e m hull - o sheik

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    O SHEIK E.M.HULLO SHEIK E.M.HULLO SHEIK E.M.HULLO SHEIK E.M.HULL

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    Livro que deu origem ao filme O Sheik, com Rodolpho Valentino

    Conta histria de Diana, linda rica e destemida, que se aventura em umaexpedio pelo deserto. Pagou Mustaph para gui-la pelo deserto, e o Skeikpagou a Mustaph para lev-la at ele. Porque ele tinha o ardente desejo depossu-la. Um dia, em Biskra, viu-a durante alguns minutos e foi o bastantepara verificar que ela era indispensvel para a sua vida. E sempre que queriaalguma coisa, obtinha por bem ou fora!

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    DispoDispoDispoDisponibilizao: Marisanibilizao: Marisanibilizao: Marisanibilizao: Marisa HelenaHelenaHelenaHelena

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    CAPCAPCAPCAPTULOTULOTULOTULO IIII

    A senhora vir assistir ao baile, Lady Conway? Decididamente no vou. No aprovo em absoluto a expedio em perspectiva que

    vai ser festejada com esse baile. Sou de opinio que s em pensar numa viagem dessas,sozinha pelo deserto afora, sem uma dama de companhia ou pelo menos uma criada,unicamente com os naturais do pas, condutores de camelos e empregados, Diana Mayoest procedendo de um modo to negligente e imprprio que sem dvida lanar umandoa no s na sua reputao como no prestgio de sua ptria. Fico envergonhada s de

    pensar nisso. Ns, ingleses, devemos ter o mximo cuidado com o nosso procedimentono estrangeiro. O menor deslize serve de pretexto para os nossos vizinhos do continentenos atirar pedras, e o atual est longe de ser insignificante. a mais desatinada prova defalta de juzo de que j tive notcia.

    Ora, convenha, Lady Conway, o mal no to grande como senhora imagina.Certamente que um pouco fora do comum e... isto ... provavelmente no muitosensata a ideia, mas preciso no esquecer que a srta. Mayo teve uma educao todaespecial...

    No me estou esquecendo de que ela teve essa educao especial, atalhou LadyConway. Uma educao deplorvel. Mas no pode haver desculpas para esta viagemescandalosa. Conheci a me de Diana h muitos anos e impus-me a tarefa de mostrartanto, moa como ao irmo o desatino que iam cometer, porm sir Aubrey est de talmodo obcecado com a sua companheira egosta que nem consuma picareta se poderiamdemolir as suas convices. De acordo com a opinio dele, uma pessoa que tem o nomeMayo est acima de qualquer crtica e a reputao de sua irm uma coisa pela qual

    somente ela responsvel. A prpria moa, segundo me pareceu, no tem ideia dagravidade da sua posio e mostra-se muito petulante e at um pouco desabrida, ao lhefazerem observaes. Lavo as mos quanto a esse assunto e de modo algum irei dar meuapoio a essa festa, comparecendo a ela. J avisei mesmo o gerente de que se o barulhoesta noite for alm de uma hora razovel, deixarei o hotel amanh cedo.

    E, embrulhando-se em sua capa, com um pequeno calafrio, Lady Conway atravessoumajestosamente a larga varanda do Hotel Biskra.

    Os dois homens que tinham ficado de p, junto janela do salo de baile do hotel,

    entreolharam-se e sorriram. Eis um belo sermo, disse um deles com pronunciado sotaque norte-americano.

    Creio que assim que se fazem os escndalos.

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    Qual escndalo, qual nada! Nunca houve a menor sombra de escndalo ao qual onome de Diana Mayo estivesse ligado. Eu a conheo desde menina. E j era, ento, umapequena extravagante e original. Essa velha no passa de uma faladeira! Seria capaz dearrasar a reputao do Anjo Gabriel, se ele descesse a terra, quanto mais a de uma

    jovem to humana como Diana. Nem por isso ela muito humana, disse o americano rindo. Parece que devia ternascido homem e que foi modificada ltima hora. Assemelha-se a um rapaz de saias,mas um rapaz bonito de verdade e orgulhoso como poucos, acrescentou com umagargalhada. Ouvi-a esta manh a fazer troa de um oficial francs.

    O ingls riu. Com certeza o oficial tentou fazer-lhe uma declarao de amor. uma coisa que

    Diana no compreende e no tolera. moa fria como gelo e no pensa seno em esportes

    e viagens. Esperta, inteligente e arrojada. Creio que no sabe a significao da palavramedo.

    H certa tendncia esquisita nessa famlia, no verdade? Ouvi algum referirse a isso uma noite destas. O pai era meio desequilibrado e deu um tiro nos miolos,segundo me contaram. O ingls sacudiu os ombros.

    Se voc quiser, pode cham-lo desequilibrado, retrucou vagarosamente. Moroperto da casa dos Mayos na Inglaterra e conheo a histria toda. Sir John Mayo eraverdadeiramente apaixonado pela esposa; vinte anos depois de casados, ainda se amavam

    como no tempo de noivos. Foi quando Diana nasceu, tendo falecido sua me. Duas horasdepois, sir John suicidou-se deixando a recm-nascida ao cuidado do irmo que tinhadezenove anos e j era to preguioso e egosta como agora. O problema de educar umamenina era muito difcil de ser resolvido e ele achou mais fcil eliminar as dificuldadestratando-a como se ela fosse um rapaz. O resultado o que voc est vendo.

    Os dois se aproximaram da janela aberta e puseram-se a olhar para dentro dosalo brilhantemente iluminado, j repleto de pessoas que conversavam alegremente.Sobre uma plataforma baixa, em um dos extremos do salo, o promotor e a promotora dafesta recebiam os convidados. Eram extraordinariamente diferentes. Sir Aubrey Mayo,alto e magro com cabelos e bigodes muito negros a contrastarem com a palidez do rosto,tinha um ar corts de pessoa bem educada misturada com um pouco de tdio dissimulado.Parecia to cansado que nem conseguia conservar. No lugar o monculo que caa a todoinstante. A moa era exatamente o contrrio; de uma vivacidade esplendente, de alturamdia e muito elegante, com um garbo natural que lhe dava um ar de rapaz desportista. Asua cabecinha levantada demonstrava altivez. A boca em linha reta e o desenho do queixo

    deixavam perceber um esprito perseverante e seus olhos de um azul profundo erambrilhantes e vivos. As pestanas, longas e curvas, ensombravam-lhe os olhos, e assobrancelhas escuras como que ofuscavam o encanto dos cachos de cabelos vermelho-

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    dourados que ela usava curtos, e apertados contra as orelhas. E um resultado que vale a pena ver-se disse o americano com entusiasmo,

    referindo-se s ltimaspalavras do seu companheiro.Nisto veio ter com eles um terceiro rapaz.

    Ol, Arbuthnot. Voc est atrasado. A divindade j tem dez nomes decavalheiros escritos no seu carnet.O jovem ficou por um momento com o rosto muito vermelho e respondeu zangado,

    voltando cabea: Fiquei atrasado por causa de Lady Conway aquela velhota implicante! Ela fez

    um sermo muito comprido a respeito de Miss Mayo e da sua viagem. Devia-se amordaaraquela velha. Parecia resolvida a falar a noite toda de modo que fui logo arranjando umjeito de faz-la parar. Entretanto h um ponto em que eu concordo com ela. Por que.

    Aquela zebra do Mayo no acompanha a irm?Parece que ningum foi capaz de dar uma resposta. A orquestra tinha principiado a

    tocar e o salo estava cheio de pares que conversavam e riam. Sir Aubrey Mayo tinha-seretirado, e sua irm estava de p, cercada por vrios rapazes que esperavam,empunhando os programas, porm ela os dispersou com um sorriso e um gesto negativofeito com a cabea.

    As coisas parecem que esto andando depressa disse o americano. Voc vai tentar a sorte? perguntou o mais idoso dos dois ingleses.

    O americano mordeu a ponta de um charuto e sorriu. De certo que no. Aquela pequena terrvel acabou-me com as veleidades de

    danarino pouco tempo depois de nos termos conhecido. E no me queixo por isso ajuntou com um riso amarelo. Mas a verdade que a ingenuidade dela chega a irritar.Imaginem que me disse com toda a franqueza que no sabia o que fazer de um americanoque no andava a cavalo e no sabia danar. claro que eu retruquei, com toda adelicadeza, que nos Estados Unidos havia sempre oportunidades para um homem triunfar,ainda que ele no fosse peo nem danarino de cabar, ela, porm lanou-me um olhargelado e eu, achei melhor desaparecer da sua presena. No; Sir Complacncia Egostavai arranjar uma mesa de bridge daqui a pouco e creio que isso me ser mais conveniente.O rapaz, afinal de contas, no mau companheiro para quem sabe fechar os olhos para assuas extravagncias e um esportista. Gosto de jogar com ele. Tanto lhe faz estarganhando como perdendo.

    coisa que no tem importncia para quem possui uma conta no banco igual dele disse Arbuthnot. Eu, por mim, acho a dana mais agradvel e menos

    dispendiosa. Vou tentar a minha sorte com a rainha da festa.E assim dizendo olhou para a extremidade do salo onde a moa estava de p esozinha, com o seu porte elegante, sob a luz de um abajur que dava um brilho dourado

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    aos cabelos que emolduravam seu rosto altivo. Olhava os pares que danavam com umaexpresso de alheamento, como se os seus pensamentos estivessem muito longe daquelesalo de baile.

    O americano empurrou Arbuthnot para frente com um risinho discreto.

    Corra, mariposa ingnua, v queimar suas asas. Depois que a beldade o tiverpisado aos ps eu virei com a p do lixo ajuntar os seus restos. Porm se a suatemeridade for coroada pela vitria que merece, mais tarde havemos de celebrar esseacontecimento. E enlaando o seu brao no do amigo dirigiu-se sala de jogo.

    Arbuthnot atravessou a porta e principiou a abrir caminho vagarosamente pelosalo, rente parede, desviando-se dos pares que danavam e pedindo licena a gruposde homens e senhoras de todas as nacionalidades que conversavam com animao.Finalmente chegou ao estrado sobre o qual Diana Mayo ainda se conservava de p, e,

    subindo os poos degraus, parou ao seu lado. Que felicidade, Miss Mayo disse ele, absolutamente certo de que ela no

    pensava da mesma forma. Ser possvel que eu tenha tido a felicidade de encontr-lasem par para esta dana?

    Ela voltou-se devagar, com uma pequena ruga entre as sobrancelhas arqueadas,como manifestando ter sido inoportuna a vinda do rapaz e sentir-se aborrecida dainterrupo dos seus pensamentos; mas depois sorriu.

    Eu disse que no danaria enquanto no estivessem todos danando

    respondeu com um ar de dvida olhando o salo repleto de pares. E esto todos danando. Cumpriu nobremente o seu dever. No perca esta

    msica to convidativa ajuntou o ingls persuasivamente.A moa ficou hesitante, a bater com o lpis do carn nos dentes alvos. J me recusei a danar com muitos cavalheiros replicou com uma careta.

    Depois, rindo, acrescentou: Ento vamos. J tenho fama de mal educada. Este sersomente mais um pecado para juntar coleo dos anteriores.

    Arbuthnot danava bem, mas com a moa nos braos tinha ficado mudo. Deram avolta ao salo algumas vezes, depois pararam junto a uma porta aberta e saram para ojardim do hotel, onde se sentaram num sof de vime, debaixo da uma lanterna japonesamulticor. A orquestra ainda estava tocando e naquele momento o jardim se encontravavazio, fracamente iluminado por lanternas coloridas, que em festes desciam pelaspalmeiras de um e outro lado das alamedas.

    Arbuthnot inclinou-se para a frente pondo as mos entre os joelhos. Nunca encontrei ningum que danasse to bem como voc disse ele com

    timidez. Pode crer que dana admirvelmente.Miss Mayo olhou para ele com ar srio, sem a menor expresso de vaidade. Danar muito fcil para quem tem bom ouvido e est habituada a fazer o

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    corpo obedecer a sua vontade. Parece que h poucas pessoas exercitadas a fazer aspernas obedecerem s suas ordens.

    As minhas me obedecem porque esto habituadas a isso desde o tempo em que euera criancinha respondeu a moa calmamente.

    Aquela resposta inesperada fez que Arbuthnot ficasse silencioso por algunsminutos e a moa parecia no ter pressa em quebrar o silncio. A dana terminou e ospares refluram para o jardim que ficou repleto por algum tempo. Depois, tendo aorquestra comeado nova msica, os convidados voltaram ao salo e o jardim ficounovamente deserto.

    Como est agradvel aqui disse Arbuthnot, como quem sonda o terreno. O seucorao batia com rapidez fora do comum e seus olhos, que ele conservava fixos nasmos cruzadas, tinham uma expresso apaixonada.

    Quer dizer que prefere ficar sentado comigo aqui fora durante esta dana? disse com uma franqueza tal que o deixou desconcertado.

    Sim gaguejou o rapaz sem saber muito bem o que dizia.Miss Mayo levantou o carn luz da lanterna. Esta dana estava prometida a Arthur Conway. Ns discutimos todas as vezes

    que nos encontramos. No posso compreender porque pediu para danar comigo; elediscorda do meu modo de pensar ainda mais do que sua me aquela velha que gostatanto de intrometer-se nos negcios alheios. Creio que vai ficar muito contente se eu me

    esquecer da minha promessa. No sinto vontade de danar esta noite. Tenho o espritocheio de preocupaes por causa da viagem de amanh. Vou ficar conversando com voc,mas preciso que me d um cigarro para que eu conserve o meu bom humor.

    A mo dele tremia um pouco ao chegar o fsforo aceso ao cigarro da moa. Est mesmo decidida a levar avante esta expedio?Ela olhou com surpresa o rapaz. E por que no? J fiz todos os meus preparativos. Por que havia de mudar de

    idia na ltima hora? Por que seu irmo a deixa ir s? Por que ele no vai com voc? Bem sei que no

    tenho o direito de fazer estas perguntas, entretanto fao-as declarou com veemncia.Miss Mayo encolheu os ombros com um risinho. Ns estamos em divergncia, Aubrey e eu. Ele quer ir para os Estados Unidos.

    Eu quero fazer uma excurso pelo deserto. Por causa disso ns discutimos durante doisdias e metade de uma noite e afinal chegamos a um acordo. Irei fazer minha excurso nodeserto, e Aubrey ir para Nova York; e para demonstrar o seu reconhecimento

    fraternal minha promessa de me ir encontrar com ele nos Estados Unidos daqui a umms, sem falta, ele anuiu em acompanhar a minha caravana na sua primeira etapa edespedir-se depois de mim com a sua bno. Fico muito aborrecida de no lhe ter sido

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    possvel obrigar-me a acompanh-lo, pois esta a primeira vez que, em nossa vidaerrante, os nossos desejos no nos atraem para a mesma direo. Emancipei-me hpoucos meses e doravante poderei fazer o que bem me aprouver. Nisso no quer dizerque no tenha sido assim at hoje acrescentou com outra risada porque os meus

    desejos at hoje sempre combinaram com os de Aubrey. Mas por causa de um ms! Que diferena faria isso para ele? perguntouArbuthnot admirado da intransigncia do irmo dela.

    Aubrey assim respondeu a moa. Mas a viagem muito perigosa insistiu o rapaz.Ela sacudiu a cinza do cigarro descuidadamente. No concordo com voc. No sei por que todos esto fazendo disso um cavalo de

    batalha. Muitas outras mulheres tm feito viagens em pases mais selvagens do que este

    deserto.O moo olhou para ela com curiosidade. Miss Mayo parecia no compreender que

    era a sua mocidade, e a sua beleza que faziam a expedio perigosa. Entretanto pareceu-lhe melhor apresentar a desculpa mais fcil.

    Tem havido muitas dissenses entre as tribos. Ouvi vrios boatos a esserespeito disse o rapaz com sinceridade.

    Ela fez um pequeno movimento de impacincia. Oh, sempre essa mesma histria que eles contam quando querem criar

    obstculos. As autoridades j me disseram essa lorota tambm. Eu exigi provas e sficaram no terreno das generalidades. Perguntei-lhes se eles tinham o direito de impedira minha viagem. Responderam-me que no, mas que me aconselhavam a que no fosse.Disse-lhes que iria, a no ser que o governo francs mandasse prender-me... E por queno? No tenho medo. No vejo nada de que se possa ter medo. No acredito uma palavraa respeito das dissenses entre as tribos. Os rabes esto sempre se deslocando de umlado para outro, no verdade? Tenho um excelente guia para a caravana, um guia que asprprias autoridades gabam e, alm disso, irei armada. Sou competente para tomar contade mim. Sei atirar muito bem e estou acostumada a viver em acampamentos. Alm disso,dei a minha palavra a Aubrey de que estaria em Oran dentro de um ms, e no poderei irmuito longe nesse espao de tempo.

    A sua voz tinha um tom de obstinao. Quando ela acabou de falar, o rapaz ficousilencioso, consumido pela paixo, obcecado pela sua beleza e atormentado pelo desejode dizer-lhe tudo. Depois se voltou repentinamente para a moa com o rosto muitoplido.

    Miss Mayo... Diana... transfira esta viagem para mais tarde e d-me o direito deir com voc. Eu a amo acima de qualquer outra coisa neste mundo, desejo que voc sejaminha esposa. No hei de ser sempre um subalterno sem vintm. Ainda terei algum dia

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    uma posio que seja digna de voc no, no direi tanto mas uma posio da qual euno me tenha de envergonhar perante voc. Temos sido muita bons amigos; voc meconhece muito bem. Devotarei minha vida toda a faz-la feliz. O mundo tornou-sediferente para mim desde o momento em que a encontrei. Amo-a. No me posso separar

    de voc. Sinto-a nos meus pensamentos dia e noite. Amo-a, desejo-a. Meu Deus! Umabeleza como a sua capaz de deixar um homem doido! Ento unicamente a beleza que um homem ambiciona encontrar em sua esposa?

    perguntou ela com certa frieza e admirao na voz. Para mim a inteligncia e asade parecem coisas muito mais importantes e desejveis.

    Porm quando uma mulher possui esses trs predicados, como voc, Diana, podeconsiderar-se perfeita sussurrou ele apaixonadamente apertando com as suas mos asmozinhas delicadas da moa. Com uma fora que parecia impossvel a uma criatura to

    pequena ela retirou as mos rapidamente. - Fao o favor de no continuar a falar assim.Voc me fez ficar triste. Temos sido muito bons amigos, e nunca me ocorreu que pudessehaver mais alguma coisa, alm disso. Nunca julguei que voc me pudesse amar. Eu pelomenos nunca pensei em voc dessa maneira. No compreendo isso. Deus, quando me fez,certamente esqueceu-se de me dar um corao. Nunca amei ningum na minha vida. Meuirmo e eu temo-nos tolerado, porm nunca houve a menor afeio entre ns. E, alis,isso muito natural. Ponhas se voc no lugar de Aubrey. Imagine-se um rapaz dedezenove anos, com um esprito reservado e frio, que recebe de um momento para outro

    a incumbncia de tomar conta de uma irmzinha, largada nas suas mos inesperadamentee contra sua vontade. Seria lgico que ele me tivesse alguma afeio? Eu nunca desejeiessa afeio; Nasci com a mesma alma fria e indiferente que ele tem. Fui educada comoum rapaz. Minha vida tem sido rude. As emoes e as afeies no tm tido partenenhuma nela. So coisas que no conheo e nem desejo conhecer. Estou muito satisfeitacom a minha vida tal como ela . O casamento, para uma mulher, significa a perda da suaindependncia, quero dizer, o casamento com um homem que seja verdadeiramente umhomem, digam o que disserem as mulheres modernas. Nunca obedeci a ningum na minhavida; e no desejo experimentar isso agora. Sinto muito desgost-lo. Voc tem sido umexcelente companheiro, mas esse aspecto da vida no existe para mim. Se eu tivessepensado, um nico instante, que a minha amizade ainda havia de ser um motivo desofrimento para voc, no teria deixado essa amizade se tornar to ntima, mas no melembrei, porque nunca penso nessas coisas. Um homem para mim unicamente umcompanheiro com quem eu ando a cavalo, cao ou pesco; um camarada, um amigo e nadamais. Deus me fez mulher. Porque, s Ele sabe!

    A sua voz era calma e natural. Havia nela um tom de fria sinceridade queArbuthnot no pde deixar de reconhecer. Tinha falado tudo com a maior franqueza.No dissera mais do que a pura verdade. A sua reputao de completamente indiferente

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    para com as paixes de que era causadora e a sua atitude invarivel para com os homenseram to conhecidas quanto a sua ilimitada coragem e a sua vontade obstinada.

    Para Sir Aubrey Mayo ela era como que um irmo mais moo que servia paradistrair os amigos dele. Dava-se com todos, at mesmo com as mes de filhas

    casadouras, porque, embora rica e linda, o seu gnio estranho a impedia de ser uma rivalde moas mais modestas e menos dotadas.Arbuthnot conservou-se sentado e em silncio. Era mesmo difcil, pensava

    amargamente, que ele fosse bem sucedido, quando outros, em melhores condies,tinham falhado. Havia sido um tolo em ceder quela tentao forte demais para que lhepudesse resistir. J a conhecia muito bem e sabia de antemo qual ia ser a resposta. Oreceio de que alguma coisa sucedesse moa naquela prxima expedio, o mistriodaquela noite oriental, a presena dela, as luzes, a msica, isso tudo combinado, havia

    trazido aos seus lbios palavras que ele, se estivesse mais de posse de si mesmo, nuncateria pronunciado. Ele a amava, am-la-ia sempre, mas tinha a certeza de que o seu amorera to sem esperana quanto eterno. Mas era a homens verdadeiramente homens queela desejava para amigos e, portanto ele devia mostrar-se um forte.

    Poderemos continuar a ser camaradas, Diana? perguntou Arbuthnot comcalma.

    Miss Mayo olhou um instante para ele, cujos olhos, sob a luz mortio das lanternaspendentes, fitaram com firmeza os dela, e a moa estendeu-lhe a mo com franqueza.

    Com todo o prazer disse ela singelamente. Tenho muitos conhecidos, pormpoucos amigos. Ns estamos sempre viajando, Aubrey e eu, e parece que no temostempo para arranjar amizade. Raramente ficamos tantos meses num lugar, como ficamosaqui. Na Inglaterra dizem que somos muito maus vizinhos, pois muito raro estarmos l.Geralmente passamos trs meses em casa, no inverno, para caar, mas o resto do anovagamos pela face da Terra.

    Ele conservou a sua mo mimosa apertada na sua alguns instantes, recalcando umimenso desejo de lev-la aos lbios, o que, sabia, iria destruir a amizade que lhe acabavade ser concedida. Em seguida soltou-a. Miss Mayo continuou sentada ao seu lado. Noestava de modo algum constrangida pelo que acabava de suceder. Havia interpretadoliteralmente as palavras do rapaz e continuava a trat-lo como o camarada que ele pedirapara ser. Nem lhe passava pela mente que o devia deixar s, nem que a sua companhia oestava fazendo sofrer. Ela no se sentia embaraada, estava, ao contrrio,completamente vontade. Enquanto ali se achavam em silncio, ela pensando naexpedio e no deserto e ele alimentando vs esperanas e evocando saudosas

    recordaes, ouvia-se uma voz de homem quebrar suavemente o silncio da noite.Plidas mos que eu amava, perto do Shalimar. Onde estareis agora? A quem ireisafagar? cantava ele, com uma voz apaixonada e vibrante de bartono. Cantava em ingls,

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    entretanto, as modulaes de sua voz tinham um acento estrangeiro. Diana Mayo curvou-se para a frente e, de cabea levantada, escutava atentamente, com os olhos acintilarem. A voz parecia vir do fundo do jardim, ou talvez de mais longe ainda, daestrada que passava alm da certa de cactos. O homem cantava vagarosamente, e sua

    voz como que acariciava as palavras; os versos iam morrendo pouco a pouco, comsuavidade e clareza, at se desvanecerem os ltimos sons.Por momentos o silncio dominou outra vez no jardim. Diana se se encostou ao

    espaldar do sof com um pequeno suspiro. A Cano de Cachemira. Fez-me lembrar da ndia. Ouvi um homem cant-la em

    Cachemira no ano passado, porm no desta maneira. Que linda voz! Quem ser que cantaassim?

    Arbuthnot olhou para ela com curiosidade, surpreso pela sbita entonao de

    interesse no seu modo de falar e pela animao do seu rosto. Voc diz que no conhece a emoo, e, entretanto a cano desse desconhecido

    deixou-a to comovida. Como pode conciliar essas duas coisas? perguntou ele quasezangado.

    Gostar do que belo ser emoo? retrucou a moa levantando os olhos. No, certamente que no . A msica, a arte, a natureza, tudo quanto belo me atrai.Mas no h nisso a menor emoo. Simplesmente prefiro as coisas belas s feias. poressa razo que gosto de vestidos bonitos acrescentou rindo.

    Voc a moa que melhor se veste em Biskra disse ele. No ser isso umaconcesso aos sentimentos femininos que despreza?

    No, senhor. Interessar-se pela roupa no um defeito exclusivamentefeminino. Gosto de vestidos bonitos. Concordo em que perco algum tempo estudando ascores que melhor combinam com o meu horrvel cabelo, mas posso garantir que a minhacostureira no se v to atrapalhada quanto o alfaiate de Aubrey.

    Depois calou-se, esperando que o cantor no se tivesse ido embora, porm nadamais se ouviu a no ser uma cigarra ziziando perto deles. Voltando-se na direo deonde vinha o som, Diana disse:

    Escute! Que animalzinho alegre! Sempre a primeira coisa que ouo quandochego a Porto Said. Para mim, a cigarra representa o Oriente.

    um inseto muito aborrecido! disse Arbuthnot com irritao. Quanto a mim, vou apreciar com prazer seu canto amigo durante as quatro

    prximas semanas... Voc no imagina o que esta viagem representa para mim. Gostoimensamente dos lugares selvagens. Os momentos mais felizes de minha vida tenho-os

    passado em acampamentos, na Amrica e na ndia, e sempre senti o desejo de conhecer odeserto; ainda mais do que qualquer outro lugar. Vai ser um ms de pura alegria. Vou serimensamente feliz.

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    Levantou-se com um riso de intenso prazer e voltou-se, esperando por Arbuthnot.Este ficou de p com uma certa relutncia, mas no se moveu por alguns instantes:

    Diana, eu queria que voc me deixasse beij-la, uma vez somente imploroucom uma humildade que o tornava digno de pena.

    A moa sacudiu a cabea com uma expresso de quem se zangara. No, isso no est no nosso contrato. Nunca fui beijada na minha vida. umadas coisas que no compreendo. A sua voz era quase rspida.

    Depois se dirigiu vagarosamente para o hotel, enquanto Arbuthnot ia ao seu ladosem saber se teria novamente quebrado os laos da amizade com o seu intempestivopedido, mas ao chegarem varanda ela parou e falou-lhe de novo em tom amistoso:

    V-lo-ei amanh de manh?O rapaz compreendeu. No haveria mais referncia ao que se passara entre eles.

    A amizade continuaria, porm nas condies que ela tinha exigido. Ele aproximou-se. Sim. Ns organizamos uma escolta de cerca de uma dzia de homens para

    acompanh-la nas primeiras milhas e fazer uma despedida em regra.Ela teve um gesto de protesto, acompanhado de uma risada. Precisarei das quatro semanas de solido no deserto para destruir a presuno

    de que ficarei possuda por causa dessa escolta disse ainda a sorrir, enquanto entravano salo.

    Algumas horas mais tarde Diana se recolhia ao seu quarto, e, acendendo a luz

    eltrica, atirava as luvas e o programa sobre uma cadeira. O aposento estava vazio,porque a sua criada sara com uma vertigem ao ouvir que deveria acompanhar a suapatroa na excurso pelo deserto, e Diana tinha-a mandado voltar para Paris, a fim de lesperar o seu regresso. Partira durante o dia e levara consigo a maior parte da bagagempesada de sua ama.

    Diana estava de p no meio do quarto e olhava para os preparativos da partida,com um pequeno sorriso de satisfao. Tudo estava em ordem; os retoques finais tinhamsido dados alguns dias antes. A caravana de camelos com o material para o acampamentodevia deixar Biskra algumas horas antes do momento marcado para os Mayos partiremcom Mustaph Ali, o excelente guia que as autoridades francesas haviam recomendadocom insistncia. As duas grandes malas de roupa que Diana levaria consigo estavamabertas, j arrumadas, esperando somente pelos objetos mais necessrios, que seriamnelas postos ltima hora e perto delas a grande mala de bordo que Sir Aubrey deviadeixar em Paris quando por ali passasse. Sobre uma cadeira via-se o seu traje demontaria, aguardando a manh seguinte. O seu sorriso acentuou-se quando ela olhou

    para os elegantes cales e as botas marrons, de cano alto. Eram as roupas com que tinhapassado a maior parte da sua vida, e nas quais se sentia mais vontade do que nos belosvestidos de que estivera a falar com Arbuthnot.

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    Sentia-se satisfeita de que o baile tivesse acabado, pois no era uma espcie deexerccio que apreciasse muito. S pensava na excurso que ia principiar no dia seguinte.Estendeu os braos com um riso de satisfao.

    Isto que vida. Dirigiu-se ao toucador e, apoiando-se com os cotovelos

    sobre ele, mirou-se no espelho, sorrindo sua prpria imagem. Na falta de uma pessoacom quem conversar ela sempre falava consigo mesma, sem nem pensar na beleza dorosto que se refletia no cristal polido. O nico comentrio que fazia s vezes sobre a suaprpria aparncia era que desejaria que os seus cabelos fossem de cor diferente. Nessanoite, porm, mirava-se com curiosidade. No sei por que me sinto hoje to feliz. Deveser porque me demorei bastante tempo em Biskra. lugar muito alegre, mas eu estavaprincipiando a aborrecer-me. Tornou a rir e tomou o relgio para dar corda.

    Uma das suas originalidades consistia em no usar joias de espcie alguma. At

    mesmo o pequeno cronmetro de ouro que tinha nas mos era seguro unicamente por umasimples correia de couro. Despiu-se devagar e cada vez sentia menos sono. Vestindo umleve penteador por cima do pijama e acendendo um cigarro saiu para a larga sacada quehavia em seu quarto. A alcova ficava no primeiro andar e ao lado da janela havia um pilarcheio de ornatos que suportava a sacada do segundo andar por sobre a sua cabea. Elaolhou para o jardim ali embaixo. Era fcil descer, pensou com a expresso de um rapazitotraquinas muito mais fcil do que em muitos outros lugares em que ela j o tinha feito,quando sentia necessidade de dar um passeio solitrio. Mas o Oriente no servia para os

    passeios dessa natureza; os criados naturais do pas tinham o pssimo costume dedeitarem-se em qualquer lugar em que sentissem sono, e no havia muito tempo que ela,saltando da sua sacada, fora cair justamente em cima de um dorminhoco que, com oberreiro que fez, despertara mais da metade dos hspedes do hotel. Curvou-se sobre ogradil da sacada, tentando olhar para a varanda, embaixo, e julgou ver uma cortinabranca. Ela tornou a olhar, porm desta vez nada viu. Ento, sacudindo a cabea efazendo uma pequena careta, sentou-se no peitoril da sacada. Ajeitando-secomodamente, com as costas apoiadas na coluna, olhava para os jardins do hotel,cantarolando baixinho a cano de Cachemira que havia escutado naquela tarde.

    Era a lua cheia, e sua luz fria e brilhante enchia o jardim de espessas sombrasnegras. Divertia-se a olhar algumas dessas sombras que pareciam mover-se, como se ojardim estivesse cheio de entes que caminhassem rpidos, e ficava a observ-las atverificar se vinham das palmeiras ou dos cactos silvestres. Havia uma que ela no podiadescobrir de que objeto provinha at que com muito custo verificou ser produzida poruma grotesca esttua de chumbo, meio encoberta por um arbusto cheio de flores. Esque-

    cendo-se da hora adiantada e das janelas abertas que havia ao seu redor, rompeu numasonora gargalhada que foi interrompida pelo aparecimento de algum, meio escondido portrs da grade que separava a sua sacada da do quarto vizinho e pelo som de uma voz

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    irritada. Pelo amor de Deus, Diana, se voc no tem sono, ao menos deixe que os outros

    durmam! O queconvenientemente traduzido quer dizer: deixe Sir Aubrey Mayo dormir

    retrucou ela rindo. Meu caro amigo, durma, se quiser, mas no sei como voc podedormir com uma noite destas. J viu mais lindo luar? Pouco me importa o luar! Est muito bem. No preciso zangar-se por isso. V de novo para a cama e

    cubra a cabea com as cobertas; desse modo no o ver. Eu, porm, vou ficar sentadaaqui.

    No seja tola, Diana! Voc vai ferrar no sono, cair da abaixo e quebrar acabea!

    Voc que lucrar disse ela com bom humor. Se eu morrer, deixar-lhe-eitudo quanto tenho neste mundo meu caro irmo. Poderia dar-lhe mais prova de estima?

    A moa fingiu no ouvir a exclamao de aborrecimento que se seguiu a estaresposta e continuou a olhar para o jardim. A noite estava belssima, o silncio s erainterrompido pelo montono cricrilar dos grilos; misteriosa, com aquele mistrioinexplicvel que tm sempre as noites orientais. Havia no ar um estranho perfume derosa do Oriente; aqui, como em sua terra natal, o ar parecia mais aromtico de noite quede dia. Muitas vezes na Inglaterra ela havia ficado sentada sobre a balaustrada de pedra

    da sacada, sorvendo o perfume inebriante da noite o cheiro penetrante da terramolhada depois da chuva, o aroma emanado pelos perfumes capitosos da noite que ahaviam atrado, quando ela era ainda criana, e a tinham feito descer pelas heras quetrepavam at a sacada, a fim de vagar toa com aquela deliciosa sensao de quem estfazendo uma traquinagem, atravs do parque enluarado e mesmo no escuro que ficavaprximo. Medo era coisa que ela nunca sentira.

    A sua infncia fora muito original. No houvera parentes prximos que seinteressassem pela menina sem me, deixada aos cuidados de um irmo quase vinte anosmais velho, que no procurava disfarar o aborrecimento que lhe causava o encargo.Metido sempre consigo mesmo, e com um desejo violento de vagar pelo mundo, airmzinha era-lhe uma carga incmoda, e ele esquivou-se sua responsabilidade de ummodo faclimo. Durante os primeiros anos da sua vida ela tinha sido entregue a amas ecriadas que prejudicaram irremediavelmente seu esprito. Depois, quando era ainda umacriana, Sir Aubrey Mayo voltou para a Inglaterra, de uma longa viagem que em-preendera, e dedicou-se, por espao de alguns anos, a dirigir pessoalmente a educao de

    sua irm, nos mesmos moldes da que ele havia recebido. Vestida como rapaz, tratadacomo rapaz, ela aprendeu a andar a cavalo, a atirar ao alvo e pescar no como se essasatividades lhe fossem simples diverses, mas seriamente, a fim de que pudesse mais

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    tarde ser a companheira de um homem que limitava a isso os seus interesses. O ar denegligente moleza de Sir Aubrey era simplesmente uma afetao. Na realidade ele eraforte como um touro e queria que Diana fosse igualmente forte. Com esse escopo aeducao da menina foi uma educao espartana, sem contemplaes para com o sexo ou

    temperamento, e nada poupou para atingir o fim desejado. Desde o princpio Dianacorrespondeu ao que dela esperavam, de-votando-se de corpo e alma vida agitada erida que lhe tinham destinado. A nica coisa que mareava um pouco aquela absoropelos esportes eram as aulas a que tinha de assistir, embora no fossem muito cacetes.Todas as manhs atravessava o parque e ia escola paroquial, onde ficava algumas horasestudando sob a direo do proco, o qual cuidava mais dos seus cabelos do que das suasovelhas e era mais conhecido no campo do que entre os fiis da sua igreja. Ele tinha ummtodo rude e extravagante de ensinar, mas a menina era inteligente e em pouco tempo

    adquiriu uma quantidade enorme de conhecimentos dos mais variados. A sua educao,entretanto, sofreu uma interrupo sbita com a chegada escola paroquial de umrapazelo j crescido que tinha sido enviado por um pai desesperado, como ltimo recurso,para o reverendo musculoso e rude desasn-lo. O menino descobriu aquilo que os outros,no meio dos quais ela crescera, nunca tinham visto: que Diana Mayo, embora com roupas emodos de um rapaz, era, na realidade, uma linda moa. Com a audcia prpria do seu tipo,ele aproveitou a primeira oportunidade para dizer-lhe isso, e em seguida tentou obter obeijo que sempre conseguia em casos idnticos, devido a ser o que se costuma dizer

    um belo rapaz. Daquela feita, porm, estava lidando com uma mulher que o eraunicamente por ter nascido tal e que tinha muito mais agilidade e fora do que ele; Dianaesmurrou-o, deixou-o com os olhos negros, antes que ele pudesse compreender o queestava sucedendo; e pulava em volta dele como um galo de briga enfurecido, quando oproco chegou, atrado pelo barulho.

    O reverendo, zangado e ofegante, levou-a para casa e disse simplesmente a SirAubrey que a sua aluna j estava muito crescida e muito bonita para poder continuar aestudar na escola paroquial; dito isto, retirou-se imediatamente sem esperar resposta,deixando Sir Aubrey, que acabava de voltar de uma das suas viagens, a incumbncia deprovidenciar a futura educao de Diana. Como de costume, o problema foi resolvido pelomtodo mais cmodo. Fisicamente ela j estava em condies de desempenhar o papelque o irmo lhe havia destinado; mentalmente ele presumia que tivesse estudado obastante para saber o que convinha e, fosse l como fosse, as viagens o tambmconstituem uma educao, s vezes melhor do que a que se adquire nos livros. Foi assim,de um dia par outro, que Diana abandonou a sua vida antiga e dentro de quinze dias

    principiava a vida nova partia com o irmo para empreender aquelas excurses a que jhaviam dedicado seis anos seis anos de contnuas mudanas, emoes e perigos.Diana pensava nisso tudo, sentada naquele parapeito, com a cabea apoiada na

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    coluna. A minha vida tem sido esplndida murmurou e amanh isto hoje,vai principiar o perodo melhor. Dizendo-se isto bocejou e percebeu ento que estavamorrendo de sono. Voltou para o quarto, e, deixando as janelas abertas de par em par,atirou-se na cama e puxou as cobertas, ferrando no sono, por assim dizer, antes de a

    cabea encostar no travesseiro.Devia ter-se passado cerca de uma hora quando ela despertou subitamente. Ficoumuito quieta espiando por entre suas longas pestanas. O quarto estava iluminado peloluar, e nada via ali de anormal, porm ela sentia a impresso de que algum estivera aoseu lado, no quarto; tinha como que entrevisto, no momento de despertar, alguma coisaque parecia ter desaparecido pela porta da sacada. Quando este pensamento,desfazendo as brumas do sono, se tornou mais forte, ela saltou do leito e correu sacada. Estava vazia. Curvou-se sobre o parapeito, escutando atentamente, porm no viu

    nem ouviu coisa alguma. Surpreendida, voltou para dentro do quarto e acendeu a luz. Nofaltava nada: seu relgio l estava onde ela o deixara, sobre a mesa; as malas no tinhamo menor sinal de que algum as tivesse tocado. Ao lado da cama achava-se o revlvercom cabo de marfim que ela sempre trazia consigo, na mesma posio em que o pusera.Diana tornou a olhar em volta, franzindo as sobrancelhas.

    Talvez eu tenha sonhado murmurou com um ar de dvida mas pareciarealidade. Era uma coisa alta, branca e tangvel, e eu senti que esteve aqui no quarto.

    Ficou imvel alguns instantes, depois encolheu os ombros, apagou a luz e deitou-se

    de novo. Os seus nervos eram realmente admirveis dentro de cinco minutos estavaoutra vez dormindo profundamente.

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    CAPTULO II

    O anunciado bota-fora tinha sido entusistico. Os preparativos para a viagemperfeitos. No houve o menor contratempo. O guia, Mustaph Ali, demonstrara sercompetente e de valor; guardava silncio modesto quando no era consultado e respondiacom dignidade e cortesia quando lhe dirigiam a palavra. O dia fora muito interessante e alonga cavalgada ao sol tinha sido para Diana um intenso prazer. Chegaram ao osis ondedeveriam passar a primeira noite, uma hora antes do que esperavam, encontrando oacampamento j armado, com as barracas, e o mais arrumado com tanta ordem que SirAubrey no achou o que criticar; mesmo Stephens, seu criado, que havia feito viagenscom le desde o tempo em que Diana era criana e que era to exigente quanto o seupatro em matria de acampamentos, nada notou que pudesse censurar.

    Diana olhou para a sua barraquinha de viagem com grande satisfao. Era muitomenor do que aquelas a que ela estava acostumada, ridiculamente pequena emcomparao com a grande que usara na ndia no ano anterior, a qual possuacompartimentos separados para banheiro e para vestirio. Criados, tambm, no

    faltavam na ndia. Aqui parece que iam ser escassos, mas havia sido um capricho seu o dedispensar as excessivas comodidades de que Sir Aubrey fazia tanta questo, paraexperimentar uma vida um pouco mais rude. A estreita cama de campo, a banheira dezinco, a mesinha desmontvel e as suas duas malas pareciam ocupar todo o espaodisponvel. A moa, entretanto, ria-se daquelas inconvenientes, embora tivesse molhado acama ao banhar-se e o sabonete houvesse cado dentro da uma das suas botas de montar.Diana trocara o seu traje de cavalgar por um vestido colante de seda ver-jade, que che-gava quase at os tornozelos com um decote baixo deixando ver uma carne moa, alva e

    cetnea.Saiu da barraca e trocou um sorriso de satisfao com Stephens, que estava em

    dvida sobre o que deveria fazer, olhando ora para ela, ora para seu patro. Diana estavaatrasada e Sir Aubrey queria que as suas refeies lhe fossem servidas com toda apontualidade. O baronete descansava numa cadeira de convs os ps estendidos sobreoutra.

    Diana fez um sinal ao criado. Corra, Etephens, e sirva depressa a sopa! Se estiver fria, vamos ter trovoada.

    Depois caminhou para a beirada da lona que havia sido estendida na frente dasbarracas e ficou admirando a paisagem, extasiada com o panorama do osis que sedesenrolava diante dos seus olhos as palmeiras agrupadas, o deserto que alm se

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    perdia de vista em ondulaes harmoniosas, mas que parecia perfeitamente nivelado,visto luz indecisa do entardecer, com as montanhas longnquas semelhantes a manchasescuras ao fundo do horizonte. Respirou profundamente. Estava no deserto, afinal, nodeserto pelo qual ela ansiava toda a sua vida. No tinha percebido, at aquele momento,

    quo intenso era esse desejo de viajar no deserto. Sentia-se vontade, como se a imensasolido silenciosa a estivesse esperando e, agora que ela viera, a saudasse suavementecom o imperceptvel arfar das areias sopradas pelo vento e o misterioso encanto da suasuperfcie ondulada e movedia que parecia desafi-la a penetrar mais e mais nodesconhecido.

    A voz de seu irmo, soando atrs dela, trouxe-a novamente realidade. Voc demorou um tempo imenso. A moa voltou-se com um sorriso. No seja egosta como um urso, Aubrey. Para voc tudo corre muito bem. O

    Stephens est a para ensaboar a sua cara e lavar as suas mos, mas graas imbecilidade da Maria eu tenho que me arranjar sozinha.

    Sir Aubrey retirou vagarosamente os calcanhares de cima da outra cadeira, atiroufora o resto do charuto e, ajeitando o monculo no olho com uma truculncia fora docomum, deitou-lhe um olhar de desaprovao.

    Voc vai enfarpelar-se dessa maneira, todas as tardes, em atenes a MustaphAli e aos condutores de camelos?

    No pretendo convidar o valioso Mustaph para as minhas refeies, e no

    tenho o hbito de enfarpelar-me, como voc diz, de um modo to encantador, emateno a ningum. Se voc pensa que nos acampamentos me visto bem para lhe seragradvel, est sendo muito lisonjeiro para consigo mesmo. Fao-o unicamente para omeu prprio prazer. Aquela exploradora que ns encontramos em Londres no primeiroano em que eu principiei a viajar com voc, explicou-me o valor fsico e moral do hbitode vestir uma roupa confortvel e bonita depois de ter andado um dia inteiro de calese botas. Voc tambm muda de roupa. Que diferena h?

    H uma diferena enorme replicou ele. No vejo necessidade de vocfazer-se mais atraente do que j .

    Desde quando voc descobriu que eu sou atraente? O sol do deserto deve teratacado o seu crebro, Aubrey retrucou ela, erguendo as sobrancelhas e tamborilandoimpacientemente com os dedos sobre a mesa.

    No queira fazer-se de tola. Voc sabe perfeitamente que bonita, bonita atdemais para meter-se numa excurso destas.

    Quer fazer o favor de dizer-me onde pretende chegar? perguntou a moa

    com calma.Os seus olhos escuros, que ela mantinha fixos no rosto do irmo, pareciam ter-setornado mais escuros ainda.

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    Estive pensando seriamente hoje, Diana. Esta excurso que voc pretende fazer impossvel.

    No lhe parece que muito tarde para semelhante descoberta? interrompeua moa com um tom sarcstico.

    Ele fingiu no ter percebido a interrupo. Voc mesmo v, agora que a viagem principiou, que absolutamente impossvelcontinu-la. Nem se pode admitir que vaguei um ms inteiro sozinha, pelo deserto afora,em companhia dessa negrada. Embora a minha tutela legal tenha terminado em setembroainda tenho algumas obrigaes morais para com voc. Malgrado tenha sido convenientepara mim educ-la como um rapaz e consider-lo como um irmo mais moo em vez deirm, no podemos esquecer o fato de que voc mulher, e uma mulher muito jovem. Hcertas coisas que uma mulher no pode fazer. Se voc fosse o rapaz que sempre desejei

    que tivesse sido, seria diferente a situao, mas no um rapaz e a viagem se tornaimpossvel absolutamente impossvel por causa disso. Havia na sua voz um tomirritado de impacincia.

    Diana acendeu um cigarro vagarosamente, e, voltando a sua cadeira, riu comdesdm.

    Se eu no tivesse vivido em sua companhia toda a minha vida, Aubrey, ficariarealmente impressionada com a sua solicitude fraternal, pensaria que as suas palavraseram realmente sinceras. Mas, conhecendo-o, como eu o conheo, bem sei que no por

    minha causa que voc se inquieta, mas devido ao aborrecimento que lhe causa viajarsozinho. Voc j se acostumou a depender de mim para livrar-se de certosinconvenientes que, geralmente, surgem em todas as viagens. Foi mais sincero em Biskraquando simplesmente se ops minha excurso sem dar razo nenhuma para isso. Por queesperou at hoje noite para expor essas razes?

    Porque pensei que aqui voc tivesse, afinal, o bom senso de v-las. Em Biskra eraimpossvel discutir. Voc fez os seus preparativos contra minha vontade. Eu o deixei,convencido de que voc visse a impossibilidade de realizar a viagem, quando chegasse aodeserto. Diana, abandone esta ideia louca.

    Nunca. Estou quase disposto a obrig-la a isso. No pode faz-lo. Sou dona de meus atos. Voc no tem nenhum direito sobre

    mim. No pode obrigar-me a coisa alguma. Nem o direito de apelar para os seussentimentos de irmo porque nunca me teve afeio alguma e, portanto, no podeesperar que eu a tenha por voc. No preciso fingir que tem. No vamos discutir mais

    sobre isto. No voltarei para Biskra. Tem medo de que riam de vocs? disse ele com zombaria; mas a moa replicoualtivamente:

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    No tenho medo algum de que riam de mim. S os covardes o tm e eu no soucovarde.

    Diana, seja sensata! Aubrey! Eu j disse tudo quanto tinha a dizer. Nada h que possa alterar a

    minha determinao de continuar esta viagem. Seus argumentos no me convencem evoc bem sabe por qu. So os seus prprios interesses, e no os meus, que os ditam.Voc no nega porque no pode, porque sabe que esta a verdade.

    Encaravam-se atravs da mesa. Sir Aubrey ficou vermelho de raiva e seu monculocaiu tinindo, ao bater num dos botes do casaco.

    Voc teimosa como o diabo! disse ele furioso.Diana olhou para ele com um ar de escrnio, com a boca fechada, tal qual a dele. Sou o que voc fez de mim disse ela devagar. Que adianta discutir sobre

    o resultado? Voc me ensinou desde pequena a desprezar as restries prprias do meusexo e agora atira-as minha face. Durante toda a minha vida, voc me deu exemplos deegosmo e teimosia. Admira-se de que haja aproveitado? No pode ter surpresa com aobstinao produzida pela educao que voc mesmo me deu. No est procedendo comlgica. A culpa sua e no minha. Tudo mostrava que um dia tinha que haver um atrito.Veio antes do que eu esperava. At hoje as nossas inclinaes foram as mesmas, pormcreio que chegamos encruzilhada. Como j disse, sou dona de mim mesmo e noadmito a menor interferncia nos meus atos. Faa o favor de compreender bem isso,

    Aubrey. No quero mais discutir. Irei encontrar-me com voc em Nova York, conformeprometi. No tenho o hbito de romper as minhas promessas, mas a minha vida mepertence e hei de fazer dela o que eu quiser e no o que os outros quiserem. Farei o queeu determinar, como e quando eu determinar e nunca obedecerei a ningum.

    Praza a Deus que um dia voc caia nas mos de um homem que sabia ordenar gritou ele furioso.

    Diana franziu os lbios em expresso de mofa. Ele veria o russo comigo! retrucou, voltando para a sua barraca.Quando se sentiu sozinha a sua irritao transformou-se em prazer. Sempre era

    divertido ver o preguioso Aubrey vermelho de raiva. Diana sabia que ele vinhadissimulando essa raiva desde Biskra. Embora viajasse constantemente e muitas vezesatravs de lugares longnquos e desolados, ele gostava de viajar com o mximo conforto.Aborrecia-se por ninharias, e as dificuldades inevitveis que surgiam vinham cair sobreos ombros mais jovens de sua irm. Ela bem sabia quanto lhe era til nessas ocasies. Erapossvel que Aubrey sentisse algum remorso pela educao que lhe tinha dado, mas era

    unicamente a preocupao do seu prprio conforto que o fizera falar daquele modo. Essacerteza no lhe despertava nenhum sentimento benvolo para com ele. Aubrey semprefora e sempre havia de ser supremamente egosta. Toda a vida de ambos havia sido

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    conduzida de acordo com as convenincias dele e no dela. Ela sabia, tambm, porque asua companhia era especialmente desejada naquele passeio Amrica. Era uma viagem decaada, diversa das que eles faziam habitualmente: era a caa a uma esposa que estavaobrigando Sir Aubrey a atravessar o oceano nesta ocasio. A idia de casar-se entrara

    ha sua mente como uma necessidade desagradvel, porm sem remdio. As mulheres oaborreciam, e a idia de casar-se o irritava, porm lhe era absolutamente necessrio terum filho que lhe sucedesse um Mayo tinha que ser sucedido por outro Mayo. Eraimprescindvel que houvesse um herdeiro para tomar conta do patrimnio que a famlia:tinha conservado por centenas de anos. Nenhuma mulher o atraa, mas de todas as queele tinha encontrado, as americanas que menos o irritavam e, portanto, voltava-se paraa Amrica procura de uma esposa.

    Decidiu-se a alugar uma casa em Nova York durante alguns meses e depois em

    Newport, e por isso a companhia de Diana era considerada indispensvel. Ela evitariamuitos aborrecimentos, pois todos os preparativos seriam entregues s mos deStephens e s dela.

    Tendo resolvido fazer o que ele considerava um sacrifcio no altar da famlia,queria ver-se livre da maada o mais depressa possvel e a dificuldade criada por Diana aexecuo de seus planos o punha exasperado. Era a primeira vez que ela o contrariava e amoa ergueu os ombros com descaso ao lembrar-se disso. Com pouco mais, tudo teriadescambado para uma briga vulgar. Ela enxotou do pensamento Aubrey e o seu egosmo.

    Fazia muito calor e Diana se conservava muito quieta na sua cama, arrependendo-se det-la mandado fazer to estreita e imaginando que um movimento desasado durante osono f-la-ia cair dentro da banheira que estava ao lado. Pensou com saudades nospunkahs e depois sorriu para si mesma.

    Sybarita! murmurou, j com sono. Voc est precisando passar por algunsdesconfortos.

    Diana estava agressivamente alegre na manh seguinte hora do almoo e nopouco tempo que em seguida permaneceram ainda no osis, depois da partida da bagageme dos camelos. Sir Aubrey estava silencioso e fazia as coisas devagar; quanto moa,tagarelava com Stephens, dirigindo a arrumao da cesta que iria com ela, a cargo dohomem que fora escolhido para seu criado pessoal e que com Mustaph Ali e cerca dedez homens, estavam ali espera, para acompanharem-na.

    Chegou a hora da partida. Stephens lidava com o cavalo que Diana devia montar. Est tudo pronto, Stephens? No se mostre assim carrancudo. Eu gostaria que

    voc viesse comigo para me ajudar, mas no possvel. Sir Aubrey no seria capaz de dar

    um passo sem a sua companhia.A idia de uma viagem sem Stephens para ajud-la pareceu grave e ela sorriu maisforadamente do que pretendia faz-lo. Dirigiu-se, em seguida, a Sir Aubrey que

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    repuxava ferozmente os bigodes. No vejo razo para esperar mais tempo. Voc decerto no desejava andar s

    carreiras e quer estar em Biskra com tempo para jantar disse ela com a maiornaturalidade que pde.

    O irmo voltou-se. Diana, ainda no muito tarde para voc mudar de idia. Pelo amor de Deus,renuncie a essa loucura. Isso tentar a Deus.

    Pela primeira vez havia certo timbre de emoo na sua voz. Diana hesitou uminstante, mas somente um instante. Depois olhou para ele com um sorriso.

    Devo atirar-me ao seu pescoo e dizer: Leve-me de volta, meu anjo da guarda,serei ajuizadazinha, ou devo prostrar-me aos seus ps e, batendo com a cabea nos seussapatos, sussurrar na lngua do pas: Ouvir obedecer? No se torne ridculo, Aubrey.

    Voc no pode esperar que eu mude de ideia ltima hora. No h nenhum perigo.Mustaph Ali h de providenciar para que tudo corra bem. Tem a sua reputao de guiapara zelar. Voc sabe que as autoridades o consideram um homem de bem. No creio queesteja disposto a manchar a sua reputao. De qualquer modo, porm, saberei defender-me, graas ao que voc me tem ensinado. No me importo de que achem convencimentoeu julgar-me boa atiradora. Voc mesmo diz que demonstro ter aprendido com voc.

    Com uma risadinha alegre tirou o revlver de cabo de marfim e, apontando-o parauma pedra chata, a pequena distncia, disparou. Ela atirava muito bem de revlver, mas

    dessa vez parecia ter errado. No se via marca nenhuma na pedra. Diana ficou a olharpara o alvo sem saber o que dizer, com a testa enrugada. Depois olhou para o seu irmo ea seguir para o revlver, que ainda tinha na mo.

    Sir Aubrey praguejou. Diana! Que fanfarronada mais tola! gritou ele zangado.Ela no prestou a menor ateno s suas palavras. Estava ainda a olhar para a

    pedra lisa que tinha na sua frente. No posso compreender. Como que no acertei? A pedra grande como uma

    casa, murmurou pensativamente ao passo que tornava a levantar o revlver.Sir Aubrey, entretanto, agarrou-a pelo pulso. Pelo amor de Deus, no faa mais tolices. Voc j fez o suficiente para se

    desprestigiar disse ele em voz baixa, olhando de relance os rabes que tudoobservavam.

    Diana com relutncia meteu o revlver na capa. No posso compreender repetiu ela. Deve ter sido por causa da luz.

    Montou e, dirigindo o seu cavalo para perto de Sir Aubrey, estendeu-lhe a mo. At vista, Aubrey. Pode contar comigo um ms depois de voc ter chegado.Telegrafarei de Cherburgo. Boa Viagem! Chegarei a tempo de ser o seu garon

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    d'honneur ajuntou rindo, e, com um sinal a Mustaph Ali, guiou o seu cavalo para o sul.Durante muito tempo ela cavalgou em silncio. A discusso com Alibrey deixara-

    lhe uma impresso desagradvel. Diana sabia que aquilo que ela estava fazendo eraconsiderado uma inconvenincia, porm havia sido educada com o hbito de fazer dessas

    inconvenincias. Nunca lhe passara pela ideia, ao planejar a sua excurso, que iriamcritic-la, e nenhuma diferena lhe faria se houvesse pensado nisso, pois estava achandodivertida a sensao que a sua viagem causava. A publicidade que o caso tivera, desagra-dava-lhe; era aborrecido o fato de haver pessoas que em vez de cuidarem dos seusprprios negcios estivessem a incomodar-se com os dela. Mas que Aubrey se pusesse aolado dos que reprovavam o seu ato, mostrando atitude to diferente das que at entoassumira, era o que no podia compreender. Estava zangada com ele e desdm semisturava sua raiva. Aubrey estava em contradio com a sua atitude para com ela

    durante toda a sua vida e a descoberta de que ele mudara de opinies fazia-a ainda maisdeterminada a aderir s suas convices enraizadas. Ele era responsvel por essasconvices, pois s havia incutido nela, e se agora desejava abandon-las, era coisa que sa ele dizia respeito. Da sua parte ela no via razes para mudar os princpios em que sehavia fundado a sua educao. Se Aubrey realmente pensava que havia perigo naquelaexcurso, podia sacrificar-se ao menos uma vez e ir com ela. Como dissera JimArbuthnot, era somente um ms, um espao de tempo insignificante, mas o egosmo deAubrey no consentia que ele fizesse essa concesso, do mesmo modo que a teimosa dela

    no consentia que ela desistisse da viagem. Era esperar muito.Finalmente, ali estava o deserto! Era, afinal, a excurso com a qual ela sonhara e

    que planejara durante muitos anos. No podia desistir.A ideia de perigo trouxe-lhe um sorriso aos lbios. Que poderia haver no deserto

    de perigoso para ela? Nada havia de estranho no panorama que a cercava por todos oslados. Tudo aquilo lhe parecia curiosamente familiar. O sol abrasador que resplandecia,sobre a sua cabea, num cu sem nuvens, o mormao que subia do solo escaldante e seco,a silhueta recortada das palmeiras agrupadas, num osis distante, eram como querecordaes que ela guardava com uma satisfao mais profunda e intensa do que qual-quer outra impresso que at aquele momento tivera.

    Sentia-se imensamente feliz feliz pela sua sensao de mocidade e de fora, desua perfeio fsica, feliz devido sua capacidade de desfrutar a vida feliz, por sentirsob os joelhos um cavalo forte e esperto, contente com a sua autoridade, recm-adquirida. Esperara to ardentemente por aquele momento e a realidade se mostravainfinitamente mais deliciosa do que ela havia imaginado. Ia gozar dessa felicidade um

    ms inteiro. Lembrou-se com desgosto de sua promessa a Aubrey. Deixar a deliciosaliberdade do deserto para voltar ao ramerro da vida entre a alta sociedade dos EstadosUnidos, parecia-lhe um absurdo. S de pensar nas semanas que teria de passar em Nova

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    York j sentia tdio; Newport talvez no fosse to mau, pois teria alguma compensaes.A nica esperana era que Aubrey encontrasse logo a mulher que procurava e a

    dispensasse de uma obrigao que ia ser muito enfadonha. Aubrey contava com Diana, eela seria pouco camarada se o deixasse s; era necessrio que cumprisse a sua promessa,

    mas sentir-se-ia satisfeitssima quando tudo estivesse liquidado.Depois que Aubrey casasse desapareceria a possibilidade de haver qualquerdissentimento entre eles. Tinha unicamente uma vaga idia de como deveria ser a futuraLady Mayo, mas no perdeu muito tempo em ter pena dela. As moas americanas em geralsabem tomar conta de si. E, assim pensando, bateu levemente no seu cavalo, enquanto nosseus lbios se esboava um sorriso. Afinal de contas, Aubrey e a sua provvel esposanada tinham de interessante, comparado ao vivo interesse daquele momento.

    Uma caravana, que tinha sido lobrigada h muito tempo, chegara mais perto e

    Diana voltou a cavalo para ver passar a longa fila de camelos vagarosos. Os grandesanimais, com o seu ar pachorrento e os pescoos compridos e balouantes, sempre lhedespertavam o interesse. Era uma grande caravana; os fardos que os camelos carregavampareciam pesados. Ao lado dos mercadores montados em camelos e da multido depessoas que os acompanhavam, alguns sobre jumentos magros e outros a p ia umaescolta de cavaleiros armados. Levou tempo a passar.

    Um dos camelos carregava algumas criaturas muito embrulhadas e ocultas companos, que Diana sabia serem mulheres. O contraste entre elas e a inglesa chegava a ser

    ridculo. S de olh-las, Diana sentia-se sufocar. Ficou a imaginar como seria a vidadaquelas mulheres, se alguma vez elas se revoltavam contra os trabalhos rudes a queeram obrigadas e contra as restries que sofriam, se alguma vez sentiriam o desejo deter a liberdade com que ela se regozijava ou se o hbito e os usos eram to fortes quenunca pensavam em nada que existisse alm da vida opressa que levavam.

    Ao pensar naquelas vidas encheu-se de averso. A ideia de casamento mesmo nasua mais alta forma, baseado na considerao e na indulgncia mtua era-lheantiptica. Quando pensava no casamento sentia calafrio de repulsa. Se para Aubrey eradesagradvel, para o seu temperamento frio o reservado era uma coisa horrenda erepelente. Enchia-se de admirao e desprezo ao lembrar-se que as mulheres sesujeitavam recluso degradante e existncia de grilhetas da vida de casadas. Revol-tava-se ideia de viver irrevogvelmente presa aos caprichos e vontade de um homemque tinha o direito de exigir obedincia e que tinha tambm poder para obrig-la aobedecer. Para uma mulher ocidental j era bem mau, mas para as orientais, merasescravas das paixes dos homens a quem pertenciam, sem direito menor considerao,

    reduzidas ao nvel animais, era horrvel. Esse pensamento f-la estremecer e dar umapancada forte no pescoo do seu cavalo. O fogoso animal partiu e ela deixou-o ir. ChamouMustaph Ali ao passar a galope perto dele. O guia havia ido ao encontro da caravana e,

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    tendo apeado, conversava animadamente com o comandante da escolta armada.Devido s ideias que lhe despertara, a caravana perdera todo o interesse para

    Diana. A moa desejava caminhar sem prestar ateno para os seus homens que, como oguia, tinham parado a fim de conversar com os negociantes. O cavalo de Diana era veloz,

    de modo que levou algum tempo at que eles a alcanassem. Havia uma expresso deaborrecimento no rosto de Mustaph Ali, quando ela, ouvindo o tropel atrs de si, sevoltou e lhe fez sinal para que se aproximasse.

    Mademoiselle no est interessada na caravana? perguntou ele comcuriosidade.

    No replicou a moa secamente, passando logo a fazer perguntas sobrecertos detalhes de sua excurso.

    O homem falava com facilidade e em bom francs e, depois de ter dado as

    informaes pedidas, narrou algumas anedotas a respeito de personagens muitoconhecidas que ele havia guiado atravs do deserto. Diana observava-o com interesse.Parecia de meia idade, embora fosse difcil fazer um clculo aproximado dos anos quecontaria, pois a barba cerrada e em ponta que lhe ocultava a boca e o queixo faziam-noparecer muito mais velho do que realmente era. Essa barba era, na opinio de Diana, seunico defeito, pois ela costumava julgar os homens pela boca. Os olhos no so fiisespelhos da alma em se tratando de orientais, pois em geral se mostram irrequietosquando observados por um europeu. Os de Mustaph Ali estavam agora assim. Diana

    lembrou-se de que no lhe haviam parecido to esquivos em Biskra, quando o tomara aoseu servio. Julgou, porm, que aquilo no tinha importncia e passou a pensar numa coisamuito mais atraente, no seu modo de ver, que era a diferena entre o seu sistema deandar a cavalo e os dos rabes.

    Estes usavam os loros do estribo exageradamente curtos, o que para Diana seriaterrivelmente incmodo, causando-lhe at cibras. A moa mencionou esse fato rindo-see procurou fazer que o homem falasse dos seus cavalos. Aquele que Diana cavalgava eraum animal excelente, e tinha sido gabado pelo guia quando ele trouxera os animais paraque ela os examinasse. Tinha o guia sido entusiasta no seu louvor s qualidades do animal,porm nada havia dito de positivo sobre os seus antecedentes, o que a deixarafirmemente convencida de que o cavalo fora roubado ou adquirido de qualquer modoirregular e que seria falta de tato investigar a sua procedncia. Afinal de contas, nadatinha que ver com isso. Era o bastante que a sua viagem fosse feita no dorso de umcavalo que dava prazer montar e cuja esperteza prometia tornar agradvel o que deoutro modo se tornaria maador. Alguns dos cavalos que vira em Biskra no passavam de

    reles sendeiros.Pediu a Mustaph Ali informaes a respeito da zona que estavam atravessando,mas parece que ele nada sabia que fosse interessante, ou o que lhe parecia importante

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    ela julgara ftil e vulgar; e o homem sempre voltava a conversar sobre Biskra, de queDiana estava farta, ou falava a respeito de Oran, que ela no conhecia. A chegada a umpequeno osis onde o guia sugeriu que se deveria fazer a grande parada de repouso domeio-dia, foi oportuna. Diana saltou ao cho e, descalando as luvas, sacudiu o p da

    roupa. Era desagradvel viajar a cavalo sob um sol escaldante. Tinha bastante apetite edirigiu o preparo do seu almoo com interesse.Era a ltima vez que ia encontrar tudo to bem arranjado. Stephens era um

    artista para arrumar uma cesta de piquenique. Ia achar falta dele. Almoou rapidamente,e depois, com as costas apoiadas ao tronco de uma palmeira, um cigarro na boca e osbraos cruzados sobre os joelhos, ficou-se a olhar para o deserto com um profundosentimento de felicidade. O silncio do meio-dia como que se espalhava sobre todas ascoisas. Nem a mais leve aragem sussurrava nas folhas das palmeiras; o nico ser vivo no

    meio daquele silncio era uma lagartixa agarrada a uma pedra, perto dela. Olhando porsobre ombro viu os homens, envoltos nos seus grandes mantos, deitados a dormir, ou,pelo menos, parecendo dormir; s Mustaph Ali estava de p, na orla do osis, olhandofixamente na direo em que deviam continuar a viagem.

    Diana atirou a ponta do cigarro na lagartixa e riu ao v-la correrprecipitadamente. No sentia desejo de seguir o exemplo dos homens. Era muito felizpara perder um minuto que fosse da sua ventura, desperdiando-o num descanso de queno necessitava. Estava muito satisfeita consigo e com os seus planos. No tinha a menor

    preocupao deste mundo. Nada via que desejasse modificar ou alterar. Sua vida tinhasido sempre feliz; sempre tirara o mximo prazer de todos os minutos que vivera ataquele momento.

    Nunca lhe ocorria que sua felicidade era devida sua enorme riqueza, a qualpermitia que se dedicasse exclusivamente aos esportes e s viagens. Nunca lhe passarapela mente esse fato. Pensava to pouco nos seus haveres quanto na sua beleza. Asformalidades legais que se seguiram sua maioridade, quando a fortuna deixada por seupai passou para o seu domnio direto, constituram para ela obrigao maante a que sesujeitou, desejando que fossem o mais rpidas possvel, no dando a mnima ateno aospormenores, confiando tudo ao velho advogado da famlia, com um desprendimento que seevidenciava na indiferena com que garatujara a sua assinatura em todos os documentosque lhe apresentaram. O dinheiro em si no representava para ela coisa alguma; era sim-plesmente o meio de atingir um fim. Nunca tinha pensado nas somas exorbitantes que seesbanjavam nas contnuas e luxuosas viagens que fazia com Sir Aubrey; as suasexigncias no eram muitas, gostava de tudo simples, e a no ser o dispendioso

    equipamento indispensvel s suas excurses de caa, organizadas pelo irmo, Diana nogastava dinheiro com extravagncias. A longa lista de nmeros que tanto a aborreceradurante as horas de tdio que teve de passar na sala da biblioteca, junto com o

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    advogado, resmungando de momento a momento, pois perdera uma linda manh desetembro dentro de casa, quando o seu desejo era estar ao ar livre, no havia deixadooutra impresso a no ser que, daquela data em diante, quando desejasse alguma coisa,seria obrigada a escrever ela mesma alguns nmeros num pedao de papel, em vez de

    deixar esse cuidado a Aubrey, como havia feito at ali.No chegara a compreender a razo dos parabns e congratulaes formais comque o advogado concluir o seu relatrio, ficando at embaraada, sem saber o que dizer.No percebia porque haviam de lhes dar parabns. Tudo aquilo parecia-lhe uma tolasensaboria. Da vida real nada sabia e das ligaes de famlia menos ainda. O sistemaeducativo frio a que Aubrey a submetera, deixara-a sem a menor sombra de afeto;crescera sem nunca ter conhecido esse sentimento. O amor-no existia para ela; s depensar numa paixo sentia a mesma repugnncia que lhe causava a falta de limpeza fsica.

    O fato de haver despertado em certos homens uma emoo que ela desconhecia,tinha sido um aborrecimento que se tornava cada vez mais intolervel pela repetio.Odiava por igual os homens e a si prpria e ridicularizava-os sem piedade. Nunca haviasido to gentil e humana como para Jm Arbuthnot, e se procedera daquele modo paracom ele fora porque se sentia to radiantemente feliz naquela noite, que nem adesagradvel lembrana de que era uma mulher que estava sendo cortejada por umhomem, pde perturbar a sua felicidade. Agora, porm, no devia ocupar-se com ideiasmaantes e desagradveis. Diana fincou os taces das botas no solo macio com um

    pequeno estremecimento de satisfao; ali estava completamente livre de tudo quantopudesse afetar a sua alegria de viver. Durante o tempo em que pensava, sua cabeabaixara e nesse momento estava a olhar para a ponta empoeirada de suas botas demontar. Levantou-a e nos seus olhos perpassou um fulgor de contentamento. Aquele era odia mais feliz de sua vida. Tinha esquecido a disputa com Aubrey. Tinha banido porcompleto as ideias sugeridas pela caravana que passara. Nenhuma nota dissonante per-turbava a harmonia dos seus pensamentos.

    Uma sombra ao seu lado fez com que ela movesse a cabea. Mustaph Ali dirigiu-lhe um cumprimento respeitoso, curvando-se moda oriental.

    So horas de partir, Mademoiselle.Diana olhou surpresa para ele e depois para os homens que compunham a escolta.

    Os rabes j estavam montados. O sorriso desapareceu dos seus lbios. Mustaph Aliera o guia, porm ela era a chefe de excurso; se o guia ainda no tinha compreendidoisso, havia de compreender agora. Olhou para o seu relgio-pulseira e disse friamente:

    Ainda h muito tempo.

    Mustaph Ali curvou-se num novo salaam.Teremos que andar muito para chegar ao osis em que deveremos passar a noite apressou-se ele a insistir.

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    Diana cruzou as pernas e, tomando um punhado de areia na palma da mo, deixou-acair pelos vos dos dedos.

    Ento bastar que viajemos mais depressa respondeu com calma, olhandopara os gros de areia que brilhavam ao sol.

    Mustaph Ali teve um movimento de impacienta e persistiu com diplomacia. Mademoiselle faria bem em partir agora. Diana olhou para ele com um arirritado. Sob a delicadeza do homem e suas palavras simples no-ta-ia-se um tom dequem est decidido a fazer o que resolveu. Ela ficou sentada, muito quieta, mexendo comos dedos na areia quente. Encontrando, com seu olhar, o olhar da jovem, o guia desviou odele.

    Partiremos quando eu quiser. Mustaph Ali, disse ela rispidamente. Vocpode dar ordens aos seus homens, mas ter que obedecer s minhas. Eu a avisarei quando

    quiser partir. Pode ir-se embora.Ele ainda hesitava irresoluto.Diana bateu com os dedos no ombro, costume que havia aprendido com um oficial

    francs em Biskra J lhe disse que pode ir repetiu ela cor aspereza. Fingiu depois que no

    percebia que o rabe se ia embora e nem olhou para trs a fim de ver quais eram asordens que ele dava aos seus homens. Examinou de novo o relgio. Talvez estivesse!Ficando tarde, talvez o osis fosse mais longe do que ela pensava; mas Mustaph Ali

    tinha que ficar sabendo quem era que podia dar ordens, mesmo que tivessem de viajarat a meia-noite para chegarem ao prximo acampamento. Cerrou os dentes com energia,mas depois tornou a sorrir. Desejava mesmo que a noite casse antes de haveremchegado ao destino. Tinha tomado parte em um ou dois piqueniques noturnos nosarredores de Biskra e a beleza das noites no deserto havia-lhe causado uma impressomuito funda. Aquela viagem pelo desconhecido adentro, longe da multido de tagarelasque tinham tirado todo o encanto do passeio quebrando o silncio da noite com suaalgazarra, prometia ser muito interessante.

    Diana, entretanto, sentiu nesse instante certo arrependimento. Afinal de contas,no era muito louvvel aquela demora. Precisava deixar passar uma hora ainda, para queMustaph Ali compreendesse que ela de fato desejava exercer sua autoridade; mas ofato que depois seria preciso que galopassem um pouco, a fim de chegarem ao lugar doacampamento antes do escurecer. Os homens no estavam habituados aos costumes delae nem Diana aos dele. No podia contar com o auxlio de Stephens naquela noite;precisava fazer tudo sozinha e era muito mais fcil arranjar as coisas com a luz do dia.

    Mas uma hora a mais no faria grande diferena. Os cavalos no se tinham cansado muitode manh e podiam faz-los andar um pouco mais depressa sem que nada sofressem comisso.

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    Assim pensando olhava de vez em quando para o relgio com uma careta desatisfao. Ela desejaria observar naquele momento a cara de Mustaph Ali, masconteve-se, para evitar que este ato fosse mal interpretado.

    Tendo passado o tempo que determinara esperar, Diana levantou-se e caminhou

    vagarosamente para o lado dos rabes. O guia tinha uma expresso carrancuda, porm amoa fingiu nada perceber, e logo que partiram fez que ele viesse para o seu lado fazen-do uma referncia qualquer a Biskra, o que lhe provocou uma torrente de palavras. Elano tinha interesse nenhum em ouvir falar daquela cidade, mas sabia que Mustaph Aligostava de falar de Biskra e achava conveniente no permitir que o guia ficassesilencioso, remoendo o seu mau humor. Sua raiva desaparecia medida que ele fosseouvindo a sua prpria voz. Enquanto isso a moa cavalgava em silncio, absorta nos seuspensamentos, sem prestar ateno ao que Mustaph Ali dizia. Nem reparou quando ele se

    calou tambm.Tinha ela razo quanto possibilidade de os cavalos andarem mais depressa.

    Faziam com facilidade o esforo que deles se exigia, especialmente o era que Dianamontava. Ia num galope macio e uniforme que se podia considerar como absolutamenteperfeito.

    Assim cavalgaram algumas horas at que chegaram ao primeiro osis que fora vistodepois de terem deixado aquele onde haviam feito o alto do meio-dia. Diana, apressou oseu cavalo para ver melhor o osis, pois; era lindo com a sua luxuriante vegetao de pal-

    meiras e arbustos viosos. Alguns pombos, escondidos nas copas das rvores, arruinavamsuavemente com uma dolente melancolia que estava de acordo co o local solitrio. Ao ladodo poo, formando um tringulo, havia os fustes de trs grandes palmeiras. Os topestinham sido cortados cerca de seis metros acima do solo e os troncos mutilados erguiam-se nus e com um ar de desolao. Diana tirou o seu pesado capacete e deu-o ao homemque estava atrs dela. Depois ficou olhando para o osis, enquanto uma leve brisa lhebrincava nos cabelos curtos e lhe refrescava o rosto. O arrulhar triste dos pombos e aspalmeiras quebradas davam quilo tudo um ar de tragdia e mistrio que muito lheagradava.

    Voltou-se e perguntou a Mustaph Ali: Porque no acampamos aqui mesmo? J viajamos bastante hoje.O homem remexeu-se nervosamente na sela, pasmou os dedos pela barba e,

    olhando para Diana e para as palmeiras quebradas, respondeu: Ningum pode descansar aqui, Mademoiselle. o acampamento dos demnios.

    Al lanou a sua maldio sobre este lugar. E assim dizendo, tocou o cavalo com o

    calcanhar, fazendo-o dar uns passos para o lado, sugesto que Diana fingia no perceber. Gosto daqui insistiu ela com obstinao; um lugar maldito, redargiu-lhe o guia. A morte anda oculta entre aquelas

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    palmeiras quebradas disse ele olhando para a moa com curiosidade.Ela sacudiu a cabea com um sorriso de incredulidade. Para voc talvez assim seja. Porm no para mim. As maldies de Al s caem

    sobre aqueles que tm medo delas. Mas j que tem receio, Mustaph Ali, vamos para

    diante. E, assim dizendo, riu zombeteiramente, enquanto Mustaph Ali esporeava seucavalo com verdadeiro frenesi. Ao cair da tarde Diana viu que o deserto ainda seestendia sua frente a perder de vista. Compreendeu que no chegariam ao destinoantes de ser noite fechada. Entretanto, tinham jornadeado muito mais, e muito maisdepressa do que pretendiam. Era estranho que no houvessem alcanado os camelos quetransportavam a bagagem. Assim pensando, Diana franziu a testa e olhou o seu relgio.

    Onde est a nossa caravana, Mustaph Ali? perguntou. No vejo nem sinaldo osis e j principia a escurecer.

    Se Mademoiselle tivesse partido mais cedo... disse ele com um ar carrancudo. Mesmo que eu tivesse partido mais cedo ainda estaramos muito longe. Amanh

    teremos que fazer as coisas de outra maneira retrucou a moa com resoluo. Amanh... resmungou o guia. Diana olhou-o fixamente. Que foi que voc disse? inquiriu zangada.Mustaph Ali levou mecanicamente a mo testa curvando a cabea. O amanh pertence a Al! murmurou com uma reverncia piedosa.Diana estava para retrucar qualquer coisa quando a sua ateno foi desviada para

    um grupo de pontos negros que se avistava muito ao longe no deserto. Achavam-se a umadistncia muito grande para que ela pudesse perceber o que eram, porm apontando paraele a moa perguntou:

    Ser a caravana? Ser o que Al quiser! retorquiu ele com maior devoo ainda. E Diana sentiu,

    juntamente com uma irritao sbita, que ele devia assumir a responsabilidade daviagem, em vez de transferi-la para Deus, e tomar um pouco mais de interesse pelacaravana com a bagagem.

    Os pontos negros moviam-se com rapidez pela plancie deserta. Logo Dianacompreendeu que no eram os camelos vagarosos que eles estavam alcanando, e sim umgrupo de cavaleiros que vinha a todo o galope para o lado dela e de sua escolta. Nohaviam encontrado ningum desde o momento em que cruzaram com a caravana demercadores, pela manh. Para Diana os rabes que se aproximavam eram maisinteressantes do que o fora a caravana. Tinha visto muitas chegarem a Biskra e de lpartirem, porm, embora houvesse visto pequenos grupos de cavaleiros rabes nas

    vizinhanas da cidade, nunca encontrara um grande grupo de homens armados, nem oshavia visto no deserto, num lugar to pitoresco como aquele. Era impossvel saber dequantos cavaleiros o grupo se compunha, pois cavalgavam em formao cerrada. O vento

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    enfunava os seus brancos albornozes tornando-os gigantescos. Diana estava vivamenteinteressada. Era como se encontrasse uma embarcao depois de ter viajado muitotempo em um mar deserto. O seu sbito aparecimento fazia que se desvanecesse umsentimento de solido que principiava a tornar-se desagradvel. Talvez ela estivesse com

    fome, ou cansada, ou simplesmente aborrecida com a falta de tato do guia, o fato,todavia, era que, antes de aparecerem os rabes, Diana sentira uma opresso, como se osilncio desolador do deserto pesasse sobre ela. Mas a chegada do bando de cavaleirosmudou completamente o aspecto das coisas. Um ambiente de vida parecia ter substitudoo silncio sepulcral que reinava havia pouco.

    A distncia entre os dois grupos diminura rapidamente. Diana, desejosa deencontrar-se com a cavalgata que se avizinhava com rapidez, esporeou o seu cavalo,fazendo-o passar frente do guia, Tinham chegado to perto agora, que se podiam ver

    os homens que cavalgavam como excelentes cavaleiros as suas excelentes montarias.Estavam armados e carregavam os seus fuzis frente em vez de os trazerem a tiracolocomo os cavaleiros que ela vira em Biskra. Passaram muito perto dela, a poucos metros dedistncia num quadro perfeito, em linha de formao militar disciplinada, dando umaideia de organizao que a moa nunca esperara encontrar. Nenhum voltou cabea aopassar por ela, nem to pouco diminuiu o galope. Excitado pela proximidade daqueles.Rpidos cavalos, o animal em que Diana montava tentou acompanh-los, mas a moa orefreou, voltando-se no selim para ver passar os rabes, com a: respirao ofegante

    devido impresso que o espetculo lhe causara. Quem so eles? gritou ela para Mustaph Ali, que se chegara tambm para

    perto.O guia, porm, olhava para os cavaleiros, parecendo no ter ouvido a pergunta. A

    sua escolta tinha ficado ainda mais para trs, distanciando-se dela e do guia. Diana ficoua olhar para o esquadro que se movia rapidamente, com expresso admirativa, e de fatoera belo espetculo. Mas da a um segundo abriu a boca admirada. Os cavaleiroschegaram um pouco alm da ltima linha de homens que formavam a sua escolta e alipararam de repente e numa formao de tal modo cerrada, quando vinham naqueledesabalado galope. Puxaram os freios com tanta rapidez que os cavalos levantaram aspatas dianteiras.

    Mas no havia tempo para admirar o quanto eram bons cavaleiros. Osacontecimentos sucediam-se muito depressa. O esquadro modificou-se numa linhacontnua de dois a dois. Evoluindo atrs da escolta composta pelos homens de Mustaph,eles principiaram a envolv-las, juntamente com Diana e o guia, a galoparem com tanta

    velocidade como quando tinham passado por ela. Completamente atordoada com osacontecimentos, ela tentava conter o seu cavalo que estava excitadssimo.Duas vezes eles galoparam em volta do seu grupo de homens, com os albornozes

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    esvoaando ao vento e os fuzis nas mos. Diana principiou a ficar impaciente. Tudo aquiloera muito bonito de ver-se, mas o tempo se passava e a claridade diminua. Gostaria deque aquela exibio tivesse sido feita mais cedo, pois teria tido mais tempo para apreci-la. Voltou-se parca dizer a Mustaph Ali que era melhor continuarem a viagem, porm ele

    se havia afastado dela; estava junto dos seus homens.Lutava com o seu cavalo nervoso, tentando faz-lo voltar-se e ir para perto doguia, quando uma repentina descarga de fuzilaria f-lo dar um salto, assustando-atambm. Diana riu. Certamente era o fim da demonstrao, uma salva de despedida, adcharge de mousqueterie, de que tanto gostam os rabes. Voltou cabea para v-lospartir, pois o seu cavalo teimava em no obedecer: ento o sorriso desapareceu dos seuslbios. No fora uma salva de despedida. Os fuzis que os rabes empunhavam, no osapontavam para o cu, mas para ela e para os seus homens. A moa ficou a olh-los,

    petrificada, sem conseguir dominar o seu cavalo e no podendo ver os homens deMustaph Ali, pois um grupo de cavaleiros rabes se tinha interposto a ela e a suaescolta.

    O prprio Mustaph Ali estava deitado sobre o pescoo do seu cavalo, quepermanecia muito quieto no meio da confuso geral. Nisto deram mais uma descarga eenquanto o guia saltava rapidamente ao cho, o cavalo de Diana deu um salto to rpido,que quase a fez cair.

    Diana no teve a mnima ideia de que esses cavaleiros poderiam atac-la, at o

    momento em que eles principiaram a atirar. Julgava que estivessem mostrando o suahabilidade, com aquele amor exibio que ela sabia ser natural nos rabes. Afinal decontas, as autoridades francesas tinham razo. O primeiro sentimento dela foi. Odesprezo por uma administrao que permitia um ataque daqueles num lugar to prximoao mundo civilizado. O segundo foi lembrana de como Aubrey havia zombado do quelhe sucedera. Logo, porm, compreendeu a gravidade da situao. S ento lhe ocorreuque o seu guia havia apeado com tanta pressa, talvez porque se achasse ferido e no demedo, como havia pensado primeiro, com desdm.

    Entretanto, parece que ningum tinha provocado aquela agresso, pensou comraiva. Puxava, desesperadamente, pelas rdeas do seu cavalo, mas o animal tomara ofreio entre os dentes e absolutamente no obedecia. Sua situao deixava-a furiosa.Seu guia ferido, os homens aprisionados e ela sendo levada para longe por um cavalo emdisparada. Se ao menos pudesse fazer que o animal voltasse! Era tudo uma questo desaber quanto queriam pelo resgate, disso estava certa. Era absolutamente necessrioque ela conseguisse voltar e combinar as condies cora os rabes. Afinal de contas no

    passava de uma maada, mas dava expedio certa graa, era uma aventura. Nosupunha que os rabes tivessem inteno de ferir ningum, ms decerto, no estado deexcitao em que se achavam, um deles atirou, os outros acompanharam-no e da seguiu-

  • 8/12/2019 E M HULL - O sheik

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    se a descarga. No podia ser outra coisa. Encontravam-se muito perto de Biskra para quepudesse haver realmente perigo dizia ela a si mesma, tentando dominar o cavalo.

    Enquanto puxava as rdeas com todas as suas foras, ouviu um assobio agudo elongo. O cavalo levantou as orelhas e Diana percebeu que diminua o galope.

    Instintivamente a moa olhou para trs. Um rabe sozinho galopava ao encalo dela epercebeu que o homem se aproximava. Isto fez com que desaparecesse imediatamente assuas ideias de fazer parar o animal e, pelo contrrio, ela o esporeou com violncia. Haviaum ar sinistro de deliberao no modo por que o rabe a seguia; parecia que desejavacaptur-la.

    Diana fechou a boca com fora e nos seus olhos luziu uma enrgica resoluo. Umacoisa era voltar voluntariamente para procurar um acordo com os homens que haviamatacado a sua escolta e outra muito diferente ser capturada no deserto por um bandido

    rabe. O seu queixo, contrado, parecia feito de linhas retas. De repente a sombra de umsorriso desenhou-se na sua boca curva. Estava tendo maior nmero de experinciasdurante aquele dia, do que tivera em toda a sua vida. Muitas vezes ficara a pensar quaisseriam os sentimentos de uma criatura perseguida. Muitas vezes afirmara que a raposase divertia tanto com a corrida como os ces; isto estava ainda para ser provado, mas dequalquer modo ela ia dar quele co muito trabalho para apanh-la. Diana sabia andar acavalo e o animal ainda podia correr bastante. Curvou-se para a frente, deitando-sesobre o pescoo de sua montaria e empregou todos os meios que conhecia para faz-lo

    correr. Logo, porm, mudou de ttica. Franziu a testa com apreenso ao ver os ltimosraios do sol que ia desaparecendo no horizonte. Dentro de poucos minutos estariacompletamente escuro. No poderia correr a noite toda pelo deserto com aquele rabeatrs de si. A situao j no lhe parecia engraada e Diana comeou a zangar-se. Nainterminvel plancie que se estendia na sua frente nada havia que lhe pudesse servir dedefesa e no havia outra coisa a fazer seno dar-se por vencida e parar se fossepossvel. A ideia de desviar-se dele e voltar para trs de sua livre vontade foi logo postade parte como impraticvel. Havia visto bem quando os rabes passaram por perto dela,para ficar sabendo que lidava com perfeitos cavaleiros e cavalos muito bem adestrados eabsolutamente no obteria resultado. Entretanto, pensou obstinadamente que no deviaceder. Ia cavalgar at no