macbeth sxuola
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MACBETH Tradução livre do original e dramaturgia Maurício Paroni de Castro (consultoras Tânia Guerreiro e Ângela Noronha) O Velho Dobal que nós conhecemos,com mais de 50 anos de palco A Jovem Augusta que nós conhecemos, com menos de 50 anos de palco Alvise, espectro de Banquo, Fleance, filho de Banquo e espectro de Duncan William Shakespeare Dramatis Personae 1TRANSCRIPT
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MACBETH
William Shakespeare
Tradução livre do original e dramaturgia
Maurício Paroni de Castro
(consultoras Tânia Guerreiro e Ângela Noronha)
Dramatis Personae
Duncan, rei de escócia
Malcolm e Donalbain, seus filhos
Macbeth, barão de Glamis, depois de Cawdor, depois Rei de Escócia
Banquo
Macduff
Ross barões de Escócia
O Velho Dobal que nós conhecemos,com mais de 50 anos de palco
A Jovem Augusta que nós conhecemos, com menos de 50 anos de palco
Alvise, espectro de Banquo, Fleance, filho de Banquo e espectro de Duncan
Lady Macbeth
Lady Macduff
Três irmãs do destino
Hécate
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PRIMEIRO ATO
Três enormes rolos de panos, alinhados no mesmo eixo, com pinturas; o
primeiro para o tempo/horas, justaposto um segundo para o espaço/lugares, por
sua vez justaposto a um terceiro, mais baixo, para objetos/personagens.
Penumbra, iluminada pelas velas do Coro de Sonâmbulos, entregues por quem
do público dispôs-se a acendê-las. Este Coro tende a enganar quem quer que seja
com suas litanias hipnotizantes.Os Kurokus abrem o pano de boca vermelho.
BRUXABORGHI (Vestido com bichos de pelúcia enforcados, denota com
aquele ar evocativo de infância o evidente fardo de impaciência que a sabedoria
traz).
Será com trovão (O CORO SONÂMBULO diz continuamente a palavra “trovão”),
chuva ou relâmpago?
Acende-se intermitentemente a pintura do Relâmpago. Essas pinturas devem ser
iluminadas à antiga, por ribaltas de lâmpadas comuns. BRUXABORGHI dança.
BRUXAKÖHLER entra da Rua, de biquíni, e interrompe a atmosfera. Maquia-se.
Alguém do CORO SONÂMBULO substituí “trovão” por “Praça Roosevelt”.
BRUXADOBAL, senhor posto em trajes de menina impressionista, bate na
BRUXAKÖHLER, que pára de se maquiar, vai para trás do seu projetor e passa
a desenhar uma Lua com os seus instrumentos de maquiagem. Cobre-se com
um pano preto, mais decente. Sinaliza um pedido de compostura.
BRUXABORGHI
Quando a gente se vê de novo?
BRUXADOBAL
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Quando acabar a baderna e a guerra for perdida e vencida.
BRUXABORGHI
Antes do pôr-do-sol.
BRUXADOBAL
Onde?
BRUXABORGHI
Para lá da pântano, para encontrar Macbeth.
BRUXADOBAL
O sapo canta.
O CORO faz “crock” “crock” “crock” continuamente.
BRUXABORGHI
Névoa.
Ar engordurado.
BRUXADOBAL
O bonito é feio.
BRUXABORGHI
O feio é bonito.
BRUXAKÖHLER (O mudo, enfurecido)
BONOSOKUBUDAI! BONOSOKUNEHAN!
BRUXABORGHI
“O Bem, o Mal é tudo igual.”
BRUXADOBAL
“O Bem, o Mal é tudo igual.”
BRUXABORGHI e BRUXADOBAL têm diante de si um rolo, espécie Toráh e
lerão o texto se desejarem. BRUXADOBAL não suporta a roupa de bruxa que
lhe puseram; típico ator envergonhado pelo que é obrigado a fazer, também ele
esconde sua roupa com um pano preto. Volta a ser o VELHO DOBAL de todos
nós, com mais de 50 anos de teatro. Faz de tudo para tomar parte das
manipulações do CORO SONÂMBULO.
A pintura do Relâmpago muda para a pintura do Pôr-do-Sol. Mudança dos rolos
de pintura a cargo de KUROKALEX e KUROKASTRO. Esses KUROKUS entram
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de maneira solene, à Japonesa. O CORO silencia. Os dois desenrolam as
pinturas.
KUROKASTRO
Rei Duncan, Malcolm, Donaldbain, Lennox, Corte.
KUROKALEX
E um soldado ensanguentado.
(Repetem isso continuamente. O CORO SONÂMBULO, hipnótico e sedicioso,
movimenta todos os gestos de DUNCANNILTON. Completamente desprovido
de tônus muscular, faz enorme esforço intelectual para compreender o que lhe
dizem, é crédulo e cínico).
DUNCANNILTON
Quem é esse desgraçado que sangra? Talvez tenha notícias da revolta.
KUROKALEX
É um amigo.
KUROKASTRO
Conta ao Rei o que sabe.
CORO SONÂMBULO
Não se sabia o destino.
O VELHO DOBAL
Macdonwald, o revoltoso ... (Consulta os seus pergaminhos. Uma pessoa do
CORO repete continuamente a palavra “infame”) tinha reforços de infantaria e
de cavalaria, das ilhas do poente.
CORO SONÂMBULO
O destino era danado.
O VELHO DOBAL
Mas era fraco o sorriso daquela puta rebelde. Eis que o bravo Macbeth desdenha
o destino: espada fumante de sangue, crava passagem até a face daquele escravo
e, sem dizer oi nem adeus, rasga-lhe a carne do umbigo à garganta, e lhe finca a
cabeça num mastro.
DUNCANNILTON (Hipnotizado)
Nobilíssimoprimovalente...
CORO SONÂMBULO (parte do CORO)
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O sol conosco. (idem)
O VELHO DOBAL
Ouça, Rei de Escócia, ouça.
CORO SONÂMBULO (Outra parte do CORO)
Trovão e tempestade. (idem)
O VELHO DOBAL – (Com volume mais alto que o CORO SONÂMBULO.
Consulta sempre os seus pergaminhos.)
Ouça, Rei de Escócia, ouça; da fonte na qual deveria brotar conforto veio o
desconforto. O invasor Norueguês, com armas e tropas novas, começa o seu
assalto.
DUNCANNILTON (Completamente atordoado)
Têm medo nossos capitães, Macbeth e Banquo?
O VELHO DOBAL
Estão como a águia e o leão diante de pássaros e coelhos. Tomam banho de
sangue em feridas abertas. Mas desmaio pelas minhas de agora.
DUNCANNILTON (Sempre atordoado)
Um médico, um médico.
KUROKALEX (Anuncia)
O nosso Barão de Ross.
DUNCANNILTON (Sempre mais atordoado, olha para o rolo do espaço, não
consegue orientar-se)
De onde vem, nobre Barão?
CORO SONÂMBULO
(GATT-ROSS, do CORO, canta, como uma canção de nina para acalmá-lo)
De Fife, meu rei, onde o invasor insulta o céu e nos sopra gelo.
(O CORO evoca uma turba de estádio de futebol. A metade contra o Rei mais
alta que a metade a favor).
O Rei Norueguês, com hordas encorpadas pelo traidor Cawdor, desfecha um
ataque pavoroso...
(A metade a favor do Rei mais alta que a metade contra).
...Mas Macbeth, lacrado em sua armadura, enfrenta-o braço a braço. Doma
aquele demônio e deixa o inimigo sem líder.
(As duas metades se juntam a favor).
DUNCANNILTON (Cada vez mais atordoado com os sons)
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Grande alegria!
CORO (ibidem)
E faz o inimigo comprar a paz em nota viva.
DUNCANNILTON
O Barão de Cawdor nunca mais nos trairá.
Dê-lhe voz de morte.
Saúde Macbeth como herdeiro do título do morto.
Aquilo que ele perde, Macbeth ganha.
BRUXABORGHI (para BRUXAKÖHLER, que, mudo, desenha o futuro com
rapidez em seu projetor)
Onde é que você esteve, minha irmãzinha?
BRUXAKÖHLER desenha em seu projetor um porco degolado.
BRUXADOBAL (Arrumando os seus pergaminhos, com saudade de seu figurino
em Timão de Atenas)
Assassinando suínos.
BRUXABORGHI
Fala sério, irmãzinha, onde esteve?
BRUXADOBAL
A semear ventos. (peida).
BRUXABORGHI
Que arte gentil.
Silêncio. BRUXAKÖHLER peida.
BRUXABORGHI (inspira profundamente os perfumes.Lê o seu rolo)
Possuo tudo comigo,
Possuo os portos onde sopram os ventos,
Possuo a rosa dos ventos,
Olhem só o que eu possuo.
BRUXADOBAL
Mostra, mostra.
BRUXABORGHI
Um dedo de timoneiro,
Náufrago de minha rosa de ventos.
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O CORO SONÂMBULO imita o som do vento.
KUROKU-CASTRO
Aí vem Macbeth.
As BRUXAS se ondulam ao vento frenético, e cantam outra canção de ninar. O
CORO faz o toque de tambor.
BRUXABORGHI e BRUXADOBAL
Loucas
Vagabundas
No terreiro,
No mar
Três pra você
Três pra mim
Mais três pra nós
(pausa)
Já fez nove.
Silêncio! O despacho está pronto.
KUROKASTRO e KUROKALEX (anunciam alternadamente e mostram ao
público seus respectivos sporrans.)
Macbeth, Banquo.
Do CORO saem Macbeth e Banquo, recebem dos dois Kurokus os seus sporran e
os vestem. Tomam as suas lanças de combate – esculturas de Giampaolo Köhler.
Os Kurokus rodam o rolo do tempo para a pintura da aurora - de Laura
Trevisan.
MACBETH
Dia tão horrível e belo jamais tinha visto.
Os Kurokus rodam o rolo do espaço para o pântano.
BANQUO
A que distância estamos de Forres?
(As Bruxas estão em quase penumbra. Acende-se o projetor de
BRUXAKOHLER; O CORO SONÂMBULO reinicia o barulho do vento.)
Que coisas desancadas, esculhambadas: nem parecem morar neste mundo, mas
estão aqui.
Estão vivas?
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(Pausa)
Parecem entender-me; levam os dedos ossudos às bocas crispadas.
(Pausa)
Seriam mulheres, se as barbas não impedissem.
MACBETH
Falem. Se conseguirem. O que são vocês?
(BRUXAKÖHLER saúda MACBETH ao desenhar o Brasão – os motivos dos
ralos de banheiro - de Glamis)
BRUXABORGHI
Salve, Macbeth: (lê) Barão de Glamis!
O CORO SONÂMBULO repete sempre Macbeth Barão de Glamis.
BRUXAKÖHLER Saúda MACBETH a desenhar o Brasão de Cawdor.
BRUXADOBAL
Salve, Macbeth, (lê)Barão de Cawdor!
O CORO SONÂMBULO, idem. BRUXAKÖHLER saúda MACBETH mais uma
vez, ao desenhar a Coroa de Duncannilton. Todos esses desenhos são
acompanhados pela admiração do CORO.
BRUXABORGHI
Salve, Macbeth, daqui a bem pouco, nosso Rei!
O CORO SONÂMBULO repete “Macbeth nosso Rei”. Silêncio. MACBETH fica
extasiado, sorri e tem medo dessas palavras. O CORO SONÂMBULO o quebra
com a litania “Medo, Palidez, Medo, Palidez”, et coetera, e deverá seguir cada
palavra-chave das falas dos diálogos a seguir, até o fim da cena. Isso deverá ser
feito A FAVOR E NÃO CONTRA OS ATORES, SEJA POR VOLUME, SEJA POR
ESCUTA DAS INTENÇÕES DOS MESMOS; PEDE ATENÇÃO DOBRADA E
LEALDADE CÊNICA; NÃO É EFEITO OU COMENTÁRIO MUSICAL. É
TEATRO.
BANQUO
Por que fica pálido, por que teme tão boas palavras?
Em nome da Verdade, vocês são alucinações ou aquilo que parecem?
Saudaram o meu companheiro com previsão de imensa nobreza,
Com esperança de realeza,
Até roubar-lhe a serena aparência.
(Silêncio. Troca de palavras do CORO SONÂMBULO)
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A mim, fala nenhuma.
(pausa)
Se conseguem ver através das sementes do tempo,
Digam-me então qual vingará e qual morrerá,
Falem a mim;
Não rogo nem temo favores e ódio.
As BRUXAS saúdam BANQUO, seguidas pelo coro: ‘Salve, Salve, Salve’.
BRUXABORGHI
Menor, mas maior do que Macbeth.
BRUXADOBAL
Não tão feliz, mas mais feliz.
BRUXABORGHI
Gerarás reis sem ser Rei.
Então, salve, Macbeth e Banquo!
BRUXADOBAL
Salve!
MACBETH
Fiquem, harpias mal-acabadas! Esqueceram as falas?
Morto Sinell, virei o Barão de Glamis.
Como é que virei o de Cawdor, se ele ainda vive?
Não há chance nem de eu ser Rei, nem Barão de Cawdor!
Digam de onde tiraram estas tramas estranhas,
E porque interrompem nosso caminho nesta landa maldita com tais profecias?
Falem! Eu ordeno!
As BRUXAS evaporam-se.
Os Kurokus mudam o rolo do tempo para o Dia.
BANQUO (incrédulo)
A terra tem bolhas,
A água também,
E isso eram elas.
Por onde sumiram?
MACBETH
No ar.
O que parecia um corpo desapareceu como a respiração no vento.
Quem me dera tivessem ficado.
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BANQUO
Mas aquilo com que falamos estava mesmo aqui?
Ou comemos daquela raiz insana que deixa a razão prisioneira?
(Silêncio, quebrado pelos Kurokus, que giram lentamente o rolo do espaço para
uma floresta. Eles caminham.)
MACBETH
Os teus filhos serão reis.
BANQUO
Você será Rei.
MACBETH
E Barão de Cawdor também.
BANQUO
Assim a música das palavras.
Quem vem lá?
KUROKALEX e KUROKASTRO anunciam a entrada de GATT ROSS e, sob
coação, de Angus. A GATT-ROSS retoma seu sporran; os KUROKUS dois
outros sporrans com brasão e armas de Angus. Alternar-se-ão nas falas de
ANGUS.
GATT-ROSS
O rei recebeu com alegria
Notícias de teu sucesso, Macbeth,
E quando soube da tua pessoal valentia
Na luta contra o rebelde
A sua admiração e louvor
Competiam entre si.
Silencia, ao imaginar o teu dia.
DUNCANNILTON (do CORO)
...Impassível,
Diante dos rangos da Noruega,
Sem temor das imagens de morte por si aventadas...
GATT-ROSS
Trago a graça de nosso Rei,
E levo o Senhor até ele.
Não se fala em pagar,
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Mas em futura honra maior.
Pediu-me que o chamasse Barão de Cawdor:
Portanto, Salve, Barão de Cawdor,
Tal título é seu.
BANQUO
Pode o demônio ter dito a verdade?
MACBETH
O Barão de Cawdor vive.
Porque me veem com roupas dos outros?
KUROK-ANGUS-CASTRO
Vive, aquele que era Barão,
Uma vida sob pesado julgamento,
Vida que deve perder.
KUROK-ANGUS-ALEX
Estava combinado com os da Noruega,
Ou alinhou-se depois com o inimigo,
Prestando a eles auxílio secreto;
Ou se em ambos se empenhou
Para a destruição do país,
Não sei.
KUROK-ANGUS-CASTRO
Tais traições capitais
Estão provadas e confessadas.
MACBETH
Barão de Glamis e de Cawdor.
(O CORO SONÂMBULO repete a fala)
E o melhor ainda por vir.
(A BANQUO)
Não é que os teus filhos um dia serão Reis,
Se quem me concedeu o título de Barão,
Prometeu a eles não menos que a Coroa?
BANQUO (à parte)
Mas o feudo Cawdor leva direto à Coroa.
Que estranho:
Muitas vezes, pra nos levar à ruína,
A Força do Escuro nos diz a verdade,
Propina a minúcia honesta,
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Pra trair fundo no que se segue.
Primos, uma palavra só, vos peço!
MACBETH (à parte)
Duas verdades estão ditas,
Prólogo feliz do
Ato maior da trama real.
Este aliciamento sobrenatural
Não pode ser mau; e nem pode ser bom.
Se é mau, porque me garante o sucesso,
Confirmado pela verdade em que “Eu sou o Barão de Cowdor?”
(O CORO SONÂMBULO repete: ‘Eu sou o Barão de Cawdor’)
Se é bom, porque cedo à sugestão
Cuja imagem horrenda me arrepia os cabelos,
Faz o coração bater nas costelas?
Os medos de hoje são menores que a imaginação terrível:
Meu pensamento, onde o assassínio ainda é fantasia,
Abala a minha condição natural:
Cada órgão está regulado pela suspeita,
E nada mais é do que aquilo que não é.
BANQUO
Olha o parceiro tomado!
MACBETH
Se a Fortuna me quiser Rei
Que a Fortuna me coroe
Sem que eu me mexa.
BANQUO
A honra encontrada
É como roupa nova
Que mal assentou-se-lhe ao corpo,
Só o uso pode dar sua forma.
MACBETH
Venha o que deve vir.
O tempo e a hora sempre chegam ao fim,
Até nos dias mais duros.
BANQUO
Digníssimo Macbeth, a seu dispor!
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MACBETH
Tenha paciência comigo,
Minha mente vaga forjou-se do que já acabei de esquecer.
Senhores, a vossa dedicação está incisa
Onde todos os dias eu posso reler.
Juntemo-nos ao Rei.
(A Banquo)
Pesa o que aconteceu com a passagem do tempo;
Falemos depois, abertamente, sobre o que nos irá pelo coração.
BANQUO
Com prazer.
MACBETH
Até lá, então!
Venham, amigos.
(Saem).
Além daqui, devo deixar abertas as palavras do coro. As experiências, porém,
devem ser bem precisas; partiremos de palavras em negrito. Tenderei a
diferenciar palavras grifadas em vermelho com a voz feminina de Augusta Ruiz,
ao passo que o CORO brincará COM OUTRAS PALAVRAS. Estas devem estar
bem distante de um jogral, pois causam diretamente a ação de Duncanilton
agora (sempre atordoado) e, - depois do assassinato deste - a paranóia de
Macbeth ou a loucura da Lady. Trata-se de diálogo; não conseqüencial, jamais
de subtexto, mas sempre diálogo. Há intenção explícita entre as palavras do
coro e a terrível imaginação que Macbeth quer evitar.
DUNCANNILTON
Executaram Cawdor?
GATT-ROSS
Senhor, falei com quem assistiu à sua morte.
Confessou sinceramente a traição,
Implorou o perdão real,
Demonstrou grande arrependimento.
Nada na sua vida o honrou mais que o momento da morte.
Morreu como se houvesse encenado a hora fatal,
Jogou fora seu bem mais precioso como coisa de nada.
DUNCANNILTON
Não há arte possível pra desvendar o caráter humano pela aparência.
Era um homem no qual depositava absoluta confiança.
(Kurokus anunciam Macbeth, Banquo, Ross e Angus)
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Digníssimoprimo!
A ofensa de minha ingratidão ainda pesa sobre mim.
As mais rápidas asas da recompensa
São lentas demais para ultrapassar quem está tão na frente.
Se merecesses menos gratidão e retribuição,
Talvez a conta estivesse em meu favor.
Posso somente dizer que
Muito mais te devesse dar se te desse mais do que pudesse pagar.
(O CORO SONÂMBULO indigna-se com o “calote”).
MACBETH
O serviço e a lealdade que devo são a paga.
É papel de sua alteza receber nossos serviços,
É nosso dever com o trono e o estado.
DUNCANNILTON
Eu te plantei, para ver-te crescer e ser forte.
(A banquo)
Não mereces menos, também os teus feitos devem ser proclamados:
Dá-me um abraço, segure-me pelo coração!
BANQUO (taciturno)
Onde quer que eu cresça
A colheita será sua.
DUNCANNILTON
Imensa alegria esconde-se atrás de minhas lágrimas.
Filhos, parentes, Nobres e vocês, mais próximos de mim,
Sabem que a coroa passará para o meu primogênito,
Malcolm, que nomeamos, de agora em diante, Príncipe de Cumberland.
Esta honra nem vem solitária, nem ele será investido sozinho,
Pois sinais de nobreza brilharão, como estrelas, em quem merecer.
Daqui para Inverness! E cada vez mais ligados a ti.
MACBETH
O repouso é cansaço quando não feito em teu nome.
Eu mesmo serei mensageiro, para fazer minha esposa feliz
Com a notícia da tua chegada.
DUNCANNILTON
Meu digníssimo Cawdor!
MACBETH
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O Príncipe de Cumberland é pedra no caminho: Pular ou tropeçar.
(Pausa)
Estrelas, escondam o seu fogo. Não deixem a luz chegar a fundos e negros
desejos, que os olhos se fechem ao gesto da mão;
Aconteça o que os olhos temem ver, quando estiver feito para ser visto.
(Sai)
DUNCANILTON
Banquo!
Homem valente, elogiar-te é banquete para mim.
Vamos atrás do irmão que partiu antes para só nos dar boas vindas.
(O rolo do tempo volta ao por do sol, e o rolo do espaço mostra a sala do castelo
de macbeth. A lady entra durante a mudança do espaço, aparece lendo).
LADYMACBETH
Foi no dia da vitória: enxergavam além dos mortais comuns. Quando eu mais
ardia para saber tudo, viraram ar e nele evaporaram. Logo chegou a notícia do
Rei fazendo-me Barão de Cawdor – título com que as harpias tinham acabado de
me chamar. No fim, saudaram-me como futuro rei. Isto revelo, companheira de
glória, para que te alegre e antevejas a grandeza a que te destinas. Guarda-o no
teu coração.
És Glamis, és Cawdor, serás o que foi prometido.
Mas teu caráter derrama demais leite e bondade,
Impede o caminho mais curto.
Não te falta ambição;
Falta Maldade em tua Santa Vontade,
À qual sem doença anseias chegar.
Através do Legítimo queres alcançar o Ilegítimo.
Glamis, Cawdor, e além:
Terás de agir por isso!
Terás que fazer o que temes fazer.
(Pausa)
Vem depressa,
No teu ouvido vou derramar meu espírito,
Açoitar com a coragem da língua
O que te afasta do que o destino promete.
(ao mensageiro que entra)
Quais são as novidades?
KUROKALEX
O rei virá aqui esta noite.
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LADY MACBETH
Estás louco? O teu senhor não está com ele?
(à parte)
Se isso fosse verdade teria avisado
Para que preparasse tudo.
KUROKASTRO
É verdade senhora!
Um dos nossos veio na frente,
Quase sem fôlego conseguiu entregar a mensagem.
LADY MACBETH
Até o corvo está rouco. Anuncia a entrada fatal do Rei nas minhas muralhas.
Vem, pensamento, espírito de Morte,
Assexua-me a mente,
Crava ferocidade nas minhas carnes profundas:
Adensa-me o sangue,
Degola-me o acesso ao remorso.
Nenhuma piedade há de a mira turbar,
Ou de jazer entre ela e o feito final.
Vem a meus seios, transforma meu leite em fel;
Correio de Morte, sai do lodo incorpóreo,
Onde alimentas a fonte maligna,
Vem, noite espessa, sacia-te no mais fétido fumo do Inferno.
Que minha faca afiada não veja a ferida imediata,
Que o Céu travado nos panos da treva não grite:
Pára!
(A jovem augusta fecha a cortina vermelha)
Pára!
(Macbeth abre a cortina vermelha. A LADY o recebe.)
Glamis, Cawdor, mais que isso, próximo Rei,
Tua carta explode o turvo presente,
Sinto no instante o futuro.
MACBETH
Amor,
Duncan chega esta noite.
LADY MACBETH
E quando parte?
MACBETH
Amanhã.
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LADY MACBETH
Nunca verá o sol de amanhã.
Ppausa)
Tua face é livro em que pode-se ler o estranho.
Se queres enganar o tempo, parece-te com o tempo.
Dá boas vindas com olhar, gesto, palavras.
Sê flor inocente que esconde serpente.
Deve ser bem recebido e tratado:
À minha mão deixarás a empresa da noite,
Que nos dará poder e governo a todos os dias e noites da vida.
MACBETH
Falaremos depois.
LADY MACBETH
Finge clareza. Feição alterada é sinal de medo.
Deixa o resto comigo.
(O rolo da noite e do dia chegam. O rolo do espaço apresenta o Castelo de
Macbeth. Canto do coro – a pesquisar se melodia ou somente ritmo. O Coro o
move.)
DUNCANNILTON
Adorável, o local deste castelo.
O ar, doce e ligeiro, esperta nossos sentidos.
BANQUO
As andorinhas, hóspedes do verão, constroem sua alcova sagrada,
Atraídas pelo doce hálito que vem deste céu.
Não há canto, friso, topo de coluna
Onde não estão aninhadas.
Só vivem e procriam onde o ar é delicado.
(Entra Lady Macbeth)
DUNCANNILTON
Honra à nossa anfitriã! O amor é seguido pelo trabalho que lhe damos, mas é
sempre amor, que agradecemos. Se Deus lhe agraciar em dobro, vocês a nós
agradecerão o trabalho causado.
LADY MACBETH
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Por mais que faça e refaça, empenhando-me em lhe agradar, nosso esforço
empalidece diante da honra que Sua Majestade nos dá com sua presença. Por
todas as graças obtidas, rezaremos sempre por Vossa Majestade.
DUNCANNILTON
Onde está o Barão de Cawdor? Viemos em seu encalço, tentando em vão
alcançá-lo, mas além de bom cavaleiro, o amor, agudo como suas esporas,
o trouxe de volta muito antes de nós. Bela e nobre anfitriã, seremos seus
hóspedes esta noite.
LADY MACBETH
E nós, para sempre seus servos. Disponha desta casa como sua.
DUNCANNILTON
Senhora, me dê a mão.
Leve-me até meu anfitrião.
Nossa estima por ele é imensa
e nossas graças se derramarão sempre sobre sua pessoa. (saem)
(O rolo da noite volta, assim como o rolo do espaço vai à sala do Castelo de
Macbeth. Canto do coro. Os Kurokus movem o rolo de personagens de corte,
pratos e objetos neles desenhados ou esculpidos.)
MACBETH
Agiria depressa,
Se tudo acabasse no fim do ato,
Se dentro de si o assassinato entrevasse a conseqüência,
Se o sucesso perdoasse o ato;
Se o golpe fosse tudo e o fim de tudo,
Aqui, aqui mesmo, nas margens da areia seca do tempo, eu me atiraria ao
futuro.
Mas nestes casos temos Sentença na vida presente; postas em ato, as inspirações
malditas voltam-se como peste contra o inventor. As mãos da justiça empurram
a borda do cálice por nós envenenado de encontro aos próprios lábios.
(Pausa)
O Rei descansa, sereno: sou seu parente e vassalo, dois fortes obstáculos ao ato.
Como anfitrião, deveria barrar a porta ao assassino, e não cravar-lhe a faca.
Além isso, Duncan exerce seu mando com tal brandura, reina com tal
docilidade, que suas virtudes induzem perdão à danação de sua morte;
(pausa)
E a Piedade,
Bebezinho nu com asas de vento,
que no ar cavalga alazões invisíveis,
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Denunciaria o horror aos olhos de todos,
Até que as lágrimas afogassem o vento.
Não tenho esporas para incitar meu intento se não as da ambição excessiva que
salta a si mesma para cair no peito do outro.
(Entra Lady Macbeth)
E então?
LADY MACBETH
Quase acabou de comer.
Por que você saiu da sala?
MACBETH
Perguntou por mim?
LADY MACBETH
Nem isso você intui?
MACBETH
Não vamos continuar com esta aventura.
Recebi dele honraria que me valoriza diante dos olhos de todos,
Devo aproveitar o brilho da roupa nova,
Não tão depressa jogá-la fora.
LADY MACBETH
Estava bêbada a esperança que te vestia?
Caiu no sono e agora acorda, pálida e verde,
Depois de aprontar livremente?
Daqui em diante julgarei teu amor.
Tens medo de ser, agir e valer, pelo que desejas ser?
Queres ter aquilo que estimas a coroa da vida,
Mas vives, covarde, deixando o "não ouso" cobrir o "eu quero",
Como o gatinho deixa de comer peixe
Pra não molhar as patinhas?
MACBETH
Paz é o que peço:
Ouso o que um homem pode ousar;
Quem mais ousa, homem não é.
LADY MACBETH
Foi então a Besta quem te fez revelar-me teu plano?
Quando ousavas agir, sim, eras homem;
Querer ser mais do que és fazia um homem de ti.
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Nada existia, tempo ou lugar; tu os criastes.
Aí estão eles, e te deprimes.
Amamentei, conheço a delícia
De amar filho ao peito:
Mas eu o arrancaria de mim,
Com gengivas sem dentes,
E lhe faria saltar os miolos,
Se tivesse me jurado como juraste.
MACBETH
Se falharmos?
LADY MACBETH
Falharmos! Se mantiveres tua coragem não falharemos.
Quando Duncan dormir
-Não irá demorar muito, o dia foi duro-
Darei tanto vinho a seus guardas
Que a memória deles, guarda do cérebro, vai virar fumaça;
Os vasos da razão serão mero alambique.
Quando dormirem como porcos, como mortos,
O que não poderemos fazer com o indefeso Duncan?
Impossível não incriminar aquelas esponjas -Eles vão arcar com a infâmia.
MACBETH
Não concebas senão filhos homens, tua alma intrépida só deveria produzir
machos.
Se os mancharmos de sangue,
e usarmos os seus punhais,
Quem duvidará que foram eles?
LADY MACBETH
Quem ousará discordar,
Ao ouvir nosso clamor e lamentos diante do morto?
MACBETH
Estou decidido;
Cada fibra do meu corpo está tesa
A cumprir o ato terrível.
Vamos! É preciso atuar a cena mais linda:
A falsa aparência esconda o que sabe o falso coração!
(saem. O coro canta a última frase. Um Kuroku fecha a cortina vermelha. O
outro anuncia o segundo ato. Podem entrar os atrasados. Vende velas, pipocas, e
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água. Aluga almofadas, anuncia que os desenhos das maldiçoes estão à venda,
ao final tratar com Bruxakohler. O Segundo ato está prestes a começar).
ATO II
BANQUO (Ao kuroku, que tem a Lua de pano pintada de Laura nas mãos, atrás
do pano da noite, e lhe fixa algumas estrelas).
Que horas são, filho?
KUROKU
A lua está baixa,
Mas ainda não ouvi o relógio.
BANQUO
E ela baixa à meia noite.
KUROKU
Talvez seja mais tarde.
BANQUO
Segura a minha espada:
Andam poupando velas no Céu,
As estrelas estão apagadas;
Segura isto também. Sinto um sono de chumbo e mesmo assim não durmo:
Que os anjos afastem de mim pensamentos malditos
A que a Natureza abre caminho durante o repouso.
(entra Macbeth)
Dá-me a espada!
Quem está aí?
MACBETH
Um amigo.
BANQUO
Senhor? Ainda não foi descansar? O Rei já se recolheu, após dia de diverso
deleite. Recompensou os teus serviçais. Presenteou a tua mulher com este
diamante, pela mais distinta das recepções. Deitou-se imensamente feliz.
MACBETH
Estávamos despreparados. A nossa vontade de recebê-lo deu liberdade ao defeito.
Teríamos feito muito melhor.
BANQUO
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Foi tudo bem. Ontem sonhei com as três harpias: Parece que te revelaram
alguma verdade.
MACBETH
Não penso mais nelas, mas podemos falar do assunto. Se tiveres tempo, claro.
BANQUO
Estou à disposição.
MACBETH
Quando ocorrer, se seguires o meu conselho, será em tua honra;
BANQUO
Desde que não a perca, por procurar aumentá-la; desde que mantenha aberto o
peito e limpa a lealdade.
MACBETH
Bom descanso, por ora.
BANQUO
Obrigado, para ti também. (Sai Banquo)
MACBETH (para Kuroku)
Diz pra tua senhora que toque o sino quando a minha bebida estiver pronta.
(O Kuroku move o rolo, passa uma chávena no rolo dos objetos.)
Vai deitar-te.
(Sai Kuroku. Olha para o rolo, vazio e mal-iluminado)
Será mesmo um punhal com o cabo na minha direção o que vejo à minha
frente? Vem, deixa-me agarrar-te: Te vejo mas não te seguro.
(Pega uma vela e mexe no rolo. Nada mais aparece.)
Alucinação fatal, tão sensível ao sentimento como à visão!
(Pausa.)
Será um Punhal mental, criação falsa nascida na opressão febril das têmporas?
(Pausa.)
Ainda te vejo, de forma tão palpável quanto este aqui na minha mão. Mostra o
caminho por onde eu já ia, e o instrumento que deveria usar. Ou os meus olhos
são joguetes dos outros sentidos ou valem mais que todos eles.
(Pausa.)
Continuo a ver-te; E na tua lâmina e cabo, vejo gotas de sangue que antes não
via. Não, isso não existe! É este ato maldito que te traz aos meus olhos. Agora,
quando em metade do Mundo a Natureza parece morta, e sonhos maléficos
controlam o pano do sono, a feitiçaria celebra as oferendas à pálida Hécate.
(O CORO SONÂMBULO balança-se e ulula com voz baixa; junta
DUNCANNILTON atrás do rolo do espaço, onde está desenhado o seu leito.
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MACBETH com uma das mãos, move o rolo do espaço até traze-lo para o seu
lado. Com a outra, prepara o punhal para o golpe. Caminha no lugar. Isto será
muitíssimo lento, quase imperceptível, de grande e sutil contenção
interpretativa dos atores. O público deve ouvir as duas respirações - ofegantes do
assassino e tranqüilas da futura vítima - durante as pausas.)
O lobo, sentinela de uivo ensaiado, anuncia o seco Assassino mover-se como um
fantasma, no passo furtivo do estuprador rumo ao seu alvo. Terra, segura e
firme, não ouças ou vejas por onde vão os meus passos! Temo tuas pedras
delatem meu caminho, e acabem com o horror presente do momento essencial.
(pausa. Ouve-se as respirações.)
Enquanto eu ameaço, ele vive: as palavras esfriam o calor das ações.
(toca o sino)
Vou, e está feito. O sino me chama. Não o ouças, Rei, é um mau presságio que te
intima ao Céu ou ao Inferno.
(O Rei continua a dormir serenamente. A cena deve continuar nesse clima, a
tensão está nele. MACBETH distancia-se, continuamos a perceber-lhe a
respiração ofegante. Entra LADY MACBETH; põe-se no lugar de MACBETH,
ao lado do rolo dos objetos.)
LADY MACBETH
O que os deixa bêbados me deixa valente.
O que os apaga me ateia fogo.
Escuta! foi a coruja que gritou,
Não é nada, só o toque que dá o pior boa-noite.
Ele vai fazer,
As portas estão abertas:
Os guardas desprezam seu posto roncando.
Droguei tanto as bebidas, que a Morte e a Natureza discutem se vão viver ou
morrer.
(volta Macbeth. O CORO continua com as respiração).
MACBETH
Quem está aí?
Oi!
LADY MACBETH
Que não acordem sem nada ter sido feito.
Tentar e não consumar será o nosso fim.
Deixei ali os punhais, ele não pode não vê-los.
Eu mesma o faria, se não parecesse tanto o meu pai quando dorme.
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(Duncannilton é esfaqueado. Muda a respiração. Grita surdamente e despede-se
de seu papel. Desveste-se da coroa. Vai até o projetor de BRUXAKÖHLER e,
despojadamente, pinta os dois punhais e as mãos de Macbeth de vermelho. Vai
sentar-se ao fundo da platéia, perto da saída. Acende um cigarro, reza, toma um
copo d’água, ou qualquer ação corriqueira da pessoa que é. Deixa de existir
como ator no palco. A pessoa Nilton voltará somente para assombrar os atores.
Começará a fazer parte de um futuro CORO MORTO, onde não há personagens,
somente o texto e a função das mesmas, mas com a figura do ator. Se puderem
gravitar em torno da JOVEM AUGUSTA, que todos conhecemos, com menos de
50 anos de teatro, melhor. Ela estará a se preparar para entrar como Hécate,
com o rosto branco da Lua, em meio às cordas e balanços. A composição do
CORO MORTO é exatamente a mesma do CORO SONÂMBULO: a diferença é
o ‘ESTADO CÊNICO’ de quem ivi participa. Isto tem muito a ver com Tadeusz
Kantor: como roubei-lhe a técnica dos figurinos e composições, será bom para
nós restituir-lhe com uma homenagem. )
MACBETH (continua a récita)
Fiz.
Não ouviste um barulho?
LADY MACBETH
Ouvi arrulhos de coruja e os grilos.
Falaste alguma coisa?
MACBETH
Quando?
LADY MACBETH
Agora.
MACBETH
Vindo pra cá?
LADY MACBETH
Sim!
MACBETH
Escuta...quem dorme no segundo quarto?
LADY MACBETH
Donalbain.
MACBETH (olha as mãos)
...Que visão horrorosa.
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LADY MACBETH
Mal sinal, dizer ‘visão horrorosa’.
MACBETH
Um riu dormindo, outro gritou ‘assassino’,
E se acordaram um ao outro: fiquei parado e escutei.
Rezaram e voltaram a dormir.
Um gritou “Valha-me Deus”, o outro “Amem”.
Enquanto me viam com estas mãos de carrasco:
Eu ouvia seus medos, e não consegui responder
“Amém” quando eles disseram “que Deus nos proteja”.
(A JOVEM AUGUSTA pendura dois desenhos dos assassinados em seus
balances)
LADY MACBETH
Não pense mais tão fundo.
MACBETH
Mas por que não consegui dizer ‘Amém’?
Quando mais precisava de proteção, um ‘Amém’congelou-me a garganta.
LADYMACBETH
Repensadas assim, ações como essas trazem loucura.
MACBETH
Pensei ouvir uma voz dizendo,
‘Dormir, nunca mais’.
Macbeth assassinou o sono,
O sono inocente,
O sono que enlaça
O embaraçado novelo de preocupações,
A morte em cada dia de vida,
O banho após o trabalho árduo,
O bálsamo de mentes feridas,
Prato principal da Mãe Natureza,
Nutriente primeiro da festa da Vida.
LADY MACBETH
Que queres dizer?
MACBETH
Continuava a gritar pela casa toda.
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O CORO SONÂMBULO (Passeia pelo palco e grita em desordem”Dormir nunca
mais”. Depois, em ordem, sussurra a lógica terrível.)
Glamis assassinou o sono,
Por isso,
Cawdor jamais dormirá,
Por isso,
Macbeth jamais dormirá.
LADY MACBETH
Quem foi que disse isso? Por que curvas a tua força com uma mente tão
fraca?Vai beber um pouco d’água, tira essa prova suja da tua mão. Por que
trouxe pra cá os punhais? Devem ficar lá, leva-os de volta espalha sangue nos
guardas adormecidos.
MACBETH
Não vou continuar. Tenho medo de pensar no que fiz. Não me atrevo a olhar
aquilo de novo.
LADY MACBETH
Molenga, dá cá os punhais. Devem parecer culpados.
Adormecidos e mortos não passam de imagens.
São os olhos da infância que temem o demônio pintado.
(Sai. JOVEM AUGUSTA gruda as figuras das guardas assassinadas no rolo das
personagens. Ouve-se o CORO bater)
MACBETH
De onde vem este barulho? O que se passa comigo, que qualquer som me
horroriza? Que mãos são estas? Hah! Arrancam-me os olhos. Podem todas as
águas do mundo lavar este sangue das minhas mãos? Não, minhas mãos
tingirão de vermelho o verde de todos os mares.
(Nilton pinta de vermelho as mãos de Lady Macbeth)
LADY MACBETH (de perto da porta)
As minhas mãos tomaram a cor das tuas; Mas tenho vergonha de ter o coração
tão alvo. (Ouve-se o CORO bater.) Alguém bate, vamos pro nosso quarto. Um
pouco de água nos limpará desta ação. Não foi fácil? (O CORO bate.) Escuta,
batem de novo. Veste o pijama, para que a ocasião não nos mostre acordados. E
não fica perdido nos teus pensamentos.
(O CORO bate fortemente)
MACBETH
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Muito melhor não saber quem eu sou que saber o que fiz. Quem me dera
pudessem acordar o Rei com essa batidas.
(sai.)
KUROKASTRO (de trás da coxia preta)
Isso é que eu chamo de bater. Se a gente fosse os Porteiros do Inferno, não
trancava mais nada. (O CORO bate de novo) Bate, bate, bate. Quem é que está aí,
em nome do Maligno? Taí um bóia-fria que se enforcou achando que aqui se
ganhava melhor. Espero que tenha trazido mais pano, que aqui vai suar pelo
que fez. (batem) Batem, batem. Quem está aí, em nome do outro Demônio? A Fé
aqui é enganadora e pode jurar nos dois pratos da balança, contra qualquer um
deles. (batem) Batem, batem, batem. Quem está aí? (batem) Batem, batem.
MACDUFF
Foi dormir tão tarde, amigo, a ponto de acordar só agora?
KUROKASTRO
Na verdade senhor, festejamos até o galo cantar:
E a bebida, senhor, provoca três coisas.
MACDUFF
Quais são?
Kurokalex
Nariz vermelho, sono e mijo, senhor. Quanto ao tesão, é atiçado ou não. Atiça o
desejo e broxa o corpo. Convence e desanima. Faz ficar duro antes pra murchar
na hora. Engana e abandona, oferecendo a mentira.
MACDUFF
Então ontem te ofereceram a mentira.
Kurokalex
Ainda sinto isso na garganta, mas consigo segurar.
(entra Macbeth)
MACDUFF
Quem não acordou com esse barulho?
Bom dia.
O Rei está acordado?
MACBETH
Ainda não.
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MACDUFF
Ele ordenou-me que o chamasse cedo. Quase deixei passar a hora.
MACBETH
Eu te levo até ele.
MACDUFF
Sei que o faz com gosto, mas não deixa de ser um incomodo para o senhor.
MACBETH
O trabalho que nos dá prazer alivia a dor.
KUROKASTRO (Move o rolo do espaço e aparece a porta do quarto)
É esta a porta.
MACDUFF
Vou acordá-lo; é esse o meu serviço exclusivo.
(sai. O rolo do espaço vai ao salão do castelo)
kurokastro
O Rei está de partida, hoje?
MACBETH
Está. Ele disse que sim.
KUROKASTRO
Foi uma noite tremenda. O vento derrubou chaminés, ouviram-se lamentos no
ar, estranhos gritos de morte. E profecias terríveis de incêndios e confusão,
amamentados por nossa época horrível. O pássaro do inferno gritou a noite toda.
Alguns dizem, que a terra teve febre e que chegou a tremer. (isto é sugestão do
coro).
(entra MACDUFF)
GATTMACDUFF
Horror... horror, horror que língua e coração não podem contar.
MACBETH
O que foi?
GATT-MACDUFF
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A confusão acabou de assinar a sua obra-prima: o assassínio mais sacrílego
arrombou o Templo eleito do Senhor e roubou a vida do seu santuário.
MACBETH
Que vida?
GATT-MACDUFF
Venham até ao quarto, e destruam a vossa visão, não me obriguem a falar:
Vejam e depois falem vocês mesmos.
O CORO SONÂMBULO (Mexe nos rolos, todos vermelhos)
Acordem, acordem, toquem o sino de alarme: Assassínio e Traição!
GATT-MACDUFF (procura e grita no meio do CORO, que faz o barulho do
caos)
Banquo, Donalbain, Malcolm, acordem! Livrem-se do sono, simulacro da Morte,
e olhem a própria Morte. Levantem, levantem e vejam a grande imagem do
Juízo Final. Malcolm, Banquo, saiam das sepulturas, caminhem como fantasmas,
para presenciar este horror.
Toquem o sino.
(Toca o sino, entra Lady Macbeth)
LADY MACBETH
O que é que se passa? Porque é que esse sino terrível convoca os que dormem na
casa?
Fala, fala!
GATT-MACDUFF
O que tenho para dizer não serve à escuta,
Sua repetição aos ouvidos, de tão terrível, mataria a senhora.
(A Banquo)
Banquo, Banquo.
O nosso Rei foi assassinado.
LADY MACBETH
Ahhhhhh! O quê, aqui nesta Casa?
BANQUO
Cruel demais em qualquer lugar.
Caro Duff, contradiz a ti mesmo, diz que não é verdade.
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(Entram Macbeth, Lennox e Ross)
MACBETH
Estivesse eu morto uma hora antes, teria vivido uma vida abençoada. A partir
deste instante, nada mais é serio na vida mortal;
Tudo não passa de uma brincadeira.
A Reputação e a Honra estão mortas,
O vinho da Vida esgotou-se.
Só do lixo não se pode queixar.
(Kurokus movem o rolo dos objetos: desenhados Malcolm e Donalbain, atrás de
fundo vermelho).
MACBETH
A origem, a nascente, a fonte de vosso sangue foi estancada.
BANQUO (Aos olhos do Rei, presumivelmente fora de cena,mas olhando na
direção de NILTON, que deverá interpretar MALCOM)
O Rei foi assassinado, ao que parece, por sua guarda de quarto. Suas mãos e seus
rostos estavam manchados de sangue além dos punhais, fora do coltre. Estavam
assustados e confusos; nenhuma vida humana lhes devia ter sido confiada.
MACBETH
Ainda assim, arrependo-me da fúria que me levou a matá-los.
BANQUO
Por que fizeste isso?
MACBETH
Quem consegue ser sábio, surpreso, temperado, furioso, leal e neutro ao mesmo
tempo?
Ninguém! O ímpeto do amor violento ultrapassou a Razão. (Reconstitui a cena,
verificarei de auxiliados pelas cores dos rolos e da pintura) Aqui jaz o Rei, a sua
pele prateada, laqueada de sangue dourado. Os profundos golpes das
punhaladas são brecha na Natureza para a devastadora entrada da Ruína. Ali, os
assassinos, impregnados nas cores dos da sua laia, com seus punhais
embrulhados no sangue coagulado.
(Pausa)
Quem poderia frear tendo um coração para amar,
E, nesse coração,
Coragem para declarar o seu amor?
BANQUO
Cuidem da senhora:
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E quando tivermos cobertas as nossas fragilidades, vamos investigar esta obra
sangrenta, para conhecermos um pouco mais. Medo e escrúpulo nos abalam:
das mãos de Deus partamos contra as ocultas pretensões desse demônio
traiçoeiro.
MACBETH
Vamos nos vestir e encontrar, depois, no Salão.
O CORO
Todos nós.
(Vestem suas armaduras do lado.)
BANQUO (No fundo da cena)
O que fazer? Mostrar mágoa fingida é uma profissão fácil aos homens falsos.
Aqui há punhais nos sorrisos dos homens. A flecha assassina lançada ainda sibila
no ar. O mirante melhor está longe do alvo.
( Fecha-se o pano vermelho. Meia Luz).
VELHO DOBAL, tomando um café, atrás das coxias pretas.
Com a minha idade, vi horas horrendas e coisas estranhas: mas nada como esta
noite.
JOVEM AUGUSTA, maquiando-se para a Hécate.
Ah, meu velho, está tudo estranho...pelo relógio já é dia, mas a noite estrangula
aqueles rolos; é noite mesmo, ou é dia envergonhado ? A escuridão trava este
palco, enquanto a luz a devia beijar.
VELHO DOBAL
É contra a Natureza, como o ato que foi cometido.
(Pausa)
...Ontem na Praça, um falcão foi morto por uma coruja, caçadora de ratos.
JOVEM AUGUSTA
E os cavalos dos guardas têm ficado selvagens. Quebraram as amarras,
combatendo a obediência devida, como se declarassem guerra à cidade.
VELHO DOBAL
Comeram uns aos outros.
JOVEM AUGUSTA
Eu vi tudo.
(Abre-se a cortina vermelha: Macduff)
32
Como vai o mundo agora, senhor?
Já se sabe quem cometeu o crime de sangue?
MUCDUFF
Aqueles que Macbeth matou.
JOVEM AUGUSTA
Que ganham eles com isso?
MACDUFF
Foram subornados: Malcolm e Donalbain, os dois filhos do Rei, fugiram, cai
sobre eles a suspeita do ato.
JOVEM AUGUSTA
Contra a Natureza, uma vez mais. Ambição que seca a própria fonte de vida. O
mais natural é que a coroa seja de Macbeth.
MACDUFF
Já partiu para Scone para ser investido.
JOVEM AUGUSTA
Vai pra lá?
MACDUFF
Não. Vou para Fife.
JOVEM AUGUSTA
Eu vou para lá.
MACDUFF
Boa sorte, adieu e que as nossas roupas velhas não sirvam melhor que as novas.
JOVEM AUGUSTA
(para o velho Dobal)
Adeus, senhor
VELHODOBAL
Que a benção acompanhe aqueles que fazem bem do mal, e amigos dos
inimigos.
O pano vermelho se fecha. Venda de água e pipocas. Aviso de quanto falta para
terminar. Voltarão depois Hécate e BRUXADOBAL como personagens
Diante do nosso pequeníssimo proscênio.
33
BANQUO
Glamis, Cawdor, Rei: você conseguiu. Tudo como as harpias prometeram, e eu
temo que tenhas jogado muito sujo para o conseguir: No entanto, foi dito que a
Coroa não seria tua pra sempre, e eu vou ser a raiz e o pai de muitos Reis. Se elas
disseram a verdade, como a disseram ti, Macbeth, não poderão elas também ser
meus oráculos, e fundar em mim a esperança?
Mas silêncio. Aí vem ele!
(toca o sino. Abre-se a cortina.)
(entram Macbeth como Rei, Lady Macbeth, e outros do CORO – na verdade, A
JOVEM GUTA, NILTON, GATT-ROSS, que, aos poucos transformaram-se num
CORO DE MORTOS. Quem morre assassinado vai fazer parte deles, ao
desmaquilar-se ou deixar as personagens)
MACBETH
Eis o nosso principal convidado.
LADY MACBETH
Se ele tivesse sido esquecido, teria havido uma grande lacuna na nossa festa, e
tudo o mais seria de mal gosto.
MACBETH
Esta noite oferecemos uma ceia solene, senhor, faço questão da sua presença.
BANQUO
Que Sua Alteza me dê as ordens a que o meu dever está indissoluvelmente
ligado.
MACBETH
Partirá a cavalo, esta tarde?
BANQUO
Sim, meu bom senhor.
MACBETH
Desejo a s, que contínua opinião que continuo a considerar séria e próspera
No Conselho que hoje se reúne. Mas faremos isso amanhã. A cavalgada, é para
longe?
BANQUO
Tão longe, meu senhor, quanto o tempo entre esta ceia e o jantar. Se o meu
cavalo não agüenta o ritmo,tomarei à noite uma ou duas horas emprestadas
MACBETH
34
Não faltes à nossa festa.
BANQUO
Não faltarei, meu Rei.
MACBETH
Ouvimos dizer que os nossos primos sanguinários se refugiaram, um na
Inglaterra e outro na Irlanda, não confessaram o cruel parricídio, e enchem os
ouvidos de quem os escuta com estranhas invenções. Mas sobre isso falaremos
amanhã, em que também trataremos de negócios de Estado. Vai montar teu
cavalo: Adieu, até logo à noite.
O Fleance acompanha-te?
BANQUO
Sim, meu bom senhor, está na hora.
MACBETH
Desejo que os vossos cavalos sejam ligeiros e de cascos seguros. Adeus.
(sai Banquo)
Cada um seja senhor do próprio tempo até ás sete da tarde, quando daremos as
boas vindas à sociedade. Ficarei recolhido até a hora do jantar.
(Fecha-se a cortina vermelha. No proscêncio, Macbeth e um KUROKUS)
Aquele homem me aguarda?
KUROKUS
Aguardam sim, meu senhor, do lado de fora do Palácio.
MACBETH
Traga-o para dentro.
Ser Rei não é nada, mas continuar a ser rei com segurança... Meus receios
cravam profundamente em Banquo. Na sua nobre Natureza reina o que mais
tenho medo. Pelo tanto que ousa e pelo seu espírito destemido, possui uma
sabedoria que lhe guia o valor e que o faz agir com cautela. Não há ninguém
senão ele que eu tema mais, sendo eu Rei; meu Gênio é censurado pelo dele,
qual Marco António por César.
Reprovou as harpias quando elas me chamaram Rei, obrigou-as a falar com ele.
E elas profeticamente o abençoaram pai de uma dinastia. Em minha cabeça
colocaram uma coroa infrutífera, em minha mão um cetro estéril, a que meus
filhos não herdarão.
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Tudo me será arrancado por outra estirpe. Se for assim, foi por Banquo que perdi
a cabeça, foi pelos filhos dele que matei um grande Rei, foi apenas por eles que
enchi de rancor a barca da minha paz. Reis, das sementes de BANQUO. Reis.
Não! Destino, desce ao combate; desafia-me até ao final.
(O KUROKU, atrás da cortina vermelha, diáfana, gruda a figura do matador no
rolo das personagens) É o prisioneiro?
KUROKU
Sim, meu senhor.
MACBETH
Agora fica na porta até te chamar!
(Indi toma uma vela e vai até as figuras. A luz deve vir de trás, o que vemos
serão silouettes da cena, KUROKU em primeiro plano)
Saiba que foi ele que te atirou nessa condição miserável. Você foi manipulado,
enganado, delatado e tudo o mais que se possa dizer e fazer. Até uma meia-alma
ou uma mente insana sabe, foi BANQUO o culpado.A paciência é tão parte do
teu caráter pra deixar isso passar? Serás assim tão cristão a ponto de rezar pelo
homem cuja pesada mão quase te curvou até à sepultura e tornou os teus filhos
também miseráveis para sempre?
(pausa)
Perdigueiros, galgos, spaniels, pastores, bastardos: todos são cães. Mas a classe
distingue o veloz, o lento, o cão-de-guarda, o caçador, cada um de acordo com o
dom que a Natureza lhe concedeu. Recebem uma nota, que os distingue uns dos
outros.
(pausa)
Os homens são a mesma coisa. Se tu, matador de profissão, tiveres uma posição
nesta classificação, que não esteja abaixo do nível do humano. Se eu puser –te à
prova nesta tarefa cuja execução aniquila o teu inimigo, que a morte seja
perfeita. Ela te agarra ao meu coração e a mim, que tenho que cuidar de estar
vivo.
(pausa)
Tu és fustigado pelas desgraças e vitima da tua nascença. Concede à tua vida
esta chance de remendá-la. Ou livra-te dela para sempre. BANQUO é inimigo
comum. Cada minuto a mais na sua vida é um golpe na nossa. E embora eu
pudesse, de forma nua e crua, fazê-lo desaparecer deste Mundo apenas com o
aval da minha vontade, não o faço pelo bem de certos amigos, meus e dele, cujo
amor não devo perder. Preciso da vossa ajuda escondendo isso do olhar público.
Deve ser feito esta noite, a certa distância do Palácio: devo ficar livre de suspeita.
(Pausa)
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E para que não haja embaraço ou suspeitas: Com ele está Fleance, seu filho, cujo
sumiço me é tão vital quanto o do pai, devendo por isso abraçar o mesmo
destino nessa hora negra. Banquo, se o vôo da tua alma deve findar no Céu, será
nesta noite.
(Sai. Abre-se o pano vermelho. Sala do Castelo.)
LADY MACBETH
Nada se ganha e tudo se perde quando se alcança o desejo sem prazer: É melhor
ser o alvo da destruição, do que pela destruição vivermos numa alegria dúbia.
(entra Macbeth)
Mas então, porque ficas sozinho? Fazendo de fantasias horríveis tuas
companheiras, tendo pensamentos que deviam ter morrido com quem morreu.
O que não tem remédio, não te deve mais dizer respeito. O que está feito, está
feito.
MACBETH
Ferimos a cobra, mas não a matamos. A ferida vai fechar e a cobra vai voltar,
enquanto a nossa pobre malícia continua à mercê dos seus dentes.
Deixemos que a moldura das coisas se dissolva, sofrem ambos os mundos; Aqui
fazemos nossa refeição com medo, dormimos na angustia dos sonhos terríveis
que as noites nos vibram. Estão melhores os mortos a quem mandamos para
ganhar a paz que nós vivos, no êxtase do suplicio da mente. Duncan dorme bem
na sua tumba, depois do delírio da febre vital. A traição já lhe fez o pior: nada,
nem aço, nem veneno, nem intriga, nem extorção, o pode mais atingir.
LADY MACBETH
Acalma-te, vamos, suaviza essa aparência enrugada. Esta noite, seja alegre e
jovial com os convidados.
MACBETH
Assim serei, amor, e peço que o sejas também. Lembra-te de BANQUO, dá-lhe
atenção com o olhar e a palavra. Neste presente inseguro, deixemos a limpidez
da nossa honra na corrente da bajulação. Vamos usar os nossos rostos como
máscaras dos nossos corações. Vamos esconder o que somos.
LADY MACBETH
Pare com isso.
MACBETH
Escorpiões transbordam a minha mente: BANQUO e Fleance estão vivos.
LADY MACBETH
Mas sobre eles, não há a eterna proteção da Natureza.
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MACBETH
Sim , eles podem ser atacados e tu ficarás alegre. Antes que o morcego faça o
último vôo da noite, antes que Hécate se recolha com seus besouros, vai haver
uma ação terrível.
LADY MACBETH
O que?
MACBETH
Vem, noite selada,
Venda o terno olhar tímido do Dia.
Com a tua mão sangrenta e invisível,
Cancela e destrói essa amarra que me empalidece.
A luz fica espessa,
O corvo regressa ao bosque,
As coisas boas do Dia
Começam a adormecer
Enquanto a negra Noite se levanta em busca de presas.
Fica inocente e mantêm-te em silêncio. Quando ações maléficas se iniciam,
tornam-se cada vez mais fortes por sua própria maldade. Peço-te que venhas
comigo.
Sai. Os KUROKUS têm as falas dos assassino, com as sombras projetas na
cortina, diáfana).
KUROKASTRO-ASSASSINO
Saiu da cana? Quem te soltou?
KUROKALEX-ASSASSINO
Macbeth. Mandou te ajudar. Nós não tem que desconfiar dele, ta tudo
programado. Já tá no fim do dia, quem tá atrasado acelera pra ganhar tempo.
Escuta! Cavalos! Apaga a tocha!
(Apagam a vela que os iluminava mal.)
BANQUO (de dentro)
Ah, os servos do Palácio. Alguém de vocês nos dê luz.
KUROKASTRO-ASSASSINO
É ele: sempre vai andando daqui até o Palácio.
(Entra BANQUO e FLEANCE- ator ALVISE)
KUROKASTRO-ASSASSINO
38
Se liga.
BANQUO
Vai chover, esta noite.
KUROKALEX- ASSASSINO
Tomara que chova...(esfaqueia) Apaga o outro, apaga!
BANQUO
Ah!, traição! Voa, filho! Foge e me vinga!
KUROKALEX ASSASSINO
Acende a luz, rápido!
KUROKASTRO-ASSASSINO (Confuso)
Mas não era para apagar?
(A luz se acende: a silhueta de BANQUO morto está grudada no rolo das
personagens. A partir de agora, ALVISE será o fantasma de BANQUO em meio
ao CORO MORTO – basta uma passada de maquilagem branca e, ao remover a
mesma, seu filho, FLEANCE. É um jogo de signos importante e deve ser bem
preciso. Todos esses mortos deverão ter um pequeno equipamento de
maquilagem para isso. A simplicidade deles é a eficácia da precisão desejada.
Um paninho, uma cor e um removedor bastam.)
KUROKALEX ASSASSINO
Aqui só tem um. O pivete vazou.
KUROKASTRO ASSASSINO
O filé mignon. Vamos cair fora.
(Black out)
MACBETH (de costas, falando como se a corte estivesse em outro aposento. O
rolo do espaço mostra a porta de entrada de seu salão real. Macbeth abriu a
cortina pela metade.)
Minhas calorosas boas vindas. Sirvam-se à vontade, já venho beber com vocês.
(Aparece um kurokastro na metade do palco descoberta)
Sangue na cara.
KUROKASTRO-ASSASSINO
Sangue de Banquo.
MACBETH
39
Melhor na tua cara que dentro dele. Foi eliminado?
KUROKASTRO-ASSASSINO
Já era.
MACBETH
Fleance?
KUROKASTRO-ASSASSINO
Vazou.
MACBETH
Esse é o meu pior medo. Teria sido perfeito como o mármore, sólido como uma
rocha, vasto e essencial como o ar. Ainda estou confinado, preso por dúvida e
medo. Com Banquo, morreu a velha serpente. O filho vai criar veneno, mas
ainda não tem dentes. Amanhã falamos de novo.
(Sai KUROKASTRO-ASSASSINO, entra LADY MACBETH)
LADY MACBETH
Abandonaste os teus convidados: para comer assim, podiam ficar em casa.
Cortesia é tempero, sem ela tudo fica insípido.
(Entra o fantasma de BANQUO – ALVISE, que, a exemplo de Nilton, remove a
sua maquilagem).
MACBETH
Bem lembrado.
(Vai até a metade da cortina, na porta, e diz a seus convidados)
Que a boa digestão sirva o apetite e a saúde sirva ambos. Aqui estaria completa
a nossa nobreza, se Banquo estivesse presente. Prefiro supor indelicadeza a
lamentar um seu infortúnio.
(Pausa. Grita, transtornado)
Quem fez isso? O chão está encharcado de sangue.
LADY MACBETH (De fora, entre o meio da festa, apostada na metade da
cortina)
Sentem-se, nobres amigos, o Rei fica assim desde a juventude. O ataque é
passageiro, estará bem num instante. Se repararem demais, vão ofendê-lo e
causar mal estar.
(Entra e diz a macbeth) Estás louco?
MACBETH
Sim, a ponto de me atrever a olhar ao que horroriza o Demônio.
40
LADY MACBETH (Agarra-se à cortina).
Que absurdo! Isso é como aquele punhal vagando no ar que dizes te conduziu ao
Rei. Esses ataques, impostores do medo bem podiam virar a história de uma
mulher à lareira no inverno com o consentimento da avó. Que vergonha! Por
que essas caras? Aquilo não passa de uma cadeira vazia.
MACBETH
Olha.
(ALVISE vai para trás da cortina)
Olha!
(Ao fantasma) Se consegues acenar com a cabeça, fala também!
(Desesperado, para LADY MACBETH) Se os cemitérios e as sepulturas nos
devolvem quem enterramos, os nossos monumentos virarão estômago de
abutre.
(ALVISE/FANTASMA de BANQUO volta a seu lugar no proscênio. Este jogo
deverá ser empregado várias vezes nas alucinações de que MACBETH é vítima;
trata-se de três ou quatro passos, atrás e dentro da cortina, ou atrás e não da
LADY).
LADY MACBETH
Que loucura! Que vergonha!
MACBETH (Perigosamente louco, à sua corte)
Aqui foi derramado sangue, há crimes terríveis demais para serem contados. Já
foi o tempo em que o homem morria quando simplesmente lhe cortavam a
cabeça. Agora, levantam-se de novo e sentam naquela cadeira vazia.
(Pausa)
Não se espantem comigo meus amigos, é só uma doença de nada. Amor e saúde
para todos!
(Olha para a Lady, que mostra sinais de alívio).
Brindo à alegria geral de toda a mesa, e ao nosso querido amigo Banquo, de
quem sentimos falta. Estivesse ele aqui... A todos e a ele brindamos. De todos a
todos.
(Pausa. ALVISE faz o seu jogo de entra e sai da festa e de suas alucinações. Três
passos, para trás da cortina ed è bella che fatta!)
Sai da minha vista, carniça! Que a terra te cubra. Os teus ossos estão secos, o teu
sangue está frio. Expirou a vida desse olhar que me lanças.
LADY MACBETH
Meus amigos, levem isso como um costume seu. Não lhes prestem atenção.
41
MACBETH
Fora, sombra horrível, fora!
(ALVISE volta ao proscênio).
Volto a ser um homem quando essa coisa vai embora. Por favor, continuem
sentados.
LADY MACBETH
Destruiste a alegria do banquete com a mais surpreendente desordem.
MACBETH
Poderão as coisas nos possuírem como nuvens passageiras sem nos deixarem
completamente loucos? Duvido de minha capacidade quando te vejo suportar
isso mantendo o tom natural da tua face. A minha empalidece de medo.
(Pausa)
Boa noite! Não esperem, saiam já.
LADY MACBETH
Muito boa noite para todos!
MACBETH
Sangue vai gerar sangue: sabe-se de pedras que se moveram e de árvores que
falaram. (Olha para os rolos e os KUROKUS) Que horas são?
LADY MACBETH (Confusa)
Quase de manhã.
Não se sabe se é noite, se dia.
(Os KUROKUS ficam confusos).
MACBETH
O que dizes de MACDUFF valorizar-se com sua ausência ao nosso banquete?
Vou mandar-lhe um sinal. Não há quem não tenha em casa criado pago por
mim.
(pausa).
Amanhã bem cedinho, vou visitar as minhas irmãs harpias. Elas devem saber
mais sobre isso. E eu quero saber sobre tudo, seja o que seja. Vadeio tão fundo
neste rio de sangue que voltar seria bem pior que atravessar. Tenho tantas vozes
na cabeça que devo interpretar sem conhecer o papel.
LADY MACBETH
Falta-te o maior remédio de todos: o sono.
MACBETH
42
Vem, vamos dormir. Vertigem e insônia é medo de principiante; este duro
trabalho requer mais prática.
(HÉCATE, que terminou de maquilar-se, entra, acompanhada de ALVISE e
NILTON. Vai fixar a sua imagem no rolo do tempo.)
BRUXADOBAL
Então, Hécate? Estás zangada?
HÉCATE
E não era pra estar, suas megeras?
Insolentes, descaradas! como se atrevem a negociar com Macbeth enigmas e
assuntos da morte, enquanto eu, dona do vosso poder e inventora do Mal, nem
fui chamada para interpretar o meu papel e mostrar a glória da nossa arte? Pior
que isso, tudo o que fizeram foi por um sujeito caprichoso, malicioso e rancoroso
que (como outros) ama apenas por seus interesses. Consertem isso! Desapareçam
e encontrem-se comigo no abismo do Inferno pela manhã. Ele lá estará para
saber o seu destino. Arrumem caldeirões, feitiços, e tudo o mais. Eu irei pelo ar.
Passarei esta noite a tecer um fim funesto e fatal. Uma grande obra será feita
esta noite. Sob o canto da Lua estão penduradas gotas vaporosas. Vou apanhá-las
antes que cheguem ao solo, e destilá-las com despachos; evocarão os espíritos
que o fazem mergulhar iludido na confusão. Ele desprezará o destino,
desdenhará a morte, e lançará sua ambição bem acima da sabedoria, da virtude
e do medo. Vocês sabem como a confiança é o maior inimigo do homem.
Me chamam. Vejam o meu espírito, sentado numa nuvem cerrada, aguardando
por mim.
(Ela gruda a Lua no rolo e vai ao proscênio. O VELHO DOBAL fecha o pano de
boca).
A JOVEM GUTA, desmaquiando-se.
O Rei foi chorado por Macbeth: feliz estava ele com a sua morte. Dizem que
Fleance matou o correto e valente Banquo, porque fugiu. Quem poderá não
pensar, o quão monstruoso foi para Malcolm ou para Donalbain matar o seu
pai? Ato hediondo, como isso desgostou Macbeth! Não é que imediatamente e
em pura raiva, dilacerou os dois delinquentes, escravos da bebida e do sono?
Nobre ação...Sim, e muito sensata também: pois teria enraivecido qualquer
coração vivo.
(Pausa)
Isto afirmo: que ele planejou tudo muito, e penso que tivesse ele os filhos de
Duncan ao seu alcance - Queiram os Céus, nunca terá! - eles descobririam, como
Fleance, o que seria o destino da morte.
E por não ter comparecido à festa do tirano, sei que Macduff caiu em desgraça.
Onde ele está?
43
O VELHO DOBAL
O filho do Rei (de quem o tirano retém o que lhe é de direito) vive na Corte
Inglesa, recebido pelo Rei Eduardo. Pará lá foi Macduff, pedir-lhe auxílio para
acordar Northumberland e o guerreiro Siward, para que possa libertar as nossas
festas de punhais sangrentos. Isso exasperou Macbeth de tal forma que ele se
prepara para a guerra.
A JOVEM AUGUSTA
Mandou chamar Macduff?
O VELHO DOBAL
Mandou. E com um absoluto “Senhor, eu não vou”, o mensageiro virou as costas.
A JOVEM AUGUSTA
Que um Anjo voe até à Corte de Inglaterra, que um vento abençoado possa
retornar ao nosso país, que sofre sob uma mão amaldiçoada.
O VELHO DOBAL
Enviarei minhas orações para ele.
(Entram os Kurokus para vender mais pipoca)
A cena das bruxas
BRUXA BORGHI (Lendo a receita no pergaminho)
Peçonhentas entranhas , sapo achatado em pedra bem fria, por trinta e uma
noites suando veneno. Filé de cobra morta, olho de salamandra e dedo de sapo,
pêlo de morcego, língua de cão, língua de víbora, picada de cobra, perna de
lagarto, asa de coruja.
BRUXA DOBAL (Corrige)
Não.
Escama de dragão, dente de lobo, múmia de bruxa, goela do bobo, bucho de
tubarão do mar fossa, raiz de cicuta arrancada do breu, fígado de blasfemo
judeu, nariz de turco, beiço de mongol, dedinho de recém nascido estrangulado
eogado no fosso por puta cruel rameira.
Engrossar o caldo até uma gosma grudenta e esfriar com sangue de macaco.
HÉCATE
Espíritos encarnados e cinzentos, venham todos os que puderem.
44
BRUXADOBAL
Pela coceira do meu polegar, algum sem-vergonha está para chegar.
[entra MACBETH]
MACBETH
Bruxas nojentas, filhas do demônio; vos esconjuro, pelo negro ofício que
professam, digam o que sabem. Ainda que desatem os ventos em furacões,
respondam o que vou perguntar.
BRUXA BORGHI
Fala.
BRUXADOBAL
Pergunta.
BRUXA BORGHI (Aponta BRUXAKOHLER, que desenha.)
Ele sabe o que pensas.
Ouve sem nada dizer.
BRUXA DOBAL (em transe lê o desenho)
Macbeth, Macbeth, Macbeth!
Toma cuidado com Macduff,
Chega; é o bastante.
MACBETH
Na verdade, isso no fundo eu já temia. Mais uma palavra...
BRUXA BORGHI
Ele não dá consultoria!. Isso aqui não é escritório.
(soluços de BRUXADOBAL)
Macbeth, Macbeth, Macbeth!
Seja sempre sanguinário, violento, resoluto.
Ria da força do homem, pois homem nascido de mulher jamais fará mal a
Macbeth.
MACBETH
Então, Macduff poderá viver. Mas... quero segurança em dobro, e garantia do
destino. Não ficarás vivo.
BRUXA BORGHI
Escuta calado.
(Soluço. Transe. Lê)
45
Investe-te da força do leão. Seja orgulhoso, sem se importar com rebeldia nem
conspirações. Macbeth não será vencido enquanto o grande bosque de Birnam
não vier atacá-lo em Dunsinane.
MACBETH
Isso jamais acontecerá! Quem poderia comandar uma floresta e fazê-la sair do
lugar? Ótimo presságio! Fantástico! Feitos rebeldes, não ousem me ameaçar
enquanto o bosque de Birnam não vier me atacar. Até lá, o grande Macbeth há
de ser senhor, chegando ao fim de seus dias como a natureza determina.
Incomoda-me, porém, uma dúvida: Digam-me se os descendentes de Banquo
chegarão um dia ao trono deste reino?
BRUXA BORGHI
Não perguntes mais.
MACBETH
Não; é preciso que eu saiba. Se não me revelarem isto, que lhes recaia eterna
maldição. Quero saber.
BRUXA BORGHI
Mostre-se!
BRUXADOBAL
Mostre-se!
TODAS
Que vejam seus olhos, que sofra seu coração,
Como sombra vêm, como sombra vão.
(Uma seqüência do fantasma de Banquo /Alvise aparece.)
MACBETH
Tu te pareces demais com o espírito de Banquo. Some!
Tua coroa me fere olhos; teus cabelos, tua testa coroada, pareces o primeiro, tal
como o terceiro que te segue. Bruxas nojentas, por que isto? Mais um! O quarto!
Abram-se os olhos estarrecidos. Esta linhagem estenderá então até ao fim dos
tempos? Outro? E o sétimo? Chega, não quero ver mais nada. Aí vem um
último, com um espelho na mão, mostrando ainda muitos outros. E há alguns
com dois orbes e três cetros. Que terrível visão! Vejo agora que é verdade:
Banquo, sorri e aponta para eles, como se todos seus filhos fossem.
(As visões desaparecem.) Como! É assim?
BRUXA BORGHI
É assim.
(Desaparecem)
46
MACBETH
Onde estão? Foram embora? Maldita seja sempre esta hora perniciosa do
calendário. Quem está aí? (Ao Kuroku)
Viste, por acaso, as irmãs feiticeiras?
KUROKU
Não, meu senhor.
MACBETH
Não se cruzaram?
kUROKU
Na verdade não, meu senhor.
MACBETH
Infecto seja o ar onde elas passam.
KUROKU 2
Macduff fugiu para a Inglaterra.
MACBETH
Fugiu para a Inglaterra?
kuroku 2
Sim, meu bom senhor.
MACBETH
Ó tempo! Antecipas meus pavorosas ações! O fugidio propósito nunca será
alcançado se não materializarmos os atos. De agora em diante, o que meu
coração desejar será imediatamente executado. E agora mesmo, para coroar com
ações meus pensamentos, colocarei esta idéia em prática: Macduff de Fife,
passarei à espada tua mulher e todas as almas desgraçadas que ali estiverem. O
ferro, dobra-se enquanto está quente. Chega de visões.
(Saem.)
(Abre-se a cortina vermelha.Estão atrás do rolo do espaço. Uma porta. A luz é
diáfana ).
LADY MACDUFF
Mas o que é que ele fez para ter de fugir da sua terra?
KUROKALEX
Deve ter paciência, senhora.
47
LADY MACDUFF
Ele não teve nenhuma:
Fugir foi uma loucura: não foram as ações que nos traíram, foram os medos.
KUROKALEX
Medos ou sabedoria.
LADY MACDUFF
Sabedoria? Deixar mulher, filhos pequenos, casa e título, num lugar de onde ele
próprio foge? Ele não nos ama. Falta-lhe o instinto natural. Porque até o pardal
defende até a morte suas crias contra a coruja. É medo, não amor; como pouca é
a sabedoria da fuga por qualquer razão.
(Silêncio.)
Ele tem pai mas é órfão.
(Nina seu filho)
Filhinho, o teu pai morreu. Como vais viver? Com minhocas e moscas? Como
vais fazer sem um pai? Como vou fazer sem marido? Posso arranjar vinte em
qualquer mercado. Posso comprá-los para os vender outra vez. Teu pai era um
traidor? Sim, era. O que é um traidor? Quem jura e mente Quem faz isso, é
traidor e deve ser enforcado. Cada um deles tem que ser enforcado. Quem deve
enforcá-los? Os homens honestos, claro. Então aqueles que juram e mentem são
loucos, porque há suficientes para enforcar os homens honestos. (Pausa. Começa
a chorar) Como irás fazer sem um pai? Se ele estivesse morto, chorarias por ele.
Se não chorasse seria um bom sinal; você teria rapidamente um novo pai.
VELHO DOBAL
Senhora, o perigo se aproxima. Não se deixe encontrar aqui. Trate de sumir
daqui com o pequenino. Que o Céu a proteja. Não me atrevo a demorar-me mais
aqui.
(sai mensageiro)
LADY MACDUFF
Para onde vou fugir? Não fiz mal nenhum. Mas estou neste mundo, onde fazer o
mal é muitas vezes louvável, e fazer o bem algumas vezes uma loucura
perigosa.(Pausa) Quem são vocês?
(entram KUROKUS-ASSASSINOS)
KUROKU-ASSASSINO
Onde está o seu marido?
LADY MACDUFF
48
Em nenhum lugar tão excomungado onde alguém como você o possa
encontrar.
KUROKU-ASSASSINO
É um traidor. E este um filhinho de traidor.
(Apunhala a criança. Fecha-se a cortina vermelha.A mãe foge, desesperada.O
rolo do espaço vai a um pântano.O do tempo vai à aurora. Abre-se a cortina
vermelha.)
MALCOLM
Aquele tirano foi em tempos considerado um homem honesto. Eu sou novo,
mas pode-se aprender alguma coisa de mim; é sábio oferecer um fraco e
inocente cordeiro para apaziguar um deus feroz.
MACDUFF
Eu não sou traidor.
MALCOLM
Mas Macbeth é.
MACDUFF
Eu perdi a esperança.
MALCOLM
Talvez no lugar onde eu encontrei minhas dúvidas. Por que deixou sua mulher e
seus filhos tão expostos, sem sequer se despedir? Não deixe que a minha
desconfiança seja a sua desonra, é apenas a minha segurança: poderá ser
absolutamente honesto, pense eu o que pensar.
MACDUFF
Sangra, sangra pobre País, porque a bondade não se atreve a fiscalizar-te: faz
desfilar as tuas maldades, pois o título foi confirmado. Passe bem, meu senhor.
Eu não sou o canalha que o senhor imagina.
MALCOLM
Não se ofenda: Eu não falo como se o temesse. Acima de tudo penso que haveria
mãos levantadas por meus direitos: aqui da Inglaterra foram-me oferecidas
milhares. Mesmo assim, quando eu tiver pisado a cabeça do Tirano, cortada pela
minha espada, o meu pobre País terá mais vícios do que antes, terá mais
sofrimento com aquele que vem depois.
MACDUFF
E quem será?
49
MALCOLM
Eu mesmo, de quem conheço todos os vícios, que, quando se abrirem, farão o
negro Macbeth parecer tão puro como a neve.
MACDUFF
Nem nas legiões do horrendo inferno, poderá haver demônio mais malvado que
Macbeth.
MALCOLM
Ele é sanguinário, devasso, avarento, falso, enganador, violento, fede a cada
pecado que tenha nome. Mas a minha volúpia é infinita, nada pode satisfazer o
poço da minha luxúria. O meu desejo derruba todos os obstáculos à minha
vontade. Melhor Macbeth do que governar alguém assim.
MACDUFF
Um vício sem limites é uma tirania: tem provocado o esvaziamento precoce de
tronos felizes e a queda de muitos Reis. Mas por agora não tema em resgatar o
que é seu. Pode conduzir os seus prazeres de muitas formas; poderá enganar
mulheres dispostas a isso.
MALCOLM
Isso faz crescer no meu caráter doente uma avareza desmedida, que sendo Rei,
me faria mandar matar os Nobres por suas terras, desejar de uns as jóias, e de
outros as casas. O fato de ter mais, não passaria de condimento para me fazer
querer ainda mais.
MACDUFF
Isso cresce com uma raiz mais perniciosa do que a luxúria do verão e tem sido a
espada que destronou os nossos Reis. Tudo isso seria tolerável se compensado
pelas virtudes.
MALCOLM
Mas eu não tenho virtudes. Não tenho sinais daquelas adequadas a um Rei. Em
compensação, domino as variações de cada crime, praticando-as de todas as
formas. Se um homem assim for capaz de governar, fale: eu sou como acabei de
descrever.
MACDUFF
Capaz de governar? Não, nem de viver. Nação miserável! Com um Tirano
indigno do título de cetro sangrento, quando é que verás teus dias gloriosos de
novo? Uma vez que o aspirante legítimo do teu Trono é interditado pela sua
própria acusação, e blasfema toda a sua estirpe? Duncan foi um santo Rei. Meu
peito, a tua esperança termina aqui.
50
MALCOLM
A tua emoção, filha da integridade, reconcilia os meus pensamentos com a tua
lealdade e honra. O demoníaco Macbeth por muitos desses ardis, tem procurado
levar-me sob o seu jugo.
(Pausa)
Aqui repudio as manchas e culpas que atirei sobre mim. Mal cobiço o poder , em
nenhum momento perdi a minha fé, não denunciaria nem o Demônio, e adoro a
verdade tanto como a vida. A primeira vez que menti foi agora e sobre mim
mesmo. Na verdade, ponho-me ao seu comando e ao comando do meu País, para
onde se dirigia, quando o senhor se aproximou, o velho Siward com dez mil
homens guerreiros preparados para a batalha: agora partiremos juntos e que a
garantia de sucesso se equipare ao valor da nossa causa. Porque ficas em
silêncio?
MACDUFF
Coisas tão más e boas no mesmo instante. É difícil conciliar.
MALCOLM/NILTON (A um dos KUROKUS)
Como vão as coisas?
KUROKU
Corre o rumor que muitos homens de valor tenham descido às praças. A vossa
presença na Escócia criaria soldados, faria até as mulheres lutarem para se
livrarem de suas aflições.
MALCOLM
Para lá caminhamos. A Inglaterra concedeu-nos dez mil homens.
KUROKU
Infelizmente minhas próximas palavras deviam ser uivadas ao vento do deserto
para que ninguém as pudesse ouvir.
MACDUFF
A que dizem respeito? À causa comum ou ao desgosto privado de um único
peito?
KUROKU
Nenhuma mente honesta poderá não partilhar o sofrimento, embora o principal
pertença apenas a ti.
MACDUFF
Se ele é meu, revela-o depressa.
51
KUROKU
O teu castelo foi surpreendido: a tua mulher e os teus filhos assassinados.
Contar-te os detalhes seria a tua morte.
MALCOLM
Ponha em palavras o sofrimento. O desgosto que não fala o coração leva à sua
explosão. Vamos fazer de nosso próprio destino o remédio da nossa vingança
para curar este desgosto mortífero. Enfrente isso como um homem.
MACDUFF
Mas também devo sentir como um homem. Me ajudem.
(O diz ao público e a quem representou quem foi assassinado: Banquo, Nilton e
Lady Macduff. Silencio. Os atores olham ao público, sem nada dizer. Pode
expressar o que quiser, mas deve ser o ator).
MALCOLM
Que isto seja a pedra para amolar a tua espada; que se transforme em raiva.
MACDUFF
Podia interpretar o papel de mulher com os meus olhos e o de brigão com a
língua. Mas, Céus! Abreviem o tempo intermédio; ponham frente a frente ele e
eu. Posicionem-no ao alcance da minha espada.
MALCOLM
Não nos falta nada a não ser partir. Macbeth está maduro e os poderes divinos
têm em nós os seus instrumentos. É longa a noite que nunca encontra o dia. A
cada nova manhã, novas viúvas choram órfãos.
[VELHO DOBAL E JOVEM AUGUSTA conversam nos balanços Ali estão todos
os do coro morto.Isso pode assemelhar-se a uma espécie de manicômio, mas
somente sugerido; vai realmente parecer isso; entretanto, ainda é num caminho
apenas sugerido. Nos próximos dez dias definiremos a coisa.]
VELHO DOBAL
Quando foi a última vez que ela andou?
JOVEM AUGUSTA
Costuma levantar-se, jogar um roupão nas costas, abrir a escrivaninha e puxar
uma folha de papel. Escreve alguma coisa, lê o que escreveu, fecha e lacra a
mensagem e volta para a cama. Tudo isso no mais profundo sono.
52
VELHO DOBAL
Usufruir dos benefícios do sono, agindo como se estivesse acordada. E nesta
agitação sonâmbula, chega a dizer alguma coisa?
JOVEM AUGUSTA
O que diz, não lhe posso contar. Não sem uma testemunha que possa confirmar
minhas palavras.
(Ao fundo,[entra Lady Macbeth com uma vela).
Juro que está profundamente adormecida.
VELHO DOBAL
Por que a vela?
JOVEM AUGUSTA
Estava a seu lado. Quer sempre uma luz ao lado.
VELHO DOBAL
Está de olhos abertos.
JOVEM AUGUSTA
Mas os sentidos fechados.
VELHO DOBAL
Veja como esfrega as mãos.
JOVEM AUGUSTA
É como se lavasse as mãos. Às vezes por meia hora.
LADY MACBETH
Sai, mancha dos diabos! Sai, te ordeno! Quanta sujeira há no inferno! Que asco,
que vergonha, ter medo! Por que temer que saibam, se a ninguém temos de
prestar contas? Quem diria que o velho tivesse tanto sangue? Será que nunca
vou conseguir limpar estas mãos?
DAMA DE COMPANHIA
Ela disse o que não devia ter dito, não há dúvida. Deus sabe o que ela já viu.
VELHO DOBAL
Conheci sonâmbulos que morreram placidamente em seus leitos.
LADY MACBETH
Lava as mãos e não faça esta cara de espanto. Te digo e repito: Banquo está
enterrado, não pode sair da cova. Pra cama, pra cama! Batem à porta. Vem,
53
depressa: dá-me tua mão. O que está feito está feito, não pode ser desfeito. Pra
cama, depressa! Pra cama!
VELHO DOBAL
Agora ela volta para a cama?
JOVEM AUGUSTA
Direto.
VELHO DOBAL
Infectadas, as mentes despejam nos surdos travesseiros seus segredos.
Ela precisa mais dos deuses do que da ciência. Boa noite. Minha mente está
pesada, meus olhos perplexos. Penso, mas não ouso falar.
(Os dois KUROKUS desenrolam aos exércitos, pintados por giampaolo e Laura)
KUROKU 1
Os exércitos ingleses devem estar próximos da floresta de Birnam; avançam por
lá.
Sabem dizer se Donalbain vem com o irmão?
KUROKU 2
Certamente não, senhor. muitos outros rapazes aqui mostrarão pela primeira vez
sua coragem.
KUROKU 1
E o que faz o tirano?
KUROKU 2
Fortifica Dunsinane. Dizem que ele está louco. Já não consegue limpar as mãos
de seus crimes secretos. A cada minuto uma nova revolta re-prova sua traição.
Seus súditos cumprem ordens, não o seguem por amor
KUROKU 1
Sigamos adiante; para Birnam, marchemos.
(Movem o rolo do espaço para a floresta de Birnam)
MACBETH
Não me tragam mais notícias. Enquanto a floresta de Birnam não chegar a
Dusinane, o medo não me pode atingir. E esse garoto, Malcolm, acaso não
nasceu de uma mulher? Os espíritos que conhecem todas as mortais
conseqüências assim me asseguraram:
‘Não temas, Macbeth, nemnhum homem nascido de mulher terá poder sobre ti.
54
Assim, desertem Barões traidores, juntem-se aos ingleses devassos: a alma que
me anima e o coração que trago no peito não esmorecerão diante da dúvida nem
tremerão de medo.
(Ao Kuroku)
Que o diabo te carregue e pinte de negro tua face de palerma. Onde arranjastes
esta cara de pato?
KUROKU
Há dez mil—
MACBETH
Patos, canalha?
KUROKU
Soldados, senhor.
MACBETH
Pinta de vermelho teu medo, menininho com fígado de flor. Que soldados,
babaca?
Que morra tua alma! Que soldados, carinha de coalhada?
KUROKU
Tropas inglesas, senhor.
MACBETH
Some daqui.
Ou esta luta consolida meu poder, ou me derruba de vez. Muitos anos vivi: o
caminho da minha vida se inclina para o outono, de folhas amarelas. Não posso
almejar aquilo que deveria acompanhar a velhice: a honra, o amor, a obediência,
amigos. Em seu lugar, ouço
maldições profundas, lisonjas fáceis, da boca pra fora, que meu coração desejaria
desprezar, mas não ousa.
Lutarei até que meus ossos sejam descarnados.
Minha armadura! Quero vesti-la.
Como está a paciente, Velho?
VELHO DOBAL
As fantasias obsessivas
Que não lhe dão descanso.
MACBETH
55
Não se pode arrancar da memória a tristeza enraizada, apagar as inquietações da
mente e com um antídoto fazer esquecer, livrar o peito nervoso da matéria
perigosa que lhe pesa no coração?
Joga fora teu remédio e me dê a armadura;
Se pudesse, velho, através da urina destas terras, descobrir sua moléstia e purgá-
la, até que a saúde original fosse restituída, eu te aplaudiria.
Vamos lá, ordeno.—Que erva, droga ou purgante poderia evacuar os ingleses
daqui? Ouviu falar deles?
(Pausa)Não temo a morte ou ruína,
Enquanto a floresta de Birnam não marchar a Dunsinane.
(Realça-se a mata de Dunsinane. O CORO MORTO faz seu barulho de soldados
que marcham. A mata se aproxima, pois o rolo lentissimamente se mexe).
MALCOLM
Que esteja perto o dia em que nos sentiremos seguros em nossas casas.
Chegamos
à floresta de Birnam. Que cada homem corte um bom galho para levar como
camuflagem; Assim encoberta nossa tropa, não saberão ao certo quantos somos.
Vamos à guerra.
[Ouve-se dentro um grito de mulher.]
MACBETH
Quase tinha esquecido o gosto do medo. Já houve tempo em que meus sentidos
teriam se enregelado ao ouvir um grito dentro da noite; quando meus cabelos
teriam se eriçado. Estou tão empanturrado de atrocidades que o horror, tão
comum em meus pensamentos homicidas, já não consegue me abalar
minimamente.
KUROKU
A rainha morreu.
MACBETH
Tivesse morrido em outra hora; o momento há de chegar: para o amanhã, do
amanhã, do amanhã, se esgueira sorrateiramente no ritmo apequenado do dia
após dia, até a última sílaba do tempo marcado. Todos os nossos ontens
iluminam, idiotas, o caminho para o pó da morte.
Apaga-se a vela!
A vida é sombra que caminha: uma triste atriz, pavoneando-se frenética em seu
momento de glória, para depois dela nunca mais se ouvir. É um conto, contado
por um tolo, com grande alarde e furor, mas de conteúdo vazio .
(Ao KUROKU, que move lentamente o rolo das personagens, onde está
desenhada a floresta, aos poucos vira um exercito.)
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Já não tem mais segredo, diz logo.
KUROKU
Acho que vi, mas não sei como dizer.
MACBETH
Diga.
KUROKU
Olhei em direção a Birnam e parecia que a floresta se movia.
MACBETH
Mentiroso, lacaio!
KUROKU
Que caia sobre mim a vossa cólera, se não for assim. A três milhas de distância,
pode-se ver a floresta avançando: uma floresta em movimento.
MACBETH
Começo a suspeitar do demônio, que disfarça a mentira com a verdade. “Nada
temas enquanto Birnam não marchar a Dunsinane.” E agora acontece uma
floresta marcha rumo a Dunsinane! Peguem as armas! Às armas! Vamos!
Começo a me cansar do sol, que venha a catástrofe!
(O ROLO REVELA O exército com galhos de árvores com tambores e bandeiras)
MALCOLM
Estamos perto; joguem fora seu disfarce, mostrem-se como são.
MACBETH
Amarraram-me a um poste; impossível fugir, lutarei até o fim. Quem é
Aquele que não nasceu de mulher? Só a ele devo temer, a mais ninguém.
MACDUFF
Mostra a tua cara, tirano! Se não caíres por minha espada, os fantasmas de
minha mulher e de meus filhos nunca me deixarão em paz.
KUROKU
O castelo entregou-se sem resistência. Os homens do tirano lutam dos dois lados.
Os nobres barões deram grande prova de valor. Pouco há a fazer.
MACBETH
Por que morrer, como o romano louco, por minha própria espada? Enquanto me
deparar com inimigos, prefiro neles enfiar minha faca não em mim.
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MACDUFF
Vira, cão dos infernos!
MACBETH
Tu és, dentre todos os homens, aquele a quem mais quero evitar. Some daqui;
minha alma já está por demais pesada com teu sangue.
MACDUFF
Não tenho palavras; minha língua é minha espada, que só ela pode dizer do
abominável que és.
MACBETH
Tenho corpo fechado, nenhum homem nascido de mulher tem poder para me
matar.
MACDUFF
Pois este feitiço não vale contra mim. Saiba o anjo da morte que te protege que
Macduff foi colhido do ventre de sua mãe antes do tempo.
MACBETH
Maldita seja a língua que me diz isso, acovardando a melhor parte do homem
que há em mim. E que nunca mais se creia nesses demônios que falseiam e
jogam com duplo sentido, Mantendo a palavra no literal e quebrando-a no real.
Não lutarei contigo.
MACDUFF
Entrega-te então, covarde, e vive para seres um animal de circo. Te
enjaularemos como um monstro raro no teu retrato, nos lambe-lambes das ruas.
MACBETH
Não me curvo a beijar o chão, aos pés de Malcolm, nem servirei de isca para
distrair a patuléia. Mesmo tendo Birnam marchado até Dunsinane, mesmo que
tu, que me resistes, não tenhas nascido de mulher, vou lutar até o fim. Fecho
meu corpo com espírito guerreiro. Vem, Macduff! E maldito seja quem primeiro
gritar: “Basta!”
[Saem, lutando. Macduff volta carregando o corpo de Macbeth. Fecha-se a
cortina vermelha).
MACDUFF
É pouco o que se paga para ver tão grande dia. O mundo está livre.
MALCOLM
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Não esperaremos muito tempo para ajustar nossas contas e retribuir vosso amor.
O que resta a fazer e que será realizado com o tempo: chamar de volta à casa os
amigos que fugiram para longe do olhar do tirano; julgar os cruéis ministros do
carniceiro morto e da diabólica rainha que terminou a vida por suas próprias
mãos: e tudo o mais que for preciso havemos de realizar, tudo a seu tempo e
tudo em seu lugar. Agradeço portanto a todos e a cada um e os convido para
minha coroação.