influÊncia do uso de materiais alternativos em … · the capillary water absorption was performed...

16
111 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017 INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO Influence of the use of alternative materials in internal coating mortar: evaluation of thermal insulation Anderson Golub 1 , Cristiano Vitorino da Silva 2 1 Engenheiro Civil formado pela Universidade Regional do Alto Uruguai e das Missões - URI Erechim 2 Professor Doutor do curso de Engenharia Civil da Universidade Regional do Alto Uruguai e das Missões - URI Erechim. E-mail: [email protected] Data do recebimento: 31/01/2017 - Data do aceite: 12/05/2017 RESUMO: O presente trabalho apresenta uma avaliação do potencial de iso- lamento térmico e absorção de água em argamassas de revestimento interno pela adição de materiais alternativos como raspas de pneu moídas e resíduos da indústria como a areia de fundição e as cinzas pesadas, oriundas da queima de carvão em centrais termelétricas. Foi realizada uma análise da utilização desses resíduos em argamassas de revestimento e seus resultados foram compa- rados com as argamassas convencionalmente usadas na construção civil. Para a avaliação do isolamento térmico, tomou-se como parâmetro de referência a condutividade térmica do material. Uma bancada de testes foi projetada e construída conforme a Norma ASTM E1225/2013 para o levantamento dessa propriedade. A análise da absorção de água por capilaridade foi realizada, segundo a ABNT NBR 9779/2012. A caracterização dos materiais alternativos aplicados na mistura, bem como dos próprios componentes convencionais da argamassa, foi realizada em conformidade com as normas vigentes. As concentrações dos componentes da argamassa foram determinadas seguindo uma proporção de 1:2:8 (cimento, cal e agregado, respectivamente) para a argamassa convencional. Para os estudos de caso, tem-se parte do agregado convencional (areia), substituído nas proporções de 50% e 75% pelos materiais alternativos. Como resultados finais, constata-se que a substituição fracionada da areia por raspas de pneu moídas e cinzas pesadas de carvão na argamassa de revestimento diminui a condutividade térmica da mistura e, no caso da adição de areia de fundição, a substituição não apresenta redução.

Upload: phungdiep

Post on 11-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

111

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE

REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

Influence of the use of alternative materials in internal coating mortar: evaluation of thermal insulation

Anderson Golub1, Cristiano Vitorino da Silva2

1 Engenheiro Civil formado pela Universidade Regional do Alto Uruguai e das Missões - URI Erechim2 Professor Doutor do curso de Engenharia Civil da Universidade Regional do Alto Uruguai e das

Missões - URI Erechim. E-mail: [email protected]

Data do recebimento: 31/01/2017 - Data do aceite: 12/05/2017

RESUMO: O presente trabalho apresenta uma avaliação do potencial de iso-lamento térmico e absorção de água em argamassas de revestimento interno pela adição de materiais alternativos como raspas de pneu moídas e resíduos da indústria como a areia de fundição e as cinzas pesadas, oriundas da queima de carvão em centrais termelétricas. Foi realizada uma análise da utilização desses resíduos em argamassas de revestimento e seus resultados foram compa-rados com as argamassas convencionalmente usadas na construção civil. Para a avaliação do isolamento térmico, tomou-se como parâmetro de referência a condutividade térmica do material. Uma bancada de testes foi projetada e construída conforme a Norma ASTM E1225/2013 para o levantamento dessa propriedade. A análise da absorção de água por capilaridade foi realizada, segundo a ABNT NBR 9779/2012. A caracterização dos materiais alternativos aplicados na mistura, bem como dos próprios componentes convencionais da argamassa, foi realizada em conformidade com as normas vigentes. As concentrações dos componentes da argamassa foram determinadas seguindo uma proporção de 1:2:8 (cimento, cal e agregado, respectivamente) para a argamassa convencional. Para os estudos de caso, tem-se parte do agregado convencional (areia), substituído nas proporções de 50% e 75% pelos materiais alternativos. Como resultados finais, constata-se que a substituição fracionada da areia por raspas de pneu moídas e cinzas pesadas de carvão na argamassa de revestimento diminui a condutividade térmica da mistura e, no caso da adição de areia de fundição, a substituição não apresenta redução.

112 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

Palavras-chave: Isolamento térmico. Condutividade térmica. Argamassas de revestimento. Materiais alternativos.

ABSTRACT: This study presents an assessment of the potential for thermal insulation and water absorption in lining mortars by the addition of alternative materials such as crushed tyre chips and industrial waste like foundry sand and bottom ash derived from burning coal in thermal power plants. An analysis of the residue was carried out using these coating mortars and the results were compared to the mortars conventionally used in construction. The thermal conductivity of the material was used as a benchmark for the evaluation of the thermal insulation. A test bench was designed and built according to the ASTM E1225/2013 Standard for the lifting of this property. The analysis of the capillary water absorption was performed according to the ABNT NBR 9779/2012. The characterization of the alternative materials used in the mix-ing, as well as the specific mortar conventional components was carried out according to the current regulations. The concentrations of the mortar com-ponents were determined following a proportion of 1:2:8 (cement, lime and aggregate, respectively) for conventional mortar. For the case studies, part of the conventional aggregate (sand) was replaced by alternative materials at proportions of 50% and 75 %. As final results, it can be noticed that fractional replacement of sand by crushed tyre chips and coal ash in mortar coating de-creases the thermal conductivity of the mixture, and in case of adding foundry sand, the replacement does not present any reduction.Keywords: Thermal insulation. Thermal conductivity. Coating mortars. Al-ternative materials.

Introdução

Atualmente, a sustentabilidade vem se tornando o centro de discussões em diversos setores, sendo que na construção civil, este tema está se destacando cada vez mais. Se-gundo Margon (2002), focando a indústria da construção civil, racionalização, controle do desperdício, economia, competitividade, qua-lidade e desempenho, são termos que norteiam a nova ordem das construtoras. Entretanto, estes termos sugerem várias ações a serem desenvolvidas para atingir-se a plenitude desta nova ordem, bem como ações que devem se desenvolver em todas as etapas do processo

construtivo. Desta forma, os componentes das argamassas podem ser grandes balizadores nesta busca pelo reuso dos subprodutos da indústria, desde que estas adições não pre-judiquem a sua resistência, durabilidade e propriedades especificadas em normas.

O estudo do emprego de materiais alter-nativos na construção civil pode, além de procurar solucionar problemas ambientais como o destino final dos resíduos industriais, colaborar com respostas para questionamen-tos existentes, trazendo novos conceitos de qualidade, propriedades e características dos materiais a serem empregados e, ainda, buscar uma nova fonte de matéria-prima.

113

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

As cinzas pesadas, oriundas da queima do carvão mineral, são subprodutos que resultam da combustão deste combustível em caldeiras de centrais termoelétricas, sendo este um resíduo com sérios problemas em relação ao seu descarte final. Seu uso na composição de argamassas se dá a partir da verificação de suas características físicas, que se assemelham muito com as características da areia (agre-gado miúdo) utilizadas na construção civil.

A areia de fundição, subproduto resultante do método utilizado para fabricação de mol-des para peças fundidas nas indústrias meta-lúrgicas, também, tem potencial de utilização como agregado miúdo na composição de argamassas na construção civil. Atualmente, grande parte deste resíduo é descartado em aterros sanitários, assim gerando problemas de contaminação do lençol freático e do solo, bem como afetando a fauna das regiões. Na indústria da construção civil já é possível perceber seu reaproveitamento (em pequena escala) na confecção de blocos de concreto, mas sua adição em argamassas, ainda, é pouco estudada.

As raspas de pneu moídas, oriundas de um processo de reciclagem das carcaças dos pneus (normalmente separa-se a borracha das fibras e tudo é fragmentado para reduzir o volume nos lixões), também apresenta po-tencial de utilização como agregado miúdo na argamassa, sendo uma grande possibilidade para destinação deste material, resolvendo-se, assim, uma grande questão ambiental atual, pois estima-se que no Brasil são descarta-dos cerca de 17 milhões de pneus por ano, resultando em um volume considerável de resíduo que precisa de destinação adequada para evitar problemas ambientais. O reuso de subprodutos dos pneus já é muito explorado em diversas áreas da construção civil tais como estradas, materiais de construção e ci-ência dos materiais. Porém, uma nova forma de reutilização poderá melhorar a logística de destinação deste resíduo.

Atualmente, a questão térmica em edi-ficações está sendo muito estudada com o intuito de melhorar o conforto do usuário e a economia de energia, além da obrigatorie-dade de atendimento à recente atualização da Norma de Desempenho de Edificações (NBR 15575/2013). Visando verificar a possível me-lhora do desempenho térmico e reutilização dos subprodutos da indústria, propõe-se um estudo da influência da adição destes subpro-dutos da indústria, tais como cinzas de car-vão (pesadas), areia de fundição e raspas de pneu, na argamassa de revestimento interno, utilizada para o acabamento de edificações na construção civil. A principal característica a ser analisada é o potencial de isolamento térmico, uma vez que nas edificações este parâmetro é de suma importância. Para esta análise, toma-se a condutividade térmica como parâmetro de resposta do estudo, uma vez que esta propriedade está diretamente li-gada às características de isolamento térmico.

O objetivo deste trabalho é o de avaliar a influência da adição de materiais alternativos como as cinzas de carvão (pesadas), raspas de pneu e areia de fundição no nível de isola-mento térmico em argamassa de revestimento interno usada na construção civil.

Revisão Bibliográfica

Ha uma tendência cada vez maior para o uso de materiais alternativos não só na cons-trução civil, mas em todos os seguimentos da indústria. Tendo em vista, nas últimas décadas, a constante degradação do meio ambiente, estão sendo realizados muitos estudos e análises para o reaproveitamento de materiais que atualmente são descartados sem qualquer precaução.

Voltando-se para a análise da resistência e da caracterização, Margon (2002) estudou a influência da adição de cinzas de carvão mineral em argamassas. Para as propriedades

114 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

no estado fresco das argamassas, a trabalha-bilidade, na maioria dos traços dosados com a incorporação do resíduo, exigiu uma maior relação água/cimento para se atingir uma consistência de 255 ± 10 mm de diâmetro de espalhamento. No ensaio de exsudação, verificou-se maiores valores quando compa-radas com a argamassa de referência, sendo esta propriedade diretamente ligada com a trabalhabilidade. Para as argamassas com adição de cinzas de carvão observou-se um aumento de 0,6% na exsudação. Já em rela-ção as propriedades no estado endurecido, a resistência à compressão da argamassa teve uma constante melhora, sendo que aos 90 dias de idade, as argamassas com adição de cinzas de carvão ultrapassaram a argamassa de referência em ± 4 MPa. Quando analisado o índice de vazios, percebe-se que quanto maior o teor de cinzas de carvão adiciona-das à argamassa, maior é o índice, assim, visualizando-se um ponto fraco causado pela adição das cinzas. Em relação à resistência de aderência à tração, percebeu-se que a argamassa de referência obteve os maiores valores quando comparados com a argamas-sa com adições, tendo uma variação média de ± 0,19 MPa. (MARGON, 2002).

Meneguini (2003) verificou em seus es-tudos que o uso do pó de borracha de pneus reciclados, tratados com hidróxido de sódio comercial, melhora a trabalhabilidade de ar-gamassas, talvez até substituindo, em alguns casos, o uso de aditivos não comprometendo a absorção de água por capilaridade e não diminuindo a resistência à compressão, o que não ocorre em relação à tração por compressão diametral. Além dos resultados descriminados anteriormente, concluiu-se que com o emprego de pó de borracha, ocor-re um considerável aumento da resistência ao desgaste além da diminuição da densidade aparente da argamassa.

Com relação à resistência mecânica de materiais usados na construção civil com

adição de resíduos de borracha, Ali et al. (1993) em seus estudos, ensaiou concre-tos com adição de partículas de borracha, constatou que houve uma queda brusca na resistência à compressão e à tração, de acordo com o aumento de ar incorporado que ocorria quando os resíduos de borracha eram adicio-nados à mistura. O autor atribui esta queda da resistência mecânica ao fato da borracha ser incapaz de absorver cargas sem deformação excessiva. Lee et al. (1993) realizaram ensaios em pastas de cimento com adição de partículas de borracha e compararam os resultados a uma pasta de cimento sem adição. Como resultados de suas pesquisas, estas baseadas em traços com adição de 0%, 2%, 4% e 6% de partículas de borracha, concluíram que com o aumento da quantidade de borracha adicionada à pasta, a resistência mecânica a compressão diminuía linearmente em uma proporção de 16% para cada 2% a mais de adição.

Além do estudo de argamassas com adi-ção de materiais alternativos, Monteiro et al. (2005) estudaram a adição de Phase Change Materials (PCM) que consiste em baterias térmicas que podem ser utilizadas na constru-ção, em combinação com materiais existentes respeitando-se técnicas específicas, cuja prin-cipal característica é a mudança de fase (fase líquida para fase sólida e vice-versa) próximo à temperatura ambiente. Em seus estudos, con-cluíram que a utilização dos PCM não elimina as necessidades de aquecimento (no inverno) nem de arrefecimento (no verão), mas diminui a energia utilizada naqueles processos, devido ao seu efeito regularizador. No inverno, ao aquecer o ambiente acima dos 20ºC, os PCM incorporados na massa de acabamento fun-dem, absorvendo energia. Quando a tempera-tura desce abaixo dos 20ºC, os PCM libertam a energia que acumularam e solidificam-se. No Verão, quando as temperaturas sobem além dos 20ºC, os PCM vão absorvendo energia que de outra forma estaria no ambiente, reduzindo assim a temperatura deste.

115

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Atrelado à questão ambiental, também há uma certa preocupação com a utilização racional de energia nos edifícios. Segundo Chvatal (2007), o aumento significativo do custo da energia, acrescido da constatação de que as suas fontes não são ilimitadas e do impacto ambiental relativo à sua utilização, fomentaram iniciativas, medidas e pesquisas que estimulassem a eficiência energética. Atualmente, muitas pesquisas buscam no-vas formas inovadoras para possibilitar um amento do isolamento térmico de ambientes, sendo, muitas vezes, a argamassa de reves-timento a principal subcomponente. Para se ter um aumento do isolamento térmico de um ambiente pela argamassa, estudos apontam algumas formas eficientes, dentre elas o aumento da espessura do revestimento (CHVATAL, 2007) e a adição de materiais não convencionais na mistura e quando pos-sível, atrelando à reutilização de materiais e resíduos que são descartados na natureza, proporcionando um reaproveitamento sus-tentável.

Estudos já foram desenvolvidos no senti-do de criar modelos otimizados para espes-suras de vedações verticais em relação ao nível de isolamento, seja térmico ou acústico. Segundo Chvatal (2007), os benefícios com o aumento da espessura do isolamento são evidentes numa situação típica de inverno. No entanto, no verão, em certas condições, uma envolvente altamente isolada pode dificultar a dissipação do calor para o exte-rior, causando um aumento da temperatura interior acima do limite de conforto, sendo necessário, nestas condições, o uso de algum dispositivo ou sistema de climatização.

Segundo Ferreira (2009), sabendo que a borracha tem baixa condutividade térmica, em suas investigações optou por analisar mais de uma porcentagem de adição de bor-racha no traço da argamassa em estudo, sen-do dosados traços com adições de 10%, 20%, 30%, 40% e 67,5%, obtendo-se resultados

satisfatórios em relação ao isolamento tér-mico, com uma diminuição da condutividade térmica de 0,66%, 4,26%, 9,77%, 24,52% e 45% para estes corpos de prova, respectiva-mente. Também fica evidenciado que com a substituição de um agregado, a areia, por outro mais leve, a borracha, ao final os novos compósitos apresentaram massa específica menor à medida que o percentual de borra-cha aumentava. O aumento da quantidade de borracha proporciona maior quantidade de ar dentro do compósito, reduzindo assim o peso. Uma grande quantidade de ar proporciona um peso menor além de mais eficiência no isola-mento térmico, minimizando a condução do calor. Com a adição de borracha na argamassa houve redução da trabalhabilidade e redução da resistência mecânica em suas diversas propriedades, seja ela de compressão, tração ou flexão. O aumento da quantidade de bor-racha diminui progressivamente a resistência à compressão, sendo que para todos os casos ensaiados, as amostras com adição de bor-racha apresentaram uma resistência menor, quando comparadas à amostra de controle (sem borracha). Essa variação é provocada pela ausência de aderência entre a matriz da pasta de cimento com as fibras da borracha. Portanto é uma argamassa que pode ser uti-lizada em locais e elementos onde não seja essencial uma resistência mecânica elevada.

Para Frade et al. (2010), a energia, o con-forto, a durabilidade e a sustentabilidade são palavras-chave que condicionam a concepção da envolvente dos edifícios, em particular dos revestimentos. Isto implica que o desenvolvi-mento de novos e melhores produtos promo-vam menor incorporação de matérias-primas processadas e de energia, bem como menores implicações para o ambiente, resultantes quer da produção, quer da utilização e do destino final do produto no fim da sua vida útil. Em seus estudos, o objetivo era conferir ao pro-duto final características específicas de um material isolante (argamassa térmica). Para

116 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

isso, por apresentar uma baixa condutividade térmica decorrente de uma estrutura celular fechada, com ar incorporado, que dificulta a transferência de calor, selecionou-se o Polies-tireno Expandido (EPS) como material a ser incorporado na argamassa. Como resultados, obtiveram uma condutibilidade térmica de aproximadamente 0,09 W/m.K, valor que quando comparado com uma argamassa convencional (0,72 W/m.K), verifica-se um razoável ganho com o isolamento térmico. Também se verificou que a resistência térmi-ca é diretamente proporcional à espessura da camada de revestimento, assim quanto maior a espessura, maior será o valor de resistência térmica, o que resulta em um maior ganho com isolamento térmico. Logo, o produto desenvolvido apresenta características que influenciam determinantemente no desem-penho térmico do sistema durante a sua vida útil.

Visando outros horizontes e o reaprovei-tamento de resíduos da indústria têxtil na composição das argamassas, Pereira et al. (2012) perceberam uma relativa melhora na trabalhabilidade, resistência de aderência e isolamento térmico das argamassas ao adi-cionar resíduos de natureza fibrosa à com-posição. No que diz respeito a condutividade térmica, verificou-se uma diminuição em torno de 26% quando comparada com a ar-gamassa de referência, proporcionando assim um ganho relativamente alto com isolamento térmico. Por outro lado, ao aumentar o teor de fibras na mistura, verificou-se um aumento da porosidade, assim resultando em maiores infiltrações pelo revestimento.

Em outro trabalho, Souza (2012) estudou as características mecânicas e térmicas de ar-gamassas com adição de gesso, gesso/EVA e gesso/vermiculita, sendo a condutividade tér-mica um dos parâmetros de maior relevância em seus estudos com valores de 0,43 W/m.K, 0,41W/m.K e 0,22 W/m.K, respectivamente para as composições avaliadas. Aplicando em

um modelo de alvenaria completo e compa-rando os resultados de condutividade térmica obtidos através do método do fluxímetro (ABNT NBR 15220/2003), verificou-se que utilizando o revestimento de argamassa de gesso e de gesso/EVA tem-se uma redução de 18% de carga térmica em relação ao caso de referência. Já utilizando o revestimento de argamassa de gesso/vermiculita tem-se uma redução de 36% em relação ao mesmo caso.

Metodologia Experimental

Montagem da Bancada Conforme ASTM E1225/2013

Na montagem da bancada para análise da condutividade térmica em materiais sólidos, foi tomada como referência a Norma ASTM - American Society of Testing Materials – standard E1225: Thermal Conductivity of Solids by Means of the Guarded – Compa­rative – Longitudinal Heat Flow Technique, que em seu escopo descreve os métodos e materiais necessários para o projeto e monta-gem do experimento, bem como os cálculos a serem realizados para chegar a resultante da condutividade térmica do material em estudo.

O objetivo da Norma é montar um sis-tema fechado e isolado no interior de um invólucro, sendo que neste, o fluxo de calor seja somente em uma única direção e que haja a menor perda de calor possível por suas laterais. O sistema é composto por dois corpos de prova fabricados em material de condutividade térmica estimada conhecida, um corpo de prova do material em estudo, em uma de suas extremidades uma fonte de calor e em outra uma fonte de refrigera-ção, tudo isso devidamente isolado por um material de baixa condutividade térmica e protegido por um invólucro também de baixa condutividade térmica, assim, temos a menor perda de calor do sistema e um fluxo de calor

117

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

unidirecional (da extremidade quente para a extremidade fria).

Na bancada desenvolvida para este estudo foram tomados como material de referência dois corpos de prova cilíndricos de cobre eletrolítico com dimensões de 22,85x70 mm e k igual a 390 W/m.K. Para análise da arga-massa em questão, foram moldados corpos de prova cilíndricos de dimensões 22,85x70 mm, com a mistura devidamente dosada e materiais caracterizados. Nas extremidades do sistema foram fabricadas e inseridas placas com o mesmo cobre eletrolítico dos corpos de prova do material de referência com dimensões de 22,85x4 mm e resistivida-de elétrica de 34,1 Ω/m para aquecimento e refrigeração. Na extremidade de aquecimen-to, foi fixado uma resistência de um ferro de solda em um adaptador de transição fêmea/macho 32 mm - 3/4” de maneira que a mesma fique em contato com a placa de cobre assim aquecendo-a. Todo o aparato descrito acima foi introduzido em uma cápsula de tubo para água quente de PPR PN25 (de acordo com NBR 15813/2010) de 32 mm com k igual a 0,24 W/m.K, segundo o fabricante, no intuito de obter melhor fixação das partes e também minimizar a perda de calor radial do sistema. A capsula é montada com um adaptador de transição fêmea/fêmea 32 mm-3/4” em cada lado do tubo seguido de um adaptador de transição fêmea/macho 32 mm-3/4” em cada extremidade, de um lado para pressionar os corpos de prova dentro da capsula e do ou-tro para fixar a resistência de ferro de solda. Posteriormente, todo o sistema foi inserido dentro de um invólucro fabricado em MDF com espessura de 12,5 mm e isolado com lã de rocha (k = 0,046 W/m.K segundo o fabricante) na extremidade de saída de calor e espuma de poliuretano (k = 0,020 W/m.K segundo o fabricante) na extremidade de entrada de calor, isso visando a minimização da perda radial de calor.

Na bancada são coletados os parâmetros de temperatura em seis pontos do sistema e

também as distâncias de medição entre os mesmos. Para isso foi planejado um sistema de medição de temperatura com termopares Tipo K (com faixa de temperatura entre -200 e 1200 °C) conectados a um sistema compu-tadorizado de medição (datalog). Nos corpos de prova de cobre eletrolítico, dois termo-pares foram inseridos em furos dispostos a 5mm de suas faces e preenchidos com pasta térmica para garantia de medições mais preci-sas. Nos corpos de prova de argamassa foram inseridos dois termopares em furos dispostos a 1,5 cm de suas faces, sendo que estes são alocados por uma janela aberta no centro do tubo entre os dois corpos de prova de cobre. A Figura 1 mostra o conjunto sendo monta-do, podendo-se visualizar a extremidade de entrada de calor à direita (sem o completo isolamento com espuma de poliuretano) e a extremidade de saída de calor à esquerda (já totalmente isolada e com o invólucro de madeira fechado). Para o aquecimento da placa quente do sistema, foi utilizado um reostato de 3 kVA com 12 A e entrada de 220V/50~60 Hz e saída ajustável de 0~250 v, já a placa fria do sistema foi mantida a temperatura ambiente.

Figura 1 - Aparato experimental – montagem do conjunto.

Caracterização dos MateriaisO ensaio granulométrico tem como

objetivo medir a proporção relativa em por-centagem dos diferentes tamanhos de grãos que constituem um certo lote de agregado,

118 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

assim tendo grande influência sobre as pro-priedades futuras de concretos e argamassas. O ensaio foi realizado no Laboratório de Preparo de Amostras e Técnicas Construtivas (LAPATEC) da URI-Erechim, de acordo com a ABNT NBR NM 248/2003. Para sua execução, foram coletadas conforme ABNT NBR NM 26/2009, duas amostras de 1 kg de material para o ensaio da areia e da areia de fundição e duas amostras de 0,5 kg de material para os ensaios das raspas de pneu moídas e das cinzas pesadas de carvão, sendo estas, lavadas e secas em estufa com exceção das raspas de pneu moídas que tiveram suas sujidades somente retiradas visualmente.

Para o peneiramento dos quatro materiais foi utilizado o conjunto de peneiras da série normal (4,75 mm; 2,36 mm; 1,18 mm; 600 μm; 300 μm; 150 μm e fundo), sendo que as cinzas pesadas de carvão primeiramente fo-ram peneiradas com a peneira 4,75 mm para retirada das sujidades e partículas grandes. Na Figura 2 apresenta-se um comparativo granulométrico dos agregados.

Figura 2 - Comparativo granulométrico dos agregados.

Comparando as curvas granulométricas relacionadas na Figura 2, percebe-se que a areia usada é composta em sua grande maioria por grãos mais finos tendo sua maior porcentagem retida na peneira 0,3 mm. O

material alternativo que mais se aproxima da areia em suas características físicas é a areia de fundição, por sua vez apresentando um re-finamento um pouco maior, proporcionando, assim uma maior retenção de água na mistura da argamassa. Analisando a curva granulo-métrica da cinza de carvão, percebe-se que há uma maior uniformidade no tamanho dos grãos quando comparada com os outros mate-riais, tendo assim um melhor preenchimento dos vazios na mistura, resultando em uma argamassa mais impermeável. Apresentando grãos de maior tamanho, as raspas de pneu têm em sua maior parte, material retido nas peneiras 1,18 mm e 0,6 mm, distanciando-se dos outros materiais.

A massa específica é a massa real do agregado, excluindo-se os vazios e superfí-cies permeáveis entre os grãos. O ensaio foi realizado no LAPATEC da URI-Erechim, de acordo com a ABNT NBR NM 52/2002, isso para a areia e areia de fundição. Para sua execução, foram coletadas conforme ABNT NBR NM 26/2009, duas amostras de 0,5 kg de material sendo estas, lavadas e secas em estufa. A Figura 4.6 mostra os equipamentos normatizados utilizados na realização do en-saio da areia e areia de fundição. Já para as raspas da moagem de pneus e para as cinzas pesadas de carvão, como sua massa específica aparentemente era muito baixa (menor que da água), foi utilizado um método não nor-matizado, seguindo as leis da física. Para o ensaio, foi adicionado um volume conhecido de álcool (para as raspas de pneu) e de água (para as cinzas pesadas de carvão) dentro de um frasco normatizado, em seguida, foram despejadas uma quantidade de massa conhecida do material em estudo e esperado

Tabela I - Massa específica dos quatro materiais em estudo.

MASSA ESPECÍFICA

AREIA AREIA DE FUNDIÇÃO

RASPAS DE PNEU MOÍDAS

CINZAS PESADAS DE CARVÃO

MASSA ESP. (kg/m³) 2620,0 2440,0 1190,0 1540,0

119

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

o tempo necessário para sua decantação. Após a decantação, observou-se a variação no volume do líquido e, aplicando a Eq. (1), obteve-se os resultados de massa específica, mostrados na Tab. I.

(01)

Regido pela ABNT NBR NM 30/2001, este ensaio tem como objetivo definir em porcentagem a quantidade de água que é absorvida por uma massa conhecida do agregado em estudo. O ensaio foi realizado no LAPATEC da URI-Erechim para todos os materiais, com exceção das raspas de pneu. Para sua execução, foram coletadas duas amostras de cada material, conforme ABNT NBR NM 26/2009 e umedecidas até o mate-rial chegar ao estado saturado superfície seca. Posteriormente, o material foi seco em estufa e, após, verificado seu peso novamente. Na Tabela II são apresentados os resultados dos ensaios de absorção de água dos três mate-riais em estudo.

Tabela II - Massa específica dos quatro materiais em estudo.

ABSORÇÃO DE ÁGUA

AREIA AREIA DE FUNDIÇÃO

CINZAS PESADAS DE CARVÃO

ABSORÇÃO (%) 2,53 8,2 29,39

Como a argamassa da análise em estudo é para aplicação em revestimentos internos, para a execução das dosagens foi tomado como referência um traço tradicionalmente usual de 1:2:8 (cimento, cal e areia, respecti-vametne), conforme Salgado (2012). Os ma-teriais alternativos (raspas de pneu moídas, areia de fundição e cinzas pesadas de carvão) foram adicionados à mistura em proporções de 50% e 75%, isso em substituição ao agre-gado convencional (areia).

Na moldagem dos corpos de prova para a análise da condutividade térmica foi usa-do moldes construídos com tubo para água quente de PPR PN25 (de acordo com NBR 15813/2010) de 32mm, estes com 7cm de altura e com dois furos (cada um a 1,5cm das suas faces), isso para inserção dos ter-mopares, considerando que a argamassa não resistiria a furos executados manualmente. A Figura 3-a mostra alguns destes corpos de prova confeccionados para o estudo. Já na moldagem dos corpos de prova para análi-se da absorção de água, os mesmos foram moldados em moldes cilíndricos de 5cm de diâmetro por 10cm de altura, estes de acordo com a ABNT NBR 7215/1996, conforme a Figura 3-b.

Figura 3 - (a) moldes de tubo de água quente; (b) moldes normatizados.

A dosagem dos traços foi executada de acordo com a equação para a massa espe-cífica, sendo fixado um volume de material igual a 0,0006 m³. Os valores das massas específicas usadas, são os resultantes dos ensaios de caracterização executados, sendo estes posteriormente convertidos em kg/m³: 2,62 g/cm³ para areia, 2,44 g/cm³ para areia de fundição, 1,19 g/cm³ para as raspas de pneu moídas, 1,54g/cm³ para as cinzas pe-sadas de carvão, 2,96 g/cm³ para o cimento (segundo fabricante) e 2,7 g/cm³ para a cal hidratada (segundo fabricante). O volume de água na mistura foi controlado pela de-terminação da consistência da argamassa (NBR 13276/2002) com o uso da flow table, sendo considerado um diâmetro de espalha-

120 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

mento de 28±2 cm. Na Tabela III seguem as composições dos traços de argamassa onde o volume de material é fixado em 0,0006 m³. Após a confecção de todos os corpos de prova e posterior adensamento, os mesmos foram colocados em câmara úmida com temperatura e umidade controladas.

Ensaio e Coleta dos Dados na Bancada Térmica

Para análise da condutividade térmica na bancada, toma-se como referência os termo-pares dispostos como mostrado no esquema representado na Figura 4, sendo usado seis termopares (dois em cada corpo de prova de cobre e dois no corpo de prova de argamassa).

Para início do ensaio, foi inserido um corpo de prova de argamassa e em seguida o reostato foi regulado a uma tensão de saída de ±200 V, assim aquecendo a resistência elétrica quase ao seu máximo (visando que a tensão aplicada à resistência elétrica não poderia exceder 220 V) e esperando um certo tempo até o termopar 1 registrar uma temperatura de ±85ºC. Em seguida, a tensão foi rebaixada a um certo valor para que a temperatura no mesmo termopar se equili-brasse a 90±5ºC. Logo após, o equilíbrio de temperatura no termopar 1 (T1), verificou-se

que o sistema estava estabilizado, ou seja, com a mínima variação de temperatura pos-sível, assim resultando em um fluxo de calor preferencialmente unidirecional no regime estacionário. Para leitura, monitoramento e coleta das resultantes de temperatura na bancada, foi utilizado um sistema compu-tadorizado de datalog Novus FieldLogger I/O. O equipamento foi ajustado com suas configurações padrão e regulado para fazer a leitura das temperaturas nos termopares a cada segundo com monitoramento pelo Software FieldChart.

Quando o teste é iniciado e o reostato regulado a uma tensão de 200V, percebe-se que o sistema monitora as temperaturas, ge-rando um gráfico com uma curva ascendente nos dois primeiros termopares (inseridos nas duas faces do primeiro corpo de prova de cobre), assim comprovando a alta condu-tividade térmica do cobre. Alguns minutos depois, pode-se perceber que a temperatura do primeiro termopar inserido no corpo de prova de argamassa, também, começa a subir afastando-se do segundo, assim, podemos perceber a baixa condutividade térmica da argamassa quando comparada com a do co-bre. Após o rebaixamento da tensão, (quan-do a leitura no primeiro termopar estava 90±5ºC), o sistema começa a estabilizar-se

Figura 3 - Representação Esquemática dos termopares na bancada

121

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

e os gráficos começam a formar retas contí-nuas, assim não havendo mais aumento de temperatura até atingir um fluxo de calor unidirecional. A partir do ponto em que não há mais aumento de temperatura (sistema estabilizado), pode-se finalizar o ensaio e fazer a coleta de dados que se dá por meio de planilhas eletrônicas com as temperaturas dos termopares a cada segundo.

Ensaio de Absorção de ÁguaRegido pela ABNT NBR 9779/2012, este

ensaio tem como objetivo definir em porcen-tagem a quantidade de água que é absorvida por determinado tipo de argamassa. O ensaio foi realizado no LAPATEC da URI-Erechim em três amostras de cada traço de argamassa, sendo tais amostras após a pesagem, subme-tidas a secagem em estufa a 105±5°C por 24 horas. Após este tempo, todas as amostras foram pesadas e novamente submetidas a mais 24 horas de secagem. Posteriormente, (após 48 horas de secagem em estufa), foi constatado através de uma terceira pesagem, que suas variações de massa eram menores ou igual a 0,5%.

Após a constatação por secagem e pesa-gem da menor variação de massa, os corpos de prova foram submersos (apenas 5mm de uma de suas faces) a uma lâmina d’água, sendo suas massas constatadas após 10 e 90 minutos de imersão. Finalmente, os resul-tados de absorção foram calculados para os dois tempos destacados anteriormente com

(02)

onde A é a absorção final do corpo de prova [%], Msat é a massa do corpo de prova saturado aos 10 ou 90 minutos [kg] e Mseco é a massa do corpo de prova seco em estufa [kg].

Resultados e Discussão

Análise da Condutividade TérmicaPara determinar a condutividade térmi-

ca, coletou-se e fez-se uma média das 500 últimas leituras de temperatura feitas pelo sistema após sua estabilização (isso para cada corpo de prova, considerando que foram submetidos à análise 3 corpos de prova por traço). Como descriminado anteriormente, para o cálculo da condutividade térmica foi tomado como referência os cálculos da norma ASTM E1225/2013. Após calculada e determinada a condutividade térmica de cada corpo de prova, fez-se novamente uma média dos seus valores excluindo os resultados que se configuraram como erro (valores atípicos). Uma análise de incertezas também foi reali-zada sobre os resultados (vide Apêndice A). A Tabela III mostra os resultados dos sete traços analisados, já com as considerações feitas.

Quando analisados os resultados, percebe--se que o traço de argamassa que obteve a maior redução da condutividade térmica, quando comparado ao traço convencional, foi a argamassa com 50% de adição de raspas de pneu, sendo esta diminuição representada por um percentual de 21,8%, já que a borracha é um mau condutor de calor, ou seja, um bom isolante térmico. Usando o mesmo resíduo, mas em proporção diferente, o traço de arga-massa com 75% de adição de raspas de pneu moídas obteve uma redução de 17,9% em relação ao traço convencional, contrariando o que se esperava, já que a borracha tem menor valor de condutividade térmica que a argamassa convencional. Estes resultados, de certa forma, contrariam Ferreira (2009), uma vez que em seus estudos percebe-se a maximização do isolamento térmico da argamassa com o aumento do teor de raspas de borracha na mistura. Esta divergência dos estudos pode estar relacionada com o índice de empacotamento entre os componentes das misturas, índice de vazios ou outras variáveis

122 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

Tabela III - Condutividade térmica dos traços analisados.

CONDUTIVIDADE TÉRMICA MÉDIA - TRAÇO CONVENCIONAL

AMOSTRA T1 (K) T2 (K) T3 (K) T4 (K) T5 (K) T6 (K) TAmb (K) k (W/m.K)

1 394,35 388,85 340,65 310,45 303,65 303,15 297,75 25,83

2 401,05 399,35 332,15 302,85 294,75 294,35 291,75 9,32

3 361,65 360,15 331,65 303,85 298,95 298,65 293,55 8,42

kmed (W/m.K) 8,87 ± 5,0 %

CONDUTIVIDADE TÉRMICA MÉDIA - TRAÇO 50% CINZAS PESADAS DE CARVÃO

AMOSTRA T1 (K) T2 (K) T3 (K) T4 (K) T5 (K) T6 (K) TAmb (K) k (W/m.K)

1 363,45 362,35 329,45 304,35 301,05 300,75 297,05 7,25

2 359,55 358,25 330,45 303,65 301,05 300,85 297,55 7,28

3 362,35 361,05 330,15 302,55 297,95 297,45 293,25 8,48

kmed (W/m.K) 7,67 ± 7,4 %

CONDUTIVIDADE TÉRMICA MÉDIA - TRAÇO 75% CINZAS PESADAS DE CARVÃO

AMOSTRA T1 (K) T2 (K) T3 (K) T4 (K) T5 (K) T6 (K) TAmb (K) k (W/m.K)

1 376,85 374,85 338,05 302,45 296,75 296,35 292,75 8,76

2 374,45 372,75 339,45 303,15 296,95 296,45 292,65 7,88

3 373,95 372,05 342,05 301,65 296,75 296,45 291,95 7,08

kmed (W/m.K) 7,91 ± 8,7 %

CONDUTIVIDADE TÉRMICA MÉDIA - TRAÇO 50% AREIA DE FUNDIÇÃO

AMOSTRA T1 (K) T2 (K) T3 (K) T4 (K) T5 (K) T6 (K) TAmb (K) k (W/m.K)

1 357,85 356,75 329,35 304,25 298,75 298,25 296,25 8,29

2 361,55 359,95 327,35 302,35 298,95 298,45 294,15 10,92

3 372,35 367,15 338,55 310,75 303,75 303,35 298,95 26,19

kmed (W/m.K) 9,60 ± 13,7 %

CONDUTIVIDADE TÉRMICA MÉDIA - TRAÇO 75% AREIA DE FUNDIÇÃO

AMOSTRA T1 (K) T2 (K) T3 (K) T4 (K) T5 (K) T6 (K) TAmb (K) k (W/m.K)

1 369,35 367,75 336,25 312,35 306,05 305,75 302,65 10,33

2 374,45 372,65 342,75 314,25 306,55 306,05 299,65 10,49

3 352,05 348,75 325,45 306,35 301,95 301,65 302,15 24,50

kmed (W/m.K) 10,41 ± 0,7 %

CONDUTIVIDADE TÉRMICA MÉDIA - TRAÇO 50% RASPAS DE PNEU MOÍDAS

AMOSTRA T1 (K) T2 (K) T3 (K) T4 (K) T5 (K) T6 (K) TAmb (K) k (W/m.K)

1 368,45 367,15 336,05 305,55 300,15 299,65 295,05 7,67

2 350,05 349,25 326,65 302,15 297,15 296,95 296,15 5,31

3 369,35 367,85 338,05 308,15 302,55 302,25 295,95 7,83

kmed (W/m.K) 6,93 ± 16,6 %

CONDUTIVIDADE TÉRMICA MÉDIA - TRAÇO 75% RASPAS DE PNEU MOÍDAS

AMOSTRA T1 (K) T2 (K) T3 (K) T4 (K) T5 (K) T6 (K) TAmb (K) k (W/m.K)

1 362,65 361,55 331,25 306,75 303,55 303,15 301,85 7,96

2 366,35 365,05 336,15 306,65 303,75 303,55 301,05 6,61

3 375,45 373,45 340,65 307,85 301,25 300,85 294,75 9,51

kmed (W/m.K) 7,28 ± 19,2 %

123

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

que necessitam de maiores estudos para se-rem determinadas e explicadas.

A adição de cinzas pesadas de carvão, também, influenciou na redução da con-dutividade térmica, sendo que nos traços com 50% e 75% de adição obteve-se uma redução de 13,5% e 10,8%, respectivamente, seguindo o mesmo comportamento do caso de adição de raspas de pneu em relação ao percentual de adição.

Por fim, a adição de areia de fundição não obteve bons resultados quanto a redução na condutividade térmica, se comparada ao traço convencional, tendo esta propriedade acresci-da em 8,2% e 17,4% para as adições de 50% e 75% de areia de fundição, respectivamente, comportamento que pode ser explicado pela presença, no agregado, de materiais com alta condutividade térmica oriundos do processo de fundição. A Figura 4 apresenta os sete tra-ços dosados e ensaiados com suas respectivas condutividades térmicas.

Figura 4 - Condutividade térmica k, em W/m.K, dos traços de argamassa ensaiados.

Analisando os resultados de condutivida-de térmica, ainda, pode-se destacar que todos os traços apresentaram o valor de condutivi-dade térmica inferior nas adições com 50% de material alternativo, quando comparadas com as adições com 75%. Assim, pode-se dizer que dependendo do teor da adição, a propriedade pode variar de forma inversa em relação ao percentual adicionado. Assim,

pode-se deduzir que existirá um valor limite para minimizar a condutividade das misturas estudadas, que precisa de maior aprofunda-mento nas investigações.

Análise da Absorção de ÁguaApós o cálculo da absorção de água con-

forme a norma, verificou-se que somente para um traço de argamassa (rapas de pneu nas proporções de 50% e 75%) o ensaio de absorção teve resultado positivo quando comparado com os resultados do traço con-vencional. Para os outros (cinzas pesadas de carvão e areia de fundição, ambos em proporções de 50% e 75%), as porcentagens de absorção de água aumentaram quando comparadas com o mesmo traço convencio-nal. A Figura 5 apresenta um comparativo entre as absorções de água para cada traço de argamassa aos 10 e aos 90 minutos, em azul e verde, respectivamente.

Figura 5 - Comparativo de absorção de água entre os traços de argamassa.

Quando analisado os resultados apresen-tados na Figura 5, pode-se perceber que o traço de argamassa com maior absorção de água foi com adição de cinzas pesadas de car-vão, este chegando a ter 5,91% de acréscimo aos 10 minutos e 15,94% de acréscimo aos 90 minutos, quando comparado com o traço convencional, isto para a mistura com 75% de adição de material alternativo. Para a adição de 50% de cinzas pesadas de carvão, estes

124 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

valores caíram para 4,28% e 8,91% para 10 e 90 minutos, respectivamente. Isso mostra que quanto maior for o teor de cinzas pesadas de carvão na mistura, maior será a absorção de água. Pode-se atrelar este aumento da ab-sorção ao fato das cinzas pesadas de carvão terem um maior teor de material pulverulento (material de granulometria fina, retido abaixo da peneira com abertura de malha de 150μm no ensaio granulométrico) assim absorvendo mais água.

É possível perceber, também, um aumento na absorção de água quando comparado com o traço convencional para a mistura com adição de areia de fundição. Este aumento se configurou em 0,71% e 4,56% aos 10 e 90 minutos, respectivamente, para o traço com adição de 75% de areia de fundição. Para a o traço com adição de 50%, estes valores foram de 1,29% e 2,55%. Como no caso das cinzas pesadas de carvão também podemos atrelar este aumento quando comparado com o traço convencional à granulometria e à finura do material alternativo.

Finalmente, para o traço com adição de raspas de pneu moídas verificou-se uma acen-tuada diminuição da absorção de água quando comparada com o traço convencional. Os va-lores tiveram diminuição de 3,16% e 11,04% em 10 e 90 minutos, respectivamente, na mistura com 75% de adição. Já para o traço com 50% de adição, estes valores foram de 2,62% e 9,44%.

Análise e Comparativo da Massa entre as Misturas

Em relação à massa das misturas, a Figura 6 mostra um comparativo entre os corpos de prova dos sete traços de argamassa para um mesmo volume de 194,25 cm³ moldados de acordo com a ABNT NBR 7215/1996.

Pode-se verificar que a adição dos mate-riais alternativos, também, proporcionou uma

diminuição da massa das argamassa no esta-do endurecido, destacando as misturas com cinzas pesadas de carvão que apresentaram redução de 21,7% e 33% para os traços com 50% e 75% de adição de material alternati-vo, respectivamente. Para as raspas de pneu, estas reduções foram de 19,8% e 32,5% para os mesmos traços. Já para os traços com adição de areia de fundição, as reduções não foram tão significativas, ficando na ordem de 5,9% para as adições com 50% de material e 10,2% para as adições com 75% de material alternativo, respectivamente. Assim, tendo um revestimento de menor massa, as cargas de paredes consideradas nos cálculos das vigas e de lajes na estrutura de uma edificação poderão ser minimizadas gerando economia no projeto estrutural com a redução de aço e da seção dos elementos.

Figura 6 - Comparativo de peso entre os corpos de prova de argamassa.

Conclusões

Neste trabalho, diferentes teores de arga-massa de revestimento interno com adição de materiais alternativos foram testados com relação ao seu poder de isolamento térmico e absorção de água. Em relação à condutividade térmica, pode-se destacar que em ambos os teores a argamassa com adição de raspas de pneu moídas teve melhores resultados quando comparada com o traço convencionalmente usado na construção civil (k = 8,87 W/m.K), obtendo condutividades

125

INFLUÊNCIA DO USO DE MATERIAIS ALTERNATIVOS EM ARGAMASSA DE REVESTIMENTO INTERNO: AVALIAÇÃO QUANTO AO ISOLAMENTO TÉRMICO

PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

térmicas de 6,93 W/m.K e 7,28 W/m.K para adições de 50% e 75%, respectivamente. O traço com adição de cinzas pesadas de carvão, também, obteve uma maior maximização do poder de isolamento térmico com resultados de 7,67 W/m.K e 7,91 W/m.K para adições de 50% e 75%, respectivamente. Já o traço com a adição de areia de fundição, os resultados não se deram como imaginado, obtendo-se uma minimização do poder de isolamento térmico devido ao aumento na condutivida-de térmica para as proporções estudadas, de 9,60 W/m.K para o teor de adição de 50%, e 10,41 W/m.K para o teor de 75%. Pode-se atrelar este aumento da condutividade tér-mica para os traços com adição de areia de fundição à sua composição que, na maioria das vezes, pode conter no agregado, vestí-gios de metais originados pelo processo de fundição das peças.

Em todos os traços, também, pode-se perceber que o aumento da condutividade tér-mica, ou seja, a minimização do isolamento térmico cresceu paralelamente ao aumento do percentual de materiais alternativos na argamassa. Assim, pode-se dizer que para um melhor resultado para a propriedade (minimização), existirá uma proporção ideal para as adições de materiais alternativos, uma vez que adicionados demasiadamente, estes podem influenciar de modo negativo no poder de isolamento térmico das argamassas.

Verificou-se, também, no ensaio de absor-ção de água por capilaridade, que o traço de argamassa com adição de rapas de pneu em ambos os teores, foi o único que minimizou a absorção da mistura quando comparados com o traço convencional. Os traços com adição de cinzas pesadas de carvão e areia de fundição não obtiveram resultados como

esperado, nestes, ocorrendo um aumento da absorção de água quando comparados com o traço convencional. Assim, em relação aos traços que obtiveram um aumento da absorção de água, quando aplicados para revestimentos de vedações verticais podem originar patologias em função de infiltrações que podem ocorrer pelo emboço ou reboco.

Pode-se verificar que a adição dos ma-teriais alternativos, também, proporcionou uma diminuição da massa da argamassa no estado endurecido, destacando as misturas com cinzas pesadas de carvão e raspas de pneu. Assim, tendo um revestimento de me-nor massa, as cargas de paredes consideradas nos cálculos das vigas e de lajes na estrutura de uma edificação poderão ser minimizadas, assim gerando economia no projeto estru-tural com a redução de aço e da seção dos elementos.

Finalmente, após a realização de todo o estudo, o material alternativo que mais se destacou, obtendo resultados positivos em todos os ensaios como maximização do iso-lamento térmico e a minimização da absorção de água e do peso aparente seco foi a mistura com adição de raspas de pneu moídas, porém, para a aplicação em larga escala na indústria da construção, haveria a necessidade de ve-rificação de outras propriedades do material, como resistência à tração na flexão, resistên-cia à compressão, resistência do potencial de aderência à tração, entre outros, uma vez que, como em citações de Meneguini (2003), a adição de resíduos de borracha pode com-prometer a resistência mecânica à tração e à compressão, sendo que estas também são propriedades básicas das para um bom de-sempenho de um revestimento em argamassa.

126 PERSPECTIVA, Erechim. v. 41, n.154, p. 111-126, junho/2017

Anderson Golub - Cristiano Vitorino da Silva

REFERÊNCIAS

ALI, N. A.; AMOS, A. D. E.; ROBERTS, M. Use of Ground Rubber Tyres in Portland Cement Concrete. Concrete 2000 – Economic and Durable Construction thorough Excellence. In: Proceedings of the International Conference, University of Dundee, Scotland, UK, 7-9 September, 379-390, 2000. CHVATAL, K. Relação entre o Nível de Isolamento Térmico da Envolvente dos Edifícios e o Potencial de Sobreaquecimento no Verão. Engineering Sciences, 2007.FERREIRA, C. R. G. Análise de propriedades térmicas e mecânicas de compósitos de argamassa e resíduo de borracha. Dissertação de Mestrado, PPGCEM - Mestrado em Ciência e Engenharia de Materiais, UFRN, Natal, 2009.FRADE, D. F.; GONÇALVES, P. J.; NASCIMENTO, R. S.; SEQUEIRA, A. C. Argamassa de Reboco com Características Térmicas. In : Congresso Nacional de Argamassas de Construção, Anais..., Lisboa, 2010.LEE, B.I.; BURNETT, L.; MILLER, T.; POSTAGE, B. e CUNEO, J. Tyre Rubber/Cement Matrix Composites. Journal of Materials Science Letters, v. 12, n. 13, p. 967-968, 1993.MARGON, P. V. Influência do uso das cinzas de carvão mineral de termelétricas em argamassas de revestimento: dosagem por curva granulométrica. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina Florianópolis, 2002.MENEGUINI, E. C. A. Comportamento de argamassas com o emprego de pó de borracha. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - FEC, UNICAMP. Campinas, 2003.MONTEIRO, J. M.; AGUIAR, J. B.; BRAGANÇA, L. M.; GOMES, J. R.; SANTOS, P. Argamassas com desempenho térmico melhorado. In : Congresso Nacional de Argamassas de Construção, Anais..., Lisboa, 2005.PEREIRA, C. G.; MARTINS, A. I. G.; FARIA, P.; FANGUEIRO, R. Avaliação da introdução de resíduo da indústria têxtil em argamassas. In : 4º Congresso Português de Argamassas e ETICS, Anais..., Coimbra, 29-30 de março, 2012.SALGADO, J. C. P. Técnicas e Práticas construtivas para edificação. 2. Ed. São Paulo: Erica, 2009.SOUZA, V. A. L. Estudo do comportamento de materiais não convencionais utilizados como revestimento de paredes, visando a redução da carga térmica. Dissertação de Mestrado. João Pessoa, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, UFPA, 2012.