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DENISE MANCERA SALGADO O CONTROLE DE AUTORIDADE SOB A NORMA RDA: análise da aplicação e implicações na construção de registros de autoridade Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Escola de Comunicação e Artes (ECA), da Universidade de São Paulo (USP), Área de Concentração: Cultura e Informação, Linha de Pesquisa: Gestão de Dispositivos de Informação, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciência da Informação. Versão corrigida. Orientador: Prof. Dr. José Fernando Modesto da Silva. São Paulo 2015

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  • DENISE MANCERA SALGADO

    O CONTROLE DE AUTORIDADE SOB A NORMA RDA: anlise da aplicao e

    implicaes na construo de registros de autoridade

    Dissertao apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Cincia da Informao

    da Escola de Comunicao e Artes (ECA),

    da Universidade de So Paulo (USP), rea

    de Concentrao: Cultura e Informao,

    Linha de Pesquisa: Gesto de Dispositivos

    de Informao, como requisito parcial para

    obteno do ttulo de Mestre em Cincia da

    Informao. Verso corrigida.

    Orientador: Prof. Dr. Jos Fernando

    Modesto da Silva.

    So Paulo

    2015

  • 1

    2015

    proibida a reproduo impressa e eletrnica deste documento para fins

    comerciais. Autoriza-se a reproduo, total ou parcial, por processos

    fotocopiadores e eletrnicos, exclusivamente para fins acadmicos e cientficos,

    com a identificao completa da fonte.

    Salgado, Denise Mancera

    O controle de autoridade sob a norma RDA: anlise da aplicao e implicaes na construo de registros de autoridade / Denise Mancera Salgado. - So Paulo, 2015.

    172 f. : il. Dissertao (mestrado) - Escola de Comunicaes e

    Artes/USP, 2015. Bibliografia 1. Catalogao 2. Controle de autoridade 3. RDA I.

    Ttulo

  • 2

    FOLHA DE APROVAO

    Nome do Autor: Denise Mancera Salgado

    Ttulo: O controle de autoridade sob a norma RDA: anlise da aplicao e

    implicaes na construo de registros de autoridade

    Aprovada em _______ de ________________ de ____________________

    Presidente da Banca: Prof. Dr. Jos Fernando Modesto da Silva

    Banca Examinadora:

    Prof. Dr. __________________________________________________________

    Instituio: ___________________________Assinatura: ____________________

    Prof. Dr. __________________________________________________________

    Instituio: ___________________________Assinatura: ____________________

    Prof. Dr. __________________________________________________________

    Instituio: ___________________________Assinatura: ____________________

  • 3

    O homem tem uma grande tendncia para o esquecimento.

    O passado est morrendo de minuto a minuto, o segundo

    que se vai j ontem e as recordaes vo sendo

    empurradas para o fundo, do contrrio transbordariam por

    todos os buracos do corpo as novas vises, o que de novo

    se ouviu. Mas de vez em quando bom ir buscar as coisas

    que ficaram amassadas l no fundo.

    (Mrio Lago)

  • 4

    DEDICATRIA

    Ao meu filho Samuel, a quem amo incondicionalmente.

    Ao meu amado, amigo e sempre companheiro Fbio.

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    Maria Antonia Gaviolli Mendes Botelho, M, minha inspirao. Agradeo

    por me ensinar a amar a profisso de bibliotecrio, me incentivando e apoiando

    em todos os momentos. Sempre me lembro daquela garotinha sentada em cima

    da mesa ajudando voc a intercalar fichas no catlogo.

    Aos meus pais, Danilo Salgado e Eni Mancera Salgado, que mesmo em

    dificuldades, sempre me ampararam e incentivaram a seguir estudando, a ter uma

    profisso e a ser uma pessoa de bem. Vocs so meus exemplos de vida.

    Ao meu filho, Samuel Salgado Schlottfeldt, a quem no pude dedicar tanto

    tempo quanto gostaria neste perodo de estudo.

    Ao meu marido, Fbio dos Santos Schlottfeldt, cujo incentivo, apoio e

    pacincia durante os perodos de insanidade no desenvolvimento desta

    dissertao me ajudaram a prosseguir na batalha. O amor se mostra nesses

    pequenos detalhes. Sou uma pessoa muito melhor ao seu lado.

    Ao meu orientador, Prof. Dr. Fernando Modesto, pela ateno, confiana e

    dedicao. Agradeo por acreditar no meu trabalho mais do que eu mesma. Sua

    orientao foi fundamental para que eu pudesse conquistar esta etapa.

    A todos meus colegas de trabalho na DDCTI/CSMB/PMSP. O

    encorajamento e apoio de vocs me ajudaram a encontrar o foco e a seguir em

    frente. Agradeo pelo ombro amigo, em especial de Marilza Siqueira, Neuza

    Fusae Okayama Pereira e Roseli Akemi Sakamoto Kikkawa, que escutaram

    minhas muitas incertezas e certezas, acompanhando-me neste processo.

    Tatiana Rodrigues Nascimento, por sua compreenso nos momentos crticos, seu

    apoio, carinho e confiana. Que sua estrela brilhe sempre.

    s colegas do Mestrado, Daniele Cristina Gonalves Brene Pires e Liliana

    Giusti Serra, tambm orientandas do Prof. Dr. Fernando Modesto, pela pacincia

    e companheirismo.

    A todas as outras pessoas, amigas, amigos e conhecidos que de alguma

    forma contriburam para realizao deste sonho.

  • 6

    RESUMO

    Esta pesquisa tem por objeto a anlise da interao do esquema de descrio

    bibliogrfica Resource Description and Access (RDA) na construo de registros

    de autoridade frente aos objetivos e aos fundamentos do modelo conceitual

    Requisitos Funcionais para Dados de Autoridade (FRAD). Busca compreender e

    analisar a importncia do controle de autoridade para a recuperao da

    informao, contextualizando a construo de registros de autoridade na

    catalogao descritiva por meio do uso da norma RDA. Caracteriza-se por

    explorar os aspectos tericos e normativos que regem a construo de registros

    de autoridade. Designada como uma pesquisa terica, a investigao recorre

    pesquisa bibliogrfica, documental, histrica e analtica. O enfoque da pesquisa

    est nos registros de autoridade e as mudanas provocadas pelas novas

    concepes decorrentes dos modelos conceituais Requisitos Funcionais para

    Registros Bibliogrficos (FRBR) e sua extenso FRAD e o esquema de descrio

    bibliogrfica RDA, explorando os aspectos tericos e normativos que regem a

    construo de registros de autoridade. Apresenta um referencial terico composto

    do panorama do controle bibliogrfico, da catalogao e dos catlogos e suas

    interaes com o controle de autoridade. Discorre sobre o modelo conceitual

    FRAD e a norma catalogrfica RDA.

    Palavras-chave: Catalogao, controle de autoridade, registros de autoridade,

    FRAD, RDA

  • 7

    ABSTRACT

    This research aims at the analysis of the interaction of bibliographic description

    scheme Resource Description and Access (RDA) in building forward authority

    records the objectives and foundations of conceptual model Functional

    Requirements for Authority Data (FRAD). It seeks to understand and analyze the

    importance of authority control for information retrieval, contextualizing the

    construction of authority records in the descriptive cataloging through the use of

    RDA standard. It is characterized by exploring the theoretical and regulatory

    aspects governing the construction of authority records. Designated as a

    theoretical research, the research draws on literature, documentary, historical and

    analytical. The research focus is in authority records and the changes brought

    about by new concepts arising from conceptual models Functional Requirements

    for Bibliographic Records (FRBR) and its extension FRAD and the bibliographic

    description scheme RDA, exploring the theoretical and regulatory aspects

    governing the construction of authority records. It presents a theoretical framework

    consists panorama bibliographic control, cataloging and catalogs and their

    interactions with the control authority. It discusses the conceptual model FRAD

    and the RDA cataloging standard.

    Keywords: Cataloging, authority control, authority records, FRAD, RDA

    SUMRIO

  • 8

    1 INTRODUO 18

    1.1 OBJETIVOS 24

    1.2 METODOLOGIA 24

    2 CONTROLE BIBLIOGRFICO, CATALOGAO E CATLOGOS 28

    2.1 CONTROLE BIBLIOGRFICO NO MUNDO E NO BRASIL 28

    2.2 A CATALOGAO E SEUS PRINCPIOS 37

    2.3 OS OBJETIVOS E FUNES DO CATLOGO 52

    2.3.1 A autoria no catlogo 58

    2.4 O PADRO MARC PARA O INTERCMBIO DE DADOS 60

    3 CONTROLE DE AUTORIDADE 70

    3.1 DEFINIO E OBJETIVOS 70

    3.2 OS PONTOS DE ACESSO 83

    3.3 REGISTROS DE AUTORIDADE 86

    3.4 INSTRUMENTOS NORMATIVOS PARA O CONTROLE DE

    AUTORIDADE 89

    3.4.1 Diretrizes para Registros de Autoridade e Referncias (GARR) 90

    3.4.2 International Standard Name Identifier (ISNI) 94

    4 OS MODELOS CONCEITUAIS E A RDA 99

  • 9

    4.1 O FRBR 99

    4.2 O FRAD 105

    4.3 A RDA 117

    5 A CONSTRUO DE REGISTROS DE AUTORIDADE 126

    5.1 O MAPEAMENTO DAS TAREFAS DO USURIO NA RDA 138

    5.2 A RDA NA CONSTRUO DE REGISTROS DE AUTORIDADE 145

    6 CONSIDERAES FINAIS 160

    REFERNCIAS 164

  • 10

    LISTA DE ABREVIATURAS

    AACR Anglo-American Cataloguing Rules (Cdigo de Catalogao Anglo

    Americano)

    AACR2 Anglo-American Cataloguing Rules (Cdigo de Catalogao Anglo

    Americano), 2 edio

    ALA American Library Association

    BIBCO Monographic Bibliographic Record Cooperative Program

    BIBFRAME Bibliographic Framework

    BN Biblioteca Nacional (Brasil)

    CALCO Catalogao Legvel por Computador

    CANMARC Canadian Machine Readable Cataloging (MARC Canadense)

    CBU Controle Bibliogrfico Universal

    CENL Conference of European National Librarians

    CI Cincia da Informao

    CISAC Confdration Internationale des Socits dAuteurs et

    Compositeurs

    DPIC Declarao dos Princpios Internacionais de Catalogao

    FEBAB Federao Brasileira das Associaes de Bibliotecrios, Cientistas

    da Informao e Instituies

    FRAD Functional Requirements for Authority Data (Requisitos Funcionais

    para Dados de Autoridade)

    FRBR Functional Requirements for Bibliographic Records (Requisitos

    Funcionais para Registros Bibliogrficos)

  • 11

    FRANAR IFLA Working Group on Functional Requirements and Numbering of

    Authority Records (Grupo de Trabalho da IFLA sobre os Requisitos

    Funcionais e Numerao para Registros de Autoridade)

    FRSAD Functional Requirements For Subject Authority Data (Requisitos

    Funcionais para Dados de Autoridade Assunto)

    GARR Guidelines for Authority Records and References (Diretrizes para

    Registros de Autoridade e Referncias)

    GARE Guidelines for Authority and Reference Entries (Diretrizes para

    Entradas de Autoridade e Referncia)

    GSARE Guidelines for Subject Authority and Reference Entries / Diretrizes

    para Registros de Autoridade e Referncia de Assuntos

    IBERMARC Ibero Machine Readable Cataloging (MARC Espanhol)

    ICABS Alliance for Bibliographic Standards (Aliana para a Padronizao

    Bibliogrfica)

    IFLA International Federation of Library Associations and Institutions

    (Federao Internacional de Associaes e Instituies

    Bibliotecrias)

    IFRRO International Federation of Reproduction Rights Organisations

    IMEICC IFLA Meeting of Experts on an International Cataloguing Code

    (Encontro de Especialistas da IFLA sobre um Cdigo Internacional

    de Catalogao)

    IPDA International Performers Database Association

    ISADN International Standard Authority Data Number

    ISBD International Standard Bibliographic Description (Descrio

    Bibliogrfica Internacional Normalizada)

    ISNI International Standard Name Identifier

  • 12

    ISNI-IA International Standard Name Identifier International Agency

    ISO International Organization for Standardization

    JSC Joint Stteering Committee

    LC Library of Congress

    MARC Machine Readable Cataloging (Catalogao Legvel por Mquina)

    MARC21 Machine Readable Cataloging 21 (Catalogao Legvel por

    Mquina 21)

    MODS Metadata Object Description Schema

    NACO Name Authority Cooperative Program

    NATIS National Information System (Sistema Nacional de Informao);

    National Documentation,Library and Archives Infrastructures

    OCLC Online Computer Library Center

    OPAC Online Public Access Catalogue (Catlogo online de Acesso

    Pblico)

    PGI Programa Geral de Informao

    RBU Rpertoire Bibliographique Universel (Repertrio Bibliogrfico

    Universal)

    RDA Resource Description and Access (Recurso, Descrio e Acesso)

    RDF Resource Description Framework

    TIC Tecnologia da Informao e Comunicao

    UBC Universal Bibliographic Control (Controle Bibliogrfico Universal)

    UBCIM Universal Bibliographic Control and International MARC

  • 13

    UKMARC United Kingdom Machine Readable Cataloging (MARC do Reino

    Unido)

    UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organigation

    (Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a

    Cultura)

    UNIMARC Universal Machine Readable Cataloging

    UNISIST United Nations International Scientific Information System (Sistema

    de Informao Cientfica Internacional das Naes Unidas)

    URI Uniform Resource Identifier

    USMARC United States Machine Readable Cataloging (MARC dos Estados

    Unidos)

    VIAF Virtual International Authority File (Catlogo de Autoridade

    Internacional Virtual)

    XML eXtensible Markup Language

  • 14

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Padres para o controle bibliogrfico 33

    Figura 2 Linha do tempo do desenvolvimento dos cdigos de catalogao 48

    Figura 3 Interao entre remissivas e forma adotada em registros de

    autoridade e registros bibliogrficos

    51

    Figura 4 Registro bibliogrfico da Biblioteca Nacional no formato MARC21

    Bibliogrfico

    63

    Figura 5 Registro de autoridade da Library of Congress no formato

    MARC21 Bibliogrfico

    68

    Figura 6 Comunidade de usurios do catlogo de autoridade 74

    Figura 7 Finalidade de unificao dos pontos de acesso no controle de

    autoridade

    77

    Figura 8 Finalidade de diferenciao entre pontos de acesso no controle

    de autoridade

    78

    Figura 9 Exemplo de registro de autoridade do VIAF 82

    Figura 10 Definio das entidades Pessoa, Famlia e Entidade Coletiva 85

    Figura 11 Exemplos de pontos de acesso 86

    Figura 12 reas especificadas pelas GARR para o registro de autoridade e

    exemplo de aplicao

    93

    Figura 13 Exemplo de registro de autoridade ISNI para nome pessoal 97

    Figura 14 Grupos e entidades estabelecidos pelo FRBR 101

    Figura 15 Relacionamento entre as entidades do Grupo 1 do FRBR 103

    Figura 16 Relacionamento de responsabilidade entre entidades do Grupo 2

    do FRBR

    104

  • 15

    Figura 17 Base fundamental do modelo FRAD 108

    Figura 18 Modelo conceitual para dados de autoridade 109

    Figura 19 Exemplos de atributos para as entidades Pessoa, Famlia e

    Entidade Coletiva

    113

    Figura 20 Exemplo de registro de autoridade elaborado com os atributos

    da entidade pessoa previsto pelo FRAD

    114

    Figura 21 Relacionamentos entre Pessoas e Entidades Coletivas 116

    Figura 22 Sumrio e estrutura da RDA 120

  • 16

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 Famlia MARC21 e suas descries 64

    Quadro 2 Estrutura dos captulos RDA para a construo de registro de

    autoridade para as entidades Pessoa, Famlia e Entidade

    Coletiva

    127

    Quadro 3 Entidade pessoa: comparativos entre os atributos FRAD,

    instruo RDA e campos MARC21 Autoridade

    129

    Quadro 4 Entidade famlia: comparativos entre os atributos FRAD,

    instruo RDA e campos MARC21 Autoridade

    132

    Quadro 5 Entidade coletiva: comparativos entre os atributos FRAD,

    instruo RDA e campos MARC21 Autoridade

    134

    Quadro 6 RDA/FRAD mapeamento dos atributos da entidade Pessoa 139

    Quadro 7 RDA/FRAD mapeamento dos relacionamentos da entidade

    Pessoa

    140

    Quadro 8 RDA/FRAD mapeamento dos atributos da entidade Famlia 141

    Quadro 9 RDA/FRAD mapeamento dos relacionamentos da entidade

    Famlia

    142

    Quadro 10 RDA/FRAD mapeamento dos atributos da Entidade Coletiva 143

    Quadro 11 RDA/FRAD mapeamento dos relacionamentos da Entidade

    Coletiva

    144

    Quadro 12 Registro de autoridade de Getlio Vargas 146

    Quadro 13 Registro de autoridade da Presidncia do Brasil por Getlio

    Vargas de 1930 a 1945

    148

    Quadro 14 Registro de autoridade da Presidncia do Brasil por Getlio

    Vargas de 1951 a 1954

    149

  • 17

    Quadro 15 Registro de autoridade do escritor e msico Arnaldo Antunes 151

    Quadro 16 Registro de autoridade do grupo de rock Tits 152

    Quadro 17 Registro de autoridade do matemtico Julio Cesar de Mello e

    Souza

    153

    Quadro 18 Registro de autoridade do pseudnimo Malba Tahan 154

    Quadro 19 Registro de autoridade da Famlia Orleans e Bragana 156

    Quadro 20 Registro de autoridade da Famlia Schrmann 157

    Quadro 21 Registro de autoridade do Museu de Arte de So Paulo

    (MASP)

    158

  • 18

    1 INTRODUO

    A informao tornou-se um insumo estratgico e de relevncia a partir do

    final do sculo XX. Vrios autores e especialistas passaram denominar o perodo

    como a era da Sociedade da Informao ou da Sociedade do Conhecimento.

    Porm, com o desenvolvimento das tecnologias de informao e comunicao

    (TICs), passamos a enfrentar o dilema da exploso informacional, tema abordado

    na dcada de 1940 por Vannevar Bush e explicitado por Saracevic (1996, p. 42)

    como o irreprimvel crescimento exponencial da informao e seus registros,

    particularmente em cincia e tecnologia. Com o advento da internet, produtores e

    consumidores de informao esto dispostos em uma hierarquia horizontal,

    muitas vezes impossvel diferenciar um de outro, ou seja, o produtor

    consumidor, e principalmente, o consumidor transfigura-se em produtor de

    informao.

    Os catlogos bibliogrficos, especialmente na recuperao da informao,

    por meio de pontos de acesso controlados para nomes, podem promover uma

    melhor comunicao e atendimento das necessidades de informao do usurio.

    Desde a antiguidade, bibliotecrios e bibliotecas procuram no apenas

    armazenar o conhecimento produzido, mas organiz-lo. Apesar das mudanas

    nas finalidades e objetivos dessa organizao ao longo do tempo, a busca por

    descrever e representar o conhecimento, expresso em qualquer forma ou suporte

    de manifestao uma constante.

    As primeiras formas de catlogo tm suas origens na antiguidade. Mas

    com o advento da imprensa, a partir do sculo XV, e sua consequente

    disseminao da informao, que comeam a surgir as primeiras publicaes

    destinadas organizao dos acervos e do conhecimento.

    O catlogo pode ser compreendido como um meio de comunicao, que

    veicula mensagens sobre os registros do conhecimento, apresentando-as com

    sintaxe e semntica prpria e reunindo registros do conhecimento por

    semelhana, para usurios desses acervos (MEY; SILVEIRA, 2009, p. 12).

    Charles Ami Cutter foi um dos primeiros tericos da catalogao a

  • 19

    sistematizar os objetivos do catlogo, cujos princpios foram anteriormente

    discutidos e tratados por Panizzi. Para Panizzi um catlogo adequado deve estar

    preocupado com as reais necessidades do usurio, sendo projetado para revelar

    no apenas se o livro em particular que ele procura est na biblioteca, mas

    tambm se as outras edies da obra e que outras obras do autor a biblioteca

    possui. Com o Rules for a Printed Dictionary Catalog, Cutter (1904) apresenta

    como premissa a figura central do usurio no processo de organizao e

    recuperao da informao. Todas as aes e processos voltados para sua

    descrio devem ser realizados com foco no usurio e suas necessidades de

    informao. O desenvolvimento de padres de catalogao foi aprimorado ao

    longo da histria com o intuito de atender as demandas dos usurios e as

    necessidades de preservao das informaes contidas nos acervos

    bibliogrficos.

    O avano das inovaes tecnolgicas a partir da segunda metade do

    sculo XX contribuiu para a evoluo dos catlogos. Do sistema tradicional e

    analgico baseado em fichas impressas, passaram os registros a serem

    elaborados em bases de dados eletrnicas culminando no desenvolvimento dos

    Catlogos de Acesso Pblico em Linha/Online Public Access Catalogues (OPAC).

    Esse desenvolvimento e o retorno das discusses sobre a alterao dos

    processos de descrio e recuperao da informao, deslocando-se do foco na

    organizao dos contedos e acervos para o foco no usurio, gerou a

    necessidade de reviso das funes do catlogo. O primeiro movimento nesse

    sentido o desenvolvimento de modelos conceituais1 pela International

    Federation of Library Associations and Institutions / Federao Internacional das

    Associaes e Instituies Bibliotecrias (IFLA), publicando o Functional

    Requirements for Bibliographic Records / Requisitos Funcionais para Registros

    Bibliogrficos (FRBR), o Functional Requirements for Authority Data / Requisitos

    Funcionais para Dados de Autoridade (FRAD) como estudo e fundamentos

    tericos para as tarefas executadas pelo usurio. O modelo conceitual FRAD

    1 O modelo conceitual descreve quais so os dados que realmente devem ser armazenados no

    banco de dados e quais so os relacionamentos existentes entre os dados. Fornece uma viso mais prxima do modo como os usurios visualizam os dados e define especificaes necessrias qualidade das informaes do ambiente informatizado a ser criado (FUSCO, 2010, p. 99).

  • 20

    reconhece como tarefas do usurio de dados de autoridade: encontrar e

    identificar uma entidade2 durante o processo de busca em um catlogo

    bibliogrfico ou de autoridade, contextualizar uma entidade em um determinado

    contexto, e justificar a deciso adotada para escolha de um nome e sua forma

    para um ponto de acesso.

    Em 2009, a IFLA publica a Declarao dos Princpios Internacionais de

    Catalogao (DPIC), no qual o catlogo deve ser um instrumento efetivo e

    eficiente, que permita ao usurio encontrar recursos bibliogrficos numa coleo

    como resultado de uma pesquisa; identificar um recurso bibliogrfico

    confirmando que a entidade descrita corresponde entidade procurada, ou

    distinguir entre duas ou mais entidades com caractersticas similares; selecionar

    um recurso bibliogrfico que esteja de acordo com as necessidades do usurio;

    adquirir ou obter acesso a um recurso bibliogrfico descrito, alm de navegar em

    um catlogo e para alm dele.

    A catalogao, como uma das principais atividades da Biblioteconomia e da

    Documentao, compreende a adoo de normas que permitem o intercmbio da

    mensagem catalogrfica entre instituies documentais no mundo, o que amplia

    as alternativas de escolha pelos usurios e auxilia outros profissionais. A

    consistncia sinttica e semntica do registro bibliogrfico facilita o

    reconhecimento dos sinais e sua compreenso, pelo uso de linguagem comum

    (MEY; SILVEIRA, 2010; MEY; ZAFALON, 2009).

    O controle de autoridade como o processo de unificar os pontos de acesso

    dos catlogos, mediante a utilizao de uma forma normalizada e exibindo as

    relaes existentes entre os pontos de acesso de um catlogo, busca facilitar a

    identificao e a recuperao dos documentos armazenados (HERRERO

    PASCUAL, 1999). Tem por objetivo evitar ambiguidades ou confuses que

    possam ser causadas por homnimos, sinnimos ou diversidades de nomes pelos

    quais as pessoas, entidades, obras, temticas ou conceitos possam ser

    2 Entidade aqui compreendida como algo que possua carter unitrio e prprio; algo que tenha

    uma existncia independente ou separada; uma abstrao, conceito ideal, objeto do pensamento, ou objeto transcendental abrangendo produtos do esforo intelectual ou artstico e os agentes (pessoa, famlia, entidade coletiva) responsveis pela criao desse contedo artstico ou intelectual (IFLA, 2009, p. 10).

  • 21

    denominados. Esses catlogos desenvolvidos por servios de informao

    auxiliam no intercmbio de informaes, sendo benficos na reduo dos custos

    globais para a manuteno e elaborao de bases de dados bibliogrficas e de

    autoridade.

    A padronizao na forma e escolha de pontos de acesso para nomes,

    tambm o qualifica como a adoo de uma linguagem documentria, capaz de

    representar a informao e, principalmente, seus responsveis intelectuais. Com

    o desenvolvimento das TICs possvel utilizao de recursos que permitam a

    recuperao das formas variantes pelas quais um autor possa ser conhecido ou

    acessado ainda que representado por uma forma padro. Porm, preciso

    considerar que a forma a ser adotada deva representar o mximo possvel

    linguagem simblica utilizada pelos usurios do sistema de informao.

    Em uma viso sistmica, o controle de autoridade no deve ser

    considerado uma atividade isolada. Seu propsito a recuperao e a gesto da

    informao em bibliotecas e demais unidades de informao. Os registros de

    autoridade constituem a base do catlogo de uma biblioteca, sendo sua

    padronizao e unificao essencial para uma recuperao confivel e

    consistente dos pontos de acesso.

    Mey e Silveira (2009, p. 195) ao abordar os tipos de catlogos existentes,

    apresentam o catlogo identidade, tambm (erroneamente) denominado catlogo

    de autoridade de nomes. As autoras consideram errneo o termo de autoridade

    por se tratar de uma traduo literal do termo em ingls authority file, e no

    considerar o fato do contexto do termo estar relacionado ao sentido de autorizado.

    Apesar dessa explicao e alerta, o termo catlogo de autoridade

    amplamente adotado no Brasil para os catlogos que abrangem as formas

    autorizadas de nomes para pessoas, famlias e entidades coletivas, a mesma

    definio fornecida pelas autoras para o termo catlogo identidade. Assim, nesta

    pesquisa adota-se o termo difundido nacionalmente, catlogo de autoridade, bem

    como suas derivaes: controle de autoridade e registro de autoridade.

    Um catlogo de autoridade composto pelo conjunto de registros de

    autoridade, resultando em uma lista de nomes (pessoais, entidades, eventos), de

  • 22

    ttulos uniformes ou de assuntos. O registro de autoridade, por sua vez,

    constitudo da forma autorizada do nome que ser utilizado como ponto de

    acesso no catlogo, e das referncias cruzadas das formas no autorizadas

    (remissivas ver) ou dos nomes relacionados forma autorizada (remissivas ver

    tambm).

    Para o objeto de estudo desta dissertao, explicitaremos somente os

    pontos de acesso controlados que representam entidades do tipo pessoa, famlia

    e entidade coletiva. Essas entidades foram escolhidas por serem as entidades

    representadas na RDA para o registro de atributos e relacionamentos em

    catlogos de autoridade.

    O grande movimento internacional de reflexo permeado pelos conceitos

    tericos, incluindo o FRBR, o FRAD e o esquema de descrio bibliogrfica RDA,

    fortifica o esforo de buscar sempre uma melhor interao com o usurio,

    possibilitando a esse atingir o princpio da navegabilidade promulgado pela

    Declarao dos Princpios Internacionais de Catalogao.

    Nessa perspectiva, esta dissertao tem por objeto a anlise da interao

    do esquema de descrio bibliogrfica RDA na construo de registros de

    autoridade frente aos objetivos e aos fundamentos do modelo conceitual FRAD,

    explorando os aspectos tericos e normativos que regem a construo de

    registros de autoridade. Assim, busca compreender e analisar a importncia do

    controle de autoridade para a recuperao da informao, contextualizando a

    construo de registros de autoridade na catalogao descritiva por meio do uso

    da norma RDA.

    O catlogo de autoridade fundamental para a reunio e recuperao da

    informao em qualquer unidade documental. um instrumento derivativo e

    auxiliar do catlogo bibliogrfico, cuja funo bsica a de estabelecer pontos de

    acesso padronizados (autoridade) que iro servir ao usurio como chaves de

    pesquisa segura, garantindo a localizao confivel e eficaz da informao. Como

    uma importante ferramenta, adquiriu a sua verdadeira dimenso com o

    desenvolvimento de sistemas de informao bibliogrficos automatizados e,

    consequentemente, tem levantado interesse crescente nos ltimos anos.

  • 23

    As normas e regras de catalogao existentes at o incio do sculo XXI, e

    que ainda se encontram em vigor, no possuem acopladas instrues para a

    construo de registros de autoridade. Em sua maioria, as especificaes

    apresentadas pelos cdigos de catalogao relacionam-se definio e escolha

    de autoria em obras3 e a forma a ser adotada para o ponto de acesso

    estabelecido.

    Com o desenvolvimento da norma de catalogao da RDA, o panorama

    alterado, pois esta apresenta instrues especficas e ampliadas para a

    construo de registros de autoridade. Num perodo onde os cdigos de

    catalogao no contm instrues especficas para a construo de registros de

    autoridade, instrumentos auxiliares, como diretrizes e instrues regionais, so

    estabelecidos para sanar a ausncia de regras e instrues. A RDA pretende

    preencher essa lacuna, fornecendo instrues especficas para a construo dos

    registros de autoridade.

    preciso avaliar se a construo desses registros de autoridade, seja por

    meio das poucas instrues existentes nos cdigos anteriores ou nas

    abrangentes instrues da norma recm-criada, contempla e permite o

    desenvolvimento das funes do catlogo bibliogrfico em propiciar ao usurio

    encontrar, identificar, selecionar, adquirir recursos bibliogrficos por um

    determinado autor, ttulo ou assunto.

    O enfoque da pesquisa est nos registros de autoridade e as mudanas

    provocadas pelas novas concepes decorrentes dos modelos conceituais FRBR

    e sua extenso FRAD; e o esquema de descrio bibliogrfica RDA.

    O problema de pesquisa o de analisar quais so as implicaes do uso

    da norma RDA no processo de construo de registros de autoridade e suas

    interaes com o modelo conceitual FRAD, no qual se inclui as tarefas do usurio.

    3 Obra aqui entendida como uma criao intelectual ou artstica distinta, isto , o contedo

    intelectual ou artstico. Inclui obras expressas em palavras, msica, material grfico, fotografias, imagens em movimento, materiais cartogrficos, materiais tridimensionais, dados, programas de computador, etc. (IFLA WORKING GROUP ON FUNCTIONAL REQUIREMENTS AND NUMBERING OF AUTHORITY RECORDS, 2013).

  • 24

    1.1 OBJETIVOS

    Analisar a interao e implicaes do uso da norma RDA no processo de

    construo de registros de autoridade.

    Elaborar um panorama da catalogao e do controle de autoridade;

    Observar e identificar se e como os conceitos propostos pelo FRAD esto

    expressos na RDA;

    Avaliar o uso da norma RDA na construo dos registros de autoridade;

    Mapear se as 4 tarefas do usurio expressas no FRAD esto contidas na

    RDA e em que condio se apresentam;

    Analisar a aplicao das 4 tarefas do usurio expressas no FRAD para a

    construo do registro de autoridade utilizando a RDA.

    1.2 METODOLOGIA

    O estudo caracteriza-se como exploratrio, pois tem por finalidade

    desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a

    formulao de problemas mais precisos ou hipteses pesquisveis para estudos

    posteriores. (GIL, 2011, p. 27). Tambm se caracteriza como uma pesquisa

    descritiva, pois pretende descrever e analisar a norma de descrio bibliogrfica

    RDA no que tange a construo de registros de autoridade.

    Caracterizada como uma pesquisa terica, a investigao recorre

    pesquisa bibliogrfica, documental, histrica e analtica. So verificados e

    confrontados o registro de atributos de pessoas, entidades coletivas e famlias

    designado pela RDA com o mapeamento das tarefas do usurio previstos pelo

    FRAD, tarefas essas relacionadas a encontrar, identificar, contextualizar uma

    entidade e justificar a criao de um registro de autoridade.

    No desenvolvimento da pesquisa procede-se ao levantamento bibliogrfico

    da literatura da rea sobre o objeto de estudo e posterior anlise da construo

    de registros de autoridade utilizando-se a norma RDA, bem como, sua interao

    com o modelo conceitual FRAD.

    Os critrios para o levantamento bibliogrfico esto adequados para a

  • 25

    anlise do objeto de estudo seguindo a proposta dos objetivos e, por conseguinte,

    a estratgia de busca est focada na literatura que aborda os conceitos: controle

    de autoridade, registros de autoridade, princpios de catalogao e funes do

    catlogo.

    Inicialmente no se imps limitao cronolgica, pois em levantamentos

    preliminares constatou-se uma exiguidade da literatura sobre o tema. Foram

    excludos trabalhos abordando os conceitos: controle de autoridade, registros de

    autoridade, princpios de catalogao e funes do catlogo, sob outros pontos de

    vista que no o da representao descritiva da informao, foco de estudo desta

    dissertao, como por exemplo, na representao temtica da informao.

    Para o levantamento e pesquisa bibliogrfica foram usados os termos:

    controle bibliogrfico, controle de autoridade, representao descritiva, trabalho

    de autoridade, registro de autoridade, catlogo de autoridade, RDA, FRAD,

    bibliographic control, authority control, cataloguing, cataloging, authority work,

    authority file, authority records. As bases pesquisadas incluem a Base Referencial

    de Artigos de Peridicos em Cincia da Informao, Dedalus, Web of Science,

    Library Information Science & Technology Abstracts, Portal de Peridicos Capes,

    Biblioteca Brasileira Digital de Dissertaes e Teses, Google Acadmico. Alm

    disso, foram pesquisados sites de instituies que promovem o desenvolvimento

    e a publicao das diretrizes, normas, princpios ou regras para a elaborao de

    registros bibliogrficos e de autoridade, denominados nesta pesquisa de

    documentos normativos.

    Essa pesquisa bibliogrfica proporcionou o desenvolvimento da reviso de

    literatura apresentada nos captulos 2, 3 e 4 desta dissertao. O captulo 2

    Controle bibliogrfico, catalogao e catlogos - apresenta um panorama

    histrico e conceitual sobre o controle bibliogrfico, a catalogao, os catlogos e

    o formato de intercmbio de dados Machine Readable Cataloging (MARC). O

    captulo 3 Controle de autoridade - apresenta os conceitos, as finalidades e a

    relevncia do controle de autoridade na catalogao e na recuperao da

    informao, bem como os instrumentos normativos que estabelecem sua

    padronizao internacional. O captulo 4 Os modelos conceituais e a RDA -

    aborda o desenvolvimento dos modelos conceituais para registros bibliogrficos e

  • 26

    de autoridade, culminando com o desenvolvimento da RDA. No captulo 5 A

    construo de registros de autoridade - so analisadas as implicaes e

    aplicaes do uso da norma RDA na elaborao de registros de autoridade,

    contrapondo-os aos atributos e relacionamentos estabelecidos pelo FRAD para as

    entidades pessoa, famlia e entidade coletiva, mapeando-se as tarefas do usurio

    de encontrar, identificar, contextualizar e justificar um dado de autoridade.

    Para a anlise das implicaes do uso da RDA na construo de registros

    de autoridade e sua interao com o modelo conceitual FRAD, descritas no

    captulo 5, recorre-se pesquisa documental. Para tanto, a RDA e o FRAD foram

    consultados em seus documentos originais, elaborou-se um quadro analtico onde

    so avaliados se as funes do usurio de encontrar, identificar, contextualizar e

    justificar os dados de autoridade em recursos bibliogrficos so atendidas quando

    da construo dos registros de autoridade utilizando-se a norma RDA.

    Num primeiro momento, foi elaborado um quadro comparativo entre os

    atributos FRAD, as instrues RDA correspondentes ao registro desses atributos

    e os campos MARC 21 Autoridade compatveis. Posteriormente analisam-se os

    mapeamentos das tarefas do usurio de encontrar, identificar, contextualizar e

    justificar um dado de autoridade, mapeamento este elaborado pelo FRAD e que

    se encontra em seu documento original. Essas tarefas esto estabelecidas para

    os atributos e os relacionamentos das entidades pessoa, famlia e entidade

    coletiva abordados pelo FRAD, assim contraps-se este mapeamento as

    instrues institudas pela RDA. Para isto, procedeu-se a elaborao e anlise de

    quadros comparativos entre os atributos e relacionamentos FRAD para as

    entidades pessoa, famlia e entidade coletiva, as instrues RDA e as tarefas do

    usurio para cada entidade.

    Posteriormente, verificam-se os registros de autoridade elaborados por

    intermdio do uso das instrues da norma RDA para o registro de atributos e

    relacionamentos das entidades pessoa, famlia e entidade coletiva. Para a

    elaborao dos registros de autoridade foram utilizadas as autoridades que

    seguem relacionadas. Foram elaborados registros de autoridade para Getlio

    Vargas, tanto como entidade pessoa como entidade coletiva em seus dois

    perodos de governo como Presidente da Repblica; e Arnaldo Antunes e a

  • 27

    entidade coletiva Tits procurando-se demonstrar as relaes existentes entre

    registros de autoridade do tipo pessoal e entidade coletiva e como estes

    relacionamentos podem ser descritos utilizando-se a RDA. Posteriormente

    elaboraram-se os registros das autoridades Julio Cesar de Mello e Souza e

    Malba Tahan. Esses registros buscam descrever as relaes existentes entre

    nome verdadeiro e pseudnimo. Para exemplificar a entidade famlia foram

    elaborados registros de autoridade para as famlias Orleans e Bragana e

    Schrmann. Para a exemplificao de um registro de autoridade do tipo entidade

    coletiva utilizou-se a autoridade Museu de Arte de So Paulo.

    A seguir, o captulo 2 apresenta o histrico e os conceitos de controle

    bibliogrfico, catalogao e catlogos, procurando-se estabelecer suas relaes

    com o controle de autoridade. Discorre-se sobre as origens e funes do controle

    bibliogrfico e a situao do controle bibliogrfico no Brasil, relacionando este

    tema ao controle de autoridade e sua importncia. Em um segundo momento,

    desenvolve-se um breve histrico da catalogao apresentando os principais

    cdigos desenvolvidos e sua influncia no processo de catalogao atual. Aps,

    apresenta-se os conceitos de catalogao e sua estreita relao com os cdigos

    e catlogos. Expe-se sobre os catlogos, discutindo seus objetivos e funes,

    bem como a funo da autoria no catlogo e seu desenvolvimento, culminando

    com o catlogo de autoridade. A seguir, faz-se um delineamento do padro de

    intercmbio de dados MARC e sua interao com o controle de autoridade.

  • 28

    2 CONTROLE BIBLIOGRFICO, CATALOGAO E CATLOGOS

    Um bom leitor algum que evita um certo nmero de livros, um bom bibliotecrio um jardineiro que poda sua biblioteca, um bom arquivista seleciona aquilo que se deve refugar ao invs de armazenar. Eis a temas inditos de nossa poca (CHARTIER, 1998, p. 127).

    2.1 CONTROLE BIBLIOGRFICO NO MUNDO E NO BRASIL

    A ideia de organizar o conhecimento, buscando obter uma bibliografia

    universal to antiga quanto s bibliotecas. O conceito de controle bibliogrfico,

    muitas vezes est atrelado ao prprio conceito de organizao da informao.

    Para Campello (2006, p. 9) as bibliotecas foram as primeiras instituies a se

    preocuparem com o controle bibliogrfico e durante algum tempo seus catlogos

    constituram os nicos instrumentos para esse fim.

    Na antiguidade os catlogos de bibliotecas assumiam o papel de inventrio

    do material existente, e seu controle era relativamente simples, sendo o ideal de

    reunir tudo o que se produzia possvel. Com o aumento da produo bibliogrfica,

    surgiram as bibliografias, com o intuito de organizar o material existente para sua

    posterior recuperao. Essas bibliografias, em sua maioria, eram produzidas por

    eruditos, historiadores, entre outros, e procuravam abranger uma determinada

    rea do conhecimento, ou limitar-se a uma biblioteca especfica.

    Alm da Biblioteca de Alexandria (sc. III a.C), por meio do poeta e

    bibliotecrio grego Calmaco, que ansiava reunir toda a produo bibliogrfica

    existente, Conrad Gesner, em 1545, produziu a Bibliotheca Universalis, que

    procurava relacionar todas as obras publicadas em latim, grego e hebraico, no

    chegando, porm, a ser uma bibliografia universal. Em 1895, Paul Otlet e Henri de

    La Fontaine criaram o Rpertoire Bibliographique Universel (RBU), tambm com o

    objetivo de reunir toda a produo bibliogrfica existente no mundo. O RBU, em

    1930, possua aproximadamente 16 milhes de fichas, representando bibliotecas

    europeias e norte-americanas. As fichas eram arranjadas em ordem de

    classificao, sendo essa a Classificao Decimal Universal, e indicavam a

  • 29

    localizao das obras. O RBU possua dois arquivos principais: um arquivo de

    autor e outro classificado por assunto (MACHADO, 2003; RAYWARD, 1997).

    A partir do sculo XIX, a complexidade e variedade de materiais

    bibliogrficos se ampliam, principalmente com o aumento da disseminao de

    conhecimentos atravs de peridicos cientficos. A preocupao em organizar e

    tornar disponvel toda a produo bibliogrfica persiste. Os Princpios de

    Catalogao, tambm conhecidos como os Princpios de Paris, surgiram em

    1961, na Conferncia Internacional sobre Princpios de Catalogao. O objetivo

    desses princpios era atender a demanda por uma padronizao internacional nos

    cdigos de catalogao que permitissem o intercmbio de dados e o ideal do

    Controle Bibliogrfico Universal (CBU). Esses princpios proporcionaram a

    compatibilizao de diversos cdigos de catalogao em diversos pases

    aumentando o compartilhamento de dados entre os pases.

    A institucionalizao do Controle Bibliogrfico Universal ocorre em 1974

    com a criao do International Office for UBC (Universal Bibliographic Control) da

    Federao Internacional de Associaes e Instituies Bibliotecrias (IFLA). Suas

    bases so a criao de um sistema de intercmbio internacional de informao

    que, por intermdio de agncias nacionais, distribuem os registros bibliogrficos

    padronizados de todas as publicaes. Compreende um programa com o objetivo

    de formar uma rede universal de controle e intercmbio de informaes

    bibliogrficas, ou seja, reunir e tornar disponveis os registros bibliogrficos de

    todos os pases, a fim de atender ao ideal de acesso de todos os cidados ao

    conhecimento universal. Sua eficincia depende da mxima padronizao da

    forma e do contedo da descrio bibliogrfica (CAMPELLO, 2006; MACHADO,

    2003).

    Gorman (2004) destaca que o controle bibliogrfico e o controle de

    autoridade so lados da mesma moeda, sendo aquele impossvel sem este. A

    catalogao no existe sem a padronizao dos pontos de acesso e o controle de

    autoridade o mecanismo pelo qual podemos alcanar o grau de padronizao

    necessria. A catalogao trata de ordem, lgica, objetividade, denotao precisa

    e consistncia, devendo possuir mecanismos que assegurem esses atributos,

    sendo o controle de autoridade um desses.

  • 30

    Ainda em 1974, a United Nations Educational, Scientific and Cultural

    Organization / Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a

    Cultura (UNESCO) lanou o programa National Documentation, Library and

    Archives Infrastructures (NATIS) com a recomendao aos pases-membros de

    estabelecerem uma infraestrutura integrada entre bibliotecas, arquivos e servios

    de documentos. Em 1977, o NATIS fundiu-se ao United Nations International

    Scientific Information System (UNISIST) resultando no Programa Geral de

    Informao (PGI). Seu principal foco so as questes voltadas ao acesso

    informao, treinamento de profissionais da informao e aspectos ticos da

    informao (CAMPELLO, 2006).

    Para atingir o objetivo de acompanhar, monitorar e organizar a produo

    bibliogrfica existente amplia-se o uso de ferramentas tecnolgicas e a busca por

    uma padronizao dos registros bibliogrficos com vista a uma cooperao

    internacional.

    O CBU depende da uniformidade e padronizao na elaborao dos

    registros bibliogrficos e de autoridade pelos pases integrantes. Mas isso se

    revela um desafio. Como equilibrar essa necessidade de intercmbio atravs do

    estabelecimento de padres internacionais s necessidades dos usurios locais?

    Essas necessidades locais esto, por vezes, vinculadas a lngua falada no pas,

    seus aspectos sociais e culturais e a definio de conceitos e palavras

    divergentes dos existentes em outras lnguas.

    Quando o ideal do CBU comeou seu primeiro avano nos anos de 1970, o

    Machine Readable Cataloging (MARC)4 estava ainda em sua infncia (GORMAN,

    2003). O MARC um formato de intercmbio de dados criado na dcada de 1960

    pela Library of Congress (LC) com o objetivo de reduzir custos de catalogao e

    compartilhar seus registros bibliogrficos. uma importante ferramenta para o

    compartilhamento de dados entre agncias catalogadoras e, como consequncia,

    para o controle bibliogrfico.

    O programa do CBU da IFLA alia-se ao projeto Internacional MARC em

    1990, recebendo o nome de Universal Bibliographic Control and International

    4 O MARC ser tratado de modo mais abrangente no subitem 2.4.

  • 31

    MARC (UBCIM). Em 2003 esse programa foi substitudo pela Alliance for

    Bibliographic Standards (ICABS), cujos objetivos principais so o de coordenar

    atividades voltadas para o desenvolvimento de normas e prticas de controle

    bibliogrfico e de recursos e o de apoiar o intercmbio internacional de registros

    bibliogrficos (CAMPELLO, 2006).

    A efetivao desse programa implica no empenho e planificao de cada

    pas membro em empregar as recomendaes do CBU, permitindo o intercmbio

    internacional de registros bibliogrficos, bem como promover a preservao do

    patrimnio intelectual do pas.

    Os organismos internacionais, em especial a IFLA, continuaram os

    esforos de se conseguir um padro internacionalmente aceito para a descrio

    bibliogrfica, bem como o uso globalizado de formatos de intercmbio de dados.

    O Anglo-American Cataloging Rules (AACR), passou a ser adotado por diversas

    agncias nacionais de catalogao e o formato MARC o mais usado para o

    intercmbio de dados. Para as agncias nacionais, esse intercmbio significa no

    apenas o cumprimento dos preceitos do CBU, mas, tambm, uma reduo nos

    custos de produo dos registros bibliogrficos.

    Para Silveira (2007, p. 32) a preocupao com a elaborao de registros

    bibliogrficos que minimizassem os custos da catalogao resultou em um

    crescimento da catalogao cooperativa e, consequentemente, a necessidade de

    um consenso sobre a composio do registro bibliogrfico ficou evidente.

    O controle bibliogrfico tem como objetivo fundamental desenvolver

    ferramentas que permitam a organizao da informao para sua recuperao e

    acesso. Atravs dos anos, uma srie de princpios e prticas comuns adquiriu

    relevncia internacional, facilitando o intercmbio de informaes e a

    racionalizao dos recursos atravs de projetos de cooperao e trabalho

    coletivo. Os Princpios de Catalogao, as normas International Standard

    Bibliographic Description/Descrio Bibliogrfica Internacional Normalizada

    (ISBD), o formato Machine Readable Cataloging 21 (MARC21) e o Anglo-

    American Cataloging Rules 2nd Edition (AACR2) so ferramentas de controle

    bibliogrfico que cumprem diferentes funes, mas que se complementam para

  • 32

    alcanar um objetivo comum. As ferramentas do controle bibliogrfico esto em

    estreita relao com as tecnologias, que por sua vez, influenciaram o

    desenvolvimento de novos padres como um todo.

    Na figura 1, so representados os padres do controle bibliogrfico

    sugeridos por Picco e Ortiz Repiso (2012).

  • 33

    Figura 1 - Padres para o controle bibliogrfico

    Fonte: adaptado e traduzido de (PICCO; ORTIZ REPISO, 2012)

  • 34

    Observam-se na figura trs nveis de padres para o controle bibliogrfico.

    O primeiro nvel abstrato inclui os modelos e os princpios de catalogao. Esses

    modelos e princpios incluem o FRBR, o FRAD, o Functional Requirements for

    Subject Authority Data/Requisitos Funcionais para Dados de Autoridade Assunto

    (FRSAD), os Princpios de Paris e a DPIC. O segundo nvel refere-se

    representao de dados, onde se encontram os vocabulrios controlados e as

    regras de catalogao, como a ISBD, o AACR2 e a RDA. O terceiro nvel

    composto das aplicaes informticas, que incluem os formatos de

    armazenamento, entre eles o MARC 21, o Universal Machine Readable

    Cataloging (UNIMARC) e o Metadata Object Description Schema (MODS), e as

    linguagens de codificao, como por exemplo a International Organization for

    Standardization 2709 (ISO 2709) e o eXtensible Markup Language (XML).

    A concretizao do projeto CBU pressupe a existncia em nvel nacional

    de uma agncia bibliogrfica nacional, do registro de cada nova publicao

    editada atravs do depsito legal e da disseminao destas informaes atravs

    de bibliografias nacionais correntes. A agncia bibliogrfica nacional

    responsvel pelo recebimento e divulgao, dentro de cada pas, dos registros

    semelhantes e permutados com outras agncias nacionais de bibliografias e pela

    publicao da bibliografia nacional (CALDEIRA, 1984).

    No Brasil, os principais mecanismos do controle bibliogrfico so o

    depsito legal e as bibliografias nacionais, cuja representante no Brasil a

    Fundao Biblioteca Nacional.

    Segundo Faria e Perico (2008, p. 95) as bibliografias [...] apresentam

    uma lista de referncias segundo uma ordem especfica e contendo elementos

    descritivos de documentos, de modo a permitir a sua identificao. Por sua vez, a

    Bibliografia Nacional

    [...] apresenta e descreve documentos publicados num dado pas ou escritos numa ou mais lnguas desse pas. [...] As bibliografias nacionais so em geral retrospectivas. Apareceram a partir do sculo XVI, so com frequncia muito parciais e multiplicaram-se com carter metdico no sculo XIX (FARIA; PERICO, 2008, p. 95).

    A primeira bibliografia brasileira data de 1886, com a publicao do

  • 35

    Boletim das Acquisies mais importantes feitas pela Bibliotheca Nacional.

    A bibliografia nacional brasileira marcada por descontinuidades e interrupes.

    O Boletim Bibliogrfico da Biblioteca Nacional foi publicado de 1918 a 1982,

    quando se tornou a Bibliografia Brasileira suspensa em 1995 por problemas

    operacionais. Atualmente, acompanha-se a bibliografia brasileira atravs dos

    catlogos da Biblioteca Nacional (GRINGS; PACHECO, 2010). Sua importncia

    advm do fato de proporcionar uma representao de toda a produo intelectual

    do pas, reunindo referncias dessas publicaes em um nico local, o que

    promove facilidade em seu acesso por pesquisadores e cidados comuns.

    Em grande medida a confeco de uma bibliografia nacional passa pelo

    compromisso do depsito legal de publicaes produzidas em um determinado

    pas. Faria e Perico (2008, p. 227) definem o depsito legal como:

    [...] uma obrigao atribuda aos impressores, editores e distribuidores de depositar, em organismos designados por lei ou por uma conveno, um nmero fixo de exemplares de determinados documentos produzidos, publicados, ou difundidos no pas, seja qual for a sua natureza e o seu sistema de reproduo. [...] Contribui tambm para a defesa e preservao dos valores da lngua e cultura portuguesas, produo e divulgao da bibliografia nacional corrente, elaborao de estatsticas das edies nacionais. O depsito legal foi criado com a finalidade de conservar todas as publicaes no pas.

    O Depsito Legal existe no Brasil desde 1805, com diferentes tipos de leis

    e funes. Atualmente regido pela Lei n 10.994 de 2004 que prev o envio de

    um ou mais exemplares de toda a publicao editada ou distribuda no pas

    Biblioteca Nacional, com a finalidade de se efetuar o registro e guarda da

    produo intelectual do pas e a elaborao da bibliografia nacional, promovendo

    o controle bibliogrfico da produo editorial brasileira. Em 2010, foi promulgada a

    Lei n 12.192 que prev o depsito legal de obras musicais na Fundao

    Biblioteca Nacional (GRINGS; PACHECO, 2010).

    Alm de permitir a elaborao e manuteno da bibliografia nacional, o

    depsito legal contribui indiretamente para a elaborao de um catlogo de

    autoridade nacional, tambm a cargo da Biblioteca Nacional, a agncia

    bibliogrfica nacional brasileira.

  • 36

    Caldeira, em um seminrio ocorrido na Universidade Federal de Minas

    Gerais em 1984, alertava sobre a importncia da conscientizao do papel

    desempenhado pela Biblioteca Nacional como rgo de coordenao, permitindo

    assim, a integrao nas atividades de informao, promovendo a diminuio de

    custos pelo rpido acesso informao desejada. Para que o controle

    bibliogrfico no Brasil alcance seus objetivos necessrio um planejamento

    nacional que interligue centros de documentao, bibliotecas e editoras,

    integradas em nvel nacional e internacional, formando um sistema global

    coordenado, cuja coordenao cabe Biblioteca Nacional.

    Em termos ideais, a Biblioteca Nacional poderia implantar um programa

    nacional de polticas pblicas para o controle de autoridade nvel nacional.

    Entretanto, a Biblioteca Nacional tem passado por problemas notrios de

    estrutura, financiamento, equipes, entre outros. A instituio dispe de poucos

    profissionais, e estes ainda se esforam em manter os processos bsicos de

    catalogao e atualizao da bibliografia nacional, bem como dos catlogos

    bibliogrficos e de autoridade da instituio.

    Para Svenonius (2001) o grande problema tcnico fornecer variao local

    para culturas que classificam de forma diferente, usam diferentes linguagens de

    recuperao e possuem diferentes convenes de nomenclatura, de modo a no

    revogar as normas que facilitam o CBU. Eis um dos grandes desafios da

    catalogao atualmente. Com o desenvolvimento da tecnologia da informao,

    catlogos podem ser acessados remotamente em qualquer parte do planeta, e o

    usurio deixa de ser apenas local e fsico, e passa a ser multilocal, virtual e

    remoto. preciso equilibrar as necessidades desses usurios multilocais to

    dispares, com interesses e realidades socioculturais diferentes, s necessidades

    dos usurios locais, que, muitas vezes, no esto refletidas nos instrumentos de

    representao da informao utilizados pelas bibliotecas durante a catalogao,

    mas fundamentais para o intercmbio de informaes com outras instituies.

    Esse problema pode ser minimizado quando existem polticas pblicas de

    informao. Para Silveira (2013, p. 15) desenvolver polticas de informao para

    grupos especficos garantiria maior possibilidade de acesso e escolha aos

    cidados, pois incluiria o contexto sociocultural nos mecanismos de

  • 37

    representao. No caso brasileiro, faz-se urgente o desenvolvimento de polticas

    pblicas em defesa da Biblioteca Nacional, como instituio de preservao e

    disseminao da produo intelectual brasileira, e por outro lado, de polticas

    sobre a catalogao em plano nacional e sua importncia no aperfeioamento da

    biblioteconomia brasileira.

    Aps a discusso sobre a importncia do controle bibliogrfico, o prximo

    tpico explora a histria da catalogao, apresentando os principais cdigos

    desenvolvidos. Em um segundo momento, apresentam-se as definies que

    buscam descrever e, principalmente, conceituar a catalogao dentro do escopo

    da Cincia da Informao e da Representao da Informao.

    2.2 A CATALOGAO E SEUS PRINCPIOS

    No sculo XIX surgem grandes figuras na rea da catalogao. Uma

    dessas, Panizzi, comeou a trabalhar no British Museum em 1831 e l encontrou

    o acervo organizado por ttulos sob um cabealho de assunto, muitas vezes

    obscuro e intil. Em 1836, Panizzi elaborou um relatrio sugerindo a utilizao de

    um catlogo de autor com ndice de assuntos, no lugar de um catlogo

    classificado. A partir disso, Panizzi sistematiza, em conjunto com outros

    colaboradores do British Museum, o primeiro corpo de regras de catalogao, o

    Rules for the Compilation of the Catalogue, mais conhecidas como as 91 Regras

    de Panizzi. Essas regras definiam como registrar os nomes dos autores e os

    ttulos e como catalogar obras annimas.

    Denton (c2007) sintetiza de forma clara a importncia das 91 Regras de

    Panizzi ao afirmar que essas so a fonte da moderna catalogao por vrias

    razes: foram desenvolvidas por um grupo e no apenas por um homem; foram

    objeto de um intenso debate, anlise e justificativa e aprovadas por rgos

    governamentais; receberam ateno internacional ao serem usadas por uma

    grande biblioteca, neste caso o British Museum, e produziram um catlogo melhor

    do que os existentes at ento. Panizzi elaborou suas regras pensando nas

  • 38

    necessidades do usurio, sendo a ideia de "obra" e a padronizao parte de seu

    legado. Percebe-se tambm nas regras de Panizzi a importncia da padronizao

    dos autores, que assim permitiriam uma melhor recuperao da informao. As

    91 Regras de Panizzi podem ser consideradas as primeiras regras

    institucionalizadas de catalogao, sendo o cdigo de catalogao mais antigo o

    de Charles C. Jewett, de 1852, escrito para o Smithsonian Institute.

    Em 1876, Cutter publica o Rules for a Printed Dictionary Catalogue, sendo

    reeditado mais tarde como Rules for a Dictionary Catalog. Segundo Garrido Arilla

    (1996), com a proliferao das bibliotecas pblicas tanto nos Estados Unidos

    quanto na Europa a partir do sculo XIX, o aumento de estudantes universitrios,

    a reduo do analfabetismo e o crescimento da populao promoveram a

    incluso de usurios s bibliotecas que tinham acesso aos livros quase

    exclusivamente por autor, e esses usurios demanda sua recuperao tambm

    por assuntos. poca, os catlogos em fichas haviam atingido relevncia em

    termos de adoo e utilizao. Cutter, ento, apresenta uma nova viso de

    catlogo, onde no se teria apenas listas de itens por autor, mas itens arranjados

    por autor, ttulo e assunto, todos juntos em uma ordem alfabtica nica

    (DENTON, c2007). Para Barbosa (1978, p. 29) trata-se de um verdadeiro cdigo,

    constitudo de 369 regras que incluem normas no s para entradas por autor e

    por ttulo, mas tambm para a parte descritiva, cabealhos de assunto, e ainda

    alfabetao e arquivamento de fichas.

    Um dos princpios bsicos observados por Cutter em suas regras a

    convenincia do usurio, que dever ser preferida do catalogador. Garrido Arilla

    (1996) afirma que os princpios estabelecidos por Cutter representam a base da

    catalogao norte-americana, sendo considerado o grande terico da

    catalogao.

    Esse perodo, ou seja, final do sculo XIX e incio do XX, apresenta o

    desenvolvimento de cdigos nacionais de catalogao em vrios pases

    europeus. Com a venda de fichas catalogrficas pela LC, em 1901, a American

    Library Association (ALA), iniciou estudos sobre as regras adotadas pela LC. Em

    1904, a ALA e a Library Association da Inglaterra, comeam tambm estudos

    para a criao de um cdigo comum, buscando uniformidade e padronizao na

  • 39

    catalogao de ambos os pases. A colaborao desses estudos a publicao,

    em 1908, de dois cdigos: a edio americana denominada Catalog, Rules,

    Author and Titles Entries, e a edio britnica, denominada Cataloguing Rules,

    Author and Titles Entries. As edies foram baseadas nas regras de Panizzi,

    Cutter, Jewet e da LC e ficaram conhecidas como o Cdigo da ALA (GARRIDO

    ARILLA, 1996 ; MEY, 1995).

    Em 1941, uma segunda edio do Cdigo da ALA foi publicada. Essa

    edio estava dividida em duas partes. A primeira parte para pontos de acesso e

    cabealhos, e a segunda parte para a descrio de livros. Uma segunda edio

    definitiva publicada em 1949, em mais dois volumes. Porm, com as

    divergncias existentes entre os bibliotecrios sobre seu cdigo, em 1951, a ALA

    solicita a Seymour Lubetzky, bibliotecrio da LC, que analisasse seu cdigo de

    1949. Em 1953, Lubeztky publica seu relatrio sobre esta anlise, denominado

    Cataloguing Rules and Principles. Este documento considerado uma das

    principais contribuies catalogao. Lubetzky constatou que as regras de

    catalogao tornaram-se to complexas porque os catalogadores tinham perdido

    de vista os objetivos e funes do catlogo: ajudar os usurios a identificar e

    distinguir entre as obras que atendam s suas necessidades. Sua principal

    contribuio a fundamentao terica que atribui ao processo de catalogao

    (GARRIDO ARILLA, 1996; KNOWLTON, 2009).

    Os debates ocorridos, principalmente a partir de 1950, e a crescente

    necessidade de padronizao e intercmbio de dados entre as bibliotecas, levou

    a IFLA a organizar um grupo de trabalho, em 1954, encarregado de estudar a

    coordenao das regras de catalogao em mbito internacional. Estes trabalhos

    resultaram na Conferncia Internacional sobre Princpios de Catalogao,

    ocorrida em 1961 em Paris, mais conhecida como Conferncia de Paris. O

    objetivo desta conferncia era estudar alguns princpios de catalogao que

    norteassem o catalogar sobre a padronizao dos pontos de acessos nos

    catlogos (GARRIDO ARILLA, 1996).

    Como resultado dessa conferncia foi deferido a Declarao de

    Princpios, ou Princpios de Paris, como ficou conhecida. Essa declarao

    buscou definir as funes e objetivos do catlogo, com o propsito de servir como

  • 40

    base para uma normalizao internacional. A Declarao de Paris define como

    funes do catlogo:

    O catlogo deve ser um instrumento eficiente para verificar:

    se a biblioteca contm um livro em particular especificado por:

    (a) seu autor e ttulo, ou,

    (b) o ttulo por si s, caso o autor no seja identificado no livro, ou,

    (c) se o autor e o ttulo so inadequados ou insuficientes para sua

    identificao, um substituto adequado para o ttulo deve ser elaborado;

    (a) que obras de um determinado autor e,

    (b) que edies de uma obra particular esto na biblioteca

    (INTERNATIONAL CONFERENCE ON CATALOGUING

    PRINCIPLES, 1961).

    Svenonius (2001) considera que a Declarao de Paris apresenta

    parcialmente o que um sistema bibliogrfico, ou catlogo, possui de objetivos e

    funes. Devido ao seu escopo centrado em organizar documentos por autor e

    ttulo, no incluiu em seus objetivos a organizao da informao por assunto.

    Isto pode ser claramente observado no escopo da Declarao de Paris, conforme

    segue:

    Os princpios aqui declarados aplicam-se apenas escolha e forma de cabealhos e formas de entrada - ou seja, para os principais elementos que determinam a ordem das entradas - em catlogos de livros impressos na qual as entradas sob os nomes dos autores e, quando estes so inadequados ou insuficientes, sob os ttulos dos trabalhos so combinados em uma sequncia alfabtica (INTERNATIONAL CONFERENCE ON CATALOGUING PRINCIPLES, 1961, p. 1, traduo nossa).5

    Os principais pontos de acordo na Declarao de Paris esto relacionados

    aos pontos de acesso para nomes pessoais e ttulos uniformes, sendo

    considerada a precursora da padronizao dos pontos de acesso das obras

    5 The principles here stated apply only to the choice and form of headings and entry words i.e. to

    the principal elements determining the order of entries in catalogues of printed books in which entries under authors names and, where these are inappropriate or insufficient, under the titles of works are combined in one alphabetical sequence (INTERNATIONAL CONFERENCE ON CATALOGUING PRINCIPLES, 1961, p. 1).

  • 41

    existentes e passveis de serem catalogadas (MEY, 1995; SANTOS; CORRA,

    2009).

    A Conferncia de Paris tambm foi significativa por ser a primeira vez que

    se chegava a acordos internacionais sobre catalogao, incluindo tanto aspectos

    relativos aos objetivos e funes do catlogo quanto a sua organizao. Como

    consequncias imediatas, os cdigos de catalogao, que foram publicados nos

    anos seguintes, incorporaram suas recomendaes, sendo as Instrucciones para

    la redaccin del catlogo alfabtico de autores y obras annimas en las

    bibliotecas pblicas del Estado, de 1964, o primeiro cdigo a aderir aos

    Princpios de Paris (ESTIVILL RIUS, 2012).

    Os Princpios de Paris foram o ponto de partida de uma colaborao

    internacional. A IFLA, atravs da Seo de Catalogao promoveu diversos

    programas entre eles a ISBD e o CBU buscando uma efetiva colaborao e

    cooperao internacional. Contudo, quarenta anos aps os Princpios de Paris,

    os acervos das bibliotecas diversificaram-se, tornando evidente a necessidade de

    adequao da catalogao e dos catlogos s novas formas de recuperao da

    informao promovidas pelas mudanas e avanos tecnolgicos (ESTIVILL RIUS,

    2012; SANTOS; CORRA, 2009).

    Aps outras revises por Lubetzky e os Princpios de Paris, a ALA, a

    Library Association da Inglaterra e a Canadian Library Association publicam em

    1967 o Anglo-American Cataloguing Rules (AACR). O AACR apresentava regras

    para pontos de acesso, para a descrio de livros e, tambm, para a descrio de

    materiais no livro. O AACR passou a ser adotado pela LC e pelas principais

    bibliotecas americanas, inglesas e canadenses (JOINT STEERING COMMITTEE

    FOR DEVELOPMENT OF RDA, 2009; SANTOS; CORRA, 2009).

    poca, o intercmbio de informaes tornava-se mais frequente,

    principalmente com a elaborao e comercializao de fichas catalogrficas pela

    LC. Os princpios de catalogao tambm expressavam a necessidade de uma

    padronizao na representao da informao. Assim, havia a necessidade

    latente de uma padronizao internacional para a catalogao. A IFLA, vista

    disso, formou um grupo de estudos para viabilizar uma proposta de padronizao.

  • 42

    O relatrio desse grupo foi apresentado no International Meeting of Cataloguing

    Experts, em 1969 em Copenhague, sendo, ento, estabelecida a ISBD. Esta tem

    por objetivo identificar os componentes da descrio bibliogrfica, sua ordem de

    apresentao preferencial e a pontuao necessria na elaborao do registro

    bibliogrfico (SANTOS; CORRA, 2009).

    Em 1978, fora apresentada uma segunda edio do AACR, incorporando

    as ISBDs ao cdigo. Esse passou por revises em 1988, 1998 e 2002 seguindo

    basicamente a mesma estrutura do AACR2, no entanto, apresentando regras

    atualizadas que refletiam as mudanas experimentadas ao longo do tempo, tanto

    quanto uma nova perspectiva sobre os recursos eletrnicos, publicaes seriadas

    e recursos integrados (JOINT STEERING COMMITTEE FOR REVISION OF

    AACR, 2005).

    Em seguida as revises, o Anglo-American Cataloguing Rules 2nd edition (

    AACR2), tornou-se o cdigo de catalogao mais usado internacionalmente. Isso,

    em grande parte, devido aos projetos de catalogao cooperativa desenvolvidos

    nos Estados Unidos, principalmente pela LC como, por exemplo, o Monographic

    Bibliographic Record Cooperative Program (BIBCO) e o Name Authority

    Cooperative Program (NACO).

    No Brasil, a adoo do AACR ocorreu oficialmente a partir de 1969, data da

    traduo brasileira. Contudo, sua adoo efetiva ocorre em 1976, durante o 1

    Encontro dos Grupos de Trabalhos em Processos Tcnicos da Federao

    Brasileira das Associaes de Bibliotecrios, Cientistas da Informao e

    Instituies (FEBAB). Essa adoo foi considerada essencial pelo carter

    internacional do AACR, sendo necessria uniformidade dos pontos de acesso

    para obras representadas em catlogos, apontadas por escolas de

    Biblioteconomia e em acordo com a finalidade da Conferncia de Paris

    (BARBOSA, 1978; SANTOS; CORRA, 2009).

    Com o desenvolvimento das tecnologias de informao e comunicao a

    partir dos anos de 1960, novas demandas surgiram. Os cdigos de catalogao

    em uso, principalmente o AACR2, no contemplavam em suas regras os

    diferentes suportes de informao, especialmente a informao produzida e

  • 43

    distribuda eletronicamente ou pela internet. Os custos de catalogao

    intensificaram-se e a catalogao copiada6 pode responder a esse problema.

    vista disso, a IFLA, por intermdio de seus grupos de estudos, passa a

    indagar sobre o modelo de catalogao existente. Ento, na dcada de 1990, a

    IFLA patrocinou a criao do IFLA Study Group on the Functional Requirements

    for Bibliographic Records, grupo de estudos para a definio de requisitos

    funcionais para os dados bibliogrficos. Em 1998 publicado o FRBR.

    O FRBR busca, entre outros objetivos, garantir a qualidade do registro

    bibliogrfico atravs de requisitos bsicos de funcionalidade para esses registros,

    com foco nas tarefas realizadas pelo usurio durante sua pesquisa. O FRBR, no

    uma norma ou cdigo de catalogao, todavia, um modelo conceitual do tipo

    entidade-relacionamento7. Empenha-se em explicar de forma terica as funes

    dos registros bibliogrficos e de autoridade em relao aos diferentes suportes ou

    mdias, tecnologias e necessidades dos usurios.

    O modelo conceitual FRBR refora os objetivos bsicos dos catlogos8 e a

    importncia dos relacionamentos para que os usurios possam cumprir as tarefas

    bsicas de encontrar, identificar, selecionar e obter informaes que necessitam

    (JOINT STEERING COMMITTEE FOR REVISION OF AACR, 2005).

    Durante o desenvolvimento do FRBR, o grupo de estudos verificou a

    necessidade de ampliar os estudos sobre os requisitos funcionais para os dados

    de autoridade. O grupo entendeu que era indispensvel descrever a forma como

    as entidades e os relacionamentos so refletidos em pontos de acesso utilizados

    em registros bibliogrficos, alm de explicar como catalogadores determinam a

    forma do nome a ser utilizado nos pontos de acesso, algo no expresso no FRBR

    e que precisaria de um estudo especfico para sua realizao (Patton, 2007b).

    Esses estudos iniciaram em 1999 com o IFLA Working Group on

    6 Adaptao de um registro bibliogrfico pr-existente encontrado em outro banco de dados

    bibliogrficos para se adequar s caractersticas da obra em mos a ser catalogada. So realizadas modificaes para corrigir erros bvios e pequenos ajustes para refletir prtica local de catalogao, distinta de catalogao inicial (REITZ). 7 O conceito de entidade-relacionamento ser referido no captulo 4 ao se definir os modelos

    conceituais. 8 Esses objetivos sero abordados no prximo item, 2.3 - Objetivos e funes do catlogo.

  • 44

    Functional Requirements and Numbering of Authority Records / Grupo de

    Trabalho sobre os Requisitos Funcionais e Numerao para Registros de

    Autoridade (FRANAR)9. Em 2009, o FRANAR apresenta o documento final do

    FRAD. Os objetivos do FRAD so: prover um quadro para a anlise dos requisitos

    funcionais para o tipo de dados de autoridade que requerido no controle de

    autoridade e no seu compartilhamento internacional; fornecer um quadro

    estruturado de referncia que relacione os dados elaborados pelos criadores do

    registro autoridade para atender as necessidades de seus usurios; e auxiliar na

    avaliao do potencial de cooperao internacional e utilizao de dados de

    autoridade, tanto em bibliotecas como em outras instituies (IFLA WORKING

    GROUP ON FUNCTIONAL REQUIREMENTS AND NUMBERING OF

    AUTHORITY RECORDS, 2013).

    Concomitantemente ao desenvolvimento do FRBR e do FRAD, em 2003, a

    IFLA inicia uma srie de conferncias para a atualizao e reviso dos princpios

    de catalogao, as denominadas IFLA Meeting of Experts on an International

    Cataloguing Code (IMEICC). As conferncias ocorreram entre os anos de 2003 e

    2007, tendo o primeiro IMEICC ocorrido na cidade de Frankfurt, na Alemanha. O

    propsito do IMEICC era formular um conjunto de princpios com o objetivo de

    facilitar o intercmbio internacional de registros bibliogrficos e de autoridade,

    baseado em trs objetivos:

    1) desenvolver uma declarao de princpios internacionais de catalogao

    concebida para o atual ambiente de catalogao;

    2) harmonizar cdigos de catalogao nacionais;

    3) sugerir um conjunto de regras norteador para um cdigo internacional de

    catalogao (GENETASIO, 2012).

    Do 2 ao 4 IMEICC, ocorridos em Buenos Aires/Argentina, Cairo/Egito e

    Seul/Coria do Sul, as discusses sobre os princpios continuaram com

    apresentaes e revises dos esboos, sendo no 5 IMEICC, ocorrido na cidade

    de Pretria na frica do Sul em 2009, publicada a DPIC, conhecida como

    9 O grupo de trabalho FRANAR e o modelo conceitual FRAD sero tratados captulo 4.

  • 45

    Princpios de Frankfurt. Fortemente influenciada pelos modelos conceituais

    FRBR e FRAD, essa declarao apresenta como princpios gerais a consistncia

    e a padronizao dos processos de descrio e construo de pontos de acesso,

    possibilitando e facilitando o compartilhamento de dados bibliogrficos e de

    autoridade. Outro princpio fundamental o da integrao, onde as descries

    para todos os tipos de materiais e formas controladas de nomes de entidades

    devem ser baseadas em um conjunto de regras comuns (IFLA, 2009).

    Esta declarao substitui e amplia o mbito dos Princpios de Paris, incluindo, alm das obras textuais, todos os tipos de materiais, e alm da simples escolha e forma de entrada, todos os aspectos dos dados bibliogrficos e de autoridade utilizados em catlogos de bibliotecas. Inclui no s princpios e objetivos (isto , funes do catlogo) mas tambm regras orientadoras que devem ser includas nos cdigos de catalogao em mbito internacional, bem como servir de orientao para as funcionalidades de pesquisa e recuperao (IFLA, 2009, p. 1)

    A DPIC mantm a essncia dos objetivos do catlogo proposto por Cutter,

    o da convenincia do usurio, e adota as tarefas do usurio FRBR como objetivos

    do catlogo, recomendando como padro para a descrio bibliogrfica a ISBD.

    Esta declarao compreende:

    1. Abrangncia,

    2. Princpios gerais,

    3. Entidades, atributos e relaes,

    4. Objetivos e funes do catlogo,

    5. Descrio bibliogrfica,

    6. Pontos de acesso,

    7. Fundamentos para a funcionalidade de pesquisa.

    A DPIC define como os objetivos e funes do catlogo encontrar,

    identificar, selecionar, adquirir ou obter acesso a um recurso e navegar em um

    catlogo e para alm dele.

    Na apresentao desses objetivos e funes ficam explcitas as influncias

  • 46

    dos modelos conceituais FRBR e FRAD, onde as tarefas do usurio de encontrar,

    identificar, selecionar e obter, so apresentados e relacionados s entidades do

    Grupo 1 e do Grupo 2 descritos nesses modelos e que sero tema do captulo 4

    desta dissertao.

    A DPIC apresenta avanos, principalmente quanto ao estabelecimento de

    diretrizes para o controle de autoridade. Em seus princpios gerais, estabelece

    que, a fim de que ocorram consistncia e padronizao de registros bibliogrficos

    e de autoridade as descries e a construo de pontos de acesso devem ser

    to normalizadas quanto possvel. Isso permite maior consistncia o que, por sua

    vez, aumenta a capacidade de partilhar dados bibliogrficos e de autoridade

    (IFLA, 2009, p. 2). Em seu item 6 - Pontos de acesso - apresenta de forma

    explcita a funo do registro de autoridade, construdo para controlar as formas

    autorizadas e variantes de nomes usados como pontos de acesso, alm de definir

    o registro de autoridade em seu glossrio como um conjunto de elementos de

    dados que identifica uma entidade e pode ser usado para facilitar o acesso ao

    ponto de acesso autorizado para essa entidade ou para disponibilizar quaisquer

    outros pontos de acesso para a entidade (IFLA, 2009, p. 13).

    Genetasio (2012) considera que alguns aspectos da DPIC no so

    totalmente satisfatrios. O primeiro a ambiguidade de seus objetivos, que, por

    um lado, so apresentados como um conjunto de princpios de catalogao e, por

    outro, como um conjunto de orientaes para a construo de um cdigo

    internacional de catalogao. O segundo aspecto insatisfatrio da declarao a

    aparente ausncia de uma viso geral terica, pois vrios nveis completamente

    diferentes coexistem dentro do DPIC: princpios de natureza geral (princpios

    gerais); modelos conceituais (entidades, atributos e relacionamentos, objetivos e

    funes do catlogo); regras de catalogao (descrio bibliogrfica, pontos de

    acesso); e diretrizes para interfaces de OPACs.

    Em paralelo, durante o International Conference on the Principles and

    Future Development of AACR, realizada em 1997 em Toronto no Canad, o Joint

    Steering Committee for Revision of AACR elaborou uma lista de itens de ao,

    desencadeando em um processo de reviso do AACR. A princpio esta reviso

    estava voltada a alteraes relacionadas, principalmente, a flexibilidade e

  • 47

    extensibilidade do AACR2. Em 2004, percebe-se que as mudanas exigidas no

    cdigo vo alm do nvel de alteraes requerendo uma reviso exaustiva das

    regras. O comit denominou essa nova reviso de AACR3. Conforme novas

    mudanas eram propostas, testadas e discutidas, constata-se que era preciso

    avanar mais. Em 2005, o comit anunciou uma mudana de enfoque, ao invs

    de se tentar trabalhar nos limites das estruturas do AACR2, esta seria

    abandonada e uma nova estrutura criada, buscando uma harmonizao mais

    completa com o modelo FRBR. O nome da norma tambm seria mudado para

    RDA e o comit passaria a se chamar Joint Steering Committee for development

    of RDA. A RDA utiliza muitos dos elementos construtivos do AACR2, e os

    reorganiza numa nova estrutura baseada no arcabouo terico expresso nos

    modelos conceituais FRBR e FRAD (OLIVER, 2011).

    A RDA a norma de catalogao que substitui o AACR2. Este no mais

    ter revises peridicas, que esto destinadas a RDA e que so publicadas na

    RDA Toolkit, estabelecida em 2010. A RDA Toolkit uma ferramenta online para

    acesso as normas por meio de um navegador de internet e mediante assinatura.

    Tambm oferece acesso a um conjunto de ferramentas auxiliares ao catalogador,

    como a ltima verso do AACR2. A LC iniciou oficialmente o uso da RDA para a

    catalogao em maro de 2013. A norma RDA ser tratada com mais

    detalhamento no captulo 4.

    Segue-se a linha do tempo do desenvolvimento dos cdigos de

    catalogao com os principais cdigos, normas, diretrizes e conceitos

    estruturados a partir do sculo XIX at os dias atuais, com o objetivo de se obter

    um quadro sinttico e ilustrativo dos princpios e fundamentos tericos

    precursores da RDA.

  • 48

    Figura 2 Linha do tempo do desenvolvimento dos cdigos de catalogao

    Fonte: elaborado pelo autor

    Essa linha do tempo no busca abranger todos os cdigos de catalogao

    produzidos no perodo, mas empenha-se em alinhar cronologicamente os

    principais cdigos, regras e fundamentos tericos que exercem influncia direta

    na construo da RDA.

    Aps o relato do desenvolvimento e histrico da catalogao, segue-se

    com a interpelao sobre os conceitos da catalogao.

    Como um recurso de descrio fsica e bibliogrfica do item, a catalogao

    pode ser considerada o principal mtodo para organizar vrias colees e

    consiste da entrada de diversos itens responsveis por caracterizar cada

    elemento da coleo, com o objetivo de fornecer uma representao do

    documento descrito de uma forma nica e no ambgua permitindo sua

    identificao, localizao, representao e recuperao nos catlogos

    correspondentes (GUINCHAT; MENOU, 1994 ; RODRIGUES et al., 2002).

    O uso do termo catalogao no Brasil possui algumas variantes,

    principalmente pela separao entre a descrio fsica e de contedo da obra.

    Muitos preferem separar estas duas vertentes em representao descritiva e

    representao temtica. A representao descritiva retratada de forma

  • 49

    equivocada como apenas a descrio dos elementos fsicos do item catalogrfico.

    Contudo, tambm abrange a descrio e representao da responsabilidade

    autoral e de publicao, os pontos de acesso de ttulo e autoria, paginao, etc. A

    representao temtica retratada como a descrio dos elementos de contedo

    da obra, apresentando os elementos relacionados ao assunto.

    Com a publicao do FRBR, o repensar da catalogao tambm envolveu

    o repensar da separao entre descrio fsica e de contedo. O preceito bsico

    do modelo conceitual FRBR o de entidade-relacionamento, onde no h

    separao entre contedo e descrio do item, uma vez que estes se

    complementam.

    Por esta dissertao estar voltada ao controle de autoridade da

    responsabilidade intelectual da obra, a catalogao descritiva ser tratada com

    maior detalhamento. Usa-se o termo catalogao para designar a catalogao

    descritiva, utilizando-se como principal conceito o de Mey e Silveira (2010) que

    definem a catalogao como o estudo, a preparao e a organizao de

    mensagens, com base em registros do conhecimento reais ou ciberespaciais,

    existentes ou passveis de incluso em um ou vrios acervos, com a finalidade de

    criar contedos comunicativos que permitam interao entre o conhecimento e os

    usurios.

    Alm de seu carter comunicacional,

    [...] a catalogao, como processo essencial para a descrio e padronizao das informaes representadas, construda a partir de regras que ofeream o mximo de padronizao e minimizem as interpretaes individuais, procurando garantir a unicidade do item informacional representado e, ao mesmo tempo, sua universalidade. (SANTOS; CORRA, 2009, p. 19).

    A catalogao, como a reunio lgica de dados bibliogrficos em registros

    recuperveis e utilizveis, o processo que permite a biblioteca prosseguir com

    suas misses centrais de atendimento e de acesso livre e aberto a todo o

    conhecimento e as informaes registradas. O controle de autoridade vital e

    central a esse processo. No possvel fornecermos um servio real de biblioteca

    sem uma arquitetura bibliogrfica e essa no pode existir sem o controle

    bibliogrfico (Gorman, 2004). O controle de autoridade confere catalogao a

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    padronizao necessria aos seus processos descritivos, tornando-se essencial

    na garantia de unicidade e consistncia dos dados.

    A adoo de normas que permitem o intercmbio da mensagem

    catalogrfica entre instituies documentais no mundo amplia as alternativas de

    escolha pelos usurios e auxilia outros profissionais durante o processo de

    catalogao. A consistncia sinttica e semntica do registro bibliogrfico facilita o

    reconhecimento dos sinais e sua compreenso pelo uso de linguagem comum.

    No entanto, existe um fator determinante e geralmente ignorado: a necessidade

    dos usurios. Cabe ao catalogador definir os elementos essenciais que

    satisfaam as necessidades de seu pblico especfico para o cumprimento de tais

    aes (MEY; SILVEIRA, 2010; MEY; ZAFALON, 2009).

    Mey e Silveira (2010) alertam sobre o uso das tcnicas sem sabedoria, uso

    esse que abarca desde as lacunas hermenuticas at o endeusamento das

    tecnologias. Atenta-se, desse modo, para um problema no apenas bibliotecrio,

    mas profissional brasileiro: o emprego incondicional de tcnicas e instrumentos,

    no exatamente adequados queles aos quais se destinam. Modesto (2007)

    salienta que a catalogao, no Brasil, evolui impulsionada por fatores internos e

    externos. As tecnologias de informao moldam as prticas de catalogao e

    reconstroem o perfil do catalogador brasileiro.

    Ao longo do tempo, as regras e normas catalogrficas moldaram-se as

    necessidades dos usurios e aos avanos tecnolgicos, sendo constante seu

    principal objetivo de processamento analtico da informao com a finalidade de

    representar documentos, permitindo o armazenamento e a recuperao da

    informao.

    A catalogao, como outros processos, tem uma natureza dupla: pode ser interpretada como um processo e um produto; a resultante de todas as suas operaes e funes podem ser uma ficha catalogrfica (em sistemas tradicionais) ou um registro (nos automatizados) (JIMENEZ MIRANDA, 2003, p. 5, traduo nossa).10

    10

    La catalogacin, al igual que otros procesos, presenta una naturaleza dual: puede interpretarse como proceso y como producto; la resultante de todas sus operaciones y funciones puede ser una ficha catalogrfica (en sistemas tradicionales) o un registro (en los automatizados) (JIMENEZ MIRANDA, 2003, p. 5)

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    Como um produto da catalogao, o registro bibliogrfico (seja ele

    analgico, a ficha catalogrfica, ou automatizado) possui elementos descritivos,

    temticos e de autoridade. Com a normatizao da descrio da informao no

    decorrer do desenvolvimento da catalogao, esses elementos foram adquirindo

    uma ordem de apresentao, ordem essa definida por instrumentos normativos

    da catalogao, sendo o principal deles a ISBD. Esse formato de apresentao

    busca facilitar a comunicao entre o usurio e o registro bibliogrfico.

    O registro bibliogrfico interage com outros registros, entre eles, o registro

    de autoridade. O registro de autoridade criado para o estabelecimento do ponto

    de acesso