francisca julia

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Raído, Dourados, MS, v. 5, n. 10, p. 405-427, jul./dez. 2011. FRANCISCA JULIA E A INSERÇÃO DA MULHER NO CAMPO LITERÁRIO: UM INTERMÉDIO ENTRE O PARNASIANISMO E O SIMBOLISMO FRANCISCA JULIA AND THE INCLUSION OF WOMEN IN LITERARY FIELD: AN INTERMEDIARY BETWEEN THE PARNASSIAN AND THE SYMBOLISM Silvio Prorio da Silva 1 Aline Adriana da Silva 2 Edna Carla Lima da Silva 3 Salete Paiva da Silva 4 RESUMO: Durante muito tempo, a produção literária foi algo restrito ao universo masculino. Assim, a mulher tinha sua voz silenciada. Contudo, nesse campo, marcado pela presença masculina, eclode a atuação da mulher. Este trabalho objetiva abordar os subsídios de Francisca Julia para a inserção da mulher no âmbito da composição do texto literário. Pretende-se, também: a) abordar suas características temático- -estilísticas como um intermédio entre o Parnasianismo e o Simbolismo; b) abordar a condição de esquecimento a que foi alçada essa autora. Palavras-chave: inserção; mulher; escrita; dualidade; esquecimento. ABSTRACT: For a long time, the literary production was something restricted to the male universe. So, the woman had her voice silenced. However, this eld marked by the presence of men, breaks out the work of women. This study aims to address the subsidies of Francisca Julia for for the inclusion of women in the composition of the literary text. The intention is also: a) address the matic-stylistic characteristics as an intermediary between the symbolism and the Parnassian; b) address the condition of oblivion to which this author was raised. Keywords: insert; woman; writing; duality; oblivion. 1 Aluno do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Foi, por três anos, bolsista do Programa Conexões de Saberes da UFRPE: diálogos entre a universidade e comunidades populares, em articulação com o Programa Escola Aberta em Pernambuco - PEA/PE. E-mail: silvio_pro[email protected] 2 Aluna do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Foi, por um ano, bolsista do Programa Conexões de Saberes da UFRPE: diálogos entre a universidade e comunidades populares, em articulação com o Programa Escola Aberta em Pernambuco - PEA/PE. E-mail: [email protected] 3 Aluna do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID/UFRPE - LETRAS. E- -mail: [email protected] 4 Aluna do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. E-mail: [email protected]

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Francisca Julia e a inserção da mulher no campo literário

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  • Rado, Dourados, MS, v. 5, n. 10, p. 405-427, jul./dez. 2011.

    FRANCISCA JULIA E A INSERO DA MULHER NO CAMPO LITERRIO: UM INTERMDIO

    ENTRE O PARNASIANISMO E O SIMBOLISMO

    FRANCISCA JULIA AND THE INCLUSION OF WOMEN IN LITERARY FIELD: AN

    INTERMEDIARY BETWEEN THE PARNASSIAN AND THE SYMBOLISM

    Silvio Profi rio da Silva1

    Aline Adriana da Silva2

    Edna Carla Lima da Silva3

    Salete Paiva da Silva4

    RESUMO: Durante muito tempo, a produo literria foi algo restrito ao universo masculino. Assim, a mulher tinha sua voz silenciada. Contudo, nesse campo, marcado pela presena masculina, eclode a atuao da mulher. Este trabalho objetiva abordar os subsdios de Francisca Julia para a insero da mulher no mbito da composio do texto literrio. Pretende-se, tambm: a) abordar suas caractersticas temtico--estilsticas como um intermdio entre o Parnasianismo e o Simbolismo; b) abordar a condio de esquecimento a que foi alada essa autora.Palavras-chave: insero; mulher; escrita; dualidade; esquecimento.

    ABSTRACT: For a long time, the literary production was something restricted to the male universe. So, the woman had her voice silenced. However, this fi eld marked by the presence of men, breaks out the work of women. This study aims to address the subsidies of Francisca Julia for for the inclusion of women in the composition of the literary text. The intention is also: a) address the matic-stylistic characteristics as an intermediary between the symbolism and the Parnassian; b) address the condition of oblivion to which this author was raised.Keywords: insert; woman; writing; duality; oblivion.

    1 Aluno do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Foi, por trs anos, bolsista do Programa Conexes de Saberes da UFRPE: dilogos entre a universidade e comunidades populares, em articulao com o Programa Escola Aberta em Pernambuco - PEA/PE. E-mail: silvio_profi [email protected] Aluna do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Foi, por um ano, bolsista do Programa Conexes de Saberes da UFRPE: dilogos entre a universidade e comunidades populares, em articulao com o Programa Escola Aberta em Pernambuco - PEA/PE. E-mail: [email protected] Aluna do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciao Docncia - PIBID/UFRPE - LETRAS. E--mail: [email protected] Aluna do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. E-mail: [email protected]

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    INTRODUO

    Durante muito tempo, a produo literria foi algo restrito ao universo mascu-lino. Com isso, a mulher tinha sua voz silenciada em um cenrio caracterizado, exclu-sivamente, pela supremacia masculina. Em geral, os nicos papeis e funes sociais atribudos mulher, ainda que letrada, eram o de esposa, de me e de domstica do lar, submetendo-se, assim, preponderncia masculina. O que refl ete as condies sociais e histricas nas quais se encontravam as mulheres nesse perodo. Contudo, em um campo marcado, predominantemente, pela presena masculina, eclode a atuao da mulher no mbito da escrita, mais especifi camente, na composio do texto lite-rrio. Esse o contexto no qual surge a produo literria de Francisca Julia da Silva.

    luz das contribuies tericas de Andrade (1987), Bosi (1984), Celho et al. (2008), Coelho (2010), Leandro e Joanilho (2006), Moiss (1969), Ramos (2011), Romero (1943), Verssimo (1915), entre outros, este trabalho tem por objetivo abordar os subsdios de Francisca Julia da Silva para a insero da fi gura feminina na composio do texto literrio e, por conseguinte, no mbito literrio. Decorrente deste, pretende-se: Abordar caractersticas temtico-estilsticas de sua obra em uma perspectiva de

    intermdio entre a Escola Parnasiana e a Simbolista;

    Refl etir acerca do fato de essa autora no ser abordada pela maior parte dos Livros Didticos de Literatura. Ou, ento, ser retratada como autor minoritrio, na medida em que a abordagem do seu legado cultural limita-se a pequenos comentrios e a tpicos na parte do captulos que menciona Outros Autores da Escola Parnasiana.

    A INSERO DA FIGURA FEMININA NO MBITO LITERRIO E A ALTERAO NO PAPEL SOCIAL DA MULHER

    Da preponderncia masculina ao espao da fi gura feminina na escrita literria. Esse percurso refl ete o movimento, ou melhor, o salto na evoluo da trajetria da funo social da mulher, mesmo que inicial. Sabe-se que, durante muito tempo, a escrita literria foi algo dominado, predominantemente, pela fi gura masculina. Em face dos ideais/ da ideologia de uma poca, a mulher tinha sua voz silenciada e, por conseguinte, tinha sua participao, no mbito literrio, extinta. Tal situao no s evidencia as condies scio-histricas da mulher nessa poca, mas, em especial, demonstra os critrios no-linguticos que estabeleciam os padres de normalidade no ramo da escrita. A mulher, desse modo, tinha sua voz e participao erradicadas do universo literrio em virtude de aspectos que transcendem o mbito lingustico, inserindo, assim, as questes de gnero na composio literria.

    Em contraposio a essa postura de segregao social da mulher, eclode outra de incluso, embora mnima nessa poca. Eclode, dessa maneira, a obra da autora Francisca Julia da Silva, um dos primeiros nomes femininos inclusos no ramo da

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    escrita literria. Apesar de seu quantitativo de obras ser considerado pequeno, seu legado consegue dar conta de refl etir no s sua contribuio para a evoluo da trajetria literria e cultural do Brasil, mas tambm faz um convite refl exo acerca das condies a que estava submetida a mulher nessa poca, em decorrncia da conjuntura social que alava a fi gura feminina condio de objeto de submisso. Diante dessa perspectiva, a obra de Francisca Julia traz uma refl exo acerca da in-sero e da participao da mulher no contexto da escrita literria.

    Coelho (2010) ressalta o fato de essa autora, em sua ecloso na produo literria, foi desacreditada em virtude de sua condio feminina. Para isso, Coelho (2010) cita Constantino (1941, p. 2) que afi rma que o surgimento de uma mulher no campo literrio ocasionou muita polmica. Motivo este que fez com que muitos acreditassem que um autor estaria se utilizando de um pseudnimo, Francisca Julia, para difundir seus textos. O que est em sintonia com Colho et al. (2008, p.5), que diz que o esttico da forma e chegou a ser atribudo a vrios outros poetas at que se descobrisse que Francisca Julia no se tratava de um pseudnimo. Nessa direo, percebe-se que a mulher era desacreditada, ou seja, a fi gura feminina no teria capacidade de compor um texto literrio de tamanha magnitude.

    Francisca Jlia assustava os lderes do intelectualismo brasi-leiro [...]. Como admitir, pois, a audcia da mulher que criava obras primas, conquistando, por isso mesmo, o ttulo de maior expresso no parnasianismo? Combateram-na em vo. O bom senso reagiu. Vergonha, pretender anular os mritos de quem, na arte da forma, ombreava com Raimundo, com Alberto e com Bilac. [...] (CONSTANTINO, 1941, p. 2 apud COELHO 2010, p. 9).

    Tinha-se, assim, uma produo literria que preconizava uma predominncia masculina nesse mbito, o que, por sua vez, exclua a insero da mulher na constru-o/ produo literria. nesse sentido que, Francisca Julia da Silva, enquanto uma das primeiras autoras [nomes femininos brasileiros] inclusos na escrita literria, pe em xeque essa perspectiva, tradicionalmente, excludente e de segregao a que era submetida a mulher. O que, por sua vez, abre espao para a mulher nesse mbito, ainda que mnimo inicialmente.

    FRANCISCA JULIA: A DUALIDADE ENTRE O PARNASIANISMO E O SIMBOLISMO

    Sabe-se que os pressupostos tericos das mais diversas correntes literrias refl etem-se na escrita do autor durante o decorrer da composio do texto liter-rio. Dentro dessa perspectiva, seus textos reproduzem os ideais das vertentes nas quais esto inclusos, expressando-os tematicamente e estilisticamente na superfcie do texto. Atrelado a isso, durante muito tempo, acreditou-se que, na composio do texto literrio, o autor se utiliza dos pressupostos tericos e das caractersticas temtico-estilsticas de uma escola apenas.

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    Com base nessa viso, a articulao, ou melhor, a juno de aspectos de ver-tentes literrias distintas no ocorre e, acima de tudo, no se materializa nos signos expostos na superfcie textual. Porm, ao longo da trajetria histrico-social da Literatura Brasileira, alguns autores pem em xeque essa perspectiva, mostrando a juno de aspectos e fatores de escolas que, em geral, so mostradas como opostas pode ocorrer. Um exemplo que ilustra/ refl ete essa nova perspectiva de composi-o do texto literrio Francisca Julia da Silva que comunga de traos estilsticos e temticos das Escolas Parnasiana e Simbolista. Partindo desse pressuposto, optou--se, inicialmente, por apresentar uma sntese das caracterstica de cada uma dessas escola e, aps isso, perceber como elas se refl etem/materializam nas escritas de Francisca Julia da Silva.

    O Parnasianismo se volta para a Impessoalidade, isto , a neutralidade do autor em face da realidade, no interferindo, assim, no tratamento dados aos fatos. Dentro dessa perspectiva, o autor do texto literrio deve lanar mo da neutralidade diante da realidade, em detrimento dos seus sentimentos. Nessa tica, essa escola se contrape ao subjetivismo proveniente do Romantismo. Esse aspecto refl ete um fato comum a maior parte das escolas literrias, isto , o fato de se opor veemente escola anterior, buscando, assim, ideais de fundamentao em vertentes anteriores a que se ope. Outra caracterstica temtica do texto Parnasiano diz respeito super valorizao do esteticismo [esttica] e uma intensa busca pela perfeio, centrando--se, preponderantemente, na forma. Esta, por sua vez, pode ser defi nida como a maneira como o texto se estrutura e se organiza na superfcie textual, ou seja, os fatores internos do texto literrio. Nessa perspectiva, os autores dessa corrente lite-rria voltam sua ateno e seu olhar para a construo estrutural do texto literrio, voltando-se, predominantemente, para a busca intensa pela perfeio formal. Nor-teados por essa perspectiva, eles instauram o materialismo da forma, o artesanato do verso. A palavra trabalhada como matria-prima que deve ser lapidada, burilada e cinzelada (ANDRADE, 1987, p. 108).

    Ao preconizar versos presos a estruturas formais e objetivas, que no davam vazo ao sentimento, emoo e, sobretudo, ao engajamento social, que negavam ardentemente. Por essas razes essa poesia vista como uma poesia objetiva, impessoal e contida. (ALARINI, 2009, p. 957).

    Desataca-se, ainda, a perspectiva que esses autores adotam de utilizar, no enfoque dado ao texto, as descries de cenas e, sobretudo, de objetos, tais como, quadros, obras arquitetnicas, vasos etc.. Tinha-se, desse modo, uma poesia des-critiva, plstica e visual (ANDRADE, 1987, p. 108), que concedia primazia ao cromatismo [a forma como ela joga com as cores] e, sobretudo, no que tange s cenas que retratam aspectos e fatores concernentes natureza, conforme ressalta Andrade (1987).

    Conforme dito anteriormente, uma peculiaridade comum a maior parte das correntes e escolas literrias refere-se ao ato de se opor ao estilo anterior, por inter-

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    mdio de seus pressupostos, caractersticas e tratamentos dado ao texto. Alm disso, ao realizar esse ato, tais escolas buscam suas bases de fundamentao em correntes literrias anteriores s que se contrapem. Dentro desse contexto, o Simbolismo se volta para o subjetivismo desprezado pelos Parnasianos, valorizando, assim, o eu e, acima de tudo, aderindo ideologia da Vertente Romntica [combatida com grande empenho pelos Parnasianos]. Dito de outra forma, em virtude da oposio ao Romantismo, a Vertente Parnasiana adere a alguns dos ideais e aos pressupostos do Arcadismo, que preconizava a escrita do texto literrio tendo como base de fundamentao modelos pr-estabelecidos, isto , um objeto de arte normativo, es-pecifi cando, assim, como deveria ocorrer a composio de cada gnero. Da provm a questo da constante busca pela perfeio formal a que se dedicavam veemente os Parnasianos. Os Romnticos, na busca pela originalidade e pela construo de uma nova forma de escrita [objetivo de criar algo novo], pem em xeque essas normas, contrapondo-se, assim, ao Arcadismo. Da advm um dos fatores causadores do embate entre a Escola Romntica e a Simbolista, ou seja, o fato de recorrer a outros modelos e perspectivas postos anteriormente anteriores.

    Ainda no tocante ao Simbolismo, essa escola literria valoriza os aspectos interiores do homem, isto , sua essncia. Nesse contexto, comum nessas obras a abordagem de aspectos relativos ao corpo, ao esprito e alma, o que refl ete uma perspectiva de cunho/ teor psicolgico. Desataca-se, ainda, o fato de os autores dessa escola lanarem mo de uma linguagem musical, ou melhor, uma linguagem que articula os signos expostos na superfcie textual musicalidade. Para tanto, o autor se utiliza de diversas estratgias e recursos lingusticos, tais como, a aliterao e a assonncia, transcendendo, assim, a limitao s rimas e, sobretudo, forma, valorizando, assim, os aspectos sonoros da linguagem escrita.

    Contudo, h autores que possuem caractersticas de duas escolas literrias contemporneas entre si, articulando, assim, seus pressupostos que, at ento, se contrapunham. Um exemplo que pode ilustrar essa questo Francisca Julia que lana mo, em seus textos, de caractersticas temtico-estilsticas tanto do Parnasianismo como do Simbolismo, refl etindo, assim, um intermdio entre essas duas vertentes literrias. O que est em consonncia com Colho et al. (2008, p. 5), que diz que a obra de Francisca Julia da Silva Munster (1874-1920) situa-se no perodo de convvio entre o Parnasianismo e o Simbolismo.

    ENTRE O PARNASIANISMO E O SIMBOLISMO: OS ASPECTOS TEMTICO-ESTILSTICOS E OS TRAOS DA DUALIDADE

    Francisca Julia considerada por muitos tericos o adepto mais fi el da Escola Parnasiana pelo fato de seguir os ideais e pressupostos dessa escola, sobretudo, no que concerne impassibilidade. Em outras palavras, a neutralidade do autor diante da realidade circundante, o que possibilita a no incluso, a no participao e o distanciamento do autor no tratamento dado aos fatos. Nessa tica, o tratamento

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    dado realidade se d sem a interferncia dos aspectos interiores do autor. Em funo disso e em virtude do soneto "Musa Impassvel, essa autora recebeu o ttulo de A musa Impassvel.

    A obra de Francisca Julia da Silva Munster (1874-1920) situa-se no perodo de convvio entre o Parnasianismo e o Simbolismo. Seu primeiro livro intitulado Mrmores vem a pblico em 1895 e recebido com entusiasmo pelos litera-tos da poca. Tendo sua potica alcanado o mais alto grau de perfeio formal ideal supremo da escola parnasiana. (COLHO et al., 2008, p. 5).

    Outro aspecto comum nas obras de Francisca Julia [aspecto proveniente da esttica parnasiana] refere-se ao descritivismo, fazendo com que o leitor, durante a leitura do texto literrio, realize um movimento que remete s imagens mentais e visuais retratadas pelos signos distribudos ao longo do texto. O que vai ao encontro de Colho et al. (2008, p. 8), que diz que a autora utiliza as palavras com uma maestria hipnotizante que evidencia o poder de encantar e sugestionar o leitor por meio da criao de imagens e pensamentos pela simples descrio das cenas retratadas no poema. Mas, destaca-se, sobretudo, a busca incessante pela forma. Dito de outra maneira, a forma como o texto literrio se confi gura e se apresenta na superfcie textual. Assim, a autora, em funo dos pressupostos do Estilo Parnasiano, volta seu olhar para a construo estrutural do texto literrio. Por essa razo, seus versos so considerados por muitos como perfeitos [os mais perfeitos da Lngua Portuguesa]. So exemplos de autores que ilustram esse reconhecimento composio literria dessa autora, Olavo Bilac.

    CARACTERISTICAS TEMTICO-ESTILSTICAS DO PARNASIANISMO

    Consoante Andrade (1987, p. 108), o Parnasianismo a negao da poesia sentimental e confessional dos romnticos. Com isso, essa escola literria volta--se, predominantemente, para a impassibilidade [a no incluso do autor, dos seus aspectos emocionais e internos na abordagem da realidade] e, sobretudo, para a erradicao/ extino do lirismo. Essa nova perspectiva pode ser percebida no texto abaixo, por meio do qual a autora consegue refl etir perfeitamente os ideais e pressupostos parnasianos. Para realizar tal faceta, ela focaliza veemente a questo da impassibilidade, a partir da erradicao do lirismo, do envolvimento do autor na abor-dagem/ no tratamento dados aos fato e do descritivismo [a maneira impressionante como ela trabalha as cores e, simultaneamente, descreve os aspectos da natureza, remetendo o leitor aos fatores visuais. Percebe-se, ainda, traos da Mitologia Grega.

    MUSA IMPASSVEL II Musa, cujo olhar de pedra, que no chora, Gela o sorriso ao lbio e as lgrimas estanca! D-me que eu v contigo, em liberdade franca,

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    Por esse grande espao onde o Impassvel mora. Leva-me longe, Musa impassvel e branca! Longe, acima do mundo, imensidade em fora, Onde, chamas lanando ao cortejo da aurora, O ureo plaustro do sol nas nuvens solavanca. Transporta-me, de vez, numa ascenso ardente, deliciosa paz dos Olmpicos-Lares, Onde os deuses pagos vivem eternamente, E onde, num longo olhar, eu possa ver contigo, Passarem, atravs das brumas seculares, Os Poetas e os Heris do grande mundo antigo

    Ainda tendo como base de fundamentao terica os pressupostos de Andrade (1987, p. 108), diz-se que O Parnasianismo foi a recuperao dos ideais classicismo: representou um retorno aos temas e formas da poesia Greco-romana. Por esse motivo, comum nas obras dessa escola o espao dado s fi guras da Mitologia Grega, conforme ocorre no texto abaixo:

    DANA DE CENTAURASPatas dianteiras no ar, bocas livres dos freios,Nuas, em grita, em ludo, entrecruzando as lanas,Ei-las, garbosas vm, na evoluo das danasRudes, pompeando luz a brancura dos seios.A noite escuta, fulge o luar, gemem as franas;Mil centauras a rir, em lutas e torneios,Galopam livres, vo e vm, os peitos cheiosDe ar, o cabelo solto ao lu das auras mansas.Empalidece o luar, a noite cai, madruga...A dana hpica pra e logo atroa o espaoO galope infernal das centauras em fuga: que, longe, ao claro do luar que empalidece,Enorme, aceso o olhar, bravo, do herico braoPendente a clava argiva, Hrcules aparece...

    Nessa tica, percebe-se, nesse texto, traos da presena de aspectos mitol-gicos e histricos, o que vai ao encontro dos pressupostos da Escola Parnasiana [por conseguinte, dos modelos arca distas]. Nos textos dessa escola, so tpicas a abordagem de fi guras mitolgicas. O que est em consonncia com Christo (2005), que afi rma que,

    De acordo com a escola literria a que pertenceu o Parna-sianismo, Francisca Julia no s valoriza concepes clssicas tradicionais referentes forma (metro, rima e ritmo), como tambm, resgata os temas mitolgicos, uma vez que faz uma

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    descrio ntida da imagem das centauras: ora as descreve fe-rozes e guerreiras ora esbeltas, atraentes e livres, enfatizando a dualidade representada por este ser mtico.

    Em Os Argonautas, percebe-se a abordagem de aspectos externos, em detri-mento de fatores internos. Para tanto, a autora, em seus versos, lana mo de falas que articulam cor, aspectos terrestres [relevo] e movimento. Tal postura evidencia no s a questo da impassibilidade [a no incluso e no envolvimento do autor no tratamento dados aos fatos e realidade], como tambm refl ete a tendncia dos parnasianos de descrever cenas, lanando mo da descrio por meio de aspectos sensoriais e visuais. Dito de outra forma, o jogo de palavras que a autora se utiliza faz com que o leitor, durante o ato da leitura, o remeta s imagens descritas, valori-zando, assim, a viso e a sensao.

    OS ARGONAUTASMar fora, ei-los que vo, cheios de ardor insano;Os astros e o luar amigas sentinelas Lanam bnos de cima s largas caravelasQue rasgam fortemente a vastido do oceano.Ei-los que vo buscar noutras paragens belasInfi ndos cabedais de algum tesouro arcano...E o vento austral que passa, em cleras, ufano,Faz palpitar o bojo s retesadas velas.Novos cus querem ver, mirfi cas belezas,Querem tambm possuir tesouros e riquezasComo essas naus, que tm galhardetes e mastros...Ateiam-lhes a febre essas minas supostas...E, olhos fi tos no vcuo, imploram, de mos postas,A urea bno dos cus e a proteo dos astros...

    CARACTERISTICAS TEMTICO-ESTILSTICAS DO SIMBOLISMO

    Todavia, tal autora no se restringe ao Parnasianismo, articulando, assim, ca-ractersticas temtico-literrias da Parnasianismo e do Simbolismo simultaneamente. Isto , a autora em tela lana mo de uma dualidade, pertencendo a uma corrente literria [Parnasianismo], mas tambm compartilha de pressupostos temticos e estilsticos de ou vertente que, at ento, se contrapunham. Na viso de Colho et al. (2008), o Simbolismo possui uma relao de articulao com o Romantismo, na medida em que ambas se voltam para a subjetividade e para o sentir. Contudo, o subjetivismo da Corrente Simbolista no est diretamente ligado aos aspectos emocionais, mas ao subconsciente. O que reforado por Moiss (1969, p. 32 apud Celho, 2008, p. 3), que diz que na verdade, o Simbolismo apenas prolongou e enriqueceu a herana romntica que a intelectualidade realista pretendeu postergar.

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    Surge, agora, uma perspectiva pautada na juno de fatores que articula linguagem e pensamento, mais especifi camente, a linguagem enquanto recurso de expresso dos aspectos relativos mente humana. O que est em sintonia com Celho et al. (2008, p. 4), busca-se uma linguagem capaz de expressar estados psicolgicos mais profundos.

    Lanaram-se no encalo de uma nova linguagem fundamen-tada numa gramtica psicolgica, numa sintaxe psicolgica, e nu lxico adequado expresso das novidades estticas, pela recorrncia a neologismos, inesperadas combinaes vocabulares, emprego de arcasmos e ainda de recursos grfi cos de vria ordem (uso das maisculas, das cores na impresso de poemas ou de partes de livros, do y em lugar do i, etc.). (MOISS, 1969, p. 35 apud CELHO, 2008, p. 5).

    Partindo desse pressuposto, percebe-se que o Simbolismo ocasiona uma mu-dana de paradigma, isto , uma mudana de postura, uma vez que deixa de focar, predominantemente, na forma e prima pela questes psicolgicas e existenciais. Para isso, os Simbolista lanam mo de diversas estratgias lingusticas, que englobam desde o jogo de palavras at o uso de signos lingusticos que remetem a pensamentos e a cenas. Ainda sob o respaldo das contribuies tericas de Celho et al. (2008), essa corrente, em alguns casos, se utiliza de um vocabulrio abstrato, o que reduz a signi-fi cao literal de uma determinada palavra em um dado contexto e, por conseguinte, remete o leitor a aspectos visuais e sensoriais imprecisos (CELHO et al., 2008). Em outras palavras, uma linguagem que nem sempre fala de forma clara, mas que leva o leitor a pensar e a refl etir acerca do que dito. Contudo, essa adeso aos pressupostos do Simbolismo no se limita s questes referentes estilstica da composio do texto literrio, mas tambm abrange questo temtica. Diante dessa perspectiva, ser comum nas obras [que se voltam para a tendncia Simbolista] de Francisca Julia a abordagem de temticas, como: Aspectos internos e mentais da espcie humana, Alma, Corpo [sobretudo o confronto e dicotomia entre esses dois ltimos fatores], Moral [aspectos moralizantes], morte, sonoridade etc.., conforme sinaliza Andrade (1987). Algumas dessas caractersticas podem ser percebidas/ vistas no texto abaixo:

    SANTA TEREZA Reza de manso... Toda de roxo,A vista no teto presa,Como que imita a tristezaDaquele crio tremulo e frouxo...

    E assim, mostrando todo o desgostoQue sobre sua alma pesa,Ela reza, reza, reza,As mos erguidas, plido o rosto...

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    O rosto plido, as mos erguidas,O olhar choroso e profundo...Parece estar no Outro-MundoDe outros mistrios e de outras vidas.

    Implora a Cristo, seu Casto Esposo,Numa prece ou num transporte,O termo fi nal da Morte,Para descanso, para repouso...[...]

    Reza de manso, reza de manso,Implorando ao Casto EsposoA morte, para repouso,Para sossego, para descanso

    D'alma e do corpo que se consomem,Num desnimo profundo,Ante as misrias do Mundo,Ante as misrias to baixas do Homem !

    Quanta tristeza, quanto desgosto,Mostra na alma aberta e franca,Quando fi ca, branca, branca,As mos erguidas, plido o rosto...

    O rosto plido, as mos erguidas,O olhar choroso e profundo,Parece estar no Outro-MundoDe outros mistrios e de outras vidas...

    Nesse texto, percebe-se que a autora volta-se para uma perspectiva de cunho/ teor mstico e sobrenatural [vida aps a morte]. Com base nesse enfoque dado ao texto literrio, ela retrata a crise de existncia e a refl exo humana diante da morte [mais especifi camente, a impotncia diante da morte (CELHO et al., 2008, p. 6), os estados mentais e os sentimentos que permeiam o consciente humano neste momento que a passagem para o outro mundo [como o caso da tristeza e do desgosto], a oposio entre o corpo e a alma. Diante dessa acepo, percebe-se uma forte perspectiva psicolgica. Para realizar tal faceta, ela lana mo de uma linguagem que articula os signos e o pensamento, com o propsito de remeter cena exposta no corpo do texto [aspectos e sensaes visuais]. Com isso, Francisca Julia supera a descrio objetiva parnasiana da morte, j que a delineia pelo vis do irracional, do

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    simblico e do subconsciente humano (COLHO et al., 2008, p. 8). Todavia, no se pode deixar de destacar que, em diversos casos, a autora lana mo de jogos de palavra a fi m de levar o leitor a refl etir acerca do que dito. Isto , nem sempre sua linguagem clara e direta, o que leva o leitor a compreender/ perceber de imediato aquilo que expresso em seu dizer.

    Um outro aspecto que no poderia deixar de ser destacado neste texto diz respeito ao fato de essa autora ter produzido uma obra voltada para o pblico infantil, o Livro da Infncia [contos e versos] e Alma Infantil. A primeira obra foi adotada pelo Governo do Estado de So Paulo para ser utilizada no universo escolar. No entanto, ambas conseguem obter grande destaque nas escolas do Estado de So Paulo. O que refl ete os subsdios dessa autora para a produo literria voltada para pblico infantil, ou tambm, Literatura Infantil. Aspecto este que no era muito comum na poca.

    Diante dos aspectos expostos at o presente momento, percebe-se que Francis-ca Julia se volta para a Versatilidade. Essa a palavra que pode defi nir,ilustrar e refl etir o conjunto de obras dessa autora. Ela articula duas formas distintas de escrita e de composio do texto literrio. A primeira que se volta uma perspectiva formal, que tem como objetivo alcanar a perfeio estrutural, a partir da rigidez da forma, do distanciamento do autor no tratamento dado realidade, da conteno dos aspectos emocionais e da nfase na linguagem culta [tradicional]. A segunda, por sua vez, se volta para uma perspectiva oposta anterior que no se prende, exclusivamente, forma, mas construda por meio de aspectos subjetivos, evidenciando, assim, um forte vis psicolgico. Todos esses elemento refl etem a aproximao essas escolas literria antagnicas e, sobretudo, a dualidade na escrita da autora em tela, tanto do ponto de vista temtico, quanto estilstico.

    Nessa conjectura, percebe-se que Francisca Julia trabalha em uma perspectiva de juno de fatores, o que pode demonstrar o fato que as escolas, em geral, tentam romper com aspectos provenientes/ oriundos de vertentes literrias a elas, mas no conseguem romper totalmente. Isso pode ser percebido na escrita dessa autora, na medida em que estando fi liada/ vinculada corrente Parnasiana [que se opunha veemente ao Romantismo], ela adere a alguns aspectos da vertente Romntica.

    LITERATURA E LINGUSTICA: A ARTICULAO ENTRE AS CONCEPES DE LINGUAGEM, TEXTO, LEITURA E O TRATAMENTO DADO AO TEXTO LITERRIO

    Para muitos autores, a juno entre a Lingustica e a Literatura abordada em uma postura dicotmica, extinguindo, assim, a possibilidade de um trabalho conjunto entre essas areas de estudo. Contudo, uma ampla quantidade de autores se mobilizam em face do propsito de desconstruir essa viso. Ao realizar essa faceta, esses autores mostram como os diversos pressupostos dos Estudos das Cincias da Linguagem e das suas subreas refl etem-se no s na composio do texto literrio, isto , como

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    o autor lana mo dos aportes trazidos pela Lingustica na distribuio dos signos/ smbolos na superfcie textual. Mas, sobretudo, eles mostram como os postulados lingusticos se repercutem no tratamento dado ao texto, ou seja, no ato da leitura.

    Ao fazer uma breve retrospectiva histrica, sob a tica do Estudos Lingus-ticos, sobre o ensino de Lngua Portuguesa e Literatura no Brasil, surgem como fatores norteadores as Concepes de Linguagem, Texto e Leitura. Cada uma des-sas concepes preconiza um tipo de abordagem e tratamento aplicado ao texto literrio, dividindo-se em duas vertentes antagnicas. Uma que desconsidera os fatores lingustico-discursivos [internos do texto literrio] e o campo social, mais especifi camente, como este se refl ete na escrita literria. Outra que trabalha em uma perspectiva de juno de fatores, englobando, assim, os recursos lingustico--discursivos [intratextuais] e a dimenso social na composio temtica e estilstica do texto literrio.

    A primeira a Concepo de Linguagem como Representao do Pensamento [ou Mentalista, conceituao esta trazida por Travaglia (1997)]. Essa concepo est diretamente vinculada aos pressupostos tericos da Gramtica Tradicional. Soares (1998) sinaliza o fato de tal concepo ter orientado o ensino de Lngua Portuguesa e Literatura, no Brasil, at os anos 50. Com base nos alicerces tericos dessa con-cepo, o tratamento dado ao texto literrio gira em torno da escrita do autor que era concebida como modelo/ padro lingustico de prestgio social (SOARES, 1998; BEZERRA, 2010). Diante dessa perspectiva, no universo escolar, ocorria a imitao da escrita e do vocabulrio dos autores do texto literrio. Mas, destaca-se, sobretudo, o fato de a Concepo de Linguagem Mentalista preconizar um tratamento dado ao texto literrio que foca na abordagem gramatical, mais especifi camente, nos compndios cannicos ditados pela Gramtica Normativa. Tal postura ala o texto condio de conjunto de elementos gramaticais, por meio da qual o texto liter-rio servia de base para o desenvolvimento ou realizao de atividades gramaticais, analisando, para isso, a lngua enquanto conjunto de classes gramaticais, frases e oraes (KLEIMAN, 2008, p. 17). Com base nessas constataes, o texto literrio era usado como suporte didtico [pretexto] para anlise e classifi cao gramatical, voltando-se, assim, para um ensino prescritivo. Com base nesses pressupostos, a escrita literria consistia em um ato de expresso de ideias, que deveriam ser captadas pelo leitor do texto literrio (KOCH; ELIAS, 2006).

    O texto visto como um produto lgico do pensamento (representao mental) do autor, nada mais cabendo ao leitor se no captar essa representao mental, juntamente, com as intenes (psicolgicas) do produtor, exercendo, pois, um papel passivo. A leitura, assim, entendida como a atividade de captao de idias do autor. (KOCH; ELIAS, 2006, p. 10).

    Esse posicionamento em face do texto literrio o que Koch e Elias (2006) conceituam como Foco no Autor, por meio da qual a leitura alada condio de atividade de captao de ideias do autor. O foco da ateno , pois, o autor e suas intenes, e o sentido est centrado no autor, bastando to somente ao leitor captar

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    essas intenes (KOCH; ELIAS, 2006, p. 10). Porm, esse no era o nico uso que se fazia do texto literrio. Destaca-se, ainda, nesta Concepo Mentalista o fato de a leitura do texto literrio centrar-se em padres fontico-fonolgicos. Dito de outra forma, uma leitura volta para a oralidade, ou melhor, para a representao grfi ca e sonora correta [grafi a e pronncia], centrando-se, assim, nos aspectos e fatores entoacionais. Acerca dessa prtica, Santos (2002, p. 1) diz que,

    Para a escola e, ler quase sempre signifi cou apenas conhecer e reproduzir as relaes entre som e grafi a. Desta forma, a nfase sempre foi dada na mecnica da leitura e a grande preocupao dos professores se traduzia na cobrana por uma leitura correta esboada por meio da pronncia correta, leitura de todas as palavras do texto (no aceitando sinnimos ou omisso de palavras) e boa entonao.

    Todos esses usos que fazia do texto literrio extinguiam no s a dimenso textual-discursiva do texto literrio representada por seus aspectos e recursos lin-guisticos internos [intratextuais], mas tambm o campo social que refl ete os aspectos externos [extratextuais] da composio literria. Em outras palavras, esquecia-se, assim, no s dos movimentos lingustico-discursivos realizados no corpo textual, mas, principalmente, da dimenso social que empregada durante o ato da com-posio do texto literrio. Dimenso esta que marca e permeia a superfcie textual.

    A segunda a Concepo como Instrumento de Comunicao [ou Comunica-cional, classifi cao levantada por Travaglia (1997)]. Essa concepo est diretamente ligada aos postulados do Estruturalismo e aos pressupostos da Teoria da Comunica-o. Soares (1998) e Bezerra (2010) sinalizam o fato de essa concepo eclodir em meados dos anos 60, fi rmando-se nos anos 70. Tendo como base os aportes dessa concepo, o tratamento dado ao texto literrio ampara-se em uma concepo de leitura enquanto decodifi cao, isto , a representao de signos, smbolos, grafemas e morfemas, conforme ressalta Santos (2002) e (2007). Diante disso, a abordagem textual literria, no mbito escolar, foca na identifi cao da mensagem e nos elementos comunicativos expostos no corpo do texto literrio.

    Essa prtica seria o que Koch e Elias (2006) classifi cam como Foco no Texto, por meio da qual atribudo leitura o papel de atividade de que exige do leitor o foco no texto, cabendo-lhe o reconhecimento do sentido das palavras e das estruturas do texto (KOCH; ELIAS, 2006, p. 10). Prtica esta que Kleiman (2008, p. 18) conceitua como o texto como repositrio de mensagens e informaes.

    O texto visto como simples produto da codifi cao de um emissor a ser decodifi cado pelo leitor/ ouvinte, bastando a este, para tanto, o conhecimento do cdigo lingstico utilizado. Consequentemente, a leitura uma atividade que exige do leitor o foco no texto, em sua linearidade, uma vez que tudo est dito no dito. (KOCH; ELIAS, 2006, p. 10).

    Prima-se, assim, a mensagem do autor, deixando de lado os diversos movimen-tos discursivos realizados no corpo textual. Aplicadas ao mbito literrio, percebe-

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    -se que essas duas concepes preconizavam uma leitura e um tratamento dado ao texto literrio que no s se desvinculava dos recursos lingusticos e dos aspectos internos do texto literrio, mas, em especial, se distanciava da dimenso ideolgica e social aplicadas ao texto.

    A terceira a Concepo de Linguagem como Recurso de Interao Social [ou Interacional ou Dialgica, denominao esta sustentada por Koch e Elias (2006 e 2009)]. Essa concepo surge nos anos 80 em face dos Estudos das Cincias Linguagem, mais especifi camente, dos postulados das suas subareas, tais como: os da Corrente Funcionalista, da Lingustica de Texto, da Anlise do Discurso, da Sociolingustica, da Pragmtica etc. (BEZERRA, 2010). Dentre essas vertentes da Lingustica, destaca-se, os pressupostos da Lingustica de Texto [ou Cincia do Texto e do Discurso, conforme conceitua Beaugrande (1997 apud Koch (2002) e Santos (2007)]. Para Koch (2002), a Lingustica Textual traz tona pressupostos tericos que focalizam as mais diversas atividades lingustico-discursivas realizadas no s na produo, mas tambm na leitura e compreenso textual. nesse ce-nrio que eclode uma nova concepo de leitura enquanto atribuio/ elaborao de sentido e construo de signifi cados. O que est em consonncia com Koch e Elias (2006, p. 11),

    A leitura , pois, uma atividade interativa altamente complexa de produo de sentidos, que se realiza evidentemente com base nos elementos lingsticos presentes na superfcie textual e na sua forma de organizao, mas requer a mo-bilizao de um vasto conjunto de saberes no interior do evento comunicativo.

    Sob essa nova perspectiva, surge um novo tratamento aplicado ao texto lite-rrio. Foca-se, assim, nos recursos lingusticos utilizados pelo autor na produo do texto e pelo leitor durante o ato da leitura do texto literrio. Mas, sobretudo, prima-se pela abordagem e tratamento dado a esse texto enquanto construo lin-gustica e social, o que evidencia o objeto artstico enquanto refl exo da realidade. Tal postura faz com que o homem olhe para a produo literria de forma/ maneira diferenciada, atentando, assim, para a relevncia da produo do texto literrio para a historia literria e cultural brasileira. O que vai ao encontro de Suassuna et al. (2006, p. 230-231),

    Para cultuar os autores clssicos da literatura, preciso levar o aluno a aprender o signifi cado scio-histrico-cultural das suas obras, a linguagem por eles utilizadas, a intertextualidade neles presentes. A palavra seria encarada, ento, como matria prima do escritor, que se utiliza dela para reescrever, atravs da linguagem, o real captado sob um certo ponto de vista social.

    Partindo desse pressuposto, percebe-se que, ao aplicar os pressupostos da Lingustica no tratamento dado ao texto literrio, volta-se a ateno/olhar para esse texto sob outro prisma, que articula o vis lingustico e social, na medida o texto consiste em uma transcrio lingustica a partir da ao do autor que leva para o

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    campo literrio os mais diversos aspectos do universo social no qual est inserido. O que pe em xeque paradigmas postos anteriormente que so pautados em pers-pectiva dicotmicas para esses campos de estudos. Esse posicionamento remete perspectiva adota por Beaugrande (1997 apud Santos, 2007, p. 787),

    O texto no pode ser mais interpretado apenas como a unidade que ocupa, na hierarquia do sistema lingstico, o grau superior orao nem se pode mais tom-lo como uma seqncia bem formada de oraes. Antes, os textos resultam do cruzamento de diferentes matrizes: lingsticas (capacidades cognitivas), tecnolgicas (condies mecnicas) e histricas (contexto sociopoltico).

    FRANCISCA JULIA E O ESQUECIMENTO: ECOS DO MODERNISMO

    Diante do estudo das contribuies da autora em questo [ainda que seu quantitativo de obras seja pequeno], surge uma indagao. Por qual motivo uma autora to elogiada [em alguns casos, por autores que compem a literatura cannica da escola parnasiana, conforme trechos das falas proferidas pelos autores abaixo], chegando at a receber homenagens pstumas, no abordada na maior parte dos Livros Didticos de Literatura, como tambm objeto de estudo e investigao de uma pequena quantidade pesquisadores? Essa afi rmativa surge a partir de uma pesquisa realizada em sites de busca, tais como, Google, Alta Vista etc..

    Nesses sites, em geral, consta um grande quantitativo de poemas da autora em tela. Contudo, h uma pequena diversidade de produes acadmicas que voltam seu olhar para essa autora to aclamada em sua poca. Dito de outra maneira, h uma pequena diversidade de obras que se voltam a abordar sua histria cronol-gica Porm, poucas se dedicam a um estudo aprofundado acerca de sua produo temtico-estilstico e, acima de tudo, acerca da perspectiva de esquecimento a que foi alada tal autora [objeto de estudo deste tpico]. Com isso, deixa-se de lado uma grande diversidade de autores e, sobretudo, elementos extremamente relevantes da histria scio-cultural da literatura.

    Em Francisca Jlia supreendeu-me o respeito da lngua portuguesa, no que ela transporte para a sua estrofe brasileira a dura construo clssica: mas a lngua doce de Cames, trabalhada pela pena dessa meridional, que traz para a arte escrita todas as suas delicadezas de mulher, toda a sua faceirice de moa, nada perde da sua pureza fi dalga de linhas. O portugus de Francisca Jlia o mesmo antigo portugus, remoado por um banho maravilhoso de novi-dade e frescura. (Olavo Bilac).

    Nem aqui, nem no sul nem no norte, onde agora fl oresce uma escola literria, encontro um nome que se possa opor ao de Francisca Jlia. Todos lhe so positivamente inferiores

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    no estro, na composio e fatura do verso, nenhum possui em tal grau o talento de reproduzir as belezas clssicas com essa fria severidade de forma e de eptetos que Heredia e Leconde deram o exemplo na literatura francesa. (Joo Ribeiro).

    Nenhuma pena manejada por mo feminina, seja qual for o perodo que remontemos, jamais esculpiu, em nossa lngua, versos que atinjam a perfeio sem par e a beleza estonte-ante dos concebidos pelo raro gnio da peregrina artista. (Aristeu Seixas).

    Leandro e Joanilho (2006) abordam, em uma perspectiva geral, o fato de inmeros autores prestigiados intelectualmente, em sua poca, mas que, aps sua morte foram alados ao ostracismo. Os estudos literrios, em geral, tm como foco os grandes autores das escolas literrias [representantes mais clebres, eminentes e renomados], deixando de lado, autores concebidos como minoritrios. nesse contexto que surgem dois grupos que se contrapem. No dizer Leandro Joanilho (2006, p. 1084), foram classifi cados em grupos distintos: os que permaneceram imortalizados por suas obras, e os que despontaram para o anonimato, ou, autores-poetas que foram esquecidos e no entraram para os cnones literrios. Partindo desse pressuposto, a produo literria brasileira poderia ser classifi cada em duas vertentes. A primeira engloba os autores eternizados, sendo, assim, imor-talizados em face de suas produes. A segunda abrange os que foram alados condio minoritria e, em virtude disso, foram conduzidos condio de esqueci-dos nas pginas da trajetria histrico-social da Literatura Brasileira (LEANDRO; JOANILHO, 2006).

    As antologias literrias brasileiras e os livros didtico-liter-rios em sua maioria se propem a estudar apenas perodos de glamour da Literatura, dos quais poetas como lvares de Azevedo, Rui Barbosa e Machado de Assis fazem parte, ou seja, excluem uma boa parcela de produo literria, deixando historicamente um grande vazio, como se, entre lvares de Azevedo e Machado de Assis, por exemplo, fosse um perodo infrtil, com ausncia de produes literrias. Por esse motivo criou-se uma distncia entre esse perodo de glamour e o perodo de esquecimento. Os grandes autores destacaram-se no cenrio paulista e ganharam o pas, outros, fi caram restritos aos saraus e com encontros em casares da poca. (LEANDRO; JOANILHO, 2006, p. 1086).

    Em virtude de gozarem de maior prestigio social nas escolas literria em que se enquadram, diversos autores foram eternizados nas paginas literrias brasileiras. Por outro lado, outros foram alados ao esquecimento. Isso, em termos de pesquisas acadmicas e de manuais didticos escolares. Em muitos casos, os Livros Didticos de Literatura se voltam para a abordagem dos autores cannicos, em detrimento de uma gama de outros autores que contriburam substancialmente para a evoluo

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    histrico-social da Literatura Brasileira. Dentre esses autores, est Francisca Julia. Uma autora que fora aclamada, reconhecida, inclusive, por autores como compem a trade cannica do Parnasianismo, isto , que compunham os escritores mais pres-tigiados dessa escola literria.

    Um dos poucos autores que se debrua sobre a temtica da produo lite-rria de Francisca Julia, Ramos (2011) atribui esse esquecimento aos pressupostos trazidos pelo Modernismo. Para esse autor, os ideais veiculados pela Semana de 1922 que no s pem em xeque diversos pressupostos da corrente Parnasiana, mas tambm estimula o desinteresse por parte da crtica literria e, sobretudo, es-timula o desinteresse dos autores de manuais didticos na abordagem de diversos aspectos relativos vertente parnasiana. O que, por sua vez, extingue a abordagem da construo social da produo literria brasileira, como, por exemplo, a trajet-ria da autora em foco. Nessa tica, essa postura no surge do nada, mas se d em funo dos pressupostos da escola moderna, conforme as palavras proferidas por Ramos (2011, p. 1),

    Uma das maiores responsabilidades pelo esquecimento de to perfeita e importante obra como a de Francisca Jlia o que, ousadamente e correndo o risco de ser grosseiro, eu chamaria de: "O ai dos vencidos". Com a revoluo da semana de 1922, patenteia o movimento modernista em constituir-se como novo cnone literrio brasileiro. Esttica de reao, o modernismo, extremamente panfl etrio, vito-rioso reformulou ou erradicou diversos dos paradigmas que o parnasianismo estabelecera ou perpetuara. Tal fato, a meu ver, originou dois problemas para os estudos literrios: a) a crtica literria pouco se dedica ao tema; fazendo-o, revela (quase sempre) pouca profundidade em suas anlises; b) em decorrncia, os autores de livros didticos reproduzem o desinteresse acadmico e o preconceito modernista, geran-do um pblico discente que olha para o Parnasianismo j conformado pelo discurso dos modernistas. Estabelece-se a um crculo vicioso em que parte importante da trajetria literria brasileira legada ao esquecimento. Esquecimento danoso, porque compromete a amplitude refl exiva sobre o processo literrio nacional e deixam nas sombras fi guras como Francisca Jlia.

    Diante dessa perspectiva, Ramos (2011) atribui escola Moderna grande parte desse esquecimento que permeia a produo de Francisca Julia. Eclodia, assim, um esprito de rompimento com as frmulas do passado (FARACO; MOURA, 1983, p. 63). Ao aderir aos ideais das tendncias dos anos 20, que preco-nizavam o redimensionamento/ reestruturao das ideias e, em especial, das artes [uma ruptura com a arte tradicional (FARACO; MOURA, 1983, p. 63)], muitos autores deixam se lado as produes da vertente parnasiana. Pretendia-se, assim, voltar o olhar literrio para o Brasil, na medida em que, em diversas produes brasileiras, ocorria uma esttica copiada de produes internacionais, sobretudo,

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    as francesas. Nessa dimenso, ocorre uma quebra de paradigmas, ou tambm, uma mudana de perspectiva na produo literria, atentando e refl etindo acerca da realidade brasileira.

    Para atender ao seu desejo de modernizar o Brasil, os ar-tistas rompem com as formas de expresso j gastas, no s produzindo obras com novas tcnicas, como tambm atacando abertamente os artistas do passado, sobretudo, os parnasianos. (FARACO; MOURA, 1983, p. 63).

    Partindo dessa acepo, vidos por novas propostas de conduo da produo e composio do texto literrio, os adeptos dessa nova corrente rompem com os paradigmas e pressupostos postos anteriormente por outras escolas literrias. Tal postura pode ser evidenciada, acima de tudo, no que concerne Vertente Parnasiana. Um dos aspectos mais focalizados nessas crticas que eram tecidas por essas novas tendncias literrias diz respeito utilizao da linguagem durante o decorrer da composio do texto literrio. Em alguns casos propondo a refaco e a reescrita de textos de escolas anteriores, conforme ressaltam Faraco e Moura (1983).

    No se deve imaginar que havia tendncias homogneas: vrios pontos de vista por vezes entraram em choque. Mas havia um consenso: todos eram contra a tradio; todos propunham uma nova linguagem para expressar a realidade brasileira. Uma linguagem que fosse nossa e, ao mesmo tempo, universal. (FARACO; MOURA, 1983, p. 64).

    Sendo assim, percebe-se que esses novos postulados literrios da dcada de 20 se contrapunham, principalmente, linguagem culta [cannica e sacralizada] que era estabelecida por pressupostos postos anteriormente. Ou seja, uma lngua que, at certo ponto, sufocava a expresso genuna dos escritores brasileiros (FARACO; MOURA, 1983, p. 65). Com isso, pretendia-se alcanar uma lngua livre, que per-mitisse a aproximao maior entre o portugus literrio e a fala coloquial brasileira (FARACO; MOURA, 1983, p. 65). Surge, assim, uma alterao de paradigmas e mudana de perspectiva na composio do texto literrio. nesse cenrio que se d a oposio ao Parnasianismo e, consequentemente, produo dos autores adeptos dessa corrente literria. Dito de outra maneira, em face de grande parte da obra de Francisca Julia compor essa tradio proveniente da escola parnasiana a que se contrapunham os adeptos do Modernismo, sua produo atingida por esse pre-conceito, o que, conseguintemente, contribui, de certa forma, para o esquecimento das contribuies dessa autora (RAMOS, 2011).

    METODOLOGIA

    Conforme mencionado anteriormente, este texto tem como objetivo trans-cender a perspectiva que norteia a maior parte das obras publicadas sobre Francisca Julia, nas quais ocorre uma tradicional nfase dada histria cronolgica dessa autora. Em consequncia disso, deixa-se de lado no s a refl exo acerca das ca-

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    ractersticas temtico-estilsticas e literrias de sua obra , mas, sobretudo, esquece--se de abordar o motivo pelo qual ela foi alada condio de captulo esquecido nos Livros Didticos de Literatura. Chegando, muitas vezes, a no ser aborda ou, ento, sua abordagem restringe-se a pequenos comentrios na parte do captulos que menciona Outros Autores da Escola Parnasiana. O que, por conseguinte, elenca Francisca Julia o papel de autor minoritrio, j que apresenta-se primeiramente os autores cannicos da vertente parnasiana e, em seguida, os Outros Autores. Categoria na qual ela est inserida

    Para tanto, foi realizado, primeiramente, explanao das caractersticas temti-co- estilsticas e composicionais de ambas as escolas. Em seguida, a abordagem dos aspectos relativos ao tema e s caractersticas estruturais dos textos dessa autora. E, aps isso, a anlise de alguns poemas da autora em foco, a fi m de identifi car/ perceber os refl exos oriundos dessas duas vertentes literrias. Por ltimo, o trabalho focou na questo do esquecimento dessa autora renomada, em sua poca, mas que foi alada condio de pgina esquecida na histria da Literatura Brasileira. O que, por sua vez, contribuiu de forma signifi cativa para que esta fosse arredada/ erradi-cada dos estudos literrios e, por conseguinte, dos Livros Didticos de Literatura e da metodologia de ensino dessa disciplina [na maior parte das vezes].

    CONSIDERAES FINAIS

    Longe de ser mais um relato acerca da historia cronolgica da vida de Fran-cisca Julia da Silva, este texto objetivou ir alm disso. Em funo disso, focou na versatilidade, ou melhor, na perspectiva de juno de fatores adotada por essa au-tora, desconstruindo, assim, a viso de que duas escolas literrias trabalham sempre contrapondo-se. O que evidencia o fato de as vertentes literrias, apesar de se opor a alguns pressupostos das escolas anteriores, h articulam autores que articulam caractersticas concernentes temtica e ao estilo. No se pode deixar de sinalizar que a composio do texto literrio muda em relao s correntes literrias. No entanto, essas mudanas e alteraes que ocorrem na escrita literria no podem ser encaradas e percebidas como melhora, mas como evoluo. Primou-se, assim, pela abordagem da refl exo acerca das contribuies dessa autora em face da evoluo da trajetria histrico-social da literatura brasileira.

    Sendo assim, percebe-se, diante dos estudos realizados e dos aspectos abordados neste trabalhos, que inegvel a contribuio da produo literria de Francisca Julia para a evoluo da trajetria histrico-social da Literatura Brasileira. Isso no s do ponto de vista temtico-estilstico, mas, sobretudo, do ponto do vista na alterao da funo e do papel social da mulher no que tange composi-o do texto literrio. A obra de Francisca Julia representa um salto nas condies scio-histricas da mulher, na medida em que ocorre uma quebra de paradigmas na funo social da mulher, ainda que incipiente. Mas que se intensifi cou, conti-nuamente, ao longo dos anos. Em outras palavras, a obra dessa autora refl ete a

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    contribuio feminina no campo literrio, o que propicia a insero da mulher no mbito literrio.

    Apesar de ter cado no esquecimento em funo de diversos fatores, assim como outros autores e autoras, de fundamental importncia que seu legado cultural seja estudado e, acima de tudo, divulgado. A partir desse ato, possvel contem-plar o as mais diversas formas que o homem [espcie masculina e, em especial, a feminina] agem na construo social da Literatura no Brasil. Nesse sentido, no se pode apagar dos postulados literrios brasileiros as relevantes contribuies dessa autora, alando, assim, seu legado cultural e literrio a um captulo esquecido da Literatura Brasileira.

    REFERNCIAS

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