aprendizagem cooperativa no prece e na sala de aula

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A APRENDIZAGEM EM CLULAS COOPERATIVAS E A EFETIVAO DA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA EM SALA DE AULA THE COOPERATIVE LEARNING IN CELLS AND A SIGNIFICANT LEARNING EFFECTIVE IN THE CLASSROOMCarmen Silvia Nunes de Miranda 1; Marlia Studart Barbosa 2, Talita Feitosa de Moiss3

RESUMO Este artigo tem por intuito fomentar a vivncia da aprendizagem significativa rogeriana em sala de aula, a partir de uma articulao dessa com princpios e recursos da aprendizagem cooperativa desenvolvida pelo Programa de Educao em Clulas Cooperativas (PRECE). Tal encontro torna possvel a busca por alternativas ao ensino formal dirigido e centrado no professor. A importncia dada s experincias dos estudantes no processo de aprendizagem, com foco no desenvolvimento de seus potenciais e interesses, a relevncia das relaes humanas travadas nesse contexto educacional e a busca por recursos efetivos, so pontos convergentes dessas duas propostas. PALAVRAS-CHAVE: Educao; Aprendizagem significativa; Aprendizagem cooperativa. ABSTRACT This article is meant to ferment Rogers Significant Learning experience in the classroom, from an articulation of the bases and resources of Cooperative Learning developed by the Cooperative Cells Educational Program. Such interaction enables the search for alternatives to the Formal Directed Education focused on the teacher. The importance given to the experiences of students in the learning process, focusing on the development of their potential and interests, the relevance of Human relationships addressed in the educational context and the search for effective resources are converging points of these two proposals. KEY-WORDS: Education; Significant learning; Cooperative learning. RESUMEN Este artculo se destina a fomentar el aprendizaje significativo de Rogers en aula de clase, a partir de una articulacin de los principios y las caractersticas del aprendizaje cooperativo desarrollado por el Programa de Educacin en Clulas Cooperativas PRECE. El encuentro posibilit la bsqueda de alternativas a la educacin formal dirigida y enfocada en el profesor. La importancia dada las experincias de los estudiantes em el proceso de aprendizaje, centrndose en el desarrollo de sus potencialidades e intereses, la importncia de las relaciones humanas atrapadas em el contexto educativo y la bsqueda de soluciones eficaces, son puntos que estn convergiendo en las dos propuestas. PALABRAS-CLAVE: Educacin, Aprendizaje Significativa, Aprendizaje Cooperativa.

Psicloga, mestranda em Psicologia pela Universidade Federal do Cear (UFC). Psicloga, Coordenadora do Projeto Estudante Cooperativo da Coordenadoria de Protagonismo Estudantil da Secretaria de Educao do Governo do Estado do Cear. 3 Estudante do 9 semestre do curso de Psicologia da Universidade Federal do Cear (UFC), estagiria do Instituto Corao de Estudante.2

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INTRODUO

Este estudo terico parte de questionamentos acerca das dificuldades na efetivao de uma aprendizagem significativa em sala de aula. Tais questes surgiram a partir de discusso junto a alunos e professores de diferentes instituies do ensino superior no XV Encontro Latino- americano de Abordagem Centrada na Pessoa, que aconteceu em Ouro Preto, Minas Gerais, em 2010. Ressaltamos duas dentre as dificuldades apontadas na discusso: a dos alunos, acostumados a um modelo tradicional de educao (conteudstico e com foco nas notas), em envolverem-se numa aprendizagem auto-dirigida, em que no sero mais guiados e a dos professores em criarem formas de proporcionar tal aprendizagem, que exige flexibilidade e criatividade, por estar voltada muito mais a um pressuposto das relaes humanas do que a um modelo a ser aplicado. No momento dessa discusso travada no encontro latino de ACP de 2011 pudemos perceber a escassez de espaos de compartilhamento de experincias acerca dessa temtica. Tais espaos so essenciais pelo fato de promoverem reflexes sobre o cotidiano da sala de aula que preza por uma aprendizagem significativa, to na contramo do sistema de educao em que estamos inseridos. Tal pensamento articula-se com a proposta proveniente deste trabalho de apresentar, mais como via de reflexo e estmulo experimentao, princpios e recursos da aprendizagem cooperativa do Programa de Educao em Clulas Cooperativas (PRECE) para a efetivao da aprendizagem significativa. A aprendizagem cooperativa do PRECE iniciou-se com uma experincia informal em educao, que ganhou fora como um movimento social, permeando, hoje, os espaos formais de educao atravs de parceria com Secretaria de Educao do Estado do Cear

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(SEDUCCE) e com a Universidade Federal do Cear (UFC). Atualmente, nomeia-se esse modelo de aprendizagem cooperativa devido a consonncias e influncias metodolgicas da teoria norte-americana de aprendizagem cooperativa dos irmos David W. Johnson e Rogers T. Johnson (JOHNSON; JOHNSON; HOLUBEC, 1987), embora se diferencie deste em alguns aspectos. A proposta precista constitui-se numa proposta singular de aprendizagem em grupo experiencial voltada para as vivncias dos seus membros e para a possibilidade de transformao social e desenvolvimento local. a este modelo, desenvolvido a partir das experincias de aprendizagem de jovens em grupos de educao informal no interior do Cear, que nos referimos neste trabalho. Desta forma, a inquietao gerada pela discusso no Encontro e o contato com a aprendizagem desenvolvida pelo PRECE levaram-nos a esboar reflexes sobre a possvel articulao entre aprendizagem significativa e a aprendizagem cooperativa precista, salvaguardando suas diferenas e especificidades. Este trabalho, nesse sentido, ressaltar o encontro entre as duas propostas no intuito de fomentar novos caminhos para a aprendizagem em sala de aula. Para tanto, contaremos com trs momentos: no primeiro, explanaremos brevemente acerca da aprendizagem significativa rogeriana, em seguida apresentaremos a aprendizagem cooperativa do PRECE a partir de sua histria, com suas influncias e

diferenciaes da teoria norte-americana de aprendizagem cooperativa, chegando a seus princpios e recursos metodolgicos e por ltimo, nos cabe uma articulao das propostas das aprendizagens significativa rogeriana e cooperativa do PRECE com foco na possibilidade de compreender o uso dos princpios e recursos metodolgicos precistas, que conta com a apropriao da metodologia norte-america, como caminhos para uma aprendizagem significativa em sala de aula.

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A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA NA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA

A partir de preocupaes relativas prtica clnica, a Abordagem Centrada na Pessoa, desenvolvida pelo psiclogo norte-americano Carl Rogers (1902-1986), teve repercusses em diferentes reas, para alm da psicoterapia, como na resoluo de conflitos, nos pequenos e grandes grupos e na educao (WOOD, 1983; 2008), esta ltima foco deste trabalho. A temtica da educao encontra-se inicialmente presente na obra desse autor em suas reflexes e experincias como professor universitrio preocupado com a formao de terapeutas (ROGERS, 1975). Sempre arraigada sua experincia pessoal, tais reflexes alcanam, ao longo do tempo, crticas profundas ao modelo convencional de educao e se organizam em torno de uma nova proposta de educao, a centrada no estudante. Sobre tais crticas, numa entrevista a Richard Evans, Rogers (EVANS, 1979, p.66) comenta:Acho que minha crtica mais profunda ao sistema educacional [...] que ele se baseia na desconfiana ao estudante. No confia nele para deix-lo seguir suas prprias inspiraes: dirigi-o; diz-lhe o que deve fazer; diz-lhe o que deve pensar; diz-lhe o que deve aprender.

Diferentemente do modelo convencional, na proposta centrada no estudante, o ensino, a transmisso de conhecimentos elencados por uma figura de autoridade, cede lugar a preocupaes com a aprendizagem, aquisio de novos conhecimentos, gerando mudanas de percepo e de comportamento tanto nos alunos quanto nos professores (ROGERS, 1977; 1997). Surge, assim, a ideia de aprendizagem significativa, que tanto na clnica quanto em situaes educacionais, emergem de um clima de segurana e receptividade proporcionado pela vivncia das atitudes facilitadoras e a confiana na capacidade do

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organismo humano (dos clientes, estudantes, terapeutas, professores) de lidar da melhor forma possvel num dado momento com as situaes emergentes, rumo ao seu crescimento. So trs as atitudes facilitadoras: a autenticidade ou congruncia; a compreenso emptica; e a aceitao, confiana ou apreo. No que se refere relao professor-aluno, temos que a autenticidade diz respeito a que o professor seja uma pessoa real diante do aprendiz, esteja consciente dos seus prprios sentimentos e permita-se sent-los e express-los quando considerar necessrio. J a empatia colocar-se no lugar do aluno como se fosse ele, mas sabendo que no o , ou seja, ter uma atitude sensvel de compreenso do modo como o aluno v o mundo sua volta, enxerga as situaes em que se encontra e percebe a sua aprendizagem. A aceitao ter interesse no possessivo pelo aprendiz como ser humano, dotado de sentimentos e potencialidades e ter um respeito singularidade deste. Vivenciando tais atitudes o professor proporcionaria um clima de segurana em sala de aula gerando uma mudana na qualidade do relacionamento pessoal com os alunos, embasando-se na confiana no organismo humano, o que levaria a uma aprendizagem autodirigida: [...] se acredito na capacidade de cada um desenvolver sua potencialidade individual, proporcionar-lhe-ei todas as oportunidades e lhe permitirei a escolha de vias prprias e sua direo pessoal na aprendizagem. (ROGERS, 1977, p.119) A aprendizagem significativa volta-se para o envolvimento pessoal do aluno no seu processo de aquisio de conhecimentos, que a partir de questes relacionadas sua vida e aos seus interesses, traa sua aprendizagem e por ela responsvel. No afirmamos com isso que tudo cabe ao aluno, sobrando ao professor uma postura de passividade, como por vezes atribuda a profissionais nessa vertente. Longe disso, ao professor caberia centrar-se mais no processo de aprendizagem do que no de ensino como a educao convencional aponta. Assim, eleEm vez de empregar a maior parte do tempo em preparar planos de aula e exposies orais, concentra-se na promoo de todas as espcies de recursos que Revista do Nufen - Ano 03, v. 01, n.01, janeiro-julho, 2011.

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podero proporcionar a seus alunos uma aprendizagem experiencial correspondente s necessidades deles (ROGERS, 1977, p.135).

O professor facilitaria a aprendizagem significativa a partir das atitudes j mencionadas e da crena no organismo humano ao crescimento, mas tambm se colocaria disposio dos alunos em suas necessidades individuais e de grupo, estando preparado a responder intelectual e emocionalmente, tal como Rogers (1977, p.135) aponta: Pe-se a si prprio, o seu saber e a sua experincia especiais, claramente disposio dos alunos, mas no se impe a eles. Percebe-se, assim, a clara distino entre uma postura de passividade e o papel apontado para o professor como um facilitador da aprendizagem significativa. Neste, ele busca suscitar a motivao dos alunos atravs das atitudes e da preparao de recursos que auxiliem na efetivao de tal aprendizagem na busca contnua por uma metodologia pessoal (ROGERS, 1977), ou seja, metodologias congruentes com o seu jeito de ser, com as quais se sinta confortvel. Tal aprendizagem apontada por Rogers (1977; 1997) como essencial num contexto social que, longe de ser imutvel, passa por modificaes contnuas e em que um dado contedo ultrapassado em pouco perodo de tempo. Para este autor, resta-nos aprender a aprender (ROGERS, 1977) para uma melhor aquisio de conhecimentos to fluidos. Desta forma, a criatividade e a lida com mudanas fazem parte do processo educacional tanto para o aluno, na construo e aquisio de conhecimentos, como para o professor, na implicao e busca por recursos e propostas criativas para a efetivao da aprendizagem significativa em sala de aula. A aprendizagem significativa pressupe que haja a possibilidade para o aluno de dar sentido ao que aprendido em sala de aula. Para que faa sentido, tanto professor quanto o aluno devem assumir uma proposta cooperativa de construo do conhecimento, onde ambos se reconheam como colaboradores desse processo. Ao mesmo tempo em que o 22Revista do Nufen - Ano 03, v. 01, n.01, janeiro-julho, 2011.

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professor prope um lugar ativo para o aluno, ele tambm d sentido ao seu novo lugar, que o de facilitador do conhecimento, sendo ele to aprendiz quanto o aluno no sentido de que tudo que vivenciado tambm novo para ele:O nico homem que se educa aquele que aprendeu como aprender, que aprendeu como se adaptar e mudar, que se capacitou de que nenhum conhecimento seguro, que somente o processo de buscar conhecimento oferece uma base de segurana (ROGERS, p.110, 1977).

Quando o professor reconhece que no ambiente da sala de aula (e nos espaos de aprendizagem agregados a ela) os alunos compreendem melhor os contedos que se relacionam com suas experincias pessoais, possvel trabalhar com numa proposta de aprendizagem significativa que opera para alm da cognio, reconhecendo que h uma seleo afetiva dos contedos, ou seja, os alunos tm mais facilidade de aprender o que faz mais sentido para eles dentro dos seus contextos de vida. Segundo Bonda (2002, p. 21), A experincia o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. No o que se passa, no o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas, porm, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece. exatamente essa noo de que o que o professor transmite no , necessariamente, o que o aluno experimenta que deve ser compreendida quando falamos de aprendizagem significativa. O foco da educao passa a no ser mais o ensino, a transmisso de um conhecimento, mas a aprendizagem, a experimentao desse, pois, para Rogers (1977;1997), ningum ensina ningum, no sentido de que a aquisio de um conhecimento tem como base primordial aquele que aprende, seus interesses e experincias. H uma mudana filosfica e poltica, de viso e postura dos envolvidos no processo de educao com a descentralizao do poder da figura do professor e maior nfase nos alunos. Isso no significa que o professor abra mo de qualquer mtodo em sala de aula, deixando ao aluno a responsabilidade por selecionar o que ele deseja conhecer. Cabe ao professor aproximar-se das experincias pessoais dos alunos e com isso favorecer a 23

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aprendizagem criando um clima propcio em sala de aula para o desenvolvimento das potencialidades desses. Rogers (1977) aponta alguns mtodos e recursos possveis provenientes de experincias em sala de aula como um convite aos professores experimentarem criativamente formas de propiciar aprendizagem significativa: A inteno foi, antes, a de oferecer um estmulo facilitador, sugestes teis a vias de acesso que ele [o professor] pode experimentar ou adaptar, segundo a sua prpria personalidade e o seu estilo prprio (ROGERS, 1977, p.146). Embora Rogers tenha lanado o convite, abrindo espao para a experimentao de recursos variveis nesse contexto de aprendizagem significativa em sala de aula, o pensamento corrente nos corredores acadmicos de que se trata de uma postura passiva do professor e de averso utilizao de recursos para alm da efetivao das atitudes facilitadoras. na contra-mo desse pensamento que caminhamos ao buscar mtodos que auxiliem o professor a efetivar a aprendizagem significativa em sala de aula, a partir da aprendizagem cooperativa vivenciada no PRECE. Ressaltamos, no entanto, que [...] nenhum dos mtodos aqui mencionados ter eficcia, a menos que a genuna inteno do professor seja a de criar um clima dentro do qual haja liberdade para aprender (ROGERS, 1977, p.140).

A APRENDIZAGEM COOPERATIVA NO PRECE

Para chegarmos ao que estamos denominando de aprendizagem cooperativa do PRECE necessrio que compreendamos um pouco do seu surgimento e de sua proposta, diferenciando-o da aprendizagem cooperativa tradicional norte-americana. Assim,

apresentaremos rapidamente o histrico do PRECE, seguindo por uma breve explanao

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acerca das articulaes e diferenas entre os dois modelos, trajetria necessria para alcanarmos os objetivos deste trabalho.

HISTRIA DO PRECE

O Programa de Educao em Clulas Cooperativas (PRECE) um movimento popular que promove a transformao social atravs da educao. O Programa prope aos jovens de origem popular um modelo de aprendizagem participativo cujo foco do processo pedaggico centra-se na interao e cooperao entre os estudantes. O idealizador do PRECE foi Manoel Andrade, professor universitrio da Universidade Federal do Cear (UFC) oriundo da localidade rural Cip, em Pentecoste (CE). Incomodado com a realidade de sua comunidade de origem, em que havia um grande nmero de jovens fora da faixa etria escolar ou que haviam abandonado os estudos, convidou, em 1994, um grupo de sete jovens para esses estudarem juntos. A princpio, objetivava-se que conseguissem voltar a estudar e conclussem a educao bsica. Incentivados, passaram a almejar o ingresso na Universidade Pblica, com a qual conquistariam novas possibilidades profissionais e sociais (PRECE, 2011). A proposta do referido professor aos estudantes foi que se reunissem diariamente, mesmo em sua ausncia, e juntos estudassem os contedos, cada um contribuindo a seu modo para aprendizagem coletiva. Cada estudante deveria optar pelo assunto com o qual mais se identificava, assumindo o papel dentro do grupo de promover a discusso sobre o tema, a partir do qual todos partilhariam seus conhecimentos, realizando uma mtua educao (AVENDAO, A. C. A, 2008). O grupo deveria reunir-se durante a semana, e aos fins de semana, encontrar-se-ia com o professor para resoluo de eventuais dvidas e compartilhamento do que havia acontecido.

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A iniciativa a princpio foi alvo de muitas crticas e desdm: Como vo aprender sem um professor ali para ensinar?!; No d pra confiar num grupo de adolescentes decidindo o que vo fazer!; O que um menino desses tem para ensinar para o outro?! De fato, eles teriam que ultrapassar uma srie de barreiras: geogrficas, financeiras e, em especial, educacionais, advindas da fragilidade da escolarizao pblica do Brasil, principalmente, no campo. Apesar de toda a descrena e da desconfiana por parte de familiares, da comunidade e mesmo, em alguns momentos, dos prprios estudantes (GOMES, 2010), o professor mantinha-se convicto de que o grupo tinha em si tudo o que lhe era necessrio para seu processo de construo de conhecimento. importante destacar que o convite a estudarem juntos implicava em viverem juntos, devido s dificuldades supracitadas. A soluo vivel foi deixarem suas casas para irem morar numa antiga casa de farinha cedida pelos pais do professor Manoel. Esses jovens passaram a partilhar no somente conhecimento, mas tambm dificuldades, sonhos, sentimentos, enfim, suas vidas. O grupo de estudo foi denominado de Clula Educacional Cooperativa, termo empregado fazendo aluso s caractersticas biolgicas das clulas vivas, tais como organizao autnoma, potencial de desenvolvimento e multiplicao que uma unidade celular possui essencialmente. Surgia, assim, uma caracterstica intrnseca a essa metodologia o vnculo. Contando com o apoio mtuo, o grupo de estudantes conseguiu concluir a educao bsica, mas no somente isso, cerca de dois anos depois, em 1996, houve o primeiro estudante aprovado para um curso do ensino superior, pedagogia na Universidade Federal do Cear. A utilizao da metodologia em clula apresentou-se como um meio potencializador da aprendizagem destes jovens, de maneira que esses, no s conseguiram retomar seus

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estudos bsicos, mas, a revs de todas as dificuldades vividas, obtiveram xitos, como o ingresso na Universidade. A partir de ento, muitos estudantes aderiram ao PRECE, aumentando tambm o nmero de estudantes de origem popular em universidades pblicas. Os universitrios precistas passaram a ser multiplicadores do Programa, retornando aos fins de semana as suas comunidades de origem a fim de acompanhar o desenvolvimento de novas clulas educacionais (AVENDAO, A.A, 2008). Ao longo dos 17 anos de histria houve cerca de 500 aprovaes em Universidades e cerca de dois mil estudantes secundaristas participando das Escolas Populares Cooperativas. Hoje as clulas de aprendizagem esto distribudas por sete municpios do estado do Cear em 13 Escolas Populares Cooperativas (EPCs), que so associaes civis constitudas por estudantes que formam uma rede de atuao em educao bsica, controle social, governana e desenvolvimento econmico (AVENDAO, A. C. A, 2008, p.29). A metodologia do PRECE foi amplamente difundida na Universidade Federal do Cear em 2008 com a criao da Coordenadoria de Formao e Aprendizagem Cooperativa (COFAC), um programa da Pr-Reitoria de Graduao da UFC que incentiva os estudantes a organizarem grupos de estudos cooperativos nos diversos ambientes e unidades acadmicas. Em junho de 2011, foi inaugurada a Escola Estadual de Educao Profissional de Pentecostes em parceria com a UFC para viabilizar a implantao da metodologia da aprendizagem cooperativa em sala de aula, a pioneira no Brasil com essa proposta. Alm disso, o PRECE, em reconhecimento a relevncia de seu trabalho, ter sua metodologia implementada nas escolas estaduais da rede pblica atravs do Projeto Estudante Cooperativo da Coordenadoria de Protagonismo Estudantil da Secretaria de Educao do Governo do Estado do Cear (PROJETO ESTUDANTE COOPERATIVO, 2011).

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Haja vista a tamanha repercusso que essa experincia educacional obteve, tem-se dedicado a compreenso e sistematizao dessa metodologia em Clulas de modo que possa ser utilizada nos diversos espaos educacionais. Para tanto, tem-se buscado alguns referenciais tericos advindos de outras prticas que dialogam com a metodologia vivenciada em Clula tais como os estudos de Paulo Freire e Carl Rogers (VIEIRA, 2008). Desde 2008, esforos so dedicados a entender uma proposta pedaggica norte-americana Aprendizagem Cooperativa (JOHNSON, R. T., JOHNSON, D. W., HOLUBEC, 1987) e construir os pontos de articulao dessa teoria com a prtica do PRECE.

A

APRENDIZAGEM

COOPERATIVA

NORTE-AMERICANA

E

A

APRENDIZAGEM COOPERATIVA DO PRECE A aprendizagem cooperativa um termo genrico utilizado por diversos autores para referirem-se ao uso de mtodos cooperativos em sala de aula, valorizando as competncias sociais em detrimento da competio, caracterstica da educao tradicional. Consistindo numa alternativa ao individualismo, salienta a solidariedade, conjugao de esforos, responsabilidade individual e social (LOPES & SILVA, 2009). A aprendizagem cooperativa sistematizada pelos irmos americanos Johnson & Johnson considerada [...] um mtodo de ensino que consiste na utilizao de pequenos grupos de tal modo que os alunos trabalhem em conjunto para maximizarem a sua prpria aprendizagem e a dos outros colegas. (LOPES & SILVA, 2009, p.3). Apresentaremos a seguir alguns dos elementos da Aprendizagem Cooperativa tradicionalmente utilizada nos Estados Unidos, Canad, Espanha, Portugal, fazendo uma interlocuo com os elementos da Aprendizagem Cooperativa difundida pelo PRECE no estado do Cear. importante destacar que o contato com essa Aprendizagem Cooperativa norte-americana tem dado subsdios ao PRECE em seu 28 processo de sistematizao

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metodolgica, principalmente no que se refere aos princpios que permeiam o funcionamento das Clulas de Aprendizagem Cooperativa. A Aprendizagem Cooperativa tradicional (LOPES & SILVA, 2009) trabalha com cinco elementos essenciais: interdependncia positiva, responsabilidade individual e de grupo, interao estimuladora (de preferncia face a face), competncias sociais e processo de grupo. O primeiro, a interdependncia positiva, considerado o elemento principal da aprendizagem cooperativa, ele diz respeito a uma noo de que o sucesso do grupo depende do sucesso de cada membro quando se reconhecem como responsveis uns pelos outros, podendo colaborar entre si na troca de conhecimento (LOPES & SILVA, 2009; JOHNSON, JOHNSON e KARL, 1998). No PRECE esse elemento est presente desde o incio, apesar de no ter sido nomeado desta forma, uma vez que a metodologia de estudo em Clulas Cooperativas parte do princpio de que a colaborao entre os estudantes no compartilhamento da vida e dos estudos essencial para a formao de vnculos e para a criao de um espao de cooperao que favorea o crescimento pessoal e grupal dos estudantes. vlido lembrar que nos primrdios do projeto, quando os sete primeiros estudantes iniciaram o estudo em Clula, eles passaram a morar na antiga casa de fazer farinha na comunidade Cip, convivendo em tempo integral, o que favoreceu, desde ento, a noo de que havia uma interdependncia entre eles. A interdependncia social positiva, como uma compreenso de que cada um faz parte e tem uma contribuio singular, insubstituvel e que se complementa com a dos demais na configurao do grupo nos leva a um segundo elemento, a responsabilidade individual e grupal. Esse segundo elemento da Aprendizagem Cooperativa norte-americana se refere crena de que o grupo capaz de assumir uma responsabilidade coletiva na busca dos seus

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objetivos, estando cada membro responsvel por uma parcela dessa responsabilidade (LOPES & SILVA, 2009; JOHNSON et al, 1998). Na metodologia do PRECE, podemos fazer uma correspondncia desse elemento com uma modalidade de ao educativa historicamente construda pelo programa, que a formao de protagonistas juvenis. Segundo Costa (2011, s/n)[...] no campo da educao, o termo protagonismo juvenil designa a atuao dos jovens como personagem principal de uma iniciativa, atividade ou projeto voltado para a soluo de problemas reais. O cerne do protagonismo, portanto, a participao ativa e construtiva do jovem na vida da escola, da comunidade ou da sociedade mais ampla.

Nesse sentido, compreendemos que a metodologia de aprendizagem em Clulas Estudantis Cooperativas forjam nos jovens precistas esse protagonismo juvenil, uma vez que eles no s compem um grupo de aprendizagem, mas participam de uma ampla rede solidria e engajada scio-politicamente com as questes de suas comunidades e municpios. Avendao (2008, p. 30), nos traz, a respeito dissoO que se denomina genericamente de precista no apenas aquele que participou de projetos educacionais do PRECE, e sim qualquer sujeito envolvido na rede de aes protagonizadas por um coletivo, que possui origens, caminhadas e objetivos semelhantes - sejam elas aes educacionais, poltico-comunitrias ou referentes ao processo de desenvolvimento da economia local. Esse coletivo possui um cclico processo de conscientizao individual e comunitria, provocando a transformao da realidade por meio da utilizao do saber e do auto-conhecimento dos sujeitos como seres ativos e histricos.

Um

terceiro

elemento

da

Aprendizagem

Cooperativa

norte-americana,

denominado interao estimuladora, de preferncia face a face, parte da idia de que a interao entre os alunos em prol de um objetivo estabelecido coletivamente gera um maior compromisso pessoal de uns com os outros e, conseqentemente, maior chance de sucesso pessoal e grupal (LOPES; SILVA, 2009; COCHITO, 2004). Esse elemento dialoga com uma prtica precista que a valorizao das histrias de vida dos estudantes. Como eles esto em interao constante, seja por conta de atividades voltadas aos estudos ou devido a outras atividades nas quais esto coletivamente engajados,

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h um incentivo para que os estudantes compartilhem as suas histrias de vida como um mtodo para favorecer uma mtua compreenso entre eles e fortalecer os vnculos existentes. Um quarto elemento da Aprendizagem Cooperativa norte-americana diz respeito s competncias sociais, que so relativas necessidade de que os alunos aprendam algumas habilidades sociais e tenham motivao para us-las no trato uns com os outros no dia a dia, como tambm para gerenciar conflitos de maneira positiva. Algumas dessas habilidades seriam: aceitar as diferenas, pedir ajuda, partilhar os materiais, dentre outras (JOHNSON; JOHNSON, 2005; LOPES; SILVA, 2009). A realidade norte-americana de questes sociais relacionadas a preconceitos scio-raciais, que se mesclam com uma srie de outras formas de discriminao, tornando o ambiente escolar muitas vezes propcio a prtica de violncia verbal e fsica entre os alunos, favoreceu a composio, na construo da Aprendizagem Cooperativa norte-americana, de uma srie de habilidades voltadas para os conflitos contextualizados nesse cenrio (COCHITO, 2004). Quando nos deparamos com a realidade brasileira, nordestina e, mais especificamente cearense de um histrico de excluso e desigualdades sociais, contexto no qual o PRECE est inserido, percebemos como seus princpios esto voltados para a transformao dessa realidade. O PRECE traz arraigado a sua prtica valores e atitudes relativos cooperao, solidariedade, doao, dedicao, fraternidade, a citar alguns, que vem sendo passado de uma gerao de estudantes para outra. Conforme Arneide Avendao (2008, p.48), [...] faz parte do currculo [das EPCs] um curso de Formao Poltica, em que os estudantes mediante textos e debates, discutem sua realidade e o que fazer para transformla. Essa postura cidad torna-se, pois, um elemento fundamental para constituio dessa metodologia.

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O ltimo elemento o processo de grupo, que so balanos regulares do funcionamento do grupo e da progresso da aprendizagem (COCHITO, 2004, p.26). um momento de avaliao grupal em que so tomadas decises a respeito do que deve ser mantido ou modificado para que se alcancem os objetivos desejados por todos. A aprendizagem cooperativa traz essa prtica como algo contnuo e freqente aps o encerramento de cada atividade grupal (LOPES; SILVA, 2009). Esse modelo sistemtico de avaliao fortalece ainda mais a postura dialgica que o PRECE pressupe em sua metodologia, pois avaliao da aprendizagem feita tanto em relao ao trabalho em si, quanto forma como os estudantes trabalharam em grupo. Na aprendizagem cooperativa norte-americana h uma proposta de construo de conhecimento atravs das interaes entre alunos. Para tanto, empregado uma srie de mtodos e tcnicas que so estruturados a fim de promover uma cooperao entre os discentes. O professor/facilitador tem, nesse caso, o papel de apresentar o contedo, propor atividades coletivas e fazer um acompanhamento da forma como essas so realizadas nos grupos. A proposta do PRECE o estudo em clulas cooperativas (em sala ou fora dessa), em que os estudantes dirigiro sua aprendizagem em grupo tendo como base os elementos j apresentados, alm de recursos tcnicos que podem ser utilizados, facilitando a dinmica e efetivao de tais elementos explicitados acima. Ao professor cabe auxiliar, monitorando os estudantes sempre que necessrio na realizao das atividades e percalos que surgirem. Percebemos, com o exposto, a busca do PRECE numa apropriao crtica de alguns elementos e preceitos do mtodo cooperativo estadunidense. A contextualizao da realidade a qual se encontra inserido e uma maior nfase no dilogo, experincia e liberdade dos estudantes, apontam especificidades que perpassam tais apropriaes e configuram a aprendizagem cooperativa precista como singular.

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RECURSOS

DA

APRENDIZAGEM

COOPERATIVA

DO

PRECE

NUMA

APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA

A aprendizagem significativa, diferentemente da cooperativa, no se caracteriza como um mtodo com tcnicas especficas para a aquisio do conhecimento. Ela se configura mais como uma proposta de redirecionamento da relao aluno-professor no contexto de aprendizagem, onde a figura do professor cede espao a do facilitador e a aprendizagem ocorre a partir das vivncias experimentadas pelo aluno. Nesse sentido, a aprendizagem:no se baseia nas habilidades de ensinar de um lder, no seu conhecimento erudito do campo, no planejamento do currculo, no uso de subsdios udio-visuais, na programao do computador utilizado, nas palestras e aulas expositivas, na abundncia de livros, embora tudo isso possa, uma vez ou outra, ser empregado como recurso importante. No, a facilitao da aprendizagem significativa baseia-se em certas qualidades de comportamento que ocorrem no relacionamento pessoal entre o facilitador e o aprendiz (ROGERS, 1977, p. 111).

A aprendizagem cooperativa do PRECE, devido influncias da aprendizagem cooperativa norte-americana, adota tcnicas e sistematizaes. Mas diferencia-se desta na medida em que a vivncia dos integrantes e a relao entre esses ganham destaque na aprendizagem, promovendo uma liberdade entre os estudantes e fomentando o protagonismo juvenil. A importncia do dilogo e da experincia pessoal nas clulas de aprendizagem cooperativa pode ser observada pelo uso sistemtico do recurso de contao da histria de vida, em que os estudantes conversam sobre sua vida pessoal com o intuito de se conhecerem mais e fortalecerem a relao, e da relevncia dada a momentos de conversas informais nos encontros em clulas. nesse sentido que aproximamos a experincia do PRECE de uma aprendizagem significativa e vivencial, o que nos permite uma articulao de seus recursos com a proposta rogeriana de educao.

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O compartilhamento das histrias de vida em meio aos sentimentos e livros, incluindo a o professor, que na aprendizagem cooperativa tradicional desenvolve funo de monitorar os estudantes, traz uma dimenso mais fluda e igualitria no processo educacional. No PRECE, a valorizao da cooperao grupal na construo do conhecimento possibilita tambm um espao permissivo em que o aluno direciona sua prpria aprendizagem. A organizao da turma em grupos uma ao primordial. Mais que agrupar os estudantes aleatoriamente h uma intencionalidade por parte do facilitador/professor no processo de diviso de grupo. Assim, aps a exposio de um determinado contedo, os alunos renem-se em pequenos grupos, cada um com um papel especfico e devem juntos realizar as atividades propostas pelo professor, requerendo, dessa forma, uma

responsabilizao individual e grupal na construo do conhecimento (JOHNSON, JOHNSON; KARL, 1998; COCHITO, 2004). Os estudantes so incentivados a organizarem-se de forma que cada um contribua efetivamente para concretizao da tarefa. possvel que o professor sugira algumas atribuies, levando em considerao em que consiste a atividade proposta. Por exemplo, se o grupo dividido para discusso de um tema pode-se atribuir papis como de um relator da discusso desenvolvida pelo grupo, um representante para apresentao da idia, um mediador do debate, um gerenciador do tempo de fala, etc. (LOPES; SILVA, 2009). importante que os estudantes sintam-se a vontade para criar os papis que julgam necessrios para o bom funcionamento do grupo. Nas Clulas do PRECE acontece dos estudantes designarem algum para ficar responsvel por acalmar os nimos caso a discusso fique acalorada diante de um tema polmico ou ainda algum responsvel pelo intervalo e organizao de um lanche. O grupo tem autonomia para decidir o que favorece sua dinmica. Conforme apontou Rogers (1978, p.52): [...] o grupo reconhece no seu processo os elementos no-saudveis, centra-se neles, filtra-os ou elimina-os, e continua, tornando-se num

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grupo mais saudvel. Cabe, portanto, ao professor/facilitador confiar nesses diversos arranjos grupais. Vale a pena salientar a importncia de esses papis terem um carter rotativo, ou seja, que cada membro do grupo tenha a chance de assumir diferentes funes (COCHITO, 2004), o que propicia um espao em que todos tenham a chance de experimentar-se de diferentes formas, promovendo um ambiente favorvel s potencialidades dos estudantes. Alm da contao da histria de vida e da atribuio de papis, existem algumas tcnicas que o professor/facilitador pode utilizar. Tais tcnicas provm da aprendizagem cooperativa norte-america, tendo sido apropriada pelo PRECE de forma a promover o dilogo entre os estudantes e uma aproximao pessoal, alm propiciar experincias de cooperao entre esses. Com tais recursos, ao invs de uma exposio unilateral advinda do docente sobre determinado assunto, como na educao tradicional, os estudantes podero construir cooperativa e experiencialmente conhecimentos sobre o assunto. Alguns destes recursos (LOPES; SILVA, 2009) seriam: A) CO-OP CO-OP (ver figura 1)

Figura 1

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1- Um tema abrangente escolhido para toda a classe, que estar dividida em grupos; 2- O tema dividido em sub-temas que sero distribudos entre as duplas de estudantes; 3- Estes sub-temas sero divididos em tpicos de forma que cada estudante da dupla fique responsvel por um tpico especfico; 4- Cada um estudar individualmente seu tpico, em seguida reuni-se com sua dupla e discute o sub-tema; 5- Posteriormente, o grupo inicial se juntar para discutir o tema completo. B) Grupos de Especialistas ou Jigsaw (ver figura 2)

Figura 2

Primeira etapa: os estudantes so divididos em grupos nos quais estudaro um nico tema, tornando cada membro do grupo especialistas em determinado subtema. Segunda etapa: novos grupos so montados de modo que cada um deles contenha um especialista de cada um dos subtemas, havendo uma socializao entre todos os membros. O uso de tais recursos parte de uma postura de confiana do professor nas potencialidades dos alunos e na capacidade desses em responsabilizarem-se por sua prpria aprendizagem. A sala de aula pode torna-se um espao de aprender a aprender (ROGERS,

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1977), em que cada sujeito co-responsabiliza-se no somente pela sua aprendizagem, mas tambm de seus colegas. Ao utilizar as divises de grupo expostas acima como tcnicas em sala de aula para viabilizar um espao propcio liberdade de aprender, tendo como base a relao interpessoal dos estudantes, o professor estar propiciando um ambiente favorvel para a aprendizagem significativa.

CONCLUSO

Partindo de questionamentos sobre a efetivao da aprendizagem significativa em sala de aula, tomamos a experincia de aprendizagem em clulas cooperativas, com seus princpios e recursos advindos da aprendizagem cooperativa norte-americana, como inspirao para novas configuraes em sala de aula. Apesar de influncias do modelo cooperativo norte-americano, a experincia cooperativa precista possui seu prprio terreno metodolgico e diferencia-se, dentre outras coisas, por sua maior nfase na experincia de vida dos estudantes e no protagonismo desses, com a possibilidade de transformao social. Assim, acreditamos que a aprendizagem cooperativa vivenciada pelos estudantes do PRECE apontam um caminho de prticas que primam por um aprendizado centrado nas experincias autnticas dos estudantes. Elas alertam uma necessidade de se repensar a relao estabelecida entre alunos e professores nos processos de aquisio de conhecimento, onde ambos devem revisar os seus papis, muitas vezes cristalizados no cotidiano escolar, para a construo de uma nova forma de aprendizagem significativa, ou seja, enraizada no desejo sincero do aluno em aprender e na disponibilidade real do professor de assumir o seu lugar de acompanhante do aluno, e no de dirigente, no seu caminho de conhecimento.

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nesse sentido que acreditamos na possibilidade de apropriao por parte dos professores de metodologias e recursos advindos dessas experincias, adaptados para as suas realidades cotidianas, com o objetivo de uma implementao da aprendizagem significativa em sala de aula. Buscamos, assim, com este escrito, propiciar reflexes acerca da implementao da aprendizagem significativa rogeriana e da necessidade da experimentao, por parte do professor, de novos recursos, vivenciados de forma autntica, que permitam aos estudantes trilharem sua prpria trajetria educacional. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS AVENDAO, A.A. Pr-vestibular Cooperativo: uma experincias exitosa no serto do Cear. In: XIMENES, V.M.; AMARAL, C.E.M; REBOUAS JNIOR, F.G. Psicologia Comunitria e Educao Popular: vivncias de extenso/cooperao universitria no Cear. Fortaleza: LC Grfica e Editora, 2008. AVENDAO, A.C.A. PRECE: Caminhadas de sujeitos comunitrios. In: XIMENES, V.M.; AMARAL, C.E.M; REBOUAS JNIOR, F.G. (orgs) Psicologia Comunitria e Educao Popular: vivncias de extenso/cooperao universitria no Cear. Fortaleza: LC Grfica e Editora, 2008. BONDA, J.L. Notas sobre a experincia e o saber de experincia. Revista Brasileira de Educao, Campinas, n 19. jul 2002. Disponvel em: < http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/RBDE19/RBDE19_04_JORGE_LARROSA_BONDI A.pdf >. Acesso em: 8 ago, 2011. COCHITO, M.I.G.S. Cooperao e Aprendizagem: educao intercultural. Lisboa: ACIME, 2004. CONEXES DOS SABERES. Universidade Federal do Cear. Objetivos. Disponvel em: . Acesso em: 12 ago. 2011 COSTA, A.C.G. Protagonismo Juvenil: o que e como pratic-lo. Disponvel em: < http://4pilares.net/text-cont/costa-protagonismo.htm> Acesso em: 12 ago. 2011. EVANS, R. I. Carl Rogers: o homem e suas idias. So Paulo: Martins Fontes, 1979. 196 p. GOMES, M.C. Canafstula: vida e esperana no serto nordestino Estudo sobre a experincia de desenvolvimento local na organizao scioeconmica do povoado de

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