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UNIVERSIDADE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS – UNIPAC

FACULDADE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DE BARBACENA – FADI

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

PAÊBLA APARECIDA DA SILVA

ABORTO EUGENÉSICO

BARBACENA 2011

PAÊBLA APARECIDA DA SILVA

ABORTO EUGENÉSICO

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Esp. Colimar Dias Braga Júnior.

BARBACENA 2011

Paêbla Aparecida da Silva

ABORTO EUGENÉSICO

Monografia apresentada à universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, como

requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Esp. Colimar Dias Braga Júnior Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC

Profa. Me. Débora Maria Gomes Messias Amaral

Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC

Prof. Esp. Rafael Francisco de Oliveira Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC

Aprovada em ___/___/___

Dedico carinhosamente este trabalho àqueles

que sempre lutaram para me dar uma vida

digna e repleta de conhecimentos. Que

abdicaram de seus projetos e me deu a

oportunidade de construir minha trajetória. Que

sempre me incentivaram a prosseguir nos

caminhos da aprendizagem, contribuindo na

realização dos meus sonhos e ideais: meu pai

Antônio Machado da Silva Filho e minha mãe

Margareth Aparecida Gonçalves da Silva que

pelo exemplo de vida e dignidade me

ensinaram a alcançar meus objetivos.

AGRADECIMENTO

A Deus, pelo dom da vida e pela presença constante em todos os momentos

da minha vida, aos meus pais Antônio Machado da Silva Filho e Margareth

Aparecida Gonçalves da Silva que muito amo e aos quais muito devo, pelo

imensurável esforço em ver meus sonhos realizados.

Pelo apoio, dedicação, e amor desde a concepção até esses meus vinte e

três anos de existência. Se não fosse pelos meus maravilhosos pais, meu sonho não

teria se realizado. Amo muito vocês!

Bom mesmo é ir a luta com determinação,

abraçar a vida com paixão, perder com classe

e vencer com ousadia, pois o triunfo pertence a

quem mais se atreve. E a vida é muito curta

para ser insignificante.

Charles Chaplin

RESUMO

O presente estudo analisa as características do aborto eugenésico frente ao Ordenamento Jurídico Brasileiro, para abortamento de fetos anencefálicos, anomalia incompatível com a vida extra-uterina. Expõem-se os limites da questão jurídica do aborto do anencéfalo. Apresenta como aspectos introdutórios, um histórico do aborto, fazendo um acompanhamento desde a antiguidade até os dias atuais, dedicando á historia do aborto eugenésico no Brasil. As condições em que a genitora é obrigada a passar, pela falta de normas específicas para este tipo de intervenção médica. Análise das decisões de tribunais que autorizaram a interrupção da gestação de fetos anencefálicos, de forma a alcançar o objetivo pretendido nesta pesquisa, a qual defende a vontade da mãe em querer abortar ou não, sem a autorização do judiciário, tornando o processo mais simples e mais célere. Não tendo à genitora que ajuizar qualquer tipo de ação, para obter decisão judicial, prevalecendo sua vontade de levar ou não a gravidez a diante. Por fim as reflexões sobre os aspectos de mudança de entendimentos pelas instituições jurídicas brasileiras frente á possibilidade de inclusão do aborto eugênico no rol dos abortos permitidos pelo Código Penal Brasileiro, visto não existir essa previsão legal.

PALAVRAS-CHAVE: Aborto Eugenésico. Princípios Constitucionais. Ausência de Previsão Legal. Autorização Judicial. Conduta Atípica.

ABSTRACT

This study analyzes the characteristics eugenic abortion against the Brazilian legal system, to abortion of anencephalic fetuses, anomaly incompatible with life outside the womb. Expose the limits of the legal issue of abortion anencephalic. It shows, as introductory aspects, a history of abortion, making a follow up from antiquity to the present day, about the history of eugenic abortion in Brazil. The conditions under which the parent is required to pass, the of specific standards for this type of medical intervention. Analysis of court decisios that allowed the termination of pregnancy of anencephalic fetuses, in order to achieve the desired goal in this research, which supports the mother`s will to want to abort or not, without the permission of the judiciary, making the process simpler and more quickly. Not having a parent who judge any action for judicial decision, whichever their willingness to take or not before pregnancy. Finally reflections on the changing aspects of understanding by the Brazilian legal institutions will face the possibility of inclusion in the list of eugenic abortion abortions permitted by the Brazilian Penal Code, as there is no such legal provision.

KEYWORDS:Eugenic abortion. Constitutional Principles.Lack of legal

provision.Judicial Authorization.Atypical Conduct.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................... 09

2 HISTÓRIA DO ABORTO EUGENÉSICO E SUA EVOLUÇÃO ............... 11

3 PRINCÍPIOS ............................................................................................ 16

3.1 Princípio da dignidade da pessoa humana ......................................... 16

3.2 Princípio da legalidade .......................................................................... 17

3.3 Princípio da autonomia da vontade ..................................................... 18

4 ESPÉCIES DE ABORTO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO PÁTRIA ......... 20

4.1 Aborto ..................................................................................................... 20

4.2 Conceitos jurídicos ................................................................................ 20

4.3 Auto aborto e aborto consentido ......................................................... 21

4.4 Aborto provocado por terceiros ........................................................... 22

4.4.1 Sem o consentimento da gestante ........................................................... 22

4.4.2 Com o consentimento da gestante .......................................................... 22

4.5 Aborto legal ............................................................................................ 23

4.6 Aborto necessário ................................................................................. 23

4.7 Aborto resultante de estupro ................................................................ 24

4.8 Forma majorada ..................................................................................... 25

5 CONCEITO DE ABORTO EUGENÉSICO ............................................... 26

5.1 Conceitos jurídicos ................................................................................ 26

6 AUSÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA E RISCO DA VIDA DA GESTANTE .. 28

7 JURISPRUDÊNCIA ................................................................................. 34

8 CONCLUSÃO .......................................................................................... 43

REFERÊNCIAS ................................................................................................ 44

9

1 INTRODUÇÃO

O tema abordado nesta pesquisa contempla uma espécie de aborto, o

eugênico, realizado em casos de fetos que apresentam anomalias incompatíveis

com a vida extra-uterina. E a falta de lei para regulamentá-lo de forma específica.

Essa obscuridade da lei vem sendo discutida há muitos anos, ainda que

considerada por muitos juristas supra-legal. Refere-se à adoção própria de um

regime democrático, de um Direito penal mínimo, que obriga a pensar na proteção

seletiva de bens jurídicos tutelados pela lei vigente. É necessário cogitar se a

vedação da interrupção da gestação de um anencéfalo, efetivamente constitui uma

ofensa grave a um bem jurídico importante para o desenvolvimento de um indivíduo

na sociedade e, por via de conseqüência, se existe, neste caso, tipicidade material.

A vida da genitora deve ser analisada como um bem relevante para o

ordenamento jurídico, visto que além de ser uma gestação difícil, o período pós

gestação será muito mais complicado. Frente ao avanço da medicina,

acompanhando o desenvolvimento fetal é possível detectar com precisão anomalias

que tornam incompatível a vida do bebê. O direito não pode ficar estático e não

evoluir no sentido de autorizar a interrupção da gestação, pois é característico dessa

ciência humana, as modificações de lei no tempo de acordo com as constantes

transformações das sociedades.

O referencial central da pesquisa é esclarecer fundamentadamente a

importância da regulamentação de um fato tão sério como esse, tendo como

embasamento decisões judiciais favoráveis ao aborto eugênico. As decisões que o

autoriza têm fundamentação na analogia, nos problemas da saúde mental

apresentados por essas gestantes, que deve ser analisado com muita cautela e

respeitado pelo direito, o mesmo que preza pela dignidade da pessoa humana, que

é um dos princípios basilares de nossa atual constituição, saúde e bem estar do

indivíduo.

No primeiro capítulo analisa a história do aborto eugênico. Onde primeiros

indícios de métodos abortivos são do século XXVIII a.c descobertas na China. Mas o

primeiro documento jurídico que se tem notícia é o Código de Hamurabi (1686-1728

a.C.) onde havia pena pecuniária ao provocador do aborto, levando-se em

10

consideração a qualidade da gestante. A acidentalidade ou a voluntariedade do ato,

e nos casos de aborto provocado, o pai da gestante receberia reparação civil.

Já no segundo capítulo procura-se demonstrar alguns princípios

fundamentais, como o principio da Dignidade da Pessoa Humana, Princípio da

Legalidade, e o Principio da Autonomia da Vontade, que fundamentam de forma

clara o direito de escolha da mãe em abortar o feto ou não. Baseando-se no fato de

que o aborto eugênico, não é um fato típico de uma mulher que teve uma gravidez

indesejada e por isso precisa se ver livre desta o mais rápido possível, e sim uma

gravidez de vários riscos, biologicamente comprovada, e que ao final acarretará para

seus genitores uma tristeza imensurável.

No terceiro observam-se as diversas espécies de abortos previstos na

legislação pátria, e uma análise simples de cada tipo de aborto tipificado na lei.

No quarto capítulo fala sobre o aborto eugenésico, tema principal desta

monografia, seus conceitos jurídicos e algumas de suas características.

Já o sexto capítulo mostra a dificuldade encontrada pela mãe em conseguir

autorização judicial para a prática de tal procedimento cirúrgico, pelo fato de não se

ter atualmente nenhuma lei específica para o caso em tese, e a constitucionalidade

de tal ato questionada por vários estudiosos do direito, que chega até o Supremo

Tribunal Federal, sendo analisada e defendida por alguns de seus ministros. No

sétimo capítulo a análise da jurisprudência sobre o tema principal, qual seja, aborto

eugenésico.

11

2 HISTÓRIA DO ABORTO EUGENÉSICO E SUA EVOLUÇÃO

Segundo Matielo, (1994, p.12 e13) os primeiros indícios de métodos

abortivos são do século XXVIII a.c. descobertos na China. Mas o primeiro

documento jurídico que se tem notícia é o Código de Hamurabi (1728 – 1686 a.C.),

havia a imposição de pena pecuniária ao provocador do aborto, levando-se em

consideração a qualidade da gestante. A acidentalidade ou a voluntariedade do ato,

e nos casos de aborto provocado, o pai da gestante receberia a reparação civil.

Ainda sobre a questão do aborto no Código de Hamurabi, ele traz algumas

punições: (1994, p. 98).

Se alguém bate em uma mulher nascida livre, de maneira que ela perde o seu feto, deverá pagar seis ciclos de prata pelo feto. Se ela morrer, a ele deverá ser morta a filha. Se uma mulher não livre, em conseqüência de agressões, perder o feto, aquele que a agrediu deverá pagar cinco ciclos de prata. Se a mulher morreu deverá pagar meia mina. Se aquele bate em uma escrava e esta perde o próprio feto, pagará dois ciclos de prata. Se a escrava morre, deverá pagar um terço de mina. Apesar de no Egito antigo não constar previsões para o aborto, na Índia, a Lei de Manu, previa punições, que em certos casos, poderia, o provocador do aborto ser submetido desde castigos corporais até a morte, sendo em partes parecidas com as punições do Código do Hamurabi.

Nos séculos XIV a XVII a.C., os assírios puniam também o aborto

ocasionado por terceiros com diversos tipos de penas, desde golpes até a

decapitação, dependendo da gravidade do resultado, como também puniam o auto-

aborto. O Código Hitita, presente nos séculos XIX a XXII a.C. também previa

aplicação de multa semelhante ao Código de Hamurabi, onde era levado em conta,

a condição social da gestante. Tais como os documentos jurídicos já citados, a Bíblia

também se preocupava com a punição do aborto, como pode citar um trecho do

Livro Êxodo, capítulo V, versículo 21:22 :

Se homens brigarem, e acontecer que venha a ferir uma mulher grávida, e esta, der à luz sem nenhum dano, eles serão passíveis de uma indenização imposta pelo marido da mulher, e que pagarão diante dos juízes “Mas se houver outros danos, urge dar vida por vida, “olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, “queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe”.

12

Para o direito romano antigo, o aborto não tinha existência autônoma como

crime, a Lei das XII Tábuas e as leis republicanas não tratavam da matéria. A

conduta era considerada crime contra a mulher, portanto o ser humano em vida

ultra-uterina era tido como uma porção do corpo da mulher ou parte de suas

vísceras, geralmente ficava-se a salvo de punição quando não implicasse óbito da

mulher ou mesmo agressão à sua saúde. Posteriormente, a questão do aborto,

começou a ter como foco, o feto. E em certas circunstâncias, e por determinada

época, os gregos, romanos, estóicos e cínicos chegaram a permitir a prática do

aborto.

Na Grécia, era corrente a provocação do aborto. “Malthus” era o primeiro

que aconselhava o aborto (desde que o feto ainda não tivesse adquirido alma) para

manter o equilíbrio entre a população e os meios de subsistência, e também

preconizava o aborto em relação a toda mulher que concedesse depois de quarenta

anos. E o uso do aborto difunde-se por todas as camadas sociais. Importa-se

ressaltar que neste dado momento histórico havia, além da preocupação com “alma”

do feto, como era na visão de Aristóteles, que se dava grande importância para a

figura do pai, e menosprezando os interesses da mãe, em relação à questão do

aborto.

Tal era a importância dada ao pai, que fases remotas da história de Roma, a

punição em relação ao aborto assumiu caráter privado, já que o pater familiae (que

era a figura do pai, o chefe da família), tinha todo o poder de decidir sobre a vida dos

filhos, inclusive de decidir se nasceriam ou não, estando á mulher submissa as

decisões do marido, do qual, se esta contrariasse, fazendo o que não foi permitido

pelo marido, poderia ele puni-la de forma severa. Na época da República Romana,

as mulheres se preocupavam muito com sua estética, crescendo o número de

abortos, levando os legisladores a taxarem a prática do aborto como crime, e assim

foi instituída a Lei Cornélia, que instituiu a pena de morte para a mulher que

abortasse ou consentisse que fosse feito, sendo a mesma pena aplicada àqueles

que provocassem o aborto.

Na idade média, condenava-se à morte os réus de aborto, também

condenavam a pena de morte, pela espada a quem fizesse uma mulher abortar, e

por afogamento a mulher que provocasse o auto-aborto. Verifica-se assim que o

aborto neste momento histórico era punido com excessivo rigor, sendo

posteriormente denunciado pelos filósofos do século XVIII, que buscavam a abolição

13

da pena de morte. E para o crime de aborto, a pena de morte foi sendo abolida aos

poucos, até o momento de ser a pessoa punida somente com a prisão. Mas foi com

o cristianismo que se alterou a forma de ver o aborto, isto se deu em virtude de que

o cristianismo tinha que o homem era a imagem e semelhança de Deus, e assim

somente Deus teria o poder de dar e tirar a vida dos homens. Foi o Cristianismo que

alterou profundamente a visão que se tinha a respeito do aborto, surgindo o

entendimento segundo o qual o aborto significa a morte de um ser humano,

virtualmente um homicídio.

Em 1588, o Papa Sisto V estipulou que as mesmas penas canônicas e

seculares deveriam ser aplicadas ao aborto e ao homicídio, seja qualquer a idade do

feto. Mas se retomou a questão do feto animado, quando em 1951, o Papa Gregório

XIX, na Constituição Apostólica, restringiu as penas eclesiásticas ao feto animado.

Sendo somente em 1869 que foi abolida novamente a distinção de feto animado e

inanimado, tendo-se as mesmas penas para os dois casos, com a Constituição

Apostólica Sedes de Pio IX. A Igreja Católica tem firmado posição contrária à prática

legal do aborto. Na contemporaneidade pode citar os Papas João Paulo I e João

Paulo II, que através de documentos, mantiveram posição contrária da Igreja ao

aborto, inclusive em casos de estupro e aborto terapêutico (2003, p. 86).

Portanto, na atualidade, praticamente foi banida a distinção entre feto

animado e de inanimado, havendo ainda alguns doutrinadores que afirmam que não

deve haver punição para o aborto praticado até o terceiro mês de gestação, como no

caso dos Estados Unidos, que em 1973, a Suprema Corte considerou legal o aborto

até o terceiro mês de gravidez. Os acontecimentos históricos do início do século XX

cooperaram para grandes modificações nas legislações. O aborto começou a ser

legalizado a partir de 1973, na Dinamarca, e depois sendo também legalizado em

quase todos os países da Europa, com exceção da Irlanda, Malta e Bélgica. A

liberação do aborto vem se expandindo cada vez mais, aumentando o número de

países que autorizam a provocação do aborto com liberalidade, em diversas

circunstâncias, como um direito a ser exigido pela gestante e ao seu critério.

No Brasil Colônia, durante a vigência das Ordenações (afonsinas,

manuelinas ou filipinas) e em suas leis extravagantes, não mencionavam o aborto,

mas durante o Reino este era punido. No Império, o Código Penal de 1820,

enquadrava o aborto no capítulo contra a segurança das pessoas e da vida, mas

não era punido, quando praticado pela própria gestante. O artigo 199 do Código

14

Criminal do Império definia como crime, “ocasionar aborto por qualquer meio

empregado, interior ou exteriormente, com consentimento da mulher pejada”. E tinha

como pena a prisão com trabalho durante cinco anos, quando tentativa ou

cumplicidade no aborto.

O Código Criminal Imperial ainda previa o crime, quando do fornecimento de

drogas ou qualquer meios para provocar o aborto, mesmo quando este não

acontecia (artigo. 200), sendo aplicado a este a mesma pena de prisão com trabalho

por dois a seis anos. A mesma norma, ainda previa a duplicação da pena, quando o

crime fosse praticado “por médico, cirurgião ou ainda praticante de tais artes”,

considerado como crime muito grave, com pena superior ao da provocação do

aborto com o consentimento da gestante. Importa-se comentar, o Código Penal do

Império era falho, no sentido de que não previa punição em caso de morte da

gestante, bem como, ao não prever o aborto necessário.

Em 1890, com o Código da República, o crime de aborto era punido

severamente, inclusive quando auto provocado. Mas o Código apresentava

diferentes punições de acordo com o fato da expulsão ou não do produto da

concepção. Como no Código Imperial, o da República também não previa a

cominação de pena quando o crime resultasse na morte da gestante, sendo

somente aplicada uma única pena a todas as conseqüências do aborto consciente.

No entanto, a norma previa a situação de aborto, quando a gestante o fazia com a

intenção de ocultar sua desonra, quando no caso de sedução e estupro, sendo

assim a pena atenuada. Como também estabelecia cominação de pena, quando o

médico ou parteira, na realização do aborto legal ou necessário, viesse à gestante a

falecer por imperícia ou negligência. Na Consolidação das Leis Penais de Vicente

Piragibe, sancionada pelo Decreto n. 22.218 de 1932, foi confirmadas as

disposições do Código Penal de 1890, mantendo o sistema da legislação anterior

em suas linhas fundamentais. Após foi elaborado o Código Penal de 1940,

sancionado pelo Decreto-Lei n. 2.848 de 7 de dezembro de 1940, que está em uso

até os dias atuais. O Código prevê o crime de aborto em sua parte especial, sob o

Título I, dos Crimes contra a Pessoa, no capítulo I, Dos Crimes contra a Vida, em

seus artigos 124 a 128. Portanto, a liberação do aborto vem se expandido cada vez

mais, aumentando o número de países que autorizam a provocação do aborto com

liberalidade, em diversas circunstâncias, em especial de fetos anencefálicos, como

um direito a ser exigido pela gestante e a seu critério.

15

3 PRINCÍPIOS

Os princípios são os basilares do direito, é a causa primária, o momento, o

local ou trecho em que algo, uma ação ou um conhecimento, tem origem. Princípio é

mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição

fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e

servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por

definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e

lhe dá sentido harmônico.

3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

A prerrogativa de todo ser humano em ser respeitado como pessoa, de não

ser prejudicado em sua existência (a vida, o corpo e a saúde) e de fruir de um

âmbito existencial próprio é a existência do individualismo, transpersonalíssimo, e

personalismo. Este princípio protege o indivíduo de possíveis intervenções do

Estado, como esfera de autonomia em sua vida, direito de defesa. É a distinção

entre pessoa e indivíduo, fazendo com que valores coletivos não exalte-se sobre os

valores individuais, sacrificando e ferindo valores básicos inerentes a moral,

espiritual, físico da pessoa, no qual são elencados no rol dos direitos fundamentais

da Constituição Brasileira de 1988, os quais citaremos: a soberania, a cidadania, a

dignidades da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o

pluralismo político. Este princípio constitucional mais amplo do direito de família,

garantindo o desenvolvimento pleno de todos os seus membros e interesses

afetivos. O reconhecimento da dignidade se faz inerente a todos os membros da

família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis, é o fundamento da liberdade,

da justiça, da paz e do desenvolvimento social. De acordo com a Constituição

Federal de 1988 em seu:

Art. 1.º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I- Soberania;

16

II- Cidadania; III- Dignidade da pessoa humana; IV- Os valores sociais do Trabalho e da livre iniciativa; V- O pluralismo político;

E Borges (1985, p.119) afirma que:

A violação de um princípio constitucional importa em ruptura da própria Constituição, representando por isso mesmo uma inconstitucionalidade de Conseqüências muito mais grave do que a violação de uma simples norma, mesmo constitucional.

O mesmo autor esclarece que, comprovada a impossibilidade do feto

sobreviver fora do útero, não justificaria a penalização do aborto eugênico, vez que o

direito penal não estaria a serviço da finalidade constitucional de proteção a vida, e

sim ferindo um de seus preceitos e direitos fundamentais da mulher de escolher

levar ou não a gravidez à diante, que é igualmente protegido pela constituição. A

penalização nesse caso seria de flagrante inconstitucionalidade.

3.2 Princípio da Legalidade

Este princípio demonstra a idéia do Estado democrático de direito, onde

existem direitos e deveres, regras a serem cumpridas tanto pelo Estado como pelo

indivíduo, para que não haja abuso de poder por parte do ente maior. É o

sustentáculo do Estado, dispondo que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de

fazer alguma coisa se não em virtude de lei, de modo a impedir que toda e qualquer

divergência, os conflitos, as lides não se resolvam pelo primado da força, e sim pelo

império da lei, que nada mais é que, uma forma normativa de Caráter geral e

abstrato, normalmente expedida pelo órgão de representação popular o Legislativo,

ou pelo poder Executivo. Majora-se a autonomia da vontade individual, tudo aquilo

que não está proibido por lei é juridicamente permitido. “Artigo.1º. Não há crime sem

lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. (Artigo.1º do

Código Penal)”.

Este princípio vem para garantir direitos reconhecidos pela nossa carta

Magna, como direitos fundamentais do homem, aos quais exercem função muito

17

importante na sociedade que é a de garantir a liberdade do indivíduo, pois a partir do

momento em que se pune alguém pela prática de algum crime definido por lei, a

coletividade passa a ficar protegida de possíveis arbitrariedades por parte do

Estado. O princípio defende que ninguém pode violar um bem tão grande como a

liberdade, nem privá-lo de exercer suas funções seja como profissional ou como ser

humano, se não por uma norma específica que a condene. Somente serão punidos

aqueles indivíduos que praticarem condutas indesejáveis definidas em lei, sendo

que se não há crime não há punição. Somente haverá crime quando existir o nexo

causal que é a correspondência entre a conduta praticada e a previsão legal.

Segundo a teoria de Binding:

As normas penais incriminadoras não são proibitivas, mas descritivas; sendo assim quem pratica um crime não age contra a lei, mas de acordo com esta, pois os delitos encontram-se pormenorizadamente descritos em modelos legais, chamados de tipos. ( Capez, 2007, p.40).

Enfim este princípio tão importante surgiu para que os direitos das pessoas

sejam respeitados e para que não ocorra injustiças ou irregularidades na

caracterização de um crime, fazendo com que o Estado seja obrigado a respeitar as

normas e agir na forma da lei.

3.3 Princípio da Autonomia da Vontade

Identificado como respeito á pessoa, deve-se resguardar os valores

individuais, tanto moral, crenças, e religião, o direito do livre arbítrio e diversidade de

pensamentos. É a faculdade de resolver sobre sua própria vida, na qual as partes

têm o direito de liberdade, segundo são livres para pactuarem da forma que

quiserem, desde que respeitados os limites da lei. Este princípio está relacionado

com o princípio da “pacta sunt servanda” de modo que as partes são livres para

contratarem ou firmarem negócio com quem quer que seja, daí a obrigação de ser

cumprido, mesmo que contra a vontade. Princípios como este tornam as partes

livres e autorizadas,quando se tratar de direitos disponíveis podem convencionar

livremente, o que lhe aprouver acerca de seus direito e deveres, de forma que o que

18

for combinado, deverá ser cumprido e poderá ser exigido judicialmente. No caso

desse trabalho sobre o “Aborto Eugenésico” a autonomia da vontade é muito

importante, pois deve prevalecer a vontade da mãe de querer levar a gravidez

adiante ou não.

19

4 ESPÉCIES DE ABORTO PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO PÁTRIA

Podemos destacar como visto acima sobre o aborto, que consiste na

interrupção da gravidez havendo ou não a interrupção do feto do ventre materno.

Podemos analisar esse tipo de situação desde nossos antepassados e em diversos

povos e etnias diferentes pelos precedentes históricos sendo que essa prática

conhecida como aborto nem sempre foi proibida, sendo muito comum a sua

realização entre os povos hebreus e gregos. Já em Roma a Lei das XII Tábuas e as

leis da República não cuidavam do aborto, pois consideravam o produto da

concepção como parte do corpo da gestante e não como ser autônomo, de modo

que a mulher que abortava nada mais fazia que dispor do próprio corpo. E alguns

doutrinadores acreditam ser objeto jurídico do aborto tutelado pelo Ordenamento

Jurídico como sendo o direito à vida do feto. Existem algumas formas de aborto que

estão previstas expressamente na lei.

4.1 Aborto

Considera-se aborto como a interrupção da gravidez, com a destruição do

produto da concepção. Esse assunto vem sendo muito discutido ao longo dos anos,

é um tema polêmico e muito complexo que envolve muitos aspectos como: ética,

moral, religião, a medicina, o direito, os costumes, a filosofia, e a sociologia.

O nosso código Penal não tem uma definição clara e precisa sobre o aborto,

utiliza-se somente a expressão “provocar aborto” sendo a doutrina e a jurisprudência

o esclarecimento de tal expressão.

4.2 Conceitos Jurídicos

Na visão jurídica de DINIZ (2001, p. 93):

20

O termo “aborto” é originário do latim abortus, advindo de aboriri (morrer, perecer), e vem sendo empregado para designar a interrupção da gravidez antes de seu termo normal, seja ela espontânea ou provocada, tenha havido ou não a expulsão do feto destruído.

Já outros doutrinadores entendem que o aborto é a interrupção da gestação

com a conseqüente morte do produto da concepção, não sendo necessária sua

expulsão.

Mirabete (2002, p. 31) entende que:

Aborto é a interrupção da gravidez com a destruição do produto da concepção. É a morte do ovo (até três meses de gestação), embrião (de três semanas a três meses) ou feto (após três meses), não implicando necessariamente sua expulsão.

O nosso Código Penal Brasileiro aponta algumas modalidades de aborto

como:

4.3 Auto-aborto e aborto consentido

Previsto no Artigo. 124, caput, Primeira Parte, do Código Penal é aquele

praticado pela própria gestante, ou seja, é a própria mulher quem executa o crime,

ela própria emprega os meios e manobras necessários para a prática do aborto em

si mesma.

Capez (2003, p. 114) fala que é possível nessa modalidade delitiva, na

hipótese que um terceiro apenas induz, instiga ou auxilia, de maneira secundária a

gestante provocar o aborto em si mesma, por exemplo, um indivíduo que fornece os

meios abortivos para que o aborto seja realizado. Nessa situação ele responde pelo

delito do Artigo.124 do Código Penal a título de partícipe.

No aborto consentido a mulher apenas consente, aceita a prática abortiva,

mas a execução material do crime é realizada por terceira pessoa.

Segundo esse mesmo autor, pode haver concurso de pessoas na

modalidade de participação, quando, por exemplo, alguém induz a gestante a

consentir que terceiro lhe provoque o aborto.

Capez (2004, p. 115) define o aborto consentido quando:

21

[...] a mulher apenas consente na prática abortiva, mas a execução material do crime é realizada por terceira pessoa. Pode haver o concurso de pessoas na modalidade de participação, quando por exemplo, alguém induza gestante a consentir que terceiro lhe provoque o aborto. Nesta hipótese a doutrina entende que jamais poderá haver a co-autoria, uma vez que, por se tratar de crime de mão própria, o ato permissivo é personalíssimo e só cabe a gestante.

4.4 Aborto provocado por terceiro

4.4.1 Sem o consentimento da gestante

O aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante, também

chamado de aborto sofrido, está previsto no Artigo.125 do Código Penal, é uma

forma mais gravosa do delito de aborto. A falta de consentimento da gestante pode

ser interpretada como uma qualificadora do crime, pois ela atende a dois objetos

jurídicos, a vida do feto e a integridade física da gestante.

4.4.2. Com o consentimento da gestante

O aborto com o consentimento da gestante está previsto na no Artigo.126,

caput do Código Penal, o fato gera a incidência de duas figuras típicas, uma para a

consciente a genitora e outra para um terceiro provocador.

Segundo Capez, (2003, p. 130), é possível o concurso de pessoas na

hipótese em que há o auxílio à conduta do terceiro que provoca o aborto. Exemplo a

enfermeira que auxilia o médico em uma clínica de aborto.

Diferente do ato de consentir à realização do aborto, neste caso o ato

previsto é o de realizar as manobras abortivas em consonância com a vontade da

gestante.

O consentimento, segundo Diniz (2002, p. 42), deve ser inequívoco e

perdurar por todo o ato do abortamento, caso a gestante desista de concluí-lo e,

22

mesmo assim, o terceiro executor o leva a cabo responderá pelo delito de aborto.

4.5 Aborto legal

O Código Penal contempla duas formas de exclusão de ilicitude no crime de

aborto, desde que praticado por médico, para salvar a vida da gestante, conforme o

inciso I, do artigo 128, e na gravidez resultante de estupro, de acordo com o inciso II.

Capez (2003, p. 117) “fala que a primeira vista tem-se a impressão de que o

citado dispositivo legal constituiria uma dirimente ou escusa absolutória, pois o texto

legal se inicia com a frase “não se pune”.

Tal, porém, não é a sua natureza jurídica, porque à primeira vista tem-se a

impressão de que o citado dispositivo legal constituiria uma dirimente ou escusa

absolutória, pois o texto legal se inicia com a frase “não se pune”.

4.6 Aborto necessário

O Aborto necessário ou terapêutico, está previsto no Artigo. 128 do Código

Penal, sendo penalmente irrelevante, pois tem por objetivo salvar a vida da mãe.

Segundo Capez (2003, p. 134) “É a interrupção da gravidez realizada pelo

médico quando a gestante estiver correndo perigo de vida e inexistir outro meio para

salvá-la”.

Nesse tipo de aborto há dois bens jurídicos em perigo, a vida da genitora e

do feto, de modo que a preservação de um depende da destruição de outro. No

aborto necessário o legislador opta pelo bem maior que no caso é a vida da mãe,

diante de uma situação dessa a vida do feto fica em segundo plano, vez que ainda

não foi totalmente formado. Não seria sensato sacrificar a mãe ou os dois, sendo

que o feto não teve vida extra-uterina. O legislador tratou logo de cuidar e criar um

dispositivo específico para essa espécie de estado de necessidade, sem exigir o

requisito de atualidade do perigo e sim a simples constatação de algum tipo de

problema que coloque a vida da genitora em risco, como por exemplo: diabetes

23

leucemia, tuberculose, anemia profunda, câncer uterino. Tudo deve ser constatado

clinicamente por especialistas de que não exista outra maneira de salvar a mãe, é

indispensável à concordância da gestante ou de seu representante legal, podendo

em casos especiais o médico agir ou intervir a revelia desses, pois há casos muitas

vezes em que a mulher se encontra desacordada ou sem nenhuma consciência do

que está acontecendo.

4.7 Aborto resultante de estupro

O Aborto resultante de estupro é também conhecido como aborto

sentimental, humanitário ou ético, previsto no Artigo. 125, inciso II, do Código Penal,

trata-se de um aborto realizado por médicos nos casos em que a gravidez decorreu

de um crime de estupro, ou seja, uma gravidez indesejada, fruto de uma violência.

O estado não pode obrigar uma mulher que foi vítima de tal violência a gerar

em seu ventre um feto que não foi planejado, fruto de um coito vagínico violento,

dados os danos maiores, em especial as conseqüências psicológicas, que isso pode

acarretar na mulher. Este Artigo. 128, inciso II, do Código Penal, não faz nenhuma

ou qualquer distinção entre o estupro com violência real ou presumida, de onde se

pode concluir que qualquer um dos casos é possível o aborto.

Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico: Aborto necessário I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; Aborto no caso de gravidez resultante de estupro; II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

4.8 Forma majorada

O Código Penal Brasileiro em seu Artigo. 127 prevê as formas majoradas do

crime de aborto, formas especiais de aumento de pena, elas recebem o nome de

24

“qualificadoras” para o crime de aborto, com ou sem o consentimento da gestante:

pela lesão corporal de natureza grave a pena é elevada em um terço, morte da

gestante a pena é duplicada.

Na realidade são causas especiais de aumento de pena, que funcionam

como majorantes na terceira fase de aplicação da pena, ao contrário de como

funcionam as qualificadoras, que fixam os limites mínimo e máximo da pena.

Somente serão aplicadas as formas tipificadas nos artigos 125 e 126 do Código

Penal, sendo excluídos o auto-aborto e o aborto consentido, Artigo. 214 do Código

Penal. Na medida em que o nosso ordenamento não pune a auto-lesão e nem o ato

de matar-se.

25

5 CONCEITO DE ABORTO EUGENÉSICO

Aborto Eugenésico: aborto eugênico ou eugenésico, é aquele praticado para

evitar o nascimento de criança portadora de anomalia física.

5.1 Conceitos jurídicos

Capez (2008, p. 124) expressa sua opinião sobre o aborto quando diz que o

considera como interrupção da gravidez, com a conseqüente destruição do produto da

concepção, a eliminação da vida intra-uterina.

No dizer de Mirabete (2001, p. 134): “o aborto eugênico é aquele executado

ante a suspeita de que o filho virá ao mundo com anomalias graves, por herança dos

pais”.

O autor esclarece a existência de pontos controversos sobre o conceito de

aborto, pois o mencionado autor explica que a expulsão do feto não é

necessariamente a expulsão do feto, vês que o embrião poderá sofrer um processo

conhecido como autólise, sendo dissolvido ou absolvido pelo organismo, ou pode

também passar por um processo chamado de mumificação ou maceração,

permanecendo dessa forma, dentro do útero materno.

Alguns autores utilizam-se da expressão abortamento como sendo o ato, e o

aborto o produto deste mesmo crime.

Segundo Jesus (2007, p. 142) abortamento é um significado técnico,

enquanto que aborto é a conduta.

Segundo alguns autores juristas o aborto eugenésico, é um tipo diferente e

especial onde o feto anencefálico é portador de uma patologia congênita, que afeta

a configuração encefálica dos ossos do crânio que rodeiam a cabeça. A

conseqüência deste problema é um desenvolvimento mínimo do encéfalo, o qual

com freqüência apresenta uma ausência total do cérebro, região do anencefálico

responsável pelo pensamento, vista, ouvido, o tato e outros movimentos. A parte

posterior do crânio aparece sem fechar e é possível, que faltem ossos nas regiões

laterais e anterior da cabeça. Este tipo de intervenção é feito para impedir que a

26

criança nasça com deformidade ou enfermidade incurável.

Segundo a definição médica, “o aborto é a expulsão ou a extração do

concepto pesando menos de 500g, aproximadamente de 20 a 22 semanas

completas”.

Objetos jurídicos são interesses e valores permanentes, inerentes ao ser

humano, com a vida ou a liberdade variando de acordo com a sociedade e com seu

momento da história. O objeto jurídico do crime em definição doutrinária é a vida, de

onde se dá o surgimento de toda uma discussão que vem caminhando ao longo dos

anos.

Para Bitencourt (2007, p. 86), deve-se afastar, de plano, aquela concepção

antiga que lhe concedeu o nacional-socialismo alemão:

Não se pode mais falar em aborto eugênico com a finalidade de obter-se uma raça de “super-homens” e tampouco para a conservação da “pureza” de uma raça superior. Esse período, o mais negro de todos os tempos da civilização humana, está morto e enterrado, e somente deve ser lembrada para impedir o seu ressurgimento, qualquer circunstância.

Partindo desse pressuposto, o aborto eugênico tem por escopo, interromper

a gravidez quando diagnosticado a existência de alguma anomalia congênita ou

fetal, que impedirá a existência extra-uterina da criança.

27

6 AUSÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA E O RISCO DE VIDA DA GESTANTE

Existem vários doutrinadores que falam que o objeto jurídico do aborto é o

direito à vida do feto, à preservação da vida humana intra-uterina, o direito à vida do

produto da concepção e à incolumidade física e psíquica da própria gestante. Esse

assunto vem gerando muita polêmica em nossa sociedade e, principalmente, no

âmbito jurídico pelo fato do aborto ser proibido no Brasil, constituindo crime previsto

nos Artigos. 124 e 126 do Código Penal.

A legislação pátria admite o aborto em somente duas hipóteses, sendo na

gestação que apresente risco de vida para gestante ou resultante de estupro, não

estando presente o tipo de aborto de feto em razão de ele ser portador de alguma

anomalia incompatível com a vida, como é o caso da anencefalia. Pelo fato gerar

grandes discussões sobre o assunto pelo fato de que nos últimos anos muitas

gestantes têm conseguido a concessão de autorização judicial para prática do

aborto em casos específicos como esses. A primeira delas ocorreu em 1991 no Mato

Grosso do Sul, desde então surgiram muitas outras emitidas não só pelo Poder

Judiciário através de seus magistrados, mas sim pelo Ministério Público, somente

para anomalia fetal incompatível com a vida. Muitos desses abortos são concedidos

e realizados em clínicas privadas, independente de autorização do poder público e

restrito ao Direito Penal Brasileiro. Existe também o Sistema Único de Saúde (SUS)

onde as gestantes de baixa renda podem realizar esse tipo de intervenção que é

proporcionado pelo Estado, que dependem de uma autorização judicial para que o

procedimento seja feito pelo médico, fato esse gerador da discussão, pois o

profissional da saúde respeitando tanto a lei Penal quanto o Código de Ética da

Medicina, não o faz por medo de serem acusados de prática de crime de realização

de aborto, podendo ser submetidos à conseqüências legais muito sérias, até mesmo

no âmbito penal.

Esse procedimento judicial é muito demorado, tendo muitas vezes a

gestante passado pelo parto e o pedido não ter sido concedido, tal situação explica o

motivo de hoje os profissionais da saúde aceitarem a autorização concedida pelo

Ministério Público, que muitas vezes não são definitivas, gerando também uma certa

insegurança e medo de serem posteriormente reprimidos pelo fato. Em 17 de Junho

28

de 2004, estudiosos do tema e profissionais da saúde, por intermédio da

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), aliado ao Instituto de

Bioética, Direitos Humanos e Gêneros-Anis, propôs uma argüição de

Descumprimento de Preceito Fundamental ( ADPF).

Na petição inicial, na análise do “fumus boni iuris”, apontaram-se os

dispositivos que prevêem o crime de aborto com o consentimento da gestante e

suas excludentes de ilicitude como violadores dos seguintes preceitos fundamentais

da Constituição da República Federativa do Brasil: dignidade da pessoa humana;

princípio da legalidade; liberdade e autonomia da vontade; e o direito à saúde.

O ministro Gilmar Mendes também votou pelo cabimento da Argüição de

Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 54) e ponderou o seguinte (2009,

p. 220):

O tribunal poderá conhecer da argüição de descumprimento toda vez que o princípio da segurança jurídica restar seriamente ameaçado, especialmente em razão de conflitos de interpretação ou de incongruências hermenêuticas causadas pelo modelo pluralista de jurisdição constitucional [...] Não há, portanto como negar a possibilidade via ADPF, aferir-se a legitimidade ou não da interrupção da gravidez em semelhantes casos.

O ministro Marco Aurélio de Mello concedeu decisão liminar em 1º de julho

de 2004, reconhecendo o direito constitucional de as gestantes se submeterem à

operação terapêutica do parto no caso de fetos anencefálicos, bem como

determinando a paralisação de processos que discutem a mesma matéria. O mesmo

manifestou e expôs sua decisão (2009, p. 230):

Definitivamente, não tive como aquiescer à ignomínia de, à luz da letra fria – e quiçá morta – da lei, condenar-se a gestante a suportar meses a fio de desespero a liberdade e a autonomia da vontade, direitos básicos, imprescindíveis, consagrados em toda sociedade que se afirme democrática. [...]. Penso que, no cerne da questão, está à dimensão humana que obstaculiza a possibilidade de se coisificar uma pessoa, usando-a como objeto. São muitos e de crucial importância os valores em jogo. A um só tempo, cuida-se do direito a saúde, do direito da vontade, em seu sentido maior, do direito a preservação da autonomia da vontade, da legalidade e, acima de tudo, da dignidade da pessoa humana.

29

O então procurador da República, manifestou-se na ADPF, em 18 de agosto

de 2004, argumentando que as normas que criminalizam o aborto não ensejam

interpretações discrepantes, pois, as situações que excluem sua antijuridicidade

estariam expressamente previstas no Código Penal: o aborto terapêutico e o aborto

sentimental.

A anencefalia é uma anomalia irreversível, sendo impossível o feto viver

mesmo sem a antecipação terapêutica. Consiste em um distúrbio de fechamento do

tubo neural, diagnosticável nas primeiras semanas de gestação, ocorrendo por

diversas razões, deixando cérebro exposto. O líquido amniótico gradativamente

dissolve a massa encefálica, impedindo o desenvolvimento dos hemisférios

cerebrais, a imagem ecográfica de um feto com este tipo de anomalia assemelha-se

figurativamente a de um sapo ou de uma coruja pelo profundo achatamento da

cabeça devido á ausência dos ossos do crânio e da massa encefálica.

O Brasil é o quarto país do mundo em número de partos de fetos com

anencefalia, isso significa que o nosso país possui uma das legislações mais

restritivas, obrigando as mulheres a se manterem grávidas a despeito do diagnóstico

da inviabilidade fetal, em contra partida acarretando devido a esse fato índices mais

altos de depressão nessas mulheres, que não tem seus direitos de escolha

respeitados pelo Estado.

Estudos médicos comprovam que a permanência do feto no útero da mãe

pode acarretar grandes riscos a sua saúde, em virtude do risco de ocorrência de

toxemia gravídica, devido a esses problemas o aborto seria a medida mais

aconselhável e sensata que poderia ocorrer. O crime de aborto é conceituado como

interrupção da gravidez, desta forma no caso em estudo a morte do feto não é efeito

da interrupção voluntária de gravidez, mas devido sua anomalia. Portanto, não há

que se falar em nexo de causalidade entre a prática da interrupção e a morte do

feto, pois a cessação de seus sinais vitais ocorre em função da patologia

antecedente e não da intervenção médica.

A vedação por meio legal, obrigando a gestante a trazer consigo durante

nove meses um feto inviável, revela grave violência aos seus direitos de

personalidade, sendo que seu corpo poderá sofrer as conseqüências, sua psique

está afetada e comprometida pela lembrança diuturnamente da frustração e do luto

decorrentes da condição de seu feto. Assim, esse tipo de situação se assemelha

muito á tortura psicológica (Brasil, Supremo Tribunal Federal, 2008), um suplício

30

infligido a uma pessoa, que ocasionou grave quadro mental de angustia e profunda

tristeza.

Segundo a nossa carta Magna, a saúde é um dos direitos fundamentais do

sistema brasileiro, sua proteção não pode de forma alguma ser negligenciada por

um Estado que se diz democrático de direito, a gestante desse tipo de feto encontra-

se em um quadro de saúde restritamente debilitado. A saúde engloba vários

aspectos físicos, psíquicos da pessoa humana, devendo todos eles ser respeitados.

O aborto eugênico não pode ser visto simplesmente pelos olhares da religião

e de preceitos cristãos ou de qualquer outra, pois o tema discutido neste trabalho é a

vida da mãe desse feto e não preceitos bíblicos, até porque cada religião tem sua

peculiaridade e suas crenças. Com respeito ao nosso Estado maior que se

considera laico, o fato gerador maior não é a religião e nem preceitos ditos morais e

sim a saúde, a vida de uma mulher que vai passar meses da sua vida a espera de

um bebê que nem se quer terá perspectiva de vida após o parto.

Não se pode, fechar os olhos e se ater somente na palavra aborto, e

defender a todo e qualquer tipo de aborto, pois isso seria uma forma de banalização

da vida humana, e seria totalmente fora aos costumes e princípios básicos do ser

humano. Estamos tratando, nesta pesquisa, restritamente ao aborto de feto

anencefálico que morrerá fatalmente após o parto. A bioética laica tem como

pressuposto a preocupação com a realidade das pessoas, como afirma Engelhardt

(2003, p. 156): “A vida biológica humana só tem valor se contribui para a vida das

pessoas”.

Para que a vida do feto tão falada por aqueles que são contra ao aborto

eugênico seja objeto de tutela do Direito Penal é preciso que o feto tenha vida extra-

uterina e presumindo sua continuidade, importando a real possibilidade de vir a ser

viável. Portanto, se essa antecipação terapêutica do parto não é proibida por lei, a

gestante não se encaixaria em nenhum dos artigos vigentes no código Penal e muito

menos seria crime, podendo ela livremente optar por esse procedimento, qualquer

decisão do Estado-Juiz que inviabilize sua realização estaria violando os seus

parâmetros normativos vigentes.

A consumação do crime de aborto é quando a conduta típica começa a ser

realizada, ou seja, iniciados atos de execução, e o fato se torna verdadeiro e

penalmente relevante, verificando o fato típico e o nexo causal entre conduta e

agente. Ou seja, em nosso ordenamento jurídico existem várias condutas tipificadas

31

como crime, as quais ensejam penas tanto privativas de liberdade como restritivas

de direitos, cominadas com multas ou não. O aborto ainda é um assunto muito

discutido nos tempos atuais, pela complexidade de sua matéria, porque se trata de

vida humana, sendo ela uma prioridade em nossa Constituição e considerada como

nosso bem maior.

Esse tema é fruto de muitas discussões tanto no campo religioso, quanto no

meio jurídico, onde existem aqueles que defendem o aborto de qualquer espécie e

aqueles que defendem o aborto eugenésico, um tipo específico de aborto, onde o

feto não apresenta nenhuma perspectiva de vida após o parto.

A confusão entre anencefalia e deficiência pode ser analisada como a

expressão de dois mal-entendidos e coisas totalmente diferentes, confunde-se uma

com outra intencionalmente a fim de aproximar o debate do aborto eugênico com

qualquer outro tipo de aborto, principalmente a idéia de valores morais e cristãos,

por se tratar de uma vida. Está justamente nesse aspecto o ponto mais importante

do estudo, separar um feto com deficiência de um feto inviável, no qual implica a

inviabilidade da morte imediata.

O tema abordado nessa pesquisa, não se encontra tipificado em nosso

Código Penal atual e em nenhuma lei específica, fazendo desta forma a genitora do

feto ter que ajuizar uma ação judicial, para que então o magistrado decida por sua

própria vida, para que o médico, através de uma autorização judicial expressa,

possa fazer o aborto.

A pesquisa não tem a intenção de defender a prática irresponsável de

qualquer tipo de aborto, e sim o aborto eugenésico que comprovado por médicos,

psiquiatras, psicólogos tragam conseqüências muito graves à mãe depois do parto.

Visto que, durante nove meses a mulher espera ansiosamente pelo bebê, que

conseqüentemente não terá chances de sobreviver, fato esse comprovado pela

nossa atual medicina em diversos estudos e laudos elaborados por juntas médicas,

onde o feto apresenta a ausência total do encéfalo, um feto desprovido de

hemisférios cerebrais que são a parte vital do cérebro, tendo o mesmo todos os seus

sentidos comprometidos, enfim sua vida fora do ventre materno será impossível.

A questão não é a defesa de fetos com simples deformidades ou

enfermidades incuráveis e sim a impossibilidade de vida após o nascimento, não há

que ser tutelada uma vida que não será possível somente pelo fato de nossa carta

Magna defender a vida. Mas o que seria essa vida? Uma vida de segundos, minutos

32

ou horas? Será que essa vida vale mais que a saúde de uma mãe que sofrerá

conseqüências muito maiores pelo fato de gerar uma criança que não sobreviverá?

Foi comentado anteriormente sobre os tipos legais de aborto no Brasil, onde a

mulher tem a autonomia de querer levar a gravidez adiante ou não, somente pelo

fato de ter sido fruto de um abuso sexual violento, sendo que esse feto nascerá com

vida, na maioria das vezes saúde perfeita, sem nenhuma restrição, daí a

discrepância da lei, que ao mesmo tempo em que defende a vida humana, aprova e

legaliza o aborto de fetos perfeitamente normais.

Não há como aceitar que o aborto eugenésico seja considerado um crime, e

que os médicos não tenham autorização para praticá-lo nessas genitoras, o que

impõe uma reflexão sobre nossa Constituição Federal, em especial ao princípio da

dignidade da pessoa humana.

É correto afirmar que para que haja esse tipo de intervenção médica será

necessário que a mãe apresente laudos ou diagnósticos médicos perfeitamente

possíveis pelo atual avanço da medicina, atestando a inviabilidade de vida após o

período normal de gestação. Tal aborto não pode ser considerado crime, devido à

ausência de tipicidade do crime de aborto, vez que a morte do feto e inevitável. No

aborto anencefálico não existe uma morte arbitrária, ao contrário, antecipa-se a

morte do feto, cuja à vida, aliás, está cientificamente inviabilizada, mas isso é para

tutela de outros interesses sumamente mais relevantes, como a saúde física e

psicológica da mãe, por isso o fato e atípico. No que toca sobre abortamento do feto anencéfalo ou anencefálico,

entende-se que não existe crime, ante a inexistência de bem jurídico, pois o encéfalo

é a parte do sistema nervoso central que abrange o cérebro, de modo que sua

ausência implica inexistência de atividade cerebral sem a qual não se pode falar em

vida. Ainda sobre o assunto é de suma importância falar sobre a Lei n.9.343, de 4-2-

1997, em seu artigo. 3º, permite a retirada “post mortem” de tecidos e órgão do

corpo humano depois de diagnosticada a morte encefálica, isso significa que sem a

atividade encefálica não há vida, razão pela qual não se pode falar em crime de

aborto, portanto fato atípico.

33

7 JURISPRUDÊNCIA

Númeração Única: 1503605-19.2010.8.13.0024

Relator: Des.(a) ALBERTO HENRIQUE

Relator do Acórdão: Des.(a) ALBERTO HENRIQUE

Data do Julgamento: 17/06/2010

Data da Publicação: 29/06/2010

Inteiro Teor:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ALVARÁ JUDICIAL. AUTORIZAÇÃO PARA

INTERRUPÇÃO DE GRAVIDEZ. FETO ANENCÉFALO. INVIABILIDADE DA VIDA

EXTRA UTERINA. MANUTENÇÃO DA GRAVIDEZ. DEMASIADO SOFRIMENTO

PSICOLÓGICO. AUTORIZAÇÃO CONCEDIDA. SENTENÇA

REFORMADA.Considerando que a gestação de um feto portador de anomalia

incompatível com a vida extra-uterina, a antecipação do parto é medida que se

impõe, já que a morte desse feto é inevitável, em decorrência da aludida patologia. A

sentença de morte proferida por ocasião da constatação da anencefalia já fulminou

todas as expectativas e planos daqueles que aguardavam o nascimento daquele

filho, de modo que não se mostra razoável e proporcional infligir à gestante o

martírio de levar às últimas conseqüências uma gravidez sem serventia, o que

somente lhe acarretará amargura e demasiado sofrimento psicológico, o que viola o

princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III, da

CF, do qual deflui, como consectários naturais, o respeito à integridade física e

psíquica das pessoas.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.10.150360-5/001 - COMARCA DE BELO

HORIZONTE - APELANTE(S): CLÁUDIA ALMEIDA RODRIGUES E OUTRO(A)(S) -

RELATOR: EXMO. SR. DES. ALBERTO HENRIQUE

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça

do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador FRANCISCO

KUPIDLOWSKI , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos

34

julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR

PROVIMENTO, COM DETERMINAÇÃO DE IMEDIATA EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ.

Belo Horizonte, 17 de junho de 2010.

DES. ALBERTO HENRIQUE - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Participou do julgamento o Procurador de Justiça Dr. Vítor Henrique.

O SR. DES. ALBERTO HENRIQUE:

VOTO

Tenho voto escrito, que coloco à disposição dos interessados e a questão,

para mim, é simples.

O Direito protege a vida. Um feto sem cérebro não tem vida após o

nascimento, logo não há o que proteger.

Cláudia Almeida Rodrigues e Roger Eustáquio Machado requereram a

expedição de alvará judicial para antecipação de parto de feto anencéfalo.

O juiz primeiro indeferiu o pedido, sob o fundamento de que não havia perigo

iminente de morte da mãe.

Inconformados, insurgem os requerentes.

Em suas razões, destacam que os laudos acostados aos autos demonstram

a anencefalia do feto, configurando uma má formação da calota craniana que

inviabiliza a sobrevida do recém nascido imediatamente após o parto, sendo certo

que não há cura ou tratamento e que podem ocorrer complicações para a saúde da

mãe.

Citam as complicações que podem ocorrer e salientam que haverá

necessidade de apoio psicoterápico no pós-parto e puerpério, já que a mãe

encontra-se emocionalmente abalada pela notícia de má formação fetal.

Esclarecem que a gestante já é hipertensa; que não há possibilidade de vida

extra-ulterina, em decorrência do atrofiamento da massa encefálica decorrente da

inexistência da caixa craniana.

Dizem que a decisão do magistrado a quo vai de encontro ao parecer

técnico proferido pelo técnico no Ministério Público, que afirmou a necessidade da

antecipação do parto.

Afirmam que não há possibilidade de vida para o feto, mas existe vida da

gestante, que está sendo prejudicada em sua saúde física e psicológica, sendo certo

35

que ela tem um filho de apenas quatro anos, que dela necessita.

Pugna pela antecipação da tutela recursal e, ao final, pelo provimento do

recurso.

A d. Procuradoria de Justiça exarou parecer de fls. 78/89, manifestando-se

pelo provimento do recurso.

Decisão concessiva da antecipação da tutela recursal.

É o relatório.

Constatada a presença dos pressupostos de admissibilidade, conheço do

recurso.

Buscam os apelantes autorização para a realização de interrupção de

gravidez, em decorrência da constatação da anencefalia do feto.

O pedido foi instruído com pareceres médicos todos recomendando a

antecipação do parto e exame de ultrassom, cujos laudos comprovam a anencefalia.

Em primeira instância, o parecer do Órgão de Execução do Ministério

Público foi acompanhado por parecer do técnico do Ministério Público, Dr. Alexandre

Resende Fraga, que corroborou os pareceres médicos juntados pelos apelantes.

O Douto Procurador de Justiça também se manifestou no sentido de ser

dado provimento ao recurso, diante da impossibilidade de vida extra-ulterina do feto.

Com efeito, inobstante os avanços da medicina, a anencefalia trata-se,

ainda, de patologia sem cura, de modo que um feto portador desta doença não

possui nenhuma expectativa de vida fora do útero materno. Trata-se de uma doença

caracterizada pela ausência de ossos do crânio e do encéfalo fetal na vida intra-

uterina.

De regra, o aborto é considerado crime tipificado no art. 128 do Código

Penal. Entretanto, o legislador ressalvou as hipóteses do aborto necessário ou

terapêutico, quando comprovado o risco de morte para a mãe e o aborto

sentimental, decorrentes de gestações resultantes de estupro.

A despeito da inexistência de norma que autorize o aborto eugenésico -

como no caso dos autos, a jurisprudência moderna vem admitindo a interrupção da

gravidez, quando constatada a má formação do feto, com o diagnóstico de

anencefalia.

Deve-se salientar que o Código Penal foi elaborado em 1940, período

durante o qual não se encontravam disponíveis os recursos tecnológicos da

36

medicina, aptos a detectar com precisão que o feto seria fatalmente degenerado.

Nessas circunstâncias, o caso posto a julgamento não pode ser apreciado

de acordo com esta ótica, já que o direito deve se adequar aos estágios evolutivos

da sociedade, por não se tratar de um direito estático, mas sim de uma ciência

evolutiva.

Ademais, não há falar em vida do feto, o que afastaria a tipificação da

conduta de interromper a gravidez, na medida em que o feto anencéfalo assemelha-

se à condição daquele indivíduo que já teve sua morte cerebral constatada, mas que

continua vivo em virtude de encontrar-se ligado a aparelhos.

Foi esta a comparação feita pelo Culto e Douto Ministro Carlos Aires Brito,

em voto proferido na ADPF nº. 54-MC/DF:

“... não é assim mesmo com o feto anencéfalo? Ele está aparentemente

vivo, na verdade ele está ligado e por isso se desenvolve. Ele está ligado a uma UTI,

chamada útero, mas a partir do momento em que se opera o desligamento do feto

desses aparelhos ou dessa UTI, que se chama útero, nada mais resta, não há vida".

Assim, considerando que a gestação de um feto portador de anomalia

incompatível com a vida extra-uterina, a antecipação do parto é medida que se

impõe, já que a morte desse feto é inevitável, em decorrência da aludida patologia.

Acerca do tema, preciosas as lições do processualista Guilherme de Souza

Nucci que pontua:

"Assim, baseando-se no fato de que algumas gestantes, descobrindo tal

fato, não se conformam com a gestação de um ser completamente inviável, abrevia-

se o sofrimento e autoriza-se o aborto. O juiz invoca, por vezes, a tese de

inexigibilidade de conduta diversa (causa supra legal de exclusão de culpabilidade),

por vezes a própria interpretação da norma penal que protege a "vida humana" e

não a falsa existência, pois o feto só está "vivo" por conta do organismo materno que

o sustenta. A tese da inexigibilidade, nesse caso, teria dois enfoques: o da gestante,

não suportando carregar no ventre uma criança de vida inviável; o do médico,

julgando salvar a genitora de forte abalo psicológico que vem sofrendo. A medicina,

por ter meios, atualmente, de detectar tais anomalias gravíssimas, propicia ao juiz

uma avaliação antes impossível. Até esse ponto, cremos ser razoável a invocação

da tese de ser inexigível a mulher carregar por meses um ser que logo ao nascer,

perecerá. (...) Se os médicos atestarem que o feto é verdadeiramente inviável, vale

37

dizer, é anencéfalo (falta-lhe cérebro), por exemplo, não se cuida de "vida própria",

mas de um ser que sobrevive à custa do organismo materno, uma vez que a própria

lei considera cessada a vida tão logo ocorra a morte encefálica". (Código Penal

Comentado. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais, 2006, pg. 555/556)

Embora não haja nos autos a notifica de que a gestante corra risco de morte,

não se pode deixar de lado o aspecto psicológico que tal fato lhe causa: não é justo

que à mãe seja imposta a obrigação de continuar com essa gravidez-sacrifício,

valendo-se de expressão utilizada pelo Douto Ministro Carlos Britto, em seu voto

proferido na aludida ação.

A sentença de morte proferida por ocasião da constatação da anencefalia já

fulminou todas as expectativas e planos daqueles que aguardavam o nascimento

daquele filho, de modo que não se mostra razoável e proporcional infligir à gestante

o martírio de levar às últimas consequências uma gravidez sem serventia, o que

somente lhe acarretará amargura e demasiado sofrimento psicológico, o que viola o

princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III, da

CF, do qual deflui, como consectários naturais, o respeito à integridade física e

psíquica das pessoas.

As convicções religiosas devem ser deixadas de lado. É imoral e cômoda a

conduta de impor que terceiros suportem o sacrifício de levar adiante uma gravidez

dessa natureza. Embora louvável a postura daquelas gestantes que escolhem não

interromper a gestação, a despeito do diagnóstico de anencefalia, é necessário

salientar que tal escolha deve partir da própria mulher e não lhe ser imposta por

pessoas alheias à situação aflitiva vivenciada.

Assim, a reforma da sentença, para autorizar a interrupção da gravidez é

medida imperiosa, sendo certo que casos semelhantes já foram decididos por esta

Câmara:

"AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. GRAVIDEZ. INTERRUPÇÃO. MÁ FORMAÇÃO

DO FETO. CONSTATAÇÃO TÉCNICA E MÉDICA DE VIDA INVIÁVEL. APELO DA

MÃE A QUE SE DÁ PROVIMENTO. O fato da ausência de previsão autorizativa para

o aborto no art. 128 do CP não impede que o Judiciário analise o caso concreto e o

resolva à luz do bom senso e da dignidade humana, preocupando-se com a saúde

da própria mãe. Havendo constatação médica de inviabilidade de vida pós-parto,

dada a ausência de calota craniana no feto - anencefalia - o Judiciário deve autorizar

38

a interrupção da gravidez até como medida de prevenção profilática à genetriz".

(TJMG, Apelação Cível nº 515.561-1, Rel. Des. Francisco Kupidlowski, data do

julgamento 09/08/2005, DJ 17/09/2005)

"APELAÇÃO CÍVEL. ALVARÁ JUDICIAL. ANTECIPAÇÃO TERAPÊUTICA

DO PARTO. FETO ANENCEFÁLICO. EXAMES MÉDICOS COMPROBATÓRIOS.

VIABILIDADE DO PLEITO. Não se pode lançar mão dos avanços médicos,

mormente, em casos de anencefalia cabalmente comprovada, cujo grau de certeza

é absoluto acerca da impossibilidade de continuidade de vida extra-uterina do feto

anencefálico por tempo razoável. Para haver a mais límpida e verdadeira promoção

da justiça, é de fundamental importância realizar a adaptação do ordenamento

jurídico às técnicas medicinais advindas com a evolução do tempo. Vale dizer, o

direito não é algo estático, inerte, mas sim uma ciência evolutiva, a qual deve se

adequar à realidade. Seja pela inexigibilidade de conduta diversa, causa supra legal

de exclusão da culpabilidade, seja pela própria interpretação da lei penal, a

interrupção terapêutica do parto revela-se possível à luz do vetusto Código Penal de

1940. Considerando a previsão expressa neste diploma legal para a preservação de

outros bens jurídicos em detrimento do direito à vida, não se pode compreender por

qual razão se deve inviabilizar a interrupção do parto no caso do feto anencefálico,

se, da mesma maneira, há risco para a vida da gestante, com patente violação da

sua integridade física e psíquica, e, ainda, inexiste possibilidade de vida extra-

uterina. Dentre os consectários naturais do princípio da dignidade da pessoa

humana deflui o respeito à integridade física e psíquica das pessoas. Evidente que

configura clara afronta a tal princípio submeter a gestante a sofrimento grave e

desnecessário de levar em seu ventre um filho, que não poderá sobreviver. Não

bastasse a gravíssima repercussão de ordem psicológica, a gestação de feto

anencefálico, conforme atestam estudos científicos, gera também danos à

integridade física, colocando em risco a própria vida da gestante. Ademais, com o

advento da Lei 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, adotou-se o critério de morte

encefálica como definidor da morte. Nessa linha, no caso de anencefalia, dada a

ausência de parte vital do cérebro e de qualquer atividade encefálica, é impossível

se cogitar em vida, na medida em que o seu contraponto, a morte, está configurado.

(TJMG - Ap. Cível nº. 1.0079.07.343179-7/001, rel. Desª. Cláudia Maia, 13ª Câmara

Cível).

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Com tais razões de decidir, DOU PROVIMENTO AO RECURSO,

confirmando a antecipação da tutela recursal, para autorizar a interrupção da

gravidez, determinando a imediata expedição de alvará.

Custas ex lege.

O SR. DES. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA:

VOTO

Ao contrário do conceituado colega, Des. Alberto Henrique, entendo que o

caso não é dessa singeleza ímpar que ele assevera. Embora respeite muito a sua

opinião, a questão é deveras tormentosa e, por que não dizer, invade a seara

religiosa, científica e médica, invade a seara social e é um caso, como bem disse

V.Exa., até de repercussão mundial.

Aprendemos, desde o limiar da graduação, que a lei sempre, a

hermenêutica, deve sempre ser analisada pelo seu lado humano, cristão e social. E,

assim o fazendo, se formos aqui divagar sobre religiosidade, sobre termos

científicos, médicos, faríamos aqui verdadeiros tratados.

Atento ao voto do conceituado Relator, reiterando que o caso não é tão

simples como aparenta, trouxe voto escrito, após análise detalhada, com acuidade e

zelo necessários que o caso requer diante da prova contida nos autos.

A antecipação terapêutica do parto quando diagnosticada a anencefalia fetal

é tema tormentoso, porque contrapõe princípios constitucionais de proteção ao

direito à vida e da dignidade da pessoa humana.

Verifico que nos autos está bem comprovado o diagnóstico de anencefalia

do feto, através de laudos médicos confirmados por parecer técnico produzido pelo

Centro Operacional das promotorias de Justiça de Defesa da Saúde, com conclusão

no sentido de que "o produto da concepção não apresenta, embasado na

ultrassonografia, nenhuma perspectiva de sustentação de funções vitais após o

nascimento".

Diante da absoluta ausência de perspectiva de vida do nascituro, não vejo

como negar o pedido de autorização para a prática terapêutica recomendada pelos

médicos que acompanham a gestante, diante dos riscos indicados, que tanto são de

ordem física como psicológica.

Conforme já assinalou o Ministro JOAQUIM BARBOSA (STF, HC 84.025-6),

"não se pode impor à gestante o insuportável fardo de, ao longo de meses,

40

prosseguir na gravidez fadada ao insucesso".

Nos dizeres do Ministro CARLOS AYRES BRITO (STF, ADPF 54/DF):

"Se o produto da concepção não se traduzir em um ser a meio caminho do

humano, mas, isto sim, em um ser que de alguma forma parou a meio ciclo do

humano. Incontornavelmente empacado ou "sem qualquer possibilidade de

sobrevida" (ainda uma vez, locução tomada de empréstimo à mesmíssima resolução

do CFM), por lhe faltar as características todas da espécie. Uma crisálida que

jamais, em tempo algum, chegará ao estágio de borboleta. O que já importa

proclamar que se a gravidez "é destinada ao nada" -- a figuração é do ministro

Sepúlveda Pertence -, sua voluntária interrupção é penalmente atípica. Já não

corresponde ao fatotipo legal, pois a conduta abortiva sobre a qual desaba a

censura legal pressupõe o intuito de frustrar um destino em perspectiva ou uma vida

humana in fieri. Donde a imperiosidade de um conclusivo raciocínio: se a

criminalização do aborto se dá como política legislativa de proteção à vida de um ser

humano em potencial, faltando essa potencialidade vital aquela vedação penal já

não tem como permanecer."

Evidencio em tal situação, que antevejo atipicidade na prática da

antecipação terapêutica do parto, por ausência de lesividade. Como a morte do feto

logo após o parto já está prognosticada, não dispondo a Medicina de meios para

salvá-lo, toda preocupação deve ser voltada ao casal, que de forma corajosa,

destemida e exemplar bate às portas do Poder Judiciário em busca de uma solução

jurídica, para pacificar a questão.

Com estas singelas e modestas considerações, também DOU

PROVIMENTO À APELAÇÃO, nos exatos termos do judicioso voto do douto, sábio e

operoso Relator.

Prevalecendo tal desate, entendo que deve ser levado ao conhecimento do

juízo de primeira instância, pelo meio de comunicação mais urgente possível.

O SR. DES. FRANCISCO KUPIDLOWSKI:

VOTO

Na espécie, reporto-me a decisão anterior proferida como Relator, em

julgamento da então saudosa 5ª Câmara Cível do egrégio Tribunal de Alçada.

Naquela oportunidade, ao analisar pedido de interrupção de gravidez, por

má-formação de feto, vitimado pela anencefalia, em grau recursal, entendi, como

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também aqui entendo, que, por se tratar da mesma situação que a pleiteada,

autorização abortiva deva ser concedida, já que restou comprovado nos autos, por

laudos médicos inatacáveis, que o ser em estado fetal encontra-se contaminado

pela ausência de calota crânio encefálica, sendo tal deformidade irreversível e

espancatória da possibilidade de vida "extra-corpus".

Deve-se levar em consideração, sem apego a preceitos e preconceitos

arraigados através dos tempos, ser desumana a exigência quanto à manutenção de

uma gestação fadada ao insucesso da vida, o que afronta os princípios saudáveis da

medicina, em risco para a vida e a saúde da gestante, bem como de comprometer o

dever de preservar a dignidade humana da genetriz.

Com estas considerações, acompanho o douto voto da relatoria e, também,

dou provimento à apelação, nos termos daquele voto.

LC

Participaram do julgamento os Desembargadores: LUIZ CARLOS GOMES

DA MATA e FRANCISCO KUPIDLOWSKI.

SÚMULA: DERAM PROVIMENTO, COM DETERMINAÇÃO DE IMEDIATA

EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ.

42

8 CONCLUSÃO

O presente trabalho monográfico possui vários aspectos destacados sobre o

aborto eugenésico, posicionamentos doutrinários a respeito do tema abordado,

princípios constitucionais favoráveis a sua realização.

Inicialmente foram traçadas algumas considerações sobre o aborto, sendo

necessária uma análise histórica para fundamentar a importância da presente

pesquisa.

O aborto, segundo a doutrina, é a interrupção do processo da gestação com

a conseqüente morte do feto, ausência de vida extra-uterina. Sabe-se que os

primeiros registros referentes ao aborto são do Código de Hamurabi, ao qual

considerava o aborto como um crime acidental contra os interesses do pai, bem

como uma lesão contra a mulher.

Já no Brasil não previa o crime de aborto praticado pela própria gestante,

apenas criminalizava a conduta de terceiros que realizassem o ato, isso acontecia

em 1830 no Código Criminal. Somente em 1890 passou a prever afigura do aborto

praticado pela própria gestante.

Contudo posteriormente em 1940 com a promulgação do atual Código Penal

Brasileiro, houve a tipificação da figura do aborto, incluindo o crime no Capítulo I,

dos crimes contra a vida, criminalizando-o em todas as hipóteses, apenas excluindo

de punibilidade o aborto necessário, quando há outro meio de salvar a vida da

gestante, e o aborto no caso de gravidez resultante de estupro.

Justificou-se o aborto eugenésico com diversos princípios constitucionais

que dão o direito de escolha da mãe em querer levar à gestação adiante ou não, de

acordo com o princípio da dignidade humana, da legalidade, e da autonomia da

vontade. Dentre esses, vários outros também são fundamentos argumentativos da

razão pública a serem seguidos pelo Judiciário, visto que é a forma legítima de

expressão daqueles que representam a estrutura básica de uma sociedade, sejam

eles funcionários públicos, parlamentares, promotores ou juízes.

Não deve ser confundido o aborto eugenésico com o simples fato de uma

gravidez não desejada que deverá a mesma ser interrompida. O conservadorismo

da sociedade brasileira, onde símbolos religiosos estão presentes em quase todos

43

os espaços oficiais do Estado, faz com que se torne menor o grau de adesão à

razão pública pelos estratos de baixo poder político na estrutura básica. Casos como

o aborto eugenésico não será nenhuma objeção a consciência ou a preceitos

morais, pregados pela religião, que ora tenta ignorar a ciência. O argumento da

ameaça à saúde não se baseou no pressuposto do risco inerente a qualquer

gravidez, mas na evidência empírica da tortura física, psicológica e moral que o

dever da gestação de um feto anencefálico impõe a uma mulher, a qual não pode ter

seus direitos garantidos pela Constituição já mencionados desrespeitados, por um

feto que não nascerá com qualquer expectativa de vida.

Por fim a anencefalia deve ser analisada de acordo com o pluralismo moral,

não centralizada a idéias da moralidade católico-cristã. O aborto eugenésico não

pode ser considerado crime, pela atipicidade do fato, por não se tratar de morte

arbitrária, com a exclusão de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa,

tanto por parte da gestante considerando o dano psicológico, cujo o feto

sabidamente não sobreviverá, como por parte do médico que não pode ser

compelido a prolongar o sofrimento da gestante. O Brasil deve ser um Estado não

apenas que promove à diversidade de crenças, e o direito a liberdade de

consciência, mas principalmente aquele que se mantém neutro em matéria de

religião, e que reconhece esse tipo de aborto como sendo matéria de ética privada.

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REFERÊNCIAS

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