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A urbaníst ica germânica e sua in fluência na cons trução dos parad igmas do urbanisno Brasil (1870-1920)
José Geraldo Simões Junior
Professor e Doutor do Mestrado em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
O resgate da importância do urbanismo germânico pela historiografia.
O peso significativo atribuído à influência alemã na origem do urbanismo moderno pode parecer um fato novo
Na verdade , essa constatação é relativamente recente e surgiu nos anos de 1960 na Europa. A falênc
políticas públicas urbanas então em processo e a sua ineficácia em dar respostas adequadas aos graves pro
sociais e de desigualdades que se observavam generalizadamente no âmbito da apropriação do espaço u
aliada ao fortalecimento dos partidos de esquerda, fez surgir a necessidade de um debate que mo
organização de um primeiro seminário internacional, realizado em 1963 na Itália sob o título "Os comunist
grandes cidades". A partir desse encontro começaram a surgir estudos procurando rever as origens do urb
moderno, que até então estavam vinculadas ao nascimento do movimento modernista.
Cabe salientar também que nesse momento, os paradigmas do modernismo enquanto proposta de arquitetu
urbanismo estavam sendo fortemente questionados num âmbito mais geral, dado o fracasso que representado enquanto soluções de reconstrução do pós-guerra e de alternativas para o problema habitac
destruição, pela população do conjunto residencial de Pruitt-Igoe, no início dos anos 70 nos Estados Unid
simbolizar a derrota definitiva dessas premissas do CIAM enquanto fundamentadoras de políticas urbanas.
Esse movimento de revisão de paradigmas na historiografia do urbanismo assume um papel mais relev
cenário italiano e francês, dando origem a novas correntes de interpretação, onde arquitetos, historiad
urbanistas começam a realizar estudos e a fundamentar suas propostas com base na releitura dos cláss
marxismo e da experiência urbanística ocorrida anteriormente ao surgimento dos movimento moderno nos an
Tal movimento crítico dá origem então a uma nova corrente de interpretação, que na Itália passa a ser con
como Escola de Veneza ( sediada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Veneza ) e
França vem assumir uma conotação semelhante , através do Centro de Sociologia Urbana (CSU/CNRS) .
Os principais expoentes dessa nova tendência serão Giorgio Piccinato, Carlo Aymonino e Donatella Cal
Escola de Veneza, na Itália e Manuel Castells, Christian Topalov, Edmond Préteceille, Henri Lefèvre e Jean
no CNRS- Centre National de Recherches Scientifiques, na França, que utilizarão as revistas Contrap
Espaces et Societés para divulgar suas idéias.
Em termos da historiografia do urbanismo, o resgate da importância do movimento urbanístico alemão
principalmente a partir das pesquisas desenvolvidas pela Escola de Veneza.
Giorgio Piccinato, em um livro publicado em 1974, intitulado La Costruzione dell'Urbanistica - Ge
(1871-1914) vem demonstrar que os alemães foram os precursores na fundamentação de um urbanismo en
campo disciplinar e científico, antecedendo-se até mesmo aos estudos elaborados pela Escola de Chicago.
Nessa obra, ele apresenta, em tradução inédita, alguns trechos de manuais redigidos há quase um sécul
pioneiros dessa nova ciência: os alemães Reinhard Baumeister [1] e Joseph Stübben[2].
Além dos manuais germânicos, havia também uma forte influência de modelos de intervenção urbana realiza
metrópoles européias e que haviam obtido grande repercussão junto aos administradores urbanos do mund
Tratava-se dos projetos de remodelação e de modernização realizados nas cidades de Paris e
respectivamente na época de Napoleão III (plano Haussmann) e do imperador Francisco-José (aber
Ringstrasse).
Ainda dentro desse contexto germânico, aparece a figura de Camillo Sitte[3], um arquiteto austríaco que
enorme influência no cenário urbanístico europeu da época, sobretudo após a publicação, em 1889 , de um
criticando as transformações decorrentes da implantação da Ringstrasse - uma grande avenida circular envo
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o centro histórico de Viena.
O papel fundamental desempenhado por Sitte na historiografia do urbanismo moderno, foi recuperado ent
pelas pesquisas de Piccinato - pois este se limitara aos alemães - mas sim por um casal de estudiosos amer
George e Christiane Coliins.
Antecipando-se em quase dez anos ao enfoque assumido pelos estudos da Escola de Veneza, os Collins
1965, publicam um grande compêndio sobre a vida e obra de Camillo Sitte, apresentando como pano de fun
panorama geral e extremamente completo sobre todo o cenário urbanístico alemão desse período de fins do
XIX. Este trabalho é intitulado Camillo Sitte: the birth of modern city-planning.
Mais recentemente, nos anos 80, pesquisas comparativas sobre o cenário urbanístico alemão em relacontexto europeu e americano, foram realizadas pelo pesquisador inglês Anthony Sutcliffe e publicadas em T
the Planned City – Germany, Britain, the United States and France (1780-1914). Na Alemanha, os professo
Universidade de Aachen, Gerhard Fehl e Juan Rodríguez-Lores publicaram diversos estudos sobre o assun
bibliografia no final).
Estas obras foram fundamentais para a compreensão do contexto internacional onde o urbanismo científico
surgiu e se difundiu. Importante também para o entendimento das propostas elaboradas no início do século
cidade de São Paulo, em especial os planos de Victor Freire e Francisco Prestes Maia, intitulados respectiv
“Os Melhoramentos de São Paulo” (1911) e “Estudo de um Plano de Avenidas para a Cidade de São Paulo” (1
Este trabalho procurará analisar esta influência somente a partir do plano de Victor Freire.
O surgimento do urbanismo científico no cenário germânico
Após a guerra franco-prussiana de 1870, a Alemanha então já unificada recebe um grande montante de re
provenientes das indenizações pagas pela França derrotada. Esse fato vem agilizar o processo de industria
acelerada do país, trazendo como conseqüência um enorme crescimento urbano e favorecendo dessa f
aparecimento de medidas controladoras e disciplinadoras dessa expansão das cidades.
Esses novos instrumentos foram elaborados num momento em que o Estado alemão começa a ter o seu
político compartilhado entre a tradicional nobreza governante e uma nova classe social enriquecida, a bur
industrial. Desta forma, o poder central continua na mão dessa nobreza, mas as câmaras municipais das c
passam a ter o seu controle exercido majoritariamente por essa classe emergente.
A partir desse novo quadro político, as administrações municipais têm a seu dispor mais recursos e
autonomia para poder por em prática os planos de expansão e remodelação.
Essa nova classe social dirigente via nesses planos de reforma urbana a oportunidade de afirmar seus vasua ideologia liberal na paisagem da cidade. Essas remodelações, baseadas agora em critérfuncionalidade, decoro e segregação espacial, passariam a ser as premissas para a construçuma nova fisionomia da cidade .
Mais de uma centena de planos são elaborados nesse período de fim-de-século para inúmeras cida
Alemanha . Os concursos promovidos, os votos de associações profissionais, os manuais, as primeiras legi
específicas são fatores inerentes a esse contexto e que vêm favorecer o florescimento de um debate de
intelectual e científico sobre essa nascente disciplina urbanística.
Por outro lado, o isolamento que a Alemanha estava vivendo em relação à França e à sua tradição arquite(notabilizada sobretudo após as intervenções de Haussmann em Paris), vem conferir um caráter diferenc
autônomo a essa prática urbanística saxônica, fazendo com que as teorizacões dos pioneiros dessa nova c
Baumeister, Stübben e Sitte - ganhassem corpo enquanto constituintes de uma disciplina de grande signific
Europa de fins do século XIX.
Esses primeiros teóricos publicariam importantes manuais e estudos que hoje são considerados como os ma
fundação dessa nova ciência. Baumeister, professor da Escola Técnica de Karlsruhe, escreve em 1876 um
enfatizando a questão da expansão urbana e as formas de gerenciamento e intervenção por parte do poder
Sitte, arquiteto austríaco, ganharia notoriedade ao divulgar,em 1889, um estudo crítico sobre as intervençõ
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estavam se realizando no centro de Viena e que haviam dado origem a uma monumental avenida
contornando o centro histórico da cidade - a Ringstrasse. E Stübben, em 1890 publicaria um completíssimo
relatando todos os aspectos da experiência acumulada por essa nova ciência até então.
A di fusão do urbanismo alemão - os congressos e exposições in ternacionais e as revistas especializa
A difusão desse conhecimento especializado no cenário europeu mais amplo, começou a progredir verdadeir
a partir do surgimento dos encontros e congressos internacionais, na década de 1890. Alguns anos mais
ganharia projeção global com a divulgação proporcionada pelas revistas especializadas.
A questão urbana, a bem dizer, já estava presente em alguns eventos internacionais desde meados do sécu
como por exemplo nas Exposições Universais. Alguns historiadores, como Sutcliffe (1981,165) apontam a pr
de Le Play na exposição parisiense de 1867 como sendo um marco, a partir do qual a divulgação de propo
reforma urbana passa a fazer parte desse tipo de evento.
Embora essas exposições e encontros internacionais fossem uma atividade quase que quotidiana nessa
(entre 1886 e 1890 foram contabilizadas a realização de 853 congressos internacionais de caráter ger
atingiriam o número de 2271 no período de 1900 a 1914 ) (SUTCLIFFE,1981,166), a existência de e
especializados na difusão de questões urbanas passaria a acontecer na Europa somente após 1898
realização do 1º Congresso de Arte Pública, organizado em Bruxelas pelo então burgomestre da cidade, o ur
Charles Buls.
Durante toda a primeira década, os congressos eram os únicos fóruns de encontro e debate de idéias comunidade dos urbanistas. Os manuais e livros especializados eram poucos e as revistas ainda não existiam
Para que seja possível ter uma idéia do material disponível sobre esse assunto em 1903, por exemplo, pode
citar : - o livro de Camillo Sitte (1889) e sua primeira tradução para o francês (1902), o manual de Joseph S
(1890), o de Reinhard Baumeister (1876), o livro de Ebenezer Howard (1898), o de Charles Buls (1894)
Charles Mulford Robinson (1902). Outros urbanistas como Raymond Unwin, Eugène Hénard, Werner Hege
Patrick Geddes, só viriam lançar a público suas primeiras idéias alguns anos mais tarde.
O primeiro grande evento de divulgação urbanística é realizado em 1903, em Dresden, intitulado “P
Exposição Alemã de Cidades” (Ersten deutschen Städteausstelung zu Dresden), onde são apresentados 214
desenvolvidos pelas municipalidades alemãs, causando profundo impacto nos administradores públicos de
países que visitaram o evento, pois perceberam aí uma clara metodologia para realizar o diagnóstico, e
planos e conceber instrumentos normativos para suas cidades. Após a exposição de Dresden, os congressos de urbanismo realizados na Europa se constituíam na
oportunidade de aprendizado não-livresco, de troca de experiências e de debates entre os técnic
administrações municipais, projetistas e acadêmicos da área do urbano.
Após esse evento de 1903, o outro encontro significativo é o VII International Congres of Archiects, realiz
Londres no ano de 1906, que conta com a presença de Charles Buls, Joseph Stübben e Raymond Unwin.
Quatro anos mais tarde, em 1910, essa mesma cidade sediaria um dos mais importantes eventos do per
Town Planning Conference, que conseguiria reunir todos os mais importantes urbanístas da época, como
Eberstadt, A.E.Brinckmann, Augustin Rey, Louis Bonnier, Thomas H. Mawson, Stanley D. Adshead, a
Stübben, Robinson, Hénard, Geddes, Unwin e Howard.
Neste evento esteve presente o urbanista paulistano Victor da Silva Freire, que em tournée pela Europa,nessa mesma viagem as exposições de Bruxelas e de Berlim.
Neste mesmo ano de 1910, a Alemanha sediaria a importante Exposição Internacional de UrbanismBerlim (Städtebau-Ausstelung in Berlin), onde foram apresentados os planos do concurso da GBerlim e também trabalhos elaborados para as cidades de Budapeste, Estocolmo, Munique, CLondres, Paris, Viena, Chicago e Boston.
Este evento teve continuidade em 1912, com a Exposição Internacional de Dusseldorf (Städ Ausstelung - Dusseldorf) .
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Por fim, o ano de 1913 viria marcar a realização de um dos últimos encontros significativos desse p
Coincidentemente, todos realizados na Bélgica e Holanda, dos quais o mais importante foi sem dúvida o
Congrès International et Exposition Comparée des Villes , onde estiveram presentes Joseph Stübben e C
Buls.
Victor Freire esteve, com certeza, presente nos encontros realizados em 1910 e em 1913, os mais impo
dessa época.
Esses fóruns possibilitaram não só a troca de experiências entre os administradores municipais das d
cidades alemãs como também abriu espaço para a internacionalização dessa cultura germân
conseqüentemente, para o seu intercâmbio com outros países.
Um exemplo notável foi o caso do inglês Thomas Coglan Horsfall, que, impressionado com a visita realiz
cidades alemãs, publica em Manchester no ano de 1904 uma obra de grande repercussão, intitulad
Improvement of the Dwellings and Surroundings of the People: the Example of Germany”.
Além desses encontros, a difusão desse novo campo científico de conhecimento passou a contar, a partir d
do século, com os periódicos especializados. Estes vieram a se constituir no meio mais eficiente de divu
desse debate sobre a cidade,não só para aquele público tradicional já freqüentador desses congresso
sobretudo para os administradores públicos que estavam mais distantes desse contexto europeu (que era
dos brasileiros).
A primeira revista especializada na matéria do urbanismo e com repercussão internacional foi lançada em
simultaneamente em Viena e Berlim. Seu nome: Der Städtebau (A Construção Urbana). Os seus organizeram Camillo Sitte (que faleceria um pouco antes do lançamento do primeiro número) e Theodor Goecke.
No mesmo ano, a Inglaterra lançaria a Garden Cities and Town- Planning, uma das principais divulgado
projetos de cidade-jardim. Em 1908, teria início a Städdtebauliche Vortrage, editada em Berlim, e em 1910
Planning Review, publicada em Liverpool e veículo de divulgação do RIBA. Em 1914, surge o Journal of th
Planning Institute e em 1919, a revista francesa La Vie Urbaine.
No contexto norte-americano, pode-se citar os Proceedings of the National ConferenCity-Planning (1910) e a National Municipal Review (1912).
Esse período anterior à 1ª Guerra Mundial é o momento então que é considerado por muitos autores [ Collins
Piccinato(1974), Sutcliffe(1981) ], como aquele em que se dá a gênese do urbanismo enquanto campo dis
específico do conhecimento, enquanto uma ciência. Coincidentemente, é o momento em que se procpredomínio da influência germânica nesse cenário. A revista Der Städtebau, por exemplo possui a sua melh
nessa época, desde a sua criação em 1904 até a primeira interrupção, em 1914.
Muitos dos paradigmas adotados por Victor Freire, originaram-se desse ideário. Na viagem de nove mes
realizou à Europa, em 1913, (licenciando-se da Escola Politécnica e do cargo de Secretário de Obras da Pre
de São Paulo) Freire participou de diversas exposições e congressos, travou contato com Raymond U
conheceu diversas intervenções realizadas nas cidades alemãs. O mesmo proveito foi obtido em outras v
realizadas em 1900, 1910, 1916 e 1924.
A influência desses contatos foi marcante nos trabalhos que elaborou para São Paulo, especialmente e
Melhoramentos de São Paulo”, (publicado na Revista Polytechnica, em 1911) quando realiza uma anál
problemas da área central da cidade e propõe um plano de intervenções.
Alguns princípios da urbanística germânica
A partir da análise do conteúdo dos congressos e exposições internacionais, assim como dos manuaisrevistas especializadas, é possível elencar alguns aspectos que estavam presentes no debate urb
germânico no período anterior a 1920:
1 - esse contexto é marcado pela a excessiva presença de engenheiros, o que vem implicar na ênfase as
pelo urbanismo alemão nos aspectos sanitaristas e higienistas. (COLLINS, 1986,35)
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2 - No início do século XX, a experiência urbanística alemã foi exportada como um grande pacote de instru
de controle para as municipalidades e os urbanistas que eventualmente se detinham no estudo dessa expe
alemã estavam preocupados mais em absorver aqueles aspectos técnicos e administrativos presentes nos p
de reforma administrativa (cuja eficácia tanto notabilizava o urbanismo alemão) do que aqueles voltados à
enquanto obra de arte. (COLLINS,1986,100).
3 - O zoning , um instrumento de concepção germânica, surge como uma necessidade de controle e de p
urbana, num período em que as cidades alemãs passavam por um vertiginoso crescimento e uma
especulação fundiária. Um de seus promotores mais entusiastas foi Baumeister. Esse zoning presente na
moderna apresentava três categorias: a zona industrial, compreendendo o comércio atacadista e as residênc
funcionários dessas industrias; a zona de negócios e de comércio varejista; e a zona exclusivamente residenc
4- a questão da prevalência da visão viária (tão presentes nas obras de Baumeister e Stübben) é um fator i
à modernidade urbana e ao grande afluxo de veículos, questões essas que Sitte não defendia. A praça de
(rotatória), viria a se tornar um dos elementos basilares do planejamento das cidades.
5 - outra questão de importância na época eram aquelas relativas ao alinhamento das fachadas das edificaç
longo das ruas (Baufluchtlinie ) e dos efeitos visuais de perspectiva decorrentes do alinhamento do traçado
ruas (Strassenfluchtlinie ) .Esse assunto já estava presente na legislação da Prússia de 1875. Como co
Collins, essa legislação, "apesar de primitiva para os padrões do século XX, foi a indutora da adoção indiscri
de um modelo de retilinearidade presente no planejamento viário, modelo esse que seria bastante critica
Sitte. Segundo ele, a irregularidade das linhas das fachadas e das projeções de elementos presentes nas
edificações, tinham um charme em si, causando um efeito estético superior ao das uniformes fluchtl
(COLLINS,1986,40).
6 - um outro ponto causador de grande celeuma na época - motivo inclusive de calorosos debates em congre
em artigos de periódicos especializados - era aquele relativo à questão do traçado das ruas: se elas dever
retas ou se deveriam ser curvas ( krumme oder gerade Strassen? ). Por detrás desse debate, situa-se o
existente entre arquitetos e engenheiros, entre o artista e o técnico, entre os historicistas e os funcionalistas,
a racionalidade versus a espontaneidade na definição do desenho urbano.
7 - as primeiras normas construtivas adotadas na Alemanha eram de caráter higiênico e visavam a prevenç
incêndios. Referiam-se às edificações de uso residencial e davam especial atenção à ventilação, à insolaçã
isolamento da construção em relação às vizinhas. Dessa forma, começaram a surgir nessas normas
parâmetros, definindo altura da edificação, distâncias da mesma em relação às divisas do lote e à rua, profun
do lote, recuos, cubagem de ambientes internos, e também outras, procurando relacionar a área coberta com
do lote, os recuos com a altura da edificação, etc. ( PICCINATO, 1974 ,127)
A urbanística alemã e sua influência nas propostas de Victor Freire em São Paulo
A relevância dos trabalhos elaborados por Victor Freire reside exatamente no fato de possuírem um
diferenciador em relação às propostas urbanísticas brasileiras da época: eram estudos que se legitimav
possuir um discurso com referências conceituais ao urbanismo científico, que estava em gestação nesses pr
congressos europeus.
O plano intitulado “Os Melhoramentos de São Paulo”, de 1911, é um excelente exemplo para se analisa
transferência do ideário urbanístico internacional, pois fundamenta-se em inúmeros teóricos, arquitetos, urbatécnicos das administrações municipais de cidades da Europa (sobretudo da experiência anglo-saxônica e t
um pouco da norte-americana).
Por razões de exigüidade de espaço para este trabalho, não será descrito o conteúdo do plano de Freir
somente as referências bibliográficas que ele utilizou.
Dentre os inúmeros nomes consagrados que ele cita nesse trabalho, pode-se relacionar como principais:
1-Charles Buls - o famoso burgomestre da cidade de Bruxelas que em fins do século passado redigiu
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Esthétique des Villes e organizou os primeiros congressos internacionais de Arte Pública
2- Eugène Hénard - urbanista francês que teve sua atuação marcada nos congressos internacionais duprimeira década, sobretudo no de Londres. Publicou os ensaios intitulados Études sur les transformations de
3- Theodor Fischer - professor da Politécnica de Stuttgart e autor do plano de extensão da cidade de Muniq1893.
4- Camillo Sitte - o arquiteto italo-austríaco é a referência básica nesse texto de Freire, que para tanto se ut
primeira edição francesa do livro.
5- Karl Henrici - professor da Politécnica de Aachen a autor do plano de extensão de Dassau, em 1890.
6- Charles Mulford Robinson - urbanista americano, que participou do congresso de Londres emocasião em que provavelmente foi conhecido por Freire. Já em 1902, publicava The improvemtowns and cities e em 1903, o Modern Civic Art (ou The Widh and Arrangement of Streets)
7- Arthur Vierendeel - engenheiro belga, que se notabilizou pelos trabalhos que publicou sobre arquitetura emEm 1905, escreveu uma importante memória intitulada Traçado de ruas e praças públicas..
8- George Eugène Haussmann - o prefeito de Paris que realizou as famosas intervenções viárias de
monumental, em meados do século XIX.
9- Reinhard Baumeister - engenheiro alemão, autor do primeiro tratado urbanístico de caráter científico em 18
10- Joseph-Antoine Bouvard - urbanista francês que participou da Exposição Universal de 1900 e em 1907 rum plano de melhoramentos para Buenos Aires. É o nome indicado por Freire para resolver a 'questmelhoramentos de São Paulo.
11- Friedrich Puetzer - arquiteto, professor da Politécnica de Darmstadt e autor de um plano para um baperiferia dessa cidade, na década de 1890.
A alusão a todos estes urbanistas permite assim analisar o itinerário bibliográfico que Freire percorre
fundamentar o seu 'Melhoramentos de São Paulo'. Basicamente foram cinco obras:
Em primeiro lugar, aparece o livro de Sitte, o mais utilizado. Freire estudou-o detidamente e tirou daí os prconceitos que passou a defender em relação ao sistema viário, às áreas verdes, ao Paço Municipal, etc. Éobra que ele extraiu os comentários a respeito dos trabalhos e planos elaborados por Baumeister, por PuetzHenrici e por Theodor Fischer. As ilustrações referentes à obra desses urbanistas alemães não consta no entedição austríaca de 1889 e nem da famosa tradução francesa de Camille Martin em 1918. Aparece someprimeira edição francesa de 1902, que foi a que Freire então utilizou para o anexo das gravuras ao final trabalho.
Em segundo lugar, o texto de Arthur Vierendeel de 1905, que apresenta a concepção do tripé viário/sa/estético para conceituar o 'ponto de vista de conjunto' na análise do urbano.
Em terceiro, a obra de Eugéne Hénard sobre as transformações de Paris, que este francês publicou entre ode 1903 e 1907. Pelas idéias que aí apresenta, Freire deve ter se utilizado mais dos fascículos 2 e 3 dosambos de 1903 e intitulados respectivamente Les alignements brisés e Les grands espaces libres.
Em quarto, alguma parte da obra de Charles Buls, publicada anteriormente a 1911. Como Freire não faz refernenhum título em especial, pode-se supor que ele se utilizou ou do livro mais famoso de Buls editado em 1Esthétique des Villes, ou do paper que ele apresentou no congresso de Londres de 1906, intituladodisposition et du developpement des rues et des espacer libres dans les villes.
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Por último, a obra do americano Charles Mulford Robinson cuja primeira edição de 1901, como o próprioatesta à p.121, permite concluir que se trata do livro The improvement of towns and cities or The practical bcivic aestthetics.
Além desses cinco livros, Freire também utilizou as plantas e o memorial que Bouvard elaborou para a interna cidade de Buenos Aires em 1907.
É possível ainda concluir que Freire teve acesso a essa bibliografia através dos encontros internacionUrbanismo, que ele começou a participar por volta de 1908. No congresso de Londres, em 1910, ele te
contato com a obra de Robinson, de Hénard e também com a de outros urbanistas que ele utilizaria posteriorcomo Stübben, Unwin, Geddes, Augustin Rey e Howard.
A ligação com a experiência argentina e com o trabalho de Bouvard, foi um fato decorrente de sua participagrupo portenho intitulado Museo Social.
Em relação às obras de Sitte e Vierendeel, pode-se supor que Freire já as conhecia quando participou do conde Londres em 1910. Provavelmente já tinha travado contato com esses trabalhos aqui em São Paulo, uma vhá um exemplar da edição de 1902 do livro de Sitte na biblioteca da Politécnica (edição francesa). Pode-se mesmo em relação ao trabalho de Vierendeel, que embora não localizado, devia fazer parte de um artigo punum dos inúmeros periódicos europeus que essa mesma biblioteca assinava na época.
Em relação ao importante manual de Stübben, Der Städtebau, Freire não faz referência a ele neste texto demas utilizará intensamente este autor em textos posteriores, quando discute a salubridade a e expansão urbedição mais difundida do livro de Stübben é a de 1924, que a Politécnica possui um exemplar e que foi largautilizada por Prestes Maia na elaboração de seu Plano de Avenidas, em 1930. No entanto, bem antes deFreire já utilizará referências aos conceitos de Stübben, advindos certamente não de seu manual, mas de umque apresentou na Exposição Colombiana de Chicago em 1893 e que foi traduzida para o francês por Charlee largamente divulgada. Seu título: “La Construction des Villes”.
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Anexo
Alguns comentários e informações sobre os primeiros congressos e exposições de urbanismo
1893 - Nesse ano foi organizado na cidade de Chicago a Exposição Colombiana, como parte das
comemorações dos 400 anos de descoberta da América por Cristóvão Colombo. Nessa ocasião frealizados eventos visando divulgar o movimento da City Beautiful americana, como o "InternatioEngineering Congress". Aí esteve participando Joseph Stübben, que apresentou um importantetrabalho sintetizando a sua visão sobre o urbanismo, que nessa época era muito próxima do enfositteano. Essa memória, intitulada "Practical and Aesthetic Principles for the Laying Out of Cities" publicada nas Transactions of the American Society of Civil Engineers, XXIX, 1893,pp.718-36. Doanos mais tarde, Charles Buls traduziria esse texto (La Construction des Villes, Brussels,Lyon-Clasec,1895).
1898 - O 1º Congresso Internacional de Arte Pública, realizado em Bruxelas, contou com a participação de CBuls e de Joseph Stübben. Este último apresentou o trabalho "Report on Streets, Plazas and Monuments” pu
no ano seguinte em periódico belga L'Art Public e na Revista Municipal Affairs, de Nova York
1903 - A Exposição Alemã de Cidades,que foi sediada em Dresden (Ersten deutschenStädteausstellung zu Dresden) é considerada pela historiografia como a primeira exposição espede urbanismo. Embora restrita às cidades alemãs, este evento procurou apresentar as diversasexperiências de intervenção urbana que as municipalidades desse país estavam empreendendo grande intensidade. Foram expostos 214 trabalhos. A exposição causou grande repercussão nosmeios técnicos europeus e serviu para consolidar a respeitabilidade que a metodologia de intervegermânica adquiriu no cenário internacional até fins dos anos 10.
Este evento teve continuiidade através das exposições de Düsseldorf, em 1904 (sobre parques urbanos), de
Darmstadt, em 1905 e com a Exposição Internacional de Viena.
1906 - No 7º Congresso Internacional de Arquitetos realizado em Londres em 1906 sob os auspíc
RIBA (Royal Institute of British Architects) estiveram participando, dentre outros, o alemão JosephStübben, com a conferência Entwerfen und Anlegen von Strassen und freien Plätze im Städtebau
Neste mesmo ano, em Mannheim, a Liga dos Arquitetos e Engenheiros Alemães (Verband Deutscher
Architekten-und Ingenieur Vereine) votava uma série de princípios básicos a serem obedecidos pelo urbanism
Coordenados por Baumeister,e intitulados "Gründsatze des Stadtebaues" (Princípios do Urbanismesses fundamentos eram organizados nas seguintes partes: 1- Observações de caráter geral; 2-Elaboração do plano; 3- Ruas; 4- Praças; 5- Tipologia edílica; 6- Relações de propriedade; 7-Financiamento.
1910 - O Congresso Internacional de Urbanismo (Town Planning Conference) organizado pelo RIBrealizado em Londres, em outubro de 1910. Este evento reuniu os mais importantes dos urbanistépoca.
1910- 1912 - A Exposição Universal de Urbanismo, realizada em Berlim em 1910, possuiu comoleit-motiv o concurso para os planos da Grande-Berlim. Os anais do evento, organizados por OttMarch e Werner Hegemann, constam da publicação editada em dois volumes, intitulada "Der Städtebau nach den Ergebnissen der Algemeine Städtebau-Ausstellung in Berlin nebst einen Anhdie Internationale Städtebau-Ausstellung in Düsseldorf", onde estão incluídos o material relativo àExposição Internacional de Urbanismo de Dusseldorf, realizada em 1912.
O primeiro volume condensa o material referente ao plano de Berlim e divide-se em três partes: Introdução, O
de Berlim e A Cidade Monumental
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O segundo volume refere-se unicamente à exposição de 1912 e apresenta um quadro geral do urbanismo e d
intervenções realizadas nas principais cidades do mundo: Paris, Viena, Budapeste, Munique, Colônia, Londre
Estocolmo, Chicago e Boston. Aí estiveram expostos trabalhos de Eugène Hénard, Raymond Unwin, Thomas
Adams, entre outros.
1913 - No Congresso de Gand, intitulado "Premier Congrès International et Exposition Comparée Villes" - onde esteve presente Victor Freire - foram apresentados, entre outros, os seguintes traba"De la necessité et de la méthode de différencier le règlement des bâtisses" de Joseph Stübben e"Faut-il préconiser l'isolement complet ou le dégagement partiel des grandes édifices?" de CharleBuls.
No Congresso de Saneamento e de Salubridade das Habitações, de Antuérpia, contou com a participação de
brasileiros, ambos médicos, que na segunda sessão — relativa a 'Higiene Colonial'— apresentaram um traba
sobre as condições de salubridade no Rio de Janeiro. Victor Freire também estava presente.
No Congresso de Habitações Econômicas, em Haia, o único participante brasileiro foi Victor Freire.
Após esses três eventos, foi organizada uma excursão de seis semanas visitando as cidades alemãs. Coord
pelo alemão Albrecht, estiveram presentes na viagem além de Freire, os urbanistas americanos Nelson Lewis
Frank Backus Williams e o uruguaio Hansen .
[1] Reinhard Baumeister - (1833-1917), professor da Technische Hochschule Karlsruhe (Escola Técnica Superior de Karlsruhe)como engenheiro e urbanista na elaboração de planos reguladores juntamente com associações profissionais, municípios e órgãos pdedica grande parte de sua intensa atividade à elaboração teórica. Escreve sobre o ensino do urbanismo e da estética urbengenheiros, como em seu primeiro livro Architektonische Formenlehre für Ingenieure (1866) (O ensino da forma arquitetônicaengenheiros) e em diversos escritos publicados pela Technische Hochschule (1878).
Estabelece as bases do urbanismo enquanto ciência e é o primeiro a admitir que o urbanismo possui como condicionanteo tráfego de veículos. É também o pioneiro na proposição de uma legislação sobre zoneamento.
Discorre extensamente sobre a questão da moradia, do saneamento urbano e dos instrumentos da administração municipa
Publica diversos artigos na revista 'Der Städtebau'. Contribui na redação dos estatutos quando da criação das Ass(Vereine) de Arquitetos e Engenheiros de Berlim (1874) e de Mannheim (1906). Participa de diversos congressos e exinternacionais, dentre os quais o de Berlim em 1910, onde apresenta os seus planos para as cidades de Altona e Mannheim.
A sua obra fundamental, Stadt-Erweiterungen in Technischer,Baupolizeilicher und Wirtschaftlicher Beziehung (1876) (A edas cidades e sua relação com os aspectos técnicos, edílicos e econômicos) torna-se o primeiro tratado urbanístico alemão ddifusão.
Muitas das idéias expostas nesse seu manual virão influenciar Camillo Sitte posteriormente. Principalmente as consideraordem artística e aquelas que estabelecem os sistemas urbanos baseados em malhas viárias distintas: ortogonal, radial e triangular.
[2] Joseph Stübben (1845-1936) Desenvolve longa e extensa atividade profissional. Como arquiteto e urbanista, trabalha nas cidBerlim (1864-1870), Aachen (1876-1881), Colônia (1881) e Posen (1904-1920), elaborando também inúmeros planos de exremodelação para cerca de 40 cidades da Alemanha e Europa. Seu projeto mais importante é o plano de extensão para CoAlemanha.
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Obtém o 1º prêmio no concurso para o Plano da Grande Viena em 1892. Desempenha papel fundamental nos Congressos InternacUrbanismo, sobretudo nos de Bruxelas (1898), Londres (1910), e Gand (1913). Redige inúmeros artigos nos periódicos mais importperíodo: Der Städtebau, Deutsche Bauzeitung e Zeitschrift fur Bauwesen.
Seu livro mais importante é Der Städtebau (A Construção de Cidades), publicado em 1890.
[3] Camillo Sitte (1843-1903) Diplomado em artes e arquitetura, é responsável, em 1883, pela organização da nova Escola ImArtes Aplicadas de Viena. Em 1889 publica o livro que viria consagrá-lo internacionalmente, o Der Städtebau nach seinen künst
Grundsatzen ( A construção de cidades segundo seus princípios artísticos). Nessa obra, apresenta uma crítica ao projeto de imensacircular construída em Viena, a Ringstrasse , símbolo da modernidade na época, marcada pela monumentalidade das construçespaços públicos e pela facilidade de circulação.
O princípio defendido por Sitte procura retomar o exemplo das bem resolvidas cidades medievais e antigas, onde a relação entre a vdos edifícios, dos espaços livres e da escala humana era mais agradável e induzia ao pinturesco e ao inesperado.
Participa também do juri de diversos concursos internacionais de urbanismo, juntamente com Baumeister e Stübben. Em 1903, poude falecer, lança juntamente com Theodor Goecke a revista Der Städtebau ( A construção urbana).
O pensamento de Sitte inaugura uma corrente independente dentro dessa nova ciência, e sua argumentação conseguirá influencidas concepções de caráter culturalista que se elaborarão posteriormente. Além dos alemães Karl Henrici, Theodor Fischer, TheodorFelix Gemzer, Cornelius Gurlitt e Albert Brinckmann, as idéias de Sitte serão predominantes nos trabalhos dos ingleses RaymondBarry Parker, do irlandês Patrick Geddes, dos franceses Marcel Poëte, Émile Magne, Gaston Bardet e de muitos outros.