comparativa, muitos aspectos da organizao dos partidos polticos ainda no

    receberam o devido tratamento cientfico.

    O objetivo deste artigo descrever, sistematizar e discutir as principais

    contribuies da Cincia Poltica, tanto em mbito internacional quanto nacional,

    para o estudo da organizao dos partidos polticos. Para isso, nos concentramos

    nas abordagens que tratam, preferencialmente, da estrutura, do funcionamento

    interno e da relao dos partidos com seus filiados e com organizaes da

    sociedade civil. O texto est organizado da seguinte forma: na primeira seo,

    apresentamos os trabalhos clssicos da rea, as questes que levantaram e as

    1 Parte da pesquisa em que se baseia este artigo foi feita para a tese de doutoramento As

    mudanas na organizao interna do Partido dos Trabalhadores entre 1995 e 2009, em especial para os captulos 1 e 4. A tese foi elaborada no Programa de Ps-Graduao em Cincia Poltica da

    Unicamp e concluda em dezembro de 2010.

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 13

    respostas encontradas. Prestamos especial ateno construo de tipologias e

    modelos partidrios e s anlises sobre transformaes organizativas das

    agremiaes polticas. Na segunda, avaliamos contribuies mais contemporneas

    e o seu dilogo com as abordagens mais tradicionais. Na terceira, tratamos de

    alguns temas que vm mobilizando a literatura internacional nos ltimos anos,

    como os processos de seleo de lideranas partidrias e o relacionamento das

    agremiaes com filiados e organizaes da sociedade civil. Por fim, discutimos

    os trabalhos sobre a organizao dos partidos polticos no Brasil e conclumos o

    texto apontando lacunas que precisam ser preenchidas e propondo uma agenda de

    pesquisa voltada para o caso brasileiro.

    Os trabalhos clssicos e os modelos de partidos praticamente impossvel iniciar qualquer reviso da literatura clssica

    sobre partidos polticos sem comear pela obra de Robert Michels [1911],

    Sociologia dos Partidos Polticos (1982). O trabalho de Michels suplanta a rea

    de estudos partidrios e serve de base para pesquisas sobre a organizao e a

    distribuio de poder no interior das agremiaes polticas at os dias de hoje.

    Influenciado por autores como Ostrogorski, Mosca e Pareto, Michels, ao analisar

    o Partido Social-Democrata alemo (SPD), defende que qualquer partido, mesmo

    os democrticos na sua origem, tende a desenvolver uma estrutura burocrtica

    centralizada e a oligarquizao de sua direo. Essa tendncia, conhecida como a

    Lei de Michels, ou Lei de Ferro da Oligarquia, foi assim resumida pelo autor:

    [...] A lei sociolgica fundamental que rege inelutavelmente os

    partidos polticos [...] pode ser formulada assim: a organizao a

    fonte de onde nasce a dominao dos eleitos sobre os eleitores, dos

    mandatrios sobre os mandantes, dos delegados sobre os que os

    delegam. Quem diz organizao, diz oligarquia (MICHELS, 1982, p. 238).

    Segundo o autor, a incapacidade das massas em se dirigir aliada s

    exigncias tcnico-administrativas de uma organizao complexa como um

    partido poltico leva ao desenvolvimento de uma estrutura altamente

    burocratizada, comandada por um conjunto de dirigentes profissionais muito mais

    preocupados com a manuteno de suas posies internamente e com a

    sobrevivncia da organizao, do que com os objetivos polticos que inspiraram a

    sua criao. Como consequncia, decorre uma autonomizao da liderana com

    relao s bases partidrias e uma flexibilizao dos princpios ideolgicos e

    programticos da agremiao. A Lei de Ferro elaborada por Michels traduz a interpretao terica de que o desenvolvimento dos partidos polticos no

    compatvel com a manuteno de estruturas democrticas e de controle de seus

    lderes por parte dos filiados e, mais importante, de que as massas so capazes,

    apenas, de substituir antigas por novas elites.

  • 14 | Oswaldo E. do Amaral

    No incio dos anos 1950, Maurice Duverger, na obra Os Partidos Polticos

    (1980), retomou algumas das preocupaes tericas de Michels, como a natureza

    das organizaes partidrias, em um trabalho que se transfomou em um clssico e

    influenciou boa parte do debate e da agenda de pesquisa sobre os partidos

    polticos na segunda metade do sculo XX. Duverger foi o primeiro a tentar

    sistematizar a diversidade partidria por meio da elaborao de uma tipologia e a

    esboar uma teoria geral dos partidos polticos. Entre as inmeras contribuies

    do autor, destaca-se a compreenso de que tanto a origem do partido quanto a sua

    ideologia devem ser usadas como variveis explicativas no tratamento da

    organizao, desenvolvimento e comportamento dos partidos polticos.

    A partir de uma anlise comparativa de partidos da Europa Ocidental que

    combina elementos histricos, ideolgicos e organizacionais, Duverger

    desenvolve uma tipologia dos partidos polticos que resulta, como veremos

    adiante, em consideraes normativas por parte do autor a respeito das prprias

    agremiaes polticas e das possibilidades de seu desenvolvimento em

    democracias de massa. Entre os tipos construdos por Duverger destacam-se o

    partido de quadros e o partido de massa.

    O primeiro diz respeito s agremiaes de notveis formadas no sculo

    XIX e que sobreviviam no sculo XX especialmente sob a forma de partidos

    conservadores e liberais. Vejamos algumas de suas caractersticas centrais: a)

    origem interna ao parlamento; b) organizao interna de baixa intensidade; c)

    fraca articulao estrutural entre as instncias organizacionais; d) estrutura

    nacional descentralizada; e) ausncia de critrios claros de adeso; f)

    financiamento partidrio dependente de alguns grandes doadores privados; g)

    concentrao do poder decisrio nas mos da elite parlamentar (DUVERGER,

    1980).

    A expanso do sufrgio na segunda metade do sculo XIX e incio do

    sculo XX e a incorporao de um grande contingente de pessoas cena poltica

    foram determinantes, segundo Duverger, para o surgimento dos partidos de

    massa. A expanso do sufrgio levou ao desenvolvimento dos partidos socialistas

    e comunistas, que, por estarem mais prximos da concepo marxista de partido-

    classe, acabaram por desenvolver mecanismos para a integrao dos grandes

    contingentes de trabalhadores caractersticos dos partidos de massa. Nesse ponto,

    fica evidente a identificao feita por Duverger entre ideologia e organizao

    partidria (DUVERGER, 1980), posteriormente comprovada pelo trabalho de

    Janda e King (1985). Para o autor, os partidos de massa contam com as seguintes

    caractersticas: a) origem extraparlamentar; b) organizao interna de alta

    intensidade; c) forte articulao estrutural entre as instncias partidrias; d)

    rigorosos requisitos de filiao; e) financiamento compartilhado entre os membros

    do partido; f) forte doutrinarismo; g) subordinao dos parlamentares ao partido

    (DUVERGER, 1980).

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 15

    A distino e a caracterizao elaboradas por Duverger fizeram com que o

    autor definisse o partido de massa como o modelo de partido mais adaptado s

    condies impostas pela democracia moderna. Para o autor, a superioridade dos

    partidos de massa provocaria um processo de adaptao por parte dos arcaicos

    partidos de quadros, que, aos poucos, se veriam forados a adotar algumas das

    caractersticas organizacionais de seus concorrentes mais modernos, em um

    processo descrito como de contgio pela esquerda (DUVERGER, 1980; WARE, 1996; HARMEL, 2002; WOLINETZ, 2002).

    Nos anos 1960, a viso predominante na literatura de que os elementos

    centrais dos partidos de massa se universalizariam passa a ser questionada pelos

    estudiosos dos partidos polticos a partir da observao das transformaes

    organizacionais e comportamentais de algumas agremiaes na Europa Ocidental.

    O primeiro a tentar sistematizar essas transformaes e propor um novo modelo,

    mais apto a explicar as novas caractersticas dos partidos polticos, foi

    Kirchheimer (1966), em uma srie de artigos nos quais desenvolveu o conceito de

    partido catch all. Segundo o autor, a combinao entre crescimento econmico e

    amadurecimento do Estado de Bem-Estar provocou uma reduo na polarizao

    social e poltica, diminuindo a importncia tanto da ideologia quanto das

    distines de classe na cena partidria. Acompanhando as mudanas sociais mais

    amplas na Europa Ocidental, os partidos de massa estavam gradualmente

    transformando-se em agremiaes diludas ideologicamente, com apelos

    genricos a todos os grupos sociais e cada vez mais voltadas para o sucesso

    eleitoral. As proposies de Kirchheimer (1966) representaram uma inverso com

    relao hiptese de Duverger (1980) sobre o desenvolvimento dos partidos

    polticos, como possvel observar a partir das caractersticas do partido de tipo

    catch all: a) desideologizao do discurso partidrio; b) fortalecimento da

    liderana; c) declnio da importncia da militncia de base; d) apelo eleitoral

    pluriclassista; e) abertura para grupos de interesse variados (KIRCHHEIMER,

    1966).

    Nos anos 1980, Angelo Panebianco (2005) retomou a preocupao com a

    organizao partidria em um trabalho que combina, como variveis para

    compreender o desenvolvimento organizativo dos partidos polticos, o modelo

    gentico e o grau de institucionalizao das agremiaes. O modelo gentico pode

    ser determinado a partir de trs fatores:

    a) O desenvolvimento da organizao partidria a partir da penetrao

    territorial, quando um centro controla a expanso para a periferia

    (formao de associaes locais e intermedirias do partido); da difuso

    territorial, quando a expanso acontece espontaneamente por ao das

    elites locais, que posteriormente se unem a uma organizao nacional; ou

    da combinao dos dois processos;

    b) Presena ou no de uma instituio externa que legitime o partido

    (igreja, sindicato, etc.). A partir dessa caracterstica originria possvel

  • 16 | Oswaldo E. do Amaral

    distinguir os partidos entre aqueles de legitimao interna e de legitimao

    externa;

    c) Carter carismtico ou no do partido, que pode ser verificado a partir

    da identificao da agremiao como um veculo construdo para a

    afirmao de uma liderana carismtica (PANEBIANCO, 2005).

    Por institucionalizao, Panebianco (2005) entende o processo de

    estabilizao da organizao, no qual esta deixa de ser um instrumento para a

    realizao de determinados objetivos por parte dos filiados e passa a ter valor em

    si mesma. Seus objetivos no so mais separveis ou distinguveis da prpria

    organizao, que transita ento de um sistema de solidariedade, em que

    predominam os incentivos coletivos e a ideologia manifesta (objetivos explcitos

    e coerentes), para um sistema de interesses, em que sobressaem os interesses

    seletivos e a ideologia latente (objetivos vagos e contraditrios)

    (PANEBIANCO, 2005). O processo de institucionalizao pode ser medido em

    duas dimenses: a) o grau de autonomia em relao ao ambiente, entendida como

    a capacidade do partido em controlar os recursos necessrios para o seu

    funcionamento; e b) o grau de sistemicidade, compreendida como a coerncia

    estrutural interna do partido (PANEBIANCO, 2005).

    O modelo desenvolvido por Panebianco (2005) busca fornecer uma teoria

    geral a respeito da organizao dos partidos polticos, permitindo a construo de

    tipologias diversas de acordo com a combinao entre as variveis descritas. A

    partir do seu quadro terico, o autor levanta hipteses explicativas para as

    transformaes dos partidos polticos e realiza uma importante requalificao do

    modelo de partido catch all.

    Panebianco concorda com a proposio geral de Kirchheimer (1966) de

    que os partidos de massa estariam caminhando para um modelo de partido catch

    all. No entanto, exatamente por se concentrar em questes organizativas, o autor

    ressalta a progressiva profissionalizao das agremiaes causada pelo aumento

    da influncia dos especialistas dotados de conhecimentos tcnicos. Da a

    requalificao dos partidos de tipo catch all como profissionais-eleitorais. As

    principais caractersticas desse modelo de partido so: a) papel central exercido

    pelos profissionais; b) eleitoralismo, laos organizativos verticais fracos; c)

    predominncia dos representantes pblicos; d) financiamento por meio de grupos

    de interesse e fundos pblicos; e) nfase em questes de amplo apelo eleitoral

    (PANEBIANCO, 2005).

    As causas das transformaes dos partidos mais prximos ao modelo

    burocrtico de massa2 em agremiaes mais prximas ao modelo profissional-

    eleitoral encontram-se no ambiente em que esto inseridos. Segundo essa

    avaliao, duas mudanas ambientais estariam na origem das transformaes

    partidrias: a primeira delas mais estrutural e est ligada prpria dinmica do

    2 O modelo burocrtico de massa definido por Panebianco em pouco difere das especificaes

    feitas por Duverger (1980).

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 17

    desenvolvimento capitalista contemporneo, que afetou os sistemas de

    estratificao social (reduo de trabalhadores no setor secundrio, ampliao do

    segmento de servios, etc.) e a forma de insero poltica dos diferentes grupos

    ocupacionais. As alteraes estruturais repercutem ento sobre os partidos ao

    modificar cenrios polticos e as caractersticas sociais do eleitorado. A segunda

    mudana est vinculada reestruturao da comunicao poltica sob o impacto

    dos meios de comunicao de massa. De acordo com o autor, mudam-se as tcnicas de propaganda e isso leva a um terremoto organizativo: os antigos papis

    burocrticos perdem terreno como instrumentos de organizao de consenso;

    novas figuras profissionais adquirem um peso crescente (PANEBIANCO, 2005, p. 518). J a intensidade e a velocidade das transformaes estariam ligadas tanto

    ao nvel de institucionalizao do partido quanto natureza do sistema partidrio.

    Para concluirmos, necessrio lembrar que Panebianco afirma ser muito comum a

    sobreposio das caractersticas dos modelos, o que provoca tenses e conflitos

    internos nos partidos (PANEBIANCO, 2005).

    Em meados dos anos 1990, Katz e Mair (1994; 1995) fizeram uma

    significativa contribuio aos estudos partidrios a partir de uma dupla crtica

    literatura existente e s agendas de pesquisa que tratavam os partidos de forma

    comparada. Primeiro, propuseram a mudana de enfoque nos estudos partidrios

    das relaes entre as agremiaes e a sociedade para as relaes entre os partidos

    e o Estado. Segundo, afirmaram que as anlises dos partidos polticos ainda

    estavam presas a concepes antigas, como a de partido de massa, apontado como

    modelo ideal de organizao partidria. Esse duplo equvoco, na viso dos

    autores, era responsvel pelo diagnstico crescente na literatura de que os partidos

    polticos estavam em declnio e pela incapacidade dos estudiosos em enxergar,

    especialmente na Europa Ocidental, as recentes transformaes partidrias diante

    de novos desafios ambientais. Como resposta s limitaes tericas que

    encontraram, Katz e Mair (1995) identificaram a emergncia de um novo modelo

    de partido nas democracias contemporneas, o partido cartel. Esse novo tipo de

    partido seria o resultado de uma linha evolutiva caracterizada pelos modelos de

    partido de quadros, massas e catch all.

    O que define o partido cartel so as suas relaes com o Estado, apontadas

    como essenciais para a aquisio de recursos necessrios para a sobrevivncia da

    organizao. Os principais indicadores dessa relao de dependncia com o

    Estado so:

    a) A garantia de acesso a meios de comunicao de massa, especialmente

    televiso, proporcionada pelo Estado por meio de regulamentao ou

    cesso direta em canais estatais para a comunicao com o eleitorado;

    b) O Estado um importante mantenedor dos recursos humanos

    disposio dos partidos. Assessores de parlamentares e membros do

    Executivo so pagos com recursos estatais e os funcionrios do partido so

  • 18 | Oswaldo E. do Amaral

    mantidos, em grande medida, graas a repasses financeiros provenientes

    do Estado;

    c) A atividade e a organizao partidrias so cada vez mais moldadas a

    partir da regulamentao estabelecida pelo Estado;

    d) O Estado confere legitimidade aos partidos polticos perante a sociedade

    civil quando estes ocupam cargos pblicos;

    e) Os partidos utilizam recursos estatais para a distribuio de incentivos

    seletivos a seus membros ou grupos sociais que os apoiam (patronagem

    partidria) (MAIR, 1994).

    O estreitamento dos laos dos partidos com o Estado tem algumas

    consequncias importantes para a prtica democrtica e para a disputa

    interpartidria. A emergncia do partido cartel opera uma significativa inverso

    na relao entre Estado, partidos e sociedade civil. Durante a prevalncia dos

    modelos de partidos de massa e catch all, as agremiaes agiam como

    intermedirias dos interesses da sociedade civil junto ao Estado. Agora, o Estado

    que atua como intermedirio entre os partidos e a sociedade civil (MAIR, 1994).

    Com relao disputa interpartidria, o modelo de partido cartel estabelece que,

    mais relevante do que vencer eleies, garantir o acesso aos recursos estatais

    vitais para a sobrevivncia das organizaes. Dessa forma, interessam aos partidos

    mais importantes tanto a cooperao para a manuteno dos canais de

    financiamento do Estado quanto o bloqueio da ascenso de outsiders por meio de

    restries legais (KATZ e MAIR, 1995).

    Ainda de acordo com Katz e Mair, fatores sociais, culturais e polticos,

    alm das prprias caractersticas dos partidos de tipo catch all, foram os

    responsveis pela emergncia desse novo tipo partidrio. O declnio nos nveis de

    participao da populao nas atividades partidrias, a maior volatilidade do

    eleitorado e o crescente distanciamento com relao s bases partidrias fizeram

    com que as agremiaes polticas estreitassem seus vnculos com o Estado. Esse

    um aspecto importante da proposio terica dos autores, pois, para eles, a

    evoluo dos partidos polticos nas democracias ocidentais reflexo de um

    processo dialtico, no qual cada novo tipo de partido produz uma srie de reaes

    que estimulam seu prprio desenvolvimento e o surgimento de um novo modelo

    (KATZ e MAIR, 1995).

    As inovaes tericas de Katz e Mair sugerem uma requalificao mais

    ampla no estudo dos partidos polticos. No lugar de falarmos em declnio e

    fracasso, deveramos falar em adaptao e mudana (KATZ e MAIR, 1995). Essa

    requalificao fica mais fcil de ser compreendida quando se observam os

    partidos polticos no como unidades organizacionais indivisveis, mas sim

    portadores de trs faces distintas que interagem entre si e contam com estruturas

    prprias de recursos, oportunidades, incentivos e restries. Vejamos: a) Party in

    public office, a face pblica do partido, representada pela organizao no governo

    ou no parlamento; b) Party on the ground, a base partidria, composta pelos

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 19

    militantes e filiados e, de uma maneira mais ampla, por contribuintes e eleitores

    fiis; c) Party in central office, a direo nacional do partido, composta tanto

    pelos principais dirigentes partidrios, como membros de diretrios e executivas

    nacionais, quanto pelo alto escalo da burocracia partidria (KATZ e MAIR,

    1993).

    A ruptura com a viso unitria de partido poltico permite a Katz e Mair

    (1993, 1995, 2002) qualificar os diferentes tipos partidrios e entender suas

    mudanas a partir da interao e das relaes de poder entre as vrias faces. Para os autores, o partido de tipo catch all pode ser tambm caracterizado por uma

    peculiar condio de conflito entre a base e a face pblica da agremiao. Ambas

    buscam, por meio da direo partidria, subordinar a outra. J as organizaes

    partidrias contemporneas, mais prximas do modelo de partido cartel,

    apresentam uma posio privilegiada da face pblica ante as outras duas. Nas

    palavras dos autores:

    [...] Sugerimos que o desenvolvimento das organizaes

    partidrias na Europa ultrapassou o perodo do partido catch all

    e entrou em uma nova fase, na qual os partidos encontram-se

    cada vez mais dominados [...] pela face pblica do partido

    (KATZ e MAIR, 2002, p. 122).

    Os novos caminhos Mais recentemente, alguns autores reavaliaram, de forma crtica, a

    literatura a respeito dos tipos partidrios, bem como os fatores responsveis por

    provocar mudanas organizativas nas agremiaes. Para Wolinetz (2002), o

    estudo comparado dos partidos polticos, apesar de conter uma rica tradio e

    literatura, no foi capaz de gerar avanos tericos relevantes nos ltimos anos por

    se basear em tipos ideais incapazes de lidar com a multiplicidade de

    caractersticas que os partidos adquiriram aps a Terceira Onda de Democratizao e por no se preocupar em construir critrios de anlise que unificassem as abordagens existentes.

    Partindo dessa dupla crtica literatura existente, o autor buscou elaborar

    uma nova tipologia, capaz de romper com as barreiras entre as tradies

    sociolgica, funcionalista e organizativa no estudo dos partidos, possibilitando a

    comparao e a avaliao das agremiaes tanto historicamente quanto em

    diferentes regies, rompendo com a centralidade dos modelos construdos

    exclusivamente a partir da experincia democrtica europia. Sua principal

    varivel de anlise est vinculada ao comportamento dos partidos, e a distino

    que estabelece d-se entre partidos de tipo policy-seeking, vote-seeking e office-

    seeking. Derivando sua tipologia dos trabalhos de Strom (1990), Harmel e Janda

    (1994) e Strom e Muller (1999), o autor elenca as seguintes vantagens na adoo

    desse modelo de anlise, conforme apontamos em outro trabalho:

  • 20 | Oswaldo E. do Amaral

    a) mais flexvel e no aponta um sentido nico na evoluo das

    agremiaes. Os partidos podem caminhar em sentido a um tipo ideal

    ou a outro ao longo do tempo e sob diferentes circunstncias; b)

    permite a compreenso dos partidos como organizaes que podem

    possuir caractersticas de mais de um tipo ideal em vrios graus; c)

    possibilita o estudo da disputa interna de poder. possvel usar a

    mesma classificao para analisar os grupos internos e como eles

    influenciam o partido; d) com o refinamento da operacionalizao,

    permite a anlise tanto do comportamento quanto da organizao das

    agremiaes; e) com definies claras e boas medidas operacionais,

    possvel comparar partidos em diferentes lugares e contextos.

    O tipo de partido policy-seeking aquele que possui programas bem

    definidos, ideologias articuladas e que busca remodelar a agenda

    poltica com o objetivo de realizar mudanas substantivas em uma

    srie de reas. Geralmente, o partido d mais prioridade s suas ideias

    e a seu programa do que s eleies. No aspecto organizacional, conta

    com intensa participao de filiados/ativistas na vida partidria e com

    uma infraestrutura de apoio para o desenvolvimento de polticas. O

    tipo vote-seeking, por sua vez, aquele cujo principal objetivo

    vencer eleies. Seu programa mais malevel e pode ser mais

    facilmente alterado para maximizar as possibilidades de vitria

    eleitoral. O nvel de envolvimento dos filiados na vida partidria

    baixo, a estrutura partidria no grande e as campanhas eleitorais so

    altamente profissionalizadas. J o partido office-seeking aquele que

    prioriza participar do governo, pois dessa participao muitas vezes

    depende a sua prpria sobrevivncia. Evita comprometimentos

    programticos que dificultem alianas polticas e busca conseguir

    votos suficientes para participar de coalizes governamentais. Seus

    membros ocupam ou buscam ocupar cargos pblicos e disputam acesso aos recursos provenientes do Estado (AMARAL, 2010, p. 112-

    113).

    Wolinetz (2002) critica tambm a unidirecionalidade presente nos

    trabalhos de Duverger (1980), Kirchheimer (1966), Panebianco (2005) e Katz e

    Mair (1995), entre outros. Para o autor, assim como para Ware (1996) e Krouwel

    (2006), impossvel afirmar que exista uma tendncia homogeneizante na

    evoluo dos partidos polticos. Presses ambientais variadas, como um

    determinado panorama socioeconmico ou contexto institucional, combinadas

    com as caractersticas internas dos partidos e o comportamento de suas lideranas,

    podem, por exemplo, produzir transformaes distintas em partidos com

    caractersticas semelhantes. Nesse sentido, mais importante do que determinar as

    tendncias evolutivas nos partidos polticos, seria descobrir as variveis que

    provocam as transformaes partidrias.

    Encerramos esta seo com a recente contribuio de Samuels e Shugart

    (2010) sobre como diferentes desenhos institucionais exercem influncia sobre a

    organizao dos partidos polticos. Segundo os autores, a dominncia da literatura

    europeia na rea fez com que uma importante varivel institucional o sistema de governo tenha ficado ausente das anlises sobre organizao partidria. Para os

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 21

    autores, a literatura europeia privilegiou variveis socioeconmicas e

    macrocontextuais para o tratamento da organizao dos partidos polticos,

    negligenciando como a separao de poderes pode afetar as agremiaes polticas.

    Mesmo com o aumento de pases com presidentes eleitos nas ltimas dcadas no

    continente europeu, essa varivel continuou a ser ignorada pela maioria dos

    estudos partidrios.

    Para os autores, sistemas presidencialistas favorecem a criao de partidos

    presidencializados. Ou seja, a separao dos poderes Executivo e Legislativo constitui uma estrutura de incentivos e oportunidades distinta da encontrada em

    sistemas parlamentaristas para a organizao e atuao dos partidos polticos.

    Samuels e Shugart (2010) sugerem que a possibilidade de escolha do presidente

    da Repblica em uma eleio direta e a sua manuteno no poder

    independentemente do Parlamento tornam os partidos polticos menos capazes de

    controlarem suas lideranas, que adquirem maior autonomia com relao base

    partidria. Alm disso, a existncia de duas lgicas eleitorais distintas (uma para o

    Executivo e outra para o Legislativo) aumenta a possibilidade de conflitos

    intrapartidrios, pois a seleo de candidatos e a conduo de campanhas

    eleitorais em um cenrio presidencialista pode colocar em rota de coliso

    postulantes presidncia e lideranas partidrias e candidatos ao Legislativo.

    Samuels e Shugart (2010) no descartam a importncia de variveis

    sociais, culturais e econmicas para a compreenso das distintas formas

    organizativas adquiridas pelos partidos polticos, mas chamam a ateno para um

    elemento que consideram ausente. Ao fazerem isso, abrem novas possibilidades

    de pesquisa especialmente no mbito da poltica comparada.

    O que sabemos sobre filiados, relaes com organizaes da sociedade civil e processo decisrio interno Como foi possvel vermos at aqui, existe uma srie de possibilidades para

    abordar a organizao dos partidos polticos. Seria impossvel, neste texto, tratar

    de todas elas de maneira sistemtica. Dessa forma, optamos, nesta seo, por

    apresentarmos o que a literatura internacional vem discutindo em torno de trs

    temas: a) relao com filiados; b) relao com organizaes da sociedade civil; e

    c) processo decisrio interno.

    A anlise da relao dos partidos polticos com seus filiados esbarra em

    um problema de natureza emprica: a coleta de dados sobre os membros. Nem

    sempre esses dados esto disponveis ou apresentam a preciso desejada pelos

    pesquisadores. As duas tcnicas mais comuns para a obteno de dados a esse

    respeito so a anlise dos registros fornecidos pelos partidos polticos e a

    utilizao de informaes obtidas em surveys. Com relao a primeira, comum a

    superestimao do nmero por parte dos partidos para fins polticos ou mesmo de

    propaganda. Apesar disso, a maior profissionalizao das agremiaes e o

    desenvolvimento de sistemas de informao mais sofisticados nas ltimas dcadas

  • 22 | Oswaldo E. do Amaral

    ampliaram a confiabilidade dos nmeros. Com relao a segunda, os entrevistados

    podem no se lembrar que so filiados ou sentirem-se constrangidos a declarar

    participao. A melhor estratgia parece ser combinar os dois tipos de dados,

    conforme sugerem Van Biezen, Mair e Poguntke (2012). No entanto, nem sempre

    isso possvel, especialmente quando o pesquisador trabalha com muitos pases e

    sries longitudinais mais longas.

    Desde o pioneiro trabalho de Katz, Mair et. al. (1992), a queda no nmero

    de filiados aos partidos polticos vem sendo bem acompanhada na Europa

    Ocidental, sugerindo uma dificuldade das agremiaes, na maior parte dos pases

    analisados, em manter seus membros e recrutar novos. Dados recentes,

    compilados por Van Biezen, Mair e Poguntke (2012), mostram que houve uma

    queda de cinco pontos percentuais, em mdia, em 13 democracias consolidadas

    europeias nos ltimos 30 anos. Nas 27 democracias analisadas na ltima rodada

    do estudo, a mdia de filiados por eleitores ficou em 4,7%. Frana, Itlia, Espanha

    e Estnia foram os nicos pases que registraram crescimento entre os membros

    de partidos polticos.

    A reduo no nmero de filiados levantou a questo sobre as

    transformaes qualitativas desse grupo. Quem so, atualmente, os filiados a

    partidos polticos? Eles se constituram em um grupo muito distinto do restante da

    sociedade? Mudaram muito com relao aos membros que os partidos tinham

    antes?

    Conforme argumentam Scarrow e Gezgor (2010), os filiados nunca foram

    um espelho da sociedade. Sempre estiveram acima da mdia na idade e nos nveis

    de renda e educao. Os membros sempre foram tambm, na sua maioria, homens

    e integrantes da classe mdia. Alm disso, era comum estarem associados a

    sindicatos e grupos religiosos. Analisando dados recentes, os autores concluem

    que, com exceo da idade dos membros, que aumentou, o perfil

    sociodemogrfico dos filiados no mudou muito nos ltimos anos. No entanto,

    contrariando as expectativas, eles se mostraram menos ideolgicos do que nos

    anos 1990 (SCARROW e GEZGOR, 2010).

    As explicaes para o declnio do nmero de filiados so muitas e no h

    um veredito final sobre o tema. Uma linha argumenta que os partidos polticos

    so, em si, estruturas em declnio no universo poltico (LAWSON e MERKL,

    1988), o que ajudaria a compreender a reduo do interesse dos cidados em

    participar deles. Outra argumenta que os partidos perderam incentivos em recrutar

    grandes contingentes de filiados com a modernizao das campanhas eleitorais e

    dos meios de comunicao de massa. Os filiados teriam, assim, perdido o status

    de embaixadores das agremiaes junto s suas comunidades e as lideranas no precisariam mais deles para atingir um grande nmero de eleitores

    (SCARROW, 1996). Em linha semelhante, autores como Katz e Mair (1995) e

    Whiteley (2011) sustentam que a aproximao dos partidos com relao ao Estado

    diminui os incentivos para as lideranas recrutarem novos membros. A lgica

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 23

    simples: se os custos de manter o partido vm do contribuinte, por que se esforar

    em manter uma grande base de filiados? (WHITELEY, 2011). As evidncias,

    porm, no se mostram conclusivas para nenhuma das linhas mencionadas aqui.

    O segundo tema tambm est ligado ao relacionamento dos partidos com

    seus filiados: o processo decisrio interno. Conforme aponta a literatura, est em

    curso, tanto em democracias estveis quanto em novas, um processo de

    transferncia de poder sobre a seleo de lderes partidrios para o conjunto de

    filiados (SEYD e WHITELEY, 2002; KITTILSON e SCARROW, 2003;

    FREIDENBERG, 2005; SCARROW e GEZGOR, 2010; CROSS e BLAIS, 2012).

    De uma maneira geral, a literatura se refere a esse fenmeno como de

    democratizao interna e, na maior parte dos casos, ele est ligado crescente capacidade dos membros em participar diretamente (um filiado, um voto) dos

    processos de seleo de candidatos e lideranas e elaborao de propostas

    partidrias. A maior participao dos filiados nos processos decisrios

    intrapartidrios reascendeu o debate a respeito da Lei de Michels sob novas bases tericas e empricas abertas pela maior quantidade de casos disponveis para

    anlise. Katz e Mair, em diferentes trabalhos, e dentro da perspectiva da

    emergncia do modelo de partido cartel, defendem que o empowerment dos

    filiados representa uma falsa democratizao, pois leva ampliao do poder da

    liderana partidria. O argumento dos autores est baseado na premissa de que a

    massa desorganizada de filiados tende a apoiar a liderana partidria. Dessa

    forma, a democratizao interna, ao marginalizar as lideranas intermedirias e os ativistas, mais capazes de realizar oposio organizada, e ao fortalecer os

    membros comuns, acaba por produzir uma situao paradoxal na qual a maior

    participao da base resulta em maior poder e autonomia para a liderana (MAIR,

    1994; KATZ e MAIR, 2002; 2009). Seyd e Whiteley, por exemplo, no

    concordam com essa interpretao. Em trabalhos sobre o Partido Trabalhista

    britnico refutam, a partir de evidncias obtidas em surveys junto aos filiados e na

    anlise dos resultados eleitorais internos, a premissa de que filiados menos ativos

    so mais dceis e tendem a seguir a liderana. Segundo os autores, as evidncias disponveis na literatura no permitem afirmar claramente que a

    participao direta dos filiados resulta em inevitvel fortalecimento do poder e da

    autonomia dos lderes partidrios (SEYD, 1999; SEYD e WHITELEY, 2002).

    Em uma perspectiva um pouco distinta, Kittilson e Scarrow argumentam

    que, independentemente da persistncia de tendncias oligarquizantes no interior das agremiaes, a ampliao dos poderes do conjunto de filiados resulta

    no aumento do grau de transparncia dos processos decisrios internos e da

    possibilidade dos cidados exercerem mais influncia em um local onde

    importantes decises so tomadas: os partidos polticos. (KITTILSON e

    SCARROW, 2003). Para os autores, assim como para Scarrow e Gezgor, a

    democratizao no interior dos partidos seria tambm uma forma de atrair

    membros e enfrentar o crescente distanciamento entre eleitores e partidos

  • 24 | Oswaldo E. do Amaral

    verificado nas ltimas dcadas (KITTILSON e SCARROW, 2003; SCARROW e

    GEZGOR, 2010).

    A anlise do relacionamento dos partidos polticos com outras

    organizaes da sociedade civil sempre foi um tema fundamental para a

    compreenso do desenvolvimento organizativo das agremiaes polticas.

    Especialmente na experincia democrtica europeia, os partidos utilizam as

    organizaes (como sindicatos, grupos religiosos, etc.) como forma de criarem

    vnculos com setores do eleitorado. Em troca, fornecem o acesso formulao de

    polticas pblicas. Dessa maneira, as organizaes da sociedade civil

    desempenham o papel de intermedirios entre a sociedade e os partidos polticos e

    auxiliam na agregao de interesses.

    Desde o incio do sculo XX, os partidos estabeleceram diferentes tipos de

    vinculao com as organizaes da sociedade civil e com diferentes graus de

    intensidade. As organizaes podem ser totalmente independentes dos partidos, e

    sua associao estar vinculada consecuo de objetivos comuns, ou

    completamente vinculadas a eles, contando, inclusive, com uma superposio

    completa de membros e lideranas. J com relao ao nvel de intensidade, a

    literatura indica que o pice da aproximao entre partidos polticos e

    organizaes da sociedade civil aconteceu na poca de ouro dos partidos de massa, entre os anos 20 e 60 do sculo passado. Desde ento, a emergncia do

    Estado de Bem-Estar e o processo de modernizao socioeconmico agiram na

    eroso dos laos entre os partidos e grupos sociais especficos, levando a uma

    maior autonomia tanto dos partidos polticos quanto das prprias organizaes da

    sociedade civil. Esse processo est no centro da emergncia do partido de tipo

    catch all e, indiretamente, tambm do modelo de partido cartel (POGUNTKE,

    2006; VERGE, 2012). Como vimos, para Katz e Mair (1995; 2009), os partidos

    polticos se aproximaram do Estado e se distanciaram da sociedade. Com recursos

    estatais garantidos, os incentivos para a manuteno de estreitos vnculos com

    organizaes como sindicatos e associaes religiosas diminuram.

    Recentemente, alguns trabalhos questionaram a interpretao unidirecional

    derivada da anlise de Katz e Mair (1995; 2009), afirmando que o afastamento

    dos partidos com relao a outras organizaes no to claro, alm de no haver

    um padro entre partidos ou pases em torno desse fenmeno (POGUNTKE,

    2002; ALLERN, AYLLOT, CHRISTIANSEN, 2007; VERGE, 2012). Allern,

    Ayllot e Christiansen, por exemplo, demonstram que o declnio no grau de

    aproximao entre os partidos e os sindicatos na Escandinvia no se deu de

    maneira uniforme. Na Sucia e na Noruega, os social-democratas mantiveram-se

    mais prximos dos sindicatos do que na Dinamarca. Os autores, articulando

    Escolha Racional e Institucionalismo Histrico, concluem que tanto o clculo de

    custos e benefcios entre os atores envolvidos quanto a natureza dos vnculos

    construdos nas suas fases iniciais importam para explicar o grau de afastamento

    nos casos analisados (ALLERN, AYLLOT, CHRISTIANSEN, 2007). Em

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 25

    caminho semelhante, Christiansen (2012), em anlise longitudinal sobre a relao

    entre grupos de interesse e partidos polticos de diferentes famlias ideolgicas na

    Dinamarca, conclui que os laos se afrouxam quando os atores percebem que os

    custos em mant-los excedem os benefcios. Segundo o autor, isso ajuda a

    explicar os diferentes padres encontrados e as razes para eventuais

    aproximaes aps perodos de afastamento, colocando em xeque modelos mais

    estruturais, como o sugerido por Katz e Mair (1995). Em linha um pouco

    diferente, Verge demonstra como os partidos polticos espanhis continuam

    interessados em desenvolver relaes com organizaes da sociedade civil. A

    autora, inclusive, faz interessante contribuio ao descrever como os partidos

    utilizam recursos estatais para construir redes de apoios envolvendo organizaes

    da sociedade civil (CHRISTIANSEN, 2012).

    Para encerrarmos, convm mencionarmos que Katz e Mair (2012)

    responderam, em recente texto, a algumas das crticas feitas ao modelo de partido

    cartel no que diz respeito s relaes entre os partidos e as organizaes da

    sociedade civil. Para os autores, o argumento geral continua a se sustentar quando

    as relaes dos partidos com outros atores sociais no sculo XXI so comparadas

    com as mantidas pelos partidos dos anos 1950. No entanto, Katz e Mair

    reconhecem que novas democracias podem apresentar dinmicas distintas e os

    partidos podem usar organizaes da sociedade civil para fortalecerem suas

    posies frente ao eleitorado, desde que isso no signifique restries as suas

    aes.

    A literatura sobre a organizao dos partidos polticos brasileiros

    Em resenha feita no final dos anos 1990, Lima Jr. (1999) destacou a baixa

    produo acadmica sobre a organizao dos partidos polticos brasileiros.

    Escrevendo mais de uma dcada depois, Nicolau (2010) fez constatao

    semelhante. De fato, pouco sabemos como se estruturam os partidos polticos

    brasileiros que se organizaram desde o final do regime militar (1964-1985). Esta

    uma situao que contrasta com os avanos verificados em outros temas da

    Cincia Poltica nacional, como a que aborda o prprio sistema partidrio e a que

    trata das relaes Executivo-Legislativo, para ficarmos apenas em algumas.

    possvel distinguirmos a literatura que trata dos partidos polticos

    brasileiros sob uma perspectiva organizativa em dois blocos. O primeiro trata

    mais diretamente do Partido dos Trabalhadores (PT). O outro, dos demais grandes

    partidos. Na sua maioria, so estudos de caso realizados como dissertaes de

    mestrado ou teses de doutorado. No primeiro grupo, destacam-se os trabalhos de

    Meneguello (1989), Keck (1991), Ribeiro (2010) e Amaral (2011). Meneguello e

    Keck escreveram textos clssicos sobre o PT e inauguraram uma interpretao a

    respeito das origens e dos primeiros anos do partido que persiste at hoje. difcil

    encontrar qualquer trabalho de flego a respeito da agremiao que no mencione

    essas duas obras. Embora tenham algumas diferenas de enfoque e nvel de

  • 26 | Oswaldo E. do Amaral

    detalhamento, os dois textos apontam para a singularidade do PT no seu processo

    de gestao: um partido criado de baixo para cima a partir da confluncia de

    diversos atores sociais. Sindicalistas, membros da esquerda organizada, de setores

    progressistas da Igreja Catlica e de movimentos sociais urbanos, assim como

    intelectuais e parlamentares do MDB, abraaram a criao do PT e constituram o

    seu DNA. Alm da origem externa, as autoras ressaltam a preocupao do partido

    nos seus primeiros anos em construir um desenho institucional democrtico que

    privilegiasse a participao das bases no seu processo decisrio.

    Ribeiro (2010) e Amaral (2011) seguem a tradio dos trabalhos de

    Meneguello (1989) e Keck (1991) e buscam analisar as transformaes

    organizativas do PT. O trabalho de Ribeiro (2010) gira em torno de duas

    dimenses de anlise: funcional e organizativa. Para o autor, o PT seguiu o

    caminho da social-democracia europeia, adquirindo caractersticas inequvocas de

    partido profissional-eleitoral como definido por Panebianco (2005) e se tornando

    cada vez mais dependente do Estado, aproximando-se tambm do modelo de

    partido cartel proposto por Katz e Mair (1995; 2009). Muito bem documentada e

    com um percurso terico claro, a anlise de Ribeiro opta por enfatizar as

    semelhanas das transformaes petistas com as descritas pela literatura a respeito

    da social-democracia europeia. Essa nfase, porm, acaba diluindo as

    especificidades do caso petista e a importncia da preservao de prticas e regras

    ao longo da histria partidria, responsveis tambm por moldar o seu

    desenvolvimento organizativo. Esse um dos aspectos do trabalho de Amaral

    (2011) sobre as transformaes do partido. O autor procura, ainda que sem a

    abrangncia do trabalho de Ribeiro, requalificar as transformaes pelas quais o

    partido passou entre 1995 e 2010, demonstrando que as mudanas na organizao

    interna do PT refletem a acomodao da agremiao a uma posio que concilia

    sua histria/origem com a necessidade de vencer eleies e governar.

    Em uma perspectiva comparada, Roma (2006) e DAraujo (2011) analisam alguns aspectos da organizao do PT e do Partido da Social-Democracia

    Brasileira (PSDB). O primeiro demonstra como as origens e a ideologia de cada

    partido acabam por moldar seu comportamento e atuao. Nesse sentido, a origem

    parlamentar do PSDB acabou levando criao de uma agremiao mais

    descentralizada e com menos interferncia da burocracia partidria e dos filiados

    sobre suas lideranas do que no caso petista (ROMA, 2006). J DAraujo (2011) demonstra empiricamente que o PT est mais prximo de movimentos sociais e de

    setores do funcionalismo pblico do que o PSDB, o que acabou redundando em

    uma estratgia diferente de distribuio de cargos no governo Lula daquela

    verificada durante a presidncia de Fernando Henrique Cardoso (FHC).

    O segundo bloco composto por trabalhos que, na sua maioria, tratam do

    PSDB, do Partido da Frente Liberal (PFL)/Democratas (DEM) e do Partido do

    Movimento Democrtico Brasileiro (PMDB). Roma (2002) mostra como a

    estrutura organizativa do PSDB propiciou s lideranas partidrias tanto em

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 27

    mbito nacional quanto estadual concretizar acordos com outras legendas sem

    terem que se submeter a constrangimentos de outras instncias partidrias. Essa

    caracterstica, segundo o autor, foi fundamental para o sucesso eleitoral da

    agremiao nos anos 1990 (ROMA, 2002). Em estudo no qual compara como

    distintos processos de formao e institucionalizao partidrias podem

    contrabalanar os efeitos descentralizadores do federalismo, Ferreira mostra que o

    processo de formao do PMDB e de sua estruturao no perodo de transio

    para a democracia resultaram em um arranjo interno muito mais descentralizado

    do que o verificado no PFL/DEM, que desde a sua fundao contou com uma elite

    mais coesa e comprometida com a tarefa de fortalecer o partido no plano nacional

    (FERREIRA, 2002). As concluses de Ferreira seguem as indicaes de Kinzo

    (1988), que no final dos anos 1980 j apontara o exagerado facciosismo

    peemedebista. Em uma anlise mais abrangente sobre o sistema partidrio

    brasileiro, Mainwaring (2001) argumenta que PMDB, PFL/DEM e PSDB esto

    mais prximos do modelo catch all de partido e que suas estruturas so mais

    suscetveis aos incentivos centrfugos do federalismo brasileiro do que as de

    partidos de esquerda, como o PT.

    Consideraes Finais Neste texto, buscamos sistematizar a produo acadmica e o

    conhecimento cientfico produzido no mbito da Cincia Poltica, tanto nacional

    quanto internacional, sobre a organizao dos partidos polticos. Discutimos a

    evoluo dos modelos organizativos desde o pioneiro trabalho de Duverger (1980)

    at as mais recentes contribuies de Katz e Mair (1995; 2009) e Wolinetz (2002).

    Apresentamos tambm a produo mais contempornea sobre processos

    decisrios internos e o relacionamento dos partidos com filiados e organizaes da

    sociedade civil, bem como sobre a organizao dos partidos polticos brasileiros.

    No que diz respeito aos modelos de partidos, possvel perceber uma

    tenso entre os autores que acreditam em uma tendncia evolutiva nas formas de

    organizao partidria e aqueles que defendem ser difcil discernir uma direo

    inequvoca nas transformaes organizativas verificadas ao longo do tempo. Essa

    tenso transparece, por exemplo, na discusso em torno do modelo de partido

    cartel, que vem dominando a literatura nos ltimos 15 anos. De um lado, Katz e

    Mair reafirmam seus argumentos. De acordo com eles,

    [...] nesses pouco mais de dez anos desde a publicao de nosso paper

    original, as tendncias para as quais chamamos a ateno se tornaram

    ainda mais visveis e fortaleceram nosso argumento. Isso

    especialmente verdadeiro quando olhamos para os partidos

    tradicionais, que a cada dia esto mais prximos dos padres que

    descrevemos tanto em termos organizativos quanto em termos

    competitivos (KATZ e MAIR, 2009, p. 759-760).

  • 28 | Oswaldo E. do Amaral

    Para os autores, o processo de cartelizao dos sistemas polticos tem

    consequncias perigosas para o prprio regime democrtico, pois os partidos no

    conseguem mais preencher o espao de representao e agregao de interesses,

    abrindo lacunas para lideranas populistas e agremiaes antipartidos (KATZ e MAIR, 2009).

    A viso mais pessimista de Katz e Mair, embora tenha estabelecido uma

    importante agenda de pesquisa nos ltimos anos, no completamente aceita por

    muitos estudiosos dos partidos polticos. A lgica evolutiva enunciada pelos

    autores questionada dentro de uma crtica mais geral sobre a construo de

    modelos analticos para a compreenso das transformaes partidrias. Como

    pudemos ver, autores como Wolinetz (2002) e Krouwel (2006), diante de uma

    srie de evidncias empricas, no se mostram plenamente convencidos de que os

    partidos caminham inexoravelmente na mesma direo. J Dalton, Farrell e

    McAllister (2011) argumentam que os partidos, apesar de todas as transformaes

    pelas quais passaram, ainda conseguem realizar as funes de conexo entre a

    sociedade e o governo e de mobilizao poltica dos cidados. Ou seja, continuam

    a ser fundamentais para o funcionamento das democracias contemporneas e

    permanecem como atores essenciais no processo de controle dos governantes

    pelos cidados (DALTON, FARRELL e MCALLISTER, 2011). Os autores

    reconhecem, porm, que as dinmicas democrticas mais recentes estabecem

    novos desafios aos partidos, como a emergncia de lideranas carismticas

    antipartidrias e de prticas de democracia direta. No entanto, os autores indicam

    que nenhuma forma de organizao poltica, at o presente, mostrou-se superior

    aos partidos polticos para viabilizar a competio poltica nas democracias

    contemporneas e que, historicamente, as agremiaes polticas vm

    demonstrando uma impressionante habilidade de se adaptar e superar os desafios

    encontrados.

    Por fim, cabe levantarmos uma agenda de pesquisa para o caso brasileiro.

    Como vimos, apesar de boas monografias e artigos sobe a organizao de alguns

    partidos, como o PT e o PSDB, e alguns estudos comparados, ainda h muito a

    descobrir sobre como as agremiaes polticas surgidas no Brasil no atual perodo

    democrtico selecionam lideranas e candidatos, administram suas finanas,

    tomam decises, se relacionam com movimentos sociais e outras organizaes da

    sociedade civil e envolvem militantes em suas atividades.

    Diante desse quadro, fundamental desenvolvermos trabalhos que

    minorem as lacunas existentes na literatura. Para isso, so necessrias pesquisas

    que combinem slida abordagem emprica com uma anlise refinada envolvendo

    os principais partidos do Pas. Um importante passo ser dado com um duplo

    esforo investigativo: (a) Mapear o desenvolvimento organizativo dos principais

    partidos polticos do Pas; (b) Descobrir quem so os filiados aos partidos

    polticos no Brasil, o que pensam, como participam das atividades partidrias e a

    quais redes de associao pertencem.

  • O que sabemos sobre a organizao dos partidos polticos | 29

    Com relao ao primeiro, entendemos que a elaborao de um banco de

    dados sobre a organizao dos principais partidos do Pas durante o perodo

    democrtico ainda precisa ser feito. Esse banco deve conter informaes sobre

    estatutos, nmero de filiados, nmero de diretrios, atividades realizadas pelos

    partidos (como reunies, encontros, congressos e conferncias), recursos

    financeiros e lideranas partidrias (membros de diretrios e listas de candidatos).

    Outra lacuna importante no estudo dos partidos polticos no Brasil est

    justamente no que toca ao conhecimento daqueles que integram os partidos. Os

    dados existentes mais recentes, na sua maioria, do conta apenas de altas

    lideranas ou lideranas intermedirias (ROMA, 2006; RIBEIRO, 2010;

    AMARAL, 2011; DARAUJO, 2011). No sabemos nada alm da localizao geogrfica sobre os filiados aos partidos polticos. A realizao de uma pesquisa

    sobre esse universo pode abrir uma avenida de descobertas importantes sobre os

    partidos e os nveis de participao poltica no Brasil.

    Oswaldo E. do Amaral Professor do Departamento de Cincia Poltica da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e pesquisador do Centro de Estudos de Opinio Pblica (CESOP) da Unicamp. E-mail: [email protected]

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    Texto recebido em 04 de abril de 2013.

    Aprovado em 05 de junho de 2013.