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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL
MAURÍCIO PIZZOLATTO BRUSTOLIN
Itajaí (SC), novembro de 2008
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA
CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL
MAURÍCIO PIZZOLATTO BRUSTOLIN
Monografia submetida à Universidade
do Vale do Itajaí – UNIVALI , como
requisito parcial à obtenção do grau
de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Msc. Wanderley Godoy Júnior
Itajaí (SC), novembro de 2008
ii
Meus Agradecimentos:
A Deus, por ter sido um amigo fiel em
todas as horas.
Ao Professor Msc. Wanderley Gody
Júnior por ter me orientado nesse
trabalho.
Aos colegas e amigos que fiz no
período da faculdade.
iii
Este trabalho dedico:
Ao meu pai Valdoci Luiz Brustolin,
minha mãe Marise Pizzolatto Brustolin e
minha irmã Maiara Pizzolatto Brustolin,
pela compreensão e companherismo
nesta fase da minha vida.
iv
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito
da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduando
Maurício Pizzolatto Brustolin , sob o título CONTRATO DE TRABALHO DO
ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL, foi submetida em ___ de
___________ de 2008 à Banca Examinadora composta pelos seguintes
Professores:_____________________________________________________
_______________________________________________________________
e aprovada com a nota ________ (____________).
Itajaí (SC), ____ de ____________ de 2008.
Professor Msc. Wanderley Godoy Junior Orientador e Presidente da Banca
Msc. Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
v
DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total
responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho,
isentando a Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI, a Coordenação do Curso
de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer
responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), ____ de ______________ de 2008.
Maurício Pizzolatto Brustolin Graduando
vi
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
a.C Antes de Cristo
Art. Artigo
CBF Confederação Brasileira de Futebol
CDB Confederação Brasileira de Desportos
CLT. Consolidação das Leis do Trabalho
CND Conselho Nacional de Desportos
STJD Superior Tribunal de Justiça Desportiva de Futebol
§ Parágrafo
vii
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Atleta Amador 1 - Os desportistas de qualquer idade que,
com liberdade, entregam-se à prática de qualquer modalidade sem qualquer
forma de remuneração ou incentivos materiais, ou seja, aqueles que não
recebem nenhuma compensação econômica como conseqüência da prática
esportiva e não têm nenhum outro interesse que não seja o do simples
revigoramento físico, euforia da saúde ou passatempo higiênico.
Atleta não-profissional 2 - São identificados pela
liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo
permitido o recebimento de incentivos materiais e de patrocínio.
Atleta Profissional 3 - É todo aquele que pratica esporte
como profissão, entendida esta como o exercício de um trabalho como meio de
subsistência do seu exercente.
Contrato 4 - É o acordo tácito ou expresso mediante o
qual ajustam as partes pactuantes direitos e obrigações recíprocas.
Contrato de Trabalho 5 - Acordo de vontades, tácito ou
expresso, pelo qual uma pessoa física coloca seus serviços à disposição de
outrem, a serem prestados com pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade
e subordinação ao tomador.
Subordinação Jurídica 6 - É tudo o que o empregador
1 MELO FILHO, Álvaro. Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações. p.44. 2 MELO FILHO, Álvaro. Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações. p.44. 3 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.59. 4 DELGADO, Maurício Godinho. Contrato de Trabalho: caracterização, distinções, efeitos. São Paulo: LTr, 1999. p.15. 5 DELGADO, Maurício Godinho. Contrato de Trabalho: caracterização, distinções, efeitos. p.16. 6 FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de Direito à Sujeição Jurídica. p.137.
viii
determinar ao empregado que esteja dentro dos limites da atividade econômica
da empresa, que não seja crime, não o humilhe e não o coloque em situação
de risco físico.
ix
SUMÁRIO
RESUMO ................................................................................................................ XI
INTRODUÇÃO.....................................................................................................XIII
Capítulo 1 ................................................................................................................ 15
O FUTEBOL COMO PROFISSÃO ...........................................................................15
1.1 HISTÓRICO ..................................................................................................... 15
1.1.1 SURGIMENTO DO FUTEBOL NO MUNDO ................................................... 15
1.1.2 SURGIMENTO DO FUTEBOL NO BRASIL ..................................................... 22
1.2 HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO DESPORTIVA NO BRASIL ............................... 25
1.3 DESTAQUE DA LEI 9.615/98 (LEI PELÉ) E SUAS ALTERAÇÕES ....................... 33
1.4 DISTINÇÃO ENTRE ATLETA PROFISSIONAL, NÃO PROFISSIONAL E AMADOR ............................................................................................................. 42
Capítulo 2 .............................................................................................................. 444
CONTRATO DE TRABALHO NA CLT ......................................................................44
2.1 CONCEITOS DE CONTRATO DE TRABALHO ................................................. 44
2.2 ELEMENTOS DO CONTRATO DE TRABALHO .................................................46
2.3 A SUBORDINAÇÃO JURÍDICA ...................................................................... 57
Capítulo 3 ................................................................................................................ 61
CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL ..................61
3.1 ATLETAS PROFISSIONAIS DE FUTEBOL ........................................................... 61
3.2 TERMINAÇÃO DO CONTRATO E PASSE LIVRE ............................................. 83
3.3 JURISPRUDÊNCIAS .........................................................................................84
x
CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................91
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 96
xi
RESUMO
A presente monografia trata do Contrato de Trabalho do
Atleta Profissional de Futebol. O homem está interligado e correlacionado ao
esporte desde os primatas, quando fugiam de animais predadores, lutavam por
áreas e regiões e disputavam domínios no início das coletividades. Acredita-se
que depois da alimentação, a mais antiga forma de atividade humana é a que
hoje se conhece por esporte. Da mesma forma que a prática de esportes, o
futebol não tem registros exatos em sua origem, sendo o seu surgimento muito
discutido. Historiadores, na busca da origem do futebol, mencionam jogos com
bola de bambu nos quais se usavam pés e mãos desde 5.000 a.C, e 4.500 a.C.
No Brasil o surgimento do futebol é atribuído a Charles Muller, brasileiro,
descendente de ingleses, na Inglaterra onde conheceu o foot-ball, por ele se
encantou e praticou, De volta ao Brasil em 1984, trouxe consigo bolas,
uniformes e chuteiras. A primeira lei que tratou o regulamento no Brasil, foi
editada em 1941, na ditadura de Getúlio Vargas. Essa Lei era uma cópia do
modelo nazista que existia na época, quando o esporte era uma maneira de ser
aferir a hegemonia de uma raça sobre a outra. Com o passar dos tempos, com
a chegada da Nova República, o Brasil começou a eliminar a defasagem com o
renovado conceito de esporte, já aceito nos países de grau civilizatório. Em
1993 foi sancionada a Lei 8.672, chamada de Lei Zico, onde verificou-se no
corpo da nova lei, toda uma preocupação com o homem. Passado cinco anos,
foi sancionada a Lei Pelé (Lei 9.6015/ 1998) onde trouxe alterações,
principalmente com a extinção do passe. Trás a distinção entre atleta
profissional, não-profissional e amador. No segundo capítulo, conceitos de
contrato de trabalho na CLT (consolidação das leis do trabalho) e subordinação
jurídica. Em fim o contrato de trabalho do atleta profissional de futebol. Onde o
ordenamento jurídico destaca regimes diferenciados para alguns empregados,
em razão do tipo de atividade profissional que desempenham ou da condição
que ostentam. Estes contratos especiais regulam as razões de trabalho de
atletas profissionais. Destaca-se a Lei nº. 9.615/98 que “a atividade do atleta
profissional, de todas as modalidades desportivas, é caracterizada por
remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com entidade
xii
de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter,
obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento,
rompimento ou rescisão contratual”.
xiii
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objeto o Contrato de
Trabalho do Atleta Profissional de Futebol e, como objetivos:institucional é
produzir uma monografia para obtenção do grau de bacharel em Direito, pela
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI; abordando o contrato de trabalho do
atleta profissional no mundo do futebol.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na
Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de
Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na
presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
A pesquisa foi desenvolvida tendo como base as
seguintes hipóteses:
a) existem diferenças entre atleta profissional, atleta não-
profissional e atleta amador;
b) o instituto do passe ainda existe no contrato de
trabalho do atleta profissional de futebol;
c) o contrato de trabalho do atleta profissional de futebol
apresenta particularidades diferentes do contrato de trabalho previsto da CLT.
O trabalho foi dividido em três capítulos. O primeiro com o
histórico do surgimento do futebol no mundo e no Brasil, histórico da legislação
desportiva no Brasil, destaques da Lei Pelé e suas alterações e distinção entre
atleta profissional, atleta não-profissional e amador.
O segundo, tratando do Contrato de Trabalho na CLT.
(Consolidação das Leis do Trabalho) e a subordinação jurídica.
xiv
O terceiro e último capítulo, Contrato de Trabalho do
Atleta Profissional de Futebol e a terminação do contrato e passe livre.
Nas considerações finais apresentam-se breves sínteses
de cada capítulo e se demonstra se as hipóteses básicas da pesquisa foram ou
não confirmadas.
15
Capítulo 1
O FUTEBOL COMO PROFISSÃO
1.1 HISTÓRICO
1.1.1 SURGIMENTO DO FUTEBOL NO MUNDO
O homem está interligado e correlacionado ao esporte desde
os primatas, quando fugiam de animais predadores, lutavam por áreas e regiões e
disputavam domínios no início das coletividades. Acredita-se que depois da
alimentação, a mais antiga forma de atividade humana é a que hoje se conhece
por esporte.
Verifica-se que a prática desportiva teve início remoto, onde
já havia monumentos de vários estilos dos antigos egípcios, babilônios, assírios e
hebreus com cenas de luta, jogos de bola, natação, acrobacias e danças. Entre os
egípcios, a luta corpo-a-corpo e com espadas surgiram por volta de 2.700 a.C. e
eram exercícios com fins militares. Os outros jogos tinham caráter religioso.
Para relatar os antecedentes históricos do futebol, torna-se
necessário uma viagem pelas civilizações antigas, para buscar inicialmente a
origem da prática de esportes.
As origens do jogo com a bola são remotíssimas. Conforme
levantamentos feitos por historiadores e arqueólogos, no Egito e na Babilônia há
notícias que dão a esses primeiros centros de civilização na Antigüidade a
condição de pioneiros na prática de algo semelhante ao futebol7.
7 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. p.11.
16
ZAINAGUI8 destaca que os registros não são exatos:
Há evidências importantes da existência da prática de esportes nas civilizações antigas, mas seus registros não são exatos. As civilizações primitivas (maias, incas, egípcios etc.) praticavam jogos com caráter esportivo, muitas vezes com intuito religioso. A própria natação encontra sua origem numa prática “esportiva” que consistia em afogar o adversário, sagrando-se vencedor aquele que conseguisse sobreviver.
Porém, as atividades esportivas ganharam destaque na
Grécia antiga, com realce no momento em que o corpo do homem é mais
valorizado.
Da mesma forma que a prática de esportes, o futebol não
tem registros exatos em sua origem, sendo o seu surgimento muito discutido. Não
existe qualquer fonte que comprove a origem deste esporte, tendo os
pesquisadores, apenas indícios de que seu surgimento ocorreu muitos séculos
a.C.
De acordo com LEAL9, historiadores, na busca da origem do
futebol, mencionam jogos com bola de bambu nos quais se usavam pés e mãos
desde 5.000 a.C, e 4.500 a.C., no Japão, portanto, há mais de sete mil anos.
Durante o reino de Yang-Tsé (atribui-se a ele a invenção do futebol), cerca de 2.500 a.C., oito jogadores disputavam jogos num campo de 14 m2, com duas estacas ligadas por um fio de seda em cada extremo do campo, bola redonda de 22cm de diâmetro, feita de couro e recheada de cabelo e crina10.
Havia indícios de sistemas e táticas, sendo os jogadores
8 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Os Atletas Profissionais de Futebol no Direito do Trabalho. p.17. 8 DUARTE, Orlando. Futebol histórias e Regras. São Paulo: Makron Books, 1997. p.3. 9 LEAL, Júlio César. Futebol: arte e ofício. Rio de Janeiro: Sprint, 2000. p.23. 10 LEAL, Júlio César. Futebol: arte e ofício. p.23.
17
divididos em: corredores, sacadores, dianteiros e defensores. Era jogado pela elite
da sociedade e pelos altos oficiais da Igreja. Sabe-se que os Papas Clement VII,
Leon X e Urbain VII foram campeões no futebol florentino.
De outra sorte, destaca AQUINO 11 que informações mais
precisas revelam que na China, por volta de 2.300 anos atrás, jogava-se o tsutchu,
palavra chinesa que significa “golpe na bola com o pé”. Baixos-relevos mostram
cenas desse jogo praticado desde a dinastia Han (202 a.C. -226 d.C.). Outros
baixos-relevos referentes à dinastia Ming (1368-1644) registram particularidades
do tsutchu, que era praticado em três modalidades. Em uma delas, havia a
participação de um único jogador fazendo malabarismos com a bola. Outra
modalidade envolvia a competição entre duas equipes empenhadas em lançar a
pelota sobre uma rede no meio do campo. Aos adversários cabia evitar que a bola
tocasse o solo antes de ser devolvida à outra metade do campo. A terceira
modalidade opunha duas equipes empenhadas em arremessar a bola em algo
parecido com gols colocados em cada canto do campo. Registros indicam que seu
inventor, Yang-Tsé, pertencia à guarda do jovem imperador Huang-Ti, que foi
talvez o primeiro nobre a se interessar pelo futebol
Também são encontrados registros quanto à prática do
futebol no Japão, chamado de kemari12, e que fora praticado há mais de 2.000
anos. Assim como o chinês tsutchu era muito mais uma exibição de habilidade
com a bola do que uma efetiva competição esportiva.
Por volta do final do primeiro milênio antes de Cristo, o
kemari deixou de ser um esporte da aristocracia, passando a ser praticado pelas
classes populares. Era jogado em um campo quadrado e a equipe vencedora
11 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.11 12 O kemari, jogado em torno de uma cerejeira, árvore plantada repleta de simbolismos para os japoneses, era semelhante ao tsutchu. A princípio era praticado como treinamento militar, tornando-se, mais tarde, um esporte de nobres, sendo jogado com oito jogadores em cada equipe. A bola era redonda, com cerca de 22 centímetros de diâmetro, sendo recheada com crinas de cavalo.
18
poderia ser premiada com flores ou lingotes de prata13.
Já na Grécia:
Entre os gregos, o chamado epyskiros era muito popular, e incluía-se entre outros jogos com a pelota, sendo classificado – juntamente com o aporaxis, a fênida e o epiceno – na categoria chamada de sphairomachia, que englobava esportes em que a pelota era jogada com as mãos ou com os pés. Do epyskiros, jogado com os pés, pouca coisa se sabe. São muito escassas as informações relativas ao número de jogadores de cada equipe, dimensões do campo e até mesmo sobre como se fazia a contagem de pontos14.
No entendimento de DUARTE15, para os gregos, o epyskiros
possuía regras desconhecidas, perdidas no tempo. Os romanos adotam a bola e
detalhes do jogo e fazem o harpastum.
Após verificar o esporte praticado pelos gregos, os romanos
criaram o harpastum, que coexistiu com o trigon e a pila pagânica, praticados com
as mãos e os pés. No harpastum, popular entre os legionários romanos, o jogo era
com uma bola de couro semelhante à atual, inclusive em dimensões. Uma capa
de couro – chamada de follis – envolvia uma bexiga de boi cheia de ar. O campo
tinha forma retangular, com uma linha divisória no meio e duas linhas de meta nas
extremidades. A bola tinha de ser passada de jogador a jogador, cabendo a um
deles arremessá-la através da linha de meta adversária, marcando assim um
ponto.
Da mesma forma, também são encontrados registros de
jogos com bola no continente americano, conforme relata AQUINO16:
13 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.12. 14 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.12. 15 DUARTE, Orlando. Futebol: histórias e regras. p.3. 16 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.14.
19
Existem informações de que a prática do jogo da bola também era conhecida das populações indígenas do continente americano. Entre os araucanos, que viviam no atual Chile, era chamado de pirimatum, ao passo que os tehuelches da Patagônia denominavam-se de tchoekah. Não somente as populações aborígenes da América do Sul jogavam suas peladas: em Copán, importante cidade da civilização maia, na América Central, disputava-se o pok-tai-pok. O campo tinha 490 pés de comprimento e media 100 pés de largura. Pela primeira vez na evolução do futebol, o jogo era realizado com bolas de borracha maciça.
Na Europa, durante a Idade Média, a bola rolava na cidade
de Florença, na Península Italiana, onde se disputavam o calcio, denominação
que ainda hoje é usada pelos italianos para designar o futebol. Segundo AQUINO,
a primeira partida foi disputada em 17 de fevereiro de 1529, onde vinte e sete
jogadores atuavam em cada time, com camisas brancas ou verdes. A peleja foi a
forma encontrada por dois grupos políticos rivais para solucionar suas diferenças
políticas17 18.
Mas, verificavam-se nestas disputas muita violência, e o rei
Eduardo I proibiu sua realização em 1297. Apesar disso, a lei não foi respeitada,
sendo que continuaram a ocorrer verdadeiras batalhas campais entre os
participantes das equipes, que eram formadas por centenas de jogadores cada
uma. Na disputa de pelotas, socos e pontapés eram válidos e a equipe vencedora
era aquela que conseguia arremessar a pelota através da meta adversária. Já em
1314, o jogo foi mais uma vez proibido, desta vez pelo Rei Eduardo II.
Itália, França, Inglaterra e Escócia continuavam animando o
17 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.14. 18 Antes de chegar à Península Italiana, o harpastum teria sido levado pelos romanos em sua campanha contra os celtas, que vivia na Britânia, atual Inglaterra, e o mais antigo documento a ele relacionado é o livro Descriptio nobilissimae civitatis londinae, de William Fitztephen, escrito em 1175. O jogo, disputado com uma bola de couro, tinha caráter festivo: celebrava-se o fim da denominação dinamarquesa, em 1047.
20
calcio, soule, futebol, que se transformava, principalmente na Escócia e na
Inglaterra, em esporte violento. Roupas rasgadas, pernas quebradas, dentes
arrancados e críticas ao ‘esporte’. Muitos achavam que era um esporte bárbaro
que estimulava a violência e o ódio. Na França, o esporte chegada aos jardins
aristocráticos. Surge também o ‘futebol de massa’, onde chegavam a jogar 500 de
cada lado. Surgiram proibições e manifestações das autoridades contra o
massfootball que resistia19.
De acordo com AQUINO20, foi no século XVIII, quando a
Inglaterra consolidou o governo parlamentar e a Revolução Industrial,
representando a vitória do capitalismo na sociedade inglesa que começaram a
ocorrer mudanças no jogo da bola. Nesta época, surgia uma aristocracia integrada
principalmente por famílias cuja riqueza provinha do dinheiro, e não mais de
propriedades rurais, onde os filhos dessas famílias ricas começaram a freqüentar
as escolas. Destaca ainda o autor:
Aos dirigentes dessa aristocracia interessava reformular a educação então dominante no país. O futebol, esporte que pressupunha companheirismo e disciplina, poderia perfeitamente servir para esse propósito. Para isso, no entanto, deveria ser regulamentado mediante uma organização submetida a regras fixas. Além disso, os educandos poderiam canalizar suas energias para uma prática desportiva disciplinada, o que os desviaria de atividades capazes de ameaçar a estabilidade política da sociedade capitalista inglesa21.
Em 1823, na Rugby School, houve uma séria divisão entre
os que defendiam regras disciplinando o jogo da bola praticado nas escolas
particulares inglesas. A controvérsia girava em torno da permissão ou não de se
usar pés e mãos durante as pelejas. William Welbb Ellis defendia a validade do 19 DUARTE, Orlando. Futebol: histórias e regras. p.4. 20 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.17. 21 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.17.
21
uso também das mãos, tendência que acabou prevalecendo no chamado ‘futebol
americano’, ou ‘rúgbi’.
Fundamenta DUARTE22 que:
As regras começam a por ordem. Jovens das famílias ricas da Inglaterra começam a deixar de lado o tiro, a esgrima, a caça, a equitação, alguns dos seus esportes preferidos, passando para o futebol. No século XIX, o futebol está mais organizado.
Em 1848, houve uma unificação das regras com a
participação de Cambridge, Harrow, Westminster, Winchester e alunos de Elton.
Eram, então, catorze regras. Depois vieram acréscimos: impedimento, árbitro,
goleiro podendo usar as mãos, arremesso lateral, escanteio, pênalti e troca de
lado na metade do tempo (antes trocava-se de lado após cada gol)23.
Relata ainda DUARTE24 que:
Em 1868, surge a figura do árbitro. Ele anunciava as decisões aos gritos. Foram surgindo o apito, o travessão superior etc. Em 1891 apareceram as redes. O pênalti foi criado. Estabeleceu-se o número de 11 jogadores, o tamanho do campo, o tamanho da bola. Em 1901 surge o limite das áreas. Em 1907 surge a Lei do Impedimento, mudando-se em 1926. O futebol como é hoje chegou à França em 1872; à Suíça em 1879; à Bélgica em 1880; à Alemanha, Dinamarca e Holanda, em 1889; à Itália em 1893; aos países da Europa Central, em 1900. Em 1904 surge a FIFA.
Segundo o pesquisador BALLOUSSIER25, acredita-se que o
futebol com 11 jogadores se firmou pelo fato de as turmas de Cambridge terem 22 DUARTE, Orlando. Futebol: histórias e regras. p.5. 23 LEAL, Júlio César. Futebol: arte e ofício. p.27. 24 DUARTE, Orlando. Futebol: histórias e regras. p.5. 25 Apud AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.18.
22
dez alunos e um bedel (inspetor de classe). Para outros, o número 11 foi escolhido
porque foram 11 os times e escolas que fixaram o código único de regras
uniformizando essa prática desportiva.
Em dezembro de 1863, o futebol foi codificado em apenas 14
regras, tornadas públicas em livros e cartilhas distribuídas pelo país. Dentre as
regras estabelecidas, proibia-se chutar ou agarrar o adversário, fixava-se a troca
de campo ao fim do primeiro tempo, a validação de um tento somente quando a
bola ultrapassasse a linha do gol, a dimensão da largura e da extensão do campo,
o controle das chuteiras e a padronização da bola. A partir de 1875, os juízes
passaram a arbitrar as pelejas usando um apito e depois de 1881 começaram a
atuar dentro das quatro linhas26.
1.1.2 SURGIMENTO DO FUTEBOL NO BRASIL
Pouco referencial se encontra na literatura em relação à
origem do futebol no Brasil antes de Charles Miller.
Ainda assim, DUARTE27 relata que:
No Brasil, o futebol chegou por intermédio de marinheiros ingleses, holandeses e franceses, na segunda metade do século passado. Eles jogavam em nossas praias, na parada dos navios. Iam embora e levavam as bolas. Para os nossos brasileiros só restava admirar o esporte, sem saber que esse seria o nosso esporte nacional, que anos depois seríamos campeões do mundo. Fala-se também que funcionários da São Paulo Railway, de Jundiaí, teriam aprendido a jogar em 1882. Também se comenta que os funcionários da Leopoldina Railway, do Rio, no mesmo ano, também teriam experimentado o futebol. Comenta-se o sensacional que foi o jogo de
26 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.18. 27 DUARTE, Orlando. Futebol histórias e Regras. p.5.
23
marinheiros ingleses, em 1874, nas praias do Rio, exatamente onde é o Hotel Glória.
Já na obra de LEAL 28 , no Brasil, destaca-se que o
surgimento do futebol é atribuído a Charles Miller, nascido em 1874, brasileiro,
descendente de ingleses, educado na Banister Court School, na Inglaterra, onde
conheceu o foot-ball, por ele se encantou e praticou, jogando no time do Condado
de Hampshire. De volta ao Brasil, em 1894, trouxe consigo as duas primeiras
bolas, uma delas logo apelidada de Peluda, por ainda conter pêlos no couro,
uniformes e chuteiras. Organizou o primeiro jogo, do qual também participou, no
São Paulo Atletic Club, clube de ingleses, fundado em 1888, onde se jogava
principalmente o críquete.
Neste sentido, relata AQUINO29:
Ao retornar a São Paulo, em 1894, trazia em sua bagagem duas bolas de couro, camisas, chuteiras e calções. Constatando que essa modalidade de esporte era praticamente desconhecida no país, empenhou-se em divulgá-la. Ele passou a promover partidas, formar times e fundar clubes, aparecendo como o grande incentivador do futebol na capital paulista. Tornava-se assim, para muitos, o precursor do jogo no Brasil, o que lhe garantiria um lugar de destaque no panteão dos heróis do esporte nacional.
A historiografia assinala a data de 14 de abril de 1895 para a
realização da primeira partida de futebol no Brasil. Devido aos esforços de Charles
Miller, enfrentaram-se no campo da Cia. Paulista de Viação as equipes de
28 LEAL, Júlio César. Futebol: arte e ofício. p.28. 29 AQUINO, Rubim Santos Leão. Futebol, uma paixão nacional. p.26.
24
trabalhadores do The Team Gaz e do The São Paulo Railway30.
Relata ZAINAGHI31 que o futebol era praticado pela classe
alta da sociedade, excluindo os operários e as pessoas que pertenciam às classes
mais humildes.
Em 1914, surge a Federação Brasileira de Sports, e em 1916
a Confederação Brasileira de Desportos (CDB), que dedicou-se aos esportes
amadores. Em 1923, foi criada a Federação Brasileira de Futebol para os adeptos
do profissional. Somente em 1937, a Federação Brasileira de Futebol uniu-se à
Confederação Brasileira de Desportos, dando início à fase profissional do futebol.
O futebol de campo enquadra-se perfeitamente na categoria
de esporte popular. É praticado por diferentes categorias sociais,
predominantemente das classes C, D e E.
As bases da prática desportiva no Brasil estão fundadas sob
laços associativos, caracterizados pela união de pessoas para a realização de
atividades físicas, envolvendo várias modalidades desportivas.
Conforme CARLEZZO32, como qualquer outro setor social, o
desporto evoluiu gradativamente com o passar dos anos, seja com relação às
técnicas e equipamentos que auxiliam a prática desportiva, seja com relação à sua
parte organizacional.
O esporte, como um dos fenômenos sociais e culturais mais
importantes do século XX, tanto em sua vertente de entretenimento como de
30 No Brasil, os termos ingleses foram usados durante muitos anos, também aqui o futebol surgiu através dos ingleses. Charles Miller era brasileiro, foi estudar na Inglaterra e trouxe as bolas e as regras, mas as empresas de origem inglesa traziam o agradável hábito da prática do futebol. Muito se falou dos stopers, dos halfs, dos goals-keeper, dos forward, dos off-side, dos corners etc. Isso tudo veio da Inglaterra, a verdadeira ‘mãe do futebol’ e que soube, depois de muita luta, organizar o futebol. No dia 02 de junho de 1886, quatro Associações de Futebol britânicas fundaram, em Londres, a International Football Association Board que ainda é a guardiã das regras e da organização desse esporte mundial. 31 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. São Paulo: LTr, 2001. p.29. 32 CARLEZZO, Eduardo. Direito desportivo empresarial. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004. p.30.
25
prática livre e voluntária do cidadão, desenvolve-se, fundamentalmente, através de
entidades e organizações desportivas.
1.2 HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO DESPORTIVA NO BRASIL
TUBINO 33 inicia sua obra explanando que, no início da
década de 30, a desorganização do esporte brasileiro, causada principalmente
pelos conflitos decisórios por ocasião das deliberações sobre participações
internacionais, levou o Governo brasileiro a buscar medidas que solucionassem os
impasses que a cada momento surgiam. PERRY34 relata que:
Fora de tais normas legais, o desporto regia-se pela sumária legislação das entidades dos diversos ramos desportivos, com obediência relativa aos preceitos internacionais, sem a menor interferência do Governo, em qualquer sentido, com organização precária, circunstâncias que mais põem em relevo o esforço e o sacrifício dos dirigentes da época, plantando as sementes que frutificariam na potência esportiva em que se torna, aos poucos, o nosso país.
Tal desorganização e a falta de preceitos legais estruturais do desporto ocasionaram, então, cisões que tantos malefícios causaram, sobretudo no futebol, onde se degladiaram entidades nacionais e entidades estaduais de direção, num desgaste de valores, de esforços e de trabalho, umas à margem da filiação internacional, outras desfrutando dela, mas desfalcadas pela luta.
Com o início do profissionalismo, esses conflitos ocorriam
com maior freqüência na área do futebol, o que obrigou o Estado a regulamentar
33 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. Rio de Janeiro: Shape, 2002. p.25. 34 Apud TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.25.
26
as atividades desportivas, estendendo essa normatização além do futebol, vindo a
atingir todas as modalidades praticadas no Brasil.
A primeira lei que tratou e regulamentou o esporte no Brasil,
foi editada em 1941, na ditadura de Getúlio Vargas. Essa lei era uma cópia do
modelo nazista que existia na época, quando o esporte era uma maneira de se
aferir a hegemonia de uma raça sobre a outra.
Neste sentido, destaca AIDAR35 que até o ano de 1941 não
existia nenhuma legislação que regulamentasse o desporto, absolutamente nada,
apenas um apanhado de pessoas que praticavam o esporte, mas não havia lei
nenhuma que regulamentasse sequer a atividade esportiva, quanto mais a
atividade administrativa ou a atividade jurídica da modalidade esportiva.
O Decreto-lei nº. 3.199, de 14/04/1941, primeira legislação
esportiva do país, além das normas gerais que organizariam e permitiriam uma
burocratização ou cartorialização do esporte nacional criou, no seu Artigo 20, o
Conselho Nacional de Desportos (CND), que daria prosseguimento a essa
regulamentação esportiva brasileira. Pela primeira vez, no seu art. 53, reconhece
implicitamente a existência de uma prática esportiva profissional36.
Até a instituição deste decreto, foram criados vários
instrumentos legais, que por si só explicam o desenvolvimento e a preparação do
Estado para normatizar o esporte no Brasil, e foram37:
- Decreto-lei nº. 526, de 01/07/1938 – Instituiu o Conselho Nacional de Cultura. No seu Art. 20, § único, alínea h, incluiu a Educação Física (ginástica e esportes) como atividade de desenvolvimento cultural.
- Decreto-lei nº. 1.056, de 19/01/1939 – Instituiu a Comissão Nacional de Desportos, que ficou encarregada de desenvolver o
35 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. Campinas: Editora Jurídica, Mizuno, 2000. p.18. 36 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.25. 37 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.26.
27
projeto para a futura lei base para o esporte nacional.
- Decreto-lei nº. 1.212, de 07/04/1939 – Criou a Escola Nacional de Educação Física e Desportos, primeira escola civil de formação em Educação Física no país. Os conteúdos do esporte eram tratados conjuntamente com os da Educação Física.
- Decreto-lei nº. 10.409, de 14/08/1939, do Governo do Estado de São Paulo – Primeiro ato legal que legislou sobre os esportes, baixando normas para orientar a prática esportiva, promovê-la, e fiscalizá-la. Tratou ainda das cobranças de ingressos, das organizações de competições, das construções de praças esportivas e estádios, da produção de material esportivo e da previdência contra acidentes esportivos.
- Decreto-lei nº. 11.119, de 30/05/1940 – Instituiu benefícios fiscais às sociedades esportivas.
O período que compreendeu os anos de 1945 e 1985 foi
aquele que o esporte brasileiro foi normalizado primeiramente pelo Decreto-lei nº.
3.199/1941 e pelas deliberações do Conselho Nacional de Desportos até 1975, e
depois deste ano, pela Lei nº. 6.251/1975 e seu Decreto regulamentador, nº.
80.228/1977, e pela continuação das deliberações do CND. O ponto comum é que
todos esses documentos legais podem ser caracterizados como instrumentos
autoritários que produziram uma tutela e uma cartorialização do esporte brasileiro
por mais de quarenta anos38 39.
Esse período durou até 08 de outubro de 1975, quando foi
criada a Lei nº. 6.251, marcada pela posição forte do Estado sobre as sociedades
esportivas. Os alvarás para funcionamento de entidades esportivas e registros, as
38 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.39. 39 Observa-se que a partir da década de 70 surgiram no contexto internacional e no próprio Brasil várias manifestações que se confrontavam com o arcabouço jurídico-esportivo vigente no país. A concepção mundial do movimento “Esporte para Todos” e a sua chegada ao Brasil, os manifestos dos organismos internacionais ligados à Educação Física e ao Esporte, o Diagnóstico de Educação Física/Desportos do Brasil em 1971, a criação da Comissão de Esporte e Turismo no Congresso Nacional e a respectiva promoção do ciclo de debates “Panorama do Esporte Brasileiro”, a reestruturação do Ministério da Educação e Cultura quanto ao setor responsável pela Educação Física/Esportes foram os registros de, por que não dizer, verdadeiras reações ao status quo.
28
aprovações de estatutos das entidades, a normatização dos passes no futebol
profissional, as normas para transferência de atletas, as aprovações dos códigos
disciplinares e muitas outras imposições constituem uma vasta folha de ações do
CND no sentido do cumprimento do Decreto-lei nº. 3.199/41, então vigente40.
Na visão de MELO FILHO41:
Outrossim, acresça-se que a Lei nº. 6.251 condensava no CND funções legislativas, executivas e judicantes, tornando-o o órgão que fazia a norma, exercia atos de fiscalização e controle, e julgava matérias desportivas, reunindo em um só órgão todas as funções entregues na República Federativa do Brasil a três poderes distintos e inconfundíveis.
Explica AIDAR42 que a Lei nº. 6.251 foi uma cópia do Decreto
nº. 3.199, uma roupagem diferente é bem verdade, mas ainda prevalecia a mão
forte do Estado a ditar regras e normas sob a forma de organização do esporte.
Não era dado por exemplo, ao Corinthians ou ao São Paulo ou a um clube de menor expressão seja ele qual fosse, se organizar de acordo com a sua necessidade, todos tinham que se organizar da mesma maneira, todos tinham que ter a sua quantidade de sócios e todos tinham que ter no mínimo vinte conselheiros, no máximo trezentos em razão da quantidade de milhares de sócios, para cada milhar era um limite de vinte conselheiros, até o limite máximo de trezentos. De forma que, era muito difícil os clubes se organizarem livremente43.
Nesta época, o esporte brasileiro precisava de uma
modernização, o que veio a acontecer com a Lei nº. 6.251, apesar da continuação
40 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.40. 41 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. Brasília: Livraria e Editora Brasília Jurídica, 1998. p.30. 42 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.18. 43 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.19.
29
da ação tuteladora do Estado no processo esportivo.
Conceitua ainda AIDAR44:
Essa lei distingue as diversas modalidades esportivas e as classifica como desporto comunitário, estudantil, militar e classista. O comunitário como sendo praticado por entidades esportivas, o desporto como nós conhecemos e já praticados em termos profissionais, o estudantil como desporto de aprendizagem e lazer; o militar praticado pelas forças armadas; e por fim, o classista praticado no âmbito das empresas.
Ressalta TUBINO 45 que, nesse período de 1941 a 1985,
outros instrumentos legais contribuíram para a organização e o desenvolvimento
do esporte brasileiro, oferecendo condições para as práticas esportivas dos
estudantes universitários, para a implantação da loteria esportiva para o esporte
militar e para o amparo do atleta profissional. Além disso, o CND continuou com
suas deliberações no sentido de disciplinar as relações do esporte nacional,
independentemente de estar referenciado no Decreto-lei nº. 3.199/1941 ou na Lei
nº. 6.251/1975 e seu Decreto regulamentador nº. 80.228/1977.
Já a partir de 1985, com a chegada da Nova República, o
Brasil começou a eliminar a defasagem com o renovado conceito de esporte, já
aceito nos países de grau civilizatório mais adiantado.
No entender de TUBINO, foi pelo Decreto nº. 91.452, de 19
de julho de 1985, por iniciativa do MEC, foi instituída a Comissão de Reformulação
do Esporte Brasileiro. Essa Comissão apresentou um minucioso relatório com o
título de “Uma nova política para o Desporto Brasileiro – Esporte Brasileiro
Questão de Estado”, com 80 indicações de reformulações divididas em seis
partes:
44 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.19. 45 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.85.
30
I – Da questão da reconceituação do esporte e sua natureza;
II – Da necessidade de redefinição de papéis dos diversos
segmentos e setores da sociedade e do Estado em relação do esporte;
III – Mudanças jurídico-institucionais;
IV – Da carência de recursos humanos, físicos e financeiros
comprometidos com o desenvolvimento das atividades esportivas;
V – Da insuficiência de conhecimentos científicos aplicados
ao esporte;
VI – Da imprescindibilidade da modernização de meios e
práticas do esporte.
Referencia ainda TUBINO46 que:
O compromisso maior da Nova República exige, prioritariamente, seja resgatada a enorme dívida social, e, neste contexto não há como olvidar-se ou minimizar-se o Desporto, uma das forças vivas da Nação, seriamente comprometido na sua função social. Daí decorre a necessidade urgente de mudar, de promover a adequação das estruturas desportivas às exigências da vida nacional, de modo a que o modelo desportivo a ser implementado contribua de maneira eficaz para o desenvolvimento e democratização dos desportos, direito e objetivo comum de todos nós.
No período de 1985 a 1989, o CND na sua ação renovadora,
mexeu em profundidade no esporte brasileiro, com 93 resoluções, o que veio a
criar um clima de mudança na ambiência esportiva nacional, que viria favorecer a
46 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.92.
31
constitucionalização do esporte na Carta Magna de 1988.
Enfatiza ainda TUBINO47 que o esporte brasileiro sempre
teve como aspiração uma lei que oferecesse benefícios fiscais às organizações
que investissem no esporte. Foi nessa perspectiva que toda a comunidade
esportiva brasileira apoiou o projeto apresentado por Mendes Thame, que após
longa tramitação no Congresso. A Lei Mendes Thame foi promulgada em 1989 e
recebeu o nº. 7.75248.
Apesar de todo empenho dos congressistas da época e do
importante papel que o esporte ocupava na conjuntura da Nação, o governo Collor
conseguiu destruir todo esse quadro favorável ao esporte, apesar de usá-lo para
seu marketing pessoal e de ter criado uma Secretaria de Desportos ligada à
Presidência.
Neste sentido, destaca TUBINO49:
É interessante acrescentar que os dois secretários, paradoxalmente, deixaram importantes contribuições ao esporte brasileiro. O primeiro, Artur Coimbra (Zico), deixou um belo projeto de reforma do esporte brasileiro, que viria a se consumar no governo seguinte. O segundo, Bernard Rajzman, inovou ao conseguir as parcerias das empresas estatais com as entidades esportivas. Ambos deixaram as suas marcas positivas no esporte brasileiro.
A Lei Zico, nº. 8.672, foi sancionada no dia 06 de julho de
1993, onde verificou-se no corpo da nova lei toda uma preocupação com o homem,
utilizando-se este como meio, ao contrário da legislação anterior, que preocupava-
47 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.94. 48 A Lei nº. 7.752/1989 criou uma grande ilusão no meio esportivo do país, pois com a chegada do governo Collor o sonho de uma lei de incentivos fiscais rapidamente acabou. Esta lei, conseguida com toda a mobilização da comunidade esportiva nacional, foi imediatamente suspensa, no primeiro conjunto de atos do Governo Collor, pela Lei nº. 8.034/1990. 49 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.109.
32
se somente com a imposição de uma burocracia no sentido de disciplinar as
atividades inerentes aos fatos esportivos.
Referencia AIDAR 50 que o movimento que nasceu e que
levou à direção de uma nova lei, a Lei Zico, nasceu do fruto de um trabalho de
muitas pessoas, que realmente trabalharam na elaboração dessa lei. Em seu pré-
projeto foram cinco pessoas que, desinteressadamente esperando uma eleição
para presidência da República sem saber quem viria a ser o presidente da
República, ficaram durante um ano se reunindo. Foi então elaborado um projeto
de lei que adaptava a legislação brasileira ao sistema moderno de
desenvolvimento do esporte em todo o mundo; já se buscava o chamado clube
naquela época, e também facilitar as parcerias de investimento no esporte, onde
se procurou dar esta autonomia.
Com a Constituição Federal em 1988, e a abertura para o
esporte em termos de organização e funcionamento, o inciso I do art. 217, que
observados aqueles, o Estado proverá a autonomia de organização e
funcionamento, onde encontra-se o nascimento em 1993 da chamada Lei Zico,
que foi a lei que vigeu até a entrada em vigor da Lei Pelé.
Com a Lei Zico, Lei nº. 8.672 de 1993, dava-se cumprimento
ao que dispunha o art. 217, em seus incisos, da Constituição Federal. O primeiro
inciso do art. 217, da Constituição Federal fala em autonomia das entidades
dirigentes e associações quanto à sua organização; a expressão ‘sua’ é no sentido
de ser dela, própria, interna ‘sua’; autonomia quanto a sua organização e
funcionamento51.
AIDAR 52 relata que a Lei Zico trouxe quatro importantes
novidades, que foram: as entidades de prática esportiva e as entidades federais
de administração do esporte devem manter a gestão de suas atividades sob a
responsabilidade de sociedades com fins lucrativos, reconhecendo então o 50 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.25. 51 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.25. 52 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.20.
33
esporte como negócio; estabeleceu a faculdade de criação de ligas regionais e
nacionais; previu o direito de arena, em que havia a autorização das entidades
esportivas para a transmissão de seus eventos esportivos, e regulamentou a
Justiça Desportiva, com seus procedimentos processuais e garantias.
1.3 DESTAQUE DA LEI 9.615/98 (LEI PELÉ) E SUAS ALTE RAÇÕES
No período compreendido entre a Lei Zico (Lei nº.
8.672/1993) e a Lei Pelé (Lei nº. 9.615/1998) ocorreram grandes discussões na
comunidade esportiva de rendimento, a partir da tentativa de estabelecer passe
livre aos atletas profissionais do futebol.
É evidente que a Lei nº. 9.615/1998 (Lei Pelé) não poderia ser uma mudança radical da Lei nº. 8.672/1993, pois ambas fazem parte do mesmo processo de transformação iniciado em 1985 e que ganhou força com a Constituição Federal de 1988. Desse modo, uma grande parte da Lei Zico foi repetida na Lei Pelé, principalmente a parte inicial, que tratou dos conceitos, princípios e definições de referência. Por outro lado, a nova lei do esporte brasileiro diferenciou-se com algumas evoluções extremamente relevantes em relação à lei anterior53.
Ressalta KRIEGER 54 que a partir de outubro de 1988,
iniciou-se novo ciclo legislativo voltado ao desporto, sendo que a própria
Constituição Federal trata da questão, em diversos dispositivos, a seguir
apresentados em ordem cronológica:
- Art. 5º, XVII , que assegura plena liberdade de associação
para fins lícitos;
- Art. 5º, XVIII , que dispensa a autorização para a criação de
53 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.25. 54 KRIEGER, Marcílio César Ramos. Lei Pelé e legislação desportiva brasileira anotadas. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.10.
34
associações, vedando a interferência estatal em seu funcionamento;
- Art. 5º, XXVIII , a, que assegura proteção à reprodução da imagem e voz humanas nas atividades desportivas;
- Art. 24, IX , que prevê a competência legislativa concorrente da União, dos Estados e Municípios sobre questões desportivas;
- Art. 217 , em seus quatro incisos, que determinam ser dever
do Estado o fomento das práticas desportivas, observados:
I – a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto à sua organização e funcionamento;
II – a destinação de recursos para a promoção prioritária do
desporto educacional e, em casos específicos, para desporto de alto rendimento;
III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não-profissional;
IV – a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional;
- Art. 217, §1 º, estabelecendo que o Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei;
- Art. 217, §2 º, dispondo que a justiça desportiva terá o prazo máximo de 60 (sessenta) dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final;
- Art. 217, §3º , determinando que o poder público incentivará o lazer, como forma de promoção social.
Legislação ordinária decorrente das normas constitucionais:
- Lei nº. 8.028/90 , que trata da reforma administrativa do Poder Executivo. Em seu art. 33 determina que lei geral sobre
35
desportos disporá sobre Justiça Desportiva;
- Lei nº. 8.672 , de 06/07/1993, que instituiu normas gerais sobre desportos. Chamada de Lei Zico, democratizou as relações entre dirigentes e atletas, criando condições para a profissionalização das diferentes modalidades de prática desportiva. Foi regulamentada pelo Decreto nº. 981/93;
- Lei nº. 9.615/98 , que institui normas gerais sobre desportos e dá outras providências. Conhecida como a Lei Pelé, revoga a Lei nº. 8.672/93. Foi regulamentada pelo Decreto nº. 2.574, de 29 de abril de 1998.
Para MELO FILHO55, o art. 1º da Lei nº. 9.615/98 estabelece
a vinculação do desporto com os “fundamentos constitucionais do Estado
Democrático de Direito”, o que exsurge não só dos princípios insculpidos no art.
217 da vigente Carta Magna, mas também porque em função de suas evidentes e
profundas repercussões para o desenvolvimento integral do homem, para o pleno
exercício da cidadania e para o fortalecimento da sociedade brasileira e de suas
relações internas e externas, o desporto coloca-se com uma das vigas mestras do
Estado Democrático de Direito 56.
Fundamenta TUBINO57 que pouca coisa concreta aconteceu
antes da Lei Pelé, apenas uma grande discussão depois da divulgação da
Resolução nº. 01 de 17 de outubro de 1996 do Conselho Deliberativo do Instituto
Nacional de Desenvolvimento do Desporto (Indesp), que fixou o valor, os critérios
e as condições para o pagamento da importância denominada passe, cabendo ao
referido Conselho revê-la sempre que necessário. Esta Resolução foi contestada
pela comunidade do futebol em termos jurídicos, e teve fim com a chegada da
55 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.19. 56 O desporto deve ser vislumbrado não apenas por sua vertente competitiva, mas também por seu caráter participativo e educacional que não tem a ambição do placar, não pretende quebrar record e nem se nutre com a volúpia do score (MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.20). 57 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.147.
36
própria Lei Pelé.
Já para AIDAR58, a Lei Pelé, um pouco antes de ser editada,
antes de passar pela Comissão Especial destinada a proferir parecer no projeto da
Lei Pelé; o anteprojeto sofreu modificações no campo do Gabinete Civil da
presidência da República, que emendou o anteprojeto. O texto que dele saiu foi à
Câmara Federal, e na Câmara Federal essa Comissão Especial promoveu
inúmeras modificações até que veio a ser editada a chamada Lei Pelé, a Lei nº.
9.615 de 24 de março de 1998, publicada no Diário Oficial de 25 de março de
1998.
O objetivo fundamental da nova Lei nº. 9.615/98 é regular o
marco jurídico em que deve desenvolver-se a prática desportiva no âmbito do
Estado, rechaçando, por um lado, a tentação fácil de assumir um protagonismo
público excessivo e, por outro lado, a propensão de abdicar de toda
responsabilidade na ordenação e racionalização do sistema desportivo59.
Alguns pontos de importância, quanto à prática desportiva
profissional, podem ser destacados na Lei Pelé:
• uma parte da Lei nº. 9.615 (1995) e referenciada ao
futebol profissional, embora compreenda todas as práticas esportivas
profissionais;
• como na Lei nº. 8.672 (1993), Lei Zico, na Lei nº. 9.615
(1998), Lei Pelé, o atleta profissional é caracterizado, assim como as entidades
que podem se responsabilizar pelo esporte profissional também são definidas;
• sempre com referência ao passe do profissional de
futebol, a nova lei garante o direito ao primeiro contrato, numa delimitação de dois
anos;
58 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.25. 59 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.24.
37
• outra novidade é a ausência de limite superior no
contrato do atleta profissional. O limite inferior permaneceu nos três meses;
• na nova legislação são oferecidas garantias
profissionais aos atletas quanto ao não cumprimento de obrigações trabalhistas;
• também os atletas semi-profissionais são
caracterizados, assim como suas relações com as entidades de prática
profissional formadoras;
• a grande inovação da nova legislação é a liberdade do
atleta profissional, ao terminar o contrato, de assumir outro contrato com qualquer
entidade de prática esportiva (§ 2º do art. 28). Com isto, acaba o passe. Entretanto,
essa liberdade somente entrará em vigor após três anos da data da Lei (art. 93);
• também foram estabelecidas as diretrizes para os
pagamentos de atletas, quando convocados por entidades de administração do
Sistema Nacional do Desporto. Como a Lei foi referenciada ao futebol, certamente
trará inúmeros conflitos nas outras modalidades esportivas;
• a Lei Pelé manteve as regras de direitos de imagem nos
eventos esportivos para as entidades de prática esportiva;
• pelos artigos 43 e 44, foram colocadas as restrições
quanto à prática esportiva profissional;
• a Lei Pelé nº. 9.615 também tratou das questões de
segurança que as entidades de prática esportiva devem oferecer a seus atletas
profissionais, e ainda quanto à legalização trabalhista de atletas estrangeiros que
venham a exercer atividade esportiva profissional no país.
38
Destaca AIDAR60 que a maior e mais importante alteração
está no art. 27 da Lei Pelé. Diz o art. 27 da Lei Pelé:
Art. 27. As atividades relacionadas a competições de atletas profissionais são privativas de:
I – sociedades civis de fins econômicos;
II – sociedades comerciais admitidas na legislação em vigor; e
III – entidades de prática desportiva que constituírem sociedade
comercial para administração das atividades de que trata esse artigo.
Da análise dessas três características destacadas no art. 27,
a primeira questão que se coloca é se remeter os clubes que têm prática
profissional a se organizarem sob a forma de sociedade com fim lucrativo é legal,
é legítimo, é constitucional, isso porque quem legislou foi a União e ela tem
competência para isso.
Quanto a segunda questão, não interfere na autonomia de
organização e funcionamento interno, na sua autonomia e organização, de tal
sorte que não se está obrigando todos os clubes a se transformarem em
sociedade comerciais. Ou seja, o que se está determinando, é uma norma
cogente imperativa, é que os clubes que praticam modalidade profissional tenham
aquela prática profissional organizada sob forma de uma sociedade com fins
lucrativos61.
Assim, em relação ao terceiro item do art. 27, os clubes ou
se tornam sociedades civis de fins econômicos, não precisa o clube todo, poderá
ser aquela modalidade que precisa se estruturar e se organizar como uma
sociedade civil de fim econômico, como diz a lei, ou sob uma sociedade comercial
60 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.31. 61 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.33.
39
admitida na legislação em vigor. As formas de sociedade comercial admitida na
legislação em vigor são: uma sociedade por ações ou uma sociedade por cotas de
responsabilidade limitada e a terceira, através de entidades de prática desportiva
que constituírem sociedade comercial para a administração das atividades de que
trata esse artigo.
A segunda modificação muito importante é a figura da
extinção do denominado passe. O passe é o vínculo que prende o trabalhador
profissional a um determinado empregador depois de extinto o contrato de
trabalho. Celebra-se um contrato de trabalho, prazo determinado, terminou o
contrato de trabalho o trabalhador não pode ir para onde quiser, ele continua
preso naquele clube sem trabalhar e sem receber, esse é o passe, o chamado
instituto do atestado liberatório; e a carta de alforria que o trabalhador do esporte
profissional não tem.
Através da Lei Pelé foi realizada a extinção do passe. O art.
28, §2º, da Lei Pelé diz o seguinte: “A atividade de atleta profissional de todas as
modalidades esportivas é caracterizada por remuneração pactuada em contrato
formal de trabalho, firmado com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de
direito privado que deverá conter obrigatoriamente cláusula penal para as
hipóteses de descumprimento, rompimento com rescisão unilateral. §1º. Aplicam-
se ao atleta profissional as normas gerais da legislação trabalhista e da
seguridade social ressalvada as peculiaridades expressas nesta lei ou integrantes
do respectivo contrato de trabalho. §2º. O vínculo desportivo do atleta com a
entidade contratante tem natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício,
dissolvendo-se para todos os efeitos legais com término da vigência do contrato
de trabalho”.
Destaca AIDAR 62 que no §2º, do art. 28, encontra-se a
chamada extinção do passe. Porém este dispositivo, §2º do art. 28, somente
entrou em vigor em março de 2001. Houve uma carência de três anos entre a
62 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.37.
40
publicação da Lei Pelé e a vigência desse dispositivo, isso tem uma explicação: os
clubes precisaram se estruturar e os próprios atletas precisam se estruturar para
saber que eles agora dependem apenas deles ao término de um contrato de
trabalho.
A partir do ano 2000, houve uma profunda crise institucional
no esporte brasileiro, só tomando sentido contrário a partir da chegada do ministro
Calos Melles ao Ministério do Esporte e Turismo através da implementação de
estratégias bem sucedidas, que podem ser resumidas em quatro fatos63:
1) Medida Provisória que alterou a Lei nº. 9.615/1998: a Lei
Pelé, que já havia sido alterada pela Lei Maguito Vilela, recebeu novas mudanças
por medida provisória governamental. Esta medida provisória foi o produto de uma
arrumação nas questões pendentes do futebol brasileiro, que já estavam gerando
grandes incômodos no país e nos clubes. No seu estilo, o ministro Carlos Melles,
depois de ouvir os segmentos envolvidos diretamente no futebol, tratou de uma
conciliação por aproximação que, sem atender aos interesses, ofereceu as
possibilidades de uma convivência no futebol brasileiro. Aproveitou a medida
provisória e criou um Conselho Nacional do Esporte para dirimir os conflitos
esportivos do país, que surgem a cada dia. Essa Medida Provisória recebeu o nº.
2.141-3 e tem sido consolidada pelo Governo Federal desde a sua publicação
inicial. Com a extinção do passe no futebol, pelo parágrafo 2º do art. 28 da Lei nº.
9.115/1998, com as alterações da Lei nº. 9.981/2000 e a Medida Provisória nº.
2.141/2001, terminou o vínculo esportivo do atleta, deixando-o livre para transferir-
se, sem necessidade de pagamento pela sua liberação. Na Medida Provisória nº.
2.141/2001 ficou clara a intenção da defesa dos clubes formadores, pelo parágrafo
3º do art. 29. É lógico que somente o tempo vai mostrar os problemas advindos
desta nova situação. De qualquer modo, o atual momento histórico resgatou a
dignidade da força de trabalho do atleta profissional de futebol.
2) Criação da Câmara Setorial do Esporte e da Comissão do
63 TUBINO, Manoel José Gomes. 500 anos de legislação esportiva brasileira. p.267-273.
41
Esporte: essa Câmara tem por finalidade constituir-se num fórum de debates com
o objetivo de discutir a formulação da Política Nacional do Esporte. Ela foi dividida
em quatro grupos setoriais, denominados temáticos: (a) Esporte de Base; (b)
Desenvolvimento do Esporte; (c) Esporte de Rendimento; (d) Esporte para
Pessoas Portadoras de Deficiências.
3) Elaboração de uma Política Nacional para o Esporte
Brasileiro: o Brasil teve muitos planos para o esporte, mas nunca teve uma política
delineada em termos estratégicos, que ultrapassa a convivência entre Estado e
sociedade, congregando as expectativas sociais em volta do esporte,
estabelecendo os fundamentos axiológicos necessários para a formulação do
sentido a ser buscado pelas ações públicas. O documento é dividido em partes,
que são: Documentos de Referência; Contexto Esportivo Brasileiro; Premissas;
Ações Operacionais.
4) Aprovação da Lei Piva: esta lei recebeu o apoio da
comunidade esportiva em praticamente todos os seus segmentos, tendo o
presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Carlos Nujzman, à frente. Este projeto
foi aprovado no Poder Legislativo e pelo presidente da República, Fernando
Henrique Cardoso. Esta Lei abre perspectivas para o esporte olímpico e
paraolímpico brasileiro.
A Lei nº. 9.981/2000 traz alterações na Lei Pelé quanto as
seguintes questões64:
a) A faculdade de a entidade de prática desportiva tornar-se
sociedade de fins lucrativos, tema que já causara enorme controvérsia no texto
anterior.
b) As limitações sobre a atuação de investidores em mais de
uma entidade desportiva. 64 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.13.
42
c) A questão dos atletas amadores, ou não profissionais.
d) A questão do passe dos jogadores de futebol e sua
substituição pela instituição de uma multa rescisória.
A última alteração estabelecida a tratar o ordenamento
jurídico-desportivo brasileiro é a Lei nº. 10.671/2003, com 45 dispositivos,
conhecida como Estatuto de Defesa do Torcedor. Estabelece, por exemplo, o
sorteio de árbitros, com 48 horas de antecedência da partida, obriga que as
súmulas tenham três vias, exige ‘sanitários limpos’, determina o número de
ambulâncias, médicos e enfermeiros proporcional ao público presente65.
1.4 DISTINÇÃO ENTRE ATLETA PROFISSIONAL, NÃO PROFIS SIONAL E AMADOR
A Lei Pelé acaba com o esporte amador no Brasil, isto é, o
amador é um termo que terá de ser usado exclusivamente por quem não recebe
dinheiro para praticar esporte, incluindo-se qualquer modalidade de esporte.
Para AIDAR 66 , por atleta pode-se entender como toda
pessoa que pratica esportes. Assim, atleta profissional é todo aquele que pratica
esporte como profissão, entendida esta como o exercício de um trabalho como
meio de subsistência do seu exercente.
Na visão de MELO FILHO67, o não profissional é aquele que
muitas vezes gasta dinheiro para praticar o desporto.
65 MELO FILHO, Álvaro. Direito desportivo: novos rumos. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p.67. 66 AIDAR, Carlos Miguel Castex. Direito desportivo. p.59. 67 MELO FILHO, Álvaro. Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações. Brasília: Brasília Jurídica, 2001. p.42.
43
Sobre o desporto praticado de modo profissional,
caracterizou-se como aquele em que o desportista faz jus à ‘remuneração
pactuada em contrato formal de trabalho’. Ou seja, a condição de profissional
decorre da vinculação jurídica do atleta com um ente desportivo para a prestação
de serviços consistentes na prática desportiva68.
O adjetivo profissional refere-se a algo pertinente a uma
profissão, significa a pessoa que faz alguma coisa por profissão. No Brasil,
excetuando-se o atleta de futebol (Lei nº. 6.354/76), nunca se reconheceu,
legalmente, a profissão de desportista, embora se saiba que este ‘empenha no
exercício desportivo as muitas e melhores energias de sua verba produtiva’69.
Assim, ao lado dos profissionais, prevê a legislação
desportiva atual os não profissionais, que são identificados pela liberdade de
prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo permitido o recebimento
de incentivos materiais e de patrocínio.
O desporto não profissional é comumente encontrado entre
as modalidades pouco difundidas ou entre atletas de nível técnico muito inferior.
Ainda entre os não profissionais existem os chamados
amadores, ou seja, os desportistas de qualquer idade que, com liberdade,
entregam-se à prática de qualquer modalidade sem qualquer forma de
remuneração ou incentivos materiais, ou seja, aqueles que não recebem nenhuma
compensação econômica como conseqüência da prática esportiva e não têm
nenhum outro interesse que não seja o do simples revigoramento físico, euforia da
saúde ou passatempo higiênico70. Significa que amador é aquele que exerce uma
atividade desportiva por prazer, e não por profissão.
68 MELO FILHO, Álvaro. Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações. p.42. 69 MELO FILHO, Álvaro. Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações. p.95. 70 MELO FILHO, Álvaro. Novo regime jurídico do desporto: comentários à Lei 9.615 e suas alterações. p.44.
44
Capítulo 2
CONTRATO DE TRABALHO NA CLT
2.1 CONCEITOS DE CONTRATO DE TRABALHO.
Pode-se afirmar que o contrato de trabalho está diretamente
relacionado a uma questão de trabalho.
No entendimento de SILVA71, a denominação contrato de
trabalho, hoje universalmente aceita, já sofreu objeções. Houve, por exemplo,
quem preferisse a expressão ‘contrato de salário’ e os que ainda dão preferência à
denominação ‘contrato de emprego’. E ainda explica que:
Relativamente à primeira denominação proposta à retribuição salarial do trabalho, não é característica diferenciadora desse tipo de contrato. Outros contratos tratam da ‘retribuição’ por serviços prestados, bastando citar, entre outros, a locação de serviços. Quanto à segunda, afirma-se que a expressão ‘contrato de trabalho’ pode ser substituída com vantagem por ‘contrato de emprego’ porque só o empregado e o empregador podem ser sujeitos desse contrato e também porque dessa forma seria afastada a possível confusão desse contrato com o de locação de serviços e outras espécies do mesmo gênero. Ainda na doutrina brasileira há quem defenda a denominação proposta porque, além da distinção entre gênero e espécie, a própria lei, como é o caso do art. 442 da Consolidação das Leis do Trabalho, fala em ‘relação de emprego’.
71 SILVA, Carlos Alberto Barata. Compêndio de direito do trabalho. 4.ed. São Paulo: LTr, 1986. p.200.
45
Conceitua MARTINS72 que o contrato de trabalho:
É o negócio jurídico entre uma pessoa física (empregado) e uma pessoa jurídica (empregador) sobre condições de trabalho. No conceito é indicado o gênero próximo, que é o negócio jurídico, como espécie de ato jurídico. A relação se forma entre empregado e empregador. O que se discute são condições de trabalho a serem aplicadas à relação entre empregado e empregador.
De acordo com DELGADO7374, contrato é o acordo tácito ou
expresso mediante o qual ajustam as partes pactuantes direitos e obrigações
recíprocas. Para o autor, essa figura jurídica embora não tenha sido desconhecida
em experiências históricas antigas e medievais, tornou-se, no período
contemporâneo, um dos pilares mais significativos de caracterização da cultura
sócio-jurídica do mundo ocidental. Relata ainda em relação ao contrato de
trabalho que:
Identificados seus elementos componentes e o laço que os mantêm integrados, define-se o contrato de trabalho como o negócio jurídico expresso ou tácito mediante o qual uma pessoa natural obriga-se perante pessoa natural, jurídica ou ente despersonificado a uma prestação pessoal, não-eventual, subrdinada e onerosa de serviços.
72 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 17.ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.116. 73 DELGADO, Maurício Godinho. Contrato de Trabalho: caracterização, distinções, efeitos. São Paulo: LTr, 1999. p.15. 74 A relevância assumida pela noção e prática do contrato, nos últimos séculos, deriva da circunstância de as relações interindividuais e sociais contemporâneas – à diferença dos períodos históricos anteriores – vincularem seres juridicamente livres, isto é, seres desprendidos de relações institucionalizadas de posse, domínio ou qualquer vinculação extravolitiva a outrem (como era próprio da escravidão ou servidão). Ainda que se saiba que tal liberdade muitas vezes tem dimensão extremamente volátil ou enganosa (basta lembrar-se dos contratos de adesão), o fato e que os sujeitos comparecem à celebração dos atos jurídicos centrais da sociedade atual como seres teoricamente livres. Nesse quadro, apenas o contrato emergiu como instrumento jurídico hábil a incorporar esse padrão específico de relacionamento entre os indivíduos, na medida em que essencialmente apenas o contrato é que se distinguia como veículo jurídico de pleno potencialmento ao exercício privado da liberdade e da vontade (DELGADO, Maurício Godinho. Contrato de Trabalho: caracterização, distinções, efeitos. p.15).
46
Também pode ser definido o contrato empregatício como o acordo de vontades, tácito ou expresso, pelo qual uma pessoa física coloca seus serviços à disposição de outrem, a serem prestados com pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e subordinação ao tomador75.
2.2 ELEMENTOS DO CONTRATO DE TRABALHO
Os elementos legais do contrato de trabalho se encontram
previstos no art. 3º da CLT, que enfatiza “toda pessoa física que prestar serviços
de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante
salário”.
Na visão de DELGADO 76 , os elementos jurídicos-formais
(elementos essenciais) do contrato de trabalho são aqueles classicamente
enunciados pelo Direito Civil: capacidade das partes; licitude do objeto; higidez da
manifestação da vontade (ou consenso válido); forma prescrita ou não vedada por
lei (art. 82 do CCB). Esses clássicos elementos comparecem ao Direito do
Trabalho obviamente com as adequações próprias a esse ramo jurídico
especializado:
a) Capacidade: ‘é a aptidão para exercer, por si ou por
outrem, atos da vida civil’. Capacidade trabalhista é a aptidão reconhecida pelo
Direito do Trabalho para o exercício de atos da vida laborativa. O Direito do
Trabalho não introduz inovações no que concerne à capacidade do empregador;
preserva, aqui, portanto, o padrão jurídico já assentado no Direito Civil. Desde que
se trate de pessoa natural, jurídica ou ente despersonificado a quem a ordem
jurídica reconheça aptidão para adquirir e exercer, por si ou por outrem, direitos e
obrigações na vida civil, tem-se como capaz esse ente para assumir direitos e
obrigações trabalhistas. Já em relação à figura do empregado há claras 75 DELGADO, Maurício Godinho. Contrato de Trabalho: caracterização, distinções, efeitos. p.16. 76 DELGADO, Maurício Godinho. Contrato de Trabalho: caracterização, distinções, efeitos. p.25.
47
especificidades normativas na ordem justrabalhista. Em primeiro lugar, fixa o
Direito do Trabalho que a capacidade plena para atos da vida trabalhista inicia-se
aos 18 anos (e não 21, como CCB). A maioridade trabalhista começa, pois, aos 18
anos (art. 402 da CLT). Ressalte-se que o preceito celetista que anteriormente
lançava certa cortina de dúvida sobre esse termo inicial da maioridade (o art. 446
dispunha que entre 18 e 21 anos presumia-se o trabalhador autorizado a trabalhar,
por seu responsável legal) encontra-se, hoje, expressamente revogado (Lei nº.
7.855/89). Mesmo antes de sua revogação expressa, o preceito já estava
esterilizado, por incompatibilidade, em vista do parâmetro etário constitucional
firmemente acolhido em 1988 (art. 7º, XXXIII, e 227, caput e §3º, da CF/88).
b) Objeto: a ordem jurídica somente confere validade ao
contrato que tenha objeto lícito (art. 145, II, do CCB). O Direito do Trabalho não
destoa desse critério normativo geral. Enquadrando-se o labor prestado em um
tipo legal criminal rejeita a ordem justrabalhista reconhecimento jurídico à relação
socioeconômica formada, negando-lhe, desse modo, qualquer repercussão de
caráter trabalhista. Não será válido, pois, contrato laborativo que tenha por objeto
trabalho ilícito. Contudo, há uma distinção fundamental a ser observada no tocante
a esse tema. Trata-se da diferença entre ilicitude e irregularidade do trabalho.
Ilícito é o trabalho que compõe um tipo legal penal ou concorre diretamente para
ele; irregular é o trabalho que se realiza em desrespeito a norma imperativa
vedatória do labor em certas circunstâncias ou envolvente de certos tipos de
empregados. Embora um trabalho irregular possa também, concomitantemente,
assumir o caráter de conduta ilícita, isso não necessariamente se verifica. A
doutrina e a jurisprudência tendem também a chamar o trabalho irregular de
trabalho proibido, pela circunstância de ele importar em desrespeito a norma
proibitiva expressa do Estado. É exemplo significativo de trabalho irregular (ou
proibido) aquele executado por menores em período noturno ou em ambientação
perigosa ou insalubre. Na mesma direção, o trabalho executado por estrangeiro
sem autorização administrativa para prestação de serviços.
c) Manifestação da Vontade: a ordem jurídica exige a
48
ocorrência de livre e regular manifestação de vontade, pelas partes contratuais,
para que o pacto se considere válido. A higidez da manifestação da vontade (ou
consenso livre de vícios) é elemento essencial aos contratos celebrados. Os
contratos empregatícios também se caracterizam pela internalização desse
elemento jurídico-formal. Contudo, a aferição de sua presença no cotidiano
trabalhista é menos relevante do que percebido no cotidiano regulado pelo Direito
Civil.
d) Forma: forma, no direito, é a instrumentalização mediante
a qual um ato jurídico transparece; é, pois, a instrumentalização de transparência
de um ato jurídico. De maneira geral, o direito não exige forma específica para os
atos jurídicos contratados na vida privada, no suposto de que as partes podem
eleger mecanismos eficientes e práticos para enunciação de sua vontade
conjugada. Mesmo no Direito Civil, portanto, o formalismo é exigência excepcional
colocada pela ordem jurídica (arts. 82 e 129 do CCB). No Direito do Trabalho,
essa regra também se manifesta: a princípio, não há qualquer instrumentalização
específica obrigatória na celebração de um contrato empregatício. O contrato de
trabalho é pacto não solene é, portanto, contrato do tipo informal, consensual,
podendo ser licitamente ajustado até mesmo de modo apenas tácito (art. 442,
caput, da CLT). Ressalte-se, por fim, que o elemento formal vincula-se
diretamente ao tema da prova do contrato. Se a forma é a instrumentalização de
transparência de um ato jurídico, obviamente que ela surge como uma das
modalidades centrais de comprovação da existência desse ato e de seu conteúdo
obrigacional. Desse modo, o instrumento escrito tende a ser um meio privilegiado
de prova do contrato e suas cláusulas. Não obstante isso, na medida em que se
sabe que o contrato empregatício é essencialmente consensual (isto é, não
formal), é inquestionável que também poderá ser provado por quaisquer meios
probatórios lícitos existentes, mesmo que distintos da instrumentalização escrita
(arts. 442, caput, e 456, caput, da CLT; art. 332 do CPC).
49
Fundamenta MAGANO 77 que o contrato de trabalho é o
“negócio jurídico pelo qual uma pessoa física se obriga, mediante remuneração, a
prestar serviços não eventuais, a outra pessoa ou entidade, sob a direção de
qualquer das últimas”.
Segundo DELGADO78, o contrato de trabalho, que viabiliza a
concretização da relação jurídica empregatícia tipificada pelos arts. 2º e 3º da CLT,
assume modalidades distintas, segundo o aspecto enfocado em face do universo
de pactos laborais existentes79. Diversas tipologias de contratos empregatícios
podem ser construídas, elegendo-se para cada uma delas um tópico de
comparação e diferenciação entre eles. Segundo o autor, possuem as seguintes
características:
a) Os contratos de trabalho podem, desse modo, ser
expressos ou tácitos, conforme o tipo de expressão da manifestação de vontade
característica do pato efetivado.
b) Podem ser, ainda, individuais (contrato individual de
trabalho) ou plúrimos, conforme o número de sujeitos ativos (empregados)
componentes do respectivo pólo da relação jurídica.
c) Podem ser por tempo indeterminado ou por tempo
determinado, conforme a previsão de sua duração temporal.
Em outra obra, DELGADO 80 afirma que, no Direito do
Trabalho, a figura do contrato desponta com toda sua faceta enigmática. É que, de
um lado, está-se diante talvez do mais eloqüente exemplo de contrato de adesão
77 MAGANO, Octavio Bueno. ABC do direito do trabalho. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p.18. 78 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito de trabalho. 5.ed. São Paulo: LTr, 2006. p.514. 79 Diz o art. 2º em seu caput que ‘considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. 80 DELGADO, Maurício Godinho. Contrato de Trabalho: caracterização, distinções, efeitos. p.16.
50
fornecido pelo mundo contemporâneo, onde o exercício da liberdade e vontade
por uma das partes contratuais – o empregado – encontra-se em pólo extremado
de contingenciamento. De outro lado, porém, a simples presença das noções de
liberdade e vontade no contexto dessa relação contratual já alerta para o potencial
de ampliação de seu efetivo cumprimento em harmonia com avanços
sociopolíticos democráticos conquistados na história.
MAGANO 81 destaca ainda que, a partir desse conceito,
podem ser enumeradas as seguintes características do contrato de trabalho:
a) se insere na área da autonomia privada;
b) pertence à categoria dos contratos de atividade,
implicando um vínculo pessoal do trabalhador;
c) pressupõe a continuidade no tempo;
d) está ligado ao trabalho desenvolvido sob subordinação;
e) se refere a uma atividade prestada por conta alheia;
f) exige a onerosidade, por meio da retribuição pecuniária.
PAULO e ALEXANDRINO82 conceituam contrato de trabalho
como o vínculo jurídico que possui como partes, de um lado, o empregado, e, de
outro, o empregador. A doutrina predominante entende que o denominado
contrato de trabalho efetivamente tem natureza contratual e aponta-lhe as
seguintes características:
a) é bilateral, pois produz direitos e obrigações para ambos;
b) é oneroso, em que a remuneração é requisito essencial; 81 MAGANO, Octavio Bueno. ABC do direito do trabalho. p.18. 82 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Resumo de Direito do Trabalho. 2.ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004. p.20.
51
c) é comutativo, pois as prestações de ambas as partes
apresentam relativa equivalência, sendo conhecidas no momento da celebração
do ajuste;
d) é consensual, porquanto a lei não impõe forma especial
para a sua celebração, bastando a anuência das partes;
e) é um contrato de adesão, uma vez que um dos
contratantes, o empregado, limita-se a aceitar as cláusulas e condições
previamente estabelecidas pelo empregador;
f) é pessoal (intuitu personae), porque a pessoa do
empregado é considerada pelo empregador como elemento determinante da
contratação, não podendo aquele fazer-se substituir na prestação laboral sem o
consentimento deste;
g) é de execução continuada, pois a execução do contrato
não se exaure numa única prestação, prolongando-se no tempo.
Na afirmação de SILVA83, se afirma com propriedade que o
contrato de trabalho é um contrato consensual. A consensualidade do contrato de
trabalho é que consensual não é contrato que depende do consentimento das
partes, como pode à primeira vista parecer, mas aquele que, para o seu
aperfeiçoamento, basta o consentimento.
Também se afirma que o contrato de trabalho é bilateral, pela
reciprocidade de obrigações para os dois sujeitos, pois tanto de um lado como de
outro, existem obrigações fundamentais ou principais e acessórias ou
complementares. A obrigação fundamental do empregado, a prestação de
trabalho, se constitui no objeto do contrato para o empregador e a obrigação
principal deste, o pagamento do salário, é na realidade o objeto do contrato, sob o
83 SILVA, Carlos Alberto Barata. Compêndio de direito do trabalho. p.202.
52
ângulo do empregado84.
O contrato de trabalho é também oneroso, no sentido de que
cada uma das partes recebe uma vantagem, com a execução do contrato. Pelos
arts. 3º e 76º da CLT, está legalmente consignado o caráter de onerosidade do
contrato de trabalho. O empregador deve pagar, no mínimo, o salário-mínimo a
seu empregado, ainda que parcialmente em utilidades. Não há, em nossa
legislação, prestação gratuita de trabalho, que, de resto, seria a negação da
própria natureza alimentar desta espécie de contrato85.
Quanto ao caráter comutativo do contrato de trabalho,
significa que as partes conhecem desde o instante em que manifestam seu
consentimento, a extensão de suas prestações86.
Explica LOUREIRO87 que contratos comutativos são aqueles
nos quais as partes conhecem previamente a extensão e os limites precisos de
suas respectivas obrigações.
Diferente de PAULO e ALEXANDRINO, SILVA88 acrescenta
ainda que:
É ainda, o contrato de trabalho dos chamados pactos de trato sucessivo, a que se contrapõem os de execução instantânea. É que ele se realiza através do tempo, maior ou menor, não importa, mas sempre com sua execução realizada paulatinamente através de uma série de atos.
O art. 442 da CLT adotou a teoria contratualista para
84 SILVA, Carlos Alberto Barata. Compêndio de direito do trabalho. p.202. 85 SILVA, Carlos Alberto Barata. Compêndio de direito do trabalho. p.203. 86 SILVA, Carlos Alberto Barata. Compêndio de direito do trabalho. p.203. 87 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Contratos no novo Código Civil: teoria geral e contratos em espécie. 2.ed. São Paulo: Editora Método, 2004. p.154. 88 SILVA, Carlos Alberto Barata. Compêndio de direito do trabalho. p.203.
53
identificar a natureza jurídica do vínculo que une o empregado ao empregador89:
Art. 442. Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego.
Parágrafo único . Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela.
NASCIMENTO90 enfatiza que, para alguns doutrinadores, o
contrato de trabalho constitui o fato gerador da relação de emprego, enquanto
para outros tanto o contrato quanto a própria relação podem originar o vínculo.
Ainda segundo a CLT, o contrato de trabalho, segundo o art.
443, destaca que esse pode ser celebrado tácita ou expressamente (verbal ou
escrito), além de poder ser celebrado por tempo indeterminado ou determinado.
Nos contratos de trabalho em que há determinação de prazo,
o legislador restringiu as hipóteses de sua adoção. Escreve a CLT, em seu art.
443, §§ 1º e 2º 91:
§ 1º. Considera-se como prazo determinado o contrato de trabalho cuja vigência dependa de termo prefixado ou da execução de serviços especificados ou ainda da realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada.
§ 2º. O contrato por prazo determinado só será válido em se tratando:
a) de serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a
predeterminação do prazo;
89 ZAINAGHI, Domingos Sávio et al. Direito desportivo. São Paulo: Editora Jurídica Mizuno, 2000. p.56. 90 Apud SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2004. p.19. 91 ZAINAGHI, Domingos Sávio et al. Direito desportivo. p.57.
54
b) de atividades empresariais de caráter transitório;
c) de contrato de experiência.
Referencia MARTINS 92 quanto aos contratos com prazo
determinado:
O término do pacto por tempo determinado pode ser medido em razão do número de dias, semanas, meses ou anos, ou em relação a certo serviço específico, como o término de uma obra, ou se for possível fixar aproximadamente, quando houver o término de um acontecimento, como o término de uma colheita, que se realiza periodicamente em certas épocas do ano. O fato de o último dia do contrato de trabalho por tempo determinado cair em feriado, domingo ou dia não útil não prorroga para o dia seguinte. Caso se observe o dia seguinte ao término do pacto, este já será de prazo indeterminado.
No entendimento de SILVA 93 , os contratos de trabalho
podem ser firmados por tempo indeterminado (modalidade mais comum) ou por
um período certo. Neste caso, terá de haver previsão expressa do prazo já no
momento da celebração do ajuste94.
NASCIMENTO 95 também assinala sobre o Contrato de
Trabalho com tempo determinado:
Observa-se, também, que o contrato a prazo determinado deve
92 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. p.105. 93 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.23. 94 A legislação brasileira sempre demonstrou clara preferência pelos contratos de prazo indeterminado, que asseguram melhor a liberdade de o empregado desfazer-se do contrato. São restritas as hipóteses de contratação por prazo certo (SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.23). 95 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 26.ed. São Paulo: LTr, 2000. p.143.
55
ser uma exceção. Não beneficia o empregado do mesmo modo que o contrato por prazo indeterminado. Nos países em que o empregado tem direito de estabilidade desde o início do vínculo de emprego, os contratos a prazo são desfavoráveis, porque neles não haverá tal estabilidade. Outra restrição de direitos do trabalhador refere-se ao aviso prévio, indevido no término como na rescisão antecipada do contrato.
Os contratos de prazo determinado dependem dos requisitos
estabelecidos, principalmente pela combinação de dispositivos legais, contidos
nos parágrafos do art. 443 da CLT. Consoante o § 1º do referido artigo,
consideram-se como contratos de prazo determinado aqueles que96:
a) possuam termo final certo;
b) visem a execução de serviços especificados; ou
c) dependam do advento de acontecimento suscetível de
previsão aproximada.
Já em conformidade com o § 2º do art. 443 da CLT, os
contratos de prazo determinado têm sua validade circunscrita a uma dessas três
hipóteses97:
a) execução de serviço cuja natureza ou transitoriedade
justifique a predeterminação do prazo;
b) desempenho de atividades empresariais de caráter
transitório;
96 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.24. 97 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.24.
56
c) sujeição a um período de experiência.
No que se refere à duração dos contratos, excetuada apenas
a hipótese de experiência, para todas as demais, a legislação prevê o prazo
máximo de dois anos (CLT, art. 445). Podem ter apenas uma prorrogação, que
não pode ultrapassar ao limite de dois anos. Se vierem a ser prorrogados mais de
uma vez, passarão a vigorar sem determinação de prazo (CLT, art. 451).
No entender de SILVA98, para evitar contratos sucessivos, a
lei impede que um contrato a prazo seja estipulado entre as mesmas partes
depois de outro (CLT, art. 451):
Observe-se que não se está cogitando de prorrogação: prorrogar é continuar um contrato que já existe, ampliando o prazo inicialmente estipulado. Suceder significa dar início a novo contrato, separado do primeiro no aspecto do tempo. São necessários assim pelo menos seis meses entre o término do primeiro e o início do segundo contrato a prazo com o mesmo empregador, sob pena de, inobservado tal lapso temporal, este último ajuste ser considerado como de prazo indeterminado.
A legislação especial trata de várias profissões, onde é
permitida a celebração de contrato por prazo determinado, tais como artistas,
atletas profissionais, entre outros.
Em Direito, a denominação contrato de trabalho serve para
designar a relação jurídica que envolve a prestação de trabalho de forma
subordinada.
98 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.27.
57
2.3 A SUBORDINAÇÃO JURÍDICA
A característica que marca o contrato de trabalho é a
subordinação jurídica do empregado para com seu empregador. Essa situação,
segundo CASSI e SAVINO99 ocorre quando o empregado se encontra num estado
passivo de subordinação em contraposição ao poder de comando e direção do
empregador. Ou seja:
A atividade do empregado consistiria em se deixar guiar e dirigir, de modo que as suas energias convoladas no contrato, quase sempre indeterminadamente, sejam conduzidas, caso por caso, segundo os fins desejados pelo empregador. Tanto ao poder de comando como ao de direção do empregador corresponde o dever específico do empregado de obedecer. O poder de comando seria o aspecto ativo e o dever de obediência o passivo da subordinação jurídica.
Ressalta-se que o legislador conceituou empregador no art.
2º da CLT.
Art. 2º. Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
§1º. Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos que admitirem trabalhadores como empregados.
§2º. Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo
99 Apud FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de Direito à Sujeição Jurídica. São Paulo: LTr, 2002. p.135.
58
industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis à empresa principal e cada uma das subordinadas.
JEAN VICENT100 denominou contratos de atividade todos os
que têm por objeto direto e imediato o trabalho do ser humano, seja manual,
técnico ou intelectual.
Não se define a subordinação jurídica pelo seu conteúdo
concreto, mas sim se argumentando que ela é limitada aos termos do contrato,
que ela não implica atos que o coloquem em risco físico, em situação de
humilhação ou de cometimento de ilegalidade101.
No entendimento de SILVA 102 , o Direito do Trabalho
Brasileiro adota como principal critério para a distinção entre as várias
modalidades de relações de trabalho e a aplicação da tutela jurídica respectiva e a
existência da subordinação. Neste sentido, a subordinação exprime a ordem
estabelecida entre as pessoas e segundo a qual umas dependem das outras, das
quais recebem ordens ou incumbências; dependência de uma(s) pessoa(s) em
relação a outra(s)103.
FONSECA104 explica mais claramente o termo subordinação
jurídica: é tudo o que o empregador determinar ao empregado que esteja dentro
dos limites da atividade econômica da empresa, que não seja crime, não o
humilhe e não o coloque em situação de risco físico. Tudo o que não for exceção à
100 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2004. p.13. 101 FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de Direito à Sujeição Jurídica. p.137. 102 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.13. 103 DICIONÁRIO Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p.26. 104 FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de Direito à Sujeição Jurídica. p.137.
59
atuação jurídica dos comandos pode ser considerado como subordinação jurídica,
e, portanto, atitude lícita do empregador.
GÉRARD COUTOURIER 105 relaciona os conceitos de
subordinação e empregador, para expressar que aquela é a dependência jurídica
em nome da qual este exerce o poder de direção.
Já para SANTORO-PASSARELLI 106 assevera que a
subordinação se constitui em uma necessidade técnica organizacional da
empresa: o empregado é um colaborador que atua de forma técnica, pessoal e
instrumental, sob a direção do empregador, justamente para que possam ser
atingidos os objetivos empresariais.
O art. 468, da CLT, dispõe que nos contratos individuais de
trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições, por mútuo
consentimento, e ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente,
prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta
garantia.
O artigo citado estabelece ainda a regra geral no sentido de
que as alterações contratuais que sejam prejudiciais ao empregado são
vedadas107, como a supressão de vantagens contratuais, por exemplo. A regra
aduz que as alterações não prejudiciais ao empregado podem ser operadas desde
que haja consentimento mútuo108.
O contrato de trabalho apto a receber a tutela jurídica do
direito do trabalho é o que envolve um trabalhador em condição de subordinação
105 Apud SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.16 106 Apud SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.16 107 Essa regra, embora geral, tem algumas exceções fixadas pela própria Constituição Federal, como a possibilidade de redução do salário ou de aumento da jornada máxima de trabalho, com compensação, mas em ambos os casos mediante negociação coletiva (art. 7º, VI e XIII, respectivamente). 108 FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de Direito à Sujeição Jurídica. p.139.
60
em relação ao tomador dos seus serviços.
Referenciam GOMES e GOTTSCHALK109 que o critério da
subordinação jurídica:
[...] Considera o poder de comando e de direção do empregador: a subordinação seria o aspecto passivo desse poder. A atividade do empregado consistirá em se deixar guiar e dirigir segundo os fins desejados pelo empregador. O poder de comando seria o aspecto ativo, e o dever de obediência o passivo da subordinação jurídica. Como decorrência dessa relação, o empregador ainda poderia se valer do poder de controle para fiscalizar a atividade do empregado e do poder disciplinar para puni-lo (nos casos de inobservância de um dever de obediência, de diligência ou de fidelidade).
109 Apud SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.14.
61
Capítulo 3
CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL
3.1 ATLETAS PROFISSIONAIS DE FUTEBOL.
O ordenamento jurídico destaca regimes diferenciados para
alguns empregados, em razão do tipo de atividade profissional que desempenham
ou da condição que ostentam. Estes contratos especiais regulam as relações de
trabalho de atletas profissionais.
BARROS110 relata que o desporto profissional é trabalho, e a
relação do desportista com a instituição é a de emprego, gerada por um contrato
de trabalho especial. O desporto praticado de modo profissional caracteriza-se
pela remuneração pactuada, em contrato formal de trabalho, entre o atleta e a
entidade desportiva.
A qualificação desse contrato como especial resulta da
particular posição do sujeito, da natureza do trabalho111 a ser prestado e do local
em que é realizada a prestação de serviço.
Destaca-se a Lei nº. 9.615/98 que “a atividade do atleta
profissional, de todas as modalidades desportivas, é caracterizada por
remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com entidade de
prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter,
obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento,
rompimento ou rescisão contratual”.
110 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. 3.ed. São Paulo: LTr, 2008. p.98. 111 A legislação especial permite ao legislador concretizar o tratamento da relação jurídica derivada de sua particular natureza, como também reportar-se ao ordenamento legal geral (CLT), quando ausente a incompatibilidade.
62
Quando a lei fala em ‘contrato formal’, entende-se por
contrato escrito.
O contrato entre o atleta, com interesse pecuniário, e a
entidade de desporto é visto como um contrato especial de trabalho112.
BARROS 113 explica que a natureza dessa relação de
trabalho como especial exige, evidentemente, que a sua disciplina legal se separe
da legislação trabalhista geral (CLT), em algumas situações, pela necessidade de
se atender à própria especialidade da relação e o particular jogo de interesses das
partes, isto é, do desportista, enquanto empregado, e do clube ou time, enquanto
empregador, o que nem sempre coincide com o que se dá entre empregado e
empregador, de um modo geral. Os exemplos mais comuns são os da duração do
contrato de trabalho, o do grau da subordinação jurídica, que acabará por
repercutir na caracterização da justa causa, o da duração do trabalho, entre outros.
A autora op. cit.114 exemplifica que, na Itália, os esportes são
numerosos e variados, porém, o mais conhecido e seguido é o futebol. Os
primeiros rascunhos da legislação apresentados ao Senado, em 1979,
consideravam a prestação de trabalho desses desportistas como autônoma,
porém, no texto normativo aprovado em caráter definitivo (Lei nº. 91, de 23 de
março de 1981), prevaleceu a tese da qualificação do trabalho desportivo como
subordinado. Os desportistas profissionais, isto é, os trabalhadores desportistas,
compreendem os atletas, treinadores, diretores técnicos esportivos e preparadores
físicos, que exercem atividade esportiva a título oneroso em caráter contínuo no
âmbito da disciplina regulamentada pelo CONI (Comitê Olímpico Nacional Italiano)
e que obtêm a qualificação das federações esportivas nacionais, segundo normas
emanadas destas mesmas federações estabelecidas pelo CONI, para a distinção
112 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.108. 113 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.101. 114 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.99.
63
da atividade profissional daquela desenvolvida por diletantismo115.
No Brasil, o atleta que praticar o futebol, em caráter
profissional, é considerado empregado da associação desportiva que se utilizar de
seus serviços mediante salário e subordinação jurídica. O empregador será
sempre pessoa jurídica de direito privado (art. 1º da Lei nº. 6.354, de 1976, art. 28
da Lei nº. 9.615, de 24 de março de 1998 e art. 30 de seu regulamento).
Aplicam-se aos atletas profissionais do futebol a Lei nº. 6.354,
de 02 de setembro de 1976, cujo anteprojeto foi de autoria do Prof. Evaristo de
Moraes Filho; a Lei nº. 9.615, de 24 de março de 1998, conhecida popularmente
como Lei Pelé; Lei nº. 9.981, de 14 de julho de 2000; as disposições da CLT
compatíveis com a situação desse profissional (art. 28 da Lei nº. 6.354, de 1976) e
ainda a Lei nº. 10.672, de 15 de maio de 2003. A par dessas disposições legais,
aplicam-se, também, as regras da Federação Internacional de Futebol, dos
Códigos Disciplinares de Futebol e outros advindos dos usos, mormente no
tocante à remuneração. Não se lhe aplicam as normas contidas nos arts. 451 e
452 da CLT, que dizem respeito à prorrogação e renovação do contrato, pois o
contrato do atleta pode ser prorrogado por mais de uma vez e a sua renovação
não está sujeita a interstício de seis meses entre os dois contratos. Igualmente,
mesmo antes de o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) ser o regime
legal, não se estendia ao atleta a indenização de antiguidade prevista no ano art.
477 da CLT, porque o seu contrato é a termo. Em conseqüência, tampouco o
instituto da estabilidade previsto no art. 492 da CLT poderia lhe ser estendido.
Atualmente, por força expressa de lei (art. 30, parágrafo único da Lei nº. 9.615, de
1998, modificado pela Lei nº. 9.981, de 2000), não se aplica ao atleta o disposto
no art. 445 da CLT, que veda a celebração do contrato por prazo determinado
superior a dois anos116.
115 Os empregadores, nessa relação jurídica, são as sociedades desportivas constituídas sob a forma de sociedades por ações ou de responsabilidade limitada (art. 10 da Lei Italiana n. 91, de 1981). 116 Apud BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.109.
64
No tocante ao atleta, a legislação brasileira distingue
situações, pois o desporto poderá ser praticado de forma profissional e não-
profissional117 (art. 3º, parágrafo único da Lei nº. 9.615, de 1998 – lei especial, de
natureza trabalhista, intitulada Lei Pelé). O primeiro caracteriza-se pela
remuneração118 pactuada em contrato formal de trabalho firmado entre o atleta e a
entidade desportiva. Estará o ajuste, portanto, sob a égide do Direito do Trabalho,
porém, integrará o rol dos contratos especiais. Já o desporto não-profissional será
identificado pela liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho,
sendo permitido o recebimento de incentivos materiais e de patrocínio (art. 3º,
parágrafo único, II, da Lei nº. 9.615, de 1998, com a nova redação dada em 2000).
No entendimento de MELO NETO119, por se tratar de um
contrato sui generis, com natureza e fisionomia próprias, inobstante o regime geral
de contrato de trabalho seja subsidiário, é importante repontar os três elementos
constitutivos do contrato desportivo destacados por GERMAIN120:
A prestação de serviço consiste, essencialmente, na atividade desportiva do atleta abrangendo treinamentos e competições para os quais é convocado. Uma controvérsia de natureza mais sentimental que racional centra-se na questão de saber-se se o desporto pode ser elemento constitutivo de um trabalho. A
117 O desporto realizado de modo não-profissional é identificado pela liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo permitido o recebimento de incentivos materiais e de patrocínio (art. 3º, parágrafo único, II, da Lei nº. 9.615, de 1998, com a nova redação dada pela Lei 9.981, de 14 de julho de 2000). Os atletas não-profissionais com idade superior a 20 (vinte) anos não poderão participar de competições desportivas de profissionais (art. 43 da Lei nº. 9.615, de 1998, com a nova redação dada pela Lei nº. 9.981, de 2000). 118 O art. 28 da Lei n. 9.615, afirma que a atividade de atleta profissional, dentre outras particularidades, caracteriza-se por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho: Art. 457. Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber. §1º Integram o salário, não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador. §2º Não se incluem nos salários as ajudas de custo, assim como as diárias para viagem que não excedam de cinqüenta por cento do salário percebido pelo empregado. §3º Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à distribuição aos empregados. 119 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.94. 120 Apud MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.94.
65
resposta é certamente negativa quando esta prática é amadora, isto é, pelo prazer que acarreta, configurando pura e simplesmente um jogo, ou seja, o oposto ao trabalho. Contudo, a resposta torna-se positiva a partir do momento em que o atleta se dedica ao desporto, não somente pela satisfação e pela alegria pessoal que dali retira, mas também com uma outra finalidade, qual seja, percebe uma retribuição: o atleta remunerado faz do desporto um trabalho.
BARROS121 define que o desporto realizado de modo não
profissional será identificado pela liberdade de prática e pela inexistência de
contrato de trabalho, sendo permitido o recebimento de incentivos materiais e de
patrocínio (art. 3º, parágrafo único, II, da Lei nº. 9.615, de 1998, com a nova
redação dada pela Lei nº. 9.981, de 14 de julho de 2000). Não se reconhece,
portanto, o vínculo empregatício com os jogadores de futebol amadores, pois não
o fazem em caráter profissional, mas por prazer e diversão.
Nesse sentido, ressalta KRIEGER 122 que o contrato de
trabalho é peça chave na relação atleta/clube. Repita-se que o contrato de
trabalho é o instrumento que estabelece o vínculo legal entre ambos, conforme
disposto no §1º do art. 28 da Lei, que define que o vínculo esportivo – conhecido
como o nome de condição legal de jogo – nasce do vínculo empregatício. Assim, a
condição legal de jogo de um atleta em relação à determinada entidade de prática
é estabelecida pelo registro de seu contrato junto à entidade dirigente respectiva.
Inexistindo o registro, inexiste a forma juridicamente perfeita para determinar a
existência ou não da condição de jogo.
A rigor, este §1º do art. 28 tem o nítido objetivo de ampliar e completar o quadro legislativo de proteção aos atletas profissionais, seja em relação à legislação trabalhista, seja em referência à legislação da seguridade social. Vale, portanto, a
121 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.103. 122 KRIEGER, Marcílio César Ramos. Lei Pelé e legislação desportiva brasileira anotadas. p.27.
66
regulação especial da lei desportiva no pertinente ao atleta profissional, e a incidência subsidiária dos ditames gerais, trabalhistas e de seguridade social, só exsurgirá na omissão ou ausência de disciplinamento específico nesta lei ou no contrato de trabalho respectivo. Além de dever buscar-se a compatibilidade entre as legislações geral e especial, respeitando, sobretudo, o espírito, sentido e escopo global da legislação desportiva, impõe-se realçar que o contrato de trabalho, sob pretexto de estabelecer peculiaridades, não pode fazer tabula rasa ou tornar letra morta normas trabalhistas e de seguridade social cogentes e de evidente natureza de ordem pública123.
A Lei nº. 9.615, de 1998, estabelece, nos art. 28 e 30, que o
contrato de trabalho do atleta formal será escrito e terá prazo determinado, com
vigência nunca inferior a três meses; essa exigência visa a propiciar-lhe um tempo
mínimo para mostrar suas habilidades profissionais.
O art. 30 da Lei nº. 9.615/98 explicita que o contrato de
trabalho do atleta profissional terá o prazo determinado, com vigência nunca
inferior a três meses124.
O art. 30 teve sua redação alterada pela Lei nº. 9.981, de 14
de julho de 2000, a qual estabeleceu que o contrato de trabalho do atleta terá
prazo determinado, com vigência nunca inferior a três meses nem superior a cinco
anos, deixando expresso que o disposto no art. 445 da CLT não se aplica ao atleta
(art. 30, parágrafo único)125.
Nesse entendimento, ressalta MELO FILHO126:
O art. 28 da Lei nº. 9.615/98 estatui em seu caput que ‘a
123 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.99-100. 124 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.103. 125 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.110. 126 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.94.
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atividade do atleta profissional, de todas as modalidades desportivas, é caracterizada por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral’. Este ditame guarda estreita harmonia com o parágrafo único, I, do art. 3º da mesma lei quando alude ao desporto profissional tipificado ‘por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva.
Complementa BARROS127:
O contrato de trabalho do jogador de futebol deverá conter os nomes das partes contratantes individualizadas e caracterizadas; o modo e a forma de remuneração, especificados o salário, os prêmios, as gratificações e, quando houver, as bonificações, bem como o valor das luvas, se previamente ajustadas, além do número da carteira de trabalho. Os contratos de trabalho serão numerados pelos empregadores em ordem sucessiva e cronológica, datados e assinados pelo atleta ou pelo seu representante legal, sob pena de nulidade (art. 3º da Lei nº. 6.354, de 1976, incisos I, III, IV, VI, §2º).
No domínio do contrato de trabalho dos praticantes
desportivos profissionais, o disciplinamento legal justifica-se quer em razão das
especificidades e singularidades que a atividade desportiva comporta e que o
regime geral do contrato de trabalho desconhece, por ser cada vez maior o
número de praticantes desportivos que fazem do desporto profissão ou meio de
vida, sendo remunerado pela sua prática, em todas as modalidades desportivas128.
127 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.111. 128 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.94.
68
O Decreto nº. 2.574/98, assim determina no §3º do art. 32129:
§3º. O contrato de trabalho de que trata o caput deste artigo, cujo modelo padrão será expedido pelo INDESP, será celebrado em no mínimo, duas vias, de mesmo teor e forma, destinadas uma para cada parte, e deverá conter obrigatoriamente as seguintes cláusulas e condições:
I – o nome completo das partes contratantes devidamente individualizadas e caracterizadas;
II – o nome da associação empregadora, endereço completo, inscrição no Cadastro de Pessoa Física – CPF, modalidade de prática e o nome da entidade de administração filiada;
III – o nome do atleta contratado, apelido desportivo, data de nascimento, filiação, estado civil, endereço completo, número e série da Carteira de Trabalho, do Registro Geral da Cédula de Identidade, do registro junto ao Cadastro de Pessoa Física do Ministério da Fazenda;
IV – o prazo de duração;
V – o valor da remuneração total e a forma de pagamento, que poderá ser semanal, quinzenal ou mensal;
VI – o valor dos prêmios e a forma de pagamento;
VII – o valor das luvas e a forma de pagamento;
VIII – o valor das gratificações e a forma de pagamento;
IX – a carga horária;
X – o regime de concentração, antes de cada competição;
XI – a informação do número da apólice de seguro de acidentes pessoais e de vida, feitos a favor do atleta, contendo o valor do prêmio, a data de vencimento e o nome da companhia de seguros;
129 Apud ZAINAGHI, Domingos Sávio et al. Direito desportivo. p.64.
69
XII – vantagens adicionais oferecidas ao atleta; e
XIII – o visto de autorização de trabalho temporário previsto no item V do art. 13 da Lei nº. 6.815, de 19 de agosto de 1980, o passaporte contendo o visto de entrada fornecido pelo Ministério das Relações Exteriores e a RNE da Política Federal, quando se tratar de contratos celebrados com atletas de origem estrangeira.
A Lei nº. 6.354/76 determina em seu art. 3º, §1º que os
contratos serão registrados nas federações regionais e na Confederação. A FIFA
determina em seu art. 5º do “Regulamento sobre o Contrato de Transferências de
Jogadores”, que os contratos de trabalho devem ser enviados em cópia para a
associação nacional, no Brasil, a CBF, ficando à disposição daquela entidade
internacional.
No entendimento de AIDAR, determina a Lei nº 9.615/98, em
seu art. 35, a obrigação de se comunicar a “entidade nacional de administração da
modalidade a condição de profissional, semiprofissional ou amador do atleta”.
Com isso, haverá controle dos contratos, mas sem ferir o sigilo do pactuado entre
os contratantes, mas a FIFA poderá requisitar uma cópia do contrato, e neste caso,
o clube deverá acatar o pedido. E regulamentando o dispositivo supra, o art. 36 do
Decreto nº. 2.574/98 assim preceitua:
Art. 36. A entidade de prática desportiva comunicará em impresso padrão à entidade de administração da modalidade a condição de profissional, semiprofissional ou amador do atleta.
§1º. A comunicação oferecida pela entidade de prática deverá observar o mínimo de informações:
I – nome da entidade de prática desportiva;
II – nome completo e apelido desportivo do atleta;
III – data de nascimento e filiação do atleta;
70
IV – validade e duração do contrato, com seu início e término, quando se tratar de atleta profissional;
V – validade e duração do contrato, com seu início e término, quando se tratar de contrato de estágio semiprofissional; e
VI – validade da manifestação de vontade, quando se tratar de vínculo desportivo de categoria amadora.
§2º. A manifestação de vontade de atleta amador é caracterizada pela ficha de registro desportivo, que poderá ser livremente rescindida por qualquer das partes.
O contrato de trabalho de atleta só deverá ser celebrado no
caso de profissionais, não havendo necessidade quando se tratar de
semiprofissional130 ou amador.
Ressalta ainda ZAINAGHI131 que o art. 28 da Lei 9.615/98 é
de aplicação obrigatória exclusivamente para atletas e entidades de prática
profissional de futebol, sendo facultado às demais modalidades desportivas a
adoção dos preceitos ali constantes, consoante os termos do art. 94 da lei.
Observa-se ainda que no art. 28, §1º, diz ser de aplicação subsidiária ao contrato
130 A Lei nº. 9.615/98 assim pronuncia quanto ao atleta semiprofissional: Art. 36. A atividade do atleta semiprofissional é caracterizada pela existência de incentivos materiais que não caracterizem remuneração derivada de contrato de trabalho, pactuado em contrato formal de estágio firmado com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter, obrigatoriamente cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral. §1º. Estão compreendidos na categoria dos semiprofissionais os atletas com idade entre quatorze e dezoito anos completos. §2º. Só poderão participar de competição entre profissionais os atletas semiprofissionais com idade superior a dezesseis anos. §3º. Ao completar dezoito anos de idade, o atleta semiprofissional deverá obrigatoriamente ser profissionalizado, sob pena de, não o fazendo, voltar à condição de amador, ficando impedido de participar em competições entre profissionais. §4º. A entidade de prática detentora do primeiro contrato de trabalho do atleta por ela profissionalizado terá direito de preferência para a primeira renovação deste contrato, sendo facultada a cessão deste direito a terceiros, de forma remunerada ou não. §5º. Do disposto neste artigo estão excluídos os desportos individuais e coletivos olímpicos, exceto o futebol de campo. 131 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.12.
71
de atleta profissional, as normas gerais da legislação trabalhista e da seguridade
social. A Lei nº. 6.354/76 também faz a mesma previsão:
Art. 28. Aplicam-se ao atleta profissional de futebol as normas gerais da legislação trabalhista e da Previdência Social, exceto naquilo que forem incompatíveis com as disposições desta Lei.
Neste sentido, afirma ainda ZAINAGH 132 que pelas
determinações dos dois diplomas citados, não há dúvidas de que a relação entre
clube e atleta é de emprego. Isso pode ser comprovado pelos arts. 1º e 2º da Lei
nº. 6.354/76, assim caracterizam as partes contratantes:
Art. 1º. Considera-se empregador a associação desportiva que, mediante qualquer modalidade de remuneração, se utilize dos serviços de atletas profissionais de futebol, na forma definida nesta Lei.
Art. 2º. Considera-se empregado, para os efeitos desta Lei, o atleta que praticar o futebol, sob subordinação de empregador, como tal definido no art. 1º, mediante remuneração e contrato, na forma do artigo seguinte.
A remuneração consiste em todas as vantagens, das mais
variadas espécies, concedidas ao atleta como contrapartida de seus serviços
desportivos. Assim, a remuneração abrange valores fixos, bem como os prêmios
sob múltiplas formas. Ela compreende igualmente as gratificações e as bolsas
concedidas, não pelo empregador do atleta, mas pelos terceiros, organizadores de
competições e manifestações de que o atleta participa.
Desta forma, o empregador, no entendimento de
132 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.12.
72
ZAINAGHI133 pode ser caracterizado como:
Vê-se, pois, que empregador só poderá ser uma pessoa jurídica, ou seja, uma associação. E esta, como entidade de prática esportiva, deverá revestir-se das formalidades exigidas na legislação específica, como, por exemplo, seu registro na Federação Estadual e na Confederação Brasileira de Futebol.
Quanto ao empregado, ZAINAGHI134 referencia que:
Quanto ao empregado, diz a lei em seu art. 2º:
Considera-se o empregado, para os efeitos desta lei, o atleta que praticar o futebol, sob a subordinação de empregador, como tal definido no art. 1º, mediante remuneração e contrato, na forma do artigo seguinte.
Imprecisa a definição legal face ao que prevê a CLT em seu art. 3º. Falta ao artigo supracitado a não eventualidade que é prevista no texto consolidado.
A subordinação, por si só, não caracteriza a existência de vínculo de emprego, uma vez que se pode imaginar um atleta que jogue apenas uma partida, tendo de obedecer à determinação do técnico (empregado do clube) e não se estará diante de um contrato de trabalho.
Quanto ao objeto, BARROS 135 fundamenta que o serviço
executado pelo desportista se integra em um espetáculo dirigido ao público e, em
conseqüência, se ressente das afeições, moda e inclinações, em síntese, de sua
aceitação. A prática desportiva está sujeita à regras, com racionalidade própria
que integra o ordenamento jurídico desportivo e que são indiferentes para o
133 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.12. 134 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.12. 135 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.100.
73
ordenamento jurídico trabalhista, mas respeitadas enquanto tais. Os dois
ordenamentos jurídicos apresentam conflitos, dada a disparidade de ponto de
vista de cada setor. Também a prática desportiva desenvolve-se, necessariamente,
por meio de entidades associativas que participam da competição de forma
organizada e regulamentada, cujo controle é exercido pelas federações,
vinculadas a organismos internacionais. Essa estrutura institucional do esporte
gera uma complexidade não encontrada nas relações exclusivamente de emprego.
Os atletas profissionais têm os seguintes deveres, em
especial: participar dos jogos, treinos, estágios ou outras sessões preparatórias de
competições, com a aplicação e dedicação correspondentes às suas condições
psicofísicas e técnicas; preservar as condições físicas que lhes permitam
participar dessas competições desportivas, submetendo-se aos exames médicos e
tratamentos clínicos necessários à prática desportiva; exercitar a atividade
desportiva de acordo com a ética e as regras respectivas (art. 35, I, II e III da Lei
nº. 9.615, de 1998, com a nova redação dada pela Lei nº. 9.981, de 2000)136.
Os art.s 34 e 45 da Lei Pelé apresentam os requisitos que a
entidade de prática desportiva terá de cumprir:
Art. 34. São deveres da entidade de prática desportiva empregadora, em especial:
I – registrar o contrato de trabalho do atleta profissional na entidade de administração nacional da respectiva modalidade desportiva;
II – proporcionar aos atletas profissionais as condições necessárias à participação nas competições desportivas, treinos e outras atividades preparatórias ou instrumentais;
III – submeter os atletas profissionais aos exames médicos e
clínicos necessários à prática desportiva.
136 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.115.
74
Art. 45. As entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de acidentes de trabalho para atletas profissionais a ela vinculados, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos.
No entendimento de SILVA 137 , existe regime diferenciado
para os atletas profissionais, assim entendidos aqueles que fazem da prática de
um determinado esporte a sua profissão, mediante contrato escrito celebrado com
associação desportiva. O autor relata ainda que:
A matéria em princípio foi regulada pela Lei nº. 6.354/76, que impôs o prazo determinado para esse tipo de contrato, com duração mínima de três meses e máxima de dois anos. No entanto, a Lei nº. 9.615, de 24 de março de 1988 (conhecida como Lei Pelé), estabeleceu que após três anos de sua vigência entraria em vigor uma norma destinada a modificar substancialmente a relação de trabalho do atleta profissional, ao extinguir o instituto jurídico do passe (importância devida por um empregador a outro, pela cessão do atleta durante a vigência do contrato ou após o seu término. Tratava-se do §2º do art. 28, que dispunha:
O vínculo desportivo do atleta com a entidade contratante tem natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais, com o término da vigência do contrato de trabalho.
Observou-se que essa norma legal gerou grande polêmica
no meio futebolístico, sendo criticada pelos clubes, pelo fato de que tornaria
inviável o investimento na formação de novos atletas.
Modificações foram propostas, em 23 de março de 2001,
137 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.44.
75
sendo editada a Medida Provisória nº. 2.141, que alterou alguns dispositivos da
Lei Pelé, encontrando-se soluções para amenizar os efeitos do fim do passe138.
Sobre os aspectos éticos do passe, destaca MACHADO139:
Os defensores da extinção pura e simples do instituto o vêem como uma forma irrefletida de escravismo, que transformaria o atleta em ‘mercadoria’. Em oposição, outros preferem caracterizá-lo como um direito de crédito em que o cedido não seria, na verdade, o jogador, mas o contrato de trabalho que celebra com o clube, em que o atleta tem a liberdade de concordar ou não com eventual cessão.
Referencia BARROS 140 que a exploração e gestão do
desporto profissional constituem exercício profissional de atividade econômica,
sujeitando-se, especificamente, à observância dos princípios: da transparência
financeira e administrativa; da moralidade na gestão desportiva; da
responsabilidade social de seus dirigentes e do tratamento diferenciado em
relação ao desporto não-profissional; e da participação na organização esportiva
do país (nova redação dada ao art. 2º, parágrafo único, da Lei nº. 9.615, de 1998).
SILVA 141 afirma que a entidade desportiva formadora do
atleta terá o direito de exigir do novo empregador uma indenização em caso de
transferência. Serão duas modalidades de indenizações:
a) de formação, quando da cessão do atleta durante a
vigência do primeiro contrato, que não poderá exceder a duzentas vezes o
138 A Medida Provisória nº. 2.141 resolveu que a entidade desportiva formadora do atleta terá o direito de assinar com ele, a partir dos dezesseis anos de idade, o primeiro contrato de trabalho profissional, cujo prazo não poderá ser superior a cinco anos. 139 MACHADO, Jaime Eduardo. O novo contrato desportivo profissional. Sapucaia do Sul: Notadez, 2000. p.21. 140 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.108. 141 SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.45.
76
montante da remuneração anual, vedada a cobrança cumulativa penal142 143;
b) de promoção, quando de nova contratação do atleta, no
prazo de seis meses após o término do primeiro contrato, que não poderá exceder
a cento e cinqüenta vezes o montante da remuneração anual, desde que a
entidade formadora permaneça pagando salários ao atleta enquanto não firmado o
novo vínculo contratual.
Afirma ZAINAGHI144 que a cláusula penal não é uma forma
disfarçada da manutenção do passe, mas sim, um meio de se evitar o aliciamento
de jogadores durante uma competição. O prazo previsto inicialmente na Lei nº.
9.615/98, ou seja, de no máximo dois anos, em razão da aplicação subsidiária da
CLT, poderia levar à ocorrência de aliciamento de atletas 145.
Conforme MELO NETO146, a cláusula penal a que se refere o
caput do art. 28, como obrigatória nos contratos de atletas profissionais, é um
pacto acessório em que se estipulam penas, como multas contra aquele que
142 Cumpre assinalar ainda que a Lei Pelé prevê também a obrigatoriedade de constar do contrato de trabalho cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral. A Lei nº. 9.981, de 14 de julho de 2000, estabeleceu os critérios que devem ser observados para a fixação dessa cláusula penal. Assim, o valor respectivo será livremente estabelecido pelos contratantes, até o limite de cem vezes o montante da remuneração anual pactuada. Quando se tratar de atletas profissionais que recebam até dez salários mínimos mensais, o montante da cláusula penal fica limitado a dez vezes o valor da remuneração anual pactuada ou a metade do valor restante do contrato, aplicando-se o que for menor. Haverá a redução automática da cláusula penal apurada, aplicando-se, para cada ano integralizado de vigência do contrato de trabalho, os seguintes percentuais progressivos e não cumulativos: a) 10% após o primeiro ano; b) 20% após o segundo ano; c) 40% após o terceiro ano; d) 80% após o quarto ano. Quando se tratar de transferência internacional, a cláusula penal não será objeto de qualquer limitação, desde que isso esteja expresso no contrato de trabalho (SILVA, Otávio Pinto. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. p.46). 143 A Medida Provisória n. 2.141, dando nova redação ao art. 29 da Lei 9.615/98, assim prevê: Art. 29. A entidade de prática desportiva formadora do atleta terá direito de assinar com este, a partir de dezesseis anos de idade, o primeiro contrato de trabalho profissional, cujo prazo não poderá ser superior a cinco anos. 144 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.15. 145 Neste ponto, a lei ressalvou, no §5º do art. 28, que o limite de cem vezes da remuneração anual, não existirá quando tratar-se de transferência para o exterior. Na redação primitiva da Lei nº. 9.615/98, não havia qualquer diferenciação ou ressalva, caso tratar-se de transferência interna ou para o exterior. 146 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.97.
77
deixar de cumprir obrigação avençada ou contra aquele que lhe retardou o
cumprimento. Esta cláusula penal é de natureza econômica e, regra geral,
consiste no pagamento de uma soma pecuniária ou na execução de qualquer
outra prestação objeto de obrigações, deverá, obrigatoriamente, constar do
contrato entre o atleta e a entidade de prática desportiva.
Oportunamente, cabe reprisar aqui as principais obrigações
contratuais, sejam para as entidades de prática desportiva, seja para os atletas
profissionais, conforme KRIEGER147:
Para associações legais, dentre outras: registrar o contrato na CTPS do atleta; o pagamento do salário contratado no prazo legal; efetuar os descontos previdenciários e do FGTS e proceder aos respectivos recolhimentos; efetuar, quando for o caso, os descontos devidos ao Imposto de Renda, procedendo ao recolhimento; observância à jornada semanal de trabalho de 44 horas; o pagamento de percentual devido por conceito de ‘direito de arena’; seguro obrigatório.
São obrigações contratuais, dentre outras: pagamento das luvas e prêmios (bichos) por vitória/empate; o fornecimento de acomodações e/ou alimentação; pagamento do percentual contratado para os casos de cessão temporária ou definitiva do atleta, respeitado o mínimo legal.
Para o atleta profissional são obrigações legais: cumprir os horários de trabalho (treinos e jogos) determinados pela associação; não praticar atos de improbidade; não ter incontinência de conduta ou mau procedimento; não cometer atos de embriagues, desídia, abandono de emprego, prática constante de jogos de azar.
São obrigações contratuais do atleta profissional: concentrar-se e/ou ficar à disposição da associação quando determinado por ela; cumprir com empenho as prescrições específicas quanto a treinamento, tratamento médico, alimentação etc.; utiliza-se
147 KRIEGER, Marcílio César Ramos. Comentários ao CBDF. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p.113.
78
apenas dos uniformes fornecidos pela associação, quando assim por ela determinado.
A legislação visa a proteção do clube formador, ou seja,
aquele que investe nas chamadas ‘categorias de base’, com assistência médica,
preparação física, proporciona-lhe, enfim, oportunidade de praticar a profissão de
atleta no futuro.
O §2º do mesmo artigo, com a redação que lhe foi dada pela
Lei n. 9.981, de 14 de julho de 2000, prevê:
§2º. A entidade de prática desportiva detentora do primeiro contrato de trabalho com o atleta por ela profissionalizado terá o direito de preferência para a primeira renovação desse contrato.
A Lei nº 9.615/98, visando a não desestimular o investimento
dos clubes na formação de atletas, determina em seu art. 29 que “a entidade de
prática desportiva formadora de atleta terá o direito de assinar com este o primeiro
contrato profissional, cujo prazo não poderá ser superior a dois anos”.
E o Decreto nº. 2.574/98, em seu art. 31, complementa o
dispositivo legal supra:
Art. 31 . A entidade de prática desportiva formadora de atleta terá o direito de assinar com este o primeiro contrato de profissional, cujo prazo não poderá ser superior a dois anos.
§1º. Comprova-se a condição de entidade de prática formadora de atleta pela presença de formal contrato de estágio de atleta semiprofissional, firmado entre as partes, com o comprovado cumprimento de um vínculo mínimo igual ou superior a dois anos.
§2º. A prática exercida entre o atleta e a entidade de prática
79
desportiva, na categoria de amador de qualquer tempo de duração, ou de semiprofissional com estágio inferior a dois anos, não gera vínculo nem o direito de exercício da preferência na profissionalização.
§3º. O direito previsto no caput deste artigo é indelegável e intransferível, sob qualquer forma ou modalidade.
§4º. A entidade detentora do primeiro contrato de trabalho do atleta por ela profissionalizado terá direito de preferência para a primeira renovação deste contrato, sendo facultada a cessão deste direito a terceiros, de forma remunerada ou não.
ZAINAGHI148 fundamenta que não poderá o clube apenas
investir na formação do atleta, mas deverá investir por um período de no mínimo
dois anos. Se o prazo de formação for inferior, o atleta poderá celebrar seu
primeiro contrato com qualquer outra entidade de prática desportiva. O primeiro
contrato poderá conter a cláusula penal prevista no art. 28, mas, caso o atleta
queira transferir-se para outro clube, este deverá pagar ao empregador anterior,
uma indenização de até duzentas vezes o valor da remuneração anual, caso em
que a cláusula penal não vigorará. Esta indenização recebeu a denominação de
formação149.
Para alguns juristas, conforme destaca MELO NETO150, a
cláusula penal tem duas finalidades:
a) estimular o devedor ao cumprimento da obrigação,
mediante a ameaça de ter de pagar a importância da pena;
b) servir de sucedâneo da indenização por perdas e danos,
dispensando o processo da respectiva liquidação, pois é o equivalente legal dos
prejuízos do credor.
148 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.17 149 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.17. 150 MELO FILHO, Álvaro. Lei Pelé: comentários à Lei nº. 9.615/98. p.97.
80
O art. 29 da Lei nº. 9.615/98 contempla no seu caput o direito
de clube formador de atleta de assinar com ele o primeiro contrato de profissional,
cujo prazo não poderá ser superior a dois anos.
Quando não mais se tratar do primeiro contrato, a Lei nº.
9.981/2000 fixou nova regra no tocante ao prazo determinado dos contratos de
trabalho dos atletas profissionais, estabelecendo vigência nunca inferior a três
meses nem superior a cinco anos.
Destaca também BARROS151 que o contrato de trabalho do
atleta, a teor do art. 28 da Lei Pelé, com o §3º, introduzido pela Lei nº. 9.981, de
2000, e 4º, com a redação dada pela Lei nº. 10.672, de 2003, deverá conter,
obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento,
rompimento ou rescisão unilateral. O valor dessa cláusula será estabelecido
livremente pelas partes, não podendo exceder de cem vezes o montante da
remuneração anual pactuada.
O ordenamento jurídico voltado à legislação especial salienta
que o alcance e os limites desta normativa especial deverão respeitar os preceitos
constitucionais, entre os quais o direito ao trabalho e à livre escolha de trabalho,
ofício ou profissão (art. 5º, XIII, da Constituição da República de 1988). A fim de
dar efetividade ao comando constitucional, revogou-se, com a Lei nº. 9.615, de
1998, o art. 11 da Lei nº. 6.354, de 1976, que previa o controvertido instituto do
passe no nosso direito. O passe era um instrumento que permitia a contratação do
atleta por outro empregador, depois de comprovada a sua desvinculação da
associação desportiva à qual prestava serviços. O passe, com a característica de
mecanismo auto-defensivo, impedia o livre exercício da profissão pelo jogador de
futebol, o qual, após cumprir fielmente o seu contrato por prazo determinado,
dificilmente conseguiria o atestado liberatório e, em conseqüência, ficava tolhido o 151 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. p.101.
81
seu livre exercício da profissão.
Segundo as normas da FIFA que regem a matéria, um clube
poderá adquirir os serviços de um atleta que tenha contrato de trabalho vigendo
com outra entidade de prática esportiva, só que deverá comunicar seu interesse a
esta, antes de iniciar qualquer negociação com o jogador: a não observância deste
preceito sujeitará o infrator a multas previstas nos estatutos daquela entidade
internacional. Por outro lado, tendo o contrato esperado, o atleta e eventual novo
clube não terão a obrigação de informar o antigo empregador152.
Acontece que a Lei nº. 10.672, de 15 de maio de 2003, ao
alterar a redação do §3º do art. 31 da Lei nº. 9.615, de 1998, deixou claro que se a
rescisão contratual153 se operar por atraso no pagamento de salário, na forma do
caput deste artigo, a multa rescisória em favor do atleta será conhecida pela
aplicação do disposto no art. 479 da CLT, isto é, o empregado receberá a metade
da remuneração que lhe seria devida pelo tempo restante do contrato. Não se
trata, a rigor, de multa, mas de uma indenização pela ruptura antecipada do
contrato. Não há dúvida, entretanto, de que o objetivo do legislador foi excluir o
atleta da cláusula penal a que se refere o art. 28 da Lei nº. 9.615, de 1998,
mantendo-a apenas em favor da entidade de prática desportiva, apesar da
contradição com o art. 33.
Admitir-se a cláusula penal apenas em favor da associação
desportiva implica tratamento desigual vai de encontro com o princípio teleológico
da normativa inserida na Lei nº. 9.615, de 1998, que é exatamente abolir as
dificuldades no desligamento do atleta, em nome da liberdade de contratar e de
distratar.
Para os casos de suspensão do contrato de trabalho, alerta
ZAINAGHI154 que o contrato ficará suspenso quando o empregado (atleta ou não),
152 ZAINAGHI, Domingos Sávio et al. Direito desportivo. p.76. 153 A rescisão sempre ocorrerá antes do prazo final do contrato, pois quando o mesmo chega ao seu fim, está-se diante de um caso de resolução contratual. 154
82
não prestar o serviço e o empregador não tiver obrigação de pagar salários, não
se computando o tempo de paralisação como de tempo de serviço. Esta
suspensão ocorre com o afastamento por doença, após os primeiros 15 dias; a
licença sem remuneração; as suspensões disciplinares, entre outros.
De outra via, haverá interrupção no contrato de trabalho
quando o empregado não presta serviços, mas subsiste ao empregador a
obrigação de pagar salários e o tempo de paralisação é computado como tempo
de serviço. Os casos de interrupção ocorrem quando: os primeiros 15 dias de
afastamento por doença; as férias; o repouso semanal, entre outros155.
Assim, ao atleta profissional aplicam-se as regras gerais que
tratam da matéria, além das específicas previstas na Lei nº. 9.615/98. Por isso,
terá seu contrato suspenso o atleta afastado por enfermidade, após 15 dias
quando os salários não serão mais devidos, cabendo ao INSS o pagamento do
auxílio doença, este na forma da lei previdenciária; quando estiver suspenso
disciplinarmente, pelo clube ou pela federação ou confederação, e desde que não
treine ou cumpra com qualquer outra obrigação contratual etc.
Como exemplos específicos do contrato de trabalho do atleta
profissional, têm-se a participação em seleções (art. 41). No §1º do art. 41, está
previsto que “a entidade convocadora indenizará a cedente dos encargos
previstos no contrato de trabalho, pelo período em que durar a convocação do
atleta, sem prejuízo de eventuais ajustes celebrados entre este e a entidade
convocadora”156.
Por essa disposição legal, conclui o autor ZAINAGHI157 que
no caso de participação do atleta profissional em seleções, subsistirá a obrigação
do empregador pagar os salários do empregado. O clube terá de cobrar da
entidade convocadora os valores referentes aos salários pagos por este ao clube
durante o período de convocação. 155 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.38. 156 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.38. 157 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.39.
83
3.2 TERMINAÇÃO DO CONTRATO E PASSE LIVRE
O contrato de atleta profissional quando termina, põe fim
também ao vínculo desportivo, ou seja, extinto o pacto celebrado entre as partes,
o jogador é livre para firmar contrato de trabalho com outro clube, caso assim o
desejar.
Cita o art. 93 da Lei nº. 9.615/98:
Art. 93 . O disposto no art. 28, §2º, desta Lei somente produzirá efeitos jurídicos a partir de 26 de março de 2001, respeitados os direitos adquiridos decorrentes dos contratos de trabalho e vínculos desportivos de atletas profissionais pactuados com base na legislação anterior.
Percebe-se então que desde 26 de março de 2001 não
existe mais a figura do passe no direito brasileiro. Em sua redação original, assim
estava redigido o art. 93:
Art. 93 . O disposto no §2º do art. 28 somente entrará em vigor após três anos a partir da vigência desta lei.
Esta alteração ocorreu em virtude da não previsão de
proteção expressa dos direitos adquiridos. ZAINAGHI158 entende que não havia
necessidade de tal alteração, uma vez que a Constituição Federal já tratava do
direito adquirido no inciso XXXVI, do art. 5º:
Art. 5º. (...)
XXXVI – A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
158 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.46.
84
No caso do passe, o clube já é detentor do direito desde o
ato da assinatura do contrato de trabalho, pois pode, inclusive, negociar durante a
vigência do pacto trabalhista. A conclusão de ZAINAGHI159 é a de que para os
contratos celebrados antes de 26 de março de 2001, o instituto do passe (vínculo
desportivo) continuará existindo. De outro modo, todo contrato de trabalho
celebrado a partir de 26 de março de 2001, não poderá conter cláusula a respeito
do passe, pois este não existe mais. Para os casos antigos, aplicam-se as normas
que regulamentam o passe, expedidas pela CBF.
3.3 JURISPRUDÊNCIAS.
Para ilustrar o presente trabalho e demonstrar que os
principais temas aqui transcritos estão em evidência, transcreve-se alguns
julgados dos Tribunais do Trabalho do sul do Brasil, como o TRT da 4ª região, o
TRT 9ª Região e principalmente do TRT da 12ª Região.
Processo: Nº: 00537-2006-015-12-00-7
Ementa: ATLETA PROFISSIONAL. CLÁUSULA PENAL
PREVISTA NO ART. 28 DA LEI Nº 9.615/1998. APLICAÇÃO TANTO EM FAVOR
DO CLUBE COMO DO ATLETA. A cláusula penal prevista no art. 28 da Lei nº
9.615/1998 para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão
unilateral do contrato do atleta profissional é dirigida a ambos os contratantes. A
conclusão decorre da natureza sinalagmática do contrato.
Acórdão - Juíza Marta M. V. F. Fabre - Publicado no
TRTSC/DOE em 12-08-2008
159 ZAINAGHI, Domingos Sávio. Nova legislação desportiva: aspectos trabalhistas. p.46.
85
Processo: Nº: 01917-2007-024-12-00-0
Ementa: VÍNCULO DE EMPREGO. ATLETA. O
reconhecimento do vínculo de emprego do atleta com o clube não prescinde da
configuração simultânea de todos os elementos caracterizadores estatuídos no art.
3º da CLT. Não comprovados tais pressupostos, é impositiva a manutenção do
julgado que indeferiu a pretensão.
Acórdão - Juíza Teresa Regina Cotosky - Publicado no
TRTSC/DOE em 28-10-2008
Processo: Nº: 01808-2007-038-12-00-6
Ementa: VÍNCULO DE EMPREGO. ATLETA. INEXISTÊNCIA.
O reconhecimento da relação de emprego está condicionado à presença, de forma
concomitante, de todos os elementos que a caracterizam, quais sejam,
onerosidade, pessoalidade, não-eventualidade, subordinação jurídica e
dependência econômica. A ausência de um desses elementos desnatura o vínculo
nos moldes pretendidos.
Acórdão - Juiz Geraldo José Balbinot - Publicado no
TRTSC/DOE em 11-07-2008
Processo: Nº: 01808-2007-038-12-00-6
Ementa: VÍNCULO DE EMPREGO. ATLETA. INEXISTÊNCIA.
O reconhecimento da relação de emprego está condicionado à presença, de forma
concomitante, de todos os elementos que a caracterizam, quais sejam,
onerosidade, pessoalidade, não-eventualidade, subordinação jurídica e
dependência econômica. A ausência de um desses elementos desnatura o vínculo
nos moldes pretendidos.
86
Acórdão - Juiz Geraldo José Balbinot - Publicado no
TRTSC/DOE em 11-07-2008.
Processo: Nº: 04469-2006-050-12-00-2
Ementa: RECURSO ORDINÁRIO. ATLETA AMADOR. LEI N.
9.615/98. A modalidade esportiva não reconhecida como desporto de rendimento
profissional não constitui obstáculo à aplicação da CLT, quando caracterizada a
condição jurídica de empregado, nos moldes do art. 2º da CLT.
Acórdão / - Juiz Marcus Pina Mugnaini - Publicado no
TRTSC/DOE em 07-01-2008.
ACÓRDÃO do Processo 00897-2006-202-04-00-2 (RO)
Data de Publicação: 30/10/2008
Fonte: Diário Oficial do Estado do RGS - Justiça
Juiz Relator: RICARDO TAVARES GEHLING
EMENTA: ATLETA PROFISSIONAL. ACIDENTE DE
TRABALHO NÃO CARACTERIZADO. Não se caracteriza como acidente de
trabalho o mal-súbito sofrido por jogador durante partida de futebol, máxime
quando evidenciado tratar-se de sintoma de doença preexistente e da qual a
empregadora sequer tinha conhecimento. (...)
ACÓRDÃO do Processo 00769-2006-104-04-00-3 (RO)
Data de Publicação: 29/09/2008
Fonte: Diário Oficial do Estado do RGS - Justiça
Juiz Relator: ANA ROSA PEREIRA ZAGO SAGRILO
87
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE.
ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL. CONCENTRAÇÃO. Consoante
disposição expressa do artigo 7º, caput, da Lei n°. 6.354/76, a submissão ao
período de concentração para disputa de partidas previstas no calendário oficial,
bem como a disponibilidade em prol do empregador quando da realização de
jogos em locais diversos da sede da entidade desportiva, são deveres inerentes à
condição de atleta profissional-empregado ostentada pelo reclamante. Respeitado
o prazo máximo de três dias imposto pelo dispositivo legal em comento, resta
inviabilizado o pleito de pagamento de horas extras, não havendo suporte à
pugnada dispensa de tratamento de extraordinariedade ao período de
concentração para jogos, na medida que a legislação especial aplicável
expressamente o caracteriza como obrigação normal, ordinária, que se adere ex vi
legis ao contrato de trabalho especial do atleta profissional. Negado
provimento.(...)
ACÓRDÃO do Processo 02309-2006-201-04-00-9 (RO)
Data de Publicação: 09/09/2008
Fonte: Diário Oficial do Estado do RGS - Justiça
Juiz Relator: MARIA HELENA MALLMANN
EMENTA: RECURSO DA RECLAMADA DIREITO DE
IMAGEM. DIFERENÇAS SALARIAIS. Integram a remuneração os valores pagos a
título de direito de imagem, em razão da regularidade dos pagamentos e porque
foram efetuados independentemente da utilização ou não da imagem. Recurso
não provido. RECURSO DO RECLAMANTE CLÁUSULA PENAL. O rompimento
unilateral do contrato por parte do clube-empregador implica no pagamento da
cláusula penal, a teor do art. 28 da Lei nº 9615/98, o que não se confunde com a
indenização prevista no art. 479 da CLT. Recurso provido.(...)
88
ACÓRDÃO do Processo 00050-2007-292-04-00-4 (RO)
Data de Publicação: 18/08/2008
Fonte: Diário Oficial do Estado do RGS - Justiça
Juiz Relator: ROSANE SERAFINI CASA NOVA
EMENTA: CLÁUSULA PENAL. A disposição contida no
artigo 28 da Lei nº 9.615/98 não se aplica à entidade desportiva, mas somente ao
atleta. De qualquer sorte, no presente caso não ocorreu qualquer das hipóteses
previstas naquele dispositivo legal, já que o contrato de trabalho se extinguiu pelo
advento de seu termo final. Apelo desprovido. ARTIGO 467 DA CLT. Tendo em
vista a inexistência de verbas rescisórias incontroversas devidas ao reclamante,
indevido o acréscimo de cinqüenta por cento previsto no artigo 467 da CLT.
Recurso negado. (...)
TRT-PR-29-08-2008 CLÁUSULA PENAL. ATLETA
PROFISSIONAL. INICIATIVA DO EMPREGADOR. A cláusula penal exigida pelo
art. 28 da Lei 9615/98 estabelece a penalidade tão-somente a favor do
empregador. O que a norma visou garantir é a compensação do investimento que
a entidade de prática desportiva faz no atleta, com treinamento e preparação e a
reparação pela perda do profissional. Esta circunstância justifica a diferença de
efeitos na extinção do contrato dependendo da parte que tomou a iniciativa da
ruptura injustificada.
TRT-PR-04827-2007-594-09-00-0-ACO-30912-2008 - 5A.
TURMA
Relator: DIRCEU BUYZ PINTO JÚNIOR
Publicado no DJPR em 29-08-2008
89
TRT-PR-18-07-2008 ATLETA PROFISSIONAL DE
FUTEBOL. PRIMEIRO CONTRATO. DIREITO CONSTITUCIONAL AO
TRABALHO. Não afronta o direito constitucional ao trabalho a decisão que
determina ao atleta que se abstenha de firmar contrato com outra entidade
esportiva sem a anuência expressa da que foi responsável por sua formação. É
que não faria sentido imaginar que a Lei 9.815/1998 criou para a entidade
desportiva o direito de firmar o primeiro contrato com o novo atleta, porém, sem
gerar qualquer obrigação correspondente, para este. O caráter sinalagmático é da
própria natureza do contrato de trabalho (a cada direito corresponde uma
obrigação) e repercute até mesmo nas tratativas e deveres pré-contratuais. A
alteração empreendida na Lei Pelé pela Lei 10.672/2003 permite que o novo atleta
preste serviços à entidade desportiva formadora que, assim, terá chance de
recuperar ao menos parte do investimento que fez na formação do jogador, sem
onerar em demasia o time ou entidade com que ele venha a firmar novo contrato,
na vigência do primeiro, como fazia a redação anterior do parágrafo. Não há,
portanto, proibição de trabalhar, mas condicionamento que pode ser afastado com
a indenização à entidade formadora. Recurso a que se nega provimento para
manter a decisão que impôs obrigação de não fazer ao recorrente.
TRT-PR-05764-2007-673-09-00-6-ACO-25838-2008 - 2A.
TURMA
Relator: MARLENE T. FUVERKI SUGUIMATSU
Publicado no DJPR em 18-07-2008
TRT-PR-11-07-2008 MEDIDA CAUTELAR. PRETENSÃO DE
ATRIBUIR EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO. IMPROCEDÊNCIA. A decisão
que concede direito de preferência a entidade esportiva formadora de atleta de
futebol, para sua primeira contratação, não representa risco de preJuizo
irreparável a ponto de justificar a concessão de medida cautelar para atribuir efeito
90
suspensivo ao recurso. A matéria é polêmica e desaconselha qualquer espécie de
providência que venha a criar riscos até mesmo para o jogador, que poderá
enfrentar sérias dificuldades em restituir valores ou se desvincular de entidade a
que possa ter se filiado, na hipótese de manter-se a decisão de fundo que acolheu
a pretensão aJuizada pela entidade esportiva. De outra parte, não se vislumbra
perigo de dano irreparável pela espera do julgamento do recurso, especialmente
em face da prova de que não há violação do direito constitucional ao trabalho, pois
a entidade oferece condições para que o atleta preste serviços. Medida cautelar
rejeitada.
TRT-PR-01008-2007-909-09-00-0-ACO-24268-2008 - 2A.
TURMA
Relator: MARLENE T. FUVERKI SUGUIMATSU
Publicado no DJPR em 11-07-2008
91
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo do presente trabalho acadêmico foi à análise do
contrato de trabalho do atleta profissional de futebol.
O interesse do autor desta monografia pelo tema abordado
no presente trabalho acadêmico, deu-se em virtude ao interesse na área do Direito
Desportivo e pela paixão ao esporte, em especial o futebol.
O desenvolvimento lógico do presente trabalho decorreu pela
sua divisão em três capítulos.
No primeiro capítulo, foram explorados aspectos históricos
do surgimento do futebol, das leis desportivas no mundo e no Brasil, destacando a
Lei 9.615/98 (Lei Pelé) e suas alterações e a distinção entre atleta profissional,
não-profissional e amador.
A importância deste capítulo foi de identificar o histórico da
lei desportiva no Brasil e identificar a distinção de atleta profissional, não-
profissional e amador.
O segundo capítulo abordou aspectos destacados no Direito
do Trabalho, com ênfase no contrato de trabalho na CLT e sua subordinação
jurídica.
No terceiro e último capítulo, foi estudado o contrato do atleta
profissional de futebol e a terminação do contrato e do passe livre.
Deste capítulo, específico sobre o tema, extrai-se que a
atividade do atleta profissional, de todas as modalidades desportivas, é
caracterizada por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado
com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá
conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento,
92
rompimento ou rescisão contratual.
A entidade de prática desportiva formadora do atleta terá
direito de assinar com este, a partir de dezesseis anos de idade, o primeiro
contrato de trabalho profissional, cujo prazo não poderá ser superior a cinco anos.
O contrato de trabalho do atleta terá prazo determinado, com
vigência nunca inferior a três meses nem superior a cinco anos, a sua prorrogação
por acontecer mais de uma vez e sua renovação não está sujeita a interstício de
seis meses entre os dois contratos.
A rescisão contratual se operar por atraso no pagamento de
salário, a multa rescisória em favor do atleta será conhecida pela aplicação do
disposto no art. 479 da CLT, isto é, o empregado receberá a metade da
remuneração que lhe seria devida pelo tempo restante do contrato. Não se trata, a
rigor, de multa, mas de uma indenização pela ruptura antecipada do contrato.
Suspensão do contrato de trabalho, o contrato ficará
suspenso quando o empregado (atleta ou não), não prestar o serviço e o
empregador não tiver obrigação de pagar salários, não se computando o tempo de
paralisação como de tempo de serviço. Esta suspensão ocorre com o afastamento
por doença, após os primeiros 15 dias; a licença sem remuneração; as
suspensões disciplinares, entre outros.
De outra via, haverá interrupção no contrato de trabalho
quando o empregado não presta serviços, mas subsiste ao empregador a
obrigação de pagar salários e o tempo de paralisação é computado como tempo
de serviço. Os casos de interrupção ocorrem quando: os primeiros 15 dias de
afastamento por doença; as férias; o repouso semanal, entre outros.
No caso de participação do atleta profissional em seleções,
subsistirá a obrigação do empregador pagar os salários do empregado. O clube
terá de cobrar da entidade convocadora os valores referentes aos salários pagos
por este ao clube durante o período de convocação.
93
O contrato de atleta profissional quando termina, põe fim ao
vínculo desportivo, ou seja, extinto o pacto celebrado entre as partes, o jogador é
livre para firmar contrato de trabalho com outro clube, caso assim desejar.
Comprova-se pelas jurisprudências trazidas, focadas no TRT
da 4ª região,no TRT 9ª Região e principalmente no TRT da 12ª Região e a qual
pertencemos.
Assim sendo, as hipóteses argüidas para a realização do
presente trabalho acadêmico ratificam-se da seguinte forma:
a) existem diferenças entre atleta profissional, atleta não-
profissional e atleta amador;
Confirmando, o atleta profissional pratica esporte como
profissão, remuneração pactuada em contrato formal de trabalho, firmado entre o
atleta e a entidade desportiva. O atleta não-profissional é identificado pela
liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo permitido o
recebimento de incentivos materiais e patrocínios. E o amador, entregam-se à
prática de qualquer modalidade sem qualquer forma de remuneração ou
incentivos materiais, ou seja, aqueles que não recebem nenhuma compensação
econômica como conseqüência da prática esportiva e não têm nenhum outro
interesse que não seja o do simples revigoramento físico, euforia da saúde ou
passatempo.
b) o instituto do passe ainda existe no contrato de trabalho do
atleta profissional de futebol;
Não confirmado, pois o passe foi extinto através da Lei Pelé
9.615/98, conforme o art. 28 §2. O vínculo desportivo do atleta com a entidade
contratante tem natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício,
dissolvendo-se para todos os efeitos com término da vigência do contrato de
trabalho. Ou seja, extinto o pacto celebrado entre as partes, o jogador é livre para
firmar contrato de trabalho com outro clube, caso assim desejar.
94
c) o contrato de trabalho do atleta profissional de futebol
apresenta particularidades diferentes do contrato de trabalho previsto da CLT.
Confirmando as particularidades existentes entre os
contratos, são elas: a forma da celebração do contrato, a duração do contrato, a
rescisão.
1) A primeira diferença é observada em relação à forma de
celebração do contrato. O art. 443 da CLT dispõe que o contrato individual de
trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito.
Porém, a regra específica trazida pela Lei 9.615/98 indica, no art. 28, “caput”, que
o contrato de trabalho do todo atleta profissional dever ser pactuado formalmente
– leia-se, por escrito. Esta obrigatoriedade da forma escrita deve-se ao fato de que
o atleta não terá regular condição de jogo até que seu contrato seja devidamente
registrado na entidade de administração da modalidade (art. 34, I Lei 9.615/98).
Todavia, vale lembrar que a ausência do instrumento contratual na forma escrita
não impede, de forma alguma, a formação e reconhecimento de vínculo
empregatício. A ausência da formalidade gera,contudo, prejuízos. O atleta não
poderá disputar competições profissionais e o clube não poderá exigir cláusula
penal pela rescisão antecipada do contrato.
2) A segunda diferença refere-se à duração da relação de
trabalho. Em respeito ao princípio da continuidade, a legislação trabalhista
estipulou, no art. 443 da CLT, que, via de regra, os contratos de trabalho vigoram
por prazo indeterminado,apenas excetuando-se aqueles previstos no artigo 443, §
2° e na Lei nº 9.601/98. E,mesmo admitindo a fixaçã o de um prazo em casos
específicos, a legislação trabalhista limitou a duração em 2 anos, conforme o
artigo 445, prevendo, ainda, que o contrato renovado por mais de uma vez
passará a vigorar sem qualquer determinação de prazo (art. 451). No caso dos
atletas profissionais, a regra é a determinação do prazo de validade dos
instrumentos contratuais. Pela letra do artigo 30 da Lei 9.615/98, os contratos
terão validade mínima de 3 meses e máxima de 5 anos; o párgrafo único deste
mesmo artigo rejeita, expressamente, a aplicabilidade do disposto no artigo 445 da
95
CLT.
3) Quanto à hipótese de ocorrência de rescisão antecipada
do contrato de trabalho, a CLT dispõe, no art. 480, caput e § 1º, que, quando o
empregado der causa à rescisão, sem justa causa, estará obrigado a indenizar o
empregador dos prejuízos que desse fato lhe resultarem, não podendo exceder ao
que teria direito o empregado em idênticas condições. Na legislação específica
sobre o desporto, quando o jogador der ensejo ao término antecipado da
contratualidade estará obrigado ao pagamento da “cláusula penal”, devida pelo
atleta ao clube (artigo 28, § 3°). A cláusula penal é livremente estabelecida pelas
partes.
No caso de a rescisão antecipada se der por iniciativa do
empregador, ao clube é dado o mesmo tratamento da CLT. O art. 31, §3º, da Lei
9.615/98 dispõe que o clube deverá pagar ao atleta uma “multa rescisória”,
estipulada de acordo com o artigo 479 da CLT, que prevê o pagamento de metade
da remuneração a que teria o direito o empregado até o fim do contrato.
O importante é se ter a noção de que o jogador de futebol é
empregado e o seu contrato de trabalho são aplicadas as regras da Consolidação
das Leis Trabalhistas, desde que compatíveis com a Legislação Especial.
Tecidas tais considerações, cumpre o presente trabalho
acadêmico sua finalidade institucional, qual seja, a produção de Monografia para
obtenção do título de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI e investigatória, buscando através de pesquisa bibliográfica,
jurisprudencial e doutrinária o exame do tema proposto.
96
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