o controle de autoridade sob a norma rda: … · bibframe bibliographic framework bn biblioteca...
TRANSCRIPT
-
DENISE MANCERA SALGADO
O CONTROLE DE AUTORIDADE SOB A NORMA RDA: anlise da aplicao e
implicaes na construo de registros de autoridade
Dissertao apresentada ao Programa de
Ps-Graduao em Cincia da Informao
da Escola de Comunicao e Artes (ECA),
da Universidade de So Paulo (USP), rea
de Concentrao: Cultura e Informao,
Linha de Pesquisa: Gesto de Dispositivos
de Informao, como requisito parcial para
obteno do ttulo de Mestre em Cincia da
Informao. Verso corrigida.
Orientador: Prof. Dr. Jos Fernando
Modesto da Silva.
So Paulo
2015
-
1
2015
proibida a reproduo impressa e eletrnica deste documento para fins
comerciais. Autoriza-se a reproduo, total ou parcial, por processos
fotocopiadores e eletrnicos, exclusivamente para fins acadmicos e cientficos,
com a identificao completa da fonte.
Salgado, Denise Mancera
O controle de autoridade sob a norma RDA: anlise da aplicao e implicaes na construo de registros de autoridade / Denise Mancera Salgado. - So Paulo, 2015.
172 f. : il. Dissertao (mestrado) - Escola de Comunicaes e
Artes/USP, 2015. Bibliografia 1. Catalogao 2. Controle de autoridade 3. RDA I.
Ttulo
-
2
FOLHA DE APROVAO
Nome do Autor: Denise Mancera Salgado
Ttulo: O controle de autoridade sob a norma RDA: anlise da aplicao e
implicaes na construo de registros de autoridade
Aprovada em _______ de ________________ de ____________________
Presidente da Banca: Prof. Dr. Jos Fernando Modesto da Silva
Banca Examinadora:
Prof. Dr. __________________________________________________________
Instituio: ___________________________Assinatura: ____________________
Prof. Dr. __________________________________________________________
Instituio: ___________________________Assinatura: ____________________
Prof. Dr. __________________________________________________________
Instituio: ___________________________Assinatura: ____________________
-
3
O homem tem uma grande tendncia para o esquecimento.
O passado est morrendo de minuto a minuto, o segundo
que se vai j ontem e as recordaes vo sendo
empurradas para o fundo, do contrrio transbordariam por
todos os buracos do corpo as novas vises, o que de novo
se ouviu. Mas de vez em quando bom ir buscar as coisas
que ficaram amassadas l no fundo.
(Mrio Lago)
-
4
DEDICATRIA
Ao meu filho Samuel, a quem amo incondicionalmente.
Ao meu amado, amigo e sempre companheiro Fbio.
-
5
AGRADECIMENTOS
Maria Antonia Gaviolli Mendes Botelho, M, minha inspirao. Agradeo
por me ensinar a amar a profisso de bibliotecrio, me incentivando e apoiando
em todos os momentos. Sempre me lembro daquela garotinha sentada em cima
da mesa ajudando voc a intercalar fichas no catlogo.
Aos meus pais, Danilo Salgado e Eni Mancera Salgado, que mesmo em
dificuldades, sempre me ampararam e incentivaram a seguir estudando, a ter uma
profisso e a ser uma pessoa de bem. Vocs so meus exemplos de vida.
Ao meu filho, Samuel Salgado Schlottfeldt, a quem no pude dedicar tanto
tempo quanto gostaria neste perodo de estudo.
Ao meu marido, Fbio dos Santos Schlottfeldt, cujo incentivo, apoio e
pacincia durante os perodos de insanidade no desenvolvimento desta
dissertao me ajudaram a prosseguir na batalha. O amor se mostra nesses
pequenos detalhes. Sou uma pessoa muito melhor ao seu lado.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Fernando Modesto, pela ateno, confiana e
dedicao. Agradeo por acreditar no meu trabalho mais do que eu mesma. Sua
orientao foi fundamental para que eu pudesse conquistar esta etapa.
A todos meus colegas de trabalho na DDCTI/CSMB/PMSP. O
encorajamento e apoio de vocs me ajudaram a encontrar o foco e a seguir em
frente. Agradeo pelo ombro amigo, em especial de Marilza Siqueira, Neuza
Fusae Okayama Pereira e Roseli Akemi Sakamoto Kikkawa, que escutaram
minhas muitas incertezas e certezas, acompanhando-me neste processo.
Tatiana Rodrigues Nascimento, por sua compreenso nos momentos crticos, seu
apoio, carinho e confiana. Que sua estrela brilhe sempre.
s colegas do Mestrado, Daniele Cristina Gonalves Brene Pires e Liliana
Giusti Serra, tambm orientandas do Prof. Dr. Fernando Modesto, pela pacincia
e companheirismo.
A todas as outras pessoas, amigas, amigos e conhecidos que de alguma
forma contriburam para realizao deste sonho.
-
6
RESUMO
Esta pesquisa tem por objeto a anlise da interao do esquema de descrio
bibliogrfica Resource Description and Access (RDA) na construo de registros
de autoridade frente aos objetivos e aos fundamentos do modelo conceitual
Requisitos Funcionais para Dados de Autoridade (FRAD). Busca compreender e
analisar a importncia do controle de autoridade para a recuperao da
informao, contextualizando a construo de registros de autoridade na
catalogao descritiva por meio do uso da norma RDA. Caracteriza-se por
explorar os aspectos tericos e normativos que regem a construo de registros
de autoridade. Designada como uma pesquisa terica, a investigao recorre
pesquisa bibliogrfica, documental, histrica e analtica. O enfoque da pesquisa
est nos registros de autoridade e as mudanas provocadas pelas novas
concepes decorrentes dos modelos conceituais Requisitos Funcionais para
Registros Bibliogrficos (FRBR) e sua extenso FRAD e o esquema de descrio
bibliogrfica RDA, explorando os aspectos tericos e normativos que regem a
construo de registros de autoridade. Apresenta um referencial terico composto
do panorama do controle bibliogrfico, da catalogao e dos catlogos e suas
interaes com o controle de autoridade. Discorre sobre o modelo conceitual
FRAD e a norma catalogrfica RDA.
Palavras-chave: Catalogao, controle de autoridade, registros de autoridade,
FRAD, RDA
-
7
ABSTRACT
This research aims at the analysis of the interaction of bibliographic description
scheme Resource Description and Access (RDA) in building forward authority
records the objectives and foundations of conceptual model Functional
Requirements for Authority Data (FRAD). It seeks to understand and analyze the
importance of authority control for information retrieval, contextualizing the
construction of authority records in the descriptive cataloging through the use of
RDA standard. It is characterized by exploring the theoretical and regulatory
aspects governing the construction of authority records. Designated as a
theoretical research, the research draws on literature, documentary, historical and
analytical. The research focus is in authority records and the changes brought
about by new concepts arising from conceptual models Functional Requirements
for Bibliographic Records (FRBR) and its extension FRAD and the bibliographic
description scheme RDA, exploring the theoretical and regulatory aspects
governing the construction of authority records. It presents a theoretical framework
consists panorama bibliographic control, cataloging and catalogs and their
interactions with the control authority. It discusses the conceptual model FRAD
and the RDA cataloging standard.
Keywords: Cataloging, authority control, authority records, FRAD, RDA
SUMRIO
-
8
1 INTRODUO 18
1.1 OBJETIVOS 24
1.2 METODOLOGIA 24
2 CONTROLE BIBLIOGRFICO, CATALOGAO E CATLOGOS 28
2.1 CONTROLE BIBLIOGRFICO NO MUNDO E NO BRASIL 28
2.2 A CATALOGAO E SEUS PRINCPIOS 37
2.3 OS OBJETIVOS E FUNES DO CATLOGO 52
2.3.1 A autoria no catlogo 58
2.4 O PADRO MARC PARA O INTERCMBIO DE DADOS 60
3 CONTROLE DE AUTORIDADE 70
3.1 DEFINIO E OBJETIVOS 70
3.2 OS PONTOS DE ACESSO 83
3.3 REGISTROS DE AUTORIDADE 86
3.4 INSTRUMENTOS NORMATIVOS PARA O CONTROLE DE
AUTORIDADE 89
3.4.1 Diretrizes para Registros de Autoridade e Referncias (GARR) 90
3.4.2 International Standard Name Identifier (ISNI) 94
4 OS MODELOS CONCEITUAIS E A RDA 99
-
9
4.1 O FRBR 99
4.2 O FRAD 105
4.3 A RDA 117
5 A CONSTRUO DE REGISTROS DE AUTORIDADE 126
5.1 O MAPEAMENTO DAS TAREFAS DO USURIO NA RDA 138
5.2 A RDA NA CONSTRUO DE REGISTROS DE AUTORIDADE 145
6 CONSIDERAES FINAIS 160
REFERNCIAS 164
-
10
LISTA DE ABREVIATURAS
AACR Anglo-American Cataloguing Rules (Cdigo de Catalogao Anglo
Americano)
AACR2 Anglo-American Cataloguing Rules (Cdigo de Catalogao Anglo
Americano), 2 edio
ALA American Library Association
BIBCO Monographic Bibliographic Record Cooperative Program
BIBFRAME Bibliographic Framework
BN Biblioteca Nacional (Brasil)
CALCO Catalogao Legvel por Computador
CANMARC Canadian Machine Readable Cataloging (MARC Canadense)
CBU Controle Bibliogrfico Universal
CENL Conference of European National Librarians
CI Cincia da Informao
CISAC Confdration Internationale des Socits dAuteurs et
Compositeurs
DPIC Declarao dos Princpios Internacionais de Catalogao
FEBAB Federao Brasileira das Associaes de Bibliotecrios, Cientistas
da Informao e Instituies
FRAD Functional Requirements for Authority Data (Requisitos Funcionais
para Dados de Autoridade)
FRBR Functional Requirements for Bibliographic Records (Requisitos
Funcionais para Registros Bibliogrficos)
-
11
FRANAR IFLA Working Group on Functional Requirements and Numbering of
Authority Records (Grupo de Trabalho da IFLA sobre os Requisitos
Funcionais e Numerao para Registros de Autoridade)
FRSAD Functional Requirements For Subject Authority Data (Requisitos
Funcionais para Dados de Autoridade Assunto)
GARR Guidelines for Authority Records and References (Diretrizes para
Registros de Autoridade e Referncias)
GARE Guidelines for Authority and Reference Entries (Diretrizes para
Entradas de Autoridade e Referncia)
GSARE Guidelines for Subject Authority and Reference Entries / Diretrizes
para Registros de Autoridade e Referncia de Assuntos
IBERMARC Ibero Machine Readable Cataloging (MARC Espanhol)
ICABS Alliance for Bibliographic Standards (Aliana para a Padronizao
Bibliogrfica)
IFLA International Federation of Library Associations and Institutions
(Federao Internacional de Associaes e Instituies
Bibliotecrias)
IFRRO International Federation of Reproduction Rights Organisations
IMEICC IFLA Meeting of Experts on an International Cataloguing Code
(Encontro de Especialistas da IFLA sobre um Cdigo Internacional
de Catalogao)
IPDA International Performers Database Association
ISADN International Standard Authority Data Number
ISBD International Standard Bibliographic Description (Descrio
Bibliogrfica Internacional Normalizada)
ISNI International Standard Name Identifier
-
12
ISNI-IA International Standard Name Identifier International Agency
ISO International Organization for Standardization
JSC Joint Stteering Committee
LC Library of Congress
MARC Machine Readable Cataloging (Catalogao Legvel por Mquina)
MARC21 Machine Readable Cataloging 21 (Catalogao Legvel por
Mquina 21)
MODS Metadata Object Description Schema
NACO Name Authority Cooperative Program
NATIS National Information System (Sistema Nacional de Informao);
National Documentation,Library and Archives Infrastructures
OCLC Online Computer Library Center
OPAC Online Public Access Catalogue (Catlogo online de Acesso
Pblico)
PGI Programa Geral de Informao
RBU Rpertoire Bibliographique Universel (Repertrio Bibliogrfico
Universal)
RDA Resource Description and Access (Recurso, Descrio e Acesso)
RDF Resource Description Framework
TIC Tecnologia da Informao e Comunicao
UBC Universal Bibliographic Control (Controle Bibliogrfico Universal)
UBCIM Universal Bibliographic Control and International MARC
-
13
UKMARC United Kingdom Machine Readable Cataloging (MARC do Reino
Unido)
UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organigation
(Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a
Cultura)
UNIMARC Universal Machine Readable Cataloging
UNISIST United Nations International Scientific Information System (Sistema
de Informao Cientfica Internacional das Naes Unidas)
URI Uniform Resource Identifier
USMARC United States Machine Readable Cataloging (MARC dos Estados
Unidos)
VIAF Virtual International Authority File (Catlogo de Autoridade
Internacional Virtual)
XML eXtensible Markup Language
-
14
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Padres para o controle bibliogrfico 33
Figura 2 Linha do tempo do desenvolvimento dos cdigos de catalogao 48
Figura 3 Interao entre remissivas e forma adotada em registros de
autoridade e registros bibliogrficos
51
Figura 4 Registro bibliogrfico da Biblioteca Nacional no formato MARC21
Bibliogrfico
63
Figura 5 Registro de autoridade da Library of Congress no formato
MARC21 Bibliogrfico
68
Figura 6 Comunidade de usurios do catlogo de autoridade 74
Figura 7 Finalidade de unificao dos pontos de acesso no controle de
autoridade
77
Figura 8 Finalidade de diferenciao entre pontos de acesso no controle
de autoridade
78
Figura 9 Exemplo de registro de autoridade do VIAF 82
Figura 10 Definio das entidades Pessoa, Famlia e Entidade Coletiva 85
Figura 11 Exemplos de pontos de acesso 86
Figura 12 reas especificadas pelas GARR para o registro de autoridade e
exemplo de aplicao
93
Figura 13 Exemplo de registro de autoridade ISNI para nome pessoal 97
Figura 14 Grupos e entidades estabelecidos pelo FRBR 101
Figura 15 Relacionamento entre as entidades do Grupo 1 do FRBR 103
Figura 16 Relacionamento de responsabilidade entre entidades do Grupo 2
do FRBR
104
-
15
Figura 17 Base fundamental do modelo FRAD 108
Figura 18 Modelo conceitual para dados de autoridade 109
Figura 19 Exemplos de atributos para as entidades Pessoa, Famlia e
Entidade Coletiva
113
Figura 20 Exemplo de registro de autoridade elaborado com os atributos
da entidade pessoa previsto pelo FRAD
114
Figura 21 Relacionamentos entre Pessoas e Entidades Coletivas 116
Figura 22 Sumrio e estrutura da RDA 120
-
16
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Famlia MARC21 e suas descries 64
Quadro 2 Estrutura dos captulos RDA para a construo de registro de
autoridade para as entidades Pessoa, Famlia e Entidade
Coletiva
127
Quadro 3 Entidade pessoa: comparativos entre os atributos FRAD,
instruo RDA e campos MARC21 Autoridade
129
Quadro 4 Entidade famlia: comparativos entre os atributos FRAD,
instruo RDA e campos MARC21 Autoridade
132
Quadro 5 Entidade coletiva: comparativos entre os atributos FRAD,
instruo RDA e campos MARC21 Autoridade
134
Quadro 6 RDA/FRAD mapeamento dos atributos da entidade Pessoa 139
Quadro 7 RDA/FRAD mapeamento dos relacionamentos da entidade
Pessoa
140
Quadro 8 RDA/FRAD mapeamento dos atributos da entidade Famlia 141
Quadro 9 RDA/FRAD mapeamento dos relacionamentos da entidade
Famlia
142
Quadro 10 RDA/FRAD mapeamento dos atributos da Entidade Coletiva 143
Quadro 11 RDA/FRAD mapeamento dos relacionamentos da Entidade
Coletiva
144
Quadro 12 Registro de autoridade de Getlio Vargas 146
Quadro 13 Registro de autoridade da Presidncia do Brasil por Getlio
Vargas de 1930 a 1945
148
Quadro 14 Registro de autoridade da Presidncia do Brasil por Getlio
Vargas de 1951 a 1954
149
-
17
Quadro 15 Registro de autoridade do escritor e msico Arnaldo Antunes 151
Quadro 16 Registro de autoridade do grupo de rock Tits 152
Quadro 17 Registro de autoridade do matemtico Julio Cesar de Mello e
Souza
153
Quadro 18 Registro de autoridade do pseudnimo Malba Tahan 154
Quadro 19 Registro de autoridade da Famlia Orleans e Bragana 156
Quadro 20 Registro de autoridade da Famlia Schrmann 157
Quadro 21 Registro de autoridade do Museu de Arte de So Paulo
(MASP)
158
-
18
1 INTRODUO
A informao tornou-se um insumo estratgico e de relevncia a partir do
final do sculo XX. Vrios autores e especialistas passaram denominar o perodo
como a era da Sociedade da Informao ou da Sociedade do Conhecimento.
Porm, com o desenvolvimento das tecnologias de informao e comunicao
(TICs), passamos a enfrentar o dilema da exploso informacional, tema abordado
na dcada de 1940 por Vannevar Bush e explicitado por Saracevic (1996, p. 42)
como o irreprimvel crescimento exponencial da informao e seus registros,
particularmente em cincia e tecnologia. Com o advento da internet, produtores e
consumidores de informao esto dispostos em uma hierarquia horizontal,
muitas vezes impossvel diferenciar um de outro, ou seja, o produtor
consumidor, e principalmente, o consumidor transfigura-se em produtor de
informao.
Os catlogos bibliogrficos, especialmente na recuperao da informao,
por meio de pontos de acesso controlados para nomes, podem promover uma
melhor comunicao e atendimento das necessidades de informao do usurio.
Desde a antiguidade, bibliotecrios e bibliotecas procuram no apenas
armazenar o conhecimento produzido, mas organiz-lo. Apesar das mudanas
nas finalidades e objetivos dessa organizao ao longo do tempo, a busca por
descrever e representar o conhecimento, expresso em qualquer forma ou suporte
de manifestao uma constante.
As primeiras formas de catlogo tm suas origens na antiguidade. Mas
com o advento da imprensa, a partir do sculo XV, e sua consequente
disseminao da informao, que comeam a surgir as primeiras publicaes
destinadas organizao dos acervos e do conhecimento.
O catlogo pode ser compreendido como um meio de comunicao, que
veicula mensagens sobre os registros do conhecimento, apresentando-as com
sintaxe e semntica prpria e reunindo registros do conhecimento por
semelhana, para usurios desses acervos (MEY; SILVEIRA, 2009, p. 12).
Charles Ami Cutter foi um dos primeiros tericos da catalogao a
-
19
sistematizar os objetivos do catlogo, cujos princpios foram anteriormente
discutidos e tratados por Panizzi. Para Panizzi um catlogo adequado deve estar
preocupado com as reais necessidades do usurio, sendo projetado para revelar
no apenas se o livro em particular que ele procura est na biblioteca, mas
tambm se as outras edies da obra e que outras obras do autor a biblioteca
possui. Com o Rules for a Printed Dictionary Catalog, Cutter (1904) apresenta
como premissa a figura central do usurio no processo de organizao e
recuperao da informao. Todas as aes e processos voltados para sua
descrio devem ser realizados com foco no usurio e suas necessidades de
informao. O desenvolvimento de padres de catalogao foi aprimorado ao
longo da histria com o intuito de atender as demandas dos usurios e as
necessidades de preservao das informaes contidas nos acervos
bibliogrficos.
O avano das inovaes tecnolgicas a partir da segunda metade do
sculo XX contribuiu para a evoluo dos catlogos. Do sistema tradicional e
analgico baseado em fichas impressas, passaram os registros a serem
elaborados em bases de dados eletrnicas culminando no desenvolvimento dos
Catlogos de Acesso Pblico em Linha/Online Public Access Catalogues (OPAC).
Esse desenvolvimento e o retorno das discusses sobre a alterao dos
processos de descrio e recuperao da informao, deslocando-se do foco na
organizao dos contedos e acervos para o foco no usurio, gerou a
necessidade de reviso das funes do catlogo. O primeiro movimento nesse
sentido o desenvolvimento de modelos conceituais1 pela International
Federation of Library Associations and Institutions / Federao Internacional das
Associaes e Instituies Bibliotecrias (IFLA), publicando o Functional
Requirements for Bibliographic Records / Requisitos Funcionais para Registros
Bibliogrficos (FRBR), o Functional Requirements for Authority Data / Requisitos
Funcionais para Dados de Autoridade (FRAD) como estudo e fundamentos
tericos para as tarefas executadas pelo usurio. O modelo conceitual FRAD
1 O modelo conceitual descreve quais so os dados que realmente devem ser armazenados no
banco de dados e quais so os relacionamentos existentes entre os dados. Fornece uma viso mais prxima do modo como os usurios visualizam os dados e define especificaes necessrias qualidade das informaes do ambiente informatizado a ser criado (FUSCO, 2010, p. 99).
-
20
reconhece como tarefas do usurio de dados de autoridade: encontrar e
identificar uma entidade2 durante o processo de busca em um catlogo
bibliogrfico ou de autoridade, contextualizar uma entidade em um determinado
contexto, e justificar a deciso adotada para escolha de um nome e sua forma
para um ponto de acesso.
Em 2009, a IFLA publica a Declarao dos Princpios Internacionais de
Catalogao (DPIC), no qual o catlogo deve ser um instrumento efetivo e
eficiente, que permita ao usurio encontrar recursos bibliogrficos numa coleo
como resultado de uma pesquisa; identificar um recurso bibliogrfico
confirmando que a entidade descrita corresponde entidade procurada, ou
distinguir entre duas ou mais entidades com caractersticas similares; selecionar
um recurso bibliogrfico que esteja de acordo com as necessidades do usurio;
adquirir ou obter acesso a um recurso bibliogrfico descrito, alm de navegar em
um catlogo e para alm dele.
A catalogao, como uma das principais atividades da Biblioteconomia e da
Documentao, compreende a adoo de normas que permitem o intercmbio da
mensagem catalogrfica entre instituies documentais no mundo, o que amplia
as alternativas de escolha pelos usurios e auxilia outros profissionais. A
consistncia sinttica e semntica do registro bibliogrfico facilita o
reconhecimento dos sinais e sua compreenso, pelo uso de linguagem comum
(MEY; SILVEIRA, 2010; MEY; ZAFALON, 2009).
O controle de autoridade como o processo de unificar os pontos de acesso
dos catlogos, mediante a utilizao de uma forma normalizada e exibindo as
relaes existentes entre os pontos de acesso de um catlogo, busca facilitar a
identificao e a recuperao dos documentos armazenados (HERRERO
PASCUAL, 1999). Tem por objetivo evitar ambiguidades ou confuses que
possam ser causadas por homnimos, sinnimos ou diversidades de nomes pelos
quais as pessoas, entidades, obras, temticas ou conceitos possam ser
2 Entidade aqui compreendida como algo que possua carter unitrio e prprio; algo que tenha
uma existncia independente ou separada; uma abstrao, conceito ideal, objeto do pensamento, ou objeto transcendental abrangendo produtos do esforo intelectual ou artstico e os agentes (pessoa, famlia, entidade coletiva) responsveis pela criao desse contedo artstico ou intelectual (IFLA, 2009, p. 10).
-
21
denominados. Esses catlogos desenvolvidos por servios de informao
auxiliam no intercmbio de informaes, sendo benficos na reduo dos custos
globais para a manuteno e elaborao de bases de dados bibliogrficas e de
autoridade.
A padronizao na forma e escolha de pontos de acesso para nomes,
tambm o qualifica como a adoo de uma linguagem documentria, capaz de
representar a informao e, principalmente, seus responsveis intelectuais. Com
o desenvolvimento das TICs possvel utilizao de recursos que permitam a
recuperao das formas variantes pelas quais um autor possa ser conhecido ou
acessado ainda que representado por uma forma padro. Porm, preciso
considerar que a forma a ser adotada deva representar o mximo possvel
linguagem simblica utilizada pelos usurios do sistema de informao.
Em uma viso sistmica, o controle de autoridade no deve ser
considerado uma atividade isolada. Seu propsito a recuperao e a gesto da
informao em bibliotecas e demais unidades de informao. Os registros de
autoridade constituem a base do catlogo de uma biblioteca, sendo sua
padronizao e unificao essencial para uma recuperao confivel e
consistente dos pontos de acesso.
Mey e Silveira (2009, p. 195) ao abordar os tipos de catlogos existentes,
apresentam o catlogo identidade, tambm (erroneamente) denominado catlogo
de autoridade de nomes. As autoras consideram errneo o termo de autoridade
por se tratar de uma traduo literal do termo em ingls authority file, e no
considerar o fato do contexto do termo estar relacionado ao sentido de autorizado.
Apesar dessa explicao e alerta, o termo catlogo de autoridade
amplamente adotado no Brasil para os catlogos que abrangem as formas
autorizadas de nomes para pessoas, famlias e entidades coletivas, a mesma
definio fornecida pelas autoras para o termo catlogo identidade. Assim, nesta
pesquisa adota-se o termo difundido nacionalmente, catlogo de autoridade, bem
como suas derivaes: controle de autoridade e registro de autoridade.
Um catlogo de autoridade composto pelo conjunto de registros de
autoridade, resultando em uma lista de nomes (pessoais, entidades, eventos), de
-
22
ttulos uniformes ou de assuntos. O registro de autoridade, por sua vez,
constitudo da forma autorizada do nome que ser utilizado como ponto de
acesso no catlogo, e das referncias cruzadas das formas no autorizadas
(remissivas ver) ou dos nomes relacionados forma autorizada (remissivas ver
tambm).
Para o objeto de estudo desta dissertao, explicitaremos somente os
pontos de acesso controlados que representam entidades do tipo pessoa, famlia
e entidade coletiva. Essas entidades foram escolhidas por serem as entidades
representadas na RDA para o registro de atributos e relacionamentos em
catlogos de autoridade.
O grande movimento internacional de reflexo permeado pelos conceitos
tericos, incluindo o FRBR, o FRAD e o esquema de descrio bibliogrfica RDA,
fortifica o esforo de buscar sempre uma melhor interao com o usurio,
possibilitando a esse atingir o princpio da navegabilidade promulgado pela
Declarao dos Princpios Internacionais de Catalogao.
Nessa perspectiva, esta dissertao tem por objeto a anlise da interao
do esquema de descrio bibliogrfica RDA na construo de registros de
autoridade frente aos objetivos e aos fundamentos do modelo conceitual FRAD,
explorando os aspectos tericos e normativos que regem a construo de
registros de autoridade. Assim, busca compreender e analisar a importncia do
controle de autoridade para a recuperao da informao, contextualizando a
construo de registros de autoridade na catalogao descritiva por meio do uso
da norma RDA.
O catlogo de autoridade fundamental para a reunio e recuperao da
informao em qualquer unidade documental. um instrumento derivativo e
auxiliar do catlogo bibliogrfico, cuja funo bsica a de estabelecer pontos de
acesso padronizados (autoridade) que iro servir ao usurio como chaves de
pesquisa segura, garantindo a localizao confivel e eficaz da informao. Como
uma importante ferramenta, adquiriu a sua verdadeira dimenso com o
desenvolvimento de sistemas de informao bibliogrficos automatizados e,
consequentemente, tem levantado interesse crescente nos ltimos anos.
-
23
As normas e regras de catalogao existentes at o incio do sculo XXI, e
que ainda se encontram em vigor, no possuem acopladas instrues para a
construo de registros de autoridade. Em sua maioria, as especificaes
apresentadas pelos cdigos de catalogao relacionam-se definio e escolha
de autoria em obras3 e a forma a ser adotada para o ponto de acesso
estabelecido.
Com o desenvolvimento da norma de catalogao da RDA, o panorama
alterado, pois esta apresenta instrues especficas e ampliadas para a
construo de registros de autoridade. Num perodo onde os cdigos de
catalogao no contm instrues especficas para a construo de registros de
autoridade, instrumentos auxiliares, como diretrizes e instrues regionais, so
estabelecidos para sanar a ausncia de regras e instrues. A RDA pretende
preencher essa lacuna, fornecendo instrues especficas para a construo dos
registros de autoridade.
preciso avaliar se a construo desses registros de autoridade, seja por
meio das poucas instrues existentes nos cdigos anteriores ou nas
abrangentes instrues da norma recm-criada, contempla e permite o
desenvolvimento das funes do catlogo bibliogrfico em propiciar ao usurio
encontrar, identificar, selecionar, adquirir recursos bibliogrficos por um
determinado autor, ttulo ou assunto.
O enfoque da pesquisa est nos registros de autoridade e as mudanas
provocadas pelas novas concepes decorrentes dos modelos conceituais FRBR
e sua extenso FRAD; e o esquema de descrio bibliogrfica RDA.
O problema de pesquisa o de analisar quais so as implicaes do uso
da norma RDA no processo de construo de registros de autoridade e suas
interaes com o modelo conceitual FRAD, no qual se inclui as tarefas do usurio.
3 Obra aqui entendida como uma criao intelectual ou artstica distinta, isto , o contedo
intelectual ou artstico. Inclui obras expressas em palavras, msica, material grfico, fotografias, imagens em movimento, materiais cartogrficos, materiais tridimensionais, dados, programas de computador, etc. (IFLA WORKING GROUP ON FUNCTIONAL REQUIREMENTS AND NUMBERING OF AUTHORITY RECORDS, 2013).
-
24
1.1 OBJETIVOS
Analisar a interao e implicaes do uso da norma RDA no processo de
construo de registros de autoridade.
Elaborar um panorama da catalogao e do controle de autoridade;
Observar e identificar se e como os conceitos propostos pelo FRAD esto
expressos na RDA;
Avaliar o uso da norma RDA na construo dos registros de autoridade;
Mapear se as 4 tarefas do usurio expressas no FRAD esto contidas na
RDA e em que condio se apresentam;
Analisar a aplicao das 4 tarefas do usurio expressas no FRAD para a
construo do registro de autoridade utilizando a RDA.
1.2 METODOLOGIA
O estudo caracteriza-se como exploratrio, pois tem por finalidade
desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a
formulao de problemas mais precisos ou hipteses pesquisveis para estudos
posteriores. (GIL, 2011, p. 27). Tambm se caracteriza como uma pesquisa
descritiva, pois pretende descrever e analisar a norma de descrio bibliogrfica
RDA no que tange a construo de registros de autoridade.
Caracterizada como uma pesquisa terica, a investigao recorre
pesquisa bibliogrfica, documental, histrica e analtica. So verificados e
confrontados o registro de atributos de pessoas, entidades coletivas e famlias
designado pela RDA com o mapeamento das tarefas do usurio previstos pelo
FRAD, tarefas essas relacionadas a encontrar, identificar, contextualizar uma
entidade e justificar a criao de um registro de autoridade.
No desenvolvimento da pesquisa procede-se ao levantamento bibliogrfico
da literatura da rea sobre o objeto de estudo e posterior anlise da construo
de registros de autoridade utilizando-se a norma RDA, bem como, sua interao
com o modelo conceitual FRAD.
Os critrios para o levantamento bibliogrfico esto adequados para a
-
25
anlise do objeto de estudo seguindo a proposta dos objetivos e, por conseguinte,
a estratgia de busca est focada na literatura que aborda os conceitos: controle
de autoridade, registros de autoridade, princpios de catalogao e funes do
catlogo.
Inicialmente no se imps limitao cronolgica, pois em levantamentos
preliminares constatou-se uma exiguidade da literatura sobre o tema. Foram
excludos trabalhos abordando os conceitos: controle de autoridade, registros de
autoridade, princpios de catalogao e funes do catlogo, sob outros pontos de
vista que no o da representao descritiva da informao, foco de estudo desta
dissertao, como por exemplo, na representao temtica da informao.
Para o levantamento e pesquisa bibliogrfica foram usados os termos:
controle bibliogrfico, controle de autoridade, representao descritiva, trabalho
de autoridade, registro de autoridade, catlogo de autoridade, RDA, FRAD,
bibliographic control, authority control, cataloguing, cataloging, authority work,
authority file, authority records. As bases pesquisadas incluem a Base Referencial
de Artigos de Peridicos em Cincia da Informao, Dedalus, Web of Science,
Library Information Science & Technology Abstracts, Portal de Peridicos Capes,
Biblioteca Brasileira Digital de Dissertaes e Teses, Google Acadmico. Alm
disso, foram pesquisados sites de instituies que promovem o desenvolvimento
e a publicao das diretrizes, normas, princpios ou regras para a elaborao de
registros bibliogrficos e de autoridade, denominados nesta pesquisa de
documentos normativos.
Essa pesquisa bibliogrfica proporcionou o desenvolvimento da reviso de
literatura apresentada nos captulos 2, 3 e 4 desta dissertao. O captulo 2
Controle bibliogrfico, catalogao e catlogos - apresenta um panorama
histrico e conceitual sobre o controle bibliogrfico, a catalogao, os catlogos e
o formato de intercmbio de dados Machine Readable Cataloging (MARC). O
captulo 3 Controle de autoridade - apresenta os conceitos, as finalidades e a
relevncia do controle de autoridade na catalogao e na recuperao da
informao, bem como os instrumentos normativos que estabelecem sua
padronizao internacional. O captulo 4 Os modelos conceituais e a RDA -
aborda o desenvolvimento dos modelos conceituais para registros bibliogrficos e
-
26
de autoridade, culminando com o desenvolvimento da RDA. No captulo 5 A
construo de registros de autoridade - so analisadas as implicaes e
aplicaes do uso da norma RDA na elaborao de registros de autoridade,
contrapondo-os aos atributos e relacionamentos estabelecidos pelo FRAD para as
entidades pessoa, famlia e entidade coletiva, mapeando-se as tarefas do usurio
de encontrar, identificar, contextualizar e justificar um dado de autoridade.
Para a anlise das implicaes do uso da RDA na construo de registros
de autoridade e sua interao com o modelo conceitual FRAD, descritas no
captulo 5, recorre-se pesquisa documental. Para tanto, a RDA e o FRAD foram
consultados em seus documentos originais, elaborou-se um quadro analtico onde
so avaliados se as funes do usurio de encontrar, identificar, contextualizar e
justificar os dados de autoridade em recursos bibliogrficos so atendidas quando
da construo dos registros de autoridade utilizando-se a norma RDA.
Num primeiro momento, foi elaborado um quadro comparativo entre os
atributos FRAD, as instrues RDA correspondentes ao registro desses atributos
e os campos MARC 21 Autoridade compatveis. Posteriormente analisam-se os
mapeamentos das tarefas do usurio de encontrar, identificar, contextualizar e
justificar um dado de autoridade, mapeamento este elaborado pelo FRAD e que
se encontra em seu documento original. Essas tarefas esto estabelecidas para
os atributos e os relacionamentos das entidades pessoa, famlia e entidade
coletiva abordados pelo FRAD, assim contraps-se este mapeamento as
instrues institudas pela RDA. Para isto, procedeu-se a elaborao e anlise de
quadros comparativos entre os atributos e relacionamentos FRAD para as
entidades pessoa, famlia e entidade coletiva, as instrues RDA e as tarefas do
usurio para cada entidade.
Posteriormente, verificam-se os registros de autoridade elaborados por
intermdio do uso das instrues da norma RDA para o registro de atributos e
relacionamentos das entidades pessoa, famlia e entidade coletiva. Para a
elaborao dos registros de autoridade foram utilizadas as autoridades que
seguem relacionadas. Foram elaborados registros de autoridade para Getlio
Vargas, tanto como entidade pessoa como entidade coletiva em seus dois
perodos de governo como Presidente da Repblica; e Arnaldo Antunes e a
-
27
entidade coletiva Tits procurando-se demonstrar as relaes existentes entre
registros de autoridade do tipo pessoal e entidade coletiva e como estes
relacionamentos podem ser descritos utilizando-se a RDA. Posteriormente
elaboraram-se os registros das autoridades Julio Cesar de Mello e Souza e
Malba Tahan. Esses registros buscam descrever as relaes existentes entre
nome verdadeiro e pseudnimo. Para exemplificar a entidade famlia foram
elaborados registros de autoridade para as famlias Orleans e Bragana e
Schrmann. Para a exemplificao de um registro de autoridade do tipo entidade
coletiva utilizou-se a autoridade Museu de Arte de So Paulo.
A seguir, o captulo 2 apresenta o histrico e os conceitos de controle
bibliogrfico, catalogao e catlogos, procurando-se estabelecer suas relaes
com o controle de autoridade. Discorre-se sobre as origens e funes do controle
bibliogrfico e a situao do controle bibliogrfico no Brasil, relacionando este
tema ao controle de autoridade e sua importncia. Em um segundo momento,
desenvolve-se um breve histrico da catalogao apresentando os principais
cdigos desenvolvidos e sua influncia no processo de catalogao atual. Aps,
apresenta-se os conceitos de catalogao e sua estreita relao com os cdigos
e catlogos. Expe-se sobre os catlogos, discutindo seus objetivos e funes,
bem como a funo da autoria no catlogo e seu desenvolvimento, culminando
com o catlogo de autoridade. A seguir, faz-se um delineamento do padro de
intercmbio de dados MARC e sua interao com o controle de autoridade.
-
28
2 CONTROLE BIBLIOGRFICO, CATALOGAO E CATLOGOS
Um bom leitor algum que evita um certo nmero de livros, um bom bibliotecrio um jardineiro que poda sua biblioteca, um bom arquivista seleciona aquilo que se deve refugar ao invs de armazenar. Eis a temas inditos de nossa poca (CHARTIER, 1998, p. 127).
2.1 CONTROLE BIBLIOGRFICO NO MUNDO E NO BRASIL
A ideia de organizar o conhecimento, buscando obter uma bibliografia
universal to antiga quanto s bibliotecas. O conceito de controle bibliogrfico,
muitas vezes est atrelado ao prprio conceito de organizao da informao.
Para Campello (2006, p. 9) as bibliotecas foram as primeiras instituies a se
preocuparem com o controle bibliogrfico e durante algum tempo seus catlogos
constituram os nicos instrumentos para esse fim.
Na antiguidade os catlogos de bibliotecas assumiam o papel de inventrio
do material existente, e seu controle era relativamente simples, sendo o ideal de
reunir tudo o que se produzia possvel. Com o aumento da produo bibliogrfica,
surgiram as bibliografias, com o intuito de organizar o material existente para sua
posterior recuperao. Essas bibliografias, em sua maioria, eram produzidas por
eruditos, historiadores, entre outros, e procuravam abranger uma determinada
rea do conhecimento, ou limitar-se a uma biblioteca especfica.
Alm da Biblioteca de Alexandria (sc. III a.C), por meio do poeta e
bibliotecrio grego Calmaco, que ansiava reunir toda a produo bibliogrfica
existente, Conrad Gesner, em 1545, produziu a Bibliotheca Universalis, que
procurava relacionar todas as obras publicadas em latim, grego e hebraico, no
chegando, porm, a ser uma bibliografia universal. Em 1895, Paul Otlet e Henri de
La Fontaine criaram o Rpertoire Bibliographique Universel (RBU), tambm com o
objetivo de reunir toda a produo bibliogrfica existente no mundo. O RBU, em
1930, possua aproximadamente 16 milhes de fichas, representando bibliotecas
europeias e norte-americanas. As fichas eram arranjadas em ordem de
classificao, sendo essa a Classificao Decimal Universal, e indicavam a
-
29
localizao das obras. O RBU possua dois arquivos principais: um arquivo de
autor e outro classificado por assunto (MACHADO, 2003; RAYWARD, 1997).
A partir do sculo XIX, a complexidade e variedade de materiais
bibliogrficos se ampliam, principalmente com o aumento da disseminao de
conhecimentos atravs de peridicos cientficos. A preocupao em organizar e
tornar disponvel toda a produo bibliogrfica persiste. Os Princpios de
Catalogao, tambm conhecidos como os Princpios de Paris, surgiram em
1961, na Conferncia Internacional sobre Princpios de Catalogao. O objetivo
desses princpios era atender a demanda por uma padronizao internacional nos
cdigos de catalogao que permitissem o intercmbio de dados e o ideal do
Controle Bibliogrfico Universal (CBU). Esses princpios proporcionaram a
compatibilizao de diversos cdigos de catalogao em diversos pases
aumentando o compartilhamento de dados entre os pases.
A institucionalizao do Controle Bibliogrfico Universal ocorre em 1974
com a criao do International Office for UBC (Universal Bibliographic Control) da
Federao Internacional de Associaes e Instituies Bibliotecrias (IFLA). Suas
bases so a criao de um sistema de intercmbio internacional de informao
que, por intermdio de agncias nacionais, distribuem os registros bibliogrficos
padronizados de todas as publicaes. Compreende um programa com o objetivo
de formar uma rede universal de controle e intercmbio de informaes
bibliogrficas, ou seja, reunir e tornar disponveis os registros bibliogrficos de
todos os pases, a fim de atender ao ideal de acesso de todos os cidados ao
conhecimento universal. Sua eficincia depende da mxima padronizao da
forma e do contedo da descrio bibliogrfica (CAMPELLO, 2006; MACHADO,
2003).
Gorman (2004) destaca que o controle bibliogrfico e o controle de
autoridade so lados da mesma moeda, sendo aquele impossvel sem este. A
catalogao no existe sem a padronizao dos pontos de acesso e o controle de
autoridade o mecanismo pelo qual podemos alcanar o grau de padronizao
necessria. A catalogao trata de ordem, lgica, objetividade, denotao precisa
e consistncia, devendo possuir mecanismos que assegurem esses atributos,
sendo o controle de autoridade um desses.
-
30
Ainda em 1974, a United Nations Educational, Scientific and Cultural
Organization / Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a
Cultura (UNESCO) lanou o programa National Documentation, Library and
Archives Infrastructures (NATIS) com a recomendao aos pases-membros de
estabelecerem uma infraestrutura integrada entre bibliotecas, arquivos e servios
de documentos. Em 1977, o NATIS fundiu-se ao United Nations International
Scientific Information System (UNISIST) resultando no Programa Geral de
Informao (PGI). Seu principal foco so as questes voltadas ao acesso
informao, treinamento de profissionais da informao e aspectos ticos da
informao (CAMPELLO, 2006).
Para atingir o objetivo de acompanhar, monitorar e organizar a produo
bibliogrfica existente amplia-se o uso de ferramentas tecnolgicas e a busca por
uma padronizao dos registros bibliogrficos com vista a uma cooperao
internacional.
O CBU depende da uniformidade e padronizao na elaborao dos
registros bibliogrficos e de autoridade pelos pases integrantes. Mas isso se
revela um desafio. Como equilibrar essa necessidade de intercmbio atravs do
estabelecimento de padres internacionais s necessidades dos usurios locais?
Essas necessidades locais esto, por vezes, vinculadas a lngua falada no pas,
seus aspectos sociais e culturais e a definio de conceitos e palavras
divergentes dos existentes em outras lnguas.
Quando o ideal do CBU comeou seu primeiro avano nos anos de 1970, o
Machine Readable Cataloging (MARC)4 estava ainda em sua infncia (GORMAN,
2003). O MARC um formato de intercmbio de dados criado na dcada de 1960
pela Library of Congress (LC) com o objetivo de reduzir custos de catalogao e
compartilhar seus registros bibliogrficos. uma importante ferramenta para o
compartilhamento de dados entre agncias catalogadoras e, como consequncia,
para o controle bibliogrfico.
O programa do CBU da IFLA alia-se ao projeto Internacional MARC em
1990, recebendo o nome de Universal Bibliographic Control and International
4 O MARC ser tratado de modo mais abrangente no subitem 2.4.
-
31
MARC (UBCIM). Em 2003 esse programa foi substitudo pela Alliance for
Bibliographic Standards (ICABS), cujos objetivos principais so o de coordenar
atividades voltadas para o desenvolvimento de normas e prticas de controle
bibliogrfico e de recursos e o de apoiar o intercmbio internacional de registros
bibliogrficos (CAMPELLO, 2006).
A efetivao desse programa implica no empenho e planificao de cada
pas membro em empregar as recomendaes do CBU, permitindo o intercmbio
internacional de registros bibliogrficos, bem como promover a preservao do
patrimnio intelectual do pas.
Os organismos internacionais, em especial a IFLA, continuaram os
esforos de se conseguir um padro internacionalmente aceito para a descrio
bibliogrfica, bem como o uso globalizado de formatos de intercmbio de dados.
O Anglo-American Cataloging Rules (AACR), passou a ser adotado por diversas
agncias nacionais de catalogao e o formato MARC o mais usado para o
intercmbio de dados. Para as agncias nacionais, esse intercmbio significa no
apenas o cumprimento dos preceitos do CBU, mas, tambm, uma reduo nos
custos de produo dos registros bibliogrficos.
Para Silveira (2007, p. 32) a preocupao com a elaborao de registros
bibliogrficos que minimizassem os custos da catalogao resultou em um
crescimento da catalogao cooperativa e, consequentemente, a necessidade de
um consenso sobre a composio do registro bibliogrfico ficou evidente.
O controle bibliogrfico tem como objetivo fundamental desenvolver
ferramentas que permitam a organizao da informao para sua recuperao e
acesso. Atravs dos anos, uma srie de princpios e prticas comuns adquiriu
relevncia internacional, facilitando o intercmbio de informaes e a
racionalizao dos recursos atravs de projetos de cooperao e trabalho
coletivo. Os Princpios de Catalogao, as normas International Standard
Bibliographic Description/Descrio Bibliogrfica Internacional Normalizada
(ISBD), o formato Machine Readable Cataloging 21 (MARC21) e o Anglo-
American Cataloging Rules 2nd Edition (AACR2) so ferramentas de controle
bibliogrfico que cumprem diferentes funes, mas que se complementam para
-
32
alcanar um objetivo comum. As ferramentas do controle bibliogrfico esto em
estreita relao com as tecnologias, que por sua vez, influenciaram o
desenvolvimento de novos padres como um todo.
Na figura 1, so representados os padres do controle bibliogrfico
sugeridos por Picco e Ortiz Repiso (2012).
-
33
Figura 1 - Padres para o controle bibliogrfico
Fonte: adaptado e traduzido de (PICCO; ORTIZ REPISO, 2012)
-
34
Observam-se na figura trs nveis de padres para o controle bibliogrfico.
O primeiro nvel abstrato inclui os modelos e os princpios de catalogao. Esses
modelos e princpios incluem o FRBR, o FRAD, o Functional Requirements for
Subject Authority Data/Requisitos Funcionais para Dados de Autoridade Assunto
(FRSAD), os Princpios de Paris e a DPIC. O segundo nvel refere-se
representao de dados, onde se encontram os vocabulrios controlados e as
regras de catalogao, como a ISBD, o AACR2 e a RDA. O terceiro nvel
composto das aplicaes informticas, que incluem os formatos de
armazenamento, entre eles o MARC 21, o Universal Machine Readable
Cataloging (UNIMARC) e o Metadata Object Description Schema (MODS), e as
linguagens de codificao, como por exemplo a International Organization for
Standardization 2709 (ISO 2709) e o eXtensible Markup Language (XML).
A concretizao do projeto CBU pressupe a existncia em nvel nacional
de uma agncia bibliogrfica nacional, do registro de cada nova publicao
editada atravs do depsito legal e da disseminao destas informaes atravs
de bibliografias nacionais correntes. A agncia bibliogrfica nacional
responsvel pelo recebimento e divulgao, dentro de cada pas, dos registros
semelhantes e permutados com outras agncias nacionais de bibliografias e pela
publicao da bibliografia nacional (CALDEIRA, 1984).
No Brasil, os principais mecanismos do controle bibliogrfico so o
depsito legal e as bibliografias nacionais, cuja representante no Brasil a
Fundao Biblioteca Nacional.
Segundo Faria e Perico (2008, p. 95) as bibliografias [...] apresentam
uma lista de referncias segundo uma ordem especfica e contendo elementos
descritivos de documentos, de modo a permitir a sua identificao. Por sua vez, a
Bibliografia Nacional
[...] apresenta e descreve documentos publicados num dado pas ou escritos numa ou mais lnguas desse pas. [...] As bibliografias nacionais so em geral retrospectivas. Apareceram a partir do sculo XVI, so com frequncia muito parciais e multiplicaram-se com carter metdico no sculo XIX (FARIA; PERICO, 2008, p. 95).
A primeira bibliografia brasileira data de 1886, com a publicao do
-
35
Boletim das Acquisies mais importantes feitas pela Bibliotheca Nacional.
A bibliografia nacional brasileira marcada por descontinuidades e interrupes.
O Boletim Bibliogrfico da Biblioteca Nacional foi publicado de 1918 a 1982,
quando se tornou a Bibliografia Brasileira suspensa em 1995 por problemas
operacionais. Atualmente, acompanha-se a bibliografia brasileira atravs dos
catlogos da Biblioteca Nacional (GRINGS; PACHECO, 2010). Sua importncia
advm do fato de proporcionar uma representao de toda a produo intelectual
do pas, reunindo referncias dessas publicaes em um nico local, o que
promove facilidade em seu acesso por pesquisadores e cidados comuns.
Em grande medida a confeco de uma bibliografia nacional passa pelo
compromisso do depsito legal de publicaes produzidas em um determinado
pas. Faria e Perico (2008, p. 227) definem o depsito legal como:
[...] uma obrigao atribuda aos impressores, editores e distribuidores de depositar, em organismos designados por lei ou por uma conveno, um nmero fixo de exemplares de determinados documentos produzidos, publicados, ou difundidos no pas, seja qual for a sua natureza e o seu sistema de reproduo. [...] Contribui tambm para a defesa e preservao dos valores da lngua e cultura portuguesas, produo e divulgao da bibliografia nacional corrente, elaborao de estatsticas das edies nacionais. O depsito legal foi criado com a finalidade de conservar todas as publicaes no pas.
O Depsito Legal existe no Brasil desde 1805, com diferentes tipos de leis
e funes. Atualmente regido pela Lei n 10.994 de 2004 que prev o envio de
um ou mais exemplares de toda a publicao editada ou distribuda no pas
Biblioteca Nacional, com a finalidade de se efetuar o registro e guarda da
produo intelectual do pas e a elaborao da bibliografia nacional, promovendo
o controle bibliogrfico da produo editorial brasileira. Em 2010, foi promulgada a
Lei n 12.192 que prev o depsito legal de obras musicais na Fundao
Biblioteca Nacional (GRINGS; PACHECO, 2010).
Alm de permitir a elaborao e manuteno da bibliografia nacional, o
depsito legal contribui indiretamente para a elaborao de um catlogo de
autoridade nacional, tambm a cargo da Biblioteca Nacional, a agncia
bibliogrfica nacional brasileira.
-
36
Caldeira, em um seminrio ocorrido na Universidade Federal de Minas
Gerais em 1984, alertava sobre a importncia da conscientizao do papel
desempenhado pela Biblioteca Nacional como rgo de coordenao, permitindo
assim, a integrao nas atividades de informao, promovendo a diminuio de
custos pelo rpido acesso informao desejada. Para que o controle
bibliogrfico no Brasil alcance seus objetivos necessrio um planejamento
nacional que interligue centros de documentao, bibliotecas e editoras,
integradas em nvel nacional e internacional, formando um sistema global
coordenado, cuja coordenao cabe Biblioteca Nacional.
Em termos ideais, a Biblioteca Nacional poderia implantar um programa
nacional de polticas pblicas para o controle de autoridade nvel nacional.
Entretanto, a Biblioteca Nacional tem passado por problemas notrios de
estrutura, financiamento, equipes, entre outros. A instituio dispe de poucos
profissionais, e estes ainda se esforam em manter os processos bsicos de
catalogao e atualizao da bibliografia nacional, bem como dos catlogos
bibliogrficos e de autoridade da instituio.
Para Svenonius (2001) o grande problema tcnico fornecer variao local
para culturas que classificam de forma diferente, usam diferentes linguagens de
recuperao e possuem diferentes convenes de nomenclatura, de modo a no
revogar as normas que facilitam o CBU. Eis um dos grandes desafios da
catalogao atualmente. Com o desenvolvimento da tecnologia da informao,
catlogos podem ser acessados remotamente em qualquer parte do planeta, e o
usurio deixa de ser apenas local e fsico, e passa a ser multilocal, virtual e
remoto. preciso equilibrar as necessidades desses usurios multilocais to
dispares, com interesses e realidades socioculturais diferentes, s necessidades
dos usurios locais, que, muitas vezes, no esto refletidas nos instrumentos de
representao da informao utilizados pelas bibliotecas durante a catalogao,
mas fundamentais para o intercmbio de informaes com outras instituies.
Esse problema pode ser minimizado quando existem polticas pblicas de
informao. Para Silveira (2013, p. 15) desenvolver polticas de informao para
grupos especficos garantiria maior possibilidade de acesso e escolha aos
cidados, pois incluiria o contexto sociocultural nos mecanismos de
-
37
representao. No caso brasileiro, faz-se urgente o desenvolvimento de polticas
pblicas em defesa da Biblioteca Nacional, como instituio de preservao e
disseminao da produo intelectual brasileira, e por outro lado, de polticas
sobre a catalogao em plano nacional e sua importncia no aperfeioamento da
biblioteconomia brasileira.
Aps a discusso sobre a importncia do controle bibliogrfico, o prximo
tpico explora a histria da catalogao, apresentando os principais cdigos
desenvolvidos. Em um segundo momento, apresentam-se as definies que
buscam descrever e, principalmente, conceituar a catalogao dentro do escopo
da Cincia da Informao e da Representao da Informao.
2.2 A CATALOGAO E SEUS PRINCPIOS
No sculo XIX surgem grandes figuras na rea da catalogao. Uma
dessas, Panizzi, comeou a trabalhar no British Museum em 1831 e l encontrou
o acervo organizado por ttulos sob um cabealho de assunto, muitas vezes
obscuro e intil. Em 1836, Panizzi elaborou um relatrio sugerindo a utilizao de
um catlogo de autor com ndice de assuntos, no lugar de um catlogo
classificado. A partir disso, Panizzi sistematiza, em conjunto com outros
colaboradores do British Museum, o primeiro corpo de regras de catalogao, o
Rules for the Compilation of the Catalogue, mais conhecidas como as 91 Regras
de Panizzi. Essas regras definiam como registrar os nomes dos autores e os
ttulos e como catalogar obras annimas.
Denton (c2007) sintetiza de forma clara a importncia das 91 Regras de
Panizzi ao afirmar que essas so a fonte da moderna catalogao por vrias
razes: foram desenvolvidas por um grupo e no apenas por um homem; foram
objeto de um intenso debate, anlise e justificativa e aprovadas por rgos
governamentais; receberam ateno internacional ao serem usadas por uma
grande biblioteca, neste caso o British Museum, e produziram um catlogo melhor
do que os existentes at ento. Panizzi elaborou suas regras pensando nas
-
38
necessidades do usurio, sendo a ideia de "obra" e a padronizao parte de seu
legado. Percebe-se tambm nas regras de Panizzi a importncia da padronizao
dos autores, que assim permitiriam uma melhor recuperao da informao. As
91 Regras de Panizzi podem ser consideradas as primeiras regras
institucionalizadas de catalogao, sendo o cdigo de catalogao mais antigo o
de Charles C. Jewett, de 1852, escrito para o Smithsonian Institute.
Em 1876, Cutter publica o Rules for a Printed Dictionary Catalogue, sendo
reeditado mais tarde como Rules for a Dictionary Catalog. Segundo Garrido Arilla
(1996), com a proliferao das bibliotecas pblicas tanto nos Estados Unidos
quanto na Europa a partir do sculo XIX, o aumento de estudantes universitrios,
a reduo do analfabetismo e o crescimento da populao promoveram a
incluso de usurios s bibliotecas que tinham acesso aos livros quase
exclusivamente por autor, e esses usurios demanda sua recuperao tambm
por assuntos. poca, os catlogos em fichas haviam atingido relevncia em
termos de adoo e utilizao. Cutter, ento, apresenta uma nova viso de
catlogo, onde no se teria apenas listas de itens por autor, mas itens arranjados
por autor, ttulo e assunto, todos juntos em uma ordem alfabtica nica
(DENTON, c2007). Para Barbosa (1978, p. 29) trata-se de um verdadeiro cdigo,
constitudo de 369 regras que incluem normas no s para entradas por autor e
por ttulo, mas tambm para a parte descritiva, cabealhos de assunto, e ainda
alfabetao e arquivamento de fichas.
Um dos princpios bsicos observados por Cutter em suas regras a
convenincia do usurio, que dever ser preferida do catalogador. Garrido Arilla
(1996) afirma que os princpios estabelecidos por Cutter representam a base da
catalogao norte-americana, sendo considerado o grande terico da
catalogao.
Esse perodo, ou seja, final do sculo XIX e incio do XX, apresenta o
desenvolvimento de cdigos nacionais de catalogao em vrios pases
europeus. Com a venda de fichas catalogrficas pela LC, em 1901, a American
Library Association (ALA), iniciou estudos sobre as regras adotadas pela LC. Em
1904, a ALA e a Library Association da Inglaterra, comeam tambm estudos
para a criao de um cdigo comum, buscando uniformidade e padronizao na
-
39
catalogao de ambos os pases. A colaborao desses estudos a publicao,
em 1908, de dois cdigos: a edio americana denominada Catalog, Rules,
Author and Titles Entries, e a edio britnica, denominada Cataloguing Rules,
Author and Titles Entries. As edies foram baseadas nas regras de Panizzi,
Cutter, Jewet e da LC e ficaram conhecidas como o Cdigo da ALA (GARRIDO
ARILLA, 1996 ; MEY, 1995).
Em 1941, uma segunda edio do Cdigo da ALA foi publicada. Essa
edio estava dividida em duas partes. A primeira parte para pontos de acesso e
cabealhos, e a segunda parte para a descrio de livros. Uma segunda edio
definitiva publicada em 1949, em mais dois volumes. Porm, com as
divergncias existentes entre os bibliotecrios sobre seu cdigo, em 1951, a ALA
solicita a Seymour Lubetzky, bibliotecrio da LC, que analisasse seu cdigo de
1949. Em 1953, Lubeztky publica seu relatrio sobre esta anlise, denominado
Cataloguing Rules and Principles. Este documento considerado uma das
principais contribuies catalogao. Lubetzky constatou que as regras de
catalogao tornaram-se to complexas porque os catalogadores tinham perdido
de vista os objetivos e funes do catlogo: ajudar os usurios a identificar e
distinguir entre as obras que atendam s suas necessidades. Sua principal
contribuio a fundamentao terica que atribui ao processo de catalogao
(GARRIDO ARILLA, 1996; KNOWLTON, 2009).
Os debates ocorridos, principalmente a partir de 1950, e a crescente
necessidade de padronizao e intercmbio de dados entre as bibliotecas, levou
a IFLA a organizar um grupo de trabalho, em 1954, encarregado de estudar a
coordenao das regras de catalogao em mbito internacional. Estes trabalhos
resultaram na Conferncia Internacional sobre Princpios de Catalogao,
ocorrida em 1961 em Paris, mais conhecida como Conferncia de Paris. O
objetivo desta conferncia era estudar alguns princpios de catalogao que
norteassem o catalogar sobre a padronizao dos pontos de acessos nos
catlogos (GARRIDO ARILLA, 1996).
Como resultado dessa conferncia foi deferido a Declarao de
Princpios, ou Princpios de Paris, como ficou conhecida. Essa declarao
buscou definir as funes e objetivos do catlogo, com o propsito de servir como
-
40
base para uma normalizao internacional. A Declarao de Paris define como
funes do catlogo:
O catlogo deve ser um instrumento eficiente para verificar:
se a biblioteca contm um livro em particular especificado por:
(a) seu autor e ttulo, ou,
(b) o ttulo por si s, caso o autor no seja identificado no livro, ou,
(c) se o autor e o ttulo so inadequados ou insuficientes para sua
identificao, um substituto adequado para o ttulo deve ser elaborado;
(a) que obras de um determinado autor e,
(b) que edies de uma obra particular esto na biblioteca
(INTERNATIONAL CONFERENCE ON CATALOGUING
PRINCIPLES, 1961).
Svenonius (2001) considera que a Declarao de Paris apresenta
parcialmente o que um sistema bibliogrfico, ou catlogo, possui de objetivos e
funes. Devido ao seu escopo centrado em organizar documentos por autor e
ttulo, no incluiu em seus objetivos a organizao da informao por assunto.
Isto pode ser claramente observado no escopo da Declarao de Paris, conforme
segue:
Os princpios aqui declarados aplicam-se apenas escolha e forma de cabealhos e formas de entrada - ou seja, para os principais elementos que determinam a ordem das entradas - em catlogos de livros impressos na qual as entradas sob os nomes dos autores e, quando estes so inadequados ou insuficientes, sob os ttulos dos trabalhos so combinados em uma sequncia alfabtica (INTERNATIONAL CONFERENCE ON CATALOGUING PRINCIPLES, 1961, p. 1, traduo nossa).5
Os principais pontos de acordo na Declarao de Paris esto relacionados
aos pontos de acesso para nomes pessoais e ttulos uniformes, sendo
considerada a precursora da padronizao dos pontos de acesso das obras
5 The principles here stated apply only to the choice and form of headings and entry words i.e. to
the principal elements determining the order of entries in catalogues of printed books in which entries under authors names and, where these are inappropriate or insufficient, under the titles of works are combined in one alphabetical sequence (INTERNATIONAL CONFERENCE ON CATALOGUING PRINCIPLES, 1961, p. 1).
-
41
existentes e passveis de serem catalogadas (MEY, 1995; SANTOS; CORRA,
2009).
A Conferncia de Paris tambm foi significativa por ser a primeira vez que
se chegava a acordos internacionais sobre catalogao, incluindo tanto aspectos
relativos aos objetivos e funes do catlogo quanto a sua organizao. Como
consequncias imediatas, os cdigos de catalogao, que foram publicados nos
anos seguintes, incorporaram suas recomendaes, sendo as Instrucciones para
la redaccin del catlogo alfabtico de autores y obras annimas en las
bibliotecas pblicas del Estado, de 1964, o primeiro cdigo a aderir aos
Princpios de Paris (ESTIVILL RIUS, 2012).
Os Princpios de Paris foram o ponto de partida de uma colaborao
internacional. A IFLA, atravs da Seo de Catalogao promoveu diversos
programas entre eles a ISBD e o CBU buscando uma efetiva colaborao e
cooperao internacional. Contudo, quarenta anos aps os Princpios de Paris,
os acervos das bibliotecas diversificaram-se, tornando evidente a necessidade de
adequao da catalogao e dos catlogos s novas formas de recuperao da
informao promovidas pelas mudanas e avanos tecnolgicos (ESTIVILL RIUS,
2012; SANTOS; CORRA, 2009).
Aps outras revises por Lubetzky e os Princpios de Paris, a ALA, a
Library Association da Inglaterra e a Canadian Library Association publicam em
1967 o Anglo-American Cataloguing Rules (AACR). O AACR apresentava regras
para pontos de acesso, para a descrio de livros e, tambm, para a descrio de
materiais no livro. O AACR passou a ser adotado pela LC e pelas principais
bibliotecas americanas, inglesas e canadenses (JOINT STEERING COMMITTEE
FOR DEVELOPMENT OF RDA, 2009; SANTOS; CORRA, 2009).
poca, o intercmbio de informaes tornava-se mais frequente,
principalmente com a elaborao e comercializao de fichas catalogrficas pela
LC. Os princpios de catalogao tambm expressavam a necessidade de uma
padronizao na representao da informao. Assim, havia a necessidade
latente de uma padronizao internacional para a catalogao. A IFLA, vista
disso, formou um grupo de estudos para viabilizar uma proposta de padronizao.
-
42
O relatrio desse grupo foi apresentado no International Meeting of Cataloguing
Experts, em 1969 em Copenhague, sendo, ento, estabelecida a ISBD. Esta tem
por objetivo identificar os componentes da descrio bibliogrfica, sua ordem de
apresentao preferencial e a pontuao necessria na elaborao do registro
bibliogrfico (SANTOS; CORRA, 2009).
Em 1978, fora apresentada uma segunda edio do AACR, incorporando
as ISBDs ao cdigo. Esse passou por revises em 1988, 1998 e 2002 seguindo
basicamente a mesma estrutura do AACR2, no entanto, apresentando regras
atualizadas que refletiam as mudanas experimentadas ao longo do tempo, tanto
quanto uma nova perspectiva sobre os recursos eletrnicos, publicaes seriadas
e recursos integrados (JOINT STEERING COMMITTEE FOR REVISION OF
AACR, 2005).
Em seguida as revises, o Anglo-American Cataloguing Rules 2nd edition (
AACR2), tornou-se o cdigo de catalogao mais usado internacionalmente. Isso,
em grande parte, devido aos projetos de catalogao cooperativa desenvolvidos
nos Estados Unidos, principalmente pela LC como, por exemplo, o Monographic
Bibliographic Record Cooperative Program (BIBCO) e o Name Authority
Cooperative Program (NACO).
No Brasil, a adoo do AACR ocorreu oficialmente a partir de 1969, data da
traduo brasileira. Contudo, sua adoo efetiva ocorre em 1976, durante o 1
Encontro dos Grupos de Trabalhos em Processos Tcnicos da Federao
Brasileira das Associaes de Bibliotecrios, Cientistas da Informao e
Instituies (FEBAB). Essa adoo foi considerada essencial pelo carter
internacional do AACR, sendo necessria uniformidade dos pontos de acesso
para obras representadas em catlogos, apontadas por escolas de
Biblioteconomia e em acordo com a finalidade da Conferncia de Paris
(BARBOSA, 1978; SANTOS; CORRA, 2009).
Com o desenvolvimento das tecnologias de informao e comunicao a
partir dos anos de 1960, novas demandas surgiram. Os cdigos de catalogao
em uso, principalmente o AACR2, no contemplavam em suas regras os
diferentes suportes de informao, especialmente a informao produzida e
-
43
distribuda eletronicamente ou pela internet. Os custos de catalogao
intensificaram-se e a catalogao copiada6 pode responder a esse problema.
vista disso, a IFLA, por intermdio de seus grupos de estudos, passa a
indagar sobre o modelo de catalogao existente. Ento, na dcada de 1990, a
IFLA patrocinou a criao do IFLA Study Group on the Functional Requirements
for Bibliographic Records, grupo de estudos para a definio de requisitos
funcionais para os dados bibliogrficos. Em 1998 publicado o FRBR.
O FRBR busca, entre outros objetivos, garantir a qualidade do registro
bibliogrfico atravs de requisitos bsicos de funcionalidade para esses registros,
com foco nas tarefas realizadas pelo usurio durante sua pesquisa. O FRBR, no
uma norma ou cdigo de catalogao, todavia, um modelo conceitual do tipo
entidade-relacionamento7. Empenha-se em explicar de forma terica as funes
dos registros bibliogrficos e de autoridade em relao aos diferentes suportes ou
mdias, tecnologias e necessidades dos usurios.
O modelo conceitual FRBR refora os objetivos bsicos dos catlogos8 e a
importncia dos relacionamentos para que os usurios possam cumprir as tarefas
bsicas de encontrar, identificar, selecionar e obter informaes que necessitam
(JOINT STEERING COMMITTEE FOR REVISION OF AACR, 2005).
Durante o desenvolvimento do FRBR, o grupo de estudos verificou a
necessidade de ampliar os estudos sobre os requisitos funcionais para os dados
de autoridade. O grupo entendeu que era indispensvel descrever a forma como
as entidades e os relacionamentos so refletidos em pontos de acesso utilizados
em registros bibliogrficos, alm de explicar como catalogadores determinam a
forma do nome a ser utilizado nos pontos de acesso, algo no expresso no FRBR
e que precisaria de um estudo especfico para sua realizao (Patton, 2007b).
Esses estudos iniciaram em 1999 com o IFLA Working Group on
6 Adaptao de um registro bibliogrfico pr-existente encontrado em outro banco de dados
bibliogrficos para se adequar s caractersticas da obra em mos a ser catalogada. So realizadas modificaes para corrigir erros bvios e pequenos ajustes para refletir prtica local de catalogao, distinta de catalogao inicial (REITZ). 7 O conceito de entidade-relacionamento ser referido no captulo 4 ao se definir os modelos
conceituais. 8 Esses objetivos sero abordados no prximo item, 2.3 - Objetivos e funes do catlogo.
-
44
Functional Requirements and Numbering of Authority Records / Grupo de
Trabalho sobre os Requisitos Funcionais e Numerao para Registros de
Autoridade (FRANAR)9. Em 2009, o FRANAR apresenta o documento final do
FRAD. Os objetivos do FRAD so: prover um quadro para a anlise dos requisitos
funcionais para o tipo de dados de autoridade que requerido no controle de
autoridade e no seu compartilhamento internacional; fornecer um quadro
estruturado de referncia que relacione os dados elaborados pelos criadores do
registro autoridade para atender as necessidades de seus usurios; e auxiliar na
avaliao do potencial de cooperao internacional e utilizao de dados de
autoridade, tanto em bibliotecas como em outras instituies (IFLA WORKING
GROUP ON FUNCTIONAL REQUIREMENTS AND NUMBERING OF
AUTHORITY RECORDS, 2013).
Concomitantemente ao desenvolvimento do FRBR e do FRAD, em 2003, a
IFLA inicia uma srie de conferncias para a atualizao e reviso dos princpios
de catalogao, as denominadas IFLA Meeting of Experts on an International
Cataloguing Code (IMEICC). As conferncias ocorreram entre os anos de 2003 e
2007, tendo o primeiro IMEICC ocorrido na cidade de Frankfurt, na Alemanha. O
propsito do IMEICC era formular um conjunto de princpios com o objetivo de
facilitar o intercmbio internacional de registros bibliogrficos e de autoridade,
baseado em trs objetivos:
1) desenvolver uma declarao de princpios internacionais de catalogao
concebida para o atual ambiente de catalogao;
2) harmonizar cdigos de catalogao nacionais;
3) sugerir um conjunto de regras norteador para um cdigo internacional de
catalogao (GENETASIO, 2012).
Do 2 ao 4 IMEICC, ocorridos em Buenos Aires/Argentina, Cairo/Egito e
Seul/Coria do Sul, as discusses sobre os princpios continuaram com
apresentaes e revises dos esboos, sendo no 5 IMEICC, ocorrido na cidade
de Pretria na frica do Sul em 2009, publicada a DPIC, conhecida como
9 O grupo de trabalho FRANAR e o modelo conceitual FRAD sero tratados captulo 4.
-
45
Princpios de Frankfurt. Fortemente influenciada pelos modelos conceituais
FRBR e FRAD, essa declarao apresenta como princpios gerais a consistncia
e a padronizao dos processos de descrio e construo de pontos de acesso,
possibilitando e facilitando o compartilhamento de dados bibliogrficos e de
autoridade. Outro princpio fundamental o da integrao, onde as descries
para todos os tipos de materiais e formas controladas de nomes de entidades
devem ser baseadas em um conjunto de regras comuns (IFLA, 2009).
Esta declarao substitui e amplia o mbito dos Princpios de Paris, incluindo, alm das obras textuais, todos os tipos de materiais, e alm da simples escolha e forma de entrada, todos os aspectos dos dados bibliogrficos e de autoridade utilizados em catlogos de bibliotecas. Inclui no s princpios e objetivos (isto , funes do catlogo) mas tambm regras orientadoras que devem ser includas nos cdigos de catalogao em mbito internacional, bem como servir de orientao para as funcionalidades de pesquisa e recuperao (IFLA, 2009, p. 1)
A DPIC mantm a essncia dos objetivos do catlogo proposto por Cutter,
o da convenincia do usurio, e adota as tarefas do usurio FRBR como objetivos
do catlogo, recomendando como padro para a descrio bibliogrfica a ISBD.
Esta declarao compreende:
1. Abrangncia,
2. Princpios gerais,
3. Entidades, atributos e relaes,
4. Objetivos e funes do catlogo,
5. Descrio bibliogrfica,
6. Pontos de acesso,
7. Fundamentos para a funcionalidade de pesquisa.
A DPIC define como os objetivos e funes do catlogo encontrar,
identificar, selecionar, adquirir ou obter acesso a um recurso e navegar em um
catlogo e para alm dele.
Na apresentao desses objetivos e funes ficam explcitas as influncias
-
46
dos modelos conceituais FRBR e FRAD, onde as tarefas do usurio de encontrar,
identificar, selecionar e obter, so apresentados e relacionados s entidades do
Grupo 1 e do Grupo 2 descritos nesses modelos e que sero tema do captulo 4
desta dissertao.
A DPIC apresenta avanos, principalmente quanto ao estabelecimento de
diretrizes para o controle de autoridade. Em seus princpios gerais, estabelece
que, a fim de que ocorram consistncia e padronizao de registros bibliogrficos
e de autoridade as descries e a construo de pontos de acesso devem ser
to normalizadas quanto possvel. Isso permite maior consistncia o que, por sua
vez, aumenta a capacidade de partilhar dados bibliogrficos e de autoridade
(IFLA, 2009, p. 2). Em seu item 6 - Pontos de acesso - apresenta de forma
explcita a funo do registro de autoridade, construdo para controlar as formas
autorizadas e variantes de nomes usados como pontos de acesso, alm de definir
o registro de autoridade em seu glossrio como um conjunto de elementos de
dados que identifica uma entidade e pode ser usado para facilitar o acesso ao
ponto de acesso autorizado para essa entidade ou para disponibilizar quaisquer
outros pontos de acesso para a entidade (IFLA, 2009, p. 13).
Genetasio (2012) considera que alguns aspectos da DPIC no so
totalmente satisfatrios. O primeiro a ambiguidade de seus objetivos, que, por
um lado, so apresentados como um conjunto de princpios de catalogao e, por
outro, como um conjunto de orientaes para a construo de um cdigo
internacional de catalogao. O segundo aspecto insatisfatrio da declarao a
aparente ausncia de uma viso geral terica, pois vrios nveis completamente
diferentes coexistem dentro do DPIC: princpios de natureza geral (princpios
gerais); modelos conceituais (entidades, atributos e relacionamentos, objetivos e
funes do catlogo); regras de catalogao (descrio bibliogrfica, pontos de
acesso); e diretrizes para interfaces de OPACs.
Em paralelo, durante o International Conference on the Principles and
Future Development of AACR, realizada em 1997 em Toronto no Canad, o Joint
Steering Committee for Revision of AACR elaborou uma lista de itens de ao,
desencadeando em um processo de reviso do AACR. A princpio esta reviso
estava voltada a alteraes relacionadas, principalmente, a flexibilidade e
-
47
extensibilidade do AACR2. Em 2004, percebe-se que as mudanas exigidas no
cdigo vo alm do nvel de alteraes requerendo uma reviso exaustiva das
regras. O comit denominou essa nova reviso de AACR3. Conforme novas
mudanas eram propostas, testadas e discutidas, constata-se que era preciso
avanar mais. Em 2005, o comit anunciou uma mudana de enfoque, ao invs
de se tentar trabalhar nos limites das estruturas do AACR2, esta seria
abandonada e uma nova estrutura criada, buscando uma harmonizao mais
completa com o modelo FRBR. O nome da norma tambm seria mudado para
RDA e o comit passaria a se chamar Joint Steering Committee for development
of RDA. A RDA utiliza muitos dos elementos construtivos do AACR2, e os
reorganiza numa nova estrutura baseada no arcabouo terico expresso nos
modelos conceituais FRBR e FRAD (OLIVER, 2011).
A RDA a norma de catalogao que substitui o AACR2. Este no mais
ter revises peridicas, que esto destinadas a RDA e que so publicadas na
RDA Toolkit, estabelecida em 2010. A RDA Toolkit uma ferramenta online para
acesso as normas por meio de um navegador de internet e mediante assinatura.
Tambm oferece acesso a um conjunto de ferramentas auxiliares ao catalogador,
como a ltima verso do AACR2. A LC iniciou oficialmente o uso da RDA para a
catalogao em maro de 2013. A norma RDA ser tratada com mais
detalhamento no captulo 4.
Segue-se a linha do tempo do desenvolvimento dos cdigos de
catalogao com os principais cdigos, normas, diretrizes e conceitos
estruturados a partir do sculo XIX at os dias atuais, com o objetivo de se obter
um quadro sinttico e ilustrativo dos princpios e fundamentos tericos
precursores da RDA.
-
48
Figura 2 Linha do tempo do desenvolvimento dos cdigos de catalogao
Fonte: elaborado pelo autor
Essa linha do tempo no busca abranger todos os cdigos de catalogao
produzidos no perodo, mas empenha-se em alinhar cronologicamente os
principais cdigos, regras e fundamentos tericos que exercem influncia direta
na construo da RDA.
Aps o relato do desenvolvimento e histrico da catalogao, segue-se
com a interpelao sobre os conceitos da catalogao.
Como um recurso de descrio fsica e bibliogrfica do item, a catalogao
pode ser considerada o principal mtodo para organizar vrias colees e
consiste da entrada de diversos itens responsveis por caracterizar cada
elemento da coleo, com o objetivo de fornecer uma representao do
documento descrito de uma forma nica e no ambgua permitindo sua
identificao, localizao, representao e recuperao nos catlogos
correspondentes (GUINCHAT; MENOU, 1994 ; RODRIGUES et al., 2002).
O uso do termo catalogao no Brasil possui algumas variantes,
principalmente pela separao entre a descrio fsica e de contedo da obra.
Muitos preferem separar estas duas vertentes em representao descritiva e
representao temtica. A representao descritiva retratada de forma
-
49
equivocada como apenas a descrio dos elementos fsicos do item catalogrfico.
Contudo, tambm abrange a descrio e representao da responsabilidade
autoral e de publicao, os pontos de acesso de ttulo e autoria, paginao, etc. A
representao temtica retratada como a descrio dos elementos de contedo
da obra, apresentando os elementos relacionados ao assunto.
Com a publicao do FRBR, o repensar da catalogao tambm envolveu
o repensar da separao entre descrio fsica e de contedo. O preceito bsico
do modelo conceitual FRBR o de entidade-relacionamento, onde no h
separao entre contedo e descrio do item, uma vez que estes se
complementam.
Por esta dissertao estar voltada ao controle de autoridade da
responsabilidade intelectual da obra, a catalogao descritiva ser tratada com
maior detalhamento. Usa-se o termo catalogao para designar a catalogao
descritiva, utilizando-se como principal conceito o de Mey e Silveira (2010) que
definem a catalogao como o estudo, a preparao e a organizao de
mensagens, com base em registros do conhecimento reais ou ciberespaciais,
existentes ou passveis de incluso em um ou vrios acervos, com a finalidade de
criar contedos comunicativos que permitam interao entre o conhecimento e os
usurios.
Alm de seu carter comunicacional,
[...] a catalogao, como processo essencial para a descrio e padronizao das informaes representadas, construda a partir de regras que ofeream o mximo de padronizao e minimizem as interpretaes individuais, procurando garantir a unicidade do item informacional representado e, ao mesmo tempo, sua universalidade. (SANTOS; CORRA, 2009, p. 19).
A catalogao, como a reunio lgica de dados bibliogrficos em registros
recuperveis e utilizveis, o processo que permite a biblioteca prosseguir com
suas misses centrais de atendimento e de acesso livre e aberto a todo o
conhecimento e as informaes registradas. O controle de autoridade vital e
central a esse processo. No possvel fornecermos um servio real de biblioteca
sem uma arquitetura bibliogrfica e essa no pode existir sem o controle
bibliogrfico (Gorman, 2004). O controle de autoridade confere catalogao a
-
50
padronizao necessria aos seus processos descritivos, tornando-se essencial
na garantia de unicidade e consistncia dos dados.
A adoo de normas que permitem o intercmbio da mensagem
catalogrfica entre instituies documentais no mundo amplia as alternativas de
escolha pelos usurios e auxilia outros profissionais durante o processo de
catalogao. A consistncia sinttica e semntica do registro bibliogrfico facilita o
reconhecimento dos sinais e sua compreenso pelo uso de linguagem comum.
No entanto, existe um fator determinante e geralmente ignorado: a necessidade
dos usurios. Cabe ao catalogador definir os elementos essenciais que
satisfaam as necessidades de seu pblico especfico para o cumprimento de tais
aes (MEY; SILVEIRA, 2010; MEY; ZAFALON, 2009).
Mey e Silveira (2010) alertam sobre o uso das tcnicas sem sabedoria, uso
esse que abarca desde as lacunas hermenuticas at o endeusamento das
tecnologias. Atenta-se, desse modo, para um problema no apenas bibliotecrio,
mas profissional brasileiro: o emprego incondicional de tcnicas e instrumentos,
no exatamente adequados queles aos quais se destinam. Modesto (2007)
salienta que a catalogao, no Brasil, evolui impulsionada por fatores internos e
externos. As tecnologias de informao moldam as prticas de catalogao e
reconstroem o perfil do catalogador brasileiro.
Ao longo do tempo, as regras e normas catalogrficas moldaram-se as
necessidades dos usurios e aos avanos tecnolgicos, sendo constante seu
principal objetivo de processamento analtico da informao com a finalidade de
representar documentos, permitindo o armazenamento e a recuperao da
informao.
A catalogao, como outros processos, tem uma natureza dupla: pode ser interpretada como um processo e um produto; a resultante de todas as suas operaes e funes podem ser uma ficha catalogrfica (em sistemas tradicionais) ou um registro (nos automatizados) (JIMENEZ MIRANDA, 2003, p. 5, traduo nossa).10
10
La catalogacin, al igual que otros procesos, presenta una naturaleza dual: puede interpretarse como proceso y como producto; la resultante de todas sus operaciones y funciones puede ser una ficha catalogrfica (en sistemas tradicionales) o un registro (en los automatizados) (JIMENEZ MIRANDA, 2003, p. 5)
-
51
Como um produto da catalogao, o registro bibliogrfico (seja ele
analgico, a ficha catalogrfica, ou automatizado) possui elementos descritivos,
temticos e de autoridade. Com a normatizao da descrio da informao no
decorrer do desenvolvimento da catalogao, esses elementos foram adquirindo
uma ordem de apresentao, ordem essa definida por instrumentos normativos
da catalogao, sendo o principal deles a ISBD. Esse formato de apresentao
busca facilitar a comunicao entre o usurio e o registro bibliogrfico.
O registro bibliogrfico interage com outros registros, entre eles, o registro
de autoridade. O registro de autoridade criado para o estabelecimento do ponto
de acesso