sobre will eisner e a narrativa sequencial

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  • 7/30/2019 Sobre Will Eisner e a Narrativa Sequencial

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    Sobre

    Will Eisnernarrativasequenciale apor Guilherme G. Santos

    Universidade Federal do Rio de JaneiroEscola de Belas Artes - Comunicao Visual DesignDisciplina Anlise da Imagem D - 2012.2Proessor Salmo Dansa

    Aluno Luiz Guilherme Gomes dos Santos | 111232051

  • 7/30/2019 Sobre Will Eisner e a Narrativa Sequencial

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    IntroduoDurante o incio da dcada de trinta, iniciava-se no ocidente uma era da arte sequencial que viria a ser conhecida como os anos douradosdos quadrinhos. Histrias de intriga policial e heris antsticos eram os temas mais populares da poca, e o trabalho era executado demaneira visceral pelos artistas do ramo. Isso mudou devido ao trabalho de alguns artistas pioneiros, especialmente Will Eisner, um qua-drinista que enxergaria nos quadrinhos uma orma de expresso artstica, carente de ateno acadmica e um estudo mais aproundadode suas tcnicas e princpios uncionais.

    Comparao a ContemporneosOs quadrinistas da dcada de trinta preocupavam-se mais com a anlise de pblico e mercado, e executavam sua arte de maneira instin-tiva. Alguns deles eram capazes de executar obras de grande eloquncia, porm apenas por meio da lenta e rdua experimentao, semum entendimento didaticamente organizado dos prprios mtodos.

    A preocupao com o estudo dos elementos componentes do quadrinho tornava-se evidente no trabalho de Eisner quando comparadocom o trabalho da maioria de seus contemporneos. Ele se empenhou em analisar a orma do quadrinho e os componentes relevantes deuma narrativa sequencial compreensiva, e oi capaz de empregar conscientemente esse estudo como mtodo em sua obra.

    Abordagem da Arte SequencialEisner dividiu o entendimento dos quadrinhos em seus elementos mais importantes: a imagem, o timing, o quadro, a pantomima e o

    texto. Juntos esses cinco elementos ormavam as bases de qualquer narrativa sequencial, e o emprego deles, bom ou mal, aetava direta-mente a capacidade de uma obra de contar histrias visualmente.

    Imagem

    Em seu estudo Eisner compreendeu elementos importantes da comunicao visual, entre eles o signo e a linguagem simblica. O signo,como entende a comunicao visual, composto pela sua orma sica e por um conceito mental que lhe est associado. Este conceito ,por sua vez, uma apreenso da realidade externa. O signo apenas se relaciona com a realidade atravs dos conceitos e das pessoas que ousam. A principal uno dos signos seria permitir partilhar algo com algum, ou inormar algum, de modo que o signo se associa aosobjetos e s pessoas que participam, de maneira bem determinada, socialmente condicionada, do processo de comunicao.

    Nos quadrinhos o artista az uso de signos para resgatar um signicado amiliar da experincia do leitor. O signicado e interpretaodos signos podem ser alterados de acordo com a maneira como so empregados, assemelhando-se a palavras. Coisas como vestimentas,

    objetos conhecidos, expresso acial e dilogo alteram o sentido da imagem, expressando mensagens emocionais especcas.

    Por meio desses smbolos, e em conjunto com os outros elementos chave do quadrinho, o artista capaz de contar uma histria semdilogo escrito. O dilogo sugerido e o leitor capaz de completa-lo a partir da sequencia de imagens.

    Timing

    O tempo um componente essencial do nosso universo, e sua percepo sempre esteve intimamente presente na experincia humana.Porm a percepo do tempo mais sutil do que outros elementos ao nosso redor, e especialmente dicil de ser expresso visualmente.

    A comunicao do tempo em imagens estticas um dos desaos enrentados pelo quadrinista. Aos quadrinhos alta a dimenso demovimento que natural experincia sica e ao cinema, e oi da tentativa de sanar esse problema que surgiu a narrativa sequencial.

    Dessa orma o tempo um dos elementos undamentais da estrutura dos quadrinhos. Sendo uma das bases da experincia da vida, por meio dele que o artista constri histrias capazes de transmitir suspense, terror, humor, surpresa, situaes que existem intimamenteem uno do tempo.

    A iluso da passagem de tempo nos quadrinhos conhecida como timing. Essa passagem expressa atravs da interao entre quadro econtedo. A sequencialidade no existe se um desses elementos no estiver presente, e ocorre mal se no houver uma boa interao entreeles. O quadro em branco no passa nenhum decorrer de acontecimentos, e o contedo no segmentado perde a serializao de eventos.

    A orma do quadro explorada na tentativa de transmitir a iluso de tempo. Altera-se seu equilbrio, sua congurao e sua orma emrelao pgina e a outros quadros, nessa tentativa. O tamanho do quadro em relao pgina e em relao a outros quadros, a suaposio em relao pgina e em relao aos outros quadros e a quantidade de quadros em uma pgina so algumas das variaes quealteram drasticamente o entendimento subliminar da passagem de tempo.

    No mbito do contedo, a arte sequencial az uso novamente de signos para expressar a passagem de tempo. Esses signos resgatam o

    conhecimento de dierentes passagens de tempo que esto relacionadas a eles. Seja o nascer e por do sol, que transcorre um dia, o ger-minar de uma semente em broto e rvore que pode levar meses ou anos, ou o simples cair de uma moeda que transcorre em um brevemomento. por meio dessa presuno, por parte do leitor, da natureza da ocorrncia desses elementos na realidade, que o quadrinista capaz de narrar a passagem de tempo.

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    Quadro

    A uno do quadro na arte sequencial segmentar os acontecimentos da narrativa e disp-los ordenadamente de maneira a contar umahistria. Assim como os quadros so usados para expressar a passagem de tempo, eles tambm so necessrios para o encapsulamentode aes, guras, ideias, lugares ou contextos, para que seja possvel organiza-los em uma sequncia compreensvel. Eles so empregadosmais como orma de expresso artstica, capaz de infuenciar a narrativa, do que uma limitao do meio, como na cinematograa.

    Assim como na leitura de palavras, importante que a narrativa visual transcorra fuidamente e sem interrupes, que viriam a prejudi-car a comunicao dos acontecimentos. Para que isso seja possvel, o artista busca criar imagens de cil compreenso, que no deman-dam uma anlise prounda do leitor em cada quadro.

    Para esse m, segundo Eisner, o quadro em si pode ser usado como parte da linguagem visual, recurso narrativo, suporte estrutural eemissrio emocional. O artista utiliza os mais variados quadros ou a ausncia deles para comunicar os acontecimentos e emoes danarrativa da maneira mais imersiva possvel para o leitor.

    Outro elemento narrativo que o quadro est encarregado de exercer a perspectiva. Sendo basicamente uma janela que representa oponto de vista do leitor, a perspectiva capaz de inserir e posicionar o mesmo em relao s aes transcorridas, com a inteno de ma-nipular a sua experincia emocional. Um quadro estreito pode gerar emoo de aprisionamento, enquanto que um quadro expansivo ouinexistente transmite liberdade ou vazio. Um quadro de perspectiva alta analisa os acontecimentos de uma distncia segura, enquantoque uma perspectiva baixa e prxima coloca o leitor vulnervel.

    Pantomima

    A pantomima entende-se como a demonstrao, atravs dos gestos e expresses aciais, de sentimentos, pensamentos e ideias. usada noteatro e na arte perormtica em geral, para transmitir claramente as mensagens da narrativa. No quadrinho ela acilita a compreensode aes sutis e resgata do leitor um vocabulrio extenso de gestos aprendidos.

    A expresso acial e corporal comunicam mais do que palavras, e so capazes de alterar completamente o dilogo de um personagem.Para ser capaz de comunicar com a orma do corpo humano o artista precisa resgatar do repertrio do leitor os gestos que transcrevem anarrativa e todas as aes e emoes envolvidas nela. Esse repertrio varia de cultura a cultura, mas uma quantidade surpreendente deles universal ao ser humano, como o ato de sorrir ou chorar. Dessa orma, tendo em mos esse vocabulrio de gestos, o artista capaz atde atravessar barreiras culturais e lingusticas, e azer entender a sua situao pessoal leitores que no possuem a mesma experinciade vida.

    Situaes estranhas, como em temas de antasia ou culturas exticas, podem ser compreendidas pelo leitor a partir do uso habilidosoda pantomima na inteno de transmitir as emoes humanas bsicas. Mesmo no amiliarizado com aquele ambiente, o leitor est

    amiliarizado com vrias emoes e situaes narradas. Por exemplo, um menino norte americano pode estar entediado na escola damesma maneira que um menino chins estaria entediado na limpeza do monastrio, porm ambos experimentam tdio, e essa emoopode ser comunicada.

    Uma parte importante do tratamento da pantomima no quadrinho a escolha do momento de um gesto a ser ilustrado. Deve se escolhera postura mais representativa da sequncia de acontecimentos, e a sua relevncia decidida levando em considerao qual momento daao mais importante para a compreenso desses acontecimentos. O que se passa entre os gestos e posturas ilustradas preenchidopela imaginao do leitor.

    Texto

    O texto na narrativa sequencial amplamente usado em conjunto com a ilustrao para ormar uma s imagem. Tanto Eisner quantoos artistas de sua poca aziam um uso mais visceral da tipograa, porm Eisner procurou compreender melhor as suas possibilidades

    narrativas.Segundo ele, o controle do ouvido do leitor undamental para que o sentido do dilogo se mantenha conorme as intenes do escritor.Esse controle exercido enatizando visualmente certas palavras, seja pela orma, cor ou posio no espao. Essa intererncia visual naleitura d timos resultados em suas obras, criando composies em que a palavra e imagem se mesclam em uma imagem inteligvel,que capaz de comunicar uma mensagem eloquente e rapidamente compreensvel. No entanto, como no caso de vrios outros artistas,ela por vezes interere negativamente na leitura de textos mais extensos.

    Consideraes FinaisWill Eisner oi responsvel por grande parte da compreenso que temos da narrativa sequencial atualmente, seu estudo adentrou umarea hermtica da expresso artstica popular, e oi capaz de retirar desse meio supostamente simples de comunicao todo um uni-

    verso de possibilidades narrativas. Em uma poca em que o quadrinho era visto com desdm pela comunidade artstica e acadmica,e os prprios prossionais envolvidos no se interessavam em buscar um estudo mais aproundando do meio, Eisner tratou a narrativasequencial com respeito e curiosidade.

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    Reerncias Bibliogrfcas.

    EISNER, Will. Comics and Sequential Art. NY: Poorhouse Press, 1984.

    EISNER, Will. Quadrinhos e Arte Sequencial. SP: WMF MartinsFontes, 2010.

    MCCLOUD, Scott. Understanding Comic Books. NY: Harper, 1994.MCCLOUD, Scott. Making Comic Books. NY: Harper, 2011.