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ISSN 0798 1015 HOME Revista ESPACIOS ! ÍNDICES ! A LOS AUTORES ! Vol. 38 (Nº 06) Año 2017. Pág. 4 Proposta conceitual da confiança e do comprometimento como eixos ordenadores dos estados de redes Conceptual proposal of trust and commitment as axes computers network States Nilson César BERTÓLI 1; Ernesto Michelangelo GIGLIO 2; Gabriela BELTRAME 3; Felipe da Silva RAVANELLO 4 Recibido: 17/08/16 • Aprobado: 22/09/2016 Conteúdo 1. Introdução 2. Base teórica 3. Método 4. Análise dos resultados 5. Considerações finais Referências RESUMO: O objetivo do trabalho é apresentar e defender a proposta conceitual de que as categorias confiança e comprometimento são eixos organizadores das configurações das redes e, somadas à categoria governança, caracterizam os estados de redes. Para a coleta de dados foram criados três instrumentos e a análise de conteúdo resultou na sustentação da proposição. As três categorias foram capazes de indicar um estado específico de configuração de cada rede e as categorias confiança e comprometimento apareceram como eixos organizadores dos processos coletivos. O benefício teórico é oferecer um modelo de análise de redes que se distingue das análises históricas ou estruturalistas. Palavras-Chave: Confiança; Comprometimento; Eixos Organizadores. ABSTRACT: The objective of this research is to present and defend the conceptual proposal that the categories trust and commitment are organizing axes of network configurations, and together with the governance category characterized the states of networks. For the fieldwork were created three instruments collection and content analysis resulted in support of the proposition. The three categories were able to indicate a specific status of each network configuration and the categories trust and commitment appeared as organizers axes of collective processes. The theoretical benefit of the work is to provide an analytical model of networks that distinguishes the historical or structuralist analysis. Keyword: Trust; Commitment; Axles Organizers. 1. Introdução

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ISSN 0798 1015

HOME Revista ESPACIOS ! ÍNDICES ! A LOS AUTORES !

Vol. 38 (Nº 06) Año 2017. Pág. 4

Proposta conceitual da confiança e docomprometimento como eixosordenadores dos estados de redesConceptual proposal of trust and commitment as axes computersnetwork StatesNilson César BERTÓLI 1; Ernesto Michelangelo GIGLIO 2; Gabriela BELTRAME 3; Felipe da SilvaRAVANELLO 4

Recibido: 17/08/16 • Aprobado: 22/09/2016

Conteúdo1. Introdução2. Base teórica3. Método4. Análise dos resultados5. Considerações finaisReferências

RESUMO:O objetivo do trabalho é apresentar e defender aproposta conceitual de que as categorias confiança ecomprometimento são eixos organizadores dasconfigurações das redes e, somadas à categoriagovernança, caracterizam os estados de redes. Para acoleta de dados foram criados três instrumentos e aanálise de conteúdo resultou na sustentação daproposição. As três categorias foram capazes de indicarum estado específico de configuração de cada rede e ascategorias confiança e comprometimento apareceramcomo eixos organizadores dos processos coletivos. Obenefício teórico é oferecer um modelo de análise deredes que se distingue das análises históricas ouestruturalistas. Palavras-Chave: Confiança; Comprometimento; EixosOrganizadores.

ABSTRACT:The objective of this research is to present and defendthe conceptual proposal that the categories trust andcommitment are organizing axes of networkconfigurations, and together with the governancecategory characterized the states of networks. For thefieldwork were created three instruments collection andcontent analysis resulted in support of the proposition.The three categories were able to indicate a specificstatus of each network configuration and the categoriestrust and commitment appeared as organizers axes ofcollective processes. The theoretical benefit of the workis to provide an analytical model of networks thatdistinguishes the historical or structuralist analysis. Keyword: Trust; Commitment; Axles Organizers.

1. Introdução

Entre as temáticas do campo de redes, a questão da estrutura, do formato, da organização, dodesenho das redes é uma das mais relevantes, pois tenta encontrar os eixos sob os quais asrelações se organizariam. Segundo Watts (2003), existe uma dinâmica das redes, ocasionadapelas trocas de conhecimento, flutuações do comprometimento e presença de inovações enovas parcerias.O estudo está inserido no campo de questionamentos sobre estrutura, dinâmica, estágios eestados de rede, e eixos ordenadores, surgindo então à proposta de buscar as categorias quecontribuem ou são essenciais à organização das redes. Por motivos detalhados no decorrer dotrabalho, utiliza-se a expressão estados de redes.Entende-se como estados de redes a configuração das relações entre os atores, no sentido deespaço social, em desenhos de sistemas que se modificam continuamente. O eixo pode serentendido como ponto de referência, em que todas as partes se unem a ele; ou como campoenergético, onde as partes orbitam, e vão sendo atraídas não as deixando sair; ou como pontode sustentação, sobre a qual os objetos se ordenam. O trabalho segue mais de perto esteúltimo conceito. A ideia de estados de redes tem como base teórica os argumentos dasociedade em rede, conforme Castells (1999), e os argumentos das organizações em rede,conforme Nohria e Ecles (1992). A base teórica dos constructos de confiança ecomprometimento são as afirmativas de Granovetter (1985). Além desses dois construtosbásicos, elegeram-se a assimetria e a governança como as categorias que caracterizam oestado de rede.Como trabalho de campo, escolheram-se negócios da agricultura da região sul do Brasil,principalmente banana e uva. A proposição orientadora, seguindo afirmativas de Grandori eSoda (1995) e Larson (1992), é que a confiança e o comprometimento são eixos organizadoresdos estados de redes. A proposição secundária é que as duas categorias, somadas àgovernança caracterizam, ou configuram, os estados de redes, nas suas manifestações, queincluiriam desde configurações latentes, pouco organizadas, até estados bem organizados dogrupo, com poucos conflitos.O presente trabalho apresenta dois problemas de pesquisa: como se configuram os estados deredes quando se colocam as relações de confiança e comprometimento como eixosorganizadores das redes? As três categorias são capazes de indicar estados de redes?Utilizando os argumentos das relações sociais como pano de fundo para a organização dasredes e considerando o campo de investigação, o objetivo geral do trabalho é investigar apossível interface entre as relações de confiança e comprometimento e os estados de redes,quando as categorias sociais são colocadas como eixos ordenadores essenciais para aconfiguração do estado de uma rede.

2. Base teóricaAs teorias de redes se sustentam em campos do conhecimento como Sociologia, Antropologia,Psicologia e Economia (Tichy, Tushman e Fombrun, 1979). A dominância dos artigos sobreredes, conforme revisões (Tichy, Tushman e Fombrun, 1979; Miles e Snow, 1986, 1992; Giglioe Kwasnicka, 2005), indicam o assunto da ação coletiva. O item inicia, portanto, recuperandoas afirmativas da lógica da ação coletiva. Em seguida, apresentam-se os argumentos daabordagem social de redes, principalmente os conceitos de imersão (Polanyi, Arensberg ePearson, 1957; Granovetter, 1985), confiança e comprometimento; e as afirmativas daabordagem da sociedade em rede, principalmente os conceitos de estrutura social em rede(Castells, 1999).Este trabalho parte do princípio da sociedade em rede, na crença de que é sempre possívelencontrar uma rede a partir de uma organização; e utiliza a afirmativa básica do paradigmasocial-técnico sobre a presença de relações sociais como organizadoras das categorias quedefinem a rede.

2.1 Perspectiva Social de RedesA afirmativa básica deste paradigma é que o comportamento dos atores é influenciado pelasrelações sociais (Granovetter, 1985; UZZI, 1997). Existe um leque de afirmativas que evidenciaa relação social como pano de fundo do comportamento organizacional (Nohria e Ecles, 1992).Para Granovetter (1985) e Uzzi (1997), há indissociabilidade entre fatores sociais eeconômicos. A ideia da imersão social e econômica dos atores na rede, originada edesenvolvida a partir do conceito de embeddedness de Polanyi, Arensberg e Pearson (1957) eGranovetter (1985), está estreitamente vinculada ao tema do oportunismo, isto é, quanto maisimerso e comprometido estiver o ator na rede, menos propenso a se comportar de maneiraoportunista.

2.2 Confiança e ComprometimentoAs categorias confiança e comprometimento estão contidas no conceito de imersão, a qual estádescrita como embeddedness no trabalho de Granovetter (1985). Segundo Granovetter (1985,p.482), “a imersão social caracteriza-se pelas diferentes formas de integração econômica quesão conectadas por certas condições estruturais e institucionais”. Para o autor, a confiança é umsubproduto da imersão social das partes que compartilham uma norma cultural e socialcomum, pois a confiança é valor traçado pelas normas sociais.Neste trabalho, portanto, pretende-se utilizar o conceito de confiança expresso por estar nadependência do outro; e o conceito de comprometimento como a disposição de uma pessoa emparticipar de ações coletivas, sem haver um benefício próprio imediato e sem tirar proveito daconfiança depositada (Granovetter, 1985, p. 491). Afirma-se que a confiança e ocomprometimento são manifestações complementares de um relacionamento, ou seja, quandoa confiança está presente (o ator A mostra sinais de confiança no ator B), a reciprocidade seriao comprometimento (o ator B ajuda o ator A e não se aproveita de sua confiança). Ocorrendo areciprocidade, o minissistema se realimenta.Como essas categorias não são diretamente observáveis, a partir deste ponto a confiança serádenominada de Sinais de Confiança, e a categoria comprometimento de Sinais deComprometimento.

2.3 GovernançaNa manutenção da existência de um grupo surgem regras que têm a dupla finalidade deincentivar a permanência dos participantes e controlar seu comportamento (Moreno, 1972). Naárea de redes, quando existe a consciência da interdependência e a evidência das assimetrias,é essencial criar regras de incentivo para as ações coletivas e de controle dos comportamentosoportunistas. Nesse sentido a palavra governança foi aqui utilizada, embora a expressão tenhaoutros sentidos na Administração. O conceito de governança como regras de incentivo econtrole remete aos relacionamentos entre as partes, pois é possível investigar o nascimentodas regras, sua função específica naquele grupo, sua manutenção e as consequênciasdecorrentes das infrações.Conforme Grandori e Soda (1995), a governança é formal e informal. A formal se refere àsregras explicitadas em documentos, como contratos e atas, mais frequentes em redes verticais,nas quais as organizações estão em diferentes pontos de uma cadeia produtiva, comcapacidades e recursos que exigem proteção. A governança informal se refere às regrasimplícitas presentes nas relações sociais, como não trair a confiança. A governança informalestá mais presente em redes horizontais de pequenas organizações, em que o comportamentode um líder (na ética) torna-se exemplo a ser seguido, ou no receio de um ator em comportar-se de maneira oportunista, traindo a confiança dos colegas.

Como o presente estudo valoriza o relacionamento social, pretende-se investigar com maiorprofundidade a governança informal das redes. Por não ser essa categoria diretamenteobservável, a partir deste ponto a governança será denominada de SFG (Sinais e Forma deGovernança).

2.4 Estados de Redes e Eixos OrganizadoresComo nas discussões sobre redes aceitam-se os princípios de incerteza, imprevisibilidade edinâmica das relações (Chandler e Weiland, 2010; Sheth e Parvatiyar, 2000), surge a exigênciade os pesquisadores criarem estruturas, ou formas que incluam essa mutabilidade (Parente,2004). As formas mutáveis são o que se está chamando de estados de redes.Neste estudo segue-se o pensamento da busca das categorias que configuram as redes. Paraconfiguração dá-se o nome de estados de redes, indicando que a palavra estados significamutabilidade, portanto, valoriza e busca uma configuração, sem implicitamente reportar a umespaço geográfico e sem a obrigatoriedade do recurso do historicismo; e aceita a mutabilidadedo estado encontrado. Como consequência metodológica, ao se apresentar a configuração deuma rede de organizações, está se mostrando uma fotografia instantânea criada a partir dacoleta. Qualquer mudança do ângulo e das condições da foto (como utilizar outro referencialteórico, ou modificar as categorias envolvidas) resultaria em uma foto bem diferente.A ideia do eixo organizador é a do ponto de atração de um fenômeno. Significa que ascategorias sinais de confiança e sinais de comprometimento podem ser descritas como eixos,tendo capacidade de explicar as variações da configuração da rede, conforme as interfaces comoutras categorias. A ideia está próxima de um desenho de cadeias de DNA (confiança ecomprometimento seriam os dois eixos), e a partir deles as demais categorias se organizam,em diferentes estados de configurações. O desenho de um átomo seria outra metáfora da ideiade eixo (as camadas do átomo seriam o estado de rede) e a confiança e comprometimentoseriam o núcleo do átomo. Há distintas metáforas: o eixo como ponto de referência, pelo qualtodos os processos passam; o eixo como campo energético, no qual as coisas orbitam; e o eixocomo ponto de sustentação, em que as partes vão se construindo e se organizando.Existem diversos conceitos sobre eixos entre as várias Ciências, como na Química (De Andradeet al., 2003), com a afirmativa de ser ela a ciência eixo; na Psicologia (Pinho et al., 2013), coma afirmativa de que rede social e trabalho são eixos para a saúde mental; (Goulart, 2007)afirma que na educação a alfabetização é vista como eixo orientador no processo ensino-aprendizagem; em Economia (Pinto, 2011) cita-se a crise mundial como eixo nos estudos daeconomia brasileira. Em resumo, eixo organizador é visto como ícone central, e os distintosaspectos estão apoiados no eixo do objeto investigado.

2.5 Proposta do Modelo de Estados de RedesNeste item apresenta-se a proposta sobre a investigação dos estados de redes, definidos apartir de três categorias. Os critérios para a escolha das categorias foram os seguintes: (A) Sãoas mais frequentemente citadas nos artigos acadêmicos; (B) Consistentemente são colocadascomo eixos organizadores da estrutura e dinâmica das redes; (C) São as que mais indicamtrocas, reciprocidades e relações entre partes. Sobre os estados de redes, conforme explicitado,procurou-se selecionar preferencialmente aquelas que indicam relações entre partes. Assim,um estado de rede seria caracterizado pelo conjunto das categorias eixo, que são os sinais deconfiança e os sinais de comprometimento, e pela categoria governança (SFG).O Quadro 1 apresenta as categorias. Na segunda coluna está o resumo do conceito teóricodominante, conforme a revisão bibliográfica. Na terceira coluna indica-se o conteúdo a serobservado, a partir do conceito incluído na segunda coluna. Na quarta coluna apresentam-seindicadores, criados a partir de exemplos das pesquisas da revisão bibliográfica e dasinferências do pesquisador. As sugestões não pretendem esgotar a lista dos indicadores, mas

apenas mostrar a linha geral de questionamento. O quadro por si só é uma contribuiçãorelevante do trabalho, pois pretende sistematizar e agrupar as categorias dispersas naliteratura. Entende-se que o esforço é uma contribuição metodológica do trabalho, pois não seencontraram similares na literatura brasileira e internacional.

Quadro 1 - Conjunto de categorias, com seus indicadores, que caracterizam o estado de organização de uma Rede.

CategoriaConceito

dominanteConteúdo a ser

observadoIndicadores

Sinais decomprometimento

Colocar-se àdisposição paraações coletivas; nãotirar proveito dadependência dosoutros.

Atitudes e ações paraatingir objetivoscoletivos, ou ajudaroutro ator, mesmoque pouco ou nada seganhe.

1. Participar regularmente de reuniõese decisões.

2. Ajudar o outro, mesmo sembenefício próprio imediato.

3. Assumir responsabilidades de açõesconjuntas.

4. Percepção entre os atores quanto aocumprimento dos acordos.

5. Existência de promessas decontinuidade de relações entre osparceiros.

6. Comportamentos que evidenciam adisposição para continuidade dosrelacionamentos.

Sinais de confiança

Colocar-se nadependência dooutro.

Atitudes e ações nasquais o sujeito seexpõe ao coletivo, oufica na dependênciado outro, ou dispõeseus recursos semrecorrer amecanismos formaisde controle.

1. Expor suas fraquezas e dependênciasaos demais.

2. Assumir responsabilidade cujaexecução depende de outro, confiandoque esse outro cumprirá.

3. Dispor seus recursos, de qualquernatureza, para serem usados poroutros, sem necessidade desalvaguardas.

4. Comportamentos que indicam que oator segue as regras e metasestabelecidas na rede.

5. Comportamentos e atitudes quemostram que os atores confiam naintegridade das pessoas que fazemparte da rede.

Natureza e forma desolução dasassimetrias

Diferenças decapacidades erecursos e assoluções pararesolver os conflitosoriginados.

Diferenças dequalquer naturezaque sejam relevantesna organização darede e as formas desolução.

1. Quais as diferenças mais visíveisentre os participantes.

2. Diferença de recursos investidos.

3. Diferença de objetivos.

4. Diferença de valores e ética.

5. Diferença de domínio tecnológico.

6. Conflitos, problemas que surgem a

partir das assimetrias.

7. Formas de solução dos conflitosoriginados pelas assimetrias.

Sinais e formas degovernança

Regras de proteçãode recursos e decontrole docomportamento.

São formais ouinformais.

Toda e qualquer regraexplícita ou implícitaque imponharestrições aocomportamento eproteja os recursos,sejam coletivos, ouindividuais.

1. Regras sobre admissão e exclusão deatores do grupo mais fechado.

2. Regras sobre penalidades.

3. Regras sobre hierarquia, liderança efuncionamento.

4. Controle por autoridade ou reputação(de um ator mais poderoso).

5. Controles sociais (existência deblogs, sites comunitários e outros, cominformações sobre os participantes).

6. Regras sobre igualdade entre atores.

Fonte: elaborado pelos autores.

Para caracterizar uma situação complexa e sistêmica, ou seja, sem exigência de estabelecerrelações causais estritas, construiu-se a Figura 1, tomando-a como desenho básico para oplanejamento da pesquisa. A Figura 1 apresenta a unidade estrutural de análise, a tríade deatores, ligados por setas bidirecionais, que indicam interconexão, interatividade,interdependência e interinfluência; e as unidades dinâmicas de análise, ou seja, os conteúdostransacionados, conforme as categorias selecionadas. A escolha da tríade como unidade de análise segue as afirmativas de Simmel (1950), Burt(1976) e Krackhardt (1996), já que ela possibilita análises, tais como formação de subgrupos(dois contra um) impossíveis na análise diádica. Significa, na prática da pesquisa, que é precisocoletar dados de pelo menos três atores que mantêm uma ligação mais forte e rotineira.Sobre as unidades dinâmicas de análise, a proposição orientadora é que as duas categoriassociais, sinais de confiança e sinais de comprometimento, atuam como eixos atratores dascategorias que caracterizam os estados de redes. Para este artigo selecionou-se a categoriagovernança (SFG). A proposição foi construída a partir das afirmativas das perspectivas dasociedade em rede e da perspectiva social de redes (Castellls, 1999; Nohria e Ecles, 1992;Granovetter, 1985), especialmente a afirmativa sobre o pano de fundo social presente nasredes (Granovetter, 1985).

Figura 1 - Proposta de modelo de estados de redes, a partir da tríade e das categorias que são os eixos organizadores

Fonte: elaborado pelos autores.

O modelo sugere que há sempre um estado de rede possível de ser captado (ou desenhado, oupercebido) a partir da investigação da presença/ausência das categorias que o definem, cujosconteúdos estão em fluxos entre os atores. Os eventos críticos, que ocasionaram mudanças narede, podem ser considerados dando apoio aos diferentes estados da mesma rede.Resumindo o caminho trilhado, a proposta é que os sinais de confiança e os sinais decomprometimento são eixos organizadores dos estados de redes, e que essas duas categoriassomadas à SFG caracterizam o estado de rede.

3. MétodoO estudo utilizou múltiplas fontes de coleta, conforme defendido por Yin (2010), como uma dasmaneiras competentes na explicação de fenômenos que se manifestam de variadas formas.Para a investigação escolheu-se a região sul do Brasil, mais especificamente o Norte do Estadodo Paraná, nos ramos de negócios da banana e da uva, por se tratar de um local com grandeconcentração de organizações do agronegócio nos setores de viticultura e de bananicultura epela importância social e econômica na região, pois incluem várias organizações familiares.A pesquisa foi desenvolvida com atores locais, iniciando pelos atores das duas associaçõesescolhidas, capazes de responder sobre a presença das categorias do problema de pesquisa, eposteriormente incluindo outros sujeitos. Conforme o instrumento utilizado, foram definidossujeitos específicos. Para as entrevistas os sujeitos são os líderes, atores antigos e aindaparticipantes dos grupos, pessoas que se destacam no negócio, técnicos de entidades de apoio;para os questionários, são os associados e não associados, fornecedores, secretários(as) dasassociações ou sindicatos; para as observações e acompanhamento são todos os sujeitos queestiverem nas reuniões, considerando as regras de tamanho e homogeneidade do grupo.Para a coleta de dados de fontes primárias foram construídos três instrumentos. O primeiro

instrumento é um roteiro para entrevista com questões abertas, para ser aplicado em atores demaior relevo, como líderes de grupo e atores mais antigos. O segundo é um questionário comafirmativas numa escala do tipo Likert, objetivando entrevistar o máximo possível de atores dosgrupos. O terceiro é um roteiro de acompanhamento, para ser aplicado nas reuniões dasassociações.A coleta deu-se por meio de entrevistas individuais, marcadas a partir dos dados cadastrais dosagricultores, os quais já se encontravam disponíveis para os autores. A quantidade deentrevistas seguiu o critério de saturação, ou seja, a coleta terminou quando os dadosconvergiram de tal forma que novas entrevistas não originariam novos dados.O acompanhamento ocorreu por meio de participação em reuniões nos dois grupos (bananeirose viticultores) e foi utilizado o critério de exaustão para o término da coleta. Os dados de fontessecundárias foram coletados nas organizações locais, como sindicatos, secretarias do governo,organizações de apoio, como a Emater, bibliotecas e jornais locais.Para a análise dos dados das entrevistas, dos acompanhamentos e dos documentos utilizou-seo conjunto de técnicas denominado análise de conteúdo (BARDIN, 2008). Para os dados dequestionários realizou-se uma análise de frequências e grupamentos.

4. Análise dos resultados

4.1 Rede da UvaO negócio da uva iniciou em 1992, no município de Bandeirantes (PR), localizado no sul doBrasil, com 13 agricultores unidos pela vontade de ampliar o pequeno negócio, surgindo anecessidade de trabalhar em conjunto, pois estavam diante de um mercado cada vez maiscompetitivo e inovador.A análise das entrevistas indicou uma convergência expressiva nas categorias sociaisinvestigadas neste trabalho. Amizade, união, companheirismo, dedicação, confiança ecomprometimento foram elencados como elementos essenciais para a existência do grupo.O mapa perceptual das relações entre os atores da rede da uva, gerado pelo software Ucinet, émostrado na Figura 2. Conforme se verifica, existem alta densidade e dois líderes, que são ossujeitos 3 e 8 das entrevistas, sendo os mais indicados da rede.

Figura 2 - Mapa Perceptual das Relações dos Viticultores de BandeirantesFonte: elaborado pelos autores.

Nos questionários, foram obtidas respostas de 30 sujeitos, de um total de 70 produtores. Osresultados estão apresentados na Figura 3, apenas com as respostas de concordância, pois elasoferecem a base de sustentação, ou não das proposições. Nas linhas encontram-se os totais derespostas de cada sujeito em cada categoria. Para o sujeito 1, o número 7/7 na categoria sinaisde comprometimento indica que das sete afirmativas sobre a categoria, o sujeito escolheu assete com a afirmativa A - “concordo fortemente”, ou a afirmativa B - “concordo”. Portanto, como resultado de 7/7 se afirma que para o sujeito essa categoria tem forte presença.As somas dos totais de respostas dos 30 sujeitos foram organizadas por categorias eapresentadas em resultados de frequência e percentual da soma das respostas A e B e somenteda resposta A. Assim, observa-se um grau de concordância mais forte do grupo sobre cadacategoria. Na coluna da categoria sinais de comprometimento, quando somadas as respostas Ae B, obtém-se um percentual de 99,5% e frequência de 209 respostas de concordância A e Bde um total de 210. Quando somadas apenas as respostas A, obtém-se um percentual de 74%e frequência de 155 respostas de concordância mais forte sobre um total de 210. O que indicaque mesmo sendo consideradas apenas as respostas A de concordância mais forte existemsinais expressivos da presença e importância dessa categoria.

Figura 3 - Resultados das respostas de concordância dos sujeitos do grupo da uva.

Fonte: elaborada pelos autores.Os dados sustentam as proposições de que as categorias confiança e comprometimento são oseixos organizadores do grupo dos viticultores, e que essas duas categorias, ao lado dacategoria de governança, caracterizam o estado de configuração da rede, tendo umagovernança bem estabelecida e resolvida. Portanto, esse negócio se configura em um desenhode rede que se chamaria de amadurecimento ou uma rede mais desenvolvida, com problemasresolvidos em suas diversas manifestações.

4.2 Rede da BananaO negócio da banana iniciou-se em 1992, quando a Emater apresentou uma proposta aospequenos produtores do município de Andirá (PR), com o objetivo de gerar nova fonte derenda. No início se reuniram 50 produtores, especialmente aqueles com perfil associativista eque se enquadravam na agricultura familiar. Durante 13 anos (1994 a 2007), a rede seorganizou informalmente, chegando a ter 115 agricultores. Em 2008 foi fundada a Associaçãodos Produtores de Banana de Andirá e Região, Apbana, que começou com 40 associados.Os dados documentais e relatos informais indicaram que existem problemas a serem resolvidosentre os atores, como vender os produtos de forma mais justa e organizada. As entrevistasconvergiram de forma clara (e rápida, com apenas 4 delas já atingindo o critério de exaustão)sobre a importância das categorias sociais investigadas neste trabalho. A união, troca deinformação, companheirismo, amizade, confiança e comprometimento foram elencados comoelementos imprescindíveis para a existência do grupo.O mapa perceptual das relações entre os atores da rede da banana, gerado pelo softwareUcinet, é mostrado na Figura 4. Conforme se verifica, a densidade é menor quando comparadaà rede dos viticultores, mostrando a presença de subgrupos, um ator isolado, com menosligações, e a existência de dois líderes, que são os sujeitos 1 e 4 das entrevistas, que servemcomo ligação entre os dois subgrupos da rede.

Figura 4 - Mapa Perceptual das Relações dos Bananicultores de Andirá

Fonte: elaborado pelos autores.

Foram coletados dados de questionários de 20 sujeitos bananicultores, de um total aproximado

de 50 produtores. Os resultados estão apresentados na Figura 5, apenas com as respostas deconcordância, pois elas oferecem a base de sustentação do trabalho, conforme já se explicou natabela anterior.Na coluna da categoria sinais de comprometimento, quando somadas as respostas A e Bobtêm-se um percentual de 90% e frequência de 126 respostas de concordância A e B de umtotal de 140. Porém, quando somadas apenas as respostas A, obtém-se um percentual de 77%e frequência de 108 respostas de concordância mais forte sobre um total de 140. O que indicaque mesmo sendo consideradas apenas as respostas A de concordância mais forte existemsinais fortes da presença e relevância dessa categoria.

Figura 5 - Resultados das respostas de concordância dos sujeitos do grupo da banana.

Fonte: elaborado pelos autores.

Essa rede apresenta a característica que se chama de crescimento, ou uma rede que estábuscando superar dificuldades financeiras, mas que mantém um bom vínculo social entre seus

membros. A análise dos dados dos acompanhamentos segue a mesma linha conclusiva. União,amizade, confiança e comprometimento se destacaram como significativos elementos entre ossujeitos. Como conclusão dos acompanhamentos com os bananicultores, os dados sustentam asproposições de que as categorias confiança e comprometimento são os eixos organizadores dogrupo, e que essas duas categorias, somadas à categoria de governança, caracterizam o estadode configuração dessa rede. Sobre o estado de configuração da rede, ela se caracteriza porcerta desorganização, o que se chamar de uma rede com problemas a serem resolvidos. Aindaprecisa estabelecer certo controle de venda dos produtos.

5. Considerações finaisO objetivo do artigo foi apresentar uma proposta conceitual sobre as categorias sinais deconfiança e sinais de comprometimento serem eixos organizadores dos estados de redes.Definiu-se estado de redes como a configuração das relações entre os atores, em desenhos desistemas que se modificam continuamente; sua base é composta pelas duas categorias jácitadas, somadas à categoria dos sinais e formas de governança.Em resposta à proposição orientadora deste trabalho, de que a confiança e o comprometimentosão eixos organizadores dos estados de redes, pode-se afirmar que ela se mantém, poisficaram expressos nos dados coletados os fortes laços sociais nos grupos, que orientam açõescomerciais e técnicas, como na ajuda da colheita de um produtor.Quanto a resposta à proposição secundária, de que as duas categorias já citadas, somadas àgovernança, caracterizam, ou configuram os estados de redes, em suas diversasmanifestações, essa proposição igualmente se sustenta, pois as três categorias foram capazesde mostrar a configuração da rede, não tendo aparecido nos dados outras categorias, comocustos, poder, ou resultados econômicos.Foi desenvolvida uma proposta de um modelo de estado de redes a partir de uma metáforacom a figura de um átomo, conforme apresentado na Figura 1. O modelo sugere que há sempreum estado de rede possível de ser captado a partir das categorias que o definem. As figurasapresentadas foram construídas no software Geogebra, que permite inserir animação naselipses, porém ainda não foi possível alimentar esses movimentos, exatamente na ideia deeixos e dos estados de redes deste trabalho. Quando as categorias centrais são mais fortes (oseixos), as categorias representadas nas elipses teriam que se aproximar mais desse centro,apresentando a ideia de eixo atrator e de configuração do estado da rede. Portanto, mesmosem o movimento entrópico, a ideia do átomo conseguiu representar o eixo e o estado deconfiguração das duas redes.O estado de rede dos viticultores está caracterizado por seu equilíbrio e solução de conflitos,por sua dinâmica bem mesclada de formalidade e informalidade, pela união de objetivos sociaise comerciais que se integram (não há conflitos de interesses) e rituais sociais e religiosos queligam as pessoas de tal maneira que se torna difícil pensar em falta de confiança, ou decomprometimento no grupo. Já o estado de rede dos bananicultores está configurado de umaforma que apresenta certos problemas a serem resolvidos, como a venda da banana sematravessadores, e que essa rede busca superar dificuldades financeiras. Os participantesmantêm um bom vínculo social, considerando os aspectos sociais como o mais relevante para ogrupo.O trabalho contribui para a ampliação dos conhecimentos sobre as bases das redes, ao lançar oconceito de estado de redes, com categorias que expressam predominantemente orelacionamento. A proposta se distingue dos objetivos de estrutura no sentido de posição narede e dos trabalhos de história da rede.Uma proposta para novas pesquisas em redes seria testar o modelo em redes que não fossemdo agronegócio, como comparativo e discussão dos aspectos sociais em redes e mesmo emregiões diferentes, como investigar negócios localizados na zona urbana, usando como campo

de pesquisa as associações de bairros e cooperativas financeiras, entre outros. Haveria apossibilidade de nesses estudos surgirem eixos organizadores e categorias atratoras dosestados de redes.Diante das propostas para futuras pesquisas, deve-se ressaltar que o modelo conceitual dotrabalho sobre estados de redes, categorias sociais e eixos organizadores criou discussões,revisões de afirmativas da literatura, contribuiu com possibilidades metodológicas dedesenvolvimento de instrumentos, cumprindo seu objetivo de investigar as bases das redes.

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1. Doutorando em Administração - Universidade Federal de Santa Maria- UFSM. Email: [email protected]. Doutor em Administração e Professor da Universidade Paulista - UNIP . Email: [email protected]. Mestranda em Administração - Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Email: [email protected]. Mestrando em Administração - Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Email: [email protected]

Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015Vol. 38 (Nº 06) Año 2017

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