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     a a a 

    Doença Renal Crônica

     Autores:Luís Sette

    Médico Residente da Disciplina de Nefrologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicinada USP (HC-FMUSP).

    Sílvia Titan

    Doutora em Nefrologia, Médica Assistente da Divisão de Nefrologia do Hospital das Clínicas (HC-FMUSP).

    Hugo Abensur 

    Professor Livre-docente da Disciplina de Nefrologia do Hospital das Clínicas da Faculdade deMedicina da USP (HC-FMUSP).

    INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕESO termo insuficiência renal crônica (IRC) foi substituído pelo termo doença renal crônica

    (DRC), que designa tanto condições nas quais há perda insidiosa da função renal, quantocondições nas quais há lesão renal com função ainda preservada. Diversas doenças sistêmicas eprimárias renais culminam em agressão lenta do parênquima renal, o qual acaba sendo substituído

    por tecido fibroso, lesão esta irreversível. Sua definição é apresentada na Tabela 1. A DRC tornou-se um problema de Saúde Pública, com um aumento significativo em

    prevalência e incidência. Diversos motivos contribuem para isso, sendo particularmente importanteo aumento na prevalência de obesidade, diabetes melito, hipertensão arterial, tabagismo esedentarismo.

     Tabela 1: Definição de DRC

    CritériosLesão renal = 3 meses definida por anormalidades estruturais ou funcionais com ou semdiminuição no RFG, manifestadas por:

    • Anormalidades histopatológicas renais• Marcadores de lesão renal, como anormalidades urinárias (proteinúria); anormalidadessanguíneas (síndromes tubulares renais); alterações em exames de imagem (hidronefrose)

    OU

    RFG < 60 mL/min/1,73 m2 por = 3 mesesRFG = ritmo de filtração glomerular. 

    Medidas de prevenção primária e secundária são urgentes e alvo de estudo intenso. Entreelas, a criação de uma classificação pela National Kidney Foundation veio de encontro ànecessidade de padronizar a nomenclatura internacional (Tabela 2).

    Se não tratada, a DRC progride para insuficiência renal terminal, acarretandomorbimortalidade elevada, principalmente pelo alto risco cardiovascular, piora da qualidade de vidae altos custos para o sistema de saúde. Por outro lado, o paciente que necessita de terapia renalsubstitutiva (TRS) requer um acompanhamento rigoroso e especializado, de forma que a diálise (outransplante) seja iniciada com melhora da qualidade de vida.

     

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    Tabela 2: Classificação da DRC

    Fases DescriçãoDepuração dacreatinina(mL/min/1,73m2)

    Ação (incluindo asprecedentes)

      Aumento de risco  > 90 e fatores de

    risco para DRCRastreamento e redução no riscode DRC

    1   Lesão renal* com RFGnormal ou aumentado   > 90

    Diagnóstico e tratamento,

    tratamento de comorbidades,redução na progressão, reduçãode risco cardiovascular 

    2  Redução discreta no

    RFG  60 a 89 Estimativa de progressão

    3  Redução moderada no

    RFG  30 a 59

      Avaliação e tratamento dascomplicações

    4  Redução grave no

    RFG  15 a 29

      Preparação para terapiasubstitutiva renal

    5 Falência renal < 15 (ou diálise) Terapia substitutiva

    * Diagnóstico por história clínica e/ou presença de hematúria glomerular e/ou proteinúria(microalbuminúria, proteinúria glomerular ou tubular). 

    ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIADiversas doenças podem causar DRC (Tabela 3). Estas doenças podem ser classificadas

    em: 1.  Primárias (glomerulonefrites, doenças císticas renais, doenças tubulointersticiais etc.) ou

    Secundárias (DM, HAS, lúpus eritematoso sistêmico, hepatite B, C, HIV etc.).2.  Localização anatômica: patologias glomerulares, tubulointersticiais, vasculares, obstrutivas

    ou tumorais.

    3.   Adquiridas ou hereditárias. Entre todas as causas, a nefropatia diabética, a nefropatia hipertensiva, as glomerulonefrites

    crônicas e a doença renal policística são as etiologias mais frequentes. 

    Tabela 3: Causas de doença renal crônicaDiabetes melito Nefropatia diabética

    Vascular Nefropatia hipertensiva, nefropatia isquêmica, hipertensão maligna,esclerodermia, síndrome hemolítico-urêmica primária ou secundária,toxemia gravídica

    Glomerulonefritesprimárias

    Glomerulonefrite membranosa, glomerulonefritemembranoproliferativa, nefropatia de IgA, glomeruloesclerosesegmentar e focal, glomerulopatia fibrilar, pós-GNDA

    Glomerulonefritessecundárias

    Nefrite lúpica, crioglobulinemia essencial ou secundária, doença decadeia leve, doença de cadeia pesada, amiloidose, hepatite B, hepatiteC, HIV, esquistossomose

    Doençastubulointersticiais

    Nefrite intersticial crônica secundária a drogas, pielonefrite derepetição e doença de refluxo, rim do mieloma múltiplo, tuberculoserenal

    Vasculites  Granulomatose de Wegener, poliangeíte microscópica, Churg-Strauss,

    vasculite por drogas, poliarterite nodosa, arterite de TakayasuDoenças císticashereditárias

    Doença de rins policísticos, doença cística medular e outrasnefronoftises

    Doençashereditárias

    Síndrome de Alport, doença de Fabry, esclerose tuberosa e anemiafalciforme

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    Tumores Câncer renal, tumor de células transicionais, tumor de Wilms, linfomasrenais

    Doençasmetabólicas

      Cistinose, oxalose, nefrocalcinose, erros inatos do metabolismo

     O diagnóstico de DRC requer primeiramente a confirmação da natureza crônica da doença,

    descartando-se, portanto, a presença de qualquer componente agudo, potencialmente reversível. Aseguir, é fundamental o estabelecimento da etiologia da DRC, passo este comumente

    negligenciado. 

    FISIOPATOLOGIA A função primaria do rim em manter constante a composição do meio extracelular é bem

    preservada até que haja perda significativa da massa renal. Quando isto acontece, seja por algumadoença ou ablação cirúrgica, os néfrons remanescentes apresentam resposta fisiológica dehipertrofia e hiperfluxo compensatórios. A redução de massa renal é acompanhada não apenas deaumento significativo na função dos néfrons remanescentes, mas também nos túbulos,responsáveis pelo ajuste fino da excreção de água, eletrólitos, ácidos e produtos do catabolismoproteico. O regime de hiperfluxo, a princípio vantajoso, acarreta uma série de alterações

    patogênicas, que podem resultar em glomeruloesclerose, fibrose tubulointersticial e, portanto,perda progressiva da função renal.Essa lesão de natureza hemodinâmica é ainda hoje considerada o principal mecanismo

    patogênico nas nefropatias crônicas em geral. A lesão hemodinâmica não atua unicamente por meio de lesão mecânica, mas também por ativação contínua de uma série de mediadoresinflamatórios. A lesão à célula endotelial é acompanhada por lesão da célula mesangial epodocitária, resultando em ativação de vias inflamatórias e aumento na expressão de citocinas,fatores de crescimento, lesão por estresse oxidativo e recrutamento de células inflamatórias. Emúltima instância, esse processo inflamatório crônico resulta em glomeruloesclerose e fibrosetubulointersticial (Figura 1).

    Há doenças nas quais a lesão hemodinâmica não é a principal forma de agressão. Em muitas

    glomerulonefrites, a agressão imunológica é predominante, por meio de vários mecanismos:deposição de imunocomplexos, formação destes in situ, ativação de complemento, por agressão deresposta imunocelula, ou mesmo por mecanismos humorais não mediados por imunocomplexos.No entanto, uma vez iniciado o insulto e ocorrendo lesão significativa do parênquima, a lesãohemodinâmica passa a ter importância pela sobrecarga e hipertensão intraglomerular em néfronsremanescentes.

     A proteinúria, anteriormente vista apenas como um marcador de nefropatia crônica, tem umpapel importante na fisiopatologia da DRC. Diversos estudos sugerem que a presença contínua deproteína em quantidade anormal na luz tubular ativa as vias inflamatórias peritubulares. Essaativação resulta em fibrose tubulointersticial. Assim, nos últimos anos, a proteinúria emergiu nãoapenas como um bom marcador de gravidade da doença, influenciando decisões terapêuticas, mas

    também como um parâmetro clínico de resposta a tratamento. Figura 1: Mecanismos patogênicos comuns às diversas causas de DRC.

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    ACHADOS CLÍNICOS A doença renal crônica se manifesta de forma insidiosa e seus sinais e sintomas se

    apresentam de forma lenta e progressiva, tendo como seu marco final a DRC terminal, que pode semanifestar desde sinais e sintomas inespecíficos como náuseas e vômitos, até emergênciasclínicas como edema pulmonar agudo.

    Habitualmente, a falência renal se apresenta clinicamente quando o RFG cai abaixo de 30

    mL/min/1,73m2, ou seja, nos estágios 4 e 5 da DRC. Nessa fase, as alterações hematológicas,endócrinas, neurológicas, gastrintestinais, dermatológicas e hidroeletrolíticas são mais evidentes,como mostra a Tabela 4.

    Durante a anamnese e o exame físico, o médico deve estar atento a sintomas e sinais dedoenças sistêmicas possivelmente envolvidas na perda da função renal, como diabetes melito,hipertensão arterial, lúpus eritematoso sistêmico e outras doenças autoimunes, infecções virais,hepatopatias, mieloma múltiplo e outras disproteinemias, entre outros. A avaliação de antecedentesfamiliares também é extremamente útil, tanto para doenças poligênicas complexas, como diabetesmelito, hipertensão arterial, litíase e nefrocalcinose, como em doenças monogênicas, como doençados rins policísticos, doenças medulares císticas e síndrome de Alport, doença de Fabry, Dent,cistinose etc.

    Com a progressão do distúrbio, surgem uma série de sinais e sintomas decorrentes deedema, congestão, alterações hidroeletrolíticas, distúrbios do equilíbrio ácido-básico e toxicidadede produtos de catabolismo proteico e lipoproteico, como ureia e amônia. Os sintomas maiscomuns são fadiga, náuseas (principalmente pela manhã) e vômitos. É bastante comum o pacientenotar alterações em memória, padrão de sono e surgimento de lentificação. Em idosos, estessintomas podem não ser valorizados, atrasando ainda mais o diagnóstico. A perda de peso podeser exuberante, obrigando o diagnóstico diferencial com outras síndromes de caquexia.

     Tabela 4: Sintomas e sinais da DRC

      Sintomas e sinais

    Geral Noctúria (perda da capacidade de concentração urinária), fadiga,perda de apetite, soluços, redução na massa muscular, caquexia,edema, hipertensão arterial, cãibras

    Neurológico

    Distúrbios do sono, redução da atenção e de capacidade cognitiva,alterações de memória, lentificação, mioclonias, convulsões,

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    confusão mental e comaPeriférico Neuropatia sensitivo-motora, síndrome das pernas inquietas

    Cardiovascular   Pericardite, tamponamento pericárdico, miocardiopatia urêmica,

    aceleração da ateroesclerosePulmonar Pleurite, pneumonite, edema pulmonar, respiração de KusmaullGastrintestinal Náuseas, vômitos, gastrite erosiva, pancreatite, ascite, parotidite

    Hematológico  Anemia por deficiência de eritropoietina, disfunção plaquetária,

    alteração de função neutrofílica

    Endócrino-metabólico

    Hiperparatireoidismo secundário, alteração no metabolismo ósseo(osteodistrofia renal), calcificações vasculares em partes moles evasos, impotência e redução de libido, alteração de ciclo menstrual,hiperprolactinemia, dislipidemias, intolerância à glicose

    Dermatológico Hiperpigmentação, prurido, pele seca, pseudoporfiria cutânea

    Hidroeletrolítico  Hiponatremia, hipercalemia, hipocalcemia, hiperfosfatemia, acidose

    metabólica 

    Hipertensão

    Cerca de 50 a 70% dos pacientes com DRC estágios 3 a 5 são hipertensos. O controleadequado da hipertensão arterial sistêmica (HAS) é o principal fator implicado no retardo daprogressão da DRC em suas mais diversas etiologias, além de ser importante em diminuir o danocausado a outros órgãos-alvo.

     A retenção hídrica está mais pronunciada nos estágios 4 e 5 da DRC e uma droga diuréticadeve ser incluída no tratamento destes pacientes. Os diuréticos poupadores de potássio e osinibidores da ECA devem ser usados com cautela neste grupo de pacientes.

     Dislipidemia

    Pacientes com DRC a partir do estádio 3 apresentam alterações no metabolismo daslipoproteínas e triglicérides. É caracterizado pelo acúmulo de moléculas de VLDL-colesterolparcialmente metabolizadas e distúrbios na metabolização do HDL-colesterol, ocasionando altosníveis sanguíneos de triglicérides e baixos de HDL-colesterol.

     Assim como na hipertensão, o tratamento da dislipidemia pode ter benefício no retardo daprogressão da DRC. No entanto, não há evidências clínicas significativas para o emprego demedidas terapêuticas diferentes daquelas utilizadas nos pacientes não portadores de DRC. Embreve, o estudo Lipid lowering Onset of Renal Disease (LORD) será publicado para tentar responder esta questão.

     DRC e Risco Cardiovascular 

     A DRC confere alto risco cardiovascular, sendo esta principal causa de óbito tanto nos

    pacientes pré-dialíticos quantos naqueles já em terapia renal substitutiva. Seja pela presença defatores de risco em comum, seja pela intensificação da aterosclerose depois do surgimento doestado urêmico, esses pacientes apresentam incidência e prevalência elevadas de doençacoronariana e de insuficiência cardíaca (Figura 2).

     Figura 2: Fatores de risco cardiovascular.

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     Alterações Hematológicas

     A anemia da doença renal crônica é multifatorial e tem como fator mais importante adeficiência na produção de eritropoietina. Tem como característica ser normocítica e normocrômicacom redução da massa eritrocitária. Outros fatores que contribuem para anemia são deficiência deferro, diminuição do tempo de meia-vida das hemácias ocasionado por produtos urêmicos,hemólise e perda crônica ocasionados durante o procedimento dialítico, além de perdas insensíveisno trato gastrintestinal.

    O guia prático da National Kidney Fondation’s define anemia em adultos como níveis de Hb <13,5 g/dL em homens e < 12 g/dL em mulheres. A prevalência dessa alteração varia de acordo como estádio em que a DRC se encontra, acometendo cerca de 15% dos pacientes no estádio 3 e 50 a70% nos estádio 4 e 5. A anemia também é mais prevalente nos pacientes acometidos por DRC deetiologia diabética macroalbuminúricos.

    Relativamente incomum em pacientes nos estágios iniciais da DRC, a prevalência da anemiaaumenta significativamente quando o clearance de creatinina (ClCr ) está abaixo de 60 mL/min etorna-se mais frequente e severa quando se aproxima de 30 mL/min, geralmente necessitando detratamento medicamentoso. Portanto, o screening deve ser iniciado em pacientes com DRC estádio3. Os pacientes apresentam sintomas como fadiga, dispneia, diminuição da atividade intelectual,depressão, perda de libido, distúrbios do sono, anorexia, entre outros sintomas que levam a umaperda importante da qualidade de vida.

     A anemia confere um risco cardiovascular e de morte importantes (Figura 3). A hipertrofia

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    ventricular esquerda está presente em 45% dos pacientes com ClCr < 25 mL/min e é diretamenteassociada aos níveis de Hb em pacientes com DRC devido ao efeito compensatório de aumento dodébito cardíaco. A queda dos níveis de Hb em 1 g/dL corresponde a um risco relativo de 6% nodesenvolvimento de hipertrofia ventricular esquerda.

     Figura 3: Fisiopatologia da insuficiência cardíaca na anemia.

     Num estudo em aproximadamente 100.000 pacientes em hemodiálise, os níveis de

    hematócrito (Ht) correlacionaram-se significativamente com mortalidade. Pacientes com Ht entre 27e 30% tiveram um risco relativo de 1,12 (1,08 a 1,17); pacientes com Ht abaixo de 27% tiveramrisco relativo de 1,33 (1,26 a 1,40) e finalmente, pacientes com Ht entre 33 e 36% tiveram risco de0,96 (0,91 a 1,01). Locattelli et al., no estudo Dialysis Outcomes and Practice Patterns Study(DOPP,) envolvendo 4.951 pacientes, demonstrou que, para cada 1 g/dL de aumento nos níveis deHb, há uma redução no risco relativo de morte em 4%. Outras complicações, além dos efeitoscardiovasculares, podem ser correlacionadas com a anemia, destacando-se a progressão da DRCe o aumento no risco de bacteriemias.

     Alterações Osteometabólicas

     Apesar de não ser um sintoma inicial da DRC, o espectro de alterações ósseas associados àDRC, denominado distúrbio mineral ósseo da doença renal crônica (DMO-DRC), também faz partede seu quadro clínico. O termo osteodistrofia renal fica reservado para as alterações na histologiaóssea avaliada por biópsia.

     A gênese da DMO-DRC é multifatorial, destacando-se: a retenção de fósforo ehiperfosfatemia, o déficit de vitamina D (diminuição da produção de 1,25-(OH) vitamina D3), a

    hipocalcemia, as alterações funcionais nos receptores de cálcio e vitamina D das paratireoides,além da resistência óssea à ação do PTH e, mais recentemente, de outras fosfatoninas (FGF-23).Outros fatores, como uso de corticoide, desnutrição, idade, intoxicação por alumínio, ferro e outrastoxinas urêmicas, também contribuem para o processo.

    O processo tem início com a retenção de fósforo devido à incapacidade de sua excreçãoocasionada pela queda no RFG (clearance em torno de 60 mL/min). Associado a isso, hádiminuição da conversão da vitamina D em sua forma ativa pelo rim e consequente hipocalcemia.Estas alterações iniciais acarretam elevação do paratormônio (PTH), que é o hormônio responsávelpela manutenção da calcemia numa estreita faixa dita fisiológica.

    uOs estados de hipocalcemia e hiperfosfatemia crônicos são estímulos para odesenvolvimento de hiperplasia das paratireoides, que, por conseguinte, diminuem a expressão

    dos receptores de cálcio e calcitriol, tornando-se a glândula menos responsiva às elevações séricasdo cálcio e desta vitamina. Outros fatores que contribuem para patogênese do hiperparatireoidismosão a resistência óssea à ação do PTH e a acidose metabólica.

     A DMO-DRC pode ser classificada como de alta remodelação, baixa remodelação ou doençamista. O padrão-ouro para o diagnóstico de cada tipo de acometimento ósseo é a biópsia óssea

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    com análise histomorfométrica e marcação com tetraciclina. No entanto, esse método é trabalhosoe requer laboratório e pessoal habilitado em tais técnicas.

     A DMO-DRC manifesta-se por meio de dores ósseas e articulares, miopatia, lesões e roturasem ligamentos e tendões, perda funcional de articulações e, mais tardiamente, risco de fraturaspatológicas. Muitas vezes, a doença é oligossintomática ou assintomática, sendo identificadaapenas quando a agressão ao osso já é exuberante. Quadros de deformidades graves, comofácies leonina, escolioses e cifoses, alterações em caixa torácica, deformidades em quadril etumores marrons são inaceitáveis atualmente, com a gama de recursos diagnósticos e terapêuticos

     já disponíveis. Além disso, a elevação do produto cálcio-fósforo pode causar calcificações metastáticas empele e partes moles, com risco de ulcerações, gangrenas e amputações. Ainda mais importante, apresença de calcificação metastática em vasos (Figuras 4 e 5) no paciente com DRC foirecentemente associada à maior risco cardiovascular.

     A doença de alta remodelação, conhecida como osteíte fibrosa, é secundária aohiperparatireoidismo secundário. No osso, o PTH gera uma ativação na remodelação óssea e, emlongo prazo, substituição da medula óssea por tecido fibroso (daí o nome osteíte fibrosa – Figura6). Este processo está comumente associado ao agravamento da anemia por aumento daresistência à ação da eritropoietina.

     A doença de baixa remodelação compreende a osteomalácia e a doença adinâmica. A

    primeira caracteriza-se por defeito na mineralização óssea com acúmulo de osteoide nãomineralizado, enquanto a segunda é caracterizada por osteoide normal, porém com taxa muitobaixa de remodelação óssea. Estão ambas associadas à intoxicação por alumínio e outros metaispesados (ferro, estrôncio, cádmio), hipoparatireoidismo relativo, excesso de uso de calcitriol ecálcio, desnutrição, diabetes melito, idade e uso de diálise peritoneal contínua.

     Figuras 4 e 5: Calcificações metastáticas em paciente com DRC e hiperparartireoidismosecundário.

     Figura 6: Biópsia óssea em paciente com DRC e hiperparatireoidismo secundário. Note oaumento no número de osteoclastos e osteoblastos, causando aumento na remodelaçãoóssea, redução no osso trabecular e formação de fibrose peritrabecular.

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     Cortesia da Dra. Vanda Jorgetti – HC-FMUSP. 

    Alterações Endócrinas e Neurológicas As anormalidades endócrinas na DRC têm patogênese complexa e se dá por diminuição no

    clearance renal dos hormônios (p.ex., insulina, glucagon, PTH, calcitonina e prolactina); diminuiçãoda secreção renal (eritropoietina, renina e 1,25 (OH)2 vitamina D3), redução da atividade de outras

    glândulas (p.ex., testosterona, estrogênio e progesterona) e alteração no tecido alvo de açãohormonal (p.ex., PTH e eritropoietina).

     As alterações dos níveis hormonais são descritas na Tabela 5. 

    Tabela 5: Alterações hormonaisGlândulas Hormônios

    Hipotálamo-hipófise GH (?) Prolactina (?)

    TireoideT4 (? ?) TSH (?)T4L (? ?) T3 (?)T3r (?) T3L (?)

    GônadasTestosterona (?) Estrogênio (? ?)LH (? ?) FSH (?)Progesterona (?)

    Pâncreas Insulina (?) Glucagon (?)

     Adrenais  Aldosterona (? ?) Cortisol (? ?)

     ACTH (? ?) Catecolaminas (? ?)

    Rins   Eritropoietina (?) Renina (?)1,25 (OH)2 vitamina D3 (?) 

     As alterações neurológicas são comumente observadas nos pacientes com DRC. O espectrodestas alterações inclui anormalidades no sensório, disfunção cognitiva, fraqueza generalizada e

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    neuropatia periférica. A encefalopatia urêmica se refere a sinais e sintomas decorrentes da perda da função renal

    que se inicia geralmente quando o RFG está abaixo de 10 mL/min. O paciente apresenta-se comalteração de memória, retardo cognitivo, lentificação de fala e raciocínio, além de distúrbio napercepção e humor. Apesar de vários fatores influenciarem o surgimento da encefalopatia, não hácorrelação entre o grau de acometimento do sistema nervoso central com nenhum marcador bioquímico associado à disfunção renal.

     A neuropatia periférica, acomete cerca de 65% dos pacientes com DRC no estágio 5. Podem

    variar desde alterações oligossintomáticas detectadas por eletroneuromiografia até disfunçãosexual, parestesias e pré-síncope. A neuropatia é distal e simétrica (bota e luva), e está associadaà desmielinização secundária da porção posterior da medula espinhal. O exame físico revela perdado reflexo tendíneo profundo, além de diminuição de sensibilidade a dor, vibração e pressão.

     Acidose Metabólica

     A acidose metabólica se deve sobretudo à incapacidade renal de excretar íons hidrogênio epode ser composta ainda de bicarbonatúria nos casos de doenças em que há acometimentointersticial. O desenvolvimento da acidose metabólica agrava a hipercalemia, inibe o anabolismoproteico e acelera a perda óssea de cálcio, acentuando a DMO-DRC.

     

    Desnutrição A desnutrição é frequente nos pacientes com DRC e está associada a aumento na

    mortalidade. Vários fatores influenciam seu desenvolvimento, incluindo anorexia, acidose,resistência a insulina, estado pró-inflamatório e proteinúria. Os marcadores bioquímicos sãoalbumina sérica, transferrina e colesterol. Nos estágios 4 e 5 da DRC, os níveis de creatininapodem permanecer estáveis, a despeito da perda progressiva da função renal em decorrência dadiminuição da massa muscular.

     Alterações Imunológicas

     As infecções são a segunda maior causa de óbito nos pacientes com DRC. Há deficiência na

    resposta antigênica dos linfócitos T, causada parcialmente pela incapacidade de apresentação dosantígenos pelos monócitos. A ativação neutrofílica é deficiente e, apesar dos níveis séricos deimunoglobulinas serem normais, a resposta vacinal é pobre.

     As manifestações clínicas destas anormalidades incluem aumento da suscetibilidade ainfecções bacterianas, aumento do risco de reativação da tuberculose e incapacidade de eliminar os vírus das hepatites B e C.

     

    EXAMES COMPLEMENTARESMedidas Laboratoriais de Função Renal

     A principal forma de medição da função do rim é a medida do ritmo de filtração glomerular (RFG). Obviamente, medidas de avaliação de função tubular, capacidade de concentração eacidificação urinárias, metabolismo hormonal etc. também refletem a função do órgão, mas o RFGconsagrou-se como o principal parâmetro clínico e experimental. Uma vez que o RFG não pode ser medido diretamente, a taxa de depuração de algumas substâncias pode ser usada como estimativada filtração glomerular.

    O padrão-ouro para medida do RFG até hoje é a taxa de depuração da inulina, mas suarealização é extremamente trabalhosa e inviável na prática clínica. Outros métodos de estimativade RFG são precisos (125I-iotalamato, 51Cr-EDTA, iotalamato e iohexol), mas ainda caros e poucodisponíveis.

     Apresenta boa correlação com a depuração de inulina, mas pode estar superestimadaquando a redução no RFG é grave (conforme há redução no RFG, a creatinina passa a ser 

    secretada pelos túbulos). É feita habitualmente em coleta de 24 horas, outra fonte de erro por coleta inadequada e por esvaziamento incompleto da bexiga, principalmente em crianças e idosos.Diversas equações de estimativa do RFG foram criadas, levando em consideração a variabilidadeno RFG determinado por sexo, idade, peso e raça. As equações mais utilizadas são as deCockcroft-Gault e do MDRD (Tabela 6). Outra forma de estimar o RFG é fazer a média entre astaxas de depuração de creatinina e ureia, uma vez que a primeira superestima e a segunda

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    subestima o RFG nas fases mais adiantadas da DRC. 

    Tabela 6: Equações de estimativa do RFG

    Cockroft-Gault  (140 – kk idade) x peso / 72 x creatinina sérica

    * x 0,85 se sexo feminino

    MDRD170 x Cr sérica-0,999 x idade-0,176 x SUN#-0,170 x albumina 0,318

    *x 0,762 se sexo feminino** x 1,18 se raça negra

    # SUN = ureia (mg/dL) / 2,14. O uso da creatinina sérica como marcador   isolado de função renal é usual pela sua

    simplicidade, mas deve ser feito com muito critério. A creatinina sérica tem relação exponencialcom o RFG (Figura 7) e seus valores apenas se alteram significativamente quando a perda nafunção do órgão já é de aproximadamente 50%. Além disso, a creatinina é produzidaendogenamente a partir de catabolismo muscular e varia imensamente de acordo com a massamuscular (dependente do sexo do indivíduo, idade, grau de atividade física, estado nutricional eeventual presença de amputações). Assim, o mesmo valor de creatinina sérica de 1 mg/dL poderefletir um RFG de 120 mL/min num jovem do sexo masculino, como de 40 mL/min numa senhorade 80 anos desnutrida ou até mesmo um RFG de 10 mL/min num neonato.

    Recentemente, a medida da proteína de baixo peso molecular cistatina C, sintetizada emritmo constante e catabolizada por filtração glomerular, foi proposta como uma alternativa à medidade creatinina para a avaliação do RFG. No entanto, o custo mais elevado, a pouca disponibilidadede sua determinação em rotina, além da necessidade de uma melhor avaliação na prática clínica,ainda inviabiliza seu uso no lugar da creatinina.

     Figura 7: Relação entre creatinina sérica e RFG.

     Exames Complementares Diagnósticos

    São exames úteis na avaliação etiológica da DRC: 1.  Exame de urina: pode revelar a presença de proteinúria, hematúria com ou sem

    dismorfismo eritrocitário, leucocitúria, cilindrúria, glicosúria, entre outras alterações. É defundamental importância no decorrer da investigação da doença renal crônica, podendodirecionar a suspeita clínica para doenças específicas, assim como o seguimento dotratamento (controle de cura e recidivas).

    2.  Proteinúria de 24 horas.

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    TRATAMENTO Anteriormente, a nefropatia crônica era compreendida como uma doença inexorável, sem

    nenhuma possibilidade de reversão ou estabilização. No entanto, sabe-se atualmente que umamelhora significativa na sobrevida e na qualidade de vida do paciente pode ser obtida com oemprego de algumas drogas, controle clínico rigoroso, tratamento de comorbidades, prevenção denovas agressões nefrotóxicas, identificação de causas potencialmente tratáveis e preparação dopaciente para diálise e transplante renal em momento oportuno.

    Entre as medidas de tratamento e prevenção secundária da DRC (tratamento conservador),recomenda-se universalmente as descritas a seguir.

     

    Controle da Hipertensão ArterialÉ a medida nefroprotetora mais importante e eficaz. Atualmente, recomenda-se a redução da

    pressão arterial a valores inferiores a 130 x 80 mmHg. Todas as classes de anti-hipertensivospodem ser utilizadas na DRC. Há certa polêmica em relação ao uso de bloqueador de canal decálcio di-hidropiridínico, uma vez que essa droga dilata preferencialmente a arteríola aferente, comrisco potencial de aumentar a pressão intraglomerular. No entanto, vale enfatizar que o maisimportante é o controle rigoroso da pressão arterial.

     Uso de Drogas Inibidoras da ECA (IECA) e dos Antagonistas do Receptor AT1(BRA)

    Vários estudos clínicos e experimentais mostraram o papel nefroprotetor dessas drogas emnefropatias crônicas proteinúricas. Esse efeito não ocorre apenas pela ação anti-hipertensiva dasdrogas, mas sim por uma combinação de efeitos sobre a hemodinâmica arteriolar (lembrar que aatuação vasodilatadora dessas drogas é predominante na arteríola eferente, ocorrendo queda napressão capilar glomerular) e sobre vias inflamatórias e fibrogênicas. Há trabalhos clínicos quedemonstram claramente os efeitos benéficos da inibição do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) na nefropatia diabética nos pacientes com DM tipo 1, tipo 2   e em outrasnefropatias proteinúricas.

    O uso dos IECA requer alguns cuidados, como monitoração da concentração sérica depotássio, pelo risco de hipercalemia, e atenção à piora súbita de função renal. Estes episódiospodem ser precipitados pelo uso de diuréticos ou estados hipovolêmicos, mas também podem

    ocorrer em função do efeito hemodinâmico próprio da droga.Elevações discretas, em até 30% do valor inicial da função, podem ser tratadas com correção

    da hipovolemia relativa (suspensão de diurético, compensação de ICC), mantendo-se a drogainibidora do SRAA. Se a piora de função for mais exuberante, o remédio deverá ser suspensotemporariamente e reiniciado em dose mais baixa. Nessa circunstância, é interessante avaliar a

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    presença de estenose em artérias renais. O uso de IECA e BRA é contraindicado quando houver estenose bilateral de artérias renais. Outros efeitos colaterais comuns são tosse e angioedema,principalmente com IECA. Pacientes com intolerância à IECA costumam tolerar bem o uso de BRA.

    O uso combinado dessas duas classes de drogas vem sendo estudado como medidanefroprotetora, mas os estudos apresentam resultados bem diversos até o momento, sugerindoinclusive que a combinação possa ter um efeito deletério sobre a função renal. Novos estudos sãonecessários, principalmente em pacientes com nefropatia diabética e naqueles com perda defunção renal mais avançada. Por ora, o uso sistemático do tratamento combinado em DRC não

    está recomendado. Controle Glicêmico Rigoroso em Pacientes Diabéticos

     Apesar de a evidência de que controle glicêmico melhora a sobrevida renal na prevençãosecundária (pacientes com DRC) ser muito menor do que na prevenção primária (pacientesdiabéticos sem DRC), esta medida faz parte da estratégia nefroprotetora. Além disso, é necessáriana prevenção primária e secundária das outras complicações micro e macrovasculares associadasao DM. O manuseio das drogas hipoglicemiantes é habitual até RFG de aproximadamente 30mL/min, quando o risco de hipoglicemias graves aumenta. Nessa situação, é necessário suspender o uso de biguanidas e inibidores da alfaglucosidase e ajustar a dose de sulfonilureias, dandopreferências às drogas de meia-vida mais curta. A insulina é a opção mais segura para pacientes

    na fase pré-dialítica imediata e em diálise. O uso de tiazolidinedionas e glinases parece ser seguromesmo em pacientes dialíticos, mas ainda não há experiência clínica suficiente com essas drogas.Os objetivos de controle glicêmico são iguais aos desejáveis para pacientes diabéticos nãoportadores de nefropatia crônica.

     Diagnóstico e Tratamento de Dislipidemias

     Ainda é polêmica a questão sobre o uso de estatinas ser eficiente como estratégianefroprotetora. Apesar das recomendações do NCEP não incluírem a insuficiência renal crônica nogrupo de doenças de risco elevado, nas quais está indicada a manutenção do LDL-colesterol emníveis inferiores a 100 mg/dL, diversos autores e a National Kidney Foundation sugerem que opaciente renal crônico deve, sim, ser incluído nesse grupo, dado seu risco cardiovascular. O uso deestatinas é seguro na DRC e recomenda-se apenas evitar a associação de estatinas e fibratos,pelo risco maior de rabdomiólise.

     Perda de Peso

    Medida de grande eficácia, não apenas por melhorar o controle da pressão arterial e do DM,mas também por reduzir a agressão que a obesidade causa em razão da hiperfiltração glomerular que impõe.

     Controle de Outros Fatores de Risco (Sedentarismo, Tabagismo eHiperuricemia)

     A relação entre hiperuricemia e progressão de nefropatia crônica é polêmica. De qualquer forma, a maior parte dos autores inclui o controle da hiperuricemia como parte do tratamentoconservador.

     Orientação Nutricional

    É recomendada a redução na ingestão de sódio e, nas fases mais adiantadas da DRC,restrições de potássio e fósforo. Sabidamente, a redução do aporte de proteínas da dieta reduz apressão intraglomerular e, há muitos anos, recomenda-se o uso de dieta hipoproteica paradesacelerar a progressão da nefropatia crônica. Entretanto, salienta-se que tal medida deve ser usada com critério, levando em consideração o nível socioeconômico dos pacientes. Naquelespacientes que estão habituados a ingerir proteína em quantidade superior a 0,8 a 1 mg/kg/dia, arestrição da ingestão de carnes é certamente benéfica, mas naqueles pacientes que já têm umaporte baixo de proteína e que comumente tornam-se inapetentes pela própria síndrome urêmica, aaplicação de dieta hipoproteica pode gerar desnutrição. Assim, a presença de uma equipemultidisciplinar é sempre aconselhável e assegura uma melhor orientação e adesão do paciente.Vale lembrar que a desnutrição é conhecidamente um fator de gravidade em pacientes que iniciam

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    tratamento substitutivo renal, associada à morbimortalidade muito mais elevada. 

    Tratamento dos Distúrbios de Cálcio, Fósforo, Vitamina D e PTH A hipocalcemia deve ser tratada com a reposição de cálcio, habitualmente feita com

    carbonato ou acetato de cálcio. Em caso de hiperfosforemia, deve-se instituir restrição dietética defósfororeduzindo-se alimentos como carne, leite e seus derivados, ovo, refrigerantes, grãos (feijão,grão de bico, ervilha), nozes e cereais. Caso o fósforo sérico mantenha-se superior a 5,5 mg/dL,deve-se iniciar o uso de quelantes. Há três tipos de quelantes atualmente disponíveis (Figura 8): à

    base de cálcio, carbonato e acetato de cálcio; aqueles com alumínio e aqueles sem cálcio oualumínio (sevelamer ou carbonato de lantano, o último não disponível no Brasil). Os quelantes comcálcio estão indicados para pacientes que apresentam hipocalcemia concomitante, mas tornam-seprejudiciais em pacientes hipercalcêmicos (comum em fases mais adiantadas dehiperparatireoidismo secundário) ou quando usados em doses superiores a 2 g/dia. Os quelantescom alumínio são eficazes, mas não devem ser usados por mais de 15 dias, dado o risco detoxicidade óssea. O sevelamer deve ser usado em indivíduos com calcemia elevada ou naquelesque necessitam de doses muito elevadas de quelantes com cálcio, mas é uma droga de custo maiselevado e não está indicado em pacientes pré-dialíticos, pelo risco de acidose metabólica. Figura 8: Uso de quelantes de fósforo.

     Nas fases 3 e 4 da DRC, a forma precursora de vitamina D (25(OH) vitamina D) deve ser 

    reposta se insuficiente, habitualmente com ergocalciferol oral ou intramuscular. A elevação de PTH(valores dependentes da fase da DRC – Tabela 4) deve ser tratada com pulso (oral ouendovenoso) de vitamina D ativa (calcitriol ou análogos sintéticos), desde que o produto cálcio-fósforo esteja controlado (a administração de vitamina D aumenta a reabsorção intestinal de cálcioe fósforo, podendo gerar valores proibitivos de fosforemia e calcemia). Se não houver respostaclínica, está indicado o tratamento cirúrgico, com a realização de paratireoidectomia subtotal, totalou total com autoimplante.

     

    Correção da Acidose Metabólica Apesar de necessária para evitar náusea, hipercalemia e desmineralização óssea, aadministração de bicarbonato de sódio por via oral apresenta a desvantagem de aumentar aingestão de sódio e a consequente elevação na pressão arterial. Deve-se tentar obter um nível debicarbonato em torno de 22 mEq/L. Para tal, pode ser administrado bicarbonato de sódioinicialmente 1 g 4 vezes/dia.

     Correção dos Distúrbios Hematológicos

     Antes do início do tratamento, é de fundamental importância a exclusão de outros tipos deanemia não ocasionados diretamente pela deficiência de eritropoietina. Exames propostos sãohemograma com índices eritrocitários (VCM, HCM e CHCM), contagem de reticulócitos, perfilférrico (saturação de transferrina, ferritina e ferro sérico), e proteína C reativa. Qualquer indício deanemia ferropriva deve ser investigado criteriosamente. A depender da suspeita clínica e dafalência de resposta ao tratamento inicial instituído, deve-se atentar para outras causassuperpostas como deficiência de vitaminas hidrossolúveis, contagem diferencial de leucócitos,exclusão de hemólise, presença de paraproteínas, intoxicação por alumínio (causa rara com

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    passado entre 3 e 4 semanas antes do início da diálise peritoneal. Os pacientes devem ser avaliados e indagados quanto à possibilidade de transplante renal, permitindo a inscrição mesmo jána fase pré-dialítica (no Brasil, o Ministério da Saúde autoriza a inscrição na lista de transplante apartir de 20 mL/min de depuração de creatinina).

     Algoritmo 2. Esquema de medidas terapêuticas do tratamento conservador da DRC.

     

    TÓPICOS IMPORTANTES   A evolução desfavorável da doença renal crônica pode frequentemente ser prevenida ou

    retardada por meio da detecção e do tratamento precoce. Os estágios precoces da doençarenal crônica podem ser detectados por meio de dosagens laboratoriais simples de rotina.

      O reconhecimento da etiologia é fundamental na abordagem terapêutica, uma vez quemuitas causas de nefropatia crônica têm tratamento específico.

      O sinal mais precoce da DRC é o surgimento de noctúria, em função da perda decapacidade de concentração urinária, intensificada pela presença de edema.

       A principal causa de óbito em pacientes dialíticos é cardiovascular.   A ação do PTH se faz em dois sítios principais: 1) nos rins: estimulando a alfa-1-hidroxilase

    no túbulo contorcido proximal elevando a produção de calcitriol e consequente absorçãogastrintestinal deste íon; aumenta a excreção de fósforo e a reabsorção de cálcio iônico; 2)no tecido ósseo: aumenta o efluxo de cálcio, portanto, aumentando a calcemia.

       As infecções são a segunda maior causa de óbito nos pacientes com DRC. Há deficiênciana resposta antigênica dos linfócitos T, causada parcialmente pela incapacidade deapresentação dos antígenos pelos monócitos. A ativação neutrofílica é deficiente e, apesar dos níveis séricos de imunoglobulinas serem normais, a resposta vacinal é pobre.

       A taxa de depuração de creatinina tornou-se a forma mais usual de estimativa do RFG e

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    provou ser a mais prática e custo-efetiva.  O uso dos IECA requer alguns cuidados, como monitoração da concentração sérica de

    potássio, pelo risco de hipercalemia, e atenção à piora súbita de função renal. Estesepisódios podem ser precipitados pelo uso de diuréticos ou estados hipovolêmicos, mastambém podem ocorrer em função do efeito hemodinâmico próprio da droga.

      Pacientes com DRC apresentam tendência a sangramento, mesmo com plaquetas efatores de coagulação em níveis normais. Há uma deficiência na adesão e agregaçãoplaquetária.

     

     A preservação da função renal residual é importante mesmo após o início do tratamentodialítico e confere maior sobrevida aos pacientes anúricos.   A TRS é iniciada quando o RFG encontra-se entre 10 e 15 mL/min/1,73 m2 e/ou quando

    surgem sinais e sintomas de uremia. O início da diálise não deve ser feito em caráter deurgência, mas sim de forma programada, sem prejuízo da qualidade de vida do paciente.

     

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