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Rev Esc Enferm USP 2005; 39(1):28-35. 28 COMPARATIVE STUDY OF SOME HEALTH INDICATORS IN MUNICIPALITIES OF THE STATE OF SÃO PAULO IN ACCORDANCE TO THE IMPLEMENTATION OF THE FAMILY HEALTH PROGRAM ESTUDIO COMPARATIVO DE ALGUNOS INDICADORES EN MUNICIPIOS DEL ESTADO DE SÃO PAULO SEGÚN LA IMPLANTACIÓN DEL PROGRAMA SALUD DE LA FAMILIA Mariângela Guanaes Bortolo da Cruz 1 RESUMO Este estudo tem como objetivo descrever comparativamente o comportamento de três indicado- res de saúde: mortalidade infantil; cobertura vacinal/taxa de aban- dono da vacina DPT e hospita- lizações em menores de 5 anos, em dois Blocos de sete municí- pios paulistas, com características sócio-econômicas semelhantes, mas diferenciados por terem implantado (Bloco A) e não implantado (Bloco B) o Programa de Saúde da Família (PSF), sendo parâmetro para esta comparação os mesmos indicadores de saúde para o Estado de São Paulo. Utili- zou-se do cálculo e da descrição dos indicadores para cada Bloco estudado, nos seguintes perío- dos: mortalidade infantil (triênio 1995-997 e 1998-2000), cober- tura vacinal básica (de 1996 a 2000), taxa de abandono da vacina DPT (triênio 1998-2000) e hos- pitalizações em menores de cinco anos (triênio 1998-2000). Veri- ficou-se que a implantação do PSF foi um dos fatores que contribuiu para a queda das taxas de morta- lidade infantil e abandono da vacina DPT. DESCRITORES Indicadores de saúde. Saúde pública. Estudos de avaliação. Programa Saúde da Família. ABSTRACT The purpose of the study is to describe comparatively the beha- vior of three health indicators: infant mortality; vaccination coverage/ abandonment rate of the DPT vaccine; and hospitalization of children under five years of age, in two groups of seven towns of the State of São Paulo each with similar socio-economic characteristics, but differentiated for having imple- mented the Family Health Program (Group A) and not implemented it (Group B group), using as para- meters for such comparison the same health indicators for the State. The study used the calculations and the description of the indicators for each group of municipalities in the following topics and periods: infant mortality rates (1995-1997 and 1998-2000); basic vaccination coverage (from 1996 to 2000); abandonment rate of the DPT vaccine (1998-2000); and hospita- lization of children under five years old (1998-2000). It was found that the introduction of the Family Health Program was one of the factors that contributed for the reduction of infant mortality rates and the rate of abandonment of the DPT vaccine. KEY WORDS RESUMEN Este estudio tuvo por objetivo describir el comportamiento de tres indicadores de salud: mortalidad infantil; cobertura vacuna/tasa de abandono de la vacuna DPT y hospitalizaciones en menores de 5 años, en dos Grupos de siete municipios paulistas, con semejantes características socio económicas pero diferenciados por la implantación (Grupo A) o no (Grupo B) del Programa de Salud de la Familia (PSF) siendo el parámetro para esta descripción los mismos indicadores del Estado de São Paulo. Se utilizó el cálculo y la descripción de los indicadores para cada grupo estudiado, en los siguientes períodos: mortalidad infantil (trienio 1995-1997 y 1998-2000), cobertura de vacunas básica (de 1996 al 2000), tasa de abandono de la vacuna DPT (trienio 1998- 2000) y hospitalizaciones en menores de cinco años (trienio 1998-2000). Se verificó que la implantación del PSF fue uno de los factores que contribuyó para la caída de las tasas de mortalidad infantil y abandono de la vacuna DPT. DESCRIPTORES Recebido: 01/09/2003 Aprovado: 13/02/2004 R ELATO DE P ESQUISA Estudo comparativo de alguns indicadores em municípios do Estado de São Paulo segundo a implantação do Saúde da Família * Health indicators. Public health. Evaluation studies. Family Health Program. * Extraído da dissertação “PSF- Programa de Saúde da Família- comparando a mortalidade infantil, cobertura vacinal e hospitalizações, entre municípios com e sem o Programa no Estado de São Paulo”, Departamento de Saúde Materno–Infantil da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP),2002. 1 Cirurgiã-Dentista. Espe- cialista em Saúde Pública pela Universidade de Ribeirão Preto-UNAERP. Mestre em Saúde Pública pela FSP-USP. [email protected] Indicadores de salud. Salud pública. Estudios de evaluación. Programa Salud de la Familia.

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Page 1: O segundo a implantação do Saúde da Família DE · 2008-03-11 · Estudo comparativo de alguns indicadores em municípios do Estado de São Paulo segundo a implantação do Saúde

Rev Esc Enferm USP2005; 39(1):28-35.

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Mariângela G. B. da Cruz

COMPARATIVE STUDY OF SOME HEALTH INDICATORS IN MUNICIPALITIES OF THE STATE OFSÃO PAULO IN ACCORDANCE TO THE IMPLEMENTATION OF THE FAMILY HEALTH PROGRAM

ESTUDIO COMPARATIVO DE ALGUNOS INDICADORES EN MUNICIPIOS DEL ESTADODE SÃO PAULO SEGÚN LA IMPLANTACIÓN DEL PROGRAMA SALUD DE LA FAMILIA

Mariângela Guanaes Bortolo da Cruz1

RESUMOEste estudo tem como objetivodescrever comparativamente ocomportamento de três indicado-res de saúde: mortalidade infantil;cobertura vacinal/taxa de aban-dono da vacina DPT e hospita-lizações em menores de 5 anos,em dois Blocos de sete municí-pios paulistas, com característicassócio-econômicas semelhantes,mas diferenciados por teremimplantado (Bloco A) e nãoimplantado (Bloco B) o Programade Saúde da Família (PSF), sendoparâmetro para esta comparaçãoos mesmos indicadores de saúdepara o Estado de São Paulo. Utili-zou-se do cálculo e da descriçãodos indicadores para cada Blocoestudado, nos seguintes perío-dos: mortalidade infantil (triênio1995-997 e 1998-2000), cober-tura vacinal básica (de 1996 a2000), taxa de abandono da vacinaDPT (triênio 1998-2000) e hos-pitalizações em menores de cincoanos (triênio 1998-2000). Veri-ficou-se que a implantação do PSFfoi um dos fatores que contribuiupara a queda das taxas de morta-lidade infantil e abandono davacina DPT.

DESCRITORESIndicadores de saúde.Saúde pública.Estudos de avaliação.Programa Saúde da Família.

ABSTRACTThe purpose of the study is todescribe comparatively the beha-vior of three health indicators: infantmortality; vaccination coverage/abandonment rate of the DPTvaccine; and hospitalization ofchildren under five years of age, intwo groups of seven towns of theState of São Paulo each with similarsocio-economic characteristics, butdifferentiated for having imple-mented the Family Health Program(Group A) and not implementedit (Group B group), using as para-meters for such comparison thesame health indicators for the State.The study used the calculationsand the description of the indicatorsfor each group of municipalities inthe following topics and periods:infant mortality rates (1995-1997and 1998-2000); basic vaccinationcoverage (from 1996 to 2000);abandonment rate of the DPTvaccine (1998-2000); and hospita-lization of children under five yearsold (1998-2000). It was found thatthe introduction of the FamilyHealth Program was one of thefactors that contributed for thereduction of infant mortality ratesand the rate of abandonment of theDPT vaccine.

KEY WORDS

RESUMENEste estudio tuvo por objetivodescribir el comportamiento detres indicadores de salud:mortalidad infantil; coberturavacuna/tasa de abandono de lavacuna DPT y hospitalizacionesen menores de 5 años, en dosGrupos de siete municipiospaulistas, con semejantescaracterísticas socio económicaspero diferenciados por laimplantación (Grupo A) o no(Grupo B) del Programa de Saludde la Familia (PSF) siendo elparámetro para esta descripciónlos mismos indicadores delEstado de São Paulo. Se utilizó elcálculo y la descripción de losindicadores para cada grupoestudiado, en los siguientesperíodos: mortalidad infantil(trienio 1995-1997 y 1998-2000),cobertura de vacunas básica (de1996 al 2000), tasa de abandonode la vacuna DPT (trienio 1998-2000) y hospitalizaciones enmenores de cinco años (trienio1998-2000). Se verificó que laimplantación del PSF fue uno delos factores que contribuyó parala caída de las tasas de mortalidadinfantil y abandono de la vacunaDPT.

DESCRIPTORES

Recebido: 01/09/2003Aprovado: 13/02/2004

RELATO D

E PESQ

UISA

Estudo comparativo de alguns indicadoresem municípios do Estado de São Paulosegundo a implantação do Saúde da Família*

Health indicators.Public health.Evaluation studies.Family Health Program.

* Extraído da dissertação“PSF- Programa de Saúdeda Família- comparando amortalidade infantil,cobertura vacinal ehospitalizações, entremunicípios com e sem oPrograma no Estado de SãoPaulo”, Departamento deSaúde Materno–Infantil daFaculdade de SaúdePública da Universidade deSão Paulo (FSP-USP),2002.

1 Cirurgiã-Dentista. Espe-cialista em Saúde Públicapela Universidade deRibeirão Preto-UNAERP.Mestre em Saúde Públicapela [email protected]

Indicadores de salud.Salud pública.Estudios de evaluación.Programa Salud de la Familia.

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INTRODUÇÃO

A necessidade de valorização da atenção bási-ca à saúde das populações não é temática recente.Desde a Conferência Internacional sobre Cuida-dos Primários de Saúde, realizada em 1978, na cida-de russa de Alma Ata, expressava-se este anseio,uma vez que de 80 a 85% das necessidades desaúde são resolvidas neste nível de atenção(1).

A atenção básica pode ser definida como umconjunto de ações de caráter individual ou coleti-vo, situadas no primeiro nível de atenção dos sis-temas de saúde, voltadas para a promoção da saú-de, a prevenção de agravos, o tratamento e a reabi-litação, centrado na qualidade de vida das pesso-as e de seu meio ambiente(2).

Há diferentes possibilidades que vêm sendoexperimentadas no âmbito da organização da aten-ção básica, no sentido de atender aos princípiosda integralidade das ações, do impacto e da não-rejeição da demanda; neste contexto, no âmbitodas práticas de saúde, o Programa de Saúde daFamília (PSF) vem se consolidando como eixoreestruturante da atenção primária(3-4).

O PSF se alicerça sobre três grandes pilares: ogrupo (família), o território e a responsabilização,respaldado pelo trabalho em "time" ou equipe(5),constituída essa por: um médico, um enfermeiro,dois auxiliares de enfermagem e de 4 a 6 agentescomunitários de saúde (ACS) em regime de traba-lho integral (40hs semanais), responsáveis peloatendimento de até 4.500 habitantes(6). Além des-sas, constatam- se outras diferenças entre a estra-tégia Saúde da Família e a atenção básica "tradici-onal", principalmente no que se refere ao processode trabalho dos profissionais, como: o vínculoequipe-comunidade proporcionado pela adscriçãoda clientela e pelas visitas mensais dos ACS (mo-radores de sua própria área de atuação) aos lares;atendimento domiciliar quando da impossibilidadede deslocamento; reuniões semanais da equipe paraplanejamento e discussão de casos; reuniões sis-temáticas com as comunidades.

Essas diferenças levaram à formulação da hi-pótese desse estudo, ou seja, de que a implanta-ção do PSF poderia melhorar a qualidade da aten-ção básica, tanto em ações de caráter individual(cuidado médico individual) quanto nas ações co-letivas (cuidado família-domicílio).

A partir de 1994, implantado primeiramente emcidades pequenas, em áreas de baixa densida-de populacional onde a regra era a escassezde serviços e de profissionais de saúde, o PSFapresentou resultados extraordinários,

afirma Capistrano(5) reiterando a hipótese principaldesse trabalho. Além disto, o Ministério da Saúdeconsidera Saúde da Família como estratégiaprioritária das políticas de saúde, apontando den-tre as conquistas para os municípios que o implan-taram: a diminuição da mortalidade infantil, amelhoria da cobertura vacinal, a diminuição dasinternações e filas nos hospitais, entre outras(7).

Contudo, a Secretaria de Estado da Saúde deSão Paulo reconhece que, apesar da implantaçãodo PSF em muitos municípios do Estado, estesapresentam ainda sérios problemas na atençãobásica, como a falta de resolutividade e qualidadedas ações(8). Diante dessas afirmações um tantocontraditórias, este estudo tem como objetivo prin-cipal descrever comparativamente o comportamen-to de três indicadores de saúde: mortalidade infan-til; cobertura vacinal/taxa de abandono da vacinaDPT e hospitalizações em menores de 5 anos, emdois Blocos de sete municípios paulistas, com ca-racterísticas sócio-econômicas semelhantes, masdiferenciados por terem implantado (Bloco A) enão implantado (Bloco B) o Programa de Saúde daFamília (PSF), sendo parâmetro para esta compara-ção os mesmos indicadores de saúde para o Esta-do de São Paulo, no período de 1995 a 2000.

CONSIDERAÇÕES SOBRE OSINDICADORES DE SAÚDE ESTUDADOS

Mortalidade infantil

O coeficiente de mortalidade infantil (CMI)mede o risco que tem um nascido vivo de morrerantes de completar um ano de idade, calculado pelarazão entre os óbitos em menores de um ano, pelonúmero de nascidos vivos em um determinado pe-ríodo e local(9).

A mortalidade infantil pode ocorrer em doisperíodos diferentes, cujas causas de morte sãousualmente ligadas a diferentes conjuntos de cau-sas(10). O primeiro período, chamado mortalidadeinfantil neonatal, é constituído pelas mortes ocor-ridas nas quatro primeiras semanas de vida depoisdo nascimento (até a criança completar 27 dias). Aqueda do CMI neonatal é mais lenta e difícil mes-mo nos países desenvolvidos, pois não dependesomente da assistência básica à gestante (pré-na-tal), mas também da estruturação da assistênciamédico-hospitalar, da existência de maternidades,berçários e UTIs pediátricas e neonatais com vári-os níveis de complexidade e qualidade de atendi-mento, que envolvem desde pessoal especializadoaté a moderna e custosa tecnologia de equipamen-tos(11). O segundo período da mortalidade infantil

Estudo comparativode alguns indicadoresem municípios doEstado de São Paulosegundo aimplantação doSaúde da Família

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envolve os óbitos ocorridos entre o 28° dia devida e o momento em que a criança completa umano, recebendo o nome de mortalidade infantil tar-dia, ou pós-neonatal(12). As mortes tardias são cau-sadas pelos conjuntos de problemas sociais e desaúde que podem afetar a criança no decorrer doseu primeiro ano de vida. São essas condiçõesque determinarão como a mortalidade infantil tar-dia se comportará em determinada população(10).

A importância em estudar o CMI é que pelosdiversos fatores que podem provocar variaçõesnesta taxa , este é um indicador consagrado dascondições sócio-econômicas e de saúde de umapopulação, sendo utilizado como indicador gerale específico; permitindo também duas dimensõesde análise: a voltada à assistência individual (cui-dado médico individual) e às ações coletivas exe-cutadas pelos serviços de saúde(12-13). Como re-sultado, espera- se que no Bloco de municípiosque implantaram o PSF (Bloco A), haja diminui-ção do CMI, principalmente da taxa de mortalida-de infantil tardia, que possui íntima relação comas condições ambientais em que o recém nascidovive, onde os agentes comunitários de saúde(ACS) poderiam colaborar, como por exemplo, naeducação sanitária dos lares que periodicamenteadentra, além de fomentar o acesso do recém nas-cido e sua família ao serviço de saúde local.

Cobertura vacinal básica/Taxa de abandonoda vacina Tríplice Bacteriana (DPT)

A vacinação é uma ação integrada e rotineirados serviços de saúde, pertencendo ao nível deatenção primária de pequena complexidade e degrande impacto nas condições gerais de saúdede um município, representando um dos grandesavanços da tecnologia médica nas últimas déca-das, sendo uma das medidas mais custo-efetivasna prevenção de doenças; organizar-se para avacinação é um dos primeiros passos ao alcancedas prefeituras(14). A taxa de abandono da DPTreflete a capacidade de promover a vacinação dascrianças menores de um ano com as três dosesda vacina. Expressa-se através de percentuais (emcada 100 crianças, quantas não foram vacinadascom as três doses da vacina). Optou-se pelo es-tudo dessa taxa, uma vez que ela é calculada so-mente a partir de doses da vacina efetivamenteaplicadas, enquanto a cobertura vacinai básica écalculada utilizando-se de estimativaspopulacionais, muitas vezes distorcidas (sub ousuper estimadas), podendo causar alteraçõesindevidas nos resultados obtidos.

A taxa de abandono da DPT mostra que alémda captação de crianças, é necessário promover

a adesão ao programa de imunização, de maneiraa garantir a terceira dose, idealmente no primeiroano de vida. Reflete também a capacidade do ser-viço de atenção básica local em realizar a buscade faltosos e reintegrá-los ao programa de imuni-zação(15). Devido a essa característica, este indi-cador é importante para se avaliar as ações cole-tivas executadas pelos serviços de saúde à de-terminada população, independente portanto daassistência médica individual(16). A importânciadeste indicador está na atitude que deve ser to-mada quando se identificam altas taxas de aban-dono, onde a falta de acesso e baixa qualidadedos serviços de saúde são fatores de extremarelevância(15-16). A desvantagem da utilizaçãodeste indicador, é que seu cálculo não demons-tra quantas crianças não tomaram nenhuma doseda vacina DPT, sendo que estas crianças devemser a principal preocupação do programa de imu-nização em nível local. Como resultado do estu-do da taxa de abandono da vacina DPT, espera-se melhor desempenho para essa taxa no Blocode municípios com a implantação do PSF, pois apresença dos agentes comunitários de saúde(ACS), verificando sistematicamente carteiras devacinação, pode colaborar na busca de faltosos,reintegrando- os ao programa local de imuniza-ção, diminuindo assim o abandono da vacina DPTnestes municípios.

Hospitalizações em menores de 5 anos

Os principais problemas de saúde públicarelativos à criança freqüentemente surgem desua vulnerabilidade, resultante de elementos doseu processo de crescimento e de desenvolvi-mento e do ambiente em que esse processo ocor-re(17). Expressa-se através de percentuais (emcada 100 crianças menores de 5 anos, quantasforam hospitalizadas).

O estudo das hospitalizações em menores de5 anos (por diarréias, infecção de vias aéreas su-periores/IVAS e pneumonias, e todas as causas),tem como importância a verificação de casos nãoresolvidos no âmbito da atenção básica. Estasinternações são muitas vezes evitáveis à medidaque se tem a atenção básica (porta de entrada dosistema de saúde) bem organizada e resolutiva(18).Baseando-se nessas afirmações, espera-se queno Bloco de municípios que tenham implantadoo PSF, haja menores valores destas taxas.

O DESAFIO METODOLÓGICO

Este trabalho se caracteriza como um típicoestudo descritivo, com dificuldades de execução.

Mariângela G. B. da Cruz

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como: a recente implantação do PSF no Estado deSão Paulo (praticamente iniciada a partir do segun-do semestre de 1997); a comparação entre municí-pios paulistas que implantaram e não o PSF e adisponibilidade dos diferentes bancos de dadosutilizados na pesquisa, que determinaram os perío-dos de cálculo das taxas ou coeficientes referentesaos indicadores estudados.

Denominou-se Bloco A, aquele constituído pormunicípios que possuem alta cobertura populacionalpelo PSF, trabalhando- se com a hipótese de que areorganização da atenção básica pelo Programa se-ria diretamente proporcional a sua cobertura. Os mu-nicípios deste Bloco possuíam a implantação domesmo número de equipes de saúde da família noperíodo compreendido entre 01-01-1998 a 31-12-2000,ou seja, durante o mesmo período de análise dosindicadores estudados (01-01-1998 a 31-12-2000),com exceção da mortalidade infantil e componen-tes, conforme detalhado a posteriore .

É importante salientar que a média de cobertu-ra populacional pelo PSF no Bloco A é de 95,6%,

sem alteração deste valor durante todo período deestudo. Desta forma, foram definidos os sete muni-cípios integrantes do Bloco A que são: Bananal,Caiuá, Lupércio, Narandiba, Oscar Bressane,Santópolis do Aguapeí e Silveiras.

Esses municípios foram caracterizados segun-do demografia (número de habitantes e sua distri-buição urbano/rural), regional de saúde pertencen-te, saneamento básico, índices sociais (índice deDesenvolvimento Humano- IDH e índice Paulistade Responsabilidade Social-IPRS), recursos de saú-de disponíveis (Unidades Básicas de Saúde-UBS eLeitos Hospitalares-LH), entre outros.

Utilizando-se da semelhança desses critérios,foram definidos comparativamente um a um osmunicípios integrantes do Bloco B, que são: Ro-seira, Estrela do Norte, Mariápolis, Caiabú, Sagres,Itapura e Lagoinha. Portanto, pode-se dizer que adiferença entre os Blocos A e B é a implantação enão o PSF, respectivamente. O Quadro l sumarizaalgumas características dos Blocos A; B, bem comodo Estado de São Paulo.

É importante salientar que o Bloco A se com-parado ao Bloco B, possui piores valores médiospara os índices sociais IDH e IPRS; maior númerode habitantes na zona rural e maior disponibi-

lidade de recursos de saúde (unidades básicasde saúde e leitos hospitalares), fatores que pode-rão influenciar nos resultados dos indicadoresestudados.

Estudo comparativode alguns indicadoresem municípios doEstado de São Paulosegundo aimplantação doSaúde da Família

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Operacionatização metodológica dos indicadoresde saúde estudados

Mortalidade infantil: Pode ocorrer em doisperíodos diferentes, cujas causas de morte sãoligadas à diferentes conjunto de causas(10). Devi-do a esta especificidade, este estudo descreveráseu comportamento, detalhando os seus compo-nentes, ou seja, mortalidade infantil: neonatal pre-coce, neonatal tardia, neonatal, pós neonatal. Em-bora todos os indicadores elencados sejam inte-grantes do SIAB (Sistema de Informação da Aten-ção Básica), não será utilizado este banco de da-dos, uma vez que somente municípios integran-tes do PSF o possuem. Para as taxas de mortali-dade infantil serão analisados dados obtidos dosseguintes sistemas: Sistema de Informação so-bre Nascidos Vivos (SINASC) e Sistema de In-formação sobre Mortalidade (SIM). Esses doissistemas de informação (SIM e SINASC) dispu-nham suas bases de dados informatizadas desdeo ano de 1990, sendo possível somente para esseindicador o cálculo no período de 1995 a 2000,superior ao dos demais indicadores estudados.

Como recurso metodológico, visando facili-tar a interpretação dos resultados, utilizou-se daperiodicidade trienal para o cálculo dessas taxas,ou seja, triênio 1998/2000 (pós implantação doPSF) e triênio 1995/1997 (pré implantação do PSF);propiciando a sua visualização como uma únicaimagem.

Calcularam-se os coeficientes de mortalidadeinfantil, neonatal precoce, neonatal tardio,neonatal e pós neonatal para os Blocos A e B eEstado de São Paulo respeitando a razão:

Onde:

OB= Total de óbitos (neonatal precoce-1;neonatal tardio-2; neonatal-3; pós neonatal-4 einfantil-5) em determinado período (triênios 1995a 1997 e 1998 a 2000) e local (Blocos A; B e Esta-do de São Paulo).

NV= Total de nascidos vivos nesses mesmosperíodos e locais.

Taxa de Abandono da Vacina DPT: Para astaxas de abandono da vacina DPT serão analisa-dos dados obtidos dos Sistema de Informaçõesdo Programa Nacional de Imunizações (PNI/API).Como recurso metodológico utilizou- se da peri-odicidade trienal para o cálculo desta taxa, facili-tando a interpretação do resultado deste indica-dor. Haverá possibilidade do cálculo desta taxa,

somente para o do triênio 1998/2000 (pós implan-tação do PSF), uma vez que o sistema de informa-ção PNI/API dispunha de dados somente paraeste período.

A taxa de abandono da DPT é calculada atra-vés da equação:

Taxa de abandono

Onde:

N3= Número de terceiras doses DPT em menoresde um ano, em determinado local (Blocos A; B eEstado de São Paulo) e período (triênio 1998 a2000).

N1= Número de primeiras doses DPT, em meno-res de um ano, em determinado local (Blocos A;B e Estado de São Paulo) e período (1998 a 2000).

Hospitalizações em menores de 5 anos: Paraas taxas de internação serão analisados dadosobtidos do Sistema de Informações Hospitalares(SIH/SUS). Como recurso metodológico utilizou-se também da periodicidade trienal para o cálcu-lo desta taxa, sendo possível a partir dadisponibilização dos dados por este sistema, so-mente o cálculo do triênio 1998/2000 (pós im-plantação do PSF). As taxas de internação emmenores de cinco anos, por local de residência,foram calculadas por causas selecionadas (de-terminados códigos) tomando como base o Có-digo Internacional de Doenças na sua décimaversão (CID 10), através das seguintes equações:

Taxa de internação por Diarréias

Onde:

D= Número de internações em menores de 5 anos,por local de residência (Blocos A; B e Estado deSão Paulo), por Diarréias (códigos A00 a A09 doCID 10) em determinado período (1998 a 2000).

P= População menor de cinco anos nesses mes-mos locais de residência e período.

Taxa de internação por IVAS/Pneumonias:

Onde:

R= Número de internações em menores de 5 anos,por local de residência (Blocos A; B e Estado deSão Paulo), por IVAS/Pneumonias (códigos J00 aJ06;J10a J18;J20 a J22; J60 a J98 do CID 10).

P= População menor de cinco anos nesses mes-mos locais de residência e período.

Mariângela G. B. da Cruz

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Taxa de Internação em menores de 5 anos:

— X 100P

Onde:

I= Número de internações em menores de 5 anos,por local de residência (Blocos A; B e Estado deSão Paulo), por todas as causas (todos os capítu-los do CID 10), em determinado período (1998 a2000).

P= População menor de cinco anos nesses mes-mos locais de residência e período.

RESULTADOS

Na comparação dos valores do Coeficiente outaxa de mortalidade infantil (CMI) dos triênios es-tudados (1998-2000 e 1995-1997), o Estado de SãoPaulo mostrou o melhor desempenho com as maio-res quedas proporcionais : 23,4% para a mortalida-de infantil; 26,9% para o componente pós neonatale 21,7% para o componente neonatal. O Bloco Aapresentou: queda de 17,5% para a mortalidade in-fantil; queda de 52,7% para o componente pósneonatal e aumento de 7,4% do componenteneonatal. O Bloco B apresentou aumento de 9,7%para a mortalidade infantil; aumento de 36,5% paracomponente neonatal, e um decréscimo de 44,9%do componente pós neonatal, conforme demons-trado no Quadro 2.

Com relação à taxa de abandono de DPT, notriênio 1998/2000, o Bloco A destacou-se pelaobtenção do menor valor trienal (3,54%), se-

guido à maior distância pelo Estado de São Paulo(4,55%) e Bloco B (4,77%), conforme demonstradono Quadro 3.

Com relação à taxa de internação por diarréiasno triênio 1998/2000, o Bloco A apresenta a maiortaxa (1,0), seguida pelo Bloco B (0,9) e Estado deSão Paulo (0,6). As taxas de hospitalizaçãopor pneumonias/IVAS e por todas as causas notriênio 1998/2000, o Bloco A (3,5 para pneumonias/

IVAS e 9,2 gerais) e o Bloco B (3,5 para pneumoni-as/IVAS e 9,2 gerais) apresentaram valores idênti-cos, tendo como melhor desempenho, com os me-nores valores, o Estado de São Paulo (2,5 parapneumonias/IVAS e 8,1 gerais), conforme demons-trado no Quadro 4.

Estudo comparativode alguns indicadoresem municípios doEstado de São Paulosegundo aimplantação doSaúde da Família

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

É importante salientar que no estudo compa-rativo da mortalidade infantil, foi constatado umaumento dos valores para o componente neo-natal em ambos os Blocos, contrário à diminui-ção ocorrida nos valores do Estado de São Pau-lo, não sendo possível averiguar quais as causasdeste fato.

Outro resultado apontado por este trabalhofoi a proximidade do valor de 15 óbitos/1.000 nas-cidos vivos, encontrado em todos os valores dotriênio 1998/2000 para a taxa de mortalidade in-fantil (CMI), indicando que a continuidade desua redução demande o uso de alta tecnologia,voltada ao pré natal, parto e puerpério, com aparticipação de todos os níveis de gestão, devi-do ao maior "peso" do componente neonatal novalor total desta taxa para ambos os Blocos. Oestudo comparativo do desempenho da mortali-dade infantil, demonstra que houve redução dessataxa no Bloco A, sobretudo para a mortalidadeinfantil tardia, podendo ser explicada tanto pelaimplantação do PSF neste Bloco, como tambémpelos valores desta taxa no Bloco A serem supe-riores ao do Bloco B e Estado de São Paulo,no triênio 1995/1997, portanto sujeitos à maioresreduções.

O estudo da taxa de abandono da vacina DPT,demonstra que embora todos os valores sejamconsiderados baixos pela Secretaria de Estadoda Saúde(l9), esse indicador ao refletir diretamen-te a efetividade e a eficiência dos serviços desaúde prestados, teve o melhor desempenho noBloco A, sinalizando que a implantação do PSFpossa ter contribuído para esse resultado, atu-ando como um possível fator protetor para oabandono da vacina DPT. Salienta- se para a for-mulação dessa hipótese, uma possível contribui-

ção do trabalho dos agentes comunitários de saú-de (ACS) das equipes de saúde da família, queadentram periodicamente aos lares, verificandoas carteiras de vacinação, podendo dessa formacolaborar na busca de faltosos, reintegrando- osao programa de imunização local.

O estudo das hospitalizações em menoresde cinco anos, apontou que não houve pratica-mente diferença de resultados entre os Blocos.Cabe relembrar que o Bloco A possui maiorpercentual demográfico na zona rural, caracterís-tica que pode dificultar o acesso destas popula-ções aos serviços de saúde, embora esse Blocosupere o Bloco B em recursos de saúde disponí-veis. Esses resultados também podem retratarproblemas na articulação entre o momento clíni-co/ consulta médica e o momento educativo (açãofamília-domicílio), onde o PSF pode não ter lo-grado êxito nesta tarefa.

Mediante os resultados dos indicadores es-tudados, o PSF parece ter contribuído na efeti-vidade das ações que incidam diretamente comaspecto coletivo, demonstrado pelos valores dataxa de abandono da vacina DPT e mortalidadeinfantil (sobretudo componente pós neonatal),mas não há indícios de que o PSF tenha logradoêxito nas ações que dependam mais imediatamen-te do cuidado médico individual.

É importante considerar que no desenhodeste estudo, não houve seleção prévia dosmunicípios do Bloco A para que implantassem oPSF, não sendo portanto um estudo de interven-ção, exigindo cuidados quando se atribui à im-plantação do PSF a melhoria de alguns indicado-res, como a mortalidade infantil e a taxa de aban-dono da DPT. Além disto, a falta de estudos queabordassem a temática, visando parâmetros decomparação, remete à necessidade de pesquisascomplementares.

Mariângela G.B.da Cruz

Page 8: O segundo a implantação do Saúde da Família DE · 2008-03-11 · Estudo comparativo de alguns indicadores em municípios do Estado de São Paulo segundo a implantação do Saúde

Esses resultados também evidenciam a neces-sidade constante em se valorizar a atenção básica,aumentando sua resolutividade e qual idade,

objetivando, em última análise a eqüidade, enten-dida esta à aplicação universal e eqüalitária dasregras e dos procedimentos.

REFERÊNCIAS

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Estudo comparativode alguns indicadoresem municípios doEstado de São Paulosegundo aimplantação doSaúde da Família

Correspondência:Mariângela G.B. da CruzRua Roquete Pinto.313- Caxingui -São PauloCEP-05515-010-SP