document

9
5/19/2018 www.revispsi.uerj.br_v7n1_artigos_html_v7n1a02.pdf-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/wwwrevispsiuerjbrv7n1artigoshtmlv7n1a02pdf 1/9 2/9/2014 www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm http://www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm 1/9 ARTIGOS  Movimento institucionalista: principais abordagens  Institutionalist Movement: main approaches  William Cesar Castilho Pereira  * Professor Adjunto III na PUC Minas. Professor do Curso de Mestrado em Psicologia do Instituto Santo Tomás de Aquino - ISTA e do Instituto Santo Inácio - ISI. Endereço para correspondência  RESUMO O presente artigo tem como objetivo explicitar as bases das experiências abarcadas pelo termo  “Movimento Institucionalista”, passando pela definição do c onceito de instituição e por discussões relativas ao processo de institucionalização. Por fim, analisam-se duas das diversas correntes incluídas no Movimento Institucionalista: a Análise Institucional ou Socioanálise e a Sociopsicanálise. Palavras-chave: Movimento institucionalista, Análise institucional, Sóciopsicanálise, Psicanálise, Materialismo histórico. ABSTRACT The present article has the goal of explaining the theoretical basis of experiences underlying the term “Institutionalist Movement”. It starts discussing the concept of “institution” and the related process of institutionalization. Finally it analyses two of the several trends of this Movement:  “Institutional Analysis” or “Social-Analysis” and “Social- Psyc hoanalysis”. Keywords: Institutionalist Movement, Institutional Analysis, Social-Psychoanalysis, Psychoanalysis, Historical Materialism.  Movimento Institucionalista: principais abordagens O termo “movimento institucionalista” define uma série de teorias, práticas e experiências que têm como premissa a autogestão e a auto-análise 1 , objetivando impulsionar experiências coletivas

Upload: vvendellfreitas

Post on 09-Oct-2015

15 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 2/9/2014 www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm

    http://www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm 1/9

    ARTIGOS

    Movimento institucionalista: principais abordagens

    Institutionalist Movement: main approaches

    William Cesar Castilho Pereira *

    Professor Adjunto III na PUC Minas. Professor do Curso de Mestrado em Psicologia do InstitutoSanto Toms de Aquino - ISTA e do Instituto Santo Incio - ISI.

    Endereo para correspondncia

    RESUMO

    O presente artigo tem como objetivo explicitar as bases das experincias abarcadas pelo termoMovimento Institucionalista, passando pela definio do conceito de instituio e por discussesrelativas ao processo de institucionalizao. Por fim, analisam-se duas das diversas correntesincludas no Movimento Institucionalista: a Anlise Institucional ou Socioanlise e aSociopsicanlise.

    Palavras-chave: Movimento institucionalista, Anlise institucional, Sciopsicanlise, Psicanlise,Materialismo histrico.

    ABSTRACT

    The present article has the goal of explaining the theoretical basis of experiences underlying theterm Institutionalist Movement. It starts discussing the concept of institution and the relatedprocess of institutionalization. Finally it analyses two of the several trends of this Movement:Institutional Analysis or Social-Analysis and Social- Psychoanalysis.

    Keywords: Institutionalist Movement, Institutional Analysis, Social-Psychoanalysis,Psychoanalysis, Historical Materialism.

    Movimento Institucionalista: principais abordagens

    O termo movimento institucionalista define uma srie de teorias, prticas e experincias que tm

    como premissa a autogesto e a auto-anlise 1, objetivando impulsionar experincias coletivas

  • 2/9/2014 www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm

    http://www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm 2/9

    criadoras de novos saberes (BAREMBLITT, 1992). Podemos citar: anlise institucional, pedagogiainstitucional, psiquiatria democrtica, sociopsicanlise, psicossociologia, esquizoanlise, sociologiaclnica, grupo operativo, educao popular e outros.

    Ao invs de manter uma lgica identitria, esses movimentos buscam a lgica da diferena,procurando desencadear rupturas objetivas e subjetivas em modos coagulados de experinciasinstitucionais, contrapondo alienao a autonomia e a expresso da alteridade. No se trata dopoder constitudo e vertical, mas da concepo relacional do poder, que entende que o mesmo seexerce por relaes de foras, redes que se instauram em um espao com multiplicidade de pontosde resistncia. A concepo relacional do poder significa tambm um poder difuso, sem lcusprivilegiado, como o Estado ou as classes dominantes. As formas de dominao no so naturaisnem contratuais, mas construdas como estratgias sobre a ao dos outros, e determinadashistoricamente (FOUCAULT, 1990, p. 29). Assim, novos atores, antes excludos, emergem nocenrio da vida comunitria. Diferentes espaos so criados e ganham nova ordem de significados.

    O que instituio?

    O conceito de instituio, que acompanha a sociologia desde o seu nascedouro, encontra abrigoem diferentes correntes, no somente neste campo disciplinar como em outros, tais como aantropologia, as cincias polticas e a filosofia e, mesmo no interior desses campos, tem sidoempregado em sentidos muitos diversos, em aportes tericos os mais distintos.

    No se pretendendo neste artigo esgotar a discusso sobre o tal conceito, tomar-se- aqui, comoponto de partida para a discusso que se empreende, a concepo de G. Baremblitt, que, deforma concisa e clara, aponta que

    as instituies so lgicas, so rvores de composies lgicas que, segundo a formae o grau de formalizao que adotem, podem ser leis, podem ser normas e, quandono esto enunciadas de maneira manifesta, podem ser pautas, regularidades decomportamentos(BAREMBLITT, 1992, p.27).

    As instituies so instncias de saber que permitem a todo tempo recompor as relaes sociais,organizar espaos e recortar limites. A despeito de sua forma virtual, imaginria e simblica, noesto desvinculadas da prtica social. Cada sociedade, segundo o modelo infraestrutural a queobedece, cria um tipo de instituio, que ser mantida e sustentada em todos os nveis, doEstado famlia, Igreja, escola, relaes de trabalho, sistema jurdico, etc.

    Quando h uma prevalncia do institudo, as instituies e seus estabelecimentos capturam osprocessos de subjetivao singulares, impondo-lhes seu prprio modelo atravs da centralidade dopoder, do saber, do dinheiro, do prestgio, da disseminao da culpa. Por outro lado, quando asforas instituintes emergem, tem-se a possibilidade da produo de novos agenciamentos, novascomposies e arranjos prprios de subjetividades livres e desejantes.

    Por que nos institumos? Essa uma lei geral, presente em qualquer processo civilizatrio.Acontece que ns, humanos, somos ruptura, salto da natureza para a cultura. Somos, sim,animais, mas animais polticos - zoon politikon -, tendo que criar as Leis da polis. O animal, atravsdo instinto, obedece integralmente relojoaria csmica. Segundo a concepo de sujeito daSociopsicanlise, tributria da psicanlise freudiana, a cultura um esforo humano para lanarpontes sobre o abismo. preciso produzir a partir da falta. Busca-se, pelo trabalho e pelalinguagem, organizar o mundo social, humano e a natureza. Esse trabalho de criao emetamorfose lingstica ocorreu com a sexualidade humana, que regida pela pulso. O objetivoda pulso suprimir o estado de tenso que reina na fonte pulsional, o inconsciente. A pulso notem objeto fixo, como os instintos. Os objetos pulsionais tm de ser encontrados. A pulso notraz, em si mesma, uma harmoniosa garantia de ordem. Para que o desejo possa servir espciehumana e ao esforo civilizatrio, ele precisa ser institucionalizado. O dipo - descoberta nuclearde Freud - a gramtica do desejo e da lei que constitui relaes de parentesco e possibilidadesde aliana entre os grupos humanos. Assim, em todas as instituies presenciamos osatravessamentos edpicos com seus inevitveis sintomas: independncia e dependncia, liberdade

  • 2/9/2014 www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm

    http://www.revispsi.uerj.br/v7n1/artigos/html/v7n1a02.htm 3/9

    e recalcamento, conscincia e alienao.

    Os seres falantes criam as instituies, visando diminuio do estado de desamparo, inerente condio humana. Espera-se que as instituies criem estruturas razoveis de apoio paraapaziguar as sensaes de caos absoluto e destrutividade das relaes. As grandes formaesculturais tm como funo proporcionar, num mundo feito de linguagem, estruturas de apoio paraesses seres desgarrados da natureza.

    Quando a estrutura institucional pe-se a servio no do desejo, mas de privilgios, antiproduoe iniqidades, ela degrada-se, perde seu sentido original e transforma-se num instrumentodestruidor de liberdades democrticas. A instituio desvirtuada de seu propsito trabalhar parao avesso da liberdade: a servido. As grandes instituies e organizaes geralmente temem aunio dos participantes, percebendo-os como possvel fora de resistncia. As fantasiasinconscientes institucionais acreditam que a unio entre os membros pode destruir a instituio.Isso freqente em instituies totais e constitudas de autoridades despticas. A imposiounilateral de normas rgidas pode sacrificar, em nome de uma identidade narcisista, a prpria razode ser comunitria, que so as pessoas com seus desejos.

    A trama dialtica entre instituinte, institudo e de institucionalizao faz com que ela sejarealidade inacabada, projeto em construo. O instituinte no deve ser pensado como fora queresulta em institudo, mas como relao de foras permanente, que comporta tanto o poder comoas singularidades de resistncia e produo de novos sentidos. Nas bordas do espao institudo,debate-se o espao instituinte, no previsvel e inexato. Por isso, a instituio no pode sercompreendida somente como algo conservador, sem movimento contrrio, face do institudo. Oinstituinte sobrevive encoberto no seio de toda instituio atravs de seu germe transformador, odesejo, iceberg do qual s vemos a ponta aguda, cuja parte submersa uma potncia energtica.

    H nas instituies silncios impostos e conscincias caladas, em que a autoridade determina ascondies e os parmetros da comunicao. O rompimento desse silncio contribui para odesmoronamento de restries, obstculos que vem tona e podem tornar-se reveladores daestrutura institucional e daquilo que chamamos no saber, no sentido do desconhecido, docensurado pela fora violenta do institudo.

    Basicamente, as instituies funcionam sob a heterogesto, ou seja, geridos por outrem, por umgrande chefe. Ao contrrio, o movimento institucionalista busca princpios bsicos de autogestoe auto-anlise. O axioma fundamental da autogesto a igualdade de direito e de desejo. Cr-sena autonomia dos grupos, calcada na participao, no saber, na experincia particular,estabelecendo assim formas prprias de se manter, dirigir, criticar (auto-anlise). O trabalhoautogestivo acompanhado do prazer coletivo da criao, sem patro e capataz que gozamsozinhos e narcisicamente. O sistema de autogesto implica opo poltica e escolha livre dosatores sociais, mudana radical das relaes de poder, saber, prazer e prestgio. Portanto, no setrata simplesmente de destruir o poder centralizado, mas de resgat-lo para os grupos. No seentende o sistema autogestivo como um lugar onde a lei esteja ausente. A lei nesse sistematambm autogerida, visa ao direito de desejar. Ela a grande avalista do desejo, no podendoser entendida no sentido de coibir: ao contrrio, ela a garantidora da participao dentro dosgrupos - a lei tomada como dispositivo poltico.

    Na histria dos grupos populares no Brasil, esses iderios estiveram sempre presentes, ora deforma indizvel, ora visvel. Essa potncia jamais necessitou de agncias clssicas ou de umsuposto saber a conferir-lhe autoridade para deflagrar movimentos