livro - governanÇa corporativa

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Governança Corporativa

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  • GovernanaCorporativa

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  • EDITORA ATLAS S.A.

    Rua Conselheiro Nbias, 1384 CCampos Elsios)01203-904 So Paulo (SP)

    Tel.; (0__11) 3357-9144 (PABX)www.atasnet.com.br

    i\

    Adriana Andrade

    Jos Paschoal Rossetti

    . -

    GOVERNANACORPORATIVA

    Fundamentos,Desenvolvimento

    e Tendncias

    SAG PAULO

    EDITORA ATLAS S.A. - 2004

  • ) 2004 by EDITORA ATLAS S.A.

    Capa: Criao de Ricardo Carvalho, diretor de arteda agncia smpb comunicao

    Cromo da capa: Getty ImagesFoto dos autores: Rogrio Franco

    Digitao dos originais: Anglica Aparecida Alves da SilvaComposio: Lino-Jato Editorao Grfica

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Andrade, AdrianaGovernana corporativa :,fundamentos, desenvolvimento e tendn

    cias / Adriana Andrade, Jos Paschoal Rossetti. - - So Paulo : Atlas, 2004.

    Bibliografia.

    ISBN 85-224-3909;5

    1. Administrao de empresas 2. Governana corporativa I. Ttulo.

    04-5304 CDD-658.4

    ndice para catlogo sistemtico:

    1. Governana corporativa : Empresas : Administrao executiva 658.4

    TODOS os DIREITOS RESERVADOS - proibida a reproduo total ou parcial,de qualquer forma ou por qualquer meio. A violao dos direitos de autor(Lei n" 9.610/98) crime estabelecido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.

    Depsito legal na Biblioteca Nacional conforme Decreto n 1.825,de 20 de dezembro de 1907.

    Impresso no Brasil/Prnted in Braz

    M

    cv

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    \ '"\

    Para meu filho

    Breno Patrick

    Adriana Andrade

    Para minhas netas e meus netos

    Fabiana e Murilo

    Rodolfo e Heitor

    Maria Clara e Lorenzzo

    Jos Paschoal Rossetti

    Integridade, competncia e envolvimento construtivo:que estes trs valores da boa governana sejam seus fundamentosde vida e de cada uma de suas conquistas.

  • Sumario

    Apresentao, 13

    Prefcio, 15

    1 1.1 Uma primeira viso conceituai, 21Governana A diversidade de conceitos, 23Corporativa: Direitos e sistemas de relaes, 23Abrangncia, Sistemas de governo e estruturas de poder, 24Razes e Fatores de Sistema de valores e padres de comportamento, 24Desenvolvimento Sistemas normativos, 26

    A diversidade de modelos, 29

    0 trinmio propriedade-gesto-retomo, 30

    Os modelos stakeholder: interesses mltiplos, 34

    Outros fatores diferenciadores, 39

    Os Grandes

    Marcos

    Construtivos Da

    Governana

    Corporativa

    1.2 Razes e fatores de desenvolvimento, 41

    As razes essenciais do ativismo pioneiro, 41

    Os fatores determinantes mais recentes, 46

    Os fatores externos, 46

    Os fatores internos, 49

    Resumo, 52

    Palavras e expresses-chave, 54

    2.1 Os trs marcos histricos, 56

    2.2 O ativismo pioneiro de Robert Monks, 58 A reviso dos pressupostos clssicos, 59

    A hiptese contestada, 59

    O gigantismo e o poder das corporaes, 59 A atuao em vrias firentes, 63

    2.3 O Relatrio Cadbury, 68

    As razes da mobilizao, 68

    Os termos de referncia e as bases propostas, 69

  • 2.4 Os Princpios da OCDE, 72 As razes do interesse de uma organizao multlateral, 72

    As concluses e as diretrizes propostas, 75

    2.5 A difuso mundial dos cdigos de governana, 77

    2.6 O fechamento do crculo: a adoo efetiva dos princpios, 79 Dos princpios operao: a declarao do ICGN, 80 O novo cenrio de governana corporativa, 84

    A lei Sarbanes-Oxley, 85

    1. Compliance- conformidade legal, 85

    2. AccounCability - prestao responsvel de contas, 86

    3. Disclosure - mais transparncia, 86

    4. Faimess - senso de justia, 87

    A avaliao das prticas corporativas, 88

    Resumo, 93

    Palavras e expresses-chave, 95

    3 3.1 A primeira questo-chave: os conflitos de agncia, 98-

    As Questes A origem dos conflitos de agncia, 99Centrais da As razes dos conflitos de agncia, 101

    Governana l. o axioma de Klein, 101

    Corporativa 2. O axioma de Jensen-Meckling, 102

    3.2 A segunda questo-chave: os custos de agncia, 103

    3.3 A terceira questo-chave: os direitos assimtricos, 107

    3.4 A quarta questo-chave: o alinhamento de interesses, 110

    3.5 A quinta questo-chave: as foras de controle, 113 As foras externas de controle, 114

    1. O ambiente legal e rgulatrio, 114

    2. Padres contbeis exigidos das companhias, 117

    3. Controle pelo mercado de capitais, 117

    4. Mercados competitivos, 121

    5. Ativismo de investidores, 122

    As foras internas de controle, 124

    1. Concentrao da propriedade acionria, 124

    2. Constituio de conselhos guardies, 127

    3. Modelos de remunerao dos executivos, 133

    4. Monitoramento compartilhado, 136

    5. Estruturas multdivisionais de negcios, 137

    8 GOVERNANA CORPORATIVA

    Os Modelos de

    Governana

    Efetivamente

    Praticados

    O Processo de

    Governana

    Corporativa

    Resumo, 138

    Palavras e expresses-chave, 141

    ,4.1 Uma primeira sntese: os fatores de diferenciao, 144

    4.2 O modelo anglo-saxo, 146

    4.3 O modelo alemo, 151

    4.4 O modelo japons, 153

    4.5 O modelo latino-europeu, 157

    4.6 O modelo latino-americano, 160

    Caractersticas das corporaes na regio, 161 Determinantes do modelo praticado, 164

    Recomendaes da OCDE para a regio, 171Resumo, 171

    Palavras e expresses-chave, 173

    5.1 A governana como sistema de relaes, 176 Relaes focadas no interesse dos acionistas, 177 Relaes abertas a mtltiplos interesses, 181

    5.2 O conselho de administrao no processo de governana, 184 Atribuies e responsabilidades, 186

    Separao de funes, 186

    Grau de envolvimento do conselho, 188

    Misso e reas de atuao do conselho, 193

    Requisitos essenciais e normas de funcionamento, 195 Dimenso do conselho e atributos dos conselheiros, 196

    Dimensionamento e complementaridade, 196

    Atributos, posturas e condutas, 198

    A avaliao dos conselhos e dos conselheiros, 204 As razes para a avaliao, 204

    As barreiras para a avaliao, 205

    O Barreiras para avaliao dos conselhos, 205O Barreiras para avaliao de conselheiros, 205

    O que avaliar, 206

    Como avaliar, 208

    A quem cabe avaliar, 209

    Uma proposta de mtodo para avaliaes estruturadas, 209 Definies precedentes, 209

    Formatao de instrumentos, 209

    Aplicao dos questionrios, 209

    SUMRIO

  • 6

    A. Governana

    Corporativa noBrasil

    5.3

    5.4

    5.5

    Tabulao e anlise, 210

    Q A avaliao de conselheiros, 210

    A avaliao abrangente do conselho, 213

    A direo executiva no processo de governana, 215 Papis e responsabilidades, 216 O CEO: atributos e posturas esperadas, 218

    A avaliao do CEO, 221

    A busca por processos de alta eficcia, 226 O empowerment do conselho e a eficcia da governana, 228 As corporaes gerenciadas e as governadas, 229

    Trs snteses relevantes, 234

    A criao de valor, 234

    A harmonizao de interesses, 236

    A promoo do crescimento econmico, 237

    Resumo, 238

    Palavras e expresses-chave, 241

    6.1 Enquadramento conceituai: umaampla viso das foras modeladoras, 245

    6.2 Uma breve viso do ambiente corporativo no Brasil, 245 As megamudanas globais: uma sntese em trs dimenses, 247

    As concepes poltico-ideolgicas, 247

    A ordem geopoltica, 249

    A ordem econmica, 250

    O alinhamento do Brasil s megamudanas globais, 254

    A poHtica e a orientao estratgica at os anos 90, 254 Os anos 90: desradicalizao e reorientao estratgica, 258

    Os impactos: a reengenharia de negcios, 260

    Os impactos no mbito mais especfico da governana, 264 A reconfgurao do mercado de capitais, 264

    As mudanas nos padres de governana, 266 Condies estruturais do sistema corporativo, 266

    O tamanho das empresas e a origem do capital, 267

    As sociedades annimas, as abertas e as Hstadas em bolsa, 268

    A composio dos investidores no mercado de capitais, 274 A presena dos fundos de penso no mercado de aes, 275 Comparaes internacionais, 277

    6.3 O ambiente externo da governana corporativa no Brasil, 283 Os novos marcos legais e as recomendaes da CVM, 284

    10 GOVERNANA CORPORATIVA

    As Tendncias

    Provveis da

    Governana

    Corporativa

    As recomendaes da CVM, 290

    O mercado de capitais; nveis diferenciados de governana, 291

    Nvel 1 de governana corporativa, 296

    Nvel 2 de governana corporativa, 297

    Novo mercado, 298

    Efeitos da migrao para as listagens diferenciadas, 299

    Os investidores institucionais: presses por boa governana, 301

    O Instituto Brasileiro de Governana Corporativa, 306

    6.4 O ambiente interno da governana corporativa no Brasil, 308

    Uma primeira qualificao: condies determinantes, 310 A estrutura da propriedade acionria no Brasil, 315

    As relaes acionistas-conselhos-direo, 319

    Os conselhos de administrao: estrutura e eficcia, 324

    Os conselhos em perspectiva histrica, 325

    Antes da Lei das Sociedades por Aes de 1976, 325

    Depois de 1976 at o incio dos anos 90, 327

    A partir dos anos 90, 329

    Papis e responsabiUdades reconhecidas, 330

    As dimenses e a composio, 336

    Os processos e a eficcia dos conselhos de administrao, 338

    6.5 Uma sntese: o modelo de governana corporativa do Bras, 341

    Resumo, 350

    Palavras e expresses-chave, 355

    7.1 Enquadramento conceituai: as quatro tendncias, 358

    Comportamento de atores externos, 359

    Q Movimentos internos nas corporaes, 359

    7.2 A tendncia convergncia, 362

    Fatores determinantes da convergncia, 364

    Orientaes convergentes, 365

    Convergncias legais, 367

    Convergncias funcionais, 367

    7.3 A tendncia adeso, 368

    Fatores determinantes, 368

    Conseqncias esperadas, 369

    7.4 A tendncia diferenciao, 374

    Indutores de origem externa, 374

    Grandes mudanas decorrentes, 378

    SUMARIO 11

  • 7.5 A tendncia abrangncia, 378

    Ampla viso: os fatores crticos do crescimento global, 379

    A responsabilidade corporativa, 381

    7.6 Tendncias da governana corporativa no Brasil, 385

    Resumo, 393

    Palavras e expresses-chave, 395

    Referncias bibliogrficas, 397

    ndice remissivo, 407

    12 GOVERNANA CORPORATIVA

    Apresentao

    H 15 anos, ria virada dos anos 80 para a ltima dcada do sculo XX,quando a expresso governana corporativa ainda no havia surgido, emboraj ganhassemcorpo as questes centrais relacionadasa essa rea da alta gesto a Fundao DomCabraldesenhou um programa de formao e de capacitao, especialmente voltado pra a nova gerao de sucessores que estavapor assumira propriedade e o controledas empresas criadas nos anos 50, 60 e70 pelosempreendedores do longociclo de industrializao intensivado Pas.

    A equipe tcnica da FDC observava, naquela poca, que eram bem distintos os papis dos acionistas - especialmente quando sucessores em empresas familiares -, dos conselhos e dos gestores das empresas. Acompanhandoos conflitos potenciaisque poderiam resultar de uma conduo menos cuidadosa e menos profissional dos processos sucessrios, props-se ento a somaresforos para a investigao acadmica e a proposio de diretrizes eficazesque levassem distino dos papis, harmonizao dos interesses, coeso,crescimento e perpetuao das sociedades. Cerca de 120 empresas passarampor esse programa e muitas delas esto hoje no primeiro quartil das 500maiores do pas.

    Ao mesmo tempo, a equipe investiu na compreenso dos processos defuses e de aquisies, de alianas e de associaes. Mais do que levantar osobjetivos e os benefcios empresariais desses movimentos, que assumiramgrandes propores nos anos 90 - mais de 4.700 transaes no Brasil entre1990-2002, quase a metade com participao estrangeira -, buscou-se compreender as questes relacionadas s transfuses culturais, choques de visesestratgicas multidirecionais e novos modos de gesto das novas empresasque emergiam dessas mudanas.

    Em abril de 1997, a FDC foi um pouco mais longe. O tema do programa TopManagement Summit daquele ano foi governana corporativa. A nossoconvite veio ento ao Brasil Adrian Cadbury, presidente do Comit d Governana Corporativa do Reino Unido e membro do grupo de trabalho da Organizao de Cooperao para o Desenvolvimento Econmico (OCDE), queproduziu o influente Principies ofcorporate govemance, matriz dos cdigos degovernana hoje editados em mais de 60 pases, em todos os continentes.Desse encontro resultou um cdigo de melhores prticas para conselhos deadministrao, consensado por 45 dirigentes de empresas e altos executivosento presentes.

  • 14

    Vemos agora nesta importante obra de Adriana Andrade e Jos PaschoalRossetti - pioneira, pelasua abrangncia, na literatura de alta gesto produzida no Brasil - que o Relatrio Cadbury (1992) e os Princpios da OCDE(1999) foram destacados pelos autores como dois dos trs marcos mundiaisde construo da governana corporativa. Dado o reconhecido critrio dos autores, uma indicaosegura de que nossos alvosforam bem fundamentados.

    Preparar sucessores, harmonizar interesses, alinharvises estratgicas,separar as funes dos acionistas, dos conselhos e da direo executiva, propor cdigos de melhores prticas e enveredar pelas questes cruciais da altagestoestiveram entre os objetivos propostos pela equipe da FDC - e, claramente, ainda esto presentes, e com alta nfase, em nosso portflio. E todos eles so temas de governana corporativa, tratados com profundidadeneste livro.

    Ele lanadono ano em que criamos na Fundao Dom Cabral um Ncleo de Excelncia em Governana Corporativa, sob o patrocnio de uma dasempresas posicionadas no mais alto nvel de governana da Bolsa de Valoresde So Paulo - o Novo Mercado.

    A busca da excelncia , seguramente, um dos muitos atributos destetrabalho - reconhecido por professores nacionais e iiitemacionais da FDC,que tiveram acesso aos originais. Seguramente, ser uma obra de referncia,pelo seuembsamento empesquisas de alcance mundial, abrangncia e pio-neirismo. Mas, sobretudo, pelo seu rigor conceituai e profundidade das proposies.

    Emerson de Almeida

    Presidente da Fundao Dom Cabral

    GOVERNANA CORPORATIVA

    Dividiremos''este prefcio em duas partes. Em ambas registraremos oentusiasmo com que recebemos esta obra - oportuna e extremamente tilneste momento, em nosso pas. Na primeira parte, olharemos para a importncia da governana corporativa neste sculo que se inicia, tanto para asempresas e para a economia nacional, como para a sociedade como um todo.E, na segunda, enfatizaremos as notveis contribuies dos autores para acompreenso e a prtica dos processos de alta gesto abrangidos pela boagovernana.

    Sobre a governana corporativa

    pocas revisionistas, como a que estamos vivendo em todas aspartes domundo, geralmente resultam em avanos, no obstante possam por vezesprovocar sentimentos de frustrao e preocupaes. Mas so pocas de oportunidades que, se bem identificadas e capturadas, podem levar construode um futuro melhor.

    Veculos das conquistas, dos avanos materiais e do desenvolvimento, asgrandes corporaes de negcios alcanaram, neste comeo de novo sculo,uma dimenso e uma importncia sem paralelos na histria das civilizaes.Suas responsabilidades esto tambm aumentadas, em meio a uma nova ordem que se nlostra mais complexa, oscilante e voltil.

    At chegarem ao estgio atual, em que as suas dimenses rivalizam comas da maioria dos estados-nao, as grandes corporaes passaram pelo menos por trs estgios. O do empreendedorismo, que tem razes no sculo XIX;o do expansionismo, que foi coadjuvado pelo desenvolvimento dos mercadosde capitais; e o da fragmentao, resultante de processos sucessrios e da vigorosa demanda por recursos, que levou a sucessivas ofertas pblicas deaes, em escalas crescentes. No decorrer destes trs estgios, aperfeioa-ram-se os processos de gesto. E uma nova classe, a dos dirigentes executivos, assumiu posies autofortalecidas de poder, que dominou o desenvolvimento industrialista dos pases centrais na segunda metade do sculo XX,reconfigurando o ambiente corporativo, a que J. K. Galbraith chamou de onovo estado industrial.

  • Em anos mais recentes, j nas duas ltimas dcadas do sculo XX, visualizou-se um novo estgio, que se sobrepe aos anteriores, caracterizado pelabusca de um sistema equilibrado de decises, que d sustentao perenidade das corporaes, preservao de seus objetivos tangveis e intangveis,to duramente construdos dcada aps dcada. Esse novo estgio o de despertar da governana corporativa, que seguramente se tomar, com o seuaperfeioamento, disseminao e prtica, um dos pontos centrais da dinmica empresarial no sculo XXI.

    Neste estgio, fundamental que se disponibilizem informaes de qualidade, que se formalizem conceitos adequados e teis para a boa governanadas corporaes e se construam modelos funcionais e eficazes de alta gesto.Eles so necessrios diante de recentes ocorrncias que abalaram, exatamente nos mais desenvolvidos mercados, a confiana no mundo corporativo. Snos Estados Unidos, a desprecificao das aes foi de US$ 5,6 trilhes entre1999 e 2002: o valor de mercado das companhias listadas em bolsa, que havia subido de US$ 3,1 trilhes em 1990, para US$ 16,7 trilhes em 1999, recuou para US$ 11,1 trilhes em 2002. Com excees, essa mesma trajetriano foi diferente nos pases europeus e asiticos.

    A governana corporativa, que vinha sendo proposta como salvaguardados interesses dos investidores, que um dos processos fundamentais para odesenvolvimento seguro das companhias, ganhou ento maior impulso. Claroque no se trata de um recurso que, isoladamente, evitar sobre-e-subpreci-ficaes, dapidao de patrimnios pessoais e coletivos, destruio de valore movimentos histricos de ascenso e queda de grandes empreendimentos.Eventos deste tipo devem-se tambm a fatores externos s corporaes e adescontinuidades de toda ordem, desde mudanas em estruturas de concorrncia, at dissidncias tecnolgicas e rupturas comportamentais. Mas umaboa governana certamente toma os negcios mais seguros e menos expostosa riscos externos ou de gesto.

    Um bom sistema de govemana ajuda a fortalecer as empresas, reforacompetncias para enfrentar novos nveis de complexidade, ampHa as basesestratgicas da criao de valor, fator de harmonizao de interesses e, aocontribuir para que os resultados corporativos se tomem menos volteis, aumenta a confiana dos investidores, fortalece o mercado de capitais e fatorcoadjuvante do crescimento econmico.

    Sobre as contribuies desta obra

    Reafirmamos, assim, a oportunidade e a utilidade desta obra. Aco-autoria da executiva e professora Adriana Andrade e do consultor e professor Jos Paschoal Rossetti revelou-se eficaz e mostra-se presente em cadaum dos pontos que destacaremos.

    Entre suas caracteristicas, selecionamos:

    Conceitos precisos e ciaros. visvel o rigor dos autores coma preciso conceituai. Eles deixaram claro que a govemana cor

    16 GOVERNANA CORPORATIVA

    porativa no se apresenta com um desenho nico, uniformementeaplicvel, igual em todos os pases. Por isso, h vrias interpretaes disponveis e tambmvrios conceitos. Alm disso, ela envolve questes legais, macroeconmicas, financeiras, estratgicas ede gesto, amarradas s diferentescondies culturais dos pases.Mas, sem fazer concesses, a obra traz uma seleo de conceitosbem fundamentada, diferenciada quanto aos seus elementos determinantes e apresentada com muita clareza.

    Estruturao e organizao do pensamento. O texto permeado por quadros e figuras originais, evidenciando cuidadoscom a seqenciao e a constmo lgica da exposio.

    Proposies inovadoras. Em todos os captulos encontramosforma inovadoras de desenvolvimento dos temas. Os autores ou

    saram, mas com bons fundamentos. Propuseram trs marcosconstrutivos da govemana, bem escolhidos. Destacaram e exploraram exaustivamente cinco questes centrais da govemana. Tipificaram conselhos e conselheiros. Selecionaram atributos econdutas esperadas dos rgos de govemana. Classificaram todas as foras de controle. E destacaram, nominando-as, quatrograndes tendncias.

    Amplitude seletiva das fontes. A abordagem dos autoresno ativista. O critrio adotado foi o de mesclar a anlise gerencial das prticas de alta gesto com as evidncias da investigaoacadmica, com resultados de pesquisas de campo de consultoriase com proposies de instituies de mercado. O resultado umaobra expositiva, elegante, didtica e abrangente.

    Anlise do caso brasileiro. Os autores contextualizaram mui

    to bem a govemana corporativa no Bras. Avaliaram com objetividade as questes cmciais da govemana em nosso pas: a concentrao acionria, a sobreposio propriedade-gesto, a fracaproteo aos minoritrios e a expresso diminuta do mercado decapitais. Embora seja expressado um certo ceticismo com relaoa mudanas de curto prazo, ao descreverem a evoluo recentede-vrios aspectos que envolvem essas questes, os autores nospermitem pensar em possibilidades positivas para um horizontemais longo.

    Foco em funcionalidade. Quatro palavras so repetidas emtodos os captulos: modelos, sistemas, processos e prticas. Elas indicam uma clara preocupao dos autores com a funcionalidadeda govemana corporativa. E se nota tambm a alta nfase atribuda a padres de liderana de alta qualidade, pois so pessoasque esto frente dos modelos praticados e, portanto, as questesde qualificao, comprometimento e integridade so centrais naimplementao de uma govemana eficaz.

    Tendncias bem fundamentadas. So apontadas no final daobra quatro tendncias da govemana corporativa: convergncia,

    PREFACIO 17

  • 18

    adeso, diferenciao e abrangncia. Elas apontam para o futuro eso uma sntese do pensamento bem fundamentado dos autores. medida que se realizarem, levaro a um mundo corporativomais bem governado e mais equilibrado.

    Por este conjunto de caractersticas, esta obra de Adriana Andrade eJos Paschoal Rossetti uma contribuio de enorme valor para este momento e tambm uma base de preparao do modelo futuro de governanada nova corporao brasileira. A pesquisa aqui realizada no encontra similarem nosso pas. A organizao da obra e a objetividade na anlise de variadosaspectos da governana em mbito global permitem o entendimento claro dasexperincias histricas e tomam possvel formar um quadro de relevante utilidade para a compreenso e a remodelao de nossa realidade corporativa.

    Se realmente estamos diante de uma janela de oportunidade em nossopas, esta obra vem oferecer um forte alicerce, uma importantssima molduraconceituai para o desenvolvimento de nossas organizaes, das pessoas queas conduzem e das lideranas hoje em formao nas universidades.

    Jos-Guimares MonfortePresidente do Conselho de Administrao

    Instituto Brasileiro de Governana Corporativa

    GOVERNANA CORPORATIVA

    Governana Corporativa:Abrangncia, Razes eFatores de

    Desenvolvimento

    Atransio para o capitalismo sustentvel ser uma das maiscomplexasrevolues que a nossa espcie j vivenciou. Estamos embarcando em umarevoluo cultural global, que tem como epicentro a sustentabilidade. Elatem a ver comvalores, mercados, transparncia, ciclos de vidade tecnologiase produtos e tenses entreo longo e o curto prazo. E as empresas, mais quegovernos ou outras organizaes, estaro no comando destas revolues. Umcomando que se exercer pelos princpios da governana corporativa.

    JOHN ELKINGTON

    Cannibals with forks

  • 20

    A compreenso, a intemalizao e o exerccio da governanacorporativa esto, h no mnimo 15 anos, entre os mais importantes desaos da moderna gesto.No mundo corporativo, mais at que o domniodos conceitos edas melhores prticas de governana, bem como dos decorrentes processosde gesto, coloca-se como questo tambm fundamental a assimilao dosignificado histrico deste novo desafio e de seus futuros desdobramentos.

    Mais um modismo? Seguramente no.

    A governana corporativa tem fundamentos slidos, definidos a partirde prindpios ticos aplicados na conduo dos negcios. Seudesenvolvimento e sua afirmao tm razes macro e microeconmicas. E sua sustentaoj se estabelecu no s pelos princpios e razes que se encontram em suasorigens, mas tambmpelos institutos legais e marcos regulatrios que envolvem os processos de gesto e que, cada vez mais, aperfeioam-se com basenos valores que regem a boa governana.

    Organizaes multilaterais, como a Organizao para Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE), o Fundo Monetrio Internacional, o BancoMundial e o G7 - grupo das 30 mais avanadas naes industriais do mundo vem nos princpios da governanacorporativa uma base sUda para ocrescimento econmico. Uma slida base tambm para a integrao globalde mercados e para o controle dos riscos dos investimentos nas empresasabertas, especialmente dos decorrentes do ambiente competitivo de negciosem que elas operam, dos processos de gesto de ativos fsicos, financeiros eintangveis e dos relacionados qualidade das informaes que sustentam asdecisese que orientam os investidores.Emsntese, para o G7,"a governana corporativa um dos mais novos e importantes pilares de arquiteturaeconmica global".' E, para a OGDE, "a governana corporativa um dosinstrumentos determinantes do desenvolvimento sustentvel, em suastrs dimenses - a econmica, a ambiental e a social".^

    Mas, apesar de sua reconhecida importncia na gesto dos negcios ena promoo do crescimento econmico, no se pode ainda dizer que a expresso governana corporativa j estejaamplamente difundida e internalizadano mundo corporativo. E, pelo menos, por trs razes:

    1. Por ser ainda recente. A expresso foi empregada pela primeira vez em 1991. O primeiro cdigo de melhores prticas degovernana corporativa foi definido em 1992. E somente em1995 foi editado o primeiro livro com este ttulo - Corporate go-vernance, de R. Monks e N. Minow.

    GOVERNANACORPORATIVA

    2. Pela sua abrangncia. As prticas de governana podem serdescritas a partir de diversos pontos de vista, admitindo assimvrias acepes. Desde as relacionadas a questes legais, como asdos direitos societrio e sucessrio, a questes financeiras, comoa gerao de valor, a criao de riqueza e a maximizao do retomo dos investimentos, e questes estratgicas, como a definio dos propsitos empresariais e das diretrizes corporativas paraos negcios e das questes operacionais, como os sistemas queregem as relaes entre os acionistas, os conselhos de administrao e a direo executiva das empresas.

    3. Pela diversidade de modelos. Para a efetiva operacionaliza-o da governana corporativa no h apenas um, mas vriosmodelos vlidos de gesto. Dependendo da abrangncia e dosprocessos com que as empresas atendem s diferentes partes interessadas em seu desempenho e s extemalidades produzidaspelas suas operaes e pelos seus resultados, que se estabeleceo modelo de governana. Este pode estar voltado tanto para objetivos restritos quanto de maior amplitude. E, decorrentemente, agovernana ser conceituada de forma menos ou mais abrangente,reproduzindo os diferentes compromissos corporativos assumidos.

    Este primeiro captulo trata deste conjunto de questes fundamentais:focaliza a diversidade de conceitos e modelos, as razes e os fatores de desenvolvimento da governana corporativa. O objetivo inicial o de explorar bases conceituais que levem compreenso dessa nova expresso do mundocorporativo.

    1.1 Uma Primeira Viso Conceitual

    A governana corporativa, como conjunto de princpios e prticas quetm sido incorporadas aos modelos de gesto das empresas, tem atrado aateno de diferentes partes interessadas - e, em sentido mais amplo, o prprio interesse pblico.

    As partes interessadas mais diretamente envolvidas com os valores eprocessos de governana corporativa, bem como os seus interesses, esto sintetizados no Quadro 1.1. Pela diversidade das partes interessadas, fica evidente que, embora em sentido restrito, a governana responde aos interessesdos acionistas e dos agentes mais diretamente envolvidos com as operaescorporativas; em sentido amplo ela pode abranger um conjunto maior de relaes de uma corporao de negcios com todos os agentes direta ou indiretamente alcanados por suas aes.

    No h, assim, fironteiras rigidamente estabelecidas e estanques. Emprincpio, a governana um campo aberto - e os graus dessa abertura sodiretamente relacionados aos da abertura das prprias corporaes. As em-

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 21

    Esa

  • 3UADRO 1.1

    ?artes interessadas

    i interesses quejodem estar

    jresentes em

    processos deovemana

    :orporativa deiiferentes

    implitudes.

    presas fechadas e familiares podem optar por modelos mais restritos; as companhias abertas de capital privado respondero a um leque mais aberto deinteresses; as empresas estatais de capital aberto geralmente se envolvemcom interesses ainda mais expandidos. E mais: como diversos estudos acadmicos, entre eles os pioneiros conduzidos por La Porta, Lopez-de-Silanes,Shleifer e Johnson,^ tm demonstrado que h forte correlao entre as prticas adotadas de governana corporativa e o desenvolvimento econmico dasnaes, abriram-se ainda mais os campos com os quais essas mesmas prticasinteragem. Como sintetizam Claessens, Djankov e Lang,'' "h evidncias deque as melhores prticas de governana corporativa implicam maior acessodas corporaes s instituies financiadoras de seu desenvolvimento, menores custos do capital, melhor desempenho das empresas, riscos mais baixos e

    Partes interessadas

    Adonistas/cotistas:

    O Controladores.

    O Minoritrios.

    Conselhos de administrao.

    Conselhos consultivos.

    Auditorias independentes.

    Conselhos fiscais.

    Diretoria executiva; CEO e stajf.

    Comits corporativos de gesto.

    Funes corporativas.

    Outras partes internas interessadas;

    O Empregados.

    O Fundaes de assistncia e seguridade.

    Outras partes externas interessadas:

    O Fornecedores.

    Clientes.

    O Consumidores/Usurios.

    Agncias reguladoras.

    rgos normativos do mercadode capitais.

    Comunidades.

    _ Interesses

    Restritos

    Cumprimento de disposies estatutrias.

    Condies estabelecidas em acordos de acionistas.

    Desempenho estratgico no ambiente de negcios.

    Maximizao da riqueza dos acionistas.

    Otimizao do retomo sobre ativos tangveis.

    Preservao de ativos intangveis.

    Remunerao e benefcios da direo executiva.

    Perenidade da empresa.

    Ampliados

    Indicadores de cumprimento dedisposies legais.

    Responsabilidades corporativasquanto a;

    O Interesse nacional.

    O Interesse social.

    Balanos de alcance externo:

    O Social.

    O Ambiental.

    22 GOVERNANA CORPORATIVA

    tratamento mais favorvel de todas as partes interessadas nos resultados dascorporaes- por estas razes, a governana afeta as empresas, os mercadosfinanceiros e a economia das naes".

    Pela extenso e pela diversidade de seus impactos, h, em contrapartida, tambm diversas tentativas de definio em tomo do significado e do alcance da governana corporativa. O mesmo ocorre com os modelos que podem ser adotados em sua operacionahzao. E tanto conceitos como modelostm a ver com a amplitude que se d aos processos de governana e aos seusimpactos efetivos. No surpreende, portanto, que, sob diferentes perspectivas, h diferentes conceitos de governana.

    Diversidade Apesar da diversidade conceituai, h um conjunto bem definido de ex-

    DE Conceitos presses-chaves, ligadas aos princpios, aos modelos, s prticas, aos mecanismos de regulao e aos propsitos da governana corporativa. Eles estopresentes na maior parte das definies. Os principais so:

    Direitos dos acionistas ishareholders).

    Direitos de outras partes interessadas (_stakeholders).

    Conflitos de agncia.

    Sistema de relaes.

    Sistema de valores.

    Sistema de governo.

    Estrutura de poder.

    Estrutura de regulao.

    Padres de comportamento.

    A nfase atribuda a cada uma destas expresses nos diversos conceitosde governana corporativa sugere pelo menos quatro agrupamentos: 1. os queenfatizam direitos e sistemas de relaes; 2. os que destacam sistemas de governo e estruturas de poder; 3. os que chamam a ateno para sistemas de valores e padres de comportamento; e 4. e os focados em sistemas normativos.

    Direitos e Sistemas de Relaes

    OCDE.^ "Agovernana corporativa o sistema segundo o qual ascorporaes de negcio so dirigidas e controladas. A estruturada governana corporativa especifica a distribuio dos direitos eresponsabilidades entre os diferentes participantes da corporao,tais como o conselho de administrao, os diretores executivos, osacionistas e outros interessados, alm de definir as regras e procedimentos para a tomada de deciso em relao a questes corporativas. E oferece tambm bases atravs das quais os objetivos daempresa so estabelecidos, definindo os meios para se alcana-

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 23

  • rem tais objetivos e os instrumentos para se acompanhar o desempenho".

    Shleifer e Vishny. "A governana corporativa o campo daadministrao que trata do conjunto de relaes entre a direodas empresas, seus conselhos de administrao, seus acionistas eoutras partes interessadas. Ela estabelece os caminhos pelos quaisos supridores de capital das corporaes so assegurados do retomo de seus investimentos".

    Blair.^ "A governana corporativa trata dos meios utilizados pelas corporaes para estabelecer processos que ajustem os interesses em conflito entre os acionistas das empresas e seus dirigentesde alto nvel."

    IBGC. "Governana corporativa o sistema pelo qual as sociedades so dirigidas e monitoradas, envolvendo os relacionamentosentre acionistas/cotistas, conselho de administrao, diretoria,auditoria independente e conselho fiscal. As boas prticas de governana corporativa tm a finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para sua perenidade."

    Sistemas de Governo e Estruturas de Poder

    Q Cadbury.' "A governana corporativa o sistema e a estruturade poder que regem os mecanismos atravs dos quais as companhias so dirigidas e controladas."

    Babic." "O campo em que gravita a governana corporativa definido por uma dada estrutura de poder, que envolve questes relacionadas aos processos de tomada de decises estratgicas, aoexerccio da hderana, aos mtodos com que se atende aos interesses estabelecidos e aos pleitos emergentes - em sntese, eleest relacionado sociologia das elites e por isso mesmo fortemente influenciado pelos institutos legais e pelos marcos regula-trios de cada pas."

    Hitt, Ireland e Hosldsson.^i "Como a governana corporativanasceu do divrcio entre a propriedade e a gesto das empresas,seu foco a definio de uma estrutura de governo que maximizea relao entre o retomo dos acionistas e os benefiaos auferidospelos executivos. Neste sentido, envolve a estratgia das corporaes, as operaes, a gerao de valore a destinao de resultados."

    Sistema de Valores e Padres de

    COMPORTAMENTO

    Williamson.i2 "A governana corporativa trata da justia, datransparncia e da responsabilidade das empresas no trato dequestes que envolvem os interesses do negcio e os da sociedadecomo um todo."

    24 GOVERNANA CORPORATIVA

    QUADRO 1.2

    Conceitos de

    governana

    corporativa: umatentativa de sntese.

    Abrangnciae

    fliversidade

    Uma

    tentativa

    de sntese'

    DIREITOS. Sistema de gesto que visa preservar e maximizar os direitos dos acionistas, assegurando a proteodos minoritrios.

    RELAES. Prticas de relacionamento entre acionistas,conselhos e diretoria executiva, objetivando maximizar odesempenho da organizao.

    GOVERNO. Sistema de governo, gesto e controle dasempresas, que disciplina suas relaes com as panes interessadas em seu desempenho.

    PODER. Sistema e estrutura de poder que envolve a definio da estratgia, as operaes, a gerao de valor e adestinao dos resultados.

    VALORES. Sistema de valores que rege as corporaes,em suas relaes internas e externas.

    NORMAS. Conjunto de instrumentos, derivados de estatutos legais e de regulamentos, que objetiva a excelncia dagesto e a proteo dos direitos das partes interessadas emseus resultados.

    Partindo de um modelo de gesto que define suaabrangncia, a governana corporativa umconjunto de valores, princpios, propsitos,

    papis, regras e processos que rege o sistemade poder e os mecanismos de gesto das

    empresas, abrangendo:

    Oo Propsitos dos acionistas empreendedores.

    O O sistema de relaes adonistas-conselho-direo.

    O Maximizao da riqueza dos acionistas, minimizandooportunismos conflitantes com este fim.

    O Estrutura de regulao e de fiscalizao das aes corporativas.

    O Estrutura consultiva, deliberativa e de comando.

    O Processo de formulao e execuo da estratgia.

    O Sistemas de gesto, de controle e de aferio de resultados.

    O Sistema de informaes relevantes s partes interessadas.

    O Padres de atendimento aos direitos das partes interessadas.

    O Sistemas guardies de ativos tangveis e intangveis.

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 25

  • Cadbury.'^ "A governana corporativa expressa por um sistema de valores que rege as organizaes, em sua rede de relaesinternas e externas. Ela, ento, reflete os padres da companhia,os quais, por sua vez, refletem os padres de comportamento dasociedade."

    Claessens e Fan." "A governana corporativa diz respeito a padres de comportamento que conduzem eficincia, ao crescimento e ao tratamento dado aos acionistas e a outras partes interessadas, tendo por base princpios definidos pela tica aplicada gesto de negcios."

    Sistemas Normativos

    Mathiesen.i^ "Governana corporativa um campo de investigao focado em como monitorar as corporaes, atravs demecanismos normativos, definidos em estatutos legais, termoscontratuais e estruturas organizacionais que conduzam ao gerenciamento eficaz das organizaes, traduzidos por uma taxa competitiva de retomo."

    Mojiks e Minow.i^ "A governana corporativa trata do conjuntode leis e regulamentos que visam; a) assegurar os direitos dos acionistas das empresas, controladores ou minoritrios; b) disponibilizar informaes que permitam aos acionistas acompanhar decisesempresariais impactantes, avaliando o quanto elas interferem emseus direitos; c) possibilitar aos diferentes pblicos alcanados pelos atos das empresas o emprego de instrumentos que assegurema observncia de seus direitos; d) promover a interao dos acionistas, dos conselhos de administrao e da direo executiva dasempresas."

    Procurando resumir estes quatro conjuntos de conceitos, a partir de ex-presses-chave que definem a sua diversidade e a sua abrangncia, o Quadro 1.2 destaca as principais dimenses da governana corporativa. E a Figura 1.1 resume os elementos-chave do processo de governana, todosfundamentados em-um sistema d'efinido de valores que rege os mecanismosda gesto das empresas e as relaes entre as partes interessadas nos seus resultados.

    A Figura 1.2 ampUa a verso sintetizada dos elementos-chave da governana corporativa. Alise destacam, abrindo-as, as cinco "caixas"da Figura 1.1.

    Primeira "caixa"; os valores. Os quatro valores que do sustentao boa governana so;

    Faimess. Senso de justia, eqidade no tratamento dos acionistas. Respeito aos direitos dos minoritrios, por participao equ-nime com a dos majoritrios, tanto no aumento da riqueza corpo-

    26 GOVERNANA CORPORATIVA

    nGXJRA 1.1

    Elementos-chave do processo de governana corporativa: a subordinao do sistema derelaes, da estratgia, do poder e da gesto a xim sistema definido de valores.

    Relacionamento

    entre panes

    interessadas

    GOVERNANACORPORATIVA

    Sistema de valores

    Propsitosestratgicos

    Estrutura

    de poderPrticas

    de gesto

    rativa, quanto nos resultados das operaes, quanto ainda napresena ativa em assemblias gerais.

    Disclosure. Transparnciadas informaes, especialmente das dealta relevncia, que impactam os negcios e que envolvem riscos.

    Accountability. Prestao responsvel de contas, fundamentadanas melhores prticas contbeis e de auditoria.

    Coitipliance. Conformidade no cumprimento de normas reguladoras, expressas nos estatutos sociais, nos regimentos internos enas instituies legais do pas.

    Segunda "caixa": o relacionamento entre as partes interessadas. Esta questo crucial e est na base doativismo pioneiro que levou ao desenvolvimento das prticas de governana corporativa, especialmente nos Estados Unidos e na Inglaterra, pases em que predominam apropriedade acionria dispersa e a separao entre acionistas e gestores.Quando se d esta separao, atravs das boas prticas de governana quese podem minimizar os conflitos de agncia. Estes ocorrem quando o agenteprincipal Cno caso, o acionista) delega ao agente executor (no caso, a direoexecutivada corporao) as decises que maximizaro os resultadosdas ope-

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 27

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    28 GOVERNANA CORPORATIVA

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  • 30

    Como vrios autores j destacaram - Babic" e Oliveira,' por exemplo,desenvolveram ensaios competentes e esclarecedores sobre este aspecto osdiversos modelos de governana so decorrentes de condies histricas,culturais e institucionais dos pases em que cada um deles predominaSo tambm decorrentes da formao econmica dos pases, com destaquepara as relacionadas configurao e maturidade de seu sistema financeiroe, dentro deste, ao desenvolvimento de seu mercado de capitais, dois fatoresessenciais que definem, junto com a cultura empresarial e as instituies legais, a forma dominante de propriedade e de financiamento das empresas.

    Os diferentes modelos de governana corporativa, resultantes destecomplexo de condies determinantes, podem ser reunidos em dois grupos:

    O primeiro, definido pela tipologia de propriedade das empresase pela forma preponderante de financiamento das corporaes,que denominaremos pelo trinmio propriedade-gesto-retomo. Ofoco o acionista {shareholdef), quanto a seus interesses e direitos.

    O segundo, definido pela postura do mundo corporativo quantoao seu envolvimento e ao seu compromisso com objetivos demaior amplitude, no limitados aos de. natureza econmi-co-financeira. Trata-se de modelos que vo alm do retomo doinvestimento e da gerao de riqueza para os acionistas, assumindo compromissos com outras partes interessadas {stakehol-ders) no desenvolvimento das empresas e nos impactos de suasaes. Este segundo grupo diferencia-se por foco ampliado, envol-vendo-se com mltiplos interesses

    O Trinmio Propriedade-Gesto-Retorno

    Embora o conceito de responsabilidade corporativa que aponta para modelos mais abrangentes de governana esteja se difundindo rapidamente, levando as empresas a se envolverem com questes no limitadas dimensoeconmico-financeira, os interesses dos acionistas, como a gerao de riqueza e a obteno de retornos mximos para os investimentos realizados, permanecem, mesmo nas companhias mais sensveis funo social do mundocorporativo, como o objetivo central da gesto.

    Esta concepo no significa desconsiderao por quaisquer compromissos com outras partes interessadas, at porque, se esta postura prevalecer, osresultados corporativos de longo prazo podero ser negativamente impacta-dos. Na realidade, o foco na gerao de riqueza, com segurana para os su-pridores de recursos s empresas, no esgota a agenda das boas prticas degovernana, nem implica que outros objetivos no possam fazer parte dospropsitos corporativos. Apenas considera que os acionistas so, como indicaa terminologia clssica dos conflitos de agncia, o agente principal do processode governana.

    Segundo esta concepo, inverses da ordem de prioridade dos objetivos corporativos no parecem apropriadas, nem diferenciam as boas das ms

    GOVERNANACORPORATIVA

    prticas de governana corporativa. Estas diferenciam-se pela forma como oagenteprincipal, controlador ou minoritrio, tratado pela corporao, quanto aos riscos e retornos da disponibilizao de seus recursos para alavancagem dos negcios. Trata-se, assim, de concepo que estabelece como "prioridade um" a adio de valor riqueza originalmente disponibilizada para asempresas. Nesta linha, outras prioridades que dela decorrem diretamente soa reduo de conflitos de agncia na apropriao dos valores gerados e a suaequnime distribuio entre os acionistas controladores e os minoritrios.

    O foco no trinmio propriedade-gesto-retorno de origem an-glo-saxnica. Suas razes histricas so a diluio da propriedade acionriadas grandes corporaes e a separao entre a propriedade e a gesto. oque ocorre, predoininantemente, nos Estados Unidos e no Reino Unido, nosurpreendendo, pois, que tenham surgido nesses pases as preocupaes ativistas com as boas prticas de governana, centradas nos direitos dos acionistas, em conflito com o oportunismo da direo executiva das corporaes.

    Durante muito tempo, desde que Berle e Means," no imcio dos anos 30,chamaram a ateno para a pulverizao do capital das empresase para o divrcio entre a propriedade e a gesto, o problema central do que hoje chamamos de governana corporativa centrou-se no conflito de agncia. Umadas questes cruciais era evitar o comportamento oportunista dos gestores -descrito como moral hazard.

    Como registra Carvalho,^" "muito da literatura sobre governana corporativa baseia-se no princpio de que as empresas pertencem aos acionistas eque, portanto, a sua administrao deve ser feita em benefcio deles. O predomnio, por dcadas, da viso descrita por Berle e Means, segundo a qual asgrandes empresas modernas possuem propriedade acionria dispersa, moldou o debate sobre a governana corporativa: o grande problemade agnciaera visto como o conflito entre os administradores (agentesexecutivos) e acionistas (principais agentes). O oportunismo consistiria de decises dos administradores queno visassem maximizao do valordas aes. Dentro desteparadigma, boa governana empresarial significaria a adoo de mecanismosque forassem os administradores (no-acionistas) a proteger os interessesdos acionistas".

    Esta, porm, apenas uma das categorias de conflito de agncia, derivada de condies que prevalecem quando a tipologia de capital pulverizadae, por conseqncia, a propriedade e a gesto no so exercidas pelo mesmoagente. Outra categoria, que prevalece na maior parte dos pases, a da propriedade concentrada nas mos de uns poucos acionistas majoritrios, quepode levar justaposio propriedade-gesto. Neste caso, a questo centralde agncia desloca-se do conflitoproprietrios-gestorespara o conflito ma-joritrios-minoritrios. No mais o proprietrio que busca proteo contrao oportunismo do gestor, mas os minoritrios que vem seus direitos, sua riqueza e seu retorno serem solapados pelos majoritrios. Este segundo conflito de agncia o que ocorre com mais freqncia nos pases em que a propriedade no mundo corporativo concentrada e o mercado de capitais imaturo, compequenaexpresso em relao a outras fontes de capitalizao

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 31

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    32 GOVERNANA CORPORATIVA

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    dasempresas. assim na maior partedos pases emergentes. NaAmrica Latina, como no Brasil, esta uma das questes centrais da boa governana.

    A Figura 1.3 sintetiza as razes desses dois tipos de conflitos. E destaca odecorrente desenvolvimento de boas prticas de governana corporativa e deinstitutos legais que protejam acionistas, dispersos e minoritrios, de aesoportunistas que contrariem seus direitos e interesses. E a Figura 1.4 resume,em dois eixos, a tipologia dos conflitos de agncia descritos e os modelos degovernana corporativa a que eles conduziram: os centrados em reduzir prticas conflituosas resultantes da disperso; e os centrados nos desvios de conduta que podem ser gerados pela concentrao do capital acionrio.

    A eficcia desses modelos definida pela ausncia de conflitos nos doiseixos, solucionadps por prticas de boa governana que se estabelecem insti-tucionalmente no mercado de capitais e, internamente, nas empresas, sejapara solucionar um dos dois tipos de conflitos ou ambos. E as piores prticasso as que prevalecem presena de um dos dois tipos de conflito. Ou deambos.

    Os modelos de governana corporativa que se desenvolveram pioneiramente nos Estados Unidos e no Reino Unido enfatizaram, assim, a proteo

    FIGURA 1.4

    Tipologia dos conflitos de agncia: os derivados da concentrao do capital e osderivados da disperso.

    Ausentes

    CONFLITOS ENTRE

    ACIONISTAS

    MAJORITRIOS EMINORITRIOS

    Presentes

    Prticas

    conflituosas

    originrias dadisperso

    Prticas eficazes

    de governana

    Piores prticasde governana

    Prticas

    conflituosas

    originrias daconcentrao

    Presentes Ausentes

    CONFLITOS ENTRE

    PROPRIETRIOS EGESTORES

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 33

  • 34

    aos acionistas contra o oportunismo dos gestores, que podem assumir variadas formas de desvios de conduta. Nestes modelos, a forma predominante dealavancagem de recursos via equity e o mercado de capitais o supridornmero um dos recursos das grandes corporaes. Exercitam-se, ento, procedimentos que facultem aos acionistas dispersos o controle externo dascompanhias, assegurando a eles direitos de voto e acompanhamento ativodos atos dos administradores.

    Nestes modelos, os conselhos de administrao tendem a ser constitudos a partir de critrios mais rigorosos e sua eficcia tende a ser acompanhada e avaliada. Avalia-se a participao ativa dos conselheiros tanto na formulao das estratgias, como no controle da diretoria executiva. Os controlesexercidos pelo conselho sobre os gestores tendem a ser amplos; vo desde osbenefcios autoconcedidos, passam pelas Ugaes externas que diretoresmantenham nas cadeias de negcios da corporao, gerando conflitos de in-

    . teresse, e chegam at a avaliao rigorosa de seu desempenho. Ainda nestemodelo, os acionistas dispersos so protegidos por institutos legais, por modelos de governana eficazes e ainda so positivamente coadjuvados, na defesa de seus direitos, por fundos de penso e outros investidores institucionaisque, em geral, so os que detm maior (embora tambm baixa) participaono capital das corporaes. J onde o controle menos disperso, como namaior parte dos pases da Europa Ocidental (Alemanha como exemplonotvel) e no Japo, os modelos de governana fundamentam-se em outros atributos. Nestes casos, no o mercado de capitais o supridor privilegiado derecursos, mas o sistema bancrio. A alavancagem por exigveis (debt) e asaes no tm a mesma liquidez, quando comparada com a observada nosmercados de capitais mais pulverizados e mais dinmicos. Os conselhos deadministrao tendem a admitir a presena de instituies financeiras em suacomposio. E estas exercem presses maiseficazes para a rentabilizao dosnegcios. Os acionistas privados tm participao hmitada nos conselhos, e apreocupao com sua proteo tende a ser menos enfatizada.

    Os Modelos Stakeholder-. Interesses

    MLTIPLOS

    Uma segunda distino dos modelos de governana corporativa a suaabrangncia. Elesvo dos menos para os mais abrangentes e suas duas categorias bsicas levam em conta, essencialmente, os compromissos corporativos com mltiplas partes interessadas no desempenho da empresa e nos desdobramentos internos e externos de suas aes. Estas no ficam restritas aobinmio acionistas-gestores. Ampliam-se, admitindo ento que outros interesses internos e externos sejam considerados.

    Uma listagem ampUada destas partes inclui:

    Pblico interno

    O Empregados.

    O Fundaes de assistncia e seguridade.

    GOVERNANACORPORATIVA

    Pblico externo

    O Credores.

    O A montante; fornecedores.

    A jusante; clientes e consumidores.

    Q Entorno

    O Comunidade.

    O Sociedade.

    O Governo.

    O Meio ambiente.

    A distino 'entre as corporaes voltadas predominantemente para osinteresses e direitos de seus acionistas e as de estratgias mais abertas, dispostas a tambm considerarem outros interesses internos e externos, a basede duas diferenciaes clssicas de governana: shareholder e stakeholder

    Quanto s suas origens, h evidentes relaes entre os modelos tipo shareholder e as abordagens centradas na soluo dos conflitos de agncia entreproprietrios e gestores. Como resumimos no Quadro 1.3, os modelos shareholder so de origem anglo-saxnica. Como j destacamos, suas razes histricas so a diluio da propriedade acionria das grandes corporaes e

    QUADRO 1.3

    Razes e distinesfundamentais dos

    modelos de

    governana, quanto

    abrangncia dospropsitoscorporativos.

    Estruturas

    Shareholder

    Stakeholder

    Dimenses diferenciadoras

    Origem anglo-saxnica.

    Objetivos mais estritamente vinculados aos interesses dosacionistas: valor, riqueza e retomo.

    Indicadores de desempenho centrados em demonstraespatrimoniais e financeiras.

    Crescimento, riscos e retomes corporativos: avaliaes eaferies como focos da governana.

    Origem nipo-germnica.

    Conjunto ampliado de interesses: gerao abrangente devalor.

    Leque mais aberto de pblicos-alvo: integrados na estratgia corporativa.

    Amplo conjunto de indicadores de desempenho.

    Alm dos resultados patrimoniais e financeiros (que semantm essenciais), olhos voltados tambm para susten-tabilidade e funo social.

    Gerao de balanos ambiental e social.

    GOVERNANA CORPORATIVA; ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DE DESENVOLVIMENTO 35

  • a separao entre a propriedade e a gesto, como ocorre, predominantemente, nos Estados Unidos e no Reino Unido. Neste caso, como o conflito dominante se estabelece a partir da conduta oportunista dos administradores, oobjetivo central destes modelos de governana o de maximizar indicadoresprivados de retomo: a rentabilidade do negcio e o valor de mercado da empresa, reduzindo desvios que atendam mais aos interesses dos gestores, emdetrimento dos proprietrios. So da mesma tipologia os modelos, tambmshareholder, que visam a tratamento justo, com transparncia e com demonstrao responsvel de resultados, dos acionistas minoritrios pelos majoritrios controladores.

    J os modelos tipo stakeholder, tambm resumidos no Quadro 1.4, tmorigem nipo-germnica. Nestes modelos, a governana contempla um conjunto ampliado de interesses, no apenas os dos acionistas. Pblicos-alvointernos e externos alcanados diretamente pelas aes e pelos resultados dacorporao so objetos da ateno corporativa, quanto a seus direitos e interesses. O entorno tende a ser tambm mais enfatizado. E na esteira desses

    modelos que as corporaes, por metodologias hoje estruturadas, levantam epublicam, alm de demonstraes econmico-financeiras convencionais, seusbalanos social e ambiental. Ampliam-se os indicadores de desempenho. E aresponsabilidade corporativa resulta tambm ampliada.

    A Figura 1.5 uma tentativa de sntese dos modelos definidos a partirdesta lgica. Abrimos os do tipo shareholder em dois, diferenciando-os pelosinteresses a que atendem. E foram tambm abertos em dois os do tipo stakeholder, com o mesmo critrio. O mais avanado o de alto grau de abertura,no sentido de atender a um conjunto maior e mais abrangente de propsitose de resultados internos e externos.

    A Figura 1.5 enfatiza que as crenas, os valores, os princpios e prticas corporativas so mais abertas quando a estrutura da governana do tipo stakeholder avanado. Essa configurao no qualifica as crenas evalores, nem os cdigos de conduta corporativa - apenas enfatiza que somais abertos, assumindo um leque ampliado de interesses e comprometen-do-se com maior nmero de partes interessadas, que ento so abrangidaspelos propsitos corporativos. O mesmo se pode dizer, em sintonia com estespropsitos, da misso, da viso, dos focos estratgicos e dos fatores criticosde sucesso considerados pelas corporaes com modelos de governana maisamplos.

    Em configurao similar com a desenvolvida para a diferenciao dosmodelos centrados em conflitos de agncia restritos aos acionistas e gestores,a Figura 1.7 diferencia a tipologia da governana dos modelos shareholder estakeholder, partindo do atendimento dos interesses considerados. Nestecaso, entendendo-se que as estruturas mais abertas respondem de formamais abrangente s presses por responsabilidade corporativa em trs dimenses (econmico-financeira, ambiental e social), as melhores prticas de governana so as que atendem tanto aos interesses e direitos dos acionistas(majoritrios e minoritrios), quanto os de outras partes interessadas em seudesempenho (estratgico e operacional) e em suas aes (de alcance internoe externo).

    36 GOVERNANA CORPORATIVA

    Ifi 0)

    V (U

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 37

  • I-I c

    38 GOVERNANA CORPORATIVA

    FIGURA 1.7

    Tipologia dos modelos de governana segunda a abrangncia dos interesses atendidos.

    ESTRUTURA

    SHAREHOLDERi

    INTERESSES E

    DIREITOS DOS

    ACIONISTAS

    Atendidos

    Desatendidos

    Prticas quepodem ser

    conflituosas com

    outros interesses

    Melhores prticas'de govmaria

    Piores prticasde governana

    Prticas

    conflituosas com

    as expectativasdos acionistas

    Desatendidos Atendidos

    ESTRUTURA

    STAKEHOLDER:INTERESSES E DIREITOS

    DE OUTRAS PARTES

    As piores prticas seriam as de modelos que no atendem aos interessese direitos dos acionistas - por conflitos de agncia precariamente equacionados - nem aos direitos de outras partes interessadas - por desconsider-los.

    Outros Fatores Diferenciadores

    As diferenciaes usuais dos modelos de governana, tanto dos centrados na trade propriedade-gesto-retomo, quanto dos que levam em conta aabrangncia dos propsitos corporativos, no consideram todos os fatoresque definem na realidade os modelos efetivamente praticados. Como Becht,Bolton e Rell^i destacam, "as empresas tm mltiplos grupos de interesse eh mltiplas negociaes e compensaes que se entrelaam na definio desua estratgia e em suas operaes. Como conseqncia, diferentes soluespodem ser necessrias em funo da origem do controle, do mbito geogrficodas operaes e do tipo de atividade produtiva a ser governada. Por exemplo,projetos labor intensive podem demandar solues de governana diferentesdos projetos capital intensive; projetos com longos prazos de implementaoe maturao podem tambm exigir solues imprprias para projetos com

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 39

  • 3UADRO 1.4Fatores

    2Xtramercados e

    tio resultantes daabrangncia dospropsitoscorporativos quepodem diferenciarDS modelos

    praticados degovernana.

    Fatores

    diferenciadores

    Graus presumidos de complexidade dos .decorrentes modelos de govemana

    Intensividade

    de recursos

    Labor intensive

    Capital intensive

    Maiores, quanto aos interessesdos acionistas, nos projetos capital intensive. Mais complexos,quanto s presses de outraspartes interessadas, nos projetoslabor intensive.

    Tempo deimplementao

    e maturao

    Curto prazo

    Longo prazo

    Maiores, quanto gesto dasexpectativas dos acionistas, nosprojetos de longo prazo.

    Controle

    Familiar

    Consrcio

    Q Fundos de in

    vestimento

    Estatal

    Consrcios e grupos familiarestendem a ter maior complexidade no alinhamento estratgicodos acionistas. Estatais, na gesto de conflitos de agncia. Fundos de investimento, nas decises de constituio de carteirasconflitantes com interesses dos

    acionistas.

    Ascendncia

    nica

    Resultante de

    aquisies

    Q Resultante de-

    fuses

    A govemana nos casos de fuso tende a ser mais complexa.Razes principais: choques culturais, estrutura de poder e de-salinhamentos estratgicos.

    mbitogeogrficode atuao

    Nacional

    Global

    A governana de corporaesde atuao global seguramente mais complexa: exige ajustescaso a caso nos propsitos e noalinhamento com a cultura e as

    instituies de cada pas. Aabertura do capital em diferentes mercados aumenta a com

    plexidade.

    horizontes mais curtos. No h, portanto, um nico conjunto de regras universalmente aplicveis a todas as empresas em todos os lugares, at porque acultura, as instituies e as presses variam muito entre as naes".

    AUen e Gale,^^ Maher e Andersson,^^ Carlin e Mayer^'' tambm chamaram a ateno para outros fatores que podem modificar os padres da gover-

    40 GOVERNANACORPORATIVA

    As Razes

    Essenciais do

    Ativismo

    Pioneiro

    nana, adaptando-os s particularidades das empresas e dos pases em queoperam. Esses fatores diferenciadores interferem tanto nos processos de governana, quanto nos propsitos corporativos. Mas nenhum deles deixa deconsiderar as funes cruciais da governana: a proteo dos direitos e interesses dos acionistas e o bom equacionamento dos interesses de outras partesdiretamente alcanadas pelas aes corporativas.

    O Quadro 1.4 rene os principais fatores adicionais destacados pela literatura tcnica e observados na realidade prtica do mundo corporativo. Osgraus presumidos de complexidade so snteses conclusivas de investigaesacadmicas.

    Em sntese, os seguintes aspectos relevantes podem ser destacados do levantamento classificatrio dos conceitos e modelos de governana corporativa;

    1. Para alguns aspectos dos modelos bsicos de governana, o estgio em que se encontra a sistematizao do conhecimento ainda embrionrio.

    2. H grande diversidade de conceitos e modelos, no obstante jsejam;possveis agrupamentos e snteses, que devero convergirpara definies de mais alta propriedade.

    3. grande o nmero, a diversidade e a complexidade de fatoresque se entrelaam nos processos de governana. Na realidade, huma grande variedade de fatores determinantes das prticas degovernana. Eles reproduzem diferentes condies histricas einstitucionais dos pases.

    4. As prticas de governana podem variar em funo de fatoresno necessariamente derivados de condies institucionais, demarcos regulatrios ou^^da abrangncia dos modelos adotados.So tambm fatores determinantes os prazos de maturao dosprojetos, a intensividade dos recursos empregados, a ascendnciadas empresas, a origem do capital, a composio dos acionistas eo mbito geogrfico de atuao.

    5. Destacam-se, porm, como razes-chave de desenvolvimento dagovernana corporativa os conflitos de agncia e as presses sociais por maior amplitude dos objetivos corporativos.

    1.2 Razes e Fatores de Desenvolvimento

    o Quadro 1.5 resume as razes que motivaram, desde a segunda metade dos anos 80, mas mais fortemente na ltima dcada sculo XX, a proposio, o desenvolvimento e a gradativa adoo de melhores prticas de governana corporativa.

    As razes histricas para o despertar da governana so bem conhecidas. Mas importante registr-las, chamando a ateno para as questes essenciais da govemana, como os conflitos de agncia.

    GOVERNANA CORPORATIVA; ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 41

  • QUADRO 1.5

    Despertar dagovernana

    corporatva; razesiniciais de

    desenvolvimento.

    Problemas

    cotporativos

    De Para

    Condiesprevalecentes

    Mudanas almejadas

    Relacionamento

    acionistas-corporaes

    Falhas e descontinui-dades.

    Inconformidades estatutrias e legais.

    Opacidade: acessoprivilegiado a informaes.

    Desprezvel participao efetiva de minoritrios.

    Papis e relaesconflituosas.

    Ajuste e regularidade.

    Conformidade.

    Transparncia.

    Democracia acionria.

    Clareza na definiode papis: acionistas,conselho, direo.

    Gesto;

    constituio dosconselhos deadministrao

    Mandatos irremov-veis.

    Mrito e competncia desconsiderados.

    Conflitos de interes

    se presentes!

    Baixa eficcia: proforma preponderan-do sobre efetividade.

    yUtemncia.

    Exigncia: perfis deexcelncia.

    Harmonizao deconflitos.

    Comprometimento,responsabilidade, resultados.

    Gesto: atuaoda direoexecutiva

    Diretrizes impactan-tes no consnsadas.

    Conflitos entre resul

    tados de curto e delongo prazo.

    Conflitos com interesses dos acionistas.

    Manipulaes contbeis: resultados forjados.

    Ampla avaliao ehomologao peloconselho.

    Gesto de resultados.

    Alinhamento negociado.

    Prestao responsvel de contas: rigorna demonstrao deresultados.

    Proposio decdigo demelhores

    prticas

    Elaborao pioneira.

    Presses para enquadramento das corporaes.

    Denncias pblicasde descumprimento.

    Aperfeioamentosconsensados.

    Progressiva adoo.

    Q Penalizaes pelomercado e coerolegal.

    42 GOVERNANA CORPORATIVA

    A maior parte das empresas nasce de fundadores-proprietrios, que inicialmente acumulam asfunes de proprietrios e gestores. medida que asempresas crescem e, com o passar db tempo, seus fundadores morrem, nemsempre os descendentes renem condies ou tm interesse em substitu-los,mas herdam a propriedade. O processo inevitvel ento o de separao entre a propriedade e a gesto - um processo que avana e se desdobra com ocorrer do tempo, tomando a propriedade ainda mais dispersa entre milharesde acionistas no organizados, cada vez mais afastados da administrao diria dos negcios. Junto com este processo, h outros de conseqncias iguais,mas de origens diversas. Entre estes, a abertura do capital de empresas atento fechadas; ou a emisso de capital para expanso de empresas abertas.Ou ainda a diversificao das carteiras de investidores, que trocam combinaes mais concentradas por maior disperso, buscando a compatibilizaotima entre retornos e riscos.

    Todos esses movimentos levam crescente disperso da propriedade,que pode tomar-se problemtica - como de fato se tomou, tanto nos EstadosUnidos quanto no Reino Unido, pases beros da moderna governana. E amaior parte dos problemas tem a ver com as desconfortveis questes corporativas que se acumularam nestes pases e em todos os demais que os seguiram no estabelecimento de melhores prticas de govemana. Esses problemas esto tambm sintetizados no Quadro 1.5 e podem ser apontados comorazes do despertar da govemana. Distribuem-se trs conjuntos:

    1. Relacionamento acionistas-corporaes.

    2. Constituio dos conselhos de administrao.

    3. Atuao da diretoria executiva.

    Relaes acionistas-corporaes. No relacionamento entre proprietrios dispersos e no organizados observavam-se falhas e descontnuida-des, boa parte das quais relacionada ao no-reconhecimento da agenda corporativa anual e gradual destmio de relaes formais e regulares. Outrasfalhas, e ainda mais graves, decorriam de inconformidades estatutrias e legais,da desprezvel participao de minoritrios nos processos decisrios, de relaes internas conselhos-direo crescentemente conflituosas pela indefiniode papis, de opacidade e do acesso privilegiado a informaes. Essas condies contrastavam com as almejadas - regularidade, conformidade, transparncia, democracia acionria e clareza na definio dos papis dos acionistas, dosconselhos e da direo executiva das corporaes.

    Constituio dos conselhos. Nombito dos conselhos de administrao, as condies desconfortveis que se acumularam desaguaram na baixa eficcia desses colegiados corporativos. Dalton. Daily, Ellstrand e John-son2= evidenciaram que a maior parte dos conselhos eram colegiados pro forma, "pouco ocupados em agir no interesse dos proprietrios, monitorando econtrolando formalmente os executivos de alto nvel da corporao; em geral. no questionavam enfaticamente as aes oportunistas dos gestores.

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DE DESENVOLVIMENTO 43

  • aprovavam facilmente iniciativas que eles propunham em proveito prprio,no cumprindo ento uma de suas mais importantes funes, a de protegeros direitos dos acionistas, dos quais so agentes fiducirios". E mais: Sewarde Walsy^ evidenciaram outros defeitos dos conselhos, como "a desconsiderao do mrito e da competncia na indicao de seus membros. Mas, a despeito disso, boa parte deles tinha mandatos irremovveis".

    Com o advento da boa governana, os conselhos passaram a ser objetode mudanas, at porque a legislao, em praticamente todos os pases, sempre lhes conferiu amplospoderes para dirigir os assuntos das organizaes.Aalternncia dos membros tomou-se regra. Buscaram-se para a composiocritrios tecnicamente mais rigorosos e seus membros passaram a ser cobrados, e at avaliados, quanto ao seu comprometimento com os objetivos e osresultados corporativos.

    Atuao da direo. Por fim, os modos de atuao da direo executiva das corporaes, com os quais os acionistas revelavam crescente desconforto, completavam a trade de problemas que levaram ao atlvismo pormudanas. As questes centrais, no mbito da direo, eram relacionadascom os conflitos entre seus interesses e os dos acionistas; controladores ou minoritrios.

    Sob a denorninao genrica de conflitos de agncia, h pelo menosquatro aspectos da gesto em que o agenciamento mostrava-se ineficaz,quando no frontalmente prejudicial aos interesses dos proprietrios:

    1. Autobenefcios em escalas exageradas.

    2. Gesto mais focada no curto prazo.

    3. Diretrizes impactantes no onsensadas.

    4. Estratgias defensivas.

    Evidncias de pesquisas tm documentado que h, realmente, grandevariedade de conflitos de agncia nas modernas corporaes. No Quadro 1.6resumimos uma interessante analogia compilada por Hitt, Ireland e Hoskis-son:^^ exorbitantes pagamentos a executivos-chefe que recebem mais que oseu peso em ouro.

    Wright e Ferris^ mostraram que "apenas uma parte dos conflitos tem aver com a astcia oportunista de prticas autoconcedentes de benefcios,exa-geradamente conflitantes com a gerao de valor para os acionistas, como remuneraes e bnus da alta gerncia, em nveis cada vez mais altos em relao aos j questionveis nveis praticados do mercado de executivos".

    Outros conflitos resultam de gesto mais focada em gerar resultados decurto prazo, que no se sustentam no longo, mas que produzem uma espciede "falso brilho", que, embora efmero, implica pagamentos correntes deprmios no condizentes com a sustentabilidade dos negcios corporativosque, neste caso, est sendo afetada.

    44 GOVERNANA CORPORATIVA

    QUADRO 1.6Uma analogia: CEOs que valem mais que seu peso em ouro.

    Conta a tradio oral que, h muitos anos, ossultes eram pagos de acordo com o seu peso emouro. E, desde ento, tomou-se parte dos ditospopulares a analogia entre as altas remuneraes e os pesos era ouro daqueles que as recebem. Atualmente, com o grama do ouro custando cerca de US$ 13,2, uma pessoa que pese 70quilos, ou 70.000 gramas, receberia US$ 92^1. milpor ano, ou US$ 77 mil por ms. Realmente, umaexcepcional remunerao, que praticamente a totalidade das pessoas gostaria de receber.

    Mas. uma grande parte dos CBOs dos EstadosUnidos no valorizaria muito essa remunerao.No final dos anos 90, eles recebiam muito maisdo que isto. Em 1999, a remunerao mdia totaldos CEOs norte-americanos era um pouco inferiora US$ 10 milhes anuais, aproximadamente 12 a13 vezes o seu peso mdio em ouro. Alm disso,muitos deles recebiam pacotes de pagamento altamente atraentes quando deixavam as corporaes a que tinham servido, um adeus dourado, umgoMen goodbye. H casos conhecidos que variamde US$ 20 a 70 milhes, justificados por dificuldades da corporao que demitia em recolocar oCEO no mercado por remunerao compatvelcom a que vinha recebendo em mdia mundial.

    Remuneraes de CEOs desta ordem de grandeza no so reproduzidas fora dos Estados Unidos. Mas, ainda assim, o peso em ouro superado por valores que variam entre US$ 4 milhesanuais (corporaes da Europa Ocidental e doCanad) e US$ 300 mil (corporaes do Japo).

    Ainda que em sua maior parte esses valores sejam recompensados pelo desempenho operacionaldas corporaes, eles tm sido julgados excessivos,confiitando com o interesse dos acionistas, no sentido de representarem custos de agncia muito elevados. A contrapartida corretiva, que desde o finaldos anos 80, mas mais fortemente nos anos 90,vem sendo sugerida e crescentemente praticada aligao das remuneraes anuais ao desempenhodas aes das companhias. Desta forma, tem-setomado comum a recompensa dos altos executivoscom stock opcions- opes de compra das aes dacompanhia a preos predeterminados. Trata-se deincentivo para a sustentao do desempenho dasempresas e de seus valores de mercado em altosnveis, afetando a riqueza tanto dos acionistasquanto da direo executiva e assim harmonizandoos seus interesses.

    At o imcio dos anos 80, as stock options representavam 2% da remunerao dos CEOs das companhias norte-americanas. Esta proporo subiupara 26% em 1994, superando 50% no final dosanos 90. Este tipo de recompensa est tomando-seuma das ferramentas das boas prticas de governana corporativa.

    Fonte: Sntese elaborada com base no texto de aber

    tura do captulo 10. Corporate Govemance.de M. A. Hitt, Strateg: management: compe-ttiveness and globalization. Cindnnati. Chio:South-Westem CoUege Publishing, 2001. Dados extrados de G. Colvin, The big payoff:CEOs. are getting pots of money just for get-ting out of the way. Fonune, 22 Feb. 2000.

    Por fim. no plano estratgico, a direo pode preferir estratgias defensivas, que protegem-na de demisses por maus resultados, deixando de ladoestratgias de riscos mais altos que, bem gerenciadas, resultariam em maiores retornos para o capital investido. Como as diretrizes estratgicas propostas pela direo executiva nem sempre so previamente onsensadas com osacionistas, podem ser implementados projetos que atendem mais aos interesses dos gestores, afetando negativamente os dos proprietrios.

    As presses por melhores prticas de governana que passaram a serexigidas por acionistas visaram corrigir esses desvios de conduta e essas defi-

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 45

  • OS FATORES

    cincias gerenciais. Na origem dos primeiros cdigos de governana encontram-se, assim, reaes de acionistas organizados ou de proprietrios institucionais, como os fundos mtuos de aes e os fundos de penso que serebelaram contra as prticas viciosas que ao longo dos anos, com o divrcioda propriedade-gesto, estabeleceram-se nas corporaes. Em contrapartidaaos vcios corporativos estabeleceu-se uma espcie de empowerment dosacionistas - uma fora que se posicionou favoravelmente s mudanas quelevaram ao despertar da governana corporativa. Como veremos a seguir, estas mudanas ocorreram simultaneamente em vrios pases, desenvolvidos eemergentes. E um dos mais importantes resultados foi a proposio pioneirade cdigos de melhores prticas, que se difundiram com rapidez, paralelamente s presses para enquadramento das corporaes.

    A estesvcios somaram-se as manipulaes contbeis para forjarresultados, uma prtica inadmissvel nos anos de formao do moderno capitalismocorporativo, mas que passou a ocorrer em escala crescente nas duas ltimasdcadas do sculo XX, apesar das exigncias por sistemas crescentemente sofisticados de auditoria independente, estabelecidos em regulamentos internos e em institutos legais.

    s razes determinantes das proposies pioneiras somaram-se, emanos recentes, outros fatores externos'e internos, destacados no Quadro 1.7,que tm conduzido a governana corporativa a uma posio dealta relevn-

    MAIS Recentes (.j^ entre as prticas mais modernas e mais avanadas de gesto.Esses fatores so interagentes. Os externos impactam fortemente os in

    ternos. E estes tambminfluenciam mudanas no macroambiente, no grandeentorno em que as corporaes operam. A maior parte destes fatores, especialmente os externos, de recenteocorrncia: so mudanas observadas nosltimos dez anos, que se consolidaram na transio do sculo XX para o XXI.

    Os Fatores Externos

    Os determinantes externos s corporaes podemser agrupados em trsconjuntos:

    1. As mudanas no macroambiente.

    2. As mudanas no ambiente de negcios.

    3. As revises institucionais.

    As mudanas no macroambiente. Uma das mais impactantesmacromudanas da transio do sculo XX para o XXI, desencadeada com ofim das hostilidades Leste-Oeste, com a ruptura da Cortina de Ferro, com adesintegrao da antiga URSS e com a constituio daUnio Europia, foi oavassalador processo de desfronteirizao de mercados reais e financeiros e a

    46 GOVERNANA CORPORATIVA

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  • conseqente constituio de blocos econmicos. Na esteira da criao daUnio Europia, o primeiro grande bloco depases economicamente unificados, alianas que vinham sendo ensaiadas nos outros continentes foram revitalizadas e outras se estabeleceram, como o NAFTA. Como resultado desseprocesso, em todos os continentes, hatuahnente diferentes formas de integrao de mercados, com fortes impactos naestratgia corporativa. J soma151 o nmero de pases que esto integrados ou que negociam projetos deintegrao, abrangendo 92% do Produto Mundial Bruto.

    As unies nacionais, os mercados comuns, as reas de livre comrcio eos acordos bilaterais impactaram fortemente o mundo corporativo, com aquebra debarreiras deentrada em praticamente todos os negcios. Acompetio tomou-se mais acirrada. A competitividade e a produtividade foramcomo nunca estimuladas. Uma ondade privatizaes encerrou um longo dclode estatizao. Com o desengajamento do estado-empresrio, abriram-se novas oportunidades de negcios para as corporaes privadas na indstria debase e em outras reas de alto interesse estratgico.

    Este conjunto demudanas nomacroambiente econmico - sintetizvelem trs expresses, abertura, esfronteirizao e macroalianas - ampliouos fluxos de comrcio e os financeiros, promoveu maior uniformidade dasinstituies nacionais e aumentou a interdependncia das estratgias dos pases. Onacionalismo, o protecionismo e os objetivos deautp-suficincia foramsubstitudos pela insero global negociada, pela gesto demercados interco-nectados e pela quebra de velhas hegemonias nacionais. Estabeleceram-senovos competidores nacionais em todas as cadeias denegcio. Os movimentos internacionais de capitais jamais foram to intensos - exigveis, de investimento produtivo direto e especulativos volteis. Em conseqncia, pasesemergentes, como osdo Sudeste Asitico, daAmrica Latina oudoLeste Europeu, ou reemergentes, como a Rssia, tomaram-se altamente sensveis a ataques especulativos e a crises, de alto efeito contagiante.

    As mudanas no ambiente de negcios. Com as mudanas naordem global, o ambiente de negcios tambm mudou substantivamente.Ocorreram reestruturaes setoriais, estabelecendo-se novas estmturas decompetio. Os mercados abriram-se, as barreiras tarifrias de proteo foram mundialmente rebaixadas, embora em contirapartda tenham sido criadas barreiras no tarifrias de vrios tipos Cfitozoosanitrias, ecolgicas, sociais, requisitos de qualidade e especificaes tcnicas de produtos).

    Com tudo isto ocorrendo simultaneamente, o ambiente de negciostornou-semais complexo. Nunca as mudanas haviam sidoto rpidas e aomesmo tempo to profundas. Foram quebrados os ambientes estveis e ex-trapolveis, de riscos e oportunidades previsveis. As expresses-chave passaram a ser a descontnuidade, a incerteza e a turbulncia. Como conseqncia, os resultados dos negcios corporativos tomaram-se tambm menosseguros e mais expostos aos impactos destas novas realidades.

    As'revises institucionais. Estes movimentos coincidiram historicamente com as reaes quej se haviam avolumado dentro do prprio

    48 GOVERNANA CORPORATIVA

    mundo corporativo, seja pelos conflitos de agncia cada vez mais expressivos, seja pela exigncia de estratgias de negcios melhor avaliadas e filtradas por conselhos competentes'

    s manifestaes ativistas isoladas somaram-se movimentos institucionais mais consistentes.

    De um lado, os investidores institucionais tomaram-se mais ativos, assumindo posturas mais fortes e intervencionistas, tanto em seus pases, comonaqueles em que as corporaes de seu portflio de investimentos passarama investir. Isto sem contar que eles prprios passaram a diversificar globalmente suas prprias carteiras. Como Brancato^' registra, "quando os investidores institucionais, tanto nos Estados Unidos quanto do Reino Unido, comearam a investir mais em outros mercados de capitais, eles se tomaram cadavez mais interessados nas prticas de govemana corporativa adotadas emoutros pases".

    De outro lado, a esses movimentos, j suficientemente fortes para produzir revises institucionais, somaram-se, em anos mais recentes, as reaesdas autoridades reguladoras e das instituies do mercado de capitais aos escndalos corporativos. Estes j no decorriam apenas de conflitos de agncia,mas de fraudes. E as respostas foram rpidas, atacando em dois fronts:

    1. Regulao legal mais abrangente e mais severa, como alei Sarbanes-Oxley nos Estados Unidos.

    2. Profuso de cdigos de governana corporativa, que vinham sendo ensaiados isoladamente e que, ento, passaram a serdefinidos em extenso nmero de pases, cobrando pela adoodas melhores prticas definidas por instituies multilaterais, organizaes profissionais e instituies do mercado acionrio.

    Os Fatores Internos

    A este conjtmto de determinantes externos s corporaes sobreps-seoutro conjunto, tambm extenso, de fatores internos. Estes foram geradosdentro das empresas, embora a maior parte deles seja resultante das mudanas nos ambientes macro e de negcios. As linhas da influncia recproca entre eles so to visveis e fortes que difcil separar causas e efeitos de cadaum deles. E, quando assim, estamos na verdade diante de uma transformao de razes e de contedos histricos.

    As linhas das influncias internas que mais tm levado adoo dasprticas de govemana corporativa tambm podem ser agmpadas em trsconjuntos:

    1. As mudanas societrias.

    2. Os realinhamentos estratgicos.

    3. Os reordenamentos organizacionais.

    GOVERNANA CORPORATIVA: ABRANGNCIA, RAZES E FATORES DEDESENVOLVIMENTO 49

  • so

    As mudanas societrias. Em resposta s mudanas que ocorreram nas condies externas, desencadeou-se uma onda sem precedentes dereestruturaes societrias. Em momento algum haviam ocorrido tantasprivatizaes, fuses, cises e aquisies de empresas. No Brasil, por exemplo, entre 1990-2002, o nmero de transaes foi de4.875, com mdia anualacumulada de 377 - trs em cada dois dias teis, durante 13 anos. Destastransaes, 2.278, 46,7% do total, tiveram participao estrangeira. E boapartedestes casos, especialmente nasprivatizaes, deuorigem a alianas estratgicas, associaes e consrcios, que aglutinaram, dentro dos conselhosde administrao e nas diretorias executivas, atores de diferentes formaesprofissionais, com experincia emdiferentes negcios e convivncia em culturas organizacionais distintas.

    S estas ocorrncias j seriam suficientes para produzir mudanas nagovernana das empresas. Mas houve mais, no mbito societrio. Avoluma-ram-se nos anos 90 os processos sucessrios em todo o mundo. A estruturaempresarial do final do sculo passado, uma das mais importantes heranashistricas do industrialismo do segundo ps-guerra, foi em grande parte edifi-cada nos anos 50 e 60. Trinta anos depois, a gerao que a empreendeu passou a ser sucedida por uma segundagerao. E, com as sucesses, avoluma-ram-se os casos de mudanas no controle acionrio, estabelecendo-se novosacordos entre acionistas remanescentes.

    Os realinhamentos estratgicos. As mudanas societrias, juntocom outros fatores internos, levaram ao realinhamento estratgico das corporaes. Eles se tomaram necessrios pelas reestruturaes havidas no ambiente competitivo, tanto as resultantes da abertura dosmercados, quanto asimpostas pelas fuses e aquisies, quanto, ainda, as que vierem com a ondamundial de global-localizao das empresas.

    A gesto desses alinhamentos, independentemente de seus contedos,exigiu novos modelos de governana, tanto paraa formulao da estratgiaquanto paraasoperaes e o seuacompanhamento. Derivam desta exignciaas seguintes observaes de Dupas:^"

    cada vez mais complexo o conjimtode dilemas e oportunidadesque exigem sempre resposta estratgica adequada da empresa, seela quer manter-se dinmica e bem-sucedida, o que obriga os scios controladores das empresas a alteraes continuas de estratgias, buscando alianas e espaos polticos onde seus interessespossam ser preservados.

    O entendimento de que a empresa moderna um campo permanente de mudanas muitas vezes abre uma zona de conflito comexpectativas ou histricos de interesse que precisam ser administrados com cuidado e prontido.

    A "zona de consenso" a rea sobre a qual a "harmonia possvel"do grupo se estabelece para suportar decises conjuntas. Evidentemente, quanto maior esta regio, maiores chances tem a em-

    GOVERNANA CORPORATIVA

    presa de superar situaes difceis. Sovrios os espaos disponveis para harmonizao de interesses entre os scios, semprepartindo do pressuposto de que o alargamento da "zona de consenso" fundamental para garantir uma deciso de qualidade ea manuteno do foco estratgico em benefcio do patrimniofuturo de todos, respeitando minimamente as singularidades decada um.

    A premncia desses realinhamentos acaba por conduzir definio deprticas de boa governana corporativa. Sem estas, dificilmente sero eficazes os sistemas de relaes exigidos para que se estabeleam condies bsicas para realinhamentos estratgicos de boa qualidade, consensados entre osacionistas e, por extenso, entre outras partes interessadas.

    Os reordenamentos organizacionais. As mudanas internas requeridas por reequacionamentos sucessrios e reaUnhamentos estratgicosconduzem necessariamente a reordenamentos organizacionais que tambmdesguam na adoo das melhores prticas de governana corporativa.

    FIGURA 1.8

    Fatores determinantes da adoo de boas prticas de governana corporativa.

    Fatores externos s corporaes,que pressionam por

    redefinio de conceitos eredirecionamento de aes:

    1. Mudanas no macroambiente2. Mudanas no ambiente de negcios

    3. Revises institucionais

    Fatores internos, presentes eatuantes dentro das

    corporaes:

    1. Mudanas societrias2. Realinhamentos estratgicos

    3. Reordenamentos organizacionais

    ASSIMILAAO EINTERNAUZAO DAS

    PRTICAS DEGOVERNANACORPORATIVA

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    Entre estes reordenamentos, destaca-se a crescente profissionalizaoda gesto, no sentido de adoo de modelos mais avanados. Estes comeampela clareza na separao formalizada dos papis dos acionistas (foco na gesto do patrimnio), da direo executiva Cfocada na gesto dos negcios) edos conselhos de administrao (focados na conciliao de interesses, na gesto de resultados e no objetivo maior de atuar como guardio dos valorescorporativos).

    Um dos resultados desse conjunto interativo de fatores determinantes,externos e internos, tem sido a assimilao e a internalizao das melhoresprticas de governana corporativa, como sintetizamos na Figura 1.8. Nosurpreende, pois, que, com estas razes, a adoo dessas prticas seja um dosmais relevantes imperativosdo novo mundo corporativo, em todos os pases -dos mais tradicionais empreendedores, onde surgiram as grandes corporaes, aos mais recentes emergentes.

    RESUMO

    1. Seguramente, governanacoiporativa no um modismo a mais. Seu desenvolvimento tem razes firmes. E sua adoo tem razes substantivas para se disseminar. Organizaes multilaterais, como as Naes Unidas e a OCDE, vem asboas prticas de governana como pilares da arquitetura econmica global e umdos instrumentos do desenvolvimento sustentvel em suas trs dimenses - a

    econmica, a ambiental e a social.

    2. Amplamente difundidas e internalizadas no mundo corporativo, as prticas degovernana abrangem grande elenco de panes interessadas. Tratam, em essncia, dos interesses dos acionistas, em suas relaes com os conselhos de administrao e com a direo execut