emily dickinson poemas literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · algo há na fuga silente que...

23
Emily Dickinson – poemas Por Revista Prosa Verso e Arte Literatura emily dickinson A uma luz evanescente Vemos mais agudamente Que à da candeia que fica. Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter, quite, Than by a wick that stays. There’s something in the flight That clarifies the sight And decks the rays. – Emily Dickinson – “80 Poemas de Emily Dickinson”. [tradução Jorge de Sena]. Lisboa: Edições 70, 1978. 1 Uma palavra se abre Como um sabre — Pode ferir homens armados Com sílabas de farpa Depois se cala — Mas onde ela caiu Quem se salvou dirá No dia de desfile Que algum Irmão de armas Parou de respirar. Aonde vá o sol sem ar — Por onde vague o dia — Lá está esse assalto mudo — Lá, a sua vitória! Observa o atirador arguto! O tiro mais perfeito! O alvo do Tempo O mais sublime É um ser “ignoto!” . 1 There is a word Which bears a sword Can pierce an armed man — It hurls its barbed syllables

Upload: others

Post on 19-Jan-2021

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Emily Dickinson – poemas Por Revista Prosa Verso e Arte Literatura emily dickinson A uma luz evanescente Vemos mais agudamente Que à da candeia que fica. Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter, quite, Than by a wick that stays. There’s something in the flight That clarifies the sight And decks the rays. – Emily Dickinson – “80 Poemas de Emily Dickinson”. [tradução Jorge de Sena]. Lisboa: Edições 70, 1978. 1 Uma palavra se abre Como um sabre — Pode ferir homens armados Com sílabas de farpa Depois se cala — Mas onde ela caiu Quem se salvou dirá No dia de desfile Que algum Irmão de armas Parou de respirar. Aonde vá o sol sem ar — Por onde vague o dia — Lá está esse assalto mudo — Lá, a sua vitória! Observa o atirador arguto! O tiro mais perfeito! O alvo do Tempo O mais sublime É um ser “ignoto!” . 1 There is a word Which bears a sword Can pierce an armed man — It hurls its barbed syllables

Page 2: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

And is mute again — But where it fell The saved will tell On patriotic day, Some epauletted Brother Gave his breath away. Wherever runs the breathless sun — Wherever roams the day — There is its noiseless onset — There is its victory! Behold the keenest marksman! The most accomplished shot! Time’s sublimest target Is a soul “forgot!” (c. 1858) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 2 Sépala, pétala e um espinho — Nesta manhã radiosa — Gota de orvalho — Abelhas — Brisa — Folhas em remoinho — Sou uma rosa! . 2 A sepal, petal,Annotate and a thorn Upon a common summer’s morn — A flask of Dew — A Bee or two — A Breeze — a caper in the trees — And I’m a Rose! (c. 1858) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 3 Um perde — outro ganha — Jogadores jogados — Lançam de novo os dados! . 3 We lose — because we win — Gamblers — recollecting which Toss their dice again!(c. 1858) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 4 Se recordar fosse esquecer, Eu não me lembraria. Se esquecer, recordar, Eu logo esqueceria.

Page 3: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Se quem perde é feliz E contente é quem chora, Que alegres são os dedos Que colhem isto, Agora! . 4 If recollecting were forgetting, Then I remember not. And if forgetting, recollecting, How near I had forgot. And if to miss, were merry, And to mourn, were gay, How very blithe the fingers That gathered this, Today!(c. 1858) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 5 O Sucesso é mais doce A quem nunca sucede. A compreensão do néctar Requer severa sede. Ninguém da Hoste ignara Que hoje desfila em Glória Pode entender a clara Derrota da Vitória Como esse — moribundo — Em cujo ouvido o escasso Eco oco do triunfo Passa como um fracasso! . 5 Success is counted sweetest By those who ne’er succeed. To comprehend a nectar Requires sorest need. Not one of all the purple Host Who took the Flag today Can tell the definition, So clear, of Victory! As he, defeated — dying — On whose forbidden ear The distant strains of triumph Burst agonized and clear! (c. 1859) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 6 Nossa porção de noite — Nossa porção de aurora — Nossa ausência de amor —

Page 4: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Nossa ausência de agrura — Uma estrela, outra estrela Que se extravia! Uma névoa, outra névoa, Depois – o Dia! . 6 Our share of night to bear — Our share of morning — Our blank in bliss to fill Our blank in scorning — Here a star, and there a star, Some lose their way! Here a mist, and there a mist, Afterwards — Day! (c. 1859) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 7 Tanto júbilo! Tanto! Se eu errar, que pobreza! Pobres como eu, no entanto, Tudo arriscaram num só Lance! Ganharam! Sim! Temendo embora — Deste lado a Vitória! Vida é só Vida! E Morte, Morte! Ar é Ar, e Alegria, Alegria! E se eu falhar, enfim, É doce ao menos conhecer o ruim! Perder não é mais que Perder, Não há mais fim que o Fim! Mas se eu ganhar! Canhões no Mar! Sinos nas Torres, pelo ar Ressoem lentamente! O Céu é muito diferente Quando sonhado; terra firme — Poderá extinguir-me! . 7 ’Tis so much joy! ’Tis so much joy! If I should fail, what poverty! And yet, as poor as I, Have ventured all upon a throw! Have gained! Yes! Hesitated so — This side the Victory! Life is but Life! And Death, but Death! Bliss is, but Bliss, and Breath but Breath! And if indeed I fail, At least, to know the worst, is sweet! Defeat means nothing but Defeat, No Drearier, can befall!

Page 5: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

And if I gain! Oh Gun at Sea! Oh Bells, that in the Steeples be! At first, repeat it slow! For Heaven is a different thing, Conjectured, and waked sudden in — And might extinguish me! (c. 1860) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 8 A salvo nos seus Quartos de Alabastro — Distantes do Festim — Dos Sóis e do Verão — Dormem os meigos mestres da Ressurreição — Tetos de Pedra — Paredes de Cetim! Grandiosos vão os Anos ao Crescente — Os Mundos os seus Arcos circunscrevem — E os Firmamentos — fogem — Diademas – decaem — dobram-se — os Doges — Gotas sem som – em um Disco de Neve — 8 Safe in their Alabaster Chambers — Untouched by Morning — And untouched by Noon — Lie the meek members of the Resurrection — Rafter of Satin — and Roof of Stone! Grand go the Years — in the Crescent — above them — Worlds scoop their Arcs — And Firmaments — row — Diadems — drop — and Doges – surrender — Soundless as dots — on a Disc of Snow — (c. 1861) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 9 Tive uma jóia nos meus dedos — E adormeci — Quente era o dia, tédio os ventos — “É minha”, eu disse — Acordo — e os meus honestos dedos (Foi-se a Gema) censuro — Uma saudade de Ametista É o que eu possuo — . 9 I held a Jewel in my fingers — And went to sleep — The day was warm, and winds were prosy — I said “‘Twill keep” —

Page 6: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

I woke — and chid my honest fingers, The Gem was gone — And now, an Amethyst remembrance Is all I own — (c. 1861) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 10 Senti um Féretro em meu Cérebro, E Carpideiras indo e vindo A pisar — a pisar — até eu sonhar Meus sentidos fugindo — E quando tudo se sentou, O Tambor de um Ofício — Bateu — bateu — até eu sentir Inerte o meu Juízo E eu os ouvi — erguida a Tampa — Rangerem por minha Alma com Todo o Chumbo dos pés, de novo, E o Espaço — dobrou, Como se os Céus fossem um Sino E o Ser apenas um Ouvido, E eu e o Silêncio estranha Raça Só, naufragada, aqui — Partiu-se a Tábua em minha Mente E eu fui cair de Chão em Chão — E em cada Chão achei um Mundo E Terminei sabendo — então — . 10 I felt a Funeral, in my Brain, And Mourners, to and fro Kept treading — treading — till it seemed That Sense was breaking through — And when they all were seated, A Service like a Drum — Kept beating — beating — till I thought My Mind was going numb — And then I heard them lift a Box And creak across my Soul With those same Boots of Lead, again, Then Space — began to toll, As all the Heavens were a Bell, And Being, but an Ear, And I, and Silence, some strange Race Wrecked, solitary, here — And then a Plank in Reason, broke, And I dropped down, and down — And hit a World, at every plunge, And Finished knowing — then — (c. 1861)

Page 7: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

– Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 11 Não sou Ninguém! Quem é você? Ninguém — Também? Então somos um par? Não conte! Podem espalhar! Que triste — ser— Alguém! Que pública — a Fama — Dizer seu nome — como a Rã — Para as almas da Lama! . 11 I’m Nobody! Who are you? Are you — Nobody — too? Then there’s a pair of us! Don’t tell! they’d advertise — you know! How dreary — to be — Somebody! How public — like a Frog — To tell one’s name — the livelong June — To an admiring Bog!(c. 1861) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 12 Lidamos com o Joio — Para chegar à Joia! — Jogamos fora o Joio — Julgando-nos ingênuos — Mas a Forma era a mesma — E a nova Mão bateia Com Táticas de Gema — Praticando Areia — . 12 We play at paste — Till qualified, for Pearl — Then, drop the Paste — And deem ourself a fool — The shapes — though — were similar — And our new Hands Learned Gem-Tactics — Practicing Sands — (c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 13 Muita Loucura faz Sentido — A um Olho esclarecido — Muito Sentido — é só loucura —

Page 8: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

É a Maioria Que decide, suprema — Aceite — e você é são — Objete — é perigoso — E merece uma Algema . 13 Much Madness is divinest Sense — To a discerning Eye — Much Sense — the starkest Madness — ’Tis the Majority In this, as all, prevail — Assent — and you are sane — Demur — you’re straightway dangerous — And handled with a Chain — (c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. 14 Morri pela beleza — e assim que no Jazigo Meu Corpo foi fechado, Um outro Morto foi depositado Num Túmulo contíguo — “Por que morreu?” murmurou sua voz. “Pela Beleza” — retruquei — “Pois eu — pela Verdade – É o mesmo. Nós Somos Irmãos. É uma só lei” — E assim Parentes pela Noite, sábios — Conversamos a Sós — Até que o Musgo encobriu nossos lábios — E — nomes — logo após — . 14 I died for Beauty — but was scarce Adjusted in the Tomb When One who died for Truth, was lain In an adjoining room — He questioned softly “Why I failed”? “For Beauty”, I replied — “And I — for Truth — Themself are One — We Brethren, are”, He said — And so, as Kinsmen, met a Night — We talked between the Rooms — Until the Moss had reached our lips — And covered up — our names —(c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 15 Beleza — não tem causa — É —

Page 9: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Cace-a e ela cessa — Não a cace e ela cresce — Tente alcançar na Messe As Ondas — quando o Vento Passa os dedos por ela — Deus do alto vela Para negar o Intento — . 15 Beauty — be not caused — It Is — Chase it, and it ceases — Chase it not, and it abides — Overtake the Creases In the Meadow — when the Wind Runs his fingers thro’ it — Deity will see to it That You never do it — (c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 16 Algumas Borboletas há Nos Campos do Brasil — Voam ao meio-dia só — Depois — cessa o Alvará — Alguns Aromas — vêm e vão À tua Escolha, uma só vez — Estrelas — que à Noite entrevês — Estranhas — de Manhã — . 16 Some such Butterfly be seen On Brazilian Pampas — Just at noon — no later — Sweet — Then — the License closes — Some such Spice — express and pass — Subject to Your Plucking — As the Stars — You knew last Night — Foreigners — This Morning — (c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 17 Eu temo a Fala escassa — O Homem que fala Pouco — Falastrão — é oco — O Tagarela — passa — Mas O que pesa — Enquanto a Turba — Ao máximo se expande — Esse Homem — me perturba —

Page 10: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Temo que seja Grande — . 17 I fear a Man of frugal Speech — I fear a Silent Man — Haranguer — I can overtake Or Babbler — entertain — But He who weigheth — While the Rest — Expend their furthest pound — Of this Man — I am wary — I fear that He is Grand — (c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 18 Prazer — vira pintura — Se visto pela Dor — Melhor — porque impossível Ao fruidor — A Montanha — à distância — É Âmbar — um véu — Perto — dispersa-se — a ânsia — E Isto é — o Céu — . 18 Delight — becomes pictorial — When viewed through Pain — More fair — because impossible Than any gain — The Mountain — at a given distance — In Amber — lies — Approached — the Amber flits — a little — And That’s — the Skies — (c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 19 Banir a Mim — de Mim — Fosse eu Capaz — Fortim inacessível Ao Eu Audaz — Mas se meu Eu — Me assalta — Como ter paz Salvo se a Consciência Submissa jaz? E se ambos somos Rei Que outro Fim Salvo abdicar- Me de Mim? . 19

Page 11: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Me from Myself — to banish — Had I Art — Impregnable my Fortress Unto All Heart — But since Myself — assault Me — How have I peace Except by subjugating Consciousness? And since We’re mutual Monarch How this be Except by Abdication — Me — of Me?(c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 20 A Dor — tem Algo de Vazio — Não sabe mais a Era Em que veio — ou se havia Um tempo em que não era — Seu futuro é só Ela — Seu Infinito faz supor O seu Passado — que desvela Novos Passos — de Dor. . 20 Pain — has an Element of Blank — It cannot recollect When it began — or if there were A time when it was not — It has no Future — but itself — Its Infinite contain Its Past — enlightened to perceive New Periods — of Pain.(c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 21 Habito a Possibilidade — Casa melhor que a Prosa — De Janelas mais pródiga — Superior — em Portas — Cômodos como Cedros — Impermeáveis ao Olho — E por Eterno Teto Os Dosséis do Céu — De Visitantes — o mais justo — Por Ofício — Isto — Só as asas destas parcas Mãos Para o meu Paraíso — . 21

Page 12: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

I dwell in Possibility — A fairer House than Prose — More numerous of Windows — Superior — for Doors — Of Chambers as the Cedars — Impregnable of Eye — And for an Everlasting Roof The Gambrels of the Sky — Of Visitors — the fairest — For Occupation — This — The spreading wide my narrow Hands To gather Paradise —(c. 1862) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 22 Como se o Mar rompesse Mostrando um outro Mar ― E fosse ― um outro ― nesse Mar ainda pré-formar ― Mares do Mar ― que invade As Praias singulares De outros futuros Mares ― Nestes ― a Eternidade ― . 22 As if the Sea should part And show a further Sea ― And that ― a further ― and the There But a presumption be ― Of Periods of Seas ― Unvisited of Shores ― Themselves the Verge of Seas to be ― Eternity ― is Those ―(c. 1863) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 23 Publicar — é o Leilão Da nossa Mente — Pobreza — uma razão De algo tão deprimente Mas Nós — antes, em Greve, Da Mansarda ir, sem cor, Branca — Ao Branco Criador — Que investir — Nossa Neve — A Ele nosso Pensamento Pertence — a Ele Que encomenda Sua ilustração Corpórea — a Venda Do Real Alento — Mercar, sim — o que emana Do Celeste Endereço —

Page 13: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Sem reduzir a Alma Humana À Desgraça do Preço — . 23 Publication — is the Auction Of the Mind of Man — Poverty — be justifying For so foul a thing Possibly — but We — would rather From Our Garret go White — Unto the White Creator — Than invest — Our Snow — Thought belong to Him who gave it — Then — to Him Who bear It’s Corporeal illustration — Sell The Royal Air — In the Parcel — Be the Merchant Of the Heavenly Grace — But reduce no Human Spirit To Disgrace of Price —(c. 1863) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 24 Não podia beber se Você antes não bebesse, Por mais que a antecedesse O Pensar da Sede. . 24 I could not drink it, Sweet, Till You had tasted first, Though cooler than the Water was The Thoughtfulness of Thirst.(c. 1864) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 25 Corta o Ar do Ar — Divide a Luz, se puderes — Eles se acharão Cubos numa Gota Ou Grãos num Vaso Vão Névoas não anulam Odores volvem Força a Flama E com um Louro impulso Ante a tua impotência Voa a Chama. 25

Page 14: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Banish Air from Air — Divide Light if you dare — They’ll meet While Cubes in a Drop Or Pellets of Shape Fit Films cannot annul Odors return whole Force Flame And with a Blonde push Over your impotence Flits Steam.(c. 1864) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 26 Esses testaram o Horizonte — E desapareceram Pássaros antes de cumprir A Latitude. Nossa Retrospectiva Deles Prazer pousado, Nossa Antecipação — Dúvida — Dado — . 26 These tested Our Horizon — Then disappeared As Birds before achieving A Latitude. Our Retrospection of Them A fixed Delight, But our Anticipation A Dice — a Doubt — (c. 1864) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. 27 Mansão malsã de Quem? Tabernáculo ou Tumba — Domo de um Verme — Grota de um Gnomo — Ou Elfo em Catacumba? . 27 Drab Habitation of Whom? Tabernacle or Tomb — Or Dome of Worm — Or Porch of Gnome — Or some Elf’s Catacomb?

Page 15: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

(c. 1864) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 28 Me oculto em minha flor, Que fana no teu Vaso, Sem suspeitar, sentes por mim — Quase tristeza acaso. . 28 I hide myself within my flower, That, fading from your Vase, You, unsuspecting, feel for me — Almost a loneliness. (c. 1864) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 29 A Dor — expande o Tempo — Eras se enrolam dentro da Circunferência De um só Cérebro — A Dor contrai — o Tempo — Num mero Tiro Milhões de Eternidades Cabem num Suspiro — . 29 Pain — expands the Time — Ages coil within The minute Circumference Of a single Brain — Pain contracts — the Time — Occupied with Shot Gamuts of Eternities Are as they were not — (c. 1864) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 30 A Morte é um Diálogo entre A Alma e o Pó. Diz a Morte “Some” — A Alma “Só Me cabe ser Crente” — A Morte — sob a Terra — clama — Vai-se a Alma Deixando o seu — prova cabal — Manto de Lama. .

Page 16: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

30 Death is a Dialogue between The Spirit and the Dust. “Dissolve” says Death —The Spirit “Sir I have another Trust” — Death doubts it — Argues from the Ground — The Spirit turns away Just laying off for evidence An Overcoat of Clay. (c. 1864) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 31 O Abrir e o Fechar Do Ser é igual e Desigual, se o for, À Flor no Caule. Que de mesma Semente Vão, em igual Botão, Paralelos, perfeitos No que já não são. . 31 The Opening and the Close Of Being, are alike Or differ, if they do, As Bloom upon a Stalk. That from an equal Seed Unto an equal Bud Go parallel, perfected In that they have decayed. (c. 1865) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 32 Morrer por ti era pouco. Qualquer grego o fizera. Viver é mais difícil — É esta a minha oferta — Morrer é nada, nem Mais. Porém viver importa Morte múltipla — sem O Alívio de estar morta. . 32 Too scanty ’twas to die for you, The merest Greek could that. The living, Sweet, is costlier — I offer even that — The Dying, is a trifle, past,

Page 17: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

But living, this include The dying multifold — without The Respite to be dead. (c. 1865) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 33 A Geometria é a maior Magia Para a imaginação do mago — Cujos prodígios, meros atos, A humanidade prestigia. . 33 Best Witchcraft is Geometry To the magician’s mind — His ordinary acts are feats To thinking of mankind. (c. 1870) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 34 A Voz que para mim é um Mar É para outros chã — A Face que nasce a Manhã Fana sob outro Olhar — Que diferença há em Substância Se o que me é Soma A outras Finanças só alcance a Pobreza Extrema! . 34 The Voice that stands for Floods to me Is sterile borne to some — The Face that makes the Morning mean Glows impotent on them — What difference in Substance lies That what is Sum to me By other Financiers be deemed Exclusive Poverty! (c. 1871) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 35 Ruas sem som serviam Circunscrições de Pausa — Nem Sim — nem Não — se ouviram Sem Universo — ou Causa — Relógios davam Dia — Noite — Sinos distantes —

Page 18: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Mas Eras não havia E nem Depois nem Antes. . 35 Great Streets of silence led away To Neighborhoods of Pause — Here was no Notice — no Dissent — No Universe — no Laws — By Clocks, ’twas Morning, and for Night The Bells at Distance called — But Epoch had no basis here For Period exhaled. (c. 1870) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 36 Se o meu Riacho é fluente Há de secar — Se o meu Riacho é silente Ele é o Mar — Que cresce. Em meu espanto Tento escapar Para um (dizem que existe) Canto Onde “não há Mar” — . 36 Because my Brook is fluent I know ‘tis dry — Because my Brook is silent It is the Sea — And startled at its rising I try to flee To where the Strong assure me Is “no more Sea” — (c. 1871) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 37 A palavra morre Quando ocorre, Se dizia. Eu digo que ela Se revela Nesse dia. . 37 A word is dead When it is said, Some say. I say it just

Page 19: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

Begins to live That day. (c. 1872?) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 38 O Enigma decifrado Despreza-se com pressa — A Surpresa de Ontem Já não nos interessa — . 38 The Riddle we can guess We speedily despise — Not anything is stale so long As Yesterday’s surprise — (c. 1870) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 39 Tanto orgulho em morrer Que nos humilha. Tanta Indiferença em ter Tudo o que nos encanta — Tão feliz, ao revés, De ir aonde ninguém quis — Que a Angústia se desdiz Em Inveja, a teus pés — . 39 So proud she was to die It made us all ashamed That what we cherished, so unknown To her desire seemed — So satisfied to go Where none of us should be Immediately — that Anguish stooped Almost to Jealousy — (c. 1873) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 40 Nesta Vida tão breve De que nos dão só um gole Quanto — quão pouco — está Sob o nosso controle . 40 In this short Life

Page 20: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

that only lasts an hour How much — how little — is within our power(c. 1873) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 41 Ontem é História, Mas está tão longe — Ontem é Poesia — É Filosofia — Ontem é mistério — Mas onde está Hoje? Mal especulamos O tempo nos foge . 41 Yesterday is History, ‘Tis so far away — Yesterday is Poetry — ‘Tis Philosophy — Yesterday is mystery — Where it is Today While we shrewdly speculate Flutter both away (c. 1873) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 42 O Cogumelo — à Noite — É o Gnomo da Floresta — e De Dia, Trufo-Travesti, Estaca, um Toco. Como se lentamente Em toda a sua Saga Mais lento que a Serpente Mais breve que uma Praga — Malabar vegetal — Gente do Álibi — tal Uma Bolha antecede E, Bolha, se despede — Como se visse a Grama Interromper sua trama — Um sub-reptício enxerto Do verão circunspecto. Se a Natureza a um Traidor Quisesse descompor — Se Apóstata tivesse — O Cogumelo — é esse! . 42

Page 21: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

The Mushroom is the Elf of Plants — At Evening, it is not — At Morning, in a Truffled Hut It stop upon a Spot As if it tarried always And yet it’s whole Career Is shorter than a Snake’s Delay And fleeter than a Tare — ’Tis Vegetation’s Juggler — The Germ of Alibi — Doth like a Bubble antedate And like a Bubble, hie — I feel as if the Grass was pleased To have it intermit — This surreptitious scion Of Summer’s circumspect. Had Nature any supple Face Or could she one contemn — Had Nature an Apostate — That Mushroom — it is Him! (c. 1874) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 43 Se o lábio hábil a sílaba Soubesse sopesar, Poderia, surpreso, Ruir sob seu peso. . 43 Could mortal lip divine The undeveloped Freight Of a delivered syllable ‘Twould crumble with the weight. (c. 1877) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. § 44 Um Vão na Pedra Tumular Faz do feroz Lugar Um Lar — . 44 A Dimple in the Tomb Makes that ferocious Room A Home — (c. 1880) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. §

Page 22: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

45 A Fama é uma abelha. Tem um estribilho — Um ferrão em brasa — Ah! também tem asa. . 45 Fame is a bee. It has a song — It has a sting — Ah, too, it has a wing. (?) – Emily Dickinson – ‘Não sou ninguém’. Poemas. [traduções Augusto de Campos]. Campinas: Unicamp, 2009. **** TRADUÇÃO AÍLA DE OLIVEIRA 606 “Dizem, ‘com o tempo se esquece’, Mas isto não é verdade, Que a dor real endurece, Como os músculos, com a idade. O tempo é o teste da dor, Mas não é o seu remédio – Prove-o e, se provado for, É que não houve moléstia. . 606 They say that “Time assuages” – Time never did assuage – An actual suffering strengthens As Sinews do, with age – Time is a Test of Trouble – But not a Remedy – If such it prove, it prove too There was no Malady – – Emily Dickinson, em “Emily Dickinson: Uma centena de poemas”. [tradução, introdução e notas Aíla de Oliveira Gomes]. São Paulo: T. A. Queiroz; EdUSP, 1984. § 701 “Um pensamento me veio hoje à mente Que já antes me ocorreu. Não o concluí; foi tempo atrás; que ano Não lembro corretamente; Nem para onde foi, nem porque veio A mim por segunda vez; Nem, em definitivo, o que ele era Tenho a arte de dizer. Mas – em algum canto – em minha alma – eu sei Que já encontrei Coisa assim – Foi só um relembrar – foi tão somente – E já não mais veio a mim.

Page 23: Emily Dickinson poemas Literatura emily dickinson · 2018. 10. 13. · Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. . By a departing light We see acuter,

. 701 A Thought went up my mind today – That I have had before – But did not finish – some way back – I could not fix the Year – Nor where it went – nor why it came The second time to me – Nor definitely, what it was – Have I the Art to say – But somewhere – in my Soul – I know – I’ve met the thing before – It just reminded me – ‘twas all – And came my way no more – – Emily Dickinson, em “Emily Dickinson: Uma centena de poemas”. [tradução, introdução e notas Aíla de Oliveira Gomes]. São Paulo: T. A. Queiroz; EdUSP, 1984.