alfrednorthwhitehead - pedro p. ferreira · dados internacionais de cataloga~o na public~o(cip)...
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COLEc;:Ao TOPICOS
Bacbelard, G. - A POETICA DO DEVANEIO
Bacbelard, G. - A POETICA DO ESPA<;:O
Bacbelard, G. - A AGUA E OS SONHOS
Bacbelard, G. - 0 AR E OS SONHOS
Ferenczi, S. - THALASSA
Bergson, H. - MATERIA E MEMORIA
Bacbelard, G. - A TERRA E OS DEVANEIOS DO REPOUSO
Bacbelard, G. - A TERRA E OS DEVANEIOS DA VONTADE
Merleau·Ponty, M. - SIGNQS
Eliade, M. - MEFISTOFELES E 0 ANDROGINO
Eliade, M. - IMAGENS E SiMBOLOS
Panolsky, E. - ARQUITETURA OOTICA E ESCOLAsTICA
Eliade, M. - 0 SAGRADO E 0 PROFANO
Dumezil, G. - DO MITO AO ROMANCE
Tarde, G. - A OPINIAo E AS MASSAS
Sorel, G. - REFLEXOES SOBRE A VIOLENCIA
Ryle, G. - DILEMAS
Austin, J. L. - SENTIDO E PERCEP<;:Ao
Simmel, G. - FILOSOFIA DO AMOR
Weil, S. - A GRAVIDADE E A GRA<;:A
Lobruu, G. - KANT E 0 FIM DA METAFisICA
Ero, U. - INTERPRETA<;:Ao E SUPERINTERPRETA<;:Ao
Wbitebead, A. N. - 0 CONCEITO DE NATUREZA
Cassirer, E. - ENSAIO SOBRE 0 HOMEM
Alain - IDEIAS
PR6xIMOS LANCAMENTOS:
Ponty, M. - FENOMENOLOGIA DA PERCEP<;:Ao
Panofsky, E. - IDEA
.•
Alfred North Whitehead
o Conceito de Natureza
Martins Fontessao Paulo - /994
Titulo originol: THE CONCEPT OF NATUREPublicado por Press Syndicate of the University of CambridgeCopyright © Press Syndicate of the University of Cambridge
Copyright © Livraria Martins Fontes Editora Ltda., Sao Paulo, 1993,para a presente edicao
1~ edi~iio brosileira: marco de 1994
Tradu~iio: Julio B. FischerRevistio do tradu~iio: Carlos Eduardo Silveira Matos
Revisiio tipogrdjica:Marise Simoes LealMarcio Della Rosa
SUMARIO
Produ~iio graftea: Geraldo AlvesComposi~ao: Ademilde L. da Silva
Capo - Projeto: Alexandre Martins FontesPrifaeio . 1
ISBN 8S-336"()248-O
1. Ciencia - Filosofia 2. Conhecimento - Teoria 3.Filosofia da natureza 4. Natureza I. Titulo. II. serie.
Dados Internacionais de Cataloga~o na Public~o (CIP)(CAmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Whitehead. Alfred North, 1861-o conceito de natureza / Alfred North Whitehead ;
(tradu~ao Julio B. Fischer]. - Sao Paulo: Martins Fontes,1993. - (Colecao T6picos)
"As Conferencias Tarner ministradas no Trinity College,novembro de 1919."
5336191
119143169193217233235
I. Natureza e pensamento .II. Teorias da bifurca~ao da natureza .
III. 0 tempo .IV. 0 metodo da abstra~ao extensiva .V. Espa~o e movimento .
VI. Congruencia .VII. Os objetos .
VIII. Resumo .IX. Os conceitos fisicos fundamentais .
Nota: Do conceito grego de ponto .Nota: Do significado e dos eventos infinitos .
•
CDD·501
indices para cataIogo sistematico:
I. Ciencia : Filosofia 5012. Ciencias naturais : Filosofia 501
3. Filosofia da ci&1cia SOl
93-3365
Todos os direitos para a /{ngua portuguesa reservados aLIVRARIA MARTINS FONTES EDiTORA LTDA.Rua Conselheiro Ramalho, 330/340 - Tel.: 239-3677
01325-000 - Sao Paulo - SP - Brasil
PREFA.CIO
o conteudo deste livro foi originalmente apresentado no Trinity College, no outono de 1919, como 0 cicloinaugural de Conferencias Tamer. A fun~ao de conferencista Tamer tern carcher ocasional e foi criada peIagenerosidade do sr. Edward T arner. A tarefa de cada urndaqueles que sucessivamente ocupam 0 posto sera. a deministrar urn cicIo de conferencias acerca da "Filosofiadas Ciencias e as Rela~6es ou Ausencia de Rela~6es entre os diferentes Setores do Conhecimento". 0 presentelivro traduz 0 esforc;o do primeiro conferencista da seneem desincumbir-se de sua tarefa.
Os capitulos preservam sua forma original de conferencias e se mantem da maneira como foram ministradas, 11 exce~ao de pequenas a1tera~6es visando eliminarobscuridades de expressao. A forma da conferencia terna vantagem de sugerir uma plateia com urn quadro intelectual definido, 0 qual a conferencia tern 0 prop6sito demodificar em urn sentido especifico. Na apresenta~aodeuma perspectiva diferente e com amplas ramifica~6es,
2 a CONCE/TO DE NA TUREZA PREFAcIO 3
uma exposi~ao linear, das premissas as conclusoes, naoe suficiente para assegurar a inteligibilidade. A assistencia ira interpretar tudo aquilo que for dito segundo suaperspectiva preexistente. Por esse motivo, os dais primeiros capftulos e as dais ultimos sao essenciais para a inteligibilidade do livro, muito embora pouco acrescentem ainteireza formal da exposi~ao. Sua fun~ao e evitar que 0
leitor se desvie da rota no encal~o de concep~Oes equivocadas. Identico motivo me leva a evitar a terminologia tecnica da fIlosofia. A modema filosofia natural esta crivadade alto a baixo pela falacia da bifurca~ao,discutida no segundo capitulo deste livro. Por conseguinte, todos os seustermos tecnicos implicam, de alguma fonna sutil, urn entendimento equivocado de minha tese. Talvez seja conveniente prevenir explicitamente que, se 0 leitor se entregarao vicio comodo da bifurca~iio, sequer uma unica palavrado que escrevi the sera inteligivel.
as dois ultimos capitulos nao pertencem propriamente ao ciclo especial. a Capitulo VIII e uma conferenciaministrada na primavera de 1920 diante da Sociedade deQuimica dos alunos do Imperial College of Science andTechnology. Foi incluida neste volume a titulo de resumo e aplic~ao convenientes da doutrina do livro para umaplateia imbuida de uma certa perspectiva especifica.
Este volume sobre "0 Conceito de Natureza" ecomplementar a meu livro anterior, An Enquiry concerning thePrinciples ofNatural Knowledge. QIalquer um deles pode serlido independentemente, mas ambos se completam. Emparte, 0 presente livro apresenta certos pontos de vista omitidos em sen predecessor e em parte transpOe 0 mesmaterreno com uma exposic;ao alternativa. Por urn lado, ano~aomatematica foi criteriosamente evitada, senda acei-
tos os resultados das dedu~Oes matematicas. Determinadasexplica~Oes foram aprimoradas, enquanto outras foramiluminadas sob um novo prisma. Por outro lado, importantes pontos do trabalho anterior foram omitidos quandonaD havia nenhum acrescimo a fazer a seu respeito. Demodo geral, enquanto 0 trabalho anterior baseava-se, nofundamental, em ideias diretamente extraidas da fisica matematica, 0 presente livro guarda maior proximidade a determinadas areas da filosofia e da fisica, a ponto de excluir a matematica. as dois trabalhos convergem em suasdiscussOes acerca de alguns detalhes do espa~oe do tempo.
Nao tenho consciencia de ter modificado em sentidoalgum minhas conce~Oes. Houve alguns desdobramentos.Aqueles que permitem uma exposi~aonao-matematica foram incorporados ao texto. as desdobramentos matematicos sao mencionados nos dais Ultimos capftulos e se referemaadapta~ao dos principios da fisica matematica a formado prindpio da relatividade aqui sustentada. Embora sejaadotado 0 metodo einsteiniano de utilizar a teoria dos tensores, sua aplica~aoe conduzida por diferentes linhas e a partir de diferentes pressupostos. Aqueles dentre os seus resultados que tiveram comprova~aona experiencia tambemsao obtidos por meus metodos. A divergencia nasce fundamentalmente de minha recusa em aceitar sua teoria do espa~o nao-uniforme ou sua admissao do peculiar caniterfundamental dos sinais luminosos. Nao obstante, eu naoincorreria no erro de deixar de reconhecer 0 valor de seurecente trabalho acerca da relatividade geral, que tem 0
grande merito de ter sido 0 primeiro a revelar 0 modo comoa fisica matematica deve se desenvolver aluz do principioda re1atividade. A meu ver, noentanto, ele confinou 0 desenvolvimento de seu brilhante metodo matematico aoslimites estreitos de uma filosofia altamente duvidosa.
4 o CONCEITO DE NA TUREZA
o objetivo do presente volume e de seu predecessor e lan~ar as bases de uma filosofia natural que sejao pressuposto necessario de uma fisica especulativa reorganizada. A assimila~1i.o geral do espa~o e tempo quedomina 0 pensamento construtivo pode reivindicar 0
apoio independente de Minkowski pelo lado da cienciae tambem de sucessivos relativistas, ao passo que, notocante aos fil6sofos, foi, ereio eu, tema das Confer(~ncias
Gifford do professor Alexander, ministradas ha poucosanos, mas ainda n1i.o publicadas. Tambem de resumiusuas conclusoes quanta a essa questao em uma palestraaSociedade Aristotelica emjulho de 1918. Desde a publica~1i.o de An Enquiry concerning the Principles of NaturalKnowledge, pude beneficiar-me com a leitura do livro deSr. C.D. Broad, Perception, Physics and Reality [Camb.Univ. Press, 1914]. Esse valioso trabalho serviu-me deapoio em minha discuss1i.o do Capitulo II, embora eudesconhe~aate que ponto 0 sr. Broad concordaria comqualquer urn dos meus argumentos, da maneira comoali enunciados.
Resta-me agradecer aos quadros da University Press,seu pessoal da linotipia, seus revisores de provas, seupessoal de escrit6rio e gerentes, nao apenas pela excelencia tecnica de seu trabalho, mas pdo modo como cooperaram no sentido de assegurar 0 atendimento de minhas conveniencias.
A.N.W.
IMPERIAL COLLEGE OF SCIENCE AND TECHNOLOGY
Abril de 1920
CAPITULO I
NATUREZA E PENSAMENTO
o tema enfocado pdas Conferencias Tamer e defmido por Seu criador como sendo "a Filosofia das Cienciase as Rela~oes ou Ausencia de Rela~oesentre os diferentes Setores do Conhecimento". Na primeira conferenciadessa nova institui~ao, sera conveniente nos determospor alguns instantes nos propositos de seu outorgante talcomo expressos nessa defini.;ao; e 0 fal,;o com urn prazer tanto maior quanto isso me facultara introduzir ostopicos aos quais 0 presente curso devera estar voltado.
Ejustificado, penso eu, tomarmos a segunda chaveda defini~1i.o como parcialmente explanatoria da primeira. 0 que vern a ser a filosofia das ciencias? N1i.o serauma resposta insatisfatoria dizer que se trata do estudodas rela~oes entre os diferentes setores do conhecimento.Ent1i.o, com admiravel deferencia para com a liberdadedo saber, sao inseridas na definil,;30, ap6s a palavra "relal,;oes", as palavras "ou ausencia de re1al,;oes". U rnaconfutal,;ao das rela<;.oes entre as ciencias constituiria em
6 o CONCEITO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 7
si mesma uma filosofia das ciencias. Mas nao poderiamos prescindir quer da primeira quer da segunda chave. Nao e toda e qualquer rela~ao entre as ciencias queparticipa da filosofia das mesmas. A biologia e a ffsica,por exemplo, estao ligadas pelo uso do microsc6pio. Ainda assim, posso asseverar COm seguranc;a que uma descric;ao tecnica das utilizac;oes do microscopio na biologia nao e parte da filosofia das dencias. Por outro lado,nao podemos abandonar a ultima chave da defini~ao,
ou seja, aquela referente as relac;oes entre as ciencias,sem abandonar a referencia expHcita a urn ideal na ausencia do qual a filosofia necessariamente passani a definbar pela cacencia de urn interesse intrinseco. Esse ideale a obten~ao de algum conceito unificador capaz de enquadrar em relac;5es determinadas, inerentes ao mesmo,tudo quanto esta disponivel ao conhecimento, ao sentimento e aemo~ao. Esse ideal remoto e a for~a motivada investiga~ao filos6fica e rec1ama obediencia mesmoquando 0 banimos. 0 pluralista filos6fico e urn 16gicorigoroso; 0 hegeliano floresce em meio a contradic;6escom a ajuda de seu absoluto; 0 sacerdote maometanocurva-se diante da vontade criativa de Ala; e 0 pragmatico aceitara 0 que quer que seja coutanto que "funcione".
A menc;ao a esses vastos sistemas e a essas cootroversias de longa data, das quais as mesmos se originam,advertem-nos aconcentrac;ao. Nossa tarefa ea mais simples da filosofia das ciencias. Ora, uma cienciaja possuiuma certa unidade, razao pela qual tal corpo de conhecimento foi instintivamente reconhecido como constituinte de uma ciencia. A filosofia de uma ciencia e 0 esfor~o
de expressar explicitamente as caracteristicas unificadoras que permeiam esse complexo de pensamentos e con-
ferem-Ihe a condi~ao de ciencia. A filosofia das ciencias- concebida como urn objeto de estudo - e 0 esfor~o
de apresentar todas as ciencias como uma unica ciencia, ou - em caso de insucesso - a confuta~ao de talpossibilidade.
Farei ainda uma outra simplifica~ao, confinandonossa aten~ao as ciencias naturais, ou seja, as cienciasque tern por objeto de estudo a natureza. 0 postuladode urn objeto de estudo comum para esse grupo de ciencias determinou a pressuposi~ao de uma filosofia unificadora da ciencia natural.
o que entendemos por natureza? E nosso misterdiscutir a filosofia da ciencia natural. Ciencia naturale a ciencia da natureza. Mas ... 0 que vern a ser a natureza?
A natureza e aquilo que observamos pela percep~ao obtida atraves dos sentidos. Nessa percep~ao sensivel, estamos conscios de algo que nao e pensamento eque e contido em si mesmo com rela~ao ao pensamento. Essa propriedade de ser autocontido com re1a~ao aopensamento esta na base da ciencia natural. Significaque a natureza pode ser concebida como urn sistema fechado cujas rela~iies mutuas prescindem da expressaodo fato de que se pensa acerca das mesmas.
Em determinado sentido, portanto, a natureza independe do pensamento. A afirma~ao nao se pretendenenhum postulado metafisico. Quem dizer apenas quepodemos pensar sobre a natureza sem pensar sobre 0
pensamento. Direi que, nesse caso, estaremos pensando "homogeneamente" sobre a natureza.
Obviamente, epossivel pensar na natureza conjuntamente com 0 pensamento sobre 0 fato de a natureza
8 o CONCEITO DE NATUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 9
ser alva de pensamento. Direi, nesse caso, que estaremas pensando "heterogeneamente" sabre a natureza.Na verdade, durante esses ultimos minutos estivemospensando heterogeneamente sabre a natureza. 0 interesse da ciencia natural esta voltado exclusivamente paraas pensamentos homogeneos sabre a natureza.
Contudo, a percep~ao senslve! traz consigo um e!emento diverso do pensamento. Trata-se de uma intrincada questao psicol6gica 0 sabermos se a percep~ao senStve! envolve 0 pensamento; e, caso 0 envolva, qual 0tipo de pensamento que necessariamente envolve. Observe-se que foi estabelecido acima que a percep~ao senslve!e uma apreensao de a!go que difere do pensamento. Ouseja, a natureza nan epensarnento. Mas essa euma questao diferente, a saber, que 0 fato da percep~ao senslve!contem um fator diverso do pensamento. A esse fatordenomino "apreensao senslve1". Por conseguinte, a doutrina de que a ciencia natural ocupa-se exclusivarnentede pensamentos homogeneos acerca da natureza naD cooduz imediatamente aconclusao de que a ciencia natura! nao se ocupa da apreensao senslve!.
Fonnularei, porem, mais este postulado, a saber,que, embora a ciencia natural se ocupe da natureza, quee 0 termo da percep~aosenslve!, nao se ocupa da apreensao sensfvel em si.
Repetirei a linha-mestra desse raciocfnio e 0 desdobrarei em determinadas dire~6es.
o pensamento sobre a natureza e diferente da percep~ao senslve! da natureza. Dal 0 fato de a percep~ao
sensfvel conter um ingrediente ou fator que nao e pensamento. A esse ingrediente denomino apreensao senslve!. E indiferente para meu raciocfnio se a percep~ao
sensfvel inclui ou nao 0 pensamento como ingredienteadicional. Se a percep~ao sensfvel nao envolve 0 pensamento, a apreensao sensfvel e a percep~ao sensfvel saoidenticas. Aquilo que e percebido, porem, 0 e enquanto uma entidade que constitui 0 termo da apreensao sensfvel, algo que, para 0 pensamento, se encontra alemdo fato daque!a apreensao senslve!. Ademais, a coisa percebida certamente nao contem apreens5es sensfveis outras, diferentes da apreensao sensfvel que e urn ingrediente dessa percep~ao. Por conseguinte, a natureza, ta!como revelada na percep~ao sensfvel, e contida em simesma em rela~aoaapreensao sensfvel, alem de contida em si mesma em re!a~ao ao pensamento. Tambemexpressarei essa conten~ao em si mesma da natureza dizendo que a natureza est.. fechada para a mente.
Esse fechamento da natureza nao traz em seu bojonenhuma doutrina metaffsica da separa~ao entre natureza e mente. Significa que, na percep~aosensfvel, a natureza e reve!ada como um complexo de entidades cujasrela~5es mutuas sao passfveis de expressao no pensamento sem referencia amente, ou seja, sem referencia queraapreensao sensfvel quer ao pensamento. Ademais, naopretendo dar a impressao de estar sugerindo que aapreensao sensfve1 e 0 pensamento sejam as unicas atividades a serem atribuldas it mente. Tampouco estounegando a existencia de rela~5es outras entre entidadesnaturais e a mente, ou mentes, alem de serem as entidades os termos da apreensao senslve! das mentes. Porconseguinte, estenderei 0 sentido dos tennos "pensamentos homogeneos' , e "pensamentos heterogeneos", ja introduzidos. Pensamos "homogeneamente" sobre a natureza quando pensamos sobre e!a sem pensar sobre 0
10 o CONCEITO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 11
pensamento au sabre a apreensao senslvel, e pensamos"heterogeneamente" sabre a natureza quando pensamos sabre esta conjuntamente com 0 pensamento sabreo pensamento au sabre a apreensao senslve1 au sabre
ambos.Tambem considero que a homogeneidade de pen
samento sobre a natureza exclui qualquer referencia avalores marais au esteticos cuja assimilac;ao seja vividana propor~ao da atividade autoconsciente. Os valoresda natureza talvez constituam a chave para a sfntese metafi'sica da existencia. Tal sfntese, entretanto, e exatamente 0 oposto do que estou perseguindo aqui. Minhapreocupac;ao exc1usiva ecom as generalizac;oes as roaisamplas que se possa levar a cabo respeitando aquilo quenos e conhecido como a direta reve!a~ao da apreensao
sensfvel.Mencionei que a natureza se reve1a na percepc;ao
senslve! enquanto urn complexo de entidades. Sera. pro·veitoso considerar 0 que entendemos por entidade nesse contexto. "Entidade" esimplesmente 0 equivalentelatina de "coisa", a menoS que, com finalidades tecui·cas, se trace a1guma distin~ao arbitniria entre as ~a1a
vras. Todos as pensamentos devem se referir a COISas.
Podemos obter a1guma ideia dessa necessidade de coisas para 0 pensamento examinando a estrutura de uma
proposi~ao.Suponhamos que uma proposi~ao esteja sendo
transmitida por urn expositor a urn receptor. Tal proposi~aoe composta por frases; algumas dessas frases poderao ser demonstrativas e outras descritivas.
Por frase demonstrativa refiro-me it frase que torna 0 receptor conscio de uma determinada entidade de
urn modo independente da frase demonstrativa particular. Voces compreenderao que estou empregando aquio termo "demonstrac;ao" em urn sentido a-Iogica, ouseja, no sentido em que urn conferencista demonstra,com 0 auxnio de uma ra e urn microscopio, a circulac;ao sangiiinea para uma turma iniciante de estudantesde medicina. Chamarei a tal demonstra~ao "especulativa", reportando-me aacepc;ao em Hamlet do termo "especulac;ao", quando se diz:
Nao hi especula~ao naque!es 0lhos1•
Assim, uma frase demonstrativa demonstra especulativamente uma entidade. Pode se dar que 0 expositortenha em mente alguma Dutra entidade - ou seja, a frasedemonstra a e!e uma entidade diversa daquela que demonstra ao receptor. Nesse caso, ocorre uma confusao;pais existirao duas proposi<;5es diversas, a saber, a proposi~ao para 0 expositor e a proposi~ao para 0 receptor. Dei·xo tal possibilidade de lado enquanto irre!evante para nossa discussao, embora possa ser diffcil, na pratica, duaspessoas convergirem na considera<;ao exatamente cia mesrna proposi<;ao ou mesma que uma pessoa tenha determinado exatamente a proposi<;ao que esta considerando.
Tambem pode acontecer que a fraoe demonstrativa nao consiga demonstrar entidade a1guma. Neste caso, nao existe proposi~ao para 0 receptor. Creio que podemos partir do prindpio (irrefletido, talvez) de que 0expositor sabe 0 que pretende transmitir.
1. Na verdade, 0 trecho ede "Macbeth" (Ato III, cena 4); "Thou hastno speculation in those eyes" , onde speculaJiQn tern 0 sentido de "conllecer aquilaque se vi", segundo cornentario do prof. G. K. Hunter na edit;ao da PenguinBooh (N. T.)
12 o CONCE/TO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 13
Uma Frase demonstrativa eurn gesto. Nao eem siurn constituinte da proposi~ao, mas a entidade que demonstra e tal constituinte. Podemos nos indispor comuma [rase demonstrativa considerando-a de alguma forma ofensiva para n6s; mas se demonstra a entidade correta, a proposi<;ao se mantem valida, embora nosso gostopossa ter sido ofendido. Esse carater sugestivo da fraseologia e parte da qualidade literaria da senten~a quetransmite a proposic;ao. Issa porgue uma sentenc;a transmite diretamente uma proposic;ao, ao mesma tempo queem sua fraseologia sugere uma penumbra de outras proposi~6es carregadas de valor emocional. Estamos falando agora da proposi~aoespecifica diretamente transmitida em qualquer fraseologia.
Essa doutrina e obscurecida pelo fato de que, namaior parte dos casos, 0 que em termos cia forma emera parte do gesto demonstrativo constitui, na verdade,parte da proposi~ao que se pretende transmitir diretamente. Nesse caso, chamaremos elfptica a fraseologiacia proposic;ao. Na comunicac;ao ordinaria, e e1fptica afraseologia de praticamente todas as proposi~6es.
Vejamos alguns exemplos. Suponha-se que 0 expositor se encontre em Londres, digamos em Regent'sPark e no Bedford College, 0 grande educandario feminino situado naquele parque. Ele esta se pronunciandona entrada do predio e diz:
"Este ediffcio educacional e confortavel."A frase" este ediffcio educacional" e uma Frase de
monstrativa. Suponhamos agora que 0 receptor responda:
"Este nao e urn edificio educacional; e a area dosleaes no zooI6gico."
Entao, considerando que a proposi~ao original doexpositor nao tenha sido expressa em uma fraseologiaeliptica, 0 expositor mantem sua proposi<;ao original aoreplicar:
"Seja como for, 0 lugar (it) e confortavel."Observe-se que a resposta do receptor aceita a es
pecula<;ao demonstrativa da Frase "Este ediffcio educacional". Ele nao diz: "0 que voce esta querendo dizer?", mas aceita a Frase como demonstrativa de umaentidade, embora declare ser a mesma entidade a areados leaes no zool6gico. Em sua replica, 0 expositor, aseu turno, reconhece 0 exito de seu gesto original enquanto uma demonstra<;ao especulativa, e poe de ladoa questao da pertinencia de seu modo de sugestividadecom urn "seja como for". Encontra-se agora, contudo,em posi~ao de repetir a proposi~ao original com a ajuda de urn gesto demonstrativo privado de qualquer sugestividade, pertinente ou impertinente, dizendo:
"0 lugar (it) e confortavel."o "it" de sua afirma<;ao final pressupae que 0 pen
samento se apoderou da entidade enquanto puro e simples objetivo para considera~ao.
Restringir-nos-emos a entidades reveladas naapreensao senslvel. A entidade erevelada, assim, comourn termo relacional no complexo que ea natureza. Elase faz mostrar a urn observador em fun<;ao de suas rela<;aes; mas eurn objetivo para 0 pensamento em sua individualidade pura e simples. 0 pensamento nao podese processar de outra forma, isto e, nao pode se processar sem 0 "it" ideal e simples especulativamente demonstrado. Esse estabelecimento da entidade enquanto objetivo puro e simples nao atribui amesma uma existencia
14 o CONCE/TO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 15
a parte do complexo em que foi identificada pela percep<;ao sensfvel. Para 0 pensamento, 0 "it" eessencialmente urn termo relacional cia apreensao sensfvel.
Epossivel que 0 diaJogo referente ao ediffcio educacional assuma uma forma diversa. Seja 0 que for queo expositor pretendesse dizer originalmente, epraticamente certo que ele agora reconhe<;a sua primeira afirma<;ao como expressa em uma fraseologia elfptica e partado principio de que pretendesse dizer:
"18to aqui eurn ediffcio educacional e econfortavel."Aqui, a frase ou gesto demonstrativo, que demons
tra a "caisa" (it) que e confortave1, foi agora reduzidaa urn "isto"; e a Frase atenuada, mediante as circunstancias em que e proferida, e suficiente para 0 prop6sito cia correta demonstrac;;ao. Isso traz a luz a questaode que a forma verbal jamais e a fraseologia completada proposi~ao; tal fraseologia inc1ui ainda as circunstancias gerais de sua criac;;ao. Assim, a meta de uma Frasedemonstrativa eexpor uma "coisa" especffica como urnobjetivo puro e simples para 0 pensamento; todavia, 0
modus operandi de uma frase demonstrativa e produziruma apreensao cia entidade como urn termo re1acionalparticular de urn complexo auxiliar, eleito merarnenteem fun,ao da demonstra~aoespeculativa e irre1evantepara a proposi,ao. No diaJogo acima, por exemplo, educandarios e ediffcios, enquanto relacionados a"coisa"especulativamente demonstrada pela frase "este edificio educacional", flXaram essa "coisa" em urn complexoauxiliar que e irrelevante aproposi~ao.
"0 Iugar (a coisa, it) e confortavel."Nalinguagem, obviamente, cadafrasee, de modo in
variavel, altamente elfptica. Por conseguinte, a senten,a
"Este ediffcio educacional econfortavel' , provavelmentesignifica: "Este ediffeio educacional e confortavel enquanta ediffcio educacional."
Perceberemos, porem, que e passIvel substituir"confortavel" par "confortavel enquanto ediffcio educacional" na discussao acima, sem alterar nossa conclusao; fiuito embora possamos adivinhar que 0 receptor,que imaginou estar na area dos leaes do zoologica, estaria menos inc1inado a admitir que: "Seja como for,o lugar e confortavel enquanto ediffcio educacional."
Teremos um exemplo mais evidente de fraseologiae1fptica se 0 expositor dirigir ao receptor a observa~ao:
"Esse criminoso e seu amigo."o receptor poderia responder: "Ele e meu amigo
e 0 senhor esta sendo grosseiro."Aqui, 0 receptor parte do principio de que a frase
"Esse criminoso" ee1fptica e nao simplesrnente demonstrativa. Na verdade, a pura dernonstra~aoeimpossfvel,ainda que seja 0 ideal do pensamento. A impossibilidade pratica da pura demonstra,ao e uma dificuldade quese manifesta na comunica~ao do pensamento e na reten,ao do pensamento. Em outras palavras, uma proposi~ao acerca de urn fator particular da natureza naopode ser expressa a outros e tarnpouco retida para considera~6es repetidas sem a ajuda de complexos auxiliares que Ihe sao irre1evantes.
Passarei agora as frases descritivas. 0 expositor diz:"Urn educandario em Regent's Park e confortavel."
o receptor conhece bem Regent's Park. A frase"Urn educandario em Regent's Park" edescritiva para ele. Nao sendo elfptica sua fraseologia - 0 que, na
16 o CONCEITO DE NATUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 17
vida cotidiana, certamente sera, de uma forma ou deGutra -, tal proposi~ao significa simplesmente: "Existe uma entidade que euma construc;ao educacional emRegent's Park e que e confortavel."
Caso 0 receptor retruque: "A area dos Idles no 200
16gico e a unica construc;ao confortavel em Regent'sPark" 1 ele agora estanl contradizendo 0 expositor, partindo do prinefpio de que uma area de leGes em um 200
16gico nao e urn ediffcio educacional.Assim, enquanto no primeiro diaIogo 0 receptor
simplesmente polemizou com 0 expositor sem contradize10, neste diaJogo ele 0 contradiz. Assim, uma [rase descritiva eparte cia proposic;ao que contribui para expressar, enquanto uma [rase demonstrativa nao e parte ciaproposic;ao que contribui para expressar.
o expositor pode ainda estar parado em Green Park- onde nao existe nenhum ediffcio educacional - e dizer: "Este ediffcio educacional e confortavel."
Provave1mente, nenhuma proposi<;ao sera recebida pelo receptor, porquanto a frase demonstrativa "Este ediffcio educacional" nada logrou demonstrar, dadaa ausencia da base que pressup6e em termos de apreensao sensfvel.
Caso 0 expositor tivesse dito, porem: "Urn ediffcio educacional em Green Park e confortavel" , 0 receptorteria recebido uma proposi<;ao, embora uma proposi<;aofalsa.
A linguagem e normalmente ambfgua e seria imprudente fazer afirma<;6es genericas quanta a seus significados. Mas frases iniciadas em "isso" ou "aquilo"sao normalmente demonstrativas, enquanto as frases ini-
ciadas com "0, a" ou "urn, uma" sao amiude descritivas. Ao estudar a teoria da expressao proposicional, eimportante ter em mente a larga diferen<;a entre as mo
destas palavras an310gas "isso" e "aquilo" por urn lado, e "urn, uma" e "0, a", por outro. A frase "0 ediffcio educacional em Regent's Park e confortavel" sig
nifica, segundo a an3.1ise originariamente empreendidapor Bertrand Russell, que: "Existe uma entidade que
(i) e um edificio educacional em Regent's Park e que(ii) e confortavel e que (iii) e tal que qualquer edificioeducacional em Regent's Park lhe e identico."
o carater descritivo da frase "0 ediffcio educacional em Regent's Park" e, portanto, evidente. Por ou
tro lado, a negativa da proposi<;ao se da pela nega<;aode qualquer uma de suas tres chaves componentes oupela nega<;ao de qualquer combina<;ao das chaves componentes. Tivessemos substitufdo "Regent's Park" por"Green Park" 0 resultado seria uma proposi<;ao falsa.A constru<;ao de urn segundo estabelecimento educacional em Regent's Park tambem tornaria falsa a proposi
<;ao, muito embora na vida diaria 0 senso comum a tratasse, por polidez, como meramente ambfgua.
Para urn estudioso do classicismo, "A Ilfada" e emgeral uma frase demonstrativa, pois demonstra para eleurn poerna bern conhecido. Para a maioria da humanidade, contudo, a frase e descritiva, ou seja, tern por sinonimo "0 poerna intitulado 'A Ilfada' ".
Os nomes podern ser frases quer dernonstrativasquer descritivas. "Homero", por exemplo, epara nosuma frase descritiva, ou seja, a palavra, com alguma li-
18 o CONCEITO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 19
geira diferen~a de sugestividade, significa "0 homemque escreveu 'A IHada' " .
A prescnte discussao ilustra como 0 pensamento coloca diante de si objetivos simples - entidades, como nosas chamamos -, com as quais 0 pensar se reveste ao expressar suas rela~oesmutuas. A apreensao sensfve1 revela um fato por meio dos fatores que sao as entidades dopensamento. A distin~ao separada de uma entidade nopensamento nao euma asser~aometaffsica, mas urn metodo de processo necessario para a expressao finita de proposi~oes individuais. Alem das entidades nao poderiamexistir verdades finitas; sao elas as meios pelos quais ainfinitude cia irrelevancia e exclufda do pensamento.
Resumindo: os termos do pensamento sao entidades,em primeira instancia com individualidades simples e emsegunda instancia com propriedades e rela~oes a e1as atribufdas no processo de pensamento; as termos para aapreensao senslve1 sao fatores do fato cia natureza, em primeira instancia termos relacionais e apenas em segundainstancia discriminados como individualidades definidas.
Nenhuma caracterfstica cia natureza imediatamenteapresentada ao conhecimento pela apreensao sensfvelpode ser explicada. E impenetra.vel ao pensamento, nosentido de que seu peculiar carater essencial que se introduz na experiencia atraves da apreensao sensfvel e, para 0 pensamento, 0 simples guardiao de sua individualidade enquanto simples entidade. Para 0 pensamento,portanto, "vermelho" e simplesmente uma entidade definida, embora, para a apreensao, 0 "vermelho" carregue 0 conteudo de sua individualidade. A transi~ao
do "vermelho" da apreensao para 0 "vermelho" do pen-
samento e acompanhada por uma nftida perda de conteudo, ou seja, pela transit;ao do fator "vermelho" para a entidade "vermelho". Essa perda na transit;ao parao pensamento e compensada pelo fato de 0 pensamentoser comunicavel, ao passo que a apreensao sensfvel e incomunicavel.
Existem, portanto, tres componentes em nosso conhecimento da natureza, a saber: fato, fatores e entidades. Fato e 0 termo indiferenciado da apreensao sensivel; fatores sao termos da apreensao sensfvel, diferenciados enquanto elementos do fato; entidades sao fatores em sua fun~ao enquanto os termos do pensamento.As entidades assim referidas sao entidades naturais. 0pensamento e mais amplo que a natureza, de sorte queexistem entidades do pensamento que nao sao entidades naturais.
Quando falamos da natureza como um complexode entidades inter-relacionadas, 0 "complexo" efato enquanta entidade do pensamento, a cuja individualidade pura e simples e atribuida a propriedade de abarcar,em sua complexidade, as entidades naturais. :Eo nosso prop6sito analisar essa concep~ao; no curso da analise, 0
espat;o e 0 tempo deverao se manifestar. Evidentemente, as rela~oes existentes entre as entidades naturais saopor si mesmas entidades naturais, ou seja, sao tambemfatores de fato, ali presentes para a apreensao sensivel.Nesse sentido, a estrutura do complexo natural jamaispode ser completada em pensamento, da mesma formacomo os fatores de um fato jamais podem ser exauridosna apreensao sensfvel. A inexauribilidade e urn carateressencial de nosso conhecimento da natureza. Ademais,
20 a CONCEITO DE NATUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 21
a natureza DaD exaure a materia destinada ao pensarnento, ou seja, existem pensamentos que nao ocorreriamem nenhum pensamento homogeneo sabre a natureza.
A questao de sabermos se a percep.;;;:ao senslvel envolve 0 pensamento e largamente verbal. Se a percepc;ao sensfve1 envolve uma cognic;ao cia individualidadeabstraida da posir;ao atual da entidade enquanto fatorde urn fata, eia indubitavelmente envolve 0 pensamento. Mas se for concebida como apreensao sensfvel de urnfatar de urn fata, fatar esse competente para evocar aemoc;ao e a ac;ao investida de prop6sito sem 0 concursode uma cognic;ao, ela DaO envolve 0 pensamento. Nessecaso, 0 termo cia consciencia cia apreensao senslvel representa alga para a mente, mas nada para 0 pensarnento.Pode-se conjecturar que a percepr;ao sensivel de algumas farmas inferiores de vida se aproxime habitualmentedesse carater. Por vezes, tambem, nos momentos em quenossa atividade racional foi acalmada ate atingir urn estado de quietude, nossa percepc.;ao sensivel nao esta taolonge de a1canr;ar esse limite ideal.
a processo de discriminac.;ao na apreensao sensivel tern duas faces distintas. Existe a discriminac.;ao deum fato em partes e a discriminac.;ao de qualquer partede um fato enquanto exibic.;ao de relac.;oes para com entidades que nao sao partes do fato, embora sejam ingredientes do mesmo. Em outras palavras, 0 fato imediato para a apreensao e a ocorrencia da natureza emsua totalidade. Ea natureza enquanto evento presenteaapreensao sensivel e essencialmente passageiro. Einexequivel imobilizar a natureza e contemphi-Ia. Nao podemos redobrar nossos esforc.;os para aprimorar nosso
conhecimento do termo de nossa apreensao sensfvel presente; e nossa oportunidade subseqiiente na apreensaosensfvel subsequente que aufere 0 beneficio de nossa boaresoluc.;ao. Assim, 0 fato fundamental para a apreensaosensive1 e urn evento. A totalidade desse evento e pornos discriminada em eventos parciais. Estamos consciosde urn evento que e nossa vida corporal, de urn eventoque e 0 andamento da natureza no interior desta salae de urn conglomerado vagamente percebido de outroseventos parciais. Essa e a discriminac.;ao na apreensaosensive1 de urn fato em partes.
Empregarei 0 termo "parte" no sentido arbitrariamente limitado de urn evento que e parte do fato totalrevelado na apreensao.
A apreensao sensfvel tambem nos transmite outrosfatores da natureza que nao eventos. a azul-celeste, porexemplo, e visto como situado em urn evento determinado. Essa relac.;ao de situac.;ao exige uma discussao maisextensa, 0 que adiaremos para uma palestra futura. Aquestao presente ea de que 0 azul-celeste eencontradona natureza com uma nftida implicac.;ao em determinados eventos, mas nao e urn evento em si mesmo. Porconseguinte, existem na natureza, alem dos eventos, outros fatores que nos sao revelados diretamente na apreensao sensfvel. A concepc.;ao, no pensamento, de todos osfatores da natureza como entidades distintas imbufdasde re1ar;5es naturais definidas e alga que denomineialhures2 a "diversificac.;ao da natureza".
Ha uma conclusao geral a ser extraida da discussao precedente: a de que a primeira atribuic.;ao de uma
2, Cf. En.quiry.
22 o CONCEITO DE NATUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 23
filosofia da ciencia deve ser a de elaborar alguma classifica~ao geral das entidades a nos reveladas na percepc;ao senslvel.
Entre as exemplos de entidades acrescidas a "eventos" par nos utilizadas para fins ilustrativos estao os ediflcios do Bedford College, Homero e 0 azul-celeste. Evidentemente, trata-se de especies muito diversas de coisas,e e provavel que enunciados acerca de determinada especie de entidade nao sejam validos para as outras especies. Se 0 pensamento humano se processasse segundoo metodo ordenado que a logica abstrata the sugeriria,poderfamos ir mais adiante e afirmar que uma classificac;ao das entidades naturais deveria ser 0 passo inicialcia propria ciencia. Talvez voces se sintam inclinados aresponder que tal classifica~aoja foi empreendida e queo campo de interesse cia ciencia sao as aventuras das entidades materiais no espa~o e no tempo.
A historia da doutrina da materia ainda deve serescrita. E a historia da influencia da filosofia grega naciencia. Tal influencia originou-se de uma concepc;aoequivocada, de origem remota, quanta acondic;ao metaflsica das entidades naturais. A entidade foi separadado fator que constitui 0 termo da apreensao senslvel.Converteu-se no substrato de tal fator, enquanto 0 fator foi degradado a condi~ao de atributo da entidade.Dessa forma, introduziu-se na natureza uma distinc;aoque, em realidade, absolutamente naG existe. Considerada em si mesma, uma entidade natural nada mais edo que 0 fator de urn fato. Sua desconexao com rela~ao
ao complexo do fato e uma simples abstra~ao. Nao e 0
substrato do fator, mas 0 proprio fator em si tal comorevelado no pensamento. Portanto, aquilo que e urn me-
ro processo da mente na traduc;ao da apreensao sensfvel em termos do conhecimento discursivo foi transmutado em urn carater fundamental da natureza. Dessa forma, a materia se afigurou na qualidade de substrato metaffsico de suas propriedades e 0 curso da natureza e interpretado como a hist6ria da materia.
Platao e Aristote1es encontraram 0 pensamento grego preocupado com a busca das substancias simples emcujos termos 0 curso dos eventos poderia ser expresso.Podemos formular essa disposi~ao da mente na pergunta:De que e feita a natureza? As respostas que a genialidade de ambos os fil6sofos oferece a essa indagac;ao e, maisparticularmente, os conceitos subjacentes aos terrnos nosquais estruturaram suas respostas, determinaram os inquestionados pressupostos referentes a tempo, espa~o emateria que tern sido soberanos na ciencia.
Em Platao, as formas do pensamento sao mais fluidas que em Arist6teles e, por conseguinte, segundo meatrevo ajulgar, mais valiosas. Sua importancia consisteno testemunho que fornecem do pensamento cultivadoacerca da natureza antes que the tenha sido imposto urnmolde uniforme pela longa tradi~aoda filosofia cientlfica. No Timeu, por exemplo, existe urn pressuposto, expresso de modo urn tanto vago, de uma distin~ao entreo vir-a-ser geral da natureza e 0 tempo mensuravel danatureza. Em uma conferencia futura terei de distinguirentre 0 que denomino passagem da natureza e sistemastemporais particulares, que tornam manifestas certas caracterlsticas dessa passagem. Nao irei tao longe ao ponto de invocar Platao para urn apoio direto a essa doutrina, mas creio efetivamente que as partes do Timeu que
24 o CONCEITO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 25
tratam do tempo tornam-se mais claras se minha distin~ao for admitida.
Issa, no entanto, euma digressao. Por ora, minhapreocupac;ao esta voltada para a origem cia doutrina cientffica cla materia no pensamento grego. Declara Platao,no Timeu, que a natureza e feita de fogo e terra, tendoo ar e a agua como seus intermediarios, de sorte que"tal como 0 fogo epara 0 ar, assim e0 ar para a agua;e tal como 0 ar e para a agua, assim e a agua para aterra". Ele tambem sugere uma hip6tese molecular para esses quatro elementos. Segundo essa hip6tese, tudodepende cla forma dos atomos; para a terra, esta ecubica e para a fogo, piramidal. Os fisicos da atualidade estao novamente discutindo a estrutura do atomo e suaforma nao eurn fator desprezfve1 nessa estrutura. As suposi~6es de Platao se afiguram imbuidas de um canitermuito mais fantastica que a analise sistematica de Arist6te1es; sob certos aspectos, porem, sao mais valiosas.o arcabou~o geral de suas ideias e comparavel aqueleda ciencia moderna. Ele sistematiza conceitos que qualquer teoria de ftlosofia natural deve conservar e, em certosentido, explicar. Arist6teles formulou a questao fundamental quanta ao que entendemos por "substancia".Aqui, a rea~ao entre sua fila sofia e sua l6gica se processou de modo muito infeliz. Em sua l6gica, a tipo fundamental de proposi~ao afirmativa e a atribui~ao de umpredicado a urn sujeito. Nesse sentido, entre os diversos usos correntes do termo "substancia" que analisou,a enfase recai em seu significado como "0 substrato ultimo ao qual nenhum outro predicado e atribuido".
A aceita~ao inquestionavel da l6gica aristotelica conduziu a uma tendencia inveterada a se postular urn subs-
trato para tudo quanta e revelado na apreensao sensfvel, au seja, a dirigir a olhar abaixo daquilo de que estamos conscientes, em busca da substancia, no sentidoda "coisa concreta". Tal e a origem dos modernos conceitos cientfficos de materia e eter, ou seja, eles sao 0
produto desse insistente habito de postula~ao.
Nesse sentido, 0 eter foi inventado pela ciencia moderna como 0 substrato dos eventos disseminados peloespa~o e tempo para alem do alcance da materia comumponderavel. Pessoalmente, julgo a predica~ao uma no<;ao obscura a confundir relac;6es diferentes sob uma conveniente forma de expressao comum. Sustento, porexemplo, que a rela~ao do verde com uma folha de relva difere totalmente da relac;ao do verde com 0 evento,que e a hist6ria da existencia daquela folha par um certo periodo limitado de tempo, e difere da rela~ao da folha com tal evento. Em urn determinado sentido denomino evento a situac;ao do verde e, em outro sentido,asituac;ao da folha. Assim, em urn determinado sentido a folha e um carater ou propriedade que se pode tamar como predicativa da situac;ao e, em outro sentido,o verde e urn caniter ou propriedade do mesmo eventoque e tambern sua situa<;ao. Dessa forma, a predicac;aode propriedades encobre rela~6es radicalmente diferentes entre entidades.
Como conseqiiencia, a "substancia", que e urn terrno correlato a "predicac;ao", participa da ambigiiidade. Se pretendermos buscar substancia em toda parte,deveremos encontra-Ia em eventos que constituem, emcerto sentido, a substancia ultima da natureza.
Em sua moderna acepc;ao cientffica, a materia e urn
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retorno ao esfon;o jonieD de se determinar, no espa~o
e no tempo, a1gnm elemento do qual se comp6e a natureza. Possui ela uma significa~aomais refinada do queas primitivas suposi~6es envolvendo a terra e a agua emrazao de uma certa associa~ao vaga com a ideia aristotelica de substfmcia.
Terra, agua, ar, fogo e materia, e, por fim, 0 eter,estao re1acionados segundo uma sucessao direta no quediz respeito a seus caracteres de substratos ultimos danatureza. Dao testemunbo da imorredoura vitalidade dafliosofia grega em sua busca pelas entidades ultimas quesao as fatores dos fatos revelados na apreensao senslvel.Essa busca e a origem da ciencia.
A sucessao de ideias que se inicia nas toscas suposi~6es dos primeiros pensadores jonicos e termina no eteroitocentista nos faz lembrar que a doutrina cientifica damateria na verdade eurn hibrido, percorrido de passagem pela filosofia em seu trajeto rumo ao refinado conceito aristotelico de substancia e para 0 qual a cienciaretornou ao reagir contra as abstra~6es filos6ficas. A terra, 0 fogo e a agna da filosofiajonica e os elementos providos de forma no Timeu sao companiveis amateria eao eter da moderna doutrina cientffica. A substancia,todavia, representa 0 conceito filosafico final do substrata de qualquer atributo. A materia (na acep~ao cientifica) ja se encontra no espa~o e no tempo. Assim, amateria representa a recusa em recha'.;ar as caracteristicas espaciais e temporais e em chegar ao conceito simples de uma entidade individual. Foi essa recusa a responsave! pela confusao de se transpor 0 mero processodo pensamento para 0 fato da natureza. A entidade, des-
pida de todos os caracteres exceto aqueles do espac;o edo tempo, adquiriu uma condi'.;3.o ffsica de tessitura ultima da natureza, de sorte que 0 curso da natureza econcebido como as simples vicissitudes da materia emsua aventura pelo espa~o.
Assim, a origem da doutrina da materia e produtoda aceita~ao acritica do espa~o e do tempo como condi'.;oes externas da existencia natural. Nao pretendo dizercom isso que se deva lan~ar qualquer duvida sobre fatos do espa~o e do tempo enquanto ingredientes da natureza. Refiro-me, isso sim, 'lao pressuposto inconscientedo espa~o e do tempo como aquilo em que a naturezaesta a1ojada". :E esse exatamente 0 tipo de pressupostoque matiza 0 pensamento em qualquer rea'.;ao contra asutileza da critica filosafica. Minba teona referente aforma'.;ao da doutrina cientffica da materia e a de que, numprimeiro momento, a filosofia transformou ilicitamentea entidade pura e simples, que nao passa de uma abstra'.;ao necessaria ao metodo do pensamento, no substrato metafisico desses fatores na natureza que, sob varios aspectos, sao consignados a entidades enquanto seusatributos; e que, num segundo passo, os cientistas (incluindo os filasofos que eram cientistas), ignorando consciente ou inconscientemente a filosofia, tomaram essesubstrato como pressuposto, qua substrato de atributos,como, nao obstante, existente no tempo e no espa'.;o.
Isso eseguramente uma confusao. 0 ser completoda substancia ecomo urn substrato para atributos. Porconseguinte, tempo e espac;o deveriam ser atributos dasubstancia. 0 que e1es claramente DaO sao, se a materiafor a substancia da natureza, uma vez que eimpossive!expressar verdades espa'.;o-temporais sem recorrer a rela-
28 o CONCEITO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 29
~6es envolvendo termos outros que naa fra~6es de materia. Deixo de lado este ponto, todavia, para chegar emoutro. Nao ea substancia que existe no espa~o, mas siroas atributos. 0 que encontramos no espac;o sao 0 vermelho da rosa, a aroma do jasmim e a rufdo do canhao.Todos ja indicamos a urn dentista onde esta nossa darde dente. Portanto, a espa~o nao e uma rela~ao entresubstancias, mas siro entre atributos.
Assim, meSilla se admitirmos aos adeptos cia substancia a permissao em coneeher a substancia COmomateria, efraudulento introduzir sorrateiramente a substancia no espa~o sob a alega~ao de que a espa~o expressa relac;5es entre substancias. Aprimeira vista, 0 espac.;o nada tern a veT com substancias, mas tao-somentecom seus atributos. 0 que guera dizer e que se optarmos - a meu veT erroneamente - por interpretar n08sa experiencia cia natureza como uma apreensao dosatributos das substancias, essa teoria nos impossibilitani encontrar quaisquer relac;5es anaIogas diretas entreas substancias tais como reveladas em nossa experiencia. a que efetivamente encontramos sao relac;5es entre os atributos das substancias. Portanto, se a materiafor tida como substancia no espa~o, a espa~o no qualela se encontra pouco tern a ver com 0 espac;o de nossaexperiencia.
o argumento acima foi expresso em termos da teoria relacional do espa~o. Mas se a espa~o for absoluto- ou seja, se possuir urn ser independente das coisasnele contidas -, 0 curso do argumento pouco se altera.Isso porque as coisas existentes no espac;o devem guardar uma certa rela~ao fundamental com a espa~o, aqualdenominamos ocupac;ao. Assim, ainda se mantem a obje-
c;ao de que 0 que observamos enquanto relacionados aoespac;o sao os atributos.
A doutrina cientffica da materia e sustentada conjuntamente com uma teoria absoluta do tempo. 0 mesrna raciocfnio adotado para as rela~6es entre espa~o emateria aplica-se as relac;5es entre tempo e materia. Existe no entanto (na filosofia corrente) uma diferen~a entre as rela~6es entre espa~o e materia e entre tempo emateria, a qual passarei a explicar.
o espa~o nao e uma mera ordena~aode entidadesmateriais de modo tal que cada entidade individual guarda determinadas rela~6es com outras entidades materiais. A ocupac;ao do espac;o imprime urn certo caniter acada entidade material isoladamente. Dada a sua ocupac;ao do espac;o, a materia tern extensao. Dada a sua extensao, cada porc;ao de materia e divisfve! em partes ecada parte e uma entidade numericamente distinta detodas as outras partes. Consequentemente, a irnpressaoque se tern e que cada entidade material nao constituide fato uma entidade, mas uma multiplicidade essencial de entidades. Parece nao haver fim nessa dissocia~ao da materia em multiplicidades, a nao ser ao se identificar cada entidade ultima a ocupar urn ponto individual. Essa multiplicidade essencial de entidades materiais certamente nao e aquilo que prega a ciencia e tarnpouco corresponde a coisa algurna revelada na apreensaosensfvel. Eabsolutamente necessaria que se imponha urnfim em determinado estagio dessa dissocia~ao e que asentidades materiais assim obtidas sejam tratadas comounidades. 0 estagio da interrup~ao pode ser arbitrarioou estipulado pelas caracteristicas da natureza; todo raciocfnio cientffico, todavia, termina por deixar de lado
30 o CONCEITO DE NA TUREZA NA TUREZA E PENSAMENTO 31
sua analise espacial e formular a si meSilla 0 seguinteproblema: "Eis aqui uma entidade material; 0 que estara acontecendo com e1a enquanto entidade unitaria?"Contudo, essa entidade material conserva ainda sua extensao, e assim estendida ernera multiplicidade. Existini,portanto, uma propriedade atomica essencial na natureza,independente da dissocia<;ao da extensao. Existini algouno em si meSilla e que emais do que a reuniao 16gicadas entidades que ocupam os pontos do volume ocupadopela unidade. Na verdade, podemos perfeitamente nosmostrar ceticos quanta a essas entidades wtimas em pontos,e por em duvida se tais entidades existem realmente. Elaspossuem 0 canlter suspeito de sermos Ievados a aceitalas pela l6gica abstrata e nao polo fato observado.
o tempo (na filosofia corrente) nao exerce 0 mesrna efeito desintegrador sabre a materia que 0 ocupa.Se a materia ocupa uma dura<;ao do tempo, a totalidade da materia ocupa cada parte dessa dura<;ao. Assim,a rola<;ao entre materia e tempo difere daquela entre materia e espa<;.o, tal como expressa na filosofia cientfficacorrente. Existe, obviamente, uma dificuldade maisacentuada em se conceber 0 tempo como 0 produto dasrola<;aes entre diferentes por<;aes de materia do que naconcep<;ao analoga de espa<;o. Em urn dado instante, diferentes volumes de espa<;o sao ocupados por diferentesporc;oes de materia. Conseqiientement~,nao existe nenhuma dificuldade intrfnseca, ate aqui, em se conceberque 0 espa<;o nada mais e do que a resultante de rela<;oes entre as porc;5es de materia. No tempo unidimensional, contudo, a mesma por<;ao de materia ocupa diferentes porc;oes de tempo. Por conseguinte, deveria ser
passfve1 expressar 0 tempo em termos das re1ac;oes deuma pon;ao de materia consigo mesma. Meu ponto devista pessoal e de uma cren<;a na teoria re1acional tantodo espa<;o como do tempo e de uma descren<;a na formacorrente da tearia relacional do espa<;o, que exibe par<;oes de materia como as termos relacionais para as relac;oes espaciais. Os legftimos termos re1acionais sao eventos. A distin<;ao que acabei de apontar entre tempo eespa<;o em sua re1ac;ao com a materia torna evidente quequalquer assimila<;ao do tempo e do espa<;o nao pode seprocessar segundo a linha tradicional de se tomar a materia por eJemento fundamental na farma<;ao do espa<;o.
Durante seu desenvolvimento peJo pensamenta grego, a filasofia da natureza enveredou por urn caminhoequivocado. Esse pressuposto erroneo e vago e fluido noTimeu de Platao. As bases gerais do pensamento aindanao foram comprametidas e podem ser consideradas como simplesmente se ressentindo da falta de explica<;aodevida e de enfase na defesa desse pensamento. N a exposic;ao de Arist6te1es, contudo, as concepc;oes correntesforam consolidadas e olucidadas, de modo a produziruma analise falha da rela<;ao entre a materia e a formada natureza tais como reveladas na apreensao sensfvel.o termo "materia", nessa frase, nao e empregada emsua acepc;ao cientffica.
Concluirei minha explana<;ao guardando-me deuma compreensao equivocada. Eevidente que a doutrina corrente da materia cultiva uma certa lei fundamental da natureza. Qualquer exemplo simples podeilustrar 0 que pretendo dizer. Em urn museu, par exemp10, urn especime qualquer e trancado com seguran<;aem uma caixa de vidro. Ali ele permanece por anos a
32 o CONCE/TO DE NA TUREZA
fio: sua cor se esvanece e talvez se rampa em peda<;os.M.as sera 0 meSilla especime; e as mesmos elementos qufmIcas e as mesmas quantidades de tais elementos estafaD presentes na caixa ao final, assim como 0 estavamno infcio. 0 engenheiro e 0 astronomo, par sua vez lidam com movimentos de reais permanencias' na n~tureza. Qualquer teoria da natureza que por algum instante perea de vista esses importantes fatos basicos ciaexperiencia esimplesmente nescia. Mas pode-se ressaltar que a expressao cientffica desses fatos terminou enredada no emaranhado de uma metaffsica duvidosa eque, quando removemos a metaffsica enos lan<;amoscom fOlego renovado a uma investiga~ao imparcial danatureza, uma nova luz e lanc;;ada sabre uma serie deconceitos fundamentais que dominam a ciencia e orientam 0 desenvolvimento cia investigac;ao.
CAPITULO II
TEORIAS DA BIFURCAQAoDA NATUREZA
Em minha conferencia anterior, critiquei 0 conceitode materia como a subst5ncia cujos atributos sao percebidos por nos. Tal modo de considerar a materia constitui, penso eu, a razao historica de sua introdu~ao naciencia - e e ainda a vaga concep~ao desse modo, nabase de nossos pensamentos, que leva a doutrina cientffica corrente a se afigurar taq obvia. Ou seja, concebemos a nos mesmos como percebendo atributos de coisas, e sao por~6es de materia as coisas cujos atributos
percebemos.No seculo XVII, a doce simplicidade desse aspec
to da materia foi alvo de urn duro golpe. As doutrinascientfficas da propaga~ao encontravam-se na epoca emprocesso de elabora~ao e, por volta do fim do seculo,ja eram inquestionaveis, muito embora suas formas particulares tenham sido modificadas desde entao. a estabelecimento dessas teorias da propaga~ao marca umaguinada na rela~ao entre ciencia e filosofia. As doutri-
34 a CONCE/TO DE NA TUREZA TEaR/AS DA B/FURCA9AO DA NA TUREZA 35
nas as quais me refiro especialmente sao as teorias cialuz e do sam. Nao tenho a menor duvida de que as teorias em questao ja tinham uma existencia vaga e ocasional anterior, como sugestoes evidentes ditadas pelosensa cOillum; pais que nada no pensamento jamais enovo de todo. Naquela epoca, porem, foram sistematizadas no sentido das ciencias exatas e todas as suas conseqiiencias, implacavelmente deduzidas. E a estabelecimenta desse processo de se tamar seriamente as conseqiiencias que marca a legftima descoberta de uma teoria.Doutrinas sistematicas da luz e do som como fenomenosprovenientes de corpos emissores foram definitivamenteestabelecidas, tendo Newton, em particular, exposto deforma inequivoca a relac;ao entre a luz e a cor.
o resultado aniquilou par completo a simplicidade da teoria da percep~ao baseada no binomio "substancia e atributo". Aquila que enxergamos depende daluz que penetra a olho. Ademais, sequer percebemos aque penetra a olho. As coisas transmitidas sao ondas au- como julgava Newton - partfculas diminutas, as coisas percebidas sao cores. Locke enfrentou essa dificuldade atraves de uma teoria de qualidades primarias esecundarias. Segundo ela, existem alguns atributos damateria que nos sao perceptiveis. Tais atributos constituem as qualidades primarias, enquanto outras coisasha que percebemos, como as cores, que nao sao atributos da materia, mas sao por nos percebida,s como sendotais atributos. Sao as qualidades secundarias da materia.
Par que percebemos as qualidades secundarias? Parece uma contingencia bastante infeliz a de percebermosmuitas coisas que nao se encontram presentes. Enisso,porem, que verdadeiramente redunda a teoria das quali-
dades secundarias. Reina hoje na filosofia e na cienciauma apatica aquiescencia com a conclusao de que eimpossivel produzir qualquer relato coerente da naturezatal como nos e revelada na apreensao sensfvel, sem trazer Ii baila, de maneira for~ad'1-, as rela~oes da mesmacom a mente. 0 relato contemporaneo da natureza naoe, como deveria ser, urn mero relato daquilo que a menteconhece acerca da natureza, mas e tambem confundidocom urn relato acerca da aC;ao da natureza sobre a mente. 0 resultado tern sido desastroso, tanto para a ciencia como para a filosofia, mas sobretudo para a filosofia. 0 grande tema das rela~oes entre natureza e mentese transformou na forma amesquinhada da intera~aoentre 0 corpo e a mente humanos.
A polemica de Berkeley contra a materia baseouse nessa confusao introduzida pela teoria da propaga~ao da luz. Ele advogava - justificadamente, a meu ver- 0 abandono da doutrina da materia em sua formapresente. Mas nada tinha a propor em substitui~ao,exceto uma teoria quanta arelac;ao das mentes finitas coma mente divina.
A meta a que nos propomos nestas conferencias,contudo, e a de nos atermos anatureza propriamentedita e nao jornadear para alem de entidades reveladasna apreensao sensfvel.
A percipiencia em si mesma e tida como pressuposta. Na verdade, chegamos a considerar as condi~oes
para a percipiencia, mas apenas ate onde tais condi~oes se encontram entre as dados revelados pela percepc;ao. Deixamos a cargo cia metaffsica a sintese entre acognoscente e 0 cognito. Se faz necessaria, para que alinha de argumentac;ao dessas conferencias se tome com-
36 o CONCEITO DE NATUREZA TEORIAS DA BIFURCA9AO DA NATUREZA 37
preensivel, alguma explica~ao e defesa adicionais dessaposi~ao.
A tese imediata para discussao ea de que qualquerinterpreta~aometafisica euma intromissao ilicita na seara da filosofia da ciencia natural. Par interpreta~aometafisica refiro-me a qualquer discussao do como (paraalem da natureza) e do porque (para alem da natureza)do pensamento e cia apreensao sensivel. Buscamos, nafilosofia cia ciencia, as no~oes gerais que se aplicam anatureza, au seja, aquila de que estamos conscios atrayes da percep~ao.Trata-se da filosofia da coisa percebicia, e naD cleve ser confundida com a metaffsica cia realidade, cujo alcance inclui tanto a perceptor como a coisapercebida. Nenhuma perplexidade referente ao objetodo conhecimento pode ser solucionada pela afirma~ao
de que existe uma mente a canhece-lo t .
Em outras palavras, ea seguinte a premissa adotada: a apreensao sensivel e uma apreensao de alga. Qualsera, entao, 0 carater geral daque1e alga por nos apreendido? A pergunta nao se refere itquele que percebe auao processo, mas acoisa percebida. Enfatizo este pontoporgue as discuss5es acerca cia filosofia cia ci(~ncia saoamiude extremamente metafi'sicas - em grande detrimento do tema, na minha opiniao.
o recurso a metaffsica e como lanc;ar urn fosforoaceso em urn dep6sito de p61vora. Tudo vai pelos ares.E exatamente isso 0 que fazem os filosofos cientfficosquando se veem lanc;ados em urn beeo sem saida e censurados por incoereneia. De imediato trazem a mente
1. Cf. Enquiry, prefacio.
it baila e se poem a falar de entidades da mente au exteriores a mente, conforme 0 caso. Para a filosofia natural, tudo quanto e percebido encontra-se na natureza.Nao podemos empreender uma selec;ao rigorosa. Paran6s, a fulgor avermelhado do poente deve ser parte taointegrante da natureza quanto 0 sao as moltkulas e asondas eletricas par intermedio das quais as homens daciencia explicariam 0 fenomeno. Cabe afilosofia natural analisar como esses diferentes elementos da natureza se interligam.
Ao fazer essa exigencia, julgo-me adotando nossaatitude instintiva imediata para com 0 conhecimento perceptual, que somente e abandonado sob influencia dateoria. Somos instintivamente inclinados a acreditar que,mediante a devida atenc;ao, a natureza pode se revelara nos para alem do observado aprimeira vista. Mas naonos contentaremos com menos. 0 que pedimos da filosofia da ciencia e algum relato acerca da coerencia dascoisas conhecidas atraves da percep~ao.
Isso significa uma recusa a sustentar qualquer teoriade acrescimos psfquicos ao objeto conhecido pela percep~ao. Seja urn dado da percep~ao,par exemplo, a grarna verde, urn objeto que conhecemos como ingredienteda natureza. A teoria dos acrescimos psiquicos tratariao verdor como urn acrescimo psiquico fornecido pelamente perceptiva e reservaria anatureza meramente asmoIeculas e a energia radiante que influenciam a mente no sentido de tal percep~ao. Meu argumento e a deque essa introdu~ao for~ada da mente como capaz deempreender acrescimos proprios acoisa oferecida ao conhecimento pela apreensao sensivel nao passa de umaforma de evitar a problema da fl1osofia natural. Tal pro-
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I
blema consiste em discutir as rela~6es inter se das coisas conhecidas, abstraidas do fato puro e simples de serem conhecidas. A filosofia natural jamais deve indagar 0 que esta na mente e 0 que esta na natureza. Talprocedimento seria uma confissao de sua inepcia em expressar relat;5es entre coisas perceptivamente conhecidas, ou seja, expressar aquelas rela-;6es naturais cujaexpressa.o constitui a filosofia natural. Pode se dar quea incumbencia seja demasiado ardua para n6s, que asrela~5es sejam por demais complexas e variadas paranossa apreensao ou triviais em demasia para merecerem 0 incomodo de uma exposi~ao. Everdade, sem duvida, que percorremos tao-somente urn trecho muito pequeno no sentido da formula~ao adequada de tais rela<;oes. No minima, porem, naD nos dispomos a ocultaro insucesso sob uma teoria cia a<;8.o coadjuvante cia mente perceptiva.
o alvo de meu protesto e essencialmente a bifurca~ao da natureza em dois sistemas de realidade os,quais, conquanto sejam reais, sao reais em sentidos diferentes. Uma realidade seriam as entidades como os eletrons, objeto de estudo da fisica especulativa. Essa seriaa realidade oferecida ao conhecimento, muito emboranessa teoria ela jamais seja conhecida. 1sso porque 0 passIvel de cognic;ao e a outra especie de realidade, a ac;aocoadjuvante da mente. Existiriam, portanto, duas naturezas: uma e a conjetura e a outra,-o sonho.
Outro modo de enunciar essa teoria contra a qualestou argumentando e bifurcar a natureza em dois segmentos, a saber, a natureza apreendida pela percepc;aoe a natureza que e a causa da percepc;ao. A natureza,enquanto fato apreendido pela percep~ao, traz dentro
de si 0 verdor das arvores, 0 gorjeio dos passaros, a calidez do sol, a rigidez das cadeiras e a sensaC;ao do veludo ao tatoo A natureza enquanto causa da apreensao eo sistema hipotetico de moleculas e eletrons que afetaa mente de modo a produzir a apreensao da naturezaaparente. 0 ponto de convergencia dessas duas naturezas e a mente, sendo a natureza causal influente e a natureza aparente, efluente.
Existem quatro quest5es referentes a essa teoria dabifurca~ao da natureza que de pronto se prestam a discussao. Dizem respeito a (i) causalidade, (ii) ao tempo,(iii) ao espa~o e (iv) as ilus5es. Sao quest5es que, emverdade, nao podem existir separadamente. Constituemapenas quatro pontos de partida distintos a partir dosquais se pode passar a discussao da teoria.
A natureza causal e a influencia sobre a mente queea causa da efluencia da natureza aparente a partir damente. Essa concepC;ao da natureza causal nao deve serconfundida com a concep~ao distinta de uma parte danatureza enquanto a causa de outra parte. Por exemplo, 0 ardor do fogo e a transmissao do calor a partirdeste atraves do espac;o intermedio sao a causa que levao corpo, seus nervos e seu cerebro, a funcionar de determinadas maneiras. Mas esta nao e uma ac;ao da natureza sobre a mente. Trata-se de uma interac;ao interna anatureza. A causac;ao envoIvida nessa interac;ao euma causac;ao cujo sentido difere da influencia desse sistema de interac;5es corp6reas, interno anatureza, sobrea mente que the e estranha e que, mediante tal influencia, percebe a vermelhidao e 0 calor.
A teoria da bifurca~aoe uma tentativa de apresentar a ciencia natural como uma investigac;ao quanta a
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causa do fatD do conhecimento, vale dizer, tenta apresentar a natureza aparente como uma efluencia cia mente devida a natureza causal. Toda essa no~ao baseia-separcialmente na admissao implfcita de que a mente s6pode conhecer aquilo que ela mesma produziu e de alguma forma conserva dentro de si, embora exija umarazao extrfnseca tanto para originar como para determinar 0 carater de sua atividade. Ao considerarmos 0
conhecimento, porem, devemos abolir essas metaforasespaciais, como "interno amente" e "externo amente". a conhecimento euma instancia ultima. Nao sepode explicar 0 "porque" do conhecimento; s6 podemos descrever 0 "que?" do conhecimento. au seja, podemos analisar 0 conteudo e suas relac;oes internas, masnao podemos explicar por que existe 0 conhecimento.A natureza causal, portanto, e uma quimera metaffsica, embora se fa~a necessaria uma metaffsica cujo alcance transcenda a limita~ao da natureza. 0 objetivode uma tal ciencia metaffsica nao e explicar 0 conhecimento, mas expor, em sua mais absoluta completude,nosso conceito de realidade.
Cumpre-nos admitir, no entanto, que a teoria dacausalidade da natureza tern urn sequito respeitavel. Arazao pela qual a bifurca~ao da natureza esta repetidamente se insinuando pela filosofia cientifica e a extrema dificuldade em apresentar a vermelhidao e a calidezpercebidas no fogo em urn sistema unico.de rela~oes comas agitadas moleculas de carvao e oxigenio, com a energia que deles se irradia e com as diversas atividades docorpo material. A menos que se produzam essas rela~oes de abrangencia total, defrontarno-nos com uma natureza bifurcada, ou seja, calidez e vermelhidao por urn
(
lado, e moleculas, eletrons e eter do outro. Assim, osdois fatores sao explicados como sendo respectivamentea causa e a reaC;ao da mente a causa.
o tempo e 0 espa~o aparentemente forneceriam essas rela~6es de abrangencia total exigidas por aquelesque defendem a filosofia da unidade da natureza. A vermelhidao percebida no fogo e 0 calor estao definitivamente relacionados no tempo e no espa~o as moleculasdo fo((o e as moleculas do corpo.
E pouco mais que urn exagero desculpavel dizer quea determina~ao do significado da natureza se reduz precipuamente adiscussao do carater do tempo e do caraterdo espa~o. Em conferencias subsequentes, explicarei meuponto de vista do tempo e do espa~o. Esfor~ar-me-eiemdemonstrar que constituem abstrac;oes a partir de elementos mais concretos da natureza, isto e, dos eventos.A discussao dos detalhes do processo de abstra~ao apresentara 0 tempo e 0 espa~o como interligados e, por fim,nos levara ao tipo de re1a~oes entre seus dimensionarnentos que se verifica na moderna teoria da relatividade eletromagnetica. Mas isso e antecipar nossa linha de desenvolvimento. Por ora, quero considerar 0 modo como as concep~oes usuais de tempo e espa~o contribuem,ou deixam de contribuir, para unificar nossa concep~ao
da natureza.Primeiramente, consideremos as teorias absolutas
do tempo e do espa~o. Consideraremos cada urn, istoe, tempo e espac;o, como urn sistema separado e independente de entidades, cada sistema conhecido por nosem si e por si mesmo, simultaneamente a nosso conhecimento dos eventos da natureza. 0 tempo e a sucessaoordenada de instantes desprovidos de dura~ao; instantes
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esses que nos sao conhecidos meramente como as termas cia rela\=ao serial que ea rela~ao ordenadora do tempo, rela'Yao essa, por sua vez, que somente nos econhecida como referente aos instantes. Em outras palavras,a rela'Yao e os instantes nos sao conhecidos conjuntamenteem nossa apreensao do tempo, cada urn implicando 0
Dutro.Tal ea teoria absoluta do tempo - e confesso que
me parece bastante implausfvel. Em meu conhecimentopessoal nao ha nada que corresponda ao tempo puro esimples da teoria absoluta. 0 tempo me econhecido comouma abstra~aoderivada da passagem dos eventos. 0 fatofundamental que torna possive! essa abstra~aoea passagem cia natureza, seu desenvolvimento, seu avaniYo cnativo; e, combinado a esse fata, temos Dutra caracteristicacia natureza, a saber, a relaiYa.o extensiva entre as eventos.Esses dais fatos, quais sejam, a passagem dos eventos ea extensao dos eventos uns sabre as outros, sao, em minha opiniao, as qualidades a partir das quais 0 tempoe 0 espa~o se originam como abstra~6es. Mas isso eantecipar minhas pr6prias especula~6es futuras.
Por ora, retornando ateoria absoluta, admitiremosque 0 tempo nos e conhecido independentemente dequaisquer eventos no tempo. 0 que acontece no tempo ocupa tempo. Essa rela~ao dos eventos com 0 tempoocupado, ou seja, essa rela~ao de ocupa~ao, e uma rela~ao fundamental da natureza do tempo. Portanto, ateoria exige que estejamos conscientes de duas rela~6es
fundamentais: a rela~ao ordenadora do tempo, entre osinstantes, e a rela~ao de ocupa~ao do tempo, entre os instantes do tempo e os estados da natureza ocorridos nesses instantes.
Existem duas considera~6esque prestam substancial apoio it teoria dominante do tempo absoluto. Emprimeiro lugar, 0 tempo se estende para alem da natureza. Nossos pensamentos estao situados no tempo. Porconseguinte, parece impossivel derivar 0 tempo simplesmente das rela~6es entre elementos da natureza. N essecaso, as rela~6es temporais nao poderiam relacionar pensamentos. Assim, para lan~ar mao de uma metafora, 0
tempo aparentemente teria raizes mais profundas na realidade do que a natureza. Isso porque podemos imaginar pensamentos relacionados no tempo sem nenhumapercep~ao da natureza. Podemos imaginar, por exemplo, urn dos anjos de Milton cujos pensamentos se sucedem no tempo, e que casualmente nao percebeu queo Altissimo criou 0 espa~o e ali alojou urn universo material. A bern da verdade, creio que Milton colocou 0
espa~o no mesmo nivel absoluto que 0 tempo. Mas issonao deve perturbar nosso exemplo. Em segundo lugar,e diffcil derivar da teoria relativista 0 legitimo caraterserial do tempo. Cada instante eirrevogavel. Jamais podereincidir, pelo pr6prio carater do tempo. Mas se na teoriarelativista urn instante de tempo e simplesmente 0 estado da natureza naquele momento, e a rela~ao ordenadora do tempo, simplesmente a rela~ao entre esses estados, 0 carater irrevogave1 do tempo pareceria significarque urn estado atual da natureza como urn todo jamaispode retornar. Admito pare~a pouco provave! que alguma vez se verificasse tal recorrencia ate 0 minimo detalhe, mas nao ea extrema improbabilidade que esta emquestao. Nossa ignorancia e tao abissal que nossos juizos acerca da probabilidade e da improbabilidade deeventos futuros pouco conta. A questao verdadeira eque
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a exata recorrencia de urn estado da natureza parece meramente improvave1, enquanto a recorrencia de urn instante do tempo viola todo 0 nosso conceito de ordem temporal. Os instantes do tempo que passaram sao passadoe jamais podem tornar a ser.
Qualquer teoria alternativa do tempo deve ter emconta essas duas considera~oes, verdadeiros sustentaculosda teoria absoluta. Contudo, nao prosseguirei agora emsua discussao.
A teoria absoluta do espa<;o e aniiloga acorrespondente teoria do tempo, embora sejam mais frageis as razoes para sustenta-Ia. 0 espa~o, segundo essa teoria, eurn sistema de pontos desprovidos de extensao, que constituem as termos das re1a<;6es ordenadoras do espa<;o tecnicamente combinaveis em uma unica re1a~ao. Tal rela~ao nao organiza os pontos em uma serie linear analogamente ao metoda simples da re1a<;ao ordenadora dotempo com respeito aos instantes. As caracterfsticas 16gicas essenciais dessa re1a<;ao da qual todas as propriedades do espa<;o derivam sao expressas pe10s matematicos nos axiomas da geometria. Com base nesses axiomas2, tal como estruturados pelos matematicos modernos, e possIve1 deduzir a ciencia da geometria em suatotalidade, atraves do mais estrito raciodnio 16gico. Osdetalhes desses axiomas nao nos dizem respeito no momenta. Os pontos e as rela~oes nos Sa? conhecidos conjuntamente em nossa apreensao do espa<;o, cada qualimplicando a outro. Aquila que se da no espa<;o ocupa
2. Cf. (por exemplo) Projective Geometry de Veblen e Young, vol. i. 1910,vol. ii. 1917, Ginn and Company, Boston, EVA.
espa<;o. Essa rela<;ao de ocupa<;ao norrnalmente nao e formulada para eventos, mas para objetos. Dir-se-ia, parexemplo, que a estatua de Pompeu ocupaespa<;o, mas naoa evento que foi a assassinato de Julio Cesar. Nesse particular, creio que a costume habitual e infeliz e sustento queas relac;6es dos eventos com 0 espac;o e com 0 tempo sao,sob todos os aspectos, anaIogas. Mas iSBa euma intromissao de meus pareceres pessoais, que deverao ser discutidos em conferencias futuras. A teoria do espa<;o absoluto,assim, exige que atentemos a duas rela<;6es fundamentais:a relac;ao ordenadora do espac;o, que se cia entre pontos,e a rela<;ao de ocupa<;ao do espa<;o entre as pontos de objetos espaciais e materiais.
Essa teoria careee dos dais principais sustentaculosda teoria correspondente do tempo absoluto. Em primeiro lugar, a espa<;o nao se estende para alem da naturezano sentido em que 0 tempo aparentemente 0 faz. Nossospensamentos nao parecem ocupar espac;o exatamente ciamesma forma essencial como ocuparn 0 tempo. Por exempIo, estive pensando em uma sala e, nessa medida, meuspensamentos estao situados no espac;o. Mas afigura-se urncontra-senso indagar 0 volume que ocupavam da sala, querse tratasse de urn metro cubico ou urn centfmetro cubico,ao passo que os mesmos pensamentos ocupam uma determinada dura~aode tempo, digamos, das onze as doze deuma determinada data.
Assim, enquanto as re1a~5es de uma teoria re1ativista do tempo sao necessarias para relacionar pensamentos,nao parece tao 6bvio que as re1a~5es de uma teoria relativista do espa<;o sejam necessarias para re1aciona-Ios. A liga<;ao entre pensamento e espa<;o parece imbufda de umcerto carater de indiretividade aparentemente ausente naliga<;ao entre pensamento e tempo.
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Tambem 0 carater irrevogavel do tempo pareee naGter nenhum paralelo com 0 espac;o. Na teoria relativista, 0 espac;o e0 produto de determinadas relac;oes entreobjetos que normalmente se diz situados no espac;o; esempre que existirem as objetos, assim re1acionados, existid. 0 espa,o. Nenhuma dificuldade parece surgir comoaquela dos inconvenientes instantes do tempo que poderiam, hipoteticamente, tornar a se apresentar quando imaginavamos estar livres deles.
A teoria absoluta do espa,o nao desfruta agora deampla popularidade. 0 conhecimento do espa,o puroe simples, como urn sistema de entidades por nos conhecido em si e por si, independentemente de nossoconhecimento dos eventos cia natureza, DaD pareee corresponder a coisa alguma de nossa experiencia. 0 espaeyo, a exemplo do tempo, pareceria ser uma abstra<;aocom base em eventos. Segundo minha teoria pessoal,e1e apenas se diferencia do tempo em urn estagio algodesenvolvido do processo abstrativo. 0 modo mals usualde expressar a teoria relacional do espac;o seria considerar 0 espac;o como uma abstra~ao a partir das rela~6es
entre os objetos materiais.Imaginemos agora que admitimos urn tempo e urn
espa,o absolutos. Qual 0 significado desse pressupostono conceito de uma natureza bifurcada em natureza causal e natureza aparente? Sem duvida, a separa~ao entreas duas naturezas encontra-se agora largamente atenuada. Podemos prove-las de dois sistemas de rela,6es emcomum, pois e admissivel presumir que ambas as naturezas ocupem 0 mesmo espa~o e 0 mesmo tempo. A teoria agora e a seguinte: os eventos causais ocupam determinados perfodos do tempo absoluto e determinadas
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posi~6es do espa~o absoluto. Tais eventos influenciama mente que, em consequencia, percebe determinadoseventos aparentes que ocupam determinados periodosno tempo absoluto e determinadas posi,6es do espa,oabsoluto; e os periodos e as posi,6es ocupadas pelos eventos aparentes guardam uma rela~ao determinada comos perfodos e as posi,6es ocupadas pelos eventos causais.
De resto, os eventos causals definidos produzem para a mente eventos aparentes definidos. As ilus6es saoeventos aparentes surgidos em perlodos temporais e posi~oes espaciais sem a interven~ao desses eventos causais que sao pr6prios para influenciar a mente no sentido de sua percep,ao.
A teoria e perfeitamente 16gica em sua totalidade.Nas discussoes presentes, naopodemos esperar levar umateoria infundada a uma contradi,ao 16gica. Urn argumentador, aparte meros resvalos, apenas se envolve emuma contradi,ao quando em busca de uma reductio adabsurdum. 0 motivo substancial para a rejei,ao de umateoria filos6fica eo"absurdum" ao qual a mesma nosreduz. No caso da filosofia da ciencia natural, 0 unico"absurdum" possivel e 0 de nosso conhecimento perceptivo nao possuir 0 carater a ele atribufdo pe1a teoria.Se nosso oponente afirma que seu conhecimento possuital carater, resta-nos tao-somente - uma vez assegurado de maneira inequivoca que nos compreendemos mutuamente - concordar ou divergir. Nesse sentido, a tarefa primordial de urn comentador ao enunciar uma teoria da qual desacredita eapresenta-Ia como l6gica. Naoe ali que reside 0 seu problema.
Permitam-me sintetizar as obje~oes anteriormentefonnuladas a essa teoria da natureza. Em primeiro lugar,
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ela busca elucidar a causa do conhecimento da coisa conhecida em vez de buscar elucidar 0 canher cia coisaconhecida; em segundo lugar, eia admite urn conhecimento do tempo em si, a parte dos eventos relacionados no tempo; em terceiro, admite urn conhecimento doespa-;o em si, separado dos eventos re1acionados no espa<;o. Somam-se a essas obje<;6es outras falhas na teoria.
Podemos lan<;ar alguma luz sobre a condi<;ao artificial da natureza causal nessa teoria indagando por quepressupor que a natureza causal ocupe tempo e espa<;o.1sso traz atona a questao fundamental de sabermos quaiscaracterfsticas cleve tef a natureza causal em COillum coma natureza aparente. Por que - llessa teoria - deveriaa causa, que influencia a mente a percep.yao, ter algurna caracterfstica em COillum com a natureza aparenteefluente? Por que haveria, em particular, de estar situadano espa<;o? Por que haveria de estar situada no tempo?E, num sentido mais genedco, que conhecimento detemos acerca cia mente que nos autorize a inferir quaisquer caracterfsticas particulares de uma causa que deveria influenciar a mente no sentido de efeitos particulares?
A transcendencia do tempo para alem da naturezaoferece uma tenue razao para se presumir que a natureza causal deva ocupar tempo. Pois se a mente ocupaperfodos de tempo, pareceria haver algum motivo vagopara se presumir que as causas influentes ocupam os mesmos periodos de tempo ou, no minima, periodos estreitamente re1acionados aos perfodos mentais. Mas se amente naa ocupa volumes de espa<;o, parece nao havermotivo para que a natureza causal deva ocupar algumvolume do espa<;o. Assim, 0 espa<;o se afiguraria uma
mera aparencia, no mesmo sentido em que a naturezaaparente e mera aparencia. Conseqiientemente, se aciencia esta de fato investigando as causas atuantes namente, pareceria inteiramente descabido presumir queas causas que busca tenham re1a<;6es espaciais. De resto, nada mais existe, em nosso conhecimento, analogoa essas causas que influenciam a mente apercepc;ao. Assim, naa existe, alem do fato irrefletidamente presumido de que ocupam tempo, realmente base alguma quenos permita determinar qualquer ponto de seu carater.Elas devem permanecer eternamente desconhecidas.
Admitirei agora como urn axioma que a ciencia naoeurn conto de fadas. Nao se dedica a investigar entidades incognosdveis de propriedades arbitrarias e fantasticas. De que se ocupa entao a ciencia, admitinda queesteja empreendendo algo de importante? Minha resposta e a de que a ciencia esta determinando 0 caraterde coisas conhecidas, vale dizer, 0 caniter da naturezaaparente. Mas podemos e1iminar 0 termo "aparente" ,porquanto existe apenas uma natureza, a saber, a natureza calocada diante de nos no conhecimento perceptivo. Os caracteres que a ciencia distingue na naturezasao caracteres sutis, nao obvios aprimeira vista. Sao relac;5es de rela<;6es e caracteres de caracteres. Contudo,em que pese toda sua sutileza, trazem a marca de umacerta simplicidade, 0 que torna sua considera<;ao essencial para desembara<;ar as complexas rela<;6es entre caracteres de uma insistencia mais perceptiva.
o fato de a bifurca<;ao da natureza em componentes causais e aparentes nao expressar 0 que consideramos ser nosso conhecimento e colocado diante de nosquando atentamos para nossos pensamentos em qual-
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quer discussao sabre as causas de nossas percep~oes. Porexemplo, 0 fogo arde e percebemos urn carvao avermelhado. A ciencia explica isso como a energia radiantedo carvao a penetrar-nos as olhos. Mas, ao buscar talexplica~ao, nao estamos indagando qual a sorte de ocorrencias propfcias para levar a mente a perceber 0 vermelha. A cadeia causal e inteiramente diversa. A mente e deixada totalmente a parte. A verdadeira questaoe: quando 0 vermelho e encontrado na natureza, queDutra coisa tambem se encontra ali? Em surna, estamosesperando uma analise dos acompanhamentos, na natureza, adescoberta do vermelho na natureza. Em umaconferencia posterior deverei estender essa linha de pensamento. Chama apenas aten~ao a ela aqui no proposito de assinalar que a teoria ondulatoria da luz nao foiadotada porque as ondas sao exatamente a tipo de coisas que deveriam levar a mente a perceber as cores. Isso nao pertence ao testemunho jamais aduzido em favor cia teoria ondulat6ria, embora, na teoria causal ciapercep~ao, seja realmente a unica parte relevante. Emoutras palavras, a ciencia nao esta discutindo as causasdo conhecimento, mas a coerencia do conhecimento. 0entendimento perseguido pela ciencia e urn entendimentodas relac;6es internas a natureza.
Ate este ponto, discuti a bifurcac;ao da natureza nocontexto das teorias do tempo absoluto e do espa~o absoluto. Minha razao para tal foi que a introdu~ao dasteorias relacionais somente enfraquece a defesa da bifurca~ao, e pretendi discutir essa defesa em seus fundamentos mais solidos.
Suponhamos, por exemplo, que se adote a teoriarelacional do espac;o. Nesse caso, 0 espac;o em que a
natureza aparente esta alojada e a expressao de determinadas relac;6es entre os objetos aparentes. Eurn conjunto de relac;oes aparentes entre termos relacionais aparentes. A natureza aparente e 0 sonho, as relac;6esaparentes do espa~o sao rela~6es oniricas, 0 espac;o e urnespa~o onirico. De modo semelhante, a espa~o em quea natureza causal estii alojada ea expressao de determinadas rela~6es entre os objetos causais. Ea expressaode determinados fatos envolvendo a atividade causal quetranscorre nos bastidores. Nesse sentido, 0 espac;o causal pertence a uma ordem diferente de realidade daquela do espac;o aparente. Por conseguinte, nao existe nenhuma liga~ao inequivoca entre ambos e e despropositado afirmar-se que as moleculas da relva se encontramem urn lugar qualquer que guarde uma rela~ao espacial definitiva com a lugar ocupado pela relva que percebemos. Tal conclusao esobremodo paradoxal e reduza urn contra-senso toda a fraseologia cientffica. 0 casotorna-se ainda mais grave se admitimos a relatividadedo tempo. Isso porque as mesmos argumentos se aplicam e desmembram 0 tempo em urn tempo onirico eurn tempo causal, pertencentes a diferentes ordens derealidade.
Estou discutindo, porem, uma forma extremada dateoria da bifurcaC;ao. Trata-se, ereio, de sua forma maisdefensavel. Contudo, seu proprio earater explicito torna-a tanto mais evidentemente permeavel aeritiea. Aforma intermediaria permite que a natureza em diseussao seja sempre a natureza diretamente eonhecida e, nessa medida, ela rejeita a teoria cia bifurca~ao. Sustenta,porem, a existencia de acreseimos psiquieos anaturezatal como conheeida e que tais acreseimos nao eonstituem,
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em nenhum senfido pertinente, partes cia natureza. Percebemos, por exemplo, a bola vermelha de bilhar emseu tempo particular, em seu lugar particular, com seumovimento particular, sua rigidez particular e sua inerciaparticular. Mas sua vermelhidao e seu calor, bem como 0 estalido ao colidir com Dutra bola, constituem acrescimos psfquicos, vale dizer, qualidades secundarias quesao apenas 0 modo pelo qual a mente percebe a natureza. Essa naD eapenas a teoria vagamente predominante, mas antes, penso eu, a forma historica cia teoria ciabifurca~ao na medida em que esta e derivada da filosofia. Passarei a chama-Ia teoria dos acn§scimos psfquicos.
Essa teoria dos acrescimos psfquicos euma bern fundamentada teoria baseada no born senso, que enfatizaenormemente a flagrante realidade do tempo, do espac;o, cia solidez e cia inercia, mas que nao da credito aosacrescimos artfsticos menores cia COf, cia calidez e do som.
A teoria e produto do bom senso em retirada. Seuaparecimento deu-se numa epoca em que eram e1aboracias as teorias cientfficas cia propaga~ao. A cor, porexemplo, resulta de uma propaga~aooriginada no objeto material e dirigida ao olho daquele que percebe; ea que se propaga, assim, naD ea cor. Logo, a cor DaD
pertence it realidade do objeto material. Da mesma forma, e pela mesma razao, as sons evaporam-se cia natureza. Tambem 0 calor se cleve a transferencia de algadiverso cia temperatura. Restam-nos, assim, posi~oes
espa~o-temporaise algo que posso qualificar de "impulsividade" do carpo. 0 que nos remete ao materialismodos seculos XVIII e XIX, ou seja, it crenp de que arealidade cia natureza ea materia no tempo e no espa<;0, e dotada de inercia.
Evidentemente, foi pressuposta uma distin<;ao emqualidade a separar, de outras percep<;oes, algumas percep~6es oriundas do tatoo Essas percep~6esoriundas dotate sao percep<;oes cia legftima inercia, enquanto as demais constituem acrescimos psfquicos a serem explicados pela teoria causal. Tal distin~ao e produto de umaepoca na qual a ciencia fisica tamau a dianteira cia patologia medica e da fisiologia. As percep~6esde impulso sao tanto 0 resultado da propaga~aocomo as percep~6es de cor. Quando a cor e percebida, os nervos doorganismo sao estimulados em determinado sentido etransmitem sua mensagem para 0 cerebro, e quando sepercebe urn impulso outros nervos do organismo sao estimulados em urn sentido diverso e transmitem sua mensagem para 0 cerebro. A mensagem da primeira situa~ao nao e a transmissao da cor, e a mensagem da segunda nao e a transmissao do impulso. Mas, no primeirocaso temos a percep~ao da cor e, no segundo, do impulso devido ao objeto. Se fizermos um corte em determinados nervos, a percep~ao da cor deixara de existir, secortarmos outros nervos, a percep~ao do impulso deixara de existir. Quer nos parecer, portanto, que quaisquer razoes que determinassem por eliminar a cor darealidade da natureza haveriam de determinar tambema elimina~ao da inercia.
Assim, a perseguida bifurca~ao da natureza aparente em duas partes, das quais uma ecausal tanto para sua propria aparencia como para a aparencia da outra parte, que epura aparencia, cai por terra devido aimpossibilidade de se estabelecer qualquer distin~ao fundamental entre nossos meios de conhecer acerca das duaspartes da natureza assim compartimentada. Nao nego
que a sensa~ao de esfor~omuscular tenha, historicamente, conduzido ao conceito de forl,;a. Esse fatD historica,no entanto, nao nos autoriza a atribuir uma realidadesuperior na natureza a inercia material, acima cia corau do sam. No que diz respeito arealidade, tadas as nossas percep~6es sensoriais estao no meSilla barco e devern ser tratadas segundo a mesmo principia. Eqiiidade de tratamento eexatamente 0 que essa teoria transigente deixa de atingir.
A teoria cia bifurca~ao, todavia, nao se extingue comfacilidade. A razao e que existe efetivamente uma dificuldade a ser enfrentada, no sentido de se estabelecer,no ambito de urn meSilla sistema de entidades, a rela~ao entre a vermelhidao do fogo e a agita~ao das moJeculas. Apresentarei, em Dutra conferencia, minha explica~ao pessoal da origem dessa dificuldade e de sua solu~iio.
Gutra solu~ao favorita, a forma mais abrandada assumida pe1a teoria cia bifurca<;ao, esustentar que as moleculas e 0 eter cia ciencia sao puramente conceituais.Existe, portanto, uma unica natureza, a saber, a natureza aparente, sendo os Momos e 0 eter meras designa~6es de termos l6gicos empregados nas f6rmulas conceituais de calculo.
Mas a que e uma f6rmula de calculo? Supostamentee urn enunciado em que determinada coisa qualquer everdadeira com respeito as ocorrencias- naturais. Tomemos a mais elementar de todas as formulas: dois e doissomam quatro. Tal f6rmula - ate onde se apEca anatureza - assevera que se tomarmos duas entidades naturais e em seguida duas outras entidades naturais, 0
conjunto formado conteni quatro unidades naturais. Tais
55TEORIAS DA BIFURCAr;:AO DA NATUREZA
f6rmulas, validas para quaisquer entidades, nao podemresultar na cria<;ao dos conceitos dos Momos. Par outrolado, existem f6rmulas que asseverarn a existencia, nanatureza, de entidades com tais e tais propriedades especiais, digamos, par exemplo, com as propriedades dosatomos de hidrogenio. Ora, se tais entidades nao existern, nao consigo perceber de que modo quaisquer enuneiados a seu respeito podem aplicar-se anatureza. A asser<;ao, por exemplo, da existencia de queijo verde naLua nao pode ser premissa de nenhuma dedu~ao de relevaneia eientffiea, a menos, efetivamente, que a presen~a de queijo verde na Lua haja sido comprovada atraves de experimento. A resposta corrente a essas obje<;5es e que, embora os <ltomos sejarn meramente eonceituais, constituem, ainda assim, uma forma interessante e viva de dizer alga diverso, porem verdadeiro,acerca da natureza. Mas se e algo diverso que voce temem mente, pelo amor de Deus, diga-o com clareza.Livre-se desse intrincado mecanismo de uma naturezaconceitual que eonsiste em asser<;oes acerca de coisas inexistentes com 0 proposito de transmitir verdades aeereade coisas que realmente existem. Defendo a posi~ao 6bvia de que as leis cientfficas, se verdadeiras, sao enunciados sabre entidades das quais adquirimos conhecimento por estarem na natureza, e que se as entidades as quaisse referem os enunciados nao forem encontradas na natureza, os enunciados a seu respeito nao tem re1evanciapara ocorrencia alguma puramente natural. Portanto,as moleeulas e eletrons da teoria cientifica sao, ambos ate onde a ciencia formulou corretamente suas leis -,fatores a serem encontrados na natureza. Os eletrons saoapenas hipotetieos, na medida em que nao temos cer-
o CONCEITO DE NA TUREZA54
56 o CONCEITO DE NA TUREZA TEORIAS DA BIFURCA9AO DA NATUREZA 57
teza absoluta da veracidade da teoria do eletran. Mas,o carater hipotetico dos eletrons nao nasce cia naturezaessencial cia teoria em si mesma tao logo sua verdadetenha sido afiangada.
Assim, ao termino dessa discussao urn tanto complexa, retornamos a posi~ao que afirmamos no inicio.A tarefa primordial de uma filosofia da ciencia naturaleelucidar 0 conceito de natureza, considerada urn tinieDfata complexo para 0 conhecimento; expor as entidadesfundamentais e as relag6es fundamentais entre entidadesem cujos termos todas as leis cia natureza devem ser estabelecidas, e afiangar que as entidades e relag6es assimexpostas sao adequadas it expressao de todas as relag6esentre entidades que tern lugar na natureza.
o terceiro requisito, isto e, 0 cia adequac;ao, eo quegera toda a dificuldade. Tempo, espago, materia, qualidades cia materia e relac;5es entre objetos materiais saonormalmente admitidos como as dados fundamentais daciencia. Da forma como aparecem nas leis cientfficas,porem, as clados nao relacionam 0 conjunto das entidades que se apresentam em nossa percepgao da natureza. Por exemplo, a teoria ondulatoria da luz e uma teoria primorosa e bern estabelecida; infelizmente, porem,ela exclui a cor tal como esta e percebida. Assim, 0 vermelho percebido - au outra cor - deve ser recortadoda natureza e convertido na rea~ao da mente sob 0 impulso dos verdadeiros eventos da natureza. Em outraspalavras, esse conceito das re1ac;6es fundamentais no ambito da natureza e inadequado. Cumpre-nos, portanto,voltar nossas energias para 0 enunciado de conceitos adequados.
Ao faze-Io, porem, nao estaremos na verdade buscando solucionar urn problema metaffsico? Nao creio.Estaremos apenas procurando expor 0 tipo de rela~6es
existentes entre as entidades que de fato percebemos como presentes na natureza. Nao somos chamados a fazer nenhum pronunciamento sobre a relac;ao psicologica entre sujeitos e objetos au sabre a posigao ocupadapar cada urn no domfnio da realidade. E verdade quea resultado de nosso esforgo pode fornecer material deimportancia enquanto testemunho re1evante para umadiscussao dessa questao. Dificilmente isso deixara deacontecer. Trata-se, porem, de simples testemunho e naoconstitui em si uma discussao metaffsica. Para deixarclaro a carater dessa discussao adicional que est" forade nosso alcanc;e, apresentarei a voces duas cita~6es. Aprimeira, de Schelling, e extrafda da obra do m6sofo russo Lossky, recentemente traduzida com tanto primor para 0 ingles3 - "Considerei, na 'Filosofia da Natureza',o sujeito-objeto denominado natureza em sua atividadede autoconstru~ao.Para compreender isso, devemo-nosalgar a uma intuigao intelectual da natureza. 0 empirista nao se alc;a a essa altura e, por essa razao, em todas as suas explicag6es e sempre ele proprio que se revelaa construir a natureza. Nao admira, pois, que sua construc;ao e aquilo que deveria ser construido tao raramentecoincidam. Urn Natur-philosoph alga a natureza it condic;ao de independencia, faz com que construa a si propria e jamais e acometido, portanto, pela necessidade
3. TheIntuitive Basis of Knowledge, de N. O. Lossky, tracl. da sra. Duddington, Macmillan and Co., 1919.
de contrapor a natureza tal como construfda (i.e., comoexperiencia) anatureza real, ou de corrigir a primeirapor intermedio cia segunda."
A outra cita9ao e de urn ensaio lido pelo deao deSt. Paul para a Sociedade Aristotelica em maio de 1919.o ensaio do dr. luge intitula-se "Platonismo e Imortalidade Humana", e nele aparece a seguinte afirma<;ao:
"Resumindo, a doutrina plat8nica cia imortalidadeapoia-se na independencia do mundo espiritual. 0 mundo espiritual nao eurn muncio de ideais nao realizados,acima de, e em contraposi<;ao a, urn muncio real de fatos nao-espirituais. Trata-se, pelo contrario, do muncioreal, do qual possufmos urn conhecimento verdadeiro,embora bastante incompleto, acima de, e em contraposi<;ao a, urn muncio cia experiencia ordinaria, 0 qual, como urn todo completo, e desprovido de realidade, umavez que compactado a partir de uma miscelanea de dados, nem todos situados no meSilla nfvel, com a ajudada imagina9ao. Nao existe mundo algum que corresponda ao mundo de nossa experiencia ordinaria. A natureza forja-nos abstra90es, decidindo qual espectro de vibrac;.oes deveremos enxergar e ouvir e que coisas deveremos perceber e recordar."
Citei essas afirma90es porque ambas lidam com topicos que, embora extrfnsecos ao ambito de nossa discussao, sao sempre confundidos com ela. A razao e queestao proximos a nosso campo do pensamento e sao topicos de enorme interesse para a mente metaffsica. Ediffci! a urn filosofo se dar conta de que alguem estejarealmente confinando sua discussao nos limites que expus a voces. 0 limite se ergue exatamente ali onde elecomec;.a a ganhar entusiasmo. Afirmo-Ihes, porem, que
entre os prolegomenos necessarios afilosofia e aciencianatural esta um entendimento integral dos tipos de entidades, e dos tipos de relac;oes entre tais entidades, anos revelados em nossas percepc;oes da natureza.
58 a CONCE/TO DE NATUREZA
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TEaR/AS DA B/FURCA9AO DA NATUREZA 59
CAPITULO III
o TEMPO
As duas conferencias anteriores deste cicio tiveramurn carater preponderantemente entico. Nesta conferencia, proponho-me a entabular uma investigae;ao dostipos de entidades apresentadas ao conhecimento naapreensao senslvel. Meu prop6sito e investigar as modalidades de rela<;6es que essas entidades de diferentestipos podem guardar entre si. Uma classifica<;ao das entidades naturais e 0 preludio da filosofia natural. Come<;aremos hoje com a considera<;ao do Tempo.
Em primeiro lugar, e-nos apresentado urn fato geral, a saber, que algo est:i se passando; h:i uma ocorrencia a ser definida.
Esse fato geral de pronto oferece it nossa apreensao dais fatores, aos quais denominarei 0 "discernido"eo "discernfvel". 0 discernido compreende aqueles elementos do fato geral discriminados com suas propriaspeculiaridades individuais. E 0 campo percebido diretamente. Contudo, as entidades desse campo guardamrelae;oes com outras entidades nao particularmente dis-
62 o CONCE/TO DE NA TUREZA o TEMPO 63
criminadas dessa forma individual. Essas outras entidades sao conhecidas meramente como as termos relacionados as entidades do campo discernido. Tal entidadeeurn mera "alga", dotado de tais e tais relac;6es definidas com alguma entidade ou entidades definidas no campo discernido. Vma vez assim relacionadas, elas sao grac;as ao carater particular dessas relac;6es - conhecidas como elementos do fato geral em curso. Contudo,nao temos consciencia delas senao como entidades cumprindo as fun~6es de termos dessas rela~6es.
Assim, 0 fato geral completo, apresentado durantesua ocorrencia, compreende ambos as conjuntos de entidades, a saber, as entidades percebidas em sua propria individualidade e outras entidades apreendidas meramente como termos relacionais sem outras definic;oes.Esse fato geral completo e 0 discernfvel e compreendeo discerndo. 0 discernido e a natureza no seu todo talcomo revelada naquela apreensao sensfvel; e estende-separa alem cia natureza e a compreende no seu todo, talcomo efetivamente discriminada au discernida em talapreensao sensfvel. 0 discernimento au discriminac;aocia natureza e uma apreensao peculiar de fatores especiais da natureza com respeito a seus caracteres peculiares. Mas os fatores da natureza dos quais possufmosessa peculiar apreensao sensfvel sao conhecidos como naoabrangendo todos os fatores que, no conjunto, formamo todo complexo de entidades relacionadas compreendidas no fato geral ali apresentado para 0 discernimento. E a essa peculiaridade do conhecimento que denomino seu carMer inexaurfvel, caniter que pode ser descrito metaforicamente pela afirma~ao de que a natureza tal como percebida contem sempre uma borda desi-
gual. Por exemplo, existe urn mundo para alem da salaaqual nossa visao esta confinada e que sabemos completar as rela~6es espaciais das entidades percebidas nointerior da sala. A jun~ao do mundo interior da sala como mundo exterior existente alem dela jamais e bern definida. Os sons e os fatores mais sutis revelados naapreensao sensfvel afluem a partir do externo. Cada tipo de sentido conta com seu proprio corpo de entidadesdiscriminadas, conhecidas enquanto termos relacionados a entidades nao discriminadas por tal sentido. Enxergamos algo que nao tocamos e tocamos algo que naoenxergamos, e possufmos urn sentido geral das rela~oes
espaciais entre a entidade revelada na visao e a entidade reve1ada no tatoo Em primeiro lugar, portanto, cadaqual dessas duas entidades e conhecida como urn termorelacional em urn sistema geral de rela~oes espaciais e,em segundo lugar, e determinada a rela~ao mUtua particular dessas duas entidades enquanto mutuamente relacionadas nesse sistema geral. Mas 0 sistema geral dere1a~oes espaciais que relaciona a entidade discriminada pela visao aquela discriminada pelo tato nao depende do carliler peculiar da outra entidade tal como registrado pelo sentido alternativo. Por exemplo, as rela~6es
espaciais da coisa vista teriam necessitado de uma entidade, enquanto termo relacional, no lugar da coisa tocada, ainda que certos elementos de seu carater nao houvessem sido revelados pelo tatoo Assim, aparte 0 tato,uma entidade dotada de determinada rela~ao especfficacom a coisa vista teria sido revelada na apreensao sensfve1, mas nao discriminada sob outros aspectos com respeito a seu carater individual. Ea uma entidade conhecida apenas enquanto espacialmente relacionada a alguma
entidade discernida que designamos pela ideia pura esimples de "lugar". 0 conceito de lugar marca a revela~ao, na apreensao sensfvel, de entidades cia naturezaconhecidas meramente por suas relal;oes espaciais comentidades discernidas. Ea reve1a~ao do discernive1 atrayes de suas re1a~oes com 0 discernido.
Essa revelal;ao de uma entidade como termo relacional sem discriminal;oes especfficas Qutras quanta aqualidade e 0 fundamento de nosso conceito de significado. No exemplo acima a coisa vista era significativa,no sentido de que revelava sua relal;ao espacial com outras entidades nao necessariamente penetrando de outro modo a consciencia. Portanto, significado e re1al;ao,mas relac;;ao com a enfase em uma extremidade apenasda rela~ao.
A bern cia simplicidade, restringi meu raciocfnio asrela<;6es espaciais; as mesmas considera~6es,porem, seaplicam as rela~6es temporais. 0 conceito de "perfodode tempo" marca a revela~ao, na apreensao sensfvel,de entidades da natureza conhecidas unicamente atrayes de suas rela~6es temporais com entidades discernidas. Mais ainda, essa separa~ao das ideias de espa~o etempo foi adotada meramente em nome de uma simplicidade de exposi~ao, obtida atraves da conformidade coma linguagem corrente. Aquilo que discernimos e 0 carater especffico de urn lugar atraves de urn periodo de tempo. Eisso que entendo por urn "evento". Discernimosalguns caracteres especificos de urn evento. Mas, ao discernir urn evento, tambem estamos conscios de seu significado enquanto termo re1acional na estrutura de eventos. Essa estrutura de eventos e 0 complexo de eventostais como relacionados pelas rela~6es de extensao e co-
grediencia. A expressao mais simples das propriedadesdessa estrutura pode ser encontrada em nossas rela~6es
espaciais e temporais. Urn evento discernido e conhecido enquanto relacionado, nessa estrutura, a outros eventos cujos caracteres espedficos nao sao reve1ados sob outros aspectos naquela apreensao imediata, exceto na medida em que sao termos re1acionais compreendidos naestrutura.
A reve1a~ao da estrutura de eventos na apreensao sensivel estabelece uma classifica~ao dos mesmos em duascategorias: eventos discernidos com respeito a algum carater individual adicional e aqueles que tao-somente sao revelados na qualidade de elementos da estrutura. Esseseventos denotados devem necessariamente incluir eventos do passado remoto, bern como eventos pertencentes aofuturo. Tais eventos nos sao apreendidos como os perfodoslongfnquos do tempo ilimitado. Existe, porem, outra c1assifica~ao de eventos, tambem inerente a apreensao sensfvel. Refere-se ela aos eventos que partilham do imediatismo dos eventos discemidos imediatamente presentes. Saoeventos cujos caracteres, somados aque1es dos eventos discernidos, compreendem a natureza total presente parao discernimento. Formam 0 fato geral completo que eanatureza por inteiro orayresente, tal como revelada nessa apreensao senslvel. E nessa segunda classifica~aodeeventos que a diferencia~ao entre espa~o e tempo tern suaorigem. 0 germe do espa~o pode ser encontrado nasmutuas rela~6es dos eventos compreendidos no fato geral imediato que e a natureza total ora discernfve1, ou seja, compreendidos no evento singular que e a totalidadeda natureza presente. As rela~6esde outros eventos comessa totalidade da natureza formam 0 tecido do tempo.
65o TEMPOo CONCEITO DE NA TUREZA64
66 o CONCE/TO DE NA TUREZA o TEMPO 67
A unidade desse fato geral presente esta expressano conceito de simultaneidade. a fato geral ea total ocorrencia simultanea cia natureza ora presente para aapreensao senslve!. E a esse fato geral que denomineio discernivel. No futuro, porem, 0 chamarei de uma"dura~ao", referindo-me, por esse terma, a uma certatotalidade de natureza limitada tao-somente pe!a propriedade de constituir uma simultaneidade. Outrossim,em obediencia ao principia de delimitar anatureza 0 terrno completo cia apreensao sensfvel, naD se cleve CDnceber a simultaneidade como urn conceito mental irrelevante impasto anatureza. Nossa apreensao senslvel apresenta, para urn discernimento imediato, uma certa totalidade, aqui denominada uma "durac;ao"; portanto,uma dura~aoeuma entidade natural definida. Uma durac;ao ediscriminada como urn complexo de eventos parciais, dande se afirma que as entidades naturais que compoem esse complexo sao "simultaneas a essa durac;ao".Sao, ainda, em urn sentido derivativo, simultaneas entre si com respeito a essa dura~ao. A simultaneidade,portanto, euma rela~ao natural definida. Talvez 0 termo "dura~ao" seja improprio, na medida em que apenas sugere uma extensao abstrata de tempo. Nao e issoo que entendo por dura~ao. Uma dura~ao euma fatiaconcreta da natureza limitada pe!a simultaneidade, fator" essencial revelado na apreensao sensfvel.
A natureza eurn processo. A exemplo de tudo quanto e diretamente demonstrado na apreensao sensfvel, naoha explica~aoposslve! para essa caracterlstica da natureza. Tudo 0 que se pode fazer eempregar uma linguagem capaz de demonstra-Io especulativamente, bern como expressar a rela~ao que esse fato da natureza guarda com outros fatores.
o fato de cada dura~ao ocorrer e passar constituiuma demonstra~aodo processo da natureza. 0 processo da natureza tambem pode ser denominado "a passagem da natureza". Evito de!iberadamente, no presenteestagio, 0 emprego da palavra "tempo", porquanto 0
tempo mensuravel, da ciencia e da vida civilizada, emgeral demonstra apenas alguns aspectos do fato mais fundamental da passagem da natureza. Acredito estar depleno acordo, nessa doutrina, com Bergson, embora eleempregue 0 termo "tempo" para se referir ao fato fundamental que denomino a "passagem da natureza". Apassagem da natureza, ainda, e igualmente demonstrada pe!a transi~ao espacial e pe!a transi~ao temporal. Eem virtude dessa passagem que a natureza esta sempreem movimento. a significado dessa propriedade de "movimento" envolve 0 fato de que nao apenas qualquerato de consciencia sensorial e tao-somente aquele ato enenhum outro, como 0 termo de cada ato e tambem unico e nao constitui 0 termo de nenhum outro ato. Aapreensao sensfvel agarra sua unica chance e apresentapara 0 conhecimento algo exclusivamente destinado a ele.
o termo da apreensao sensivel e unico em dois sentidos. Eunico para a apreensao sensfvel de uma menteindividual e unico para a apreensao senslvel de todasas mentes que atuam sob condif;oes naturais. Ha umaimportante distin~ao entre os dois casos. (il Para umamente individual, nao apenas 0 componente discernidodo fato geral edemonstrado em qualquer ato de apreensao senslve! distinto do componente discernido do fatogeral demonstrado em qualquer outro ate de apreensaosensfvel daquela mente, como as duas duraf;oes correspondentes, respectivamente relacionadas pela simulta-
neidade aos dais componentes discernidos, sao necessariamente distintas. Essa euma demonstra<;ao cia passagem temporal da natureza: uma dura<;:ao passou paraDutra. Portanto, naD apenas e a passagem cia naturezaurn carMer essencial cia natureza em sua fun(iiO de terrno cia apreensao sensfvel, mas e tambern essencial para a apreensao sensfvel em si mesma. E essa verdadeque confere ao tempo a impressao de estender-se paraa1em da natureza. Mas 0 que para a mente se estendepara alem cia natureza nao e0 tempo seqiiencia! e mensunivel, que apenas demonstra 0 carater de passagemda natureza, mas a qualidade da propria passagem, quede modo algum emensuravel, exceto na propon;ao emque prevalece na natureza. Em outras palavras, a "passagem" nao emensuravel, a nao ser na medida em queocorre na natureza conjuntamente com a extensao. Napassagem, alcan<;amos uma conexao cia natureza coma realidade metafisica ultima. A qualidade da passagemem durac;5es e uma demonstrac;ao particular, na natureza, de uma qualidade que se estende para a1em da natureza. A passagem, por exemplo, e uma qualidade naoapenas cia natureza, que ea coisa conhecida, mas tambern cia apreensao sensivel, que e0 processo cognitivo.As dura<;:oes tern toda a realidade que a natureza possui, embora DaD precisemos determinar agora 0 que isso possa ser. A mensurabilidade do tempo e derivativadas propriedades das dura<;:oes. Assim tambem 0 carater seqiiencial do tempo. Verificaremos que existem nanatureza sistemas temporais seqiienciais divergentes, derivados de diferentes familias de dura<;:oes. Sao uma peculiaridade do carater da passagem tal como encontracia na natureza. Esse carater tern a realidade cia natureza,
69o TEMPO
mas DaD devemos necessariamente transferir 0 temponatural para entidades extranaturais. (ii) Para duas mentes, os componentes discernidos dos fatos gerais demonstrados em seus respectivos atDs de apreensao sensfvel devern ser diferentes. Pais que cada mente, em sua apreensao cia natureza, apreende urn determinado complexode entidades naturais relacionadas, em suas relac;5es como organismo vivo enquanto urn foco. As durac;5es associadas, POrell, podem ser identicas. Aqui, ja estamosabordando aque!e carater da natureza passante originadonas re!a<;:oes espaciais dos corpos simultaneos. Essa posSIVe! identidade das dura<;:oes no casa da apreensaosenslvel de mentes distintas e 0 que enfeixa em uma unicanatureza as experiencias particulares dos seres dotadosde percep<;:ao. Estamos considerando aqui 0 lado espacial da passagem da natureza. Para a mente, a passagem, nesse aspecto, tambem parece estender-se paraalem da natureza.
Eimportante distinguir simultaneidade de instantaneidade. Minha enfase nao recai sobre 0 mero uso corrente de ambos os termos. Existem dois conceitos quepretendo distinguir, aos quais denomino simultaneidade e instantaneidade. Espero que as palavras tenham sidocriteriosamente escolhidas; mas na verdade pouco importa, conquanto eu consiga explicar 0 que pretendo designar. Simultaneidade e a propriedade de urn grupo deelementos naturais que em algum sentido sao componentes de uma dura<;:ao. Uma dura<;:ao pode ser tantoa natureza como urn todo presente quanta 0 fato imediato apresentado pe!a apreensao senslvel. Uma durac;ao retem em si a passagem da natureza. Dentro delaencontrarn-se antecedentes e conseqiientes que tarnbem
o CONCE/TO DE NA TUREZA68
saO dura~6es que podem ser completos presentes especiosas de consciencias mais velozes. Isto e, uma dura~ao retem uma densidade temporal. Qualquer conceitocia natureza como urn todo imediatamente conhecida esempre 0 conceito de alguma dura~ao, embora esta possaser alargada em sua densidade temporal para alem dopossive! presente especioso de qualquer ente por nos conhecido como existente na natureza. A simultaneidade,portanto, eurn fator ultimo cia natureza, imediato paraa apreensao sensfvel.
A instantaneidade e urn conceito logico complexode urn processo de pensamento por meio do qual se produzem entidades 16gicas em nome cia simples expressao,no pensamento, de propriedades cia natureza. A instantaneidade e 0 conceito cia natureza como urn todo emurn instante, cnde urn instante e concebido como privado de qualquer extensao temporal. Por exemplo, pensamos sabre a distribui~ao cia materia no espa<.;o em urninstante. Trata-se de urn conceito altamente providencial na ciencia, especialmente na matematica aplicada;mas € uma id€ia altamente complexa no que diz respeito a suas relal.;oes com os fatos imediatos da apreensaosensivel. A natureza em um instante apresentada pelaapreensao sensivel € algo inexistente; 0 que a apreensao sensivel franqueia para 0 conhecimento e a natureza ao longo de um perfodo. Consequentemente, umavez que nao e em si mesma uma entidade natural, a natureza em um instante deve ser definida em termos deentidades naturais genuinas. A menos que assim procedamos, nossa ciencia, que adota 0 conceito de natureza instantanea, deve abandonar toda e qualquer alega~ao de estar fundamentada na observa~ao.
Usarei 0 termo "momento" para me referir a "natureza como um todo em urn instante". Urn momento,na acepl.;ao em que 0 termo e aqui empregado, e desprovido de qualquer extensao temporal e cleve ser contrastado com uma dura~ao provida de tal extensao. 0que e diretarnente oferecido ao nosSo conhecimento atrayes da apreensao sensivel e uma clural.;ao. Assim sendo,cumpre-nos explicar agora como os momentos sao derivados das dural.;oes, bern como 0 prop6sito a que serve a introdul.;ao dos mesmos.
Urn momenta eurn limite do qual nos aproximamos amedida que confinamos a atenl.;ao a dural.;oes deextensao minima. As relal.;oes naturais entre os ingredientes de uma dura~ao ganbam em complexidade quando consideramos dural.;oes de extensao temporal crescente. Por conseguinte, existe uma aproximal.;ao asimplicidade ideal amedida que nos aproximamos de umadiminui~ao ideal de extensao.
A palavra "limite" tern urn significado precise na16gica numerica e mesmo na 16gica das series unidimensionais a-numericas. Do modo empregado aqui, trata-se,ate agora, de simples metafora, e e necessario explicardiretarnente 0 conceito que se pretende 0 termo indique.
As dura~6es podem apresentar a propriedade relacional binaria de se estenderem uma sobre a outra. Assim, a dural.;ao que e a natureza como urn todo em determinado minuto se estende sobre a dural.;ao que e anatureza como urn todo durante 0 30~ segundo daqueIe minuto. Essa relal.;ao de "estender-se sobre" - "extensao" como a chamarei - e uma relal.;ao nat~ral b:isica, cUj~ campo compreende mais que dural.;oes. Eumarela~ao que dois eventos limitados podem guardar entre
71o TEMPOo CONCEITO DE NATUREZA70
si. AIem disso, enquanto verificada entre dura~6es, a rela~ao parece referir-se aextensao puramente temporal.Sustentarei, no cntanto, que a mesma rela~ao de extensao jaz na base tanto da extensao temporal quanta daespacial. Tal discussao pode ser adiada; nosso interesse, por ora, reside simplesmente na rela-;;ao de extensaotal como ocorre em seu aspecto temporal no que toeaao limitado campo das dura~6es.
o conceito de extensao demonstra no pensamentouma face da passagem ultima da natureza. Essa rela~ao
se verifica em razao do caniter especial assumido pelapassagem na natureza; ea rela~ao que, no caso das dura<.;oes, expressa as propriedades de "sobrepassar". Assim, a dura<;ao, que era urn minuto definido sobrepassou a dura~ao que era seu 30~ segundo. A dura~ao do30~ segundo era parte da dura~ao do minuto. Adotareias termos "todo" e "parte" exclusivamente neste sentida, senda a "parte" urn evento sobre-estendido peIooutro evento que e 0 "todo". Em minha nomenclatura, portanto, "todo" e "parte" referem-se exclusivamentc a cssa re1a<;ao fundamental de extensao; e nessaacepC;ao tecnica, conseqiientemente, s6 os eventos podem constituir quer todos quer partes.
A continuidade da natureza origina-se da extensao.Cada evento estende-se por sobre outros eventos e porsobre cada evento estendem-se outros eventos. Portanto, no caso especial de durac;oes, por ora os unicos eventos diretamente considerados, cada dura~ao e parte deoutras durac;6es; e cada durac;ao contem outras dura~6es que sao partes dela. Nesse sentido, nao existem durac;oes maximas ou durac;oes mlnimas. Nao ha, portanto,uma estrutura atomica das durac;oes, e a definic;ao per-
feita de uma dura~ao,de modo a assinalar sua individualidade e distingui-la das dura~6esquase anaJogas sobre asquais esta passando, ou que passam sobre ela, e urn postulado arbitnirio do pensamento. A apreensao sensfvel apresenta as durac;5es como fatores da natureza, mas nao autoriza claramente 0 pensamento a utiliza-la para distinguiras individualidades separadas das entidades de urn grupoafim de dura~6es ligeiramente divergentes. Este e urnexemplo da indeterminabilidade da apreensao sensfvel.A exatidao eurn ideal do pensamento e s6 se realiza naexperiencia pela seleC;ao de uma rota de aproximac;ao.
A ausencia de durac;oes maximas e mlnimas naoesgota as propriedades da natureza que formam sua continuidade. A passagem da natureza envolve a existencia de uma familia de dura~6es. Quando duas dura~6es
pertencem amesma famnia, pode acontecer que umacontenha a outra ou que se sobreponham mutuamenteem uma dura~ao subordinada em que nenhuma contenha a outra; ou entao que sejam completamente isoladas. 0 caso exclufdo e aquele em que as dura~6es
sobrepoem-se em eventos finitos, mas sem conter umaterceira durac;ao enquanto parte comum.
E6bvio que a rela~ao de extensao etransitiva. Ouseja, aplicada a dura~6es, temos que: se a dura~ao A eparte da dura~ao B e a dura~ao B e parte da dura~ao
C, entao A eparte de C. Portanto, os dois primeiros casos podem ser combinados em urn unico e poderemosdizer que duas durac;oes que pertencem amesma familia ou serao tais que haveni dura~6es que sao partes deambas ou serao totalmente isoladas.
Tambem 0 inverso everdadeiro, isto e, se duas durac;oes contem outras durac;oes que sao partes de ambas
73o TEMPOo CONCE/TO DE NA TUREZA72
o CONCE/TO DE NA TUREZA o TEMPO 75
ou se as duas dire-;5es sao completamente isoladas, ambas pertencem amesma familia.
As caractensticas adicionais cia continuidade cia natureza - no que tange as dura<;6es - ainda nao formuladas, se manifestam no contexto de uma familia dedura<;6es e podem ser enunciadas cia seguinte maneira:existem dura<;5es que cantero, como partes integrantes,duas dura~oes quaisquer da mesma famflia. Por exempIo, uma semana cantero, como partes integrantes, daisde seus dias. E evidente que uma dura~ao continentesatisfaz as condic;5es necessarias para pertencer amesrna familia tanto quanto as duas dura~oes contidas.
Estamos preparados agora para passar a defini~ao
de urn momenta do tempo. Consideremos urn conjunto de dura~oesextrafdas da mesma familia. Admitamosque possua as seguintes propriedades: (i) de dois membros quaisquer do conjunto urn cantem 0 Dutro comoparte e (ii) nao existe dura~ao alguma que seja parte detodos os membros do conjunto.
Ora, a rela<;ao entre todo e parte eassimetrica; quefO dizer com iSBa que se A eparte de B, B DaD sera partede A. Ademais, tambem ja observamos que a rela~ao
etransitiva. Assim senda, podemos facilmente perceberque as dura~oes de qualquer conjunto dotado das propriedades recem-enumeradas devem ser organizadas emuma ordem serial unidimensional, de modo que amedida que a percorremos em sentido decrescente, alcan~amos dura~5es de extensao temporal cada vez menor.A serie pode ser iniciada com qualquer dura~ao arbitrariamente admitida de qualquel' extensao temporal,porem, amedida que decresce a serie, a extensao temporal se contrai progressivamente e as sucessivas dura-
~5es se veem encerradas umas nas outras como num jogo de caixas chines. Contudo, 0 conjunto difere do jogono seguinte particular: 0 jogo tern uma caixa menor quetodas, que forma a caixa final de sua serie; ja 0 conjunto de dura~6es nao tern nenhuma dura~ao menor quetodas e tampouco pode convergir em dire~ao a umadura~ao-limite.1sso porque as partes quer da dura~ao
final quer do limite seriam partes de todas as dura~oes
do conjunto e, portanto, a segunda condi~aodo conjuntoteria sido violada.
Denominarei tal conjunto de dura~5es urn "conjunto abstrativo" de dura~5es. Eevidente que, ao percorrermos urn conjunto abstrativo, este converge parao ideal da natureza como urn todo sem extensao temporal, isto e, ao ideal da natureza e como urn todo em urninstante. Esse ideal, porem, na verdade e 0 ideal de umanao-entidade. A a~ao efetiva do conjunto abstrativo econduzir 0 pensamento a considera~ao da progressivasimplicidade das re1a~oes naturais ao reduzirmos progressivamente a extensao temporal da dura~aoconsiderada. Ora, a essencia do processo se resume em que asexpress5es quantitativas dessas propriedades naturaisconvergem efetivamente a limites, embora 0 conjuntoabstrativo nao convirja a nenhuma dura~ao limftrofe.As leis que relacionam esses limites quantitativos sao asleis da natureza "em urn instante", embora na verdade nao exista uma natureza em urn instante, mas apenas 0 conjunto abstrativo. Portanto, urn conjunto abstrativo e a entidade efetivamente designada quando consideramos urn instante de tempo sem extensao temporal. Presta-se ele a todas as finalidades necessarias dedar urn sentido inequfvoco ao conceito das propriedades
1. Cf. An Enquiry concerning the Principles ofNatural Knowledge, CambridgeUniversity Press, 1919.
cia natureza em urn instante. Concordo plenamente emque tal conceito e fundamental na expressao da cienciaffsica. A dificuldade eexpressar nossa acep~ao em termos dos julgamentos imediatos cia apreensao sensivel,e sugiro a explicat;:ao acima como uma solut;ao cabal doproblema.
Nessa explica-;ao, urn momento e0 conjunto de propriedades naturais alcan~ado por uma rota de aproximac;ao. Urna serie abstrativa euma rota de aproxima<;3.0. Existem diferentes ratas de aproximac;ao ao mesmo conjunto limftrofe das propriedades da natureza. Emoutras palavras, existem diferentes conjuntos que devemser considerados ratas de aproximac;ao ao mesma momenta. Par conseguinte, existe urn certa volume de detalhes tecnicos necessarios para se explicar as relac;5esde tais conjuntos abstrativos de mesma convergencia enos precaver de possfveis casos excepcionais. A exposic;ao de tais detalhes nao cabe nestas conferencias, mastratei extensamente deles alhures 1.
Convem mais, por motivos tecnicos, considerar urnmomento como a classe de todos os conjuntos abstrativos de durac;5es de mesma convergencia. Segundo essadefini~ao (conquanto consigamos explicar satisfatoriamente 0 que designamos por "mesma convergencia",alem de urn conhecimento detalhado do conjunto de propriedades naturais alcan~adovia aproxima~ao), urn momento e simplesmente uma classe de conjuntos de dura~5es cujas rela~5es mutuas de extensao sao dotadas de
77o TEMPO
certas peculiaridades especfficas. Podemos chamar a taisrelac;5es das durac;5es componentes de propriedades "extri'nsecas" de urn momento; as propriedades "intri'nsecas" do momenta sao as propriedades da natureza alcan~adas enquanto urn limite ao percorrermos qualquerurn de seus conjuntos abstrativos. Estamos falando daspropriedades da natureza "naquele momento" ou "nague1e instante".
As dura~5es que integram a composi~ao de urn momento pertencem todas a uma mesma famllia. Portanto, a uma familia de durac;5es corresponde uma familiade momentos. Alem disso, se tomarmos dois momentos da mesma familia, entre as durac;5es que entram nacomposic;ao de urn momento as durac;5es menores saocompletamente isoladas das dura~5es menores que integram a composic;ao do outro momento. Em suas propriedades intri'nsecas, assim, os dois momentos devemdemonstrar os limites de estados completamente diversos da natureza. Nesse sentido, os dois momentos saocompletamente isolados. Chamarei "paralelos" a essesdois momentos da mesma familia.
Correspondentes a cada durac;ao, existem dois momentos da familia associada de momentos que constituem os momentos limitrofes de tal durac;ao. Urn "momento limftrofe" de uma dura~ao pode ser definido como se segue: existem durac;5es da mesma familia quea durac;ao dada e que, embora a sobreponham, nao estao contidas na mesma. Consideremos urn conjunto abstrativo de tais dura~5es. Tal conjunto define urn momento que esta, exatamente em proporc;5es iguais, forae dentro da dura~ao. Tal momenta e urn momenta limftrofe da durac;ao. Tambem nos reportamos a nossa
o CONCE/TO DE NA TUREZA76
apreensao sensivel cia passagem cia natureza para queesta nos informe cia existencia de dais momentos limitrofes, a saber, 0 anterior e 0 posterior. A estes denominaremos as limites inicial e final.
Existem tambem momentos de mesma faroflia taisque as durac;;5es mais breves de sua composic;;ao estaocompletamente isoJadas da dura~ao dada. Diremos quetais momentosjazem "exteriormente" adurac;;ao dada.Por sua vez, outros momentos cia familia sao tais queas durac;;6es mais breves de sua composic;;ao sao partescia durac;;ao dada. Diremos que tais momentos jazem "interiormente" a durac;;ao dada ou que "sao inerentes"amesma. Em seu conjunto, a familia de momentos paraIelos edescrita dessa maneira, em referencia a qualquer dura~ao dada da familia associada de dura~6es. Ouseja, existem momentos da familia situados exterionnente adura~ao dada, existem os dois momentos que saoas momentos limftrofes da dura~ao dada e momentossituados interiormente a dura~ao dada. Outrossim,quaisquer dois momentos da mesma familia sao os momentos Jimitrofes de alguma dura~ao individual da familia associada de dura~6es.
Torna-se possive!, agora, definir a rela~ao serial deordem temporal entre os momentos de uma familia. Sejam, pois, A e C dais momentos quaisquer dessa famflia; esses momentos serao os momentos limftrofes de umacerta dura~ao d da familia associada e diremos que qualquer momento B compreendido na dura~aod estara compreendido entre os momentos A e C. Assim, a rela~ao
ternana de "estar compreendido entre", envolvendo tresmomentos, A, Be C, esta compJetamente definida. Tambern 0 nosso conhecimento acerca da passagem da natu- 2. Cf. Enquiry.
79a TEMPO
reza assegura-nos que essa rela~ao distribui os momentos da familia em uma ordem serial. Abstenho-me deenumerar as propriedades especfficas que garantem esse resultado, por mim enumeradas em meu livro recentemente pubJicad02, ao qualja fiz referencia. Ademais,a passagem da natureza nos faculta saber que uma determinada dire~ao ao lange cia serie corresponde apassagem para 0 futuro, enquanto a outra dire~ao corresponde ao retrocesso em dire~ao ao passado.
Ea uma tal serie ordenada de momentos que nosreferimos ao falar no tempo definido como uma serie.Cada elemento da serie revela urn estado instantaneoda natureza. Evidentemente, esse tempo serial e resultado de urn processo intelectual de abstra~ao. Minha contribui~ao foi fornecer defini~6es precisas do processo atraves do qual a abstra~ao e levada a cabo. Tal procedimento e simplesmente urn caso particular do metodo geral que, em meu livro, denomino "metodo da abstra~ao extensiva". Esse tempo serial evidentemente nao ea propria passagem da natureza em si. Ele revela algumas das propriedades naturais que deJa brotam. 0 estado da natureza "em urn momenta" evidentementeperdeu essa qualidade ultima da passagem. Tambem aserie temporal de momentos apenas a retem enquantouma rela~ao extrfnseca de entidades e nao como 0 produto do ser essencial dos termos da serie.
N ada foi dito ainda quanta ao dimensionamentodo tempo. Tal dimensionamento nao decorre da merapropriedade serial do tempo, mas requer uma teoria dacongruencia, a qual sera considerada em uma conferencia posterior.
o CONCEITO DE NA TUREZA78
Ao avaliar a adequa~ao dessa definic;ao da serie temporal como uma formulac;ao cia experiencia, enecessario discriminar entre 0 julgamento elementar da apreensao sensivel e nossas teorias intelectuais. 0 lapso de tempo e uma quantidade serial mensurave!. A teoria cientffica em sua totalidade depende desse pressuposto; qualquer teoria do tempo que se mostre incapaz de fornecertal serie mensuravel candena a si mesma como incapazde dar conta do fato mais proeminente da experiencia.Nossas dificuldades apenas come<;am quando indagamoso que e aquila que se esta mensurando. Trata-se, evidentemente, de urn elemento de tal modo fundamentala experiencia que dificilmente podemos nos distanciardele e isohi-Io, de modo a observa-Io em suas devidaspropor<;i5es.
Devemos inicialmente determinar se 0 tempo cleveser encontrado na natureza ou se a natureza cleve serencontrada no tempo. A dificuldade da segunda alternativa - isto e, a de estabelecer 0 tempo como anteriora natureza - e a de que 0 tempo converte-se, entaa,em urn enigma metafisico. Que especie de entidades saoseus instantes ou seus perfodos? A dissociac;ao entre tempo eeventos revela, a nossa investigac;ao imediata, quea tentativa de estabelecer 0 tempo como termo independente do conhecimento e semelhante ao esfor~o por seencontrar substancia em uma sombra. Existe 0 tempoporque existem acontecimentos e, aMm dos acontecimentos, nada existe.
Epreciso, porem, estabelecer uma distin<;ao. Emcerto sentido, 0 tempo se estende para aIem da natureza. Einverfdico que uma apreensao sensfvel atemporale urn pensarnento atemporal se combinem para contem-
plar uma natureza temporal. A apreensao senslvel e 0
pensamento sao, em si mesmos, processos, a exemplode seus termos na natureza. Em outras palavras, ha umapassagem da apreensao sensivel e uma passagem do pensamento. Portanto, os dominios da qualidade da passagem se estendem para alem da natureza. Mas surge agora a distin~ao entre passagem, de carater fundamental,e a serie temporal, que e uma abstra~ao16gica visandorepresentar algumas das propriedades da natureza. Umaserie temporal, tal como a definimos, representa apenas certas propriedades de uma familia de dura<;i5es propriedades que as dura~oes s6 possuem em razao departilharem 0 carater da passagem, mas, por outro lado, propriedades que s6 as dura<;i5es possuem de modoefetivo. Como conseqiit~ncia,0 tempo, no sentido de umaserie temporal mensuravel, e tao-somente uma propriedade da natureza e nao se estende aos processos do pensamento e da apreensao sensfvel, exceto por uma correla~ao desses processos com a serie temporal impHcita nosprocedimentos destes.
Ate este ponto, a passagem da natureza foi considerada em conexao a passagem de dura~6es, contextono qual ela revela uma peculiar afinidade com a serietemporal. Devemo-nos lembrar, todavia, que 0 caraterda passagem esta peculiarmente associado aextensao doseventos e que dessa extensao origina-se a transi~ao espacial, bern como a transi<;ao temporal. A discussao desseponto esta reservada para uma conferencia posterior, porem e necessario lembra-lo agora que estamos nos encaminhando para discutir a aplica<;ao do conceito de passagem para alem da natureza. Do contrario, teremasuma ideia muito estreita quanta aessencia da passagem.
81o TEMPOo CONCEITO DE NA TUREZA80
Enecessaria nos deter no tema cia apreensao sensivel nesse contexto, como um exemplo do modo pelo qualo tempo diz respeito amente, muito embora 0 tempo mensurcivel seja uma mera abstra~aocia natureza e a natureza esteja fechada a mente.
Consideremos a apreensao sensivel- naD seu termo,que ea natureza, mas a apreensao sensi've1 em si mesma,como urn processo cia mente. A apreensao sensive1 eumarelac;;ao cia mente com a natureza. Assim senda, estamosagora considerando a mente como urn termo relacionalcia apreensao sensivel. No que diz respeito amente, ternosa apreensao sensfvel imediata e temos a memoria. A distin<;ao entre memoria e 0 imediatismo presente tern urnduplo significado. Par um lado, revela que a mente naopossui uma apreensao imparcial de todas essas dura<;oesnaturais as quais esta relacionada atraves da apreensao.Sua apreensao compartilha da passagem da natureza. Podemos imaginar urn ser cuja apreensao, concebida comosua posse particular, nao sofre transi<;ao alguma, emborao termo de sua apreensao seja nossa propria natureza transitoria. Nao existe uma razao essencial para que a memoria nao deva ser al<;ada avividez do fato presente; e entao,pelo lado da mente, perguntamos: qual a diferen~a entreo presente e 0 passado? Com essa hipotese, contudo, podemos tambem supor que a recorda~ao vivida e a fatopresente sao dispostos na apreensao da mesma forma como em sua ordem serial temporal. Por co~seguinte,devemos admitir que, embora possamos imaginar que noprocessamento da apreensao sensfvel a mente poderia estar isenta de qualquer cad.ter de passagem, em verdadenossa experiencia da apreensao sensfvel revela nossasmentes como partfcipes desse carater.
83o TEMPO
Por outro lado, 0 simples fato da memoria e umafuga a transitoriedade. Na memoria, a passado se fazpresente. Presente nao enquanto sobrepondo-se asucessao temporal da natureza, mas como urn fato imediatopara a mente. Nesse sentido, a memoria e urn desengajamento da mente com respeito a simples passagem danatureza; pois aquilo que passou para a natureza naopassou para a mente.
Alem disso, a distin<;ao entre memoria e 0 presente imediato nao e tao nitida como convencionalmentese presume. Existe uma teoria intelectual do tempo como 0 gume de uma faca em movimento, a demonstrarurn fato presente sem extensao temporal. Essa teoriaorigina-se do conceito de uma exatidao ideal da observa<;ao. As observa<;oes astronomicas sao sucessivamente refinadas no sentido da exatidao em decimos, centesimos e milesimos de segundos. Contudo, os refinarnentos finais sao obtidos par meio de um sistema de dtlculoaproximativo e, mesmo entao, apresentam-nos uma extensao de tempo como uma margem de erro. 0 erro aquieurn simples termo convencional para expressar 0 fatode que 0 carater da experiencia nao condiz com 0 idealdo pensamento. Ja tive oportunidade de explicar comoo conceito de urn momento consegue conciliar 0 fato observado com esse ideal; ou seja, existe uma simplicidade limitrofe na expressao quantitativa das propriedadesdas dura~6es, alcanpda atraves da considera~aode qualquer urn dos conjuntos abstrativos incluidos no momento. Em outras palavras, 0 carMer extrfnseco do momentocomo urn agregado de dura<;oes assoeiou-0 com 0 carater intrfnseco do momento, que e a expressao limftrofede propriedades naturais.
o CONCEITO DE NA TUREZA82
Assim, 0 carater de urn momento e 0 ideal de exatidao que este comporta de modo algum enfraquecema posi,ao de que a termo final da apreensao e uma dura,ao provida de densidade temporal. Tal dura,ao imediata nao esta claramente delineada para nossa apreensao. Seu limite inicial se turva por uma dissolu~ao namemoria, e seu limite final se turva por uma emergencia da antecipa,ao. Nao ha uma distin,ao nftida querentre a memoria e a imediatismo do presente quer entre a imediatismo do presente e a antecipa,ao. a presente euma amplitude de fronteiras oscilantes entre asdais extremos. Assim, nossa propria apreensao sensfvel,com seu presente estendido, possui alga do caniter ciaapreensao sensfvel do ser imaginario cuja mente estavaliberta da passagem e que contemplava a natureza noseu todo como urn fata imediato. Nossa presente individual possui seus antecedentes e seus conseqiientes, enquanta para 0 ser imaginario a natureza como urn todotern suas durac;5es antecedentes e consequentes. Portanto, a unica diferen<;a, nesse sentido, entre nos e 0 serimaginario e que para ele toda a natureza participa doimediatismo de nossa durac;ao presente.
A conclusao dessa discussao e que, no que tangea apreensao sensfvel, existe uma passagem da mente,distingufvel da passagem da natureza, embora estreitamente afim com ela. Podemos especular, se 0 quisermos, que essa afinidade da passagem da mente com apassagem da natureza resulta de ambas compartilbaremalgum carater ultimo da passagem que domina todo ser.Esta, porem, e uma especulac;ao na qual naD ternos interesse. A deduc;ao imediata que nos e suficiente - noque tange a apreensao senslvel - e a de que a mente
85o TEMPO
nao esta no tempo ou no espac;o no mesmo sentido emque os eventos da natureza estao no tempo, mas que seencontra derivativamente no tempo e no espa<.;o em razao da afinidade peculiar de sua passagem com a passagem da natureza. A mente, portanto, encontra-se notempo e no espac;o em urn sentido peculiar a si mesma.Houve uma longa discussao para chegarmos a uma conclusao extremamente simples e 6bvia. Temos todos a sensac;ao de que, em algum sentido, nossas mentes estaoaqui nesta sala e neste momento. Mas nao exatamenteno mesmo sentido em que os eventos da natureza, quesao as existencias de nossos cerebros, tern suas posi<;5esespaciais e temporais. A distinc;ao fundamental a lembrar e a de que 0 imediatismo para a apreensao sensivelnao e a meSillO que a instantaneidade para a natureza.Essa ultima conclusao nos leva adiscussao seguinte, coma qual encerrarei esta conferencia. Podemos, portanto,formular a seguinte questao: sera possivel encontrar umaserie temporal alternativa na natureza?
Alguns anos atras, tal possibilidade teria sido desconsiderada como fantasticamente impossivel. Nao teria tido a menor sustentac;ao na ciencia entao correntee tampouco teria familiaridade com id€ia alguma jamaisintroduzida nos sonhos da filosofia. as seculos XVIIIe XIX aceitaram como sua filosofia natural urn determinado circulo de conceitos tao rfgidos e definitivos como aqueles da filosofia medieval, e que eram aceitos coma mesma escassez de investigac;ao critica. Denominarei"materialismo" a essa filosofia natural. Materialistaseram nao s6 os homens da ciencia, mas tambem os adeptos de todas as escolas filos6ficas. as idealistas apenasse distinguiam dos materialistas filos6ficos na questao do
o CONCEITO DE NA TUREZA84
alinhamento cia natureza com respeito amente. Mas nenhum deles tinha a menor duvida de que a filosofia danatureza, considerada em si mesma, era do tipo ao qualdenominei materialismo. Trata-se da filosofiaja examinada nas duas conferencias anteriores deste cielo. Podemos sintetiza-la como a cren~a de que a natureza eurn agregado material e que esse material existe, em certasentido, em cada membra sucessivo de uma serie unidimensional de instantes do tempo desprovidos de extensao. Alem disso, as rela~oes mutuas entre as entidades materiais em cada instante dispunham essas entidades em uma configura<;ao espacial em um espa<;o ilimitado. A impressao que se tem e de que 0 espa<;o nessa teoria - seria tao instantaneo como as instantes,e que seria preciso a1guma explica<;ao das rela<;6es entre as sucessivos espat;os instantaneos. Mas a teoria materialista se cala nesse particular; e a sucessao de espat;OS instantaneos etacitamente combinada no sentido deformar urn espal,;o persistente. A teoria e uma consideral,;ao puramente inte1ectual da experiencia, que teve asorte de se fazer formular no alvorecer do pensamentocientifico. Ela dominou a linguagem e a imagina<;ao daciencia desde que esta floresceu em Alexandria, com 0
resultado de que, hoje, dificilmente se pode falar semdar a impressao de assumir sua obviedade imediata.
Quando, porem, formulada claramente nos termosabstratos em que acabo de enuncia-la, ateoria se afastalargamente do 6bvio. 0 complexo passageiro de fatoresque compoe 0 fato que constitui 0 termo da apreensaosensivel nao nos coloca diante de coisa a1guma que corresponda it trindade desse materialismo natural. Essatrindade e composta (i) pela serie temporal de instantes
desprovidos de extensao, (ii) pelo agregado de entidades materiais e (iii) pelo espa<;o, que e 0 resultado dasrelal,;oes cia materia.
Ha urn grande abismo entre esses pressupostos dateoria intelectual do materialismo e os jufzos imediatosda apreensao sensivei. Nao ponho em duvida que essatrindade materialista personifica importantes caracteresda natureza. Mas e necessario expressar esses caracteres em termos dos fatos da experiencia. Eexatamenteo que venho buscando nesta conferencia no que diz respeito ao tempo; e agora nos deparamos com a pergunta: existira uma unica serie temporal, apenas? A filosofia materialista da natureza pressupoe 0 carater unicoda serie temporal. Essa filosofia, porem, e tao-somenteuma teoria, como as teorias cientfficas aristotelicas, objetos de uma fe tao obstinada na Idade Media. Se nestaconferencia consegui, de algun1a forma, me afastar dateoria em favor dos fatos imediatos, a resposta nem delonge sera tao indiscutivel. A pergunta pode ser reformulada nos seguintes termos: existira uma unica famIlia de dura<;6es, apenas? 0 significado de "familia dedural,;oes" na pergunta foi definido anteriormente nesta conferencia. A resposta agora de modo a1gum e 6bvia. Na teoria materialista, 0 presente instantaneo e 0
unico campo para a atividade criativa da natureza. apassado se foi e 0 futuro ainda nao e. Portanto (nessateoria), 0 imediatismo da apreensao e 0 de urn presenteinstantaneo, e esse presente unico e 0 produto do passado e a promessa do futuro. De nossa parte, contudo,negamos esse presente instantaneo imediatamente dado. Nao existe a1go semelhante a ser encontrado na natureza. Enquanto fato ultimo, trata-se de uma nao-enti-
87o TEMPOo CONCE/TO DE NA TUREZA86
dade. 0 imediato, para a apreensao senslvel, euma dura~ao. Ora, uma durac;ao traz em seu seio urn passadoe urn futuro; e as amplitudes temporais das durac;6es imediatas cia apreensao senslvel sao altamente indeterminadas e dependentes do percipiente individual. Comoconseqiiencia, DaD existe fator algum na natureza que,para cada percipiente, seja preeminente e necessariamente 0 presente. A passagem cia natureza DaD deixa nadaentre 0 passado e 0 futuro. 0 que percebemos como presente ea vfvida borda cia memoria matizada pela antecipac;ao. Essa vividez ilumina 0 campo discriminado noambito de uma durac;ao. Mas iSBa DaD representa nenhuma garantia de que as acontecimentos cia naturezanao possam ser distribufdos por outras dura,6es de famflias alternativas. Sequer podemos saber que a seriede durac;6es imediatas exibidas pela apreensao sensIvelde uma mente individual pertence, de modo absolutamente necessario, a mesma famIlia de dura~5es. Naoexiste a menor razao para se acreditar que seja assim.N a verdade, se minha teoria da natureza estiver correta, nao sera 0 caso.
A teoria materialista apresenta toda a abrangenciado pensamento medieval, que tinha uma resposta cabalpara tudo, quer no ceu, no inferno ou na natureza. Existenela urn certo carater ordenativo, com seu presente instantaneo, seu passado esvanecido, seu futuro inexistente e sua materia inerte. Esse carater ordenativo e profundamente medieval e concorda sofrivelmente com osfatos ordinarios.
A teoria que estou defendendo admite urn misterio ultimo mais vultoso e uma ignorancia mais profunda. 0 passado e 0 futuro se encontram e se misturam
no presente mal definido. A passagem da natureza, simplesmente uma outra denomina~ao da for~a criativa daexistencia, possui uma ampla margem de presente definido e instantaneo em cujo ambito operar. Sua presen~a operativa, que no momenta impulsiona a naturezaadiante, deve ser procurada ao longo do todo, tanto nopassado remoto quanta na mais estreita amplitude dequalquer dura,ao presente. Talvez tambem no futuronao-realizado. Talvez tambem no futuro que poderia ser,bern como no futuro efetivo que vira a ser. E impossIvel meditar sobre 0 tempo e 0 misterio da passagem criativa da natureza sem uma avassaladora como~ao anteas limita,6es da inte!igencia humana.
89o TEMPOo CONCE/TO DE NA TUREZA88
II',
I
~ I,
CAPITULO IV
o METODO DA ABSTRAQAOEXTENSIVA
A conferencia de hoje deve iniciar com a considera~ao dos eventos limitados. Estaremos, assim, em posi<;ao de nos embrenhar por uma investiga<;ao acerca dosfatores da natureza representados por nossa concep~ao
de espa<;o.A dura~ao que constitui a revela~ao imediata de nos
sa apreensao senslvel e discriminada em partes. Existea parte representada pela vida da natureza como um todono interior de uma sala e existe a parte representada pelavida da natureza como urn todo em uma mesa da sala.Essas partes sao eventos limitados. Possuem a extensaoda dura<;ao presente e sao partes desta. Mas, enquantouma dura~ao e urn todo ilimitado e, em determinadosentido restrito, e tudo quanto existe, urn evento limitado possui uma limita<;ao completamente definida deextensao, a nos expressa em termos espac;o-temporais.
Estamos habituados a associar a cada evento umacerta qualidade melodramitica. a atropelamento de um
homem, por exemplo, constitui urn evento compreendidoem determinados limites espac;o-temporais. Nao estamoshabituados a considerar a permanencia cia Grande Piramide ao longo de urn dia especffico qualquer como urnevento. No entanto, 0 fato natural que ea Grande Piramide ao longo de urn dia - enos referimos, com issa, anatureza como urn todo neJa compreendida -, e urnevento do meSilla carater do acidente do homem, no sentido cia natureza como urn todo em suas limitac;oes espac;otemporais, de sorte a incluir 0 homem e 0 velculo motorizado durante 0 perfodo em que estiveram em cantata.
Estamos habituados a analisar esses eventos segundotres fatores: tempo, espa~o e material. Na verdade, depronto aplicamos a des as conceitos cia teoria materialista da natureza. Nao nego a utilidade dessa analise como prop6sito de expressar importantes leis cia natureza.Minha negativa ea de que qualquer urn desses fatoresseja apresentado a nos na apreensao sensfvel em umaconcreta independencia. Percebemos urn fator unitarioda natureza; e esse fator e que algo esta transcorrendoentao - ali. Percebemos, por exemplo, 0 transcorrer daGrande Piramide em suas rela<;6es com 0 transcorrer doseventos egfpcios circundantes. De tal modo estamos condicionados, tanto pela linguagem como pelo ensino formal e pe1a conveniencia resultante, a expressar nossospensamentos em termos dessa analise materialista quetendemos inte1ectualmente a ignorar a legftima unidade do fator realmente apresentado na apreensao sensfvel. Esse fator unitario, que retem em si mesmo a passagem da natureza, e0 e1emento concreto primordial discriminado na natureza. Sao esses fatores primordiais quedesigno por eventos.
Os eventos sao 0 campo de uma re1a<;ao binaria,qual seja, a relar;.ao de extensao considerada na ultimaconferencia. Eventos sao as coisas ligadas pela relar;.aode extensao. Se urn evento A se estende por sobre urnevento B, Be "parte de" A e A e urn "todo" do qualBe uma parte. Os termos "todo" e "parte" sao invariavelmente empregados nessas conferencias nesse sentido especffico. Segue-se que, com respeito a essa rela<;ao, dois eventos A e B quaisquer podem apresentar entresi qualquer uma das quatro rela~5es, quais sejam (i) Apode estender-se por sobre B, ou (ii) B pode estender-sepor sobre A, ou (iii) A e B podem, ambos, estender-sepor sobre urn terceiro evento C, mas nenhum deles porsobre 0 outro, ou (iv) A e B podem estar completamente separados. Tais alternativas podem obviamente serilustradas pelos diagramas de Euler, tal como aparecemnos livros de 16gica.
A continuidade da natureza e a continuidade doseventos, continuidade essa que e simplesmente a denomina~aopara 0 agregado de uma variedade de propriedades de eventos ligados pela rela~ao de extensao.
Em primeiro lugar, tal relar;.ao e transitiva; em segundo, cada evento contem outros eventos como partesde si; em terceiro, cada evento euma parte de outros eventos; em quarto lugar, dados dois eventos finitos quaisquer, existirao eventos dos quais cada urn contera a ambos enquanto partes; e em quinto, existe uma relar;.ao especial entre eventos, aqual dou 0 nome de "jun<;ao" .
Dois eventos apresentam junr;.ao quando existe urnterceiro evento do qual ambos fazem parte e que e talque nenhuma de suas partes esta separada dos dois eventos dados. Portanto, dois eventos que apresentam jun-
93o METODO DA ABSTRA9AO EXTENSIVAo CONCEITO DE NA TUREZA92
1. Cf. Enquiry.
t;;ao formam exatamente urn evento, que constitui, emcerto sentido, a soma de ambos.
Somente determinados pares de eventos possuemessa propriedade. De modo geral, qualquer evento quecontenha dais eventos cantero igualmente partes outras,separadas de ambos os eventos.
Ha uma defini~aoa1ternativa para a jun~ao de doiseventos, que adotei em meu recente livro!, Dais eventosapresentam junt;;ao quando existe urn terceiro evento talque (i) se sobrepiie a ambos os eventos e (ii) nenhumade suas partes esta separada dos dois eventos dados. Aado~ao de qualquer uma dessas defini~iies a1ternativascomo a definic.;ao de junc.;ao determina que a Dutra seafigure como urn axioma referente ao caniter dajunc.;.aotal como a conhecemos na natureza. Mas nosso interesse nao e tanto uma definic.;ao 16gica como a formulac.;aodos resultados cia observac;ao direta. Ha. uma certa continuidade inerente it unidade observada de um eventoe essas duas defini~iies de jun~ao na verdade sao axiomas baseados na observac;ao sabre 0 carater dessa continuidade.
As relac;6es entre todo e parte e de sobreposic.;aoconstituem casos particulares dajun~ao de eventos. Contuda, epassive1 a existencia dejun~ao em eventos separados entre si; por exemplo, as partes superior e inferior da Grande Piramide estao divididas por a1gum planohorizontal imaginario.
A continuidade que a natureza deriva dos eventosfoi obscurecida pe!os exemplos que fui forpdo a apre-
95o METODO DA ABSTRA9AO EXTENSIVA
sentar. Assim, tomei a existencia da Grande Piramiciecomo um fato sobejamente conhecido ao qual poderiarecorrer seguramente a titulo de explica~ao. Esse e umtipo de evento que a nos se manifesta como a situa~ao
de um objeto reconhecivel; e, no exemplo escolhido, 0
objeto e tao amplamente conhecido que recebeu um nome. Um objeto e uma entidade de diferente tipo que umevento. Por exemplo, 0 evento que consiste na vida cianatureza na Grande Piramide ontem e hoje e divisive!em duas partes, a saber, a Grande Piramide ontem ea Grande Pirftmide hoje. Contudo, 0 objeto reconhecivel tambem chamado a Grande Pirftmide e hoje 0 mesmo objeto que era ontem. A teoria dos objetos deveraser alva de considera~ao em Dutra conferencia.
Todo esse tema esta investido de urn indevido arde sutileza pe!o fato de que quando 0 evento e a situa~ao de urn objeto bern caracterizado, DaO temos uma linguagem propria para distinguir entre evento e objeto.No caso da Grande Pirftmide, 0 objeto e a entidade unitaria percebida que, tal como percebida, se mantem identica a si mesma ao longo do tempo, ao mesma tempoem que toda a dan~a das moleculas e 0 jogo a1ternantedo campo eletromagnetico sao ingredientes do evento.Um objeto esta, em certo sentido, fora do tempo. Apenas derivativamente esta no tempo, por estar associadoa eventos por uma relac;ao a que denomino "situac;ao".Essa relac;ao de situac;ao exigira discussao em uma conferencia subseqiiente.
o ponto que desejo assinalar por ora e que constituir a situa~ao de um objeto bem caracterizado nao enecessidade inerente a urn evento. Existe urn evento ondequer e quando quer que algo esteja se passando. Ade-
o CONCEITO DE NA TUREZA94
2. Cf. Organization oj Thought, pp. 146 ss. Williams and Norgate, 1917.
97o METODO DA ABSTRA\7AO EXTENSIVA
o primeiro resultado do uso sistematico dessa leifoi a formula,ao dos conceitos abstratos de Tempo e Espa\:o. Na conferencia anterior, esbocei 0 modo como 0
principio foi aplicado para a obten,ao da serie temporal. Passo agora a considerar como se obtem as entidades espaciais atraves do mesmo metodo. 0 procedimentosistematico e identico, em principio, para ambos os casos, e ao tipo geral de procedimento dei 0 nome de "metodo da abstra\:ao extensiva".
Voces se lembrarao que em minha conferencia anterior defini 0 conceito de urn conjunto abstrativo de dura,oes. Essa defini,ao pode ser ampliada, de modo aaplicar-se a quaisquer eventos, eventos limitados berncomo dura\:oes. A unica altera\:ao necessaria e a substituic;ao da palavra "dura\:ao" pela palavra "evento". Porconseguinte, urn conjunto abstrativo de eventos e qualquer conjunto de eventos dotado de duas propriedades:(i) a de que em quaisquer dois membros do conjunto,urn contern 0 outro como parte e (ii) que nao existe nenhum evento que seja parte comum it totalidade dosmembros do conjunto. Tal conjunto, conforme voces selembrarao, possui as propriedades do jogo chines de caixas, em que uma vai dentro da outra, com a diferenc;ade que 0 jogo chines possui uma caixa menor que todas, ao passo que a serie abstrativa nao possui nem urnevento menor que todos e tampouco converge para urnevento-limite, nao pertencente ao conjunto.
Portanto, no que diz respeito aos conjuntos abstrativos de eventos, urn conjunto abstrativo nao convergea nada. Existe 0 conjunto cujos membros vao-se tomandoindefinidamente menores ao avan\:armos em pensamentoem dire-;ao aextremidade menor da serie, mas nao ha
o CONCEITO DE NA TUREZA
mais, as pr6prias palavras "ande quer e quando quer"pressup5em urn evento, pais espa,;;o e tempo em si mesmos sao abstrac;5es a partir de eventos. Portanto, eumaconseqiiencia dessa doutrina que algo esteja sempre sepassando em toda parte, mesmo no chamado espa,o vazio. Tal conclusao esta de acordo com a moderna ciencia ffsica que pressupoe a atividade de urn campo eletromagnetico ao longo de todo 0 espa,o e tempo. Essadoutrina cia ciencia assumiu a forma materialista de urneter que a tudo permeia. 0 eter, no entanto, eevidentemente urn mero conceito superfluo - na terminologia aplicada por Bacon adoutrina das causas finais, euma virgem infecunda. Nada se pode deduzir dele; eo eter simplesmente se presta ao prop6sito de satisfazeras exigencias cia teoria materialista. 0 conceito importante e 0 dos fatos altemantes dos campos de for,a.Trata-se do conceito de urn eter de eventos que deveriasubstituir aque1e de urn eter material.
Nao e preciso nenhum exemplo para afian,ar a vod~s que urn evento e urn fata complexo, e as relac;5esentre dais eventos formam urn emaranhado quase impenetra.vel. A chave descoberta pelo born senso da humanidade e sistematicamente utilizada na ciencia e aquiloque denominei alhures2 a lei de convergencia asimplicidade pela redu,ao da extensao.
Se A e B sao dois eventos e A' e parte de A e B'e parte de B, as rela-;:oes entre as partes A' e B' serao,sob multiplos aspectos, mais simples do que as rela,oesentre A e B. Esse e 0 principio que govema todas as tentativas de uma observac;ao exata.
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... ,
o METODO DA ABSTRA9AO EXTENSIVA
As rela~oes mutuas entre os limites no conjunto I (s),bern como entre esses limites e os limites em outros conjuntos I (s'), I (s"), ... , originados de outras conjuntos abstrativos s', s", etc., possuem uma peculiar simplicidade.
o conjunto s, portanto, indica efetivamente umasimplicidade idea! de rela~oes naturais, muito emboratal simplicidade nao seja 0 caniter de nenhum evento
e
embora nao tenha termo final, geralmente converge a urnlimite definido. Por conseguinte, existe uma classe de limites I (s) que e a classe dos limites daqueles membrasde q (en) possuidores de hom610gos ao longo da serie q (s)amedida que n cresce indefinidamente. Podemos representar essa afirma<;ao diagramaticamente utilizando umaseta (-)0) para designar "tende para". Assim,
a nada. Eapenas ela mesma. Tambem a serie q (s) naopossui termo final. Mas os conjuntos de quantidades hom610gas que percorrem os diversos termos da serie convergem efetivamente para limites precisos. Porexemplo,sendo Q; uma medida quantitativa encontrada em q (e1)'e 0 0 hom610go de Q; a ser encontrado em q (e2)' e 0o hom610go de Q; e 0 a ser encontrado em q (e3), e assim sucessivamente, a serie
o CONCEITO DE NA TUREZA98
nenhum minima, de especie alguma, que por fim sejaalcan~ado. Na verdade, 0 conjunto e apenas ele meSilla
e DaD indica nada aMm no sentido de eventos, excetoa si proprio. Mas cada evento tern urn carciter intrfnseco, no sentido de constituir uma situa~ao de objetos ede conter partes que sao situa~oes de objetos e - paraenunciar a questao de modo mais generico - no sentido de ser urn campo da vida da natureza. Ta! caraterpode ser definido por expressoes quantitativas que expressam reIa~6es entre diversas quantidades intrfnsecasao evento ou entre tais quantidades e outras quantidades intrfnsecas a Qutros eventos. No caso de eventos deextensao espa~o-tempora!consideravel, esse conjunto deexpress5es quantitativas ede uma complexidade desconcertante. Sendo e urn evento, chamemos q (e) ao conjunto de expressoes quantitativas que definem seu carater, incluindo suas re1ac;oes com 0 restante cia natureza. Seja el , e2, e3' etc. urn conjunto abstrativo, cujosmembras estao distribuidos de maneira tal que cadamembro, como en se estende por sobre todos os membros sucessivos en + l' en + 2' etc. Portanto, a serie
corresponde a serie
Chamemos aserie de eventos sea serie de expressoes quantitativas, q (s). A serie s nao possui termo fina! e nenhum evento que esteja contido em cada elemento da serie. Assim, a serie de eventos nao converge
100 a CONCE/TO DE NA TUREZA a METODa DA ABSTRA9AO EXTENS/VA 101
atual em s. Podemos fazer uma aproxima~aoa tal simplicidade - que, enquanto estimada numericamente,esta tao proxima quanta 0 desejarmos -, considerando urn evento da serie suficientemente afastado na dire~ao da extremidade menor. Deve-se notar que e a serie infinita, ao se estender em uma infindavel sucessaoem dire~ao a extremidade menor, que tern importancia. 0 evento de amplitude arbitraria que da inicio aserie nao tern a mellor importancia. Podemos excluir arbitrariamente qualquer conjunto de eventos situado naextremidade maior de urn conjunto abstrativo sem a perda de nenhuma propriedade importante para 0 conjunto assim modificado.
DOll ao carMer limftrofe das rela~6es naturais, indicado por urn conjunto abstrativo, 0 nome de "carater intrfnseco" do conjunto; ja as propriedades, ligadasare1ac;ao entre todo e parte no que conceme a seus membros, pelas quais urn conjunto abstrativo e definido, formam 0 que denomino seu "caniter extrfnseco". 0 fatode 0 carater extrfnseco de urn conjunto abstrativo determinar urn carater intrfnseco definido e a razao da importfmcia dos conceitos precisos de espa~o e tempo. Essa manifesta~aode urn carcher intrfnseco definido a partirde urn conjunto abstrativo e 0 significado preciso da leide convergencia.
Por exemplo, vemos urn trem a aproximar-se durante urn minuto. 0 evento que e a vida da naturezanaquele trem durante aquele minuto e de suma complexidade, e a expressao de suas rela~6es e dos ingredientes de seu carater nos desconcerta. Se tomarmos urnsegundo daquele minuto, 0 evento mais limitado assimobtido e mais simples no que tange a seus ingredientes,
e intervalos cada vez menores, como urn decimo daquelesegundo, ou urn centesimo, ou urn milesimo - desdeque tenhamos uma regra definida que resulte em umasucessao definida de eventos em diminui~ao - resultam em eventos cujos caracteres ingredientes convergempara a simplicidade ideal do carater do trem em urn instante definido. Alem disso, existem diversos generas detal convergencia asimplicidade. Por exemplo, podemosconvergir, como acima, ao carater limftrofe que expressaa natureza em urn instante compreendida no volume todo do trem naquele instante, ou anatureza em urn instante compreendida em alguma por~ao daquele volume- na caldeira da locomotiva, por exemplo - ou anatureza em urn instante em alguma area de superffcie,ou anatureza em urn instante em alguma linha do trem,ou anatureza em urn instante em algum ponto do trem.No wtimo caso, os caracteres limitrofes simples aos quaisse chegara serao expressos em termos de densidades, pesos especificos e tipos de material. Por outra lado, naoprecisamos necessariamente convergir a uma abstra~ao
que envolva a natureza em urn instante. Podemos convergir aos ingredientes ffsicos de uma determinada trilha de pontos ao longo do minuto como urn todo. Assim, existem diferentes tipos de carater extrfnseco de convergencia que conduzem a aproxima~ao a diversos tipos de caracteres intrfnsecos enquanto limites.
Passamos agora ainvestiga~ao de possfveis relac;6esentre conjuntos abstrativos. Urn conjunto pode "cobrir"outro. Defino esse "cobrir" do seguinte modo: urn conjunto abstrativo p cobre urn conjunto abstrativo qquandotodos os elementos de p contem, enquanto partes, alguns elementos de q. Eevidente que se algum evento e
cantero como parte integrante qualquer membra do conjunto q, dada a propriedade transitiva cia extensao, cada elemento sucessivo cia extremidade menor de q seraparte de e. Nesse caso, direi que 0 conjunto abstrativoq "inere" ao evento e. Assim, quando urn conjunto abstrativo p cobre urn conjunto abstrativo q, 0 conjuntoabstrativo q inere a cada membro de p.
Epossivel a dois conjuntos abstrativos cobrirem-semutuamente. Nesse caso, chamarei aos dais conjuntos"iguais em for~a abstrativa". Sempre que naD haja risco de mal-entendidos, abreviarei a expressao dizendosimplesmente que as dais conjuntos abstrativos sao"iguais". 0 que torna possivel essa igualdade de conjuntos abstrativos e a fatD de ambos as conjuntos, p eq, constitufrem series infinitas que caminham para suasextremidades menores. A igualdade significa portantoque, dado qualquer evento x pertencente a p, podemossempre, afastando-nos 0 suficiente na direC;ao da extremidade menor de q, encontrar urn evento y que epartede x, e que, afastando-nos 0 suficiente, entao, em direc;ao aextremidade menor de p, podemos encontrar urnevento z que e parte de y, e assim indefinidamente.
A importancia da igualdade de conjuntos abstrativos nasce do pressuposto de que os caracteres intrfnsecos dos dois conjuntos saO identicos. Nao Fosse esse 0
caso, a observaC;ao exata estaria no fim.Eevidente que dois conjuntos abstrativos quaisquer
que sejam iguais a urn terceiro conjunto abstrativo saoiguais entre si. Urn "elemento abstrativo" e 0 grupocompleto de conjuntos abstrativos iguais a qualquer urndentre si. Portanto, todos os conjuntos abstrativos pertencentes ao mesmo elemento sao iguais e convergem
103o METODO DA ABSTRAt;7AO EXTENSIVA
para 0 mesmo carater intrfnseco. Urn elernento abstrativo, assirn, e 0 grupo de rotas de aproximaC;ao a urncanlter intrfnseco definido, de simplicidade ideal, a serencontrado como urn limite entre os fatos naturais.
Se urn conjunto abstrativo p cobre urn conjunto abstrativo q, qualquer conjunto abstrativo pertencente aoelemento abstrativo do qual p e urn membra ira cobrirqualquer conjunto abstrativo pertencente ao elementodo qual q eurn membro. Nesse sentido, sera proveitosoampliar a significado do termo "cobrir" e falar de urnelemento abstrativo "cobrindo" outro elemento abstrativo. Se procurarmos, de maneira seme1hante, ampliaro significado do termo "iguais" no sentido de "iguaisem forc;a abstrativa", torna-se 6bvio que urn elementoabstrativo pode ser igual apenas a si proprio. Assim, urne1emento abstrativo possui uma forc;a abstrativa singular e e 0 constructo, formado a partir de eventos, querepresenta urn carater intrfnseco definido e ao qual sechega, como limite, pdo uso do principio de convergencia para a simplicidade atraves da redu~iioda extensiio.
Quando urn elemento abstrativo A cobre urn elemento abstrativo B, 0 caniter intrfnseco de A inclui, emcerto sentido, 0 carater intrfnseco de B. Daf resulta queas afirmac;5es acerca do carater intrfnseco de B serao,em certo sentido, afirmac;6es acerca do carater intrfnseco de A; mas 0 carater intrfnseco de A sera mais complexo que aquele de B.
Os elementos abstrativos formam os elementos fundamentais do espa~o e do tempo, enos voltaremos agora para a considera~iio das prapriedades envolvidas naforma~iiode classes especiais de tais elementos. Em minha conferencia passada tive oportunidade de investigar
o CONCEITO DE NA TUREZA102
uma classe de elementos abstrativos, a saber, as momentos. Cada momenta e urn grupo de conjuntos abstrativas e as eventos membros desses conjuntos sao taciosmembros de uma mesma familia de dura~5es. Os momentcs de uma familia formam uma serie temporal;admitindo-se a existencia de diferentes familias de momentas, haven} series temporais alternativas na natureza. Assim, 0 metoda de abstrac;ao extensiva explica aorigem cia serie temporal em termos dOB fatas imediatos cla experiencia e, ao meSilla tempo, aclmite a existencia das series temporais alternativas exigidas pela moderna teoria cia relatividade eletromagnetica.
Passemos agora para 0 espa~o. A primeira coisa afazer enos assenhorear da classe de elementos abstrativos que constituem, em certo sentido, as pontos do espa~o. Urn elemento abstrativo tal deve, em algum sentido, apresentar uma convergencia a urn minima absoluto de carater intrfnseco. Euclides expressou definitivamente a ideia geral de urn ponto como desprovido departes e desprovido de magnitude. Eesse carater de constituir urn mInima absoluto que queremos alcanc;ar, berncomo expressar em termos dos caracteres extrfnsecos dosconjuntos abstrativos que formam urn ponto. Alem disso, os pontos assim alcan<;ados representam 0 ideal deeventos sem qualquer extensao, embora, na verdade, naoexistam entidades como esses eventos ideais. Esses pontosnao serao os pontos de urn espa<;o externo -atemporal,mas sim de espa<;os instantaneos. Almejamos, em ultima instancia, chegar ao espa<;o atemporal da ciencia ffsica e tambem do pensamento comum, ora matizado pelos conceitos da ciencia. Sera conveniente reservar 0 termo "ponto" para esses espa<;os quando chegarmos a eles.
3. cr. "La Theorie Relationniste de l'Espace", Rev. de Mitaphysiqueet de Morale, vol. XXIII, 1916.
105a METODa DA ABSTRA(:AO EXTENSIVA
Adotarei, portanto, a expressao "partfculas de evento"para os limites mfnimos ideais de eventos. Assim, umapartfcula de evento e urn elemento abstrativo e, enquantotal, e urn grupo de conjuntos abstrativos; e urn ponto- isto e, urn ponto do espa<;o atemporal - sera umaclasse de partfculas de evento.
Existe, ainda, urn espa<;o atemporal separado, correspondente a cada sene temporal separada, isto e, a cadafamilia separada de dura~5es. Voltaremos futuramenteaos pontos em espa~os atemporais. Apenas fa~o alusaoa eles agora a fim de que possamos compreender os estagios de nossa investiga~ao.A totalidade de partfculasde evento forma urn multiplo quadridimensional, cujadimensao adicional se origina do tempo - em outraspalavras, se origina dos pontos de urn espa~o atemporal, sendo cada urn deles uma classe de partfculas deevento.
o carater necessario aos conjuntos abstrativos queformam as partfculas de evento estaria assegurado casoconsegufssemos defini-Ios como dotados da propriedade de serem cobertos por qualquer conjunto abstrativoque os mesmos cobrem. Neste caso, pois, qualquer outro conjunto abstrativo coberto pelo conjunto abstrativo de uma partfcula de evento seria igual a este e seria,assim, urn membro da mesma partfcula de evento. Porconseguinte, uma partfcula de evento nao poderia cobrir nenhum outro elemento abstrativo. Essa e a defini<;ao por mim originalmente proposta em urn congressoem Paris no ano de 19143. Se adotada sem algum tipo
a CONCE/TO DE NA TUREZA104
de complementa~ao,todavia, essa defini.;ao envolve umadificuldade particular e atualmente nao estoll satisfeitocom 0 modo pelo qual procurei transpor essa dificuldade no referido ensaio.
A dificuldade i' a seguinte: uma vez definidas as partkulas de evento, i' facil definir 0 agregado de partfculas de evento que formam 0 contorno de urn evento; e,a partir ciai, 0 cantata de ponto passivel, em seus contornos, a urn par de eventos dos quais urn i' parte dooutro. Podemos conceber entao todas as complexidadesdo tangenciamento. Podemos conceber, em particular,urn conjunto abstrativo no qual todos os membros ternseu cantata de ponto na mesma partfcula de evento. Efacil provar, entao, que nao havera nenhum conjuntoabstrativo com a propriedade de ser coberto por todoconjunto abstrativo que 0 meSilla cobre. Apresento essadificuldade de modo menos sucinto porque sua existenciaconduz 0 desenrolar de nossa linha de argumenta~ao.
Tivemos de anexar alguma condi~aoapropriedade basica de ser coberto por qualquer conjunto abstrativo queele cubra. Quando investigamos essa questao das condi~5es adequadas, descobrimos que, ali'm das partfculasde evento, todos os demais elementos abstrativos espaciais e espa~o-temporais podem ser definidos da mesmaforma, variando-se adequadamente as condi90es. Assim,seguiremos urn percurso geral, adequado para 0 empregoali'm das partfculas de evento.
Seja (J 0 nome de qualquer condi~aoobedecida porurn eerto numero de eonjuntos abstrativos. Direi queurn conjunto abstrativo e urn "a-primo" quando apresentar duas propriedades: (i) satisfa~a a condi~ao (J e (ii)seja coberto por todo conjunto abstrativo que, ali'm deser eoberto por ele, satisfa~a a eondi~ao a.
Em outras palavras, nao se pode ter nenhum eonjunto abstrativo que satisfa~aa condi~ao (J e que demonstre urn carater intrfnseco mais simples do que aquele deurn a-pnmo.
Temos tambem os eonjuntos abstrativos correlatos,aos quais denomino conjuntos de a-antiprimos. Urn eonjunto abstrativo i' urn (J-antiprimo quando apresenta duaspropriedades: (i) satisfaz a condi~ao (J e (ii) cobre todoconjunto abstrativo que, ali'm de cobri-lo, satisfa~a a condi~ao (J. Em outras palavras, nao se pode ter tenhumconjunto abstrativo que satisfa~a a condi~ao (J e que dernonstre urn carater intrfnseeo mais eomplexo do queaquele de urn (J-antiprimo.
o carater intnnseeo de urn a-primo possui urn certominimo de completitude entre aqueles eonjuntos abstrativos sujeitos aeondi~ao de satisfazerern a; ao passo queo carater intrfnseco de urn a-antiprimo possui urn correspondente maximo de completitude e inclui tudo quanto pode nas circunstancias.
Consideremos primeiro que contribui~ao poderianos prestar a no~ao de antiprimos na defini~ao de momentos por nos apresentada na conferencia passada. Sejaa condi~ao (J a propriedade de ser uma classe cujos membros sao, em sua totalidade, dura~5es. Urn conjunto abstrativo que satisfa~a tal condi~ao e, portanto, urn eonjunto abstrativo totalmente composto de dura~5es. Sera eonveniente, entao, definir urn momenta como 0 grupo de conjuntos abstrativos iguais a algum (J-antiprimo,onde a condi~ao (J possui esse significado especial. Poderemos perceber, mediante considera~ao,(i) que cadaeonjunto abstrativo que forma urn momento e urn(J-antiprimo, onde (J possui esse significado especial, e (ii)
107o METODO DA ABSTRA9AO EXTENSIVAo CONCEITO DE NA TUREZA106
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108 o CONCE/TO DE NA TUREZA o METODO DA ABSTRA9AO EXTENS/VA 109
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que exclufmos do carpo de momentos as conjuntos abstrativos de durac;oes que possuem, sern excec;ao, urn contorno em comum, quer 0 contorno inicial, quer 0 final.Exclufmos, assim, as casos especiais capazes de confundira raciocinio geraL A nova defini~ao de urn momenta,que suplanta nossa defini~ao previa, e (com a ajuda dano~ao de antiprimos) a de tra~ado mais preciso dentreas duas, bern como a mais proveitosa.
A condic;ao particular representada por "(J" na defini~ao de momentos incluiu alga adicional em tudo aquila que se pode derivar do conceito puro e simples de extensao. Urna durac;;:ao demonstra para 0 pensamento umatotalidade. 0 conceito de totalidade e alga que transeeude ao de extensao, embora ambos se entrelacem noconceito de durac;ao.
Da mesma forma, a condic;ao particular" (1", necessaria para a definic;;:ao de uma partfcula de evento,deve ser buscada para alem do simples conceito de extensao. A mesma observac;ao evaIida para as condic;6esparticulares indispensaveis para as outros elementos espaciais. Essa no~ao adicional e obtida atraves da distinc;ao entre 0 conceito de "posi~ao" e 0 conceito de convergencia a urn zero ideal de extens6es tal como demonstrado par urn conjunto abstrativo de eventos.
Para compreenderrnos essa distin~ao, consideremosurn ponto do espa~o instantaneo que concebemos aparente a nos a urn olhar quase instantaneo. Esse pontoe uma particula de evento e possui dais aspectos. Soburn primeiro aspecto, ele esta ali onde esta. Trata-se desua posi~ao no espa~o. Sob outro aspecto, chega-se nelequando ignorado 0 espa~o circundante e a aten~ao seconcentra no conjunto de eventos cada vez menor que
dele se aproxima. Trata-se de seu caniter extrfnseco. Urnponto, portanto, possui tres caracteres, a saber, sua posi~ao no espa~o instantaneo como urn todo, seu caraterextrfnseco e seu carater intrfnseco. 0 mesmo se aplicaa qualquer outro elemento espacial. Par exemplo, urnvolume instantaneo no espa~o instantaneo possui trescaracteres, a saber, sua posi~ao, seu carater extrfnsecocomo grupo de conjuntos abstrativos, e seu carater intrfnseco, que e 0 limite de propriedades naturais indicado par qualquer urn desses conjuntos abstrativos.
Antes que possamos discorrer acerca de posi~ao noespa~o instantaneo, devemos evidentemente ter muitaclareza quanta aquila que designamos par espa~o instantaneo propriamente dito. 0 espa~o instantaneo deve ser buscado enquanto carater de urn momento. Issoporque urn momenta e a natureza como urn todo emurn instante. Nao pode constituir 0 carater intrfnseco domomento, pois 0 carater intrfnseco revela-nos 0 caraterlimitrofe da natureza no espa~o naquele instante. 0 espa~o instantaneo deve ser uma reuniao de elementos abstrativos considerados em suas rela~5es mutuas. Portanto,urn espa~o instantaneo e a reuniao de elementos abstrativos cobertos por algum momento individual, e constitui 0 espa~o instantaneo daque1e momento.
Devemos indagar agora quanto ao carater que encontramos na natureza apto a conferir aos elementos deurn espa~o instantaneo diferentes qualidades de posi~ao.
Essa questao leva-nos de pronto a intersec~ao de momentos, urn topico ainda nao considerado nestas conferencias.
o lugar geometrico da intersec~aode dais momentos ea reuniao de elementos abstrativos cobertos por am-
bos. Ora, nao pode haver interseq:ao entre dais momentos cia mesma seric temporal. Havera necessariamenteinterseq:ao entre dais momentos respectivamente de faroilias diversas. Portanto, devemos esperar, no espac;;o instantaneo de urn momento, que as pmpriedades fundamentais sejam marcadas pe1as interseq;5es com momentos de outras famflias. SendoM urn momento dado, a intersecc;ao de M com Dutro momento A sera urn plano instantaneo no espac;o instantaneo de M; e sendo B urnterceiro momento ainterseccionar tantoM cornoA, a intersecc;ao de M e B sed. urn outro plano no espac;o M. Assiro tambem, ainterseq:ao comumdeA, BeMea interseq:ao dos dais pIanos no espac;oM, ou seja, eumalinhareta no espac;o M. Teremos 0 surgimento de urn caso excepcional se B e M se cruzarem no mesmo plano que AeM. Outrossim, senda C urn quarto momento, apartealguns casos especiais que naG precisamos considerar, estcintersecciona M em urn plano sobre 0 qual a linha reta(A, B, M) incide. Assim temos, em geral, uma intersecc;ao comum de quatm momentos de diferentes familias.Tal intersecc;ao comum e uma reuniao de elementos abstrativos, cada urn deles coberto (ou "compreendido em")todos os quatm momentos. A propriedade tridimensional do espac;o instantaneo redunda em que (a parte relac;(ies especiais entre os quatm momentos) qualquer quinto momento ou contem 0 todo de sua intersecc;ao comumou nenhuma parte desta. Nenhuma subdivisiio adicionalda intersecc;ao comum e possfvel por intermedio dos momentos. Vigora 0 princfpio do "tudo ou nada". Nao estamos diante de uma verdade apriori, mas de urn fato empfrico da natureza.
Sera conveniente reservar os termos espaciais comuns "plano", "linha reta" e "ponto" para os elemen-
tos do espac;o atemporal de urn sistema temporal. Assimsendo, urn plano instantaneo no espac;o instantaneo deurn momenta sera chamado de "nfvel", uma linha retainstantanea sera chamada de "recta" e urn ponto instantaneo sera chamado de "puncto". Urn puncto, assim, e a reuniao de elementos abstrativos compreendidos em cada qual dos quatm momentos cujas familiasnao apresentam nenhuma relaC;ao mutua especial. Sendo P, ainda, urn momento qualquer, ou todo elementoabstrativo pertencente a urn puncto dado jaz em P ounenhum elemento abstrativo de tal puncto jaz em P.
Posic;ao e a qualidade possufda por urn elementoabstrativo em virtude dos momentos nos quais esta compreendido. as elementos abstrativos compreendidos noespac;o instantaneo de urn momento dado M diferenciamse entre si pelos diversos outros momentos que interceptam M de modo a conter varias selec;oes desses elementos abstrativos. Eessa diferenciac;ao de elementos queconstitui sua diferenciac;ao de posic;ao. Urn elemento abstrativo pertencente a urn puncto apresenta 0 tipo maissimples de posiC;ao em M, urn elemento abstrativo pertencente a uma recta, mas nao a urn puncto, possui umaqualidade mais complexa de posic;ao, urn elemento abstrativo pertencente a urn nfvel e nao a uma recta ternuma qualidade ainda mais complexa de posic;ao e, finalmente, a mais complexa qualidade de posic;ao se verifica em urn elemento abstrativo pertencente a urn volume e nao a urn nfvel. Nao definimos ainda, porern,o que eurn volume. Tal definic;ao sera fornecida na proxima conferencia.
Em sua qualidade de agregados infinitos, os nfveis,rectas e punctos nao podem, evidentemente, ser as ter-
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mos cia apreensao sensfvel, nem tarnpouco limites aosquais tende a apreensao senslvel. Qualquer membra individual de urn nivel possui uma certa qualidade originada de seu carater enquanto tambem pertencente a urndeterminado conjunto de momentos, porem 0 nive! como urn todo eurn simples conceito 16gico sem nenhurna rota de aproxima(ao pelas entidades apresentadasna apreensao sensfvel.
Por Qutro lado, uma partfcula de evento edefinidade modo a demonstrar esse carater de constituir umarota de aproxima(ao assinalada pelas entidades apresentadas na apree!,sao sensivel. Uma partfcula de eventodefinida edefinida em referencia a urn puncta definidoda seguinte maneira: admitamos que a condi(ao (J signifique a propriedade de cobrir todos as elementos abstrativos que sao membros daquele puncto, de modo queurn conjunto abstrativo que satisfa~aa condi~ao a seja urnconjunto abstrativo que cubra todo elemento abstrativopertencente aquele puncta. Assim, a defini(ao de pardcula de evento associada ao puncta e a de que se tratado grupo de todos as (J-primos, em que (J possui esse significado particular.
Eevidente que - com esse significado de (J - todo conjunto abstrativo equivalente a urn a-primo e, eleproprio, urn a-primo. Assim, uma particula de eventotal como definida aqui eurn elemento abstrativo, ou seja, e 0 grupo daqueles conjuntos abstrativos iguais, cada qual, a a1gum conjunto abstrativo dado. Se formulada por escrito, a defini(ao de partfcula de evento associada a algum puncta dado, ao qual chamaremos ",sera a seguinte: a partfcula de evento associada a 7r eo grupo de classes abstrativas no qual cada uma, sem
exce(ao, apresenta as duas propriedades: (i) a de cobrircada conjunto abstrativo em " e (ii) a de que todos asconjuntos abstrativos que tambem satisfazem a condi<;ao anterior quanta a 7r e que este cobre, tarnbem 0
cubram.U rna partfcula de evento tern posi<;ao devido asua
associa<;ao com urn puncto; inversamente, de sua associa<;ao com a partfcula de evento adquire a puncto seucarater derivado como rota de aproxirna<;ao. Esses doiscaracteres de urn ponto recorrem continuamente emqualquer tratado da deriva(ao de urn ponto a partir dosfatos observados da natureza, mas em geral nao ha urnreconhecirnento claro de sua distin<;ao.
A peculiar simplicidade de urn ponto instanti'meotern uma origem dupla, a primeira ligada aposi<;ao, isto e, a seu carater de puncto, e a segunda ligada a seucad.ter de partfcula de evento. A simplicidade do puncto surge de sua indivisibilidade por urn momenta.
A simplicidade de uma partfcula de evento surgeda indivisibilidade de seu carater intrfnseco. 0 caraterintrfnseco de urna partfcula de evento e indivisfvel, nosentido de que todo conjunto abstrativo coberto pela mesrna exibe 0 mesma carater intrfnseco. Segue-se que, ernbora haja diferentes elementos abstrativos cobertos parpartfculas de evento, nao ha vantagem em consideralos, uma vez que nao se obtem nenhuma simplicidadeadicional na expressao de prapriedades naturais.
Esses dois caracteres de simplicidade de que estaoinvestidos respectivamente as partfculas de evento e ospunctos definem urn significado para as palavras deEuclides, "desprovido de partes e desprovido de magnitude" .
Obviamente, convem varrer de nosso pensamentotodos esses conjuntos abstrativos desgarrados cohertospor partfculas de evento sem serem, eles pr6prios, membros destas. Nada nos oferecem de novo no sentido docaniter intrinseco. Portanto, podemos pensar em rectase nfveis como simples lugares geometricos de partfculasde eventos. Ao faze-lo, estamos tambem deixando de ladoaqueles elementos abstrativos que cobrem conjuntos departfculas de eventos, sem que tais elementos sejam, elespr6prios, partfculas de evento. Existem classes desses elementos abstrativos que sao de grande importancia. Deverei consideni-las mais adiante nesta e em outras conferencias. Por ora, vamos ignoni-las. Tambem me referirei sempre a "particulas de evento" de preferenciaa "punctos", urn termo artificial peIo qual nao tenhogrande simpatia.
o paralelismo entre rectas e nfveis torna-se agoraexplicaveI.
Considere-se 0 espac;o instantaneo pertencente a urnmomenta A e seja A perteneente aserie temporal de momentos que denominarei a. Considere-se outra serie temporal qualquer de momentos it qual chamarei (3. as momentos de {3 nao se interseeeionam mutuamente, masinterceptam a momenta A em uma farniliade nfveis. Nenhum desses nfveis pode interseccionar outro: forma umafamilia de pianos paralelos instantaneos no espa~o instantaneo do momento A. Assim, 0 paralelismo de momentos em uma serie temporal gera 0 paralelismo de niveis em urn espac;o instantaneo e dai - como e facil perceber - 0 paralelismo de retas. Desse modo, a propriedade euclidiana do espa~o nasce da propriedade parab6lica do tempo. Epossivel que nao haja razao alguma
para se adotar uma teoria hiperb6lica do tempo e umaeorrespondente teoria hiperb6liea do espa~o. Tal teoriaainda nao foi desenvolvida e, portanto, nao e possiveljulgar quanta ao carater das evidencias que se poderiamapresentar em seu favor.
A teoria da ordem em urn espac;o instantaneo e umaderiva~ao imediata da ordem temporal. Consideremos,pois, 0 espa~o de um momento M. Seja ex 0 nome deum sistema temporal ao qual M nao pertence. SejamAI, A2, As, etc., momentos de a na ordem de suas oeorrencias. Assim, AI, A2, As, etc., cortarao M nos nfveisparalelos It, h, Is, etc. Assim, a ordem re1ativa dos niveis paralelos no espa~o de M e identica it ordem relativa dos momentos eorrespondentes no sistema temporalex. Qualquer recta de M que corte todos esses niveis emseu conjunto de punctos reeebe par seus punctos, emconseqiiencia, uma ordem de posiC;ao em M. Entao, aordem espacial e derivativa da ordem temporal. Existern, alem disso, sistemas temporais alternativos, masuma unica ordem espacial definida em cada espa~o instantaneo. Por conseguinte, os diferentes modos de se derivar uma ordem espacial dos diversos sistemas temporais devem harmonizar-se com uma ordem espacial unicaem cada espa~o instantaneo. Dessa forma, tambem e possive1 comparar diferentes ordens temporais.
Temos ainda duas grandes quest6es pendentes a serem elucidadas antes de nossa teoria do espa~o estar plenamente ajustada. A primeira se refere adeterminac;aodos metodos de dimensionamento intra-espa~o,em outras palavras, ateoria da congruencia do espac;o. Veremos que 0 dimensionarnento do espac;o esta intimamenteligado ao dimensionamento do tempo, com relaC;ao ao
115oMETODO DA ABSTRA9AO EXTENSIVAo CONCEITO DE NA TUREZA114
116 o CONCE/TO DE NA TUREZA o METODO DA ABSTRA9AO EXTENS/VA 117
qual principio a1gum [oi determinado ate agora. Portanto, nossa teoria cia congruencia sera uma teoria referente tanto ao espa90 como ao tempo. Em segundo lugar, existe a determina~ao do espa<;o atemporal correspondente a qualquer sistema temporal particular comseu conjunto infinito de espa<;os instantaneos em seusmomentos sucessivos. Esse e0 espa<;o - au, antes, saoesses as espa<;os - cia ciencia f(sica. Emuito comumdesconsiderar esse espa~o qualificando-o de conceitual.Nao compreendo 0 sentido dessas palavras. Presumo quesignifiquem que 0 espa~o e a concep~ao de a1go existente na natureza. Nesse sentido, se 0 espa<;o cia ciencia ffsica for chamado de conceitual, pergunto, sera 0 conceito de que [ator da natureza? Por exemplo, quando[alamos de urn ponto no espa~o atemporal da ciencia flsica, presumo que estejamos nos referindo a alga existente na natureza. Se nao e a issa que nos referirnos,nossos cientistas estao investindo suas faculdades inteligentes nos domfnios cia pura fantasia, 0 que obviamente nao e 0 caso. Essa exigencia de urn Ato de Habeas Corpus definido para a produ~ao das entidades relevantescia natureza aplica-se tanto ao espac;o relativo como aoabsoluto. Talvez possa-se argumentar, em favor cia teoriarelativista do espac;o, que nao existe espac;o atemporalpara a ciencia flsica, mas apenas a serie momentaneade espac;os instantaneos.
Deve-se pedir uma explicac;ao, portanto, quanta aosignificado da afirma~ao tao comum de que tal ou qualhomem percorreu a pe quatro milhas num certo honirio determinado. Como podemos medir a distancia entre urn espa~o e outro espa~o? Posso compreender 0 queseja locomover-se com base em urn mapa de operac;oes
militares. Ja 0 significado de se dizer que Cambridgeas 10 horas da manha de hoje, nO espa~o instantfmeopertinente aquele instante, encontra-se a 52 milhas deLondres as 11 horas da manha de hoje, no espa~o instanta-neo pertinente aquele instante, fage totalmente aminha compreensao. Penso que quando urn significadopara essa afinna/.;ao hOllver sido apresentado, voces perceberao que 0 que de [ato construiram [oi urn espa~o
atemporal. 0 que nao posso compreender e como produzir uma explicac;ao desse significado sem, com efeito, fazer alguma constrUl;ao do genero. Posso acrescentar, ainda, que desconhel,;o 0 modo como os espal,;os instantaneos sao assim correlacionados no ambito de urnespa~o unico por qualquer metodo sugerido pe1as teorias correntes do espal,;o.
Voces terao observado que, com 0 concurso do pressuposto de sistemas temporais alternativos, estamos nosavizinhando de uma explica~ao do carater do espa~o.
Para a ciencia natural, "explicar" significa simpiesmentedescobrir "interligal,;oes". Em certo sentido, por exempIo, nao existe explical,;ao para 0 vermelho que enxergamos. Evermelho, e nao h<i nada alem a ser dito a seurespeito. Ou ele e apresentado diante de nos na apreensao senslvel ou ignoramos a entidade vermelho. A ciencia, todavia, explicou 0 vermelho, isto e, descobriu interliga~5es entre 0 vermelho enquanto [ator da natureza e outros fatores da natureza, por exemplo as ondasde luz, que sao ondas de perturba~5es e1etromagneticas.Existem ainda multiplos estados patologicos do organismo que conduzem avisao do vermelho sem a ocorrenciade ondas luminosas. Descobriu-se, assim, ligal,;oes entreo vermelho tal como apresentado na apreensao senslvel
118 o CONCE/TO DE NA TUREZA
e diversos outros fatores da natureza. A descoberta dessas liga~oes constitui a expIica~ao cientffica de nossa visao cia cor. De modo semelhante, a dependencia do carater do espac:;o com relac:;ao ao carater do tempo constitui uma explicac:;ao, no sentido em que a ciencia buscafornecer explicac:;6es. 0 inte1ecto sistematizante abomina os simples fatos. a carater do espa~o foi apresentado ate 0 momento presente como uma reuniao de fatDssimples, ultimos e desconexos. A teoria que estoll expondo pOe fim a essa desconexao entre os fatos do espa~o.
CAPITULO V
ESPAQO E MOVIMENTO
a prop6sito desta conferencia e dar prosseguimento it tarefa de explicar a constru~ao dos espa~os como abstrac:;5es derivadas dos fatDs cia natureza. Assinalamos, noencerramento cia conferencia passada, que a questao ciacongruencia naD havia sido ainda objeto de considera~ao, tarnpouco a constru~ao de urn espa~o atemporal queestabelecesse a correlac:;ao entre os sucessivos espac:;os momentaneos de urn sistema temporal dado. Foi tambemassinalada a existencia de diversos elementos espaciaisabstrativos que ainda nao haviarn sido objeto de defini~ao.
Consideraremos primeiro a defini~ao de alguns desseselementos abstrativos, a saber, as defini~5es de s61idos,areas e rotas. Com 0 termo "rota" designo urn segmentolinear, quer retilfneo quer curviHneo. A apresenta~ao dessas defini~5es e as explica~5es preliminares necessariasservirao, espero, como uma explica~aogeral da fun~ao
das particulas de evento na analise da natureza.Observamos que as particulas de evento sao dota
das de "posi~ao" com respeito umas as outras. Na con-
120 o CONCElTO DE NATUREZA ESPAr;O E MOVlMENTO 121
fereneia anterior, expliquei que "posi9ao" era qualidade adquirida por urn elemento espacial em virtude dosmomentos em interseq:ao que 0 cobriam. Enesse sentido, portanto, que uma particula de evento e dotadade posi~ao. a modo mais simples de expressar a posic;ao na natureza de uma partfcula de evento e atravesda fixa~ao inicial de urn sistema temporal definido qualquer. Vamos chama-lo de C/. Havera urn momento daserie temporal de C/ que cobrira a partfcula de eventodada. Assim, a posi~ao da partfcula de evento na serietemporal de C/ e definida por esse momento, ao qual chamaremos M. A posi~ao da partfcula no espa~o de M eentao determinada cia maneira usual, peIos tres niveisque neIa, e somente nela, se interseccionam. Tal procedimento de se determinar a posi9ao de uma partfculade evento mostra que 0 agregado de partfculas de evento forma urn multiplo quadridimensional. Urn eventofinito qualquer ocupa uma fatia limitada desse multiploem urn sentido que passo a explicar agora.
Seja e urn evento dado qualquer. a multiplo de partfculas de evento incide em tres conjuntos com referencia a e. Cada particula de evento e urn grupo de conjuntos abstrativos iguais e cada conjunto abstrativo direcionado para sua extremidade menor e composto deeventos finitos cada vez menores. Quando selecionamos,dentre esses eventos fiuitos que integram a composic;aode uma partfcula de evento dada, aqueles suficientementepequenos, urn dentre tres casos devera ocorrer. au (i)todos esses pequenos eventos sao inteiramente separados do evento dado e ou (ii) todos esses pequenos eventos sao partes do evento e ou (iii) todos esses eventos sesobrepoem ao evento e, mas nao constituem partes do
mesmo. No primeiro caso, diremos que a partfcula deevento "jaz exteriormente" ao evento e; no segundo caso, que a partfcula de evento "jaz interiormente" aoevento e, e no terceiro caso, que a partfcula de eventoe uma "particula limitrofe" do evento c. Existem, portanto, tres conjuntos de partfculas: 0 conjunto daquelasque jazem exteriormente ao evento e, 0 conjunto daquelasque jazem interiormente ao evento c, e 0 contorno doevento e, que e0 conjunto de partfculas limitrofes de e.
Vma vez que urn evento e quadridimensional, 0 contorno de urn evento eurn multiplo tridimensional. Paraurn evento finito, ha uma continuidade de contorno; parauma durac;;ao, 0 contorno consiste naquelas particulasde evento cobertas por qualquer urn dos dois momentos limitrofes. 0 contorno de uma durac;;ao, portanto,consiste em dois espac;;os tridimensionais momentaneos.Diremos que urn evento "ocupa" 0 agregado de particulas de evento compreendidas em seu interior.
Dizemos que dois eventos que apresentem "junc;;ao" - no sentido em que foi descrita ajunc;;ao em minha conferencia passada -, e que todavia estao separados, de sorte que nenhum evento se sobrepoe ao outro ou e parte deste, sao "adjacentes".
Tal rela~ao de adjacencia determina uma re1a~ao
peculiar entre os contornos dos dois eventos. Os dois contornos devem ter uma porc;;ao comum que e, na verdade, urn lugar geometrico tridimensional continuo de partfculas de evento no multiplo quadridimensional.
Urn lugar geometrico tridimensional de partfculasde evento, que ea porc;;ao comum dos contornos de doiseventos adjacentes, sera denominado urn "solido". V msolido pode estar ou nao completamente compreendido
122 o CONCEITO DE NA TUREZA ESPAi;O E MOVIMENTO 123
em urn momento. Urn solido que nao esteja compreendido em algurn momento sera charnaclo de "errante".Chama-se "volume" a urn solido efetivamente compreendido em urn momento. Podemos definir urn volume como 0 lugar geometrico das particulas de eventono qual urn momento Cruza urn evento, coutanto queambos efetivamente se interseccionem. A interseCl;ao entre urn momento e urn evento consistira, evidentemente, naquelas partfculas de evento cobertas peID momento e compreendidas no evento. A identidade das duasdefini~6es de volume torna-se evidente quando recordamos que, ao ser cortado par urn momento, 0 eventose divide em dois eventos adjacentes.
Urn solido, segundo essa defini~ao, quer se tratede urn errante ou de urn volume, eurn mero agregadode particulas de evento a revelar uma determinada qualidade de posi~ao. Tambem podemos definir urn solidocomo urn elemento abstrativo. Para tanto, devemos recarrer ateoria dos primos explicada na conferencia anterior. Seja a condi~ao denominada u representante dofato de que cada urn dos eventos de qualquer conjuntoabstrativo que a satisfa~a possuid. todas as particulas deevento de algum solido particular nele compreendido.Assim, 0 grupo de todos os u-primos e 0 elemento abstrativo associado ao solido dado. Chamarei a esse elementa abstrativo 0 solido enquanto e1emento abstrativoe ao agregado de particulas de evento 0 solido enquantolugar geometrico. Os volumes instantaneos em espayoinstantaneo, que sao os ideais de nossa percepc;ao sensfvel, sao volumes enquanto elementos abstrativos. Aquiloque realmente percebemos com todos os esfor~os que envidamos em busca cia precisao sao pequeuos eventos si-
tuados a uma distancia suficiente no sentido cia extremidade menor de algum conjunto abstrativo pertencenteao volume enquanto elemento abstrativo.
Edificil saber ate que ponto nos aproximamos dequalquer apreensao dos solidos errantes. Seguramentenao imaginamos fazer nenhuma aproximac;ao tal. Nesse caso, porem, nossos pensamentos - no que tange aosindividuos que efetivamente se ocupam dessas questaes- de tal modo se encontram sob controle da teoria materialista cia natureza que dificilmente valero como evidencia. Se a teoria da gravita~aode Einstein contem alguma verdade, os solidos errantes sao de grande importancia para a ciencia. 0 contorno todo de urn eventofinito pode ser encarado como exemplo particular de urnsolido errante enquanto lugar geometrico. Sua peculiarpropriedade de ser fecbado impede que seja definivel como urn elemento abstrativo.
Quando urn momento cruza urn evento, divide tambern 0 contorno daquele evento. Esse lugar geometrico, que e a pon;ao do contorno compreendida no momenta, ea superffcie limftrofe do volume correspondentedaquele evento contido no momento. Trata-se de urnlugar geometrico bidimensional.
o fato de todo volume possuir uma superficie limitrofe e a origem da continuidade dedekindiana1 doespa~o.
Outro evento pode ser cortado pelo mesmo momenta em outro volume e este volume tambem tera seu con-
1. Referencia ao matematico alemaoJulius Wilhelm Richard Dedekind (1831-1916), autor, entre outras obras, de "Continuidade e numerosirracionais", de 1872. (N. T.)
124 o CONCEITO DE NA TUREZA ESPAr;:O E MOVIMENTO 125
torno. Os dais volumes no espac;o instantaneo de urn momenta podem sobrepor-se mutuarnente no modo familiar que naD preciso explicar em detalhe e, assim, eliminar por~6es da superffcie urn do outro. Tais por~6es desuperficies sao "areas momentais".
Edesnecessario, no presente estagio, nos embrenharmos peJa complexidade de uma defini~ao de areaserrantes. Sua defini~aoparecera simples 0 bastante quando 0 multiplo quadridimensional de partfculas de evento houver sido explorado mais amplamente no tocantea suas propriedades.
As areas momentais podem, eevidente, ser definidas como elementos abstrativos, peJo mesmo metodoaplicado aos solidos. Tudo 0 que devemos fazer e substituir "solido" por "area" no enunciado cia definic;aoja apresentada. Assim tambem, exatamente como no caso anaJogo de urn solido, 0 que percebemos como umaaproximac;ao a nosso ideal de area eurn evento pequeno suficientemente distanciado no sentido cia extremidade menor de urn dos conjuntos abstrativos iguais pertencente a area como urn elemento abstrativo.
Duas areas momentais compreendidas no mesmamomento podem cOftar uma aDutra em urn segmentomomental nao necessariamente retilineo. Tal segmentotambem pode ser definido como urn elemento abstrativo e recebera, entao, 0 nome de "rota momental". Naonos deteremos em nenhuma considerac;;ao geral dessasrotas momentais, tampouco nos e importante passar ainvestigac;;ao ainda mais ampla das rotas errantes em geral. Existem, todavia, dois conjuntos simples de rotascuja importancia e vital. 0 primeiro e urn conjunto derotas momentais e 0 outro de rotas errantes. Ambos po-
dem ser reunidos em uma unica classe como rotas retilineas. Passaremos asua definic;;ao sem nenhuma referencia as definic;;oes de volumes e superficies.
Os dois tipos de rotas retilineas serao chamados derotas retilineares e estac;5es. Rotas retilineares sao rotasmomentais, enquanto estac;oes sao rotas errantes. Rotas retilineares sao rotas que, em certo sentido, estao contidas em rectas. Duas partfculas de evento quaisquer situadas em uma recta definem 0 conjunto de particulasde evento compreendidas entre elas naquela recta. Admitamos que a satisfa~ao da condi~ao (j por urn conjunto abstrativo signifique que as duas partfculas de evento dadas e as partfculas de evento compreendidas entreelas na recta estao todas compreendidas em cada evento pertencente ao conjunto abstrativo. 0 grupo dea-primos, em que (J tern esse significado, forma urn elemento abstrativo. Tais elementos abstrativos sao rotasretilineares, segmentos de linhas retas instantaneas queconstituem os ideais da percep~aoexata. Nossa percepc;;ao efetiva, por exata que seja, sera a percepc;;ao de urnevento pequeno, suficientemente distanciado no sentido da extremidade menor de urn dos conjuntos abstrativos do elemento abstrativo.
V rna estac;;ao e uma rota errante; nenhum momentopode cruzar esta~ao alguma em mais que uma partfcula de evento. Vma estac;;ao, portanto, traz consigo umacomparac;;ao das posic;;oes, em seus respectivos momentos, das partfculas de evento por ela cobertas. As rectasse originam da intersec~aode momentos. Ate agora, porem, nao se fez menc;;ao a propriedades de eventos atrayeS das quais se possa descobrir qualquer lugar geometrico errante anaIogo.
126 o CONCEITO DE NA TUREZA ESPAr;O E MOVIMENTO 127
o problema geral para nossa investiga~aoconsisteem determinar urn metoda de compara~ao de posic;aoem urn espac;o instantaneo com posic;oes em outros espa~os instantaneos. Podemos nos limitar aos espa~os dosmomentos paralelos de urn sistema temporal. De quemodo deverao ser comparadas as posic;oes nesses diferentes espa~os? Em outras palavras, 0 que entendemospor movimento? Eis a questao fundamental a ser levantada com respeito a qualquer teoria de espa~o relativoe, a exemplo de diversas outras questoes fundamentais,e grande a possibilidade de ficar sem resposta. Replicarque todos sabemos 0 que entendemos por movimentonao e uma resposta. Claro que sabemos, no que tangeanossa apreensao senslvel. Minha reivindicac;ao ea deque nossa teoria de espal.;o cleve investir a natureza dealgo a ser observado. A questao nao tera sido respondida com a apresenta~ao de uma teoria segundo a qualnada existe a seT observado e reiterando, entaa, que, naoobstante, observamos efetivamente tal fata inexistente.A menos que 0 movimemo seja algo como urn fato danatureza, a energia cinetica, 0 momenta e tudo quantadepende desses conceitos fisicos evapora de nosso rol derealidades ffsicas. Mesilla nesta era revolucionaria, meuconservadorismo se op6e frontalmente aidentifica~ao doconceito de momenta com uma irrealidade.
Por conseguinte, parto do axioma de que 0 movimento e urn fato f[sico. E algo que percebemos comoexistente na natureza. Movimento pressup6e repouso.Ate 0 surgimento da teoria para perverter a intuiyao imediata, vale dizer, para perverter os julgamentos aerfticos que deeorrem imediatamente da apreensao sensivel,ninguem punha em duvida que, no movimento, deixa-
mos para tras aquila que se eneontra em repouso. Emsuas peregrinayoes, Abraao deixou seu rincao de origemonde este sempre estivera. Uma teoria do movimentoe uma teoria do repouso representam a mesma eoisa observada sob diferentes aspectos e com enfases alteradas.
Ora, nao podemos dispor de uma teoria do repousosem admitir, em algum sentido, uma teoria da posiyaoabsoluta. Presume-se, de habito, que 0 espa~o relativoimplica a inexistencia de qualquer posi~ao absoluta. 0que, segundo minha doutrina, e urn equivoco. 0 pressuposto nasce da incapacidade em se estabelecer outradistin~ao, a saber, a de que possam existir defini~6es alternativas de posi~ao absoluta. Tal possibilidade se introduz com a admissao de sistemas temporais alternativos. Assim, a serie de espayos nos momentos paralelosde uma serie temporal determinada pode ter sua propriadefini~aode posi~ao absoluta estabelecendo-se uma correla-;;ao entre eonjuntos de partieulas de eventos nessesespayos sueessivos, de modo que cada eonjunto eonsista em partfculas de evento, urn de cada espa~o, cada qualcom a propriedade de processar a mesma posi~ao absoluta naquela serie de espa~os. Urn conjunto tal de pardculas de evento formara urn ponto no espa~o atemporaldaquele sistema temporal. Portanto, urn ponto e, verdadeiramente, uma posi~ao absoluta no espa~o atemporal de urn sistema temporal dado.
Existem, todavia, sistemas temporais alternativose cada sistema temporal possui seu proprio gropo peculiar de pontos - ou seja, sua propria defini~aopeculiarde posi~ao absoluta. Eessa exatamente a teoria que pretendo elaborar.
Ao se contemplar a natureza em busca de evideneias de posiyoes absolutas, sera ocioso reeorrer ao mul-
tiplo quadridimensional de particulas de evento. Essemultiple foi obtido peIa extensao do pensamento paraalem do imediatismo cia observac;ao. Nada encontraremos nele senao 0 que ali colocamos a fim de representar, no pensarnento, as id€ias originadas de nossa direta apreensao sensiveI da natureza. A fim de descobrirevidencias das propriedades a serem encontradas no multiplo de partkulas de eventos, devemos sempre recorrer aobservac;ao das relac;5es entre eventos. Nossa problema edeterminar aquelas reIa~5es entre eventos queresultam na propriedade da posi~ao absoluta em urn espa~o atemporal. Trata-se, na verdade, do problema dadetermina~aodo proprio significado dos espa~os atemporais na ciencia ffsica.
Quando analisamos as fatores cia natureza tais como imediatamente revelados na apreensao sensfvel, devemos observar 0 carater fundamental do objeto da percepc;ao do "estar aqui". Discernimos urn evento meramente como fator de urn complexo determinado no qualcada fatar tern sua participac;ao propria e caracterfstica.
Dais fatores hi que sao ingredientes constantes dessecomplexo: 0 primeiro ea durac;ao, representada no pensamento peIo conceito de toda a natureza que se faz presente agora, eo segundo, 0 locus standi peculiar cia mente envolvida na apreensao sensivel. Esse locus standi danatureza e aquilo que, no pensamento, e representadopelo conceito de "aqui", isto e, de urn "evento aqui".
Trata-se do conceito de urn fator preciso da natureza. Tal fator eurn evento que constitui 0 foco, na natureza, do ate da percepc;ao, enquanto os demais eventos sao percebidos em referencia a e!e. Tal evento eparteda durac;ao associada e a ele chamarei "evento perci-
piente". Esse evento nao e a mente, ou seja, nao e 0
percipiente. Eaquilo existente na natureza a partir doqual a mente percebe. A base completa da mente na natureza esta representada por urn par de eventos, quaissejam, a durac;ao presente, que assinala 0 "quando" dapercepc;ao, e 0 evento percipiente, que assinala 0 "onde" da percepc;ao e 0 "como" da percepc;ao. Tal evento percipiente e, grosso modo, a vida corporal da menteencarnada. Mas essa e apenas uma identificac;ao grosseira. Isso porque as func;6es corporais gradativarnentese confundem com aquelas de outros eventos da natureza, de sorte que, para certas finalidades, 0 evento percipiente deve ser avaliado simplesmente como parte davida corporal e, para outras, pode ser avaliado ate mesmo como algo mais que a vida corporal. Sob varios aspectos, a demarcac;ao e puramente arbitraria, dependendo de onde elegemos fixar limites em uma escala move!.
Em minha conferencia anterior sobre 0 Tempo, discuti a associac;ao entre mente e natureza. A dificuldadeda discussao reside numa propensao em se negligenciarcertos fatares constantes. Jamais os percebemos pe!o contraste com suas ausencias. 0 prop6sito de uma discussao de tais fatores pode ser descrito como 0 de fazer comque coisas 6bvias parec;am extraordinarias. Nao podemos divisa-las a menos que logremos investi-las de algodo ineditismo decorrente da estranheza.
Eem razao desse habito de deixar os fatores constantes resvalarem consciencia afora que constantemente incorremos no equivoco de considerar a apreensao sensive! de algum fator particular da natureza uma re!a~ao
binaria entre a mente e 0 fator. Por exemplo, percebouma folha verde. A linguagem dessa asser~ao suprime
128 o CONCEITO DE NA TUREZA ESPAr;;O E MOVIMENTO 129
I
130 o CONCEITO DE NA TUREZA ESPAr;;O E MOVIMENTO 131
toda referencia a quaisquer fatores outros que nao a mente percipiente, a folha verde e a rela~iio de apreensiiosensivel. A linguagem descarta os fatores obvios e inevitaveis que constituem elementos essenciais cia apreensao. Estoll aqui, a falha est;a ali; eo evento aqui e 0 evento que ea vida da folha ali estiio ambos imersos em umatotalidade da natureza que eagora, totalidade que abrigaoutros fatores as quais eirrelevante mencionar. Portanto,a linguagem amiude defronta a mente com uma enganadora abstra~iioda indefinida complexidade do fato daapreensao sensfvel.
o que pretendo discutir agora ea rela~iio especialentre 0 evento percipiente que esta "aqui" e a dura~ao
que e "agora". Tal relac;ao eurn fata cia natureza, ouseja, a mente e conscia cia natureza enquanto imbufdadesses dois fatores nessa rela~iio.
No ambito cia breve durac;ao presente, 0 "aqui"do evento percipiente tern urn certo significado claro.Esse significado do "aqui" ea conteudo cia relac;ao especial entre 0 evento percipiente e sua durac;ao associacia. Chamarei a essa relac;ao "cogrediencia". Busco, portanto, uma descri~iiodo carater da rela~iiode cogrediencia. 0 presente se rompe em urn passado e urn presentequando 0 "aqui" da cogrediencia perde seu significadotinico e determinado. A natureza sofreu uma passagemdo "aqui" da percep~aocompreendida na dura~aopassada para 0 "aqui" diferente da percep~ao compreendida na dura~ao presente. Contudo, os dois "aquis" daapreensao sensfve1 compreendida em dura~oes vizinhastalvez sejam indistingufveis. Neste caso, verificou-se umapassagem do passado para 0 presente, embora uma for~a perceptiva mais retentiva pudesse ter retido a natu-
reza passante como urn presente tinico e completo, emlugar de permitir que a durac;ao interior resvalasse passado adentro. Em outras palavras, 0 sentido de repousocontribui para a integrac;ao das durac;oes em urn presente prolongado, enquanto 0 sentido de movimento diferencia a natureza em uma sucessao de durac;oes abreviadas. Ao olbarmos para fora do vagiio em urn tremexpresso, 0 presente passou antes que a reflexao pudesse captud.-lo. Vivemos em fragmentos demasiado velozes para 0 pensamento. Por outro lado, 0 presente imediato e prolongado segundo a natureza se apresente anos sob urn aspecto de repouso inquebrand.vel. Qualquer modifica~iiona natureza da margem it diferencia'Yao entre dura'Yoes, de modo a abreviar 0 presente. Existe, porem, uma grande distin'Yao entre automodifica'Yaona natureza e modifica'Yao na natureza externa. A automodifica~iio na natureza euma a1tera~iio na qualidade do ponto de vista do evento percipiente. Eo rompimento do "aqui", que torna indispensavel 0 rompimentoda dura'Yao presente. A mudan'Ya na natureza externaecompativel com urn prolongamento do presente da contempla~iio radicada em urn ponto de vista determinado. 0 que desejo salientar eque a preserva~iio de umarela'Yao peculiar com uma dura'Yao e uma condi'Yao necessaria it fun~iio daquela dura~iio enquanto dura~iio presente para a apreensao sensfvel. Essa rela'Yao peculiare a rela'Yao de cogrediencia entre 0 evento percipientee a dura~iio. Cogrediencia ea preserva~iio de uma qualidade inquebrantavel de ponto de vista no ambito dadura~iio. E 0 prolongamento da identidade de esta~iiono ambito da natureza como urn todo, que e 0 termoda apreensiio sensivel. A dura~iio pode compreender mo-
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dificac;.oes internamente a si mesma, mas naG pode na medida em que euma durac;.ao unica presente - compreender modifica~6esna qualidade de sua rela~ao peculiar com 0 evento percipiente canticlo.
Em outras palavras, a percepc;.ao esempre "aquin,
e uma dura~ao so pode ser postulada como presente para a apreensao sensivel sob a condic;.ao de propiciar urnsignificado unico e inquebrantavel do "aqui" em suarela~ao com 0 evento percipiente. Apenas no passadoepassIve! termos estado "ali" com urn ponto de vistadiverso de nosso presente "aqui".
as eventos ali e os eventos aqui sao [atos da natureza e as qualidades de estar "ali" e "aqui" naG saomeras qualidades cia apreensao enquanto uma relac;.aoentre natureza e mente. A qualidade de determinada estac;.ao na durac;.ao pertencente a urn evento que se encontra" aqui", em urn certo sentido do" aqui" , e0 mesmo tipo de qualidade de esta~ao pertencente a urn eventoque se encontra "ali" , em certo sentido do "ali" . A cogrediencia, portanto, nada tern a ver com algum carater biologico do evento por e1a re1acionado it dura~aoassociada. Tal carater biologico e aparentemente umacondi<;ao adicional para 0 vinculo peculiar entre urnevento percipiente e a percipiencia da mente; mas nadatern a ver com a rela<;ao entre 0 evento percipiente e adura<;ao, que e 0 todo presente da natureza apresentado como a revela<;ao da percipiencia.
Dado seu canlter biol6gico indispensavel, 0 evento, em seu carater de evento percipiente, elege aqueladura~ao com a qual 0 passado atuante do evento e praticamente cogrediente nos limites da exatidao da observa<;ao. Dito de outra forma, em meio aos sistemas tem-
porais alternativos oferecidos pela natureza, havera urncuja dura<;ao fornecera a melhor media de cogredienciapara todas as partes subordinadas do evento percipienteo Tal dura<;ao sera a natureza como urn todo, que eo termo apresentado pe1a apreensao senslvel. Assim, 0
carater do evento percipiente determina 0 sistema temporal de imediata evidencia na natureza. Amedida queo carater do evento percipiente se modifica com a passagem da natureza - ou, em outras palavras, amedida que a mente percipiente em sua passagem estabe1eceuma correla<;ao entre a passagem do evento percipientee outro evento percipiente - 0 sistema temporal correlacionado com a percipiencia daque1a mente pode modificar-se. Quando 0 montante dos eventos percebidossao cogredientes em uma dura<;ao outra que nao a doevento percipiente, a percipiencia podera inc1uir umadupla consciencia de cogrediencia, a saber, a consciencia do todo em cujo ambito 0 obervador no trem se encontra "aqui" e a consciencia do todo em cujo ambitoas arvores, pontes e postes telegraficos encontram-se definitivamente (( ali". Assim, nas percep<;6es sob determinadas circunstancias, os eventos discriminados estipulam suas proprias re1a~6es de cogrediencia. Tal estipula~ao de cogrediencia e peculiarmente clara quando adura~ao com a qual 0 evento percebido e cogredientee identica adura<;ao que e0 todo presente da natureza- em outras palavras, quando 0 evento e 0 evento percipiente sao ambos cogredientes com a mesma dura<;ao.
Estamos agora preparados para considerar 0 significado das esta<;6es em uma dura<;ao, onde estas sao umaespecie singular de rotas a definir uma posi~ao absolutano espa~o atemporal associado.
134 o CONCElTO DE NA TUREZA ESPAr;:O E MOVlMENTO 135
Mas existem algumas explica~5espreliminares. Diremos que urn evento finito se estende por teda uma dura~ao quando e parte da dura~ao e e cortado por qualquer momento compreendido na dura~ao. Tal eventocome~a com a dura~ao e termina com ela. Ora, todoevento que comec;a com uma durac;ao e termina com amesma, se estende por toda a dura~ao. Tal axioma estabaseado na continuidade dos eventos. Por iniciar comuma dura~ao e terminar com ela, quero dizer que (i)o evento e parte da dura~ao e (ii) os momentos limftrofes inicial e final da dura~ao cobrem algumas partfeulasde evento situadas no contorno do evento.
Todo evento que e cogrediente com uma dura~ao
se estende por toda essa dura~ao.
Nao e verdade que todas as partes de urn evento cogrediente com uma dura~ao sejam tambem cogredientes com a dura~ao. A rela~ao de cogrediencia pode deixar de se estabeIecer de duas maneiras diferentes. Vmarazao para tal pode ser a de que a parte nao se estendapor toda a dura~ao. Nesse caso, a parte pode ser cogrediente com outra dura~aoque e parte da dura~aodada,embora nao seja cogrediente com a dura~ao dada em si.Tal parte seria cogrediente caso sua existencia fa sse suficientemente prolongada naquele sistema temporal. Aoutra razao para que nao se estabelec;a a cogrediencia surge cia extensao quadridimensionaJ de eventos, de sortea inexistir uma rota precisa de transic;ao de eventos emuma serie linear. Por exemplo, 0 tune! de urn sistemametroviario eurn evento em repouso em urn determinado sistema temporal, vale dizer, e cogrediente com umadeterminada dura~ao. Urn trem que 0 percorra e partedaquele tunel, mas ele proprio nao esta em repouso.
Se urn evento efor cogrediente com uma dura~aod,ed' uma dura~aoque eparte de d, d' pertencera ao mesmo sistema temporal qued. Assim tambem, d' cruzaeemurn evento e' que eparte de e e cogrediente com d' .
Seja Puma partfcuJa de evento qualquer compreendida em uma dura~ao d dada. Considere-se 0 agregadode eventos em que Pesta compreendido e que tambemsao cogredientes com d. Cada qual desses eventos ocupaseu proprio agregado de partfculas de evento. Tais agregados terao uma parcela comum, a saber, a classe departfculas de evento que jaz em todos e1es. Essa classede partfculas de evento e 0 que denomino "esta~ao"daparticula de evento P na dura~aod. Trata-se da esta~ao
no carater de urn Jugar geometrico. U rna esta~ao podetambem ser definida no carater de urn elemento abstrativo. Seja a propriedade a a denomina~ao da propriedade de que e dotado urn conjunto abstrativo quando(i) cada qual de seus eventos e cogrediente com a dura~ao de (ii) a partfeula de evento Pesta compreendida em cada qual de seus eventos. Assim, 0 grupo dea-primos, onde a possui esse significado, eurn elemento abstrativo e constitui a esta~ao de P em d enquantoelemento abstrativo. 0 lugar geometrico das partfculasde evento cobertas pela esta~ao de P em d, enquanto elemento abstrativo, e a esta~ao de P em d enquanto lugargeometrico. Vma esta~ao, por conseguinte, possui os trescaracteres usuais, ou seja, seu carater de posi~ao, seucar~lter extrinseco enquanto elemento abstrativo e seu carater intrfnseco.
Das propriedades peculiares do repouso segue-seque duas esta~oes pertencentes a mesma dura<;ao nao
podem interseccionar-se. Por conseguirite, cada particula de evento em uma esta~ao de uma dura~ao ternaque1a esta<;ao como sua esta<;ao na dura<;ao. Assim tambem, toda dura~iio que e parte de uma dura~iio dadacorta as esta~6es da dura~iiodada em lugares geometricos que sao suas pr6prias esta<,;oes. Por meio dessas propriedades podemos nos valer das sobreposi~6es de dura<;5es de uma familia - isto e, de urn sistema temporal - para prolongar indefinidamente as esta~6es paratras e para a frente. Essa esta~iio prolongada sera chamada de uma trilha de pontos. Uma trilha de pontose um lugar geometrico de particulas de evento. Edefinida par referencia a urn sistema temporal particular,digamos 0<. Gorrespondente a qualquer outro sistematemporal, estas particulas formado um grupo diferente de trilhas de pontos. Gada particula de evento estarasituada em uma, e uma unica, trilha de pontos do gropo pertencente a qualquer sistema temporal. 0 grupode trilhas de pontos de um sistema temporal 0< e 0 grupo de pontos do espa~o atemporal de 0<. Gada um desses pontos indica uma certa qualidade de posi~iio absoluta com referencia as dura~6es da familia associada aa e, portanto, com referencia aos sucessivos espac;os instantaneos compreendidos nos sucessivos momentos de0<. Gada momento de 0< corta uma trilha de pontos emuma, e uma unica, partfcula de evento.
Essa propriedade da intersec~iiounica de um momenta e uma trilha de pontos DaD se restringe ao casoem que 0 momenta e a trilha de pontos pertencem aomesmo sistema temporal. Quaisquer duas particulas deevento em uma trilha de pontos sao sequenciais, de sorte que DaD podem estar situadas no mesmo momento.
Por conseguinte, nenhum momento pode cortar uma triIha de pontos mais de uma vez e cada momento cruzauma trilha de pontos em uma unica partfcula de evento.
Qualquer urn que, nos momentos sucessivos de ex,se encontre nas partfculas de evento em que tais momentos cruzam urn ponto determinado de ex, estara em repouso no espa~o atemporal do sistema temporal 0<. Emqualquer outro espa~o atemporal pertencente a algumoutro sistema temporal, no entanto, de estara em urnponto diferente a cada momento sucessivo daquele sistema temporal. Em outras palavras, de estara em movimento. Estara se movendo em linha reta e velocidadeuniforme. Poderfamos tomar isso como a defini~ao delinha reta, ou seja, uma linha reta no espa~o do sistematemporal {3 e 0 lugar geometrico daqueles pontos de {3que atravessam, sem exce~ao, uma certa trilha de pontos, que eurn ponto no espa~o de algum outro sistematemporal. Portanto, cada ponto do espa~o de um sistema temporal ex esta associado a uma, e uma unica, Iinha reta do espa~o de qualquer outro sistema temporal{3. Verifica-se, desse modo, que 0 conjunto de linhas retasno espa-;o {3 assim associadas com pontos no espa~o exforma uma familia completa de linhas retas paralelas noespa~o {3. Existe, portanto, uma correla~iiode um-paraurn entre os pontos no espa~o ex e as Iinhas retas de umacerta familia definida de linhas paralelas no espa~o {3.Inversamente, existe uma correla~ao amil.oga de umpara-um entre os pontos do espa~o {3 e as linhas retasde uma determinada familia de linhas retas paralelas noespa~o ex. Tais famflias serao respectivamente denominadas a familia de paralelas em {3 associadas com 0< ea familia de paralelas em 0< associadas com {3. A dire~iio
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no espa~o de {3 indicada pe1a familia de parale1as em {3sed. chamada de dire~ao de ex no espa~o {3, enquantoa familia de parale1as em ex sed. a dire~ao de {3 no espa~o a. Dessa forma, urn ente em repouso em urn pontodo espa~o ex estani se deslocando em movimento uniforme ao lange de uma linha no espa~o {3 que se encontra na dire~ao de ex no espa~o {3, e urn ente em repousoem urn ponto do espa~o {3 estad. se deslocando em movimento uniforme ao longo de uma linha no espa~o exque se encontra na dire~ao de {3 no espa~o ex.
Estive falando de espa~os atemporais associados asistemas temporais. Sao esses as espa~os cia ciencia ffsica e de qualquer conceito de espa~o como eterno e imutavel. Mas aquilo que efetivamente percebemos e umaaproximac.;ao ao espa90 instantaneo indicado por partfculas de evento compreendidas em algum momento dosistema temporal associado a nossa apreensao. Os pontos de tal espa~o instantaneo sao partfculas de eventoe as linhas retas sao rectas. Chamemos a ao sistema temporal e seja M 0 momento do sistema temporal ex ao qualnossa apreensao instantanea cia natureza se aproxima.Qualquer linha reta r do espa~o ex e urn lugar geometrico de pontos e cada ponto e uma trilha de pontos queeurn lugar geOlnetrico de partfculas de evento. Existe,portanto, na geometria quadridimensional de todas aspartfculas de evento, urn lugar geometrico bidimensional que e 0 lugar geometrico de todas as partfculas deevento existentes nos pontcs compreendidos na linha retar. Chamarei a esse lugar geometrico de partfculas deevento a matriz cia linha reta r. Vma matriz cruza qualquer momento de uma recta. Assim, a matriz de r cortao momento M em uma rectap. Portanto, pea recta ins-
tantanea de M que ocupa, no momento M, a linha retar no espac;o de a. Assim sendo, quando se ve, instantaneamente, urn ente em movimento e 0 caminho que 0
mesmo tern afrente, 0 que realmente se ve e0 ente emalguma partfcula de evento A compreendida na recta p,que e 0 caminho aparente mediante 0 pressuposto deurn movimento uniforme. Mas a recta atual p, urn lugar geometrico de partfculas de evento, jamais e atravessada pelo ente. Essas partfculas de evento sao os fatos instantaneos que passam com 0 momento instantaneo. Efetivamente atravessadas sao outras partfculas deevento que, em instantes sucessivos, ocupam os mesmospontos do espa~o ex que aqueles ocupados pelas partfculas de evento da recta p. Por exemplo, avistamos urntrecho de estrada e urn caminhao a percorre-Io. A estrada instantaneamente vista e uma porc;ao da recta p
- obviamente apenas uma aproxima~ao desta. 0 caminhao e 0 objeto em movimento. Mas a estrada, talcomo a vemos, jamais e atravessada. Nos a imaginamoscomo sendo atravessada porque os caracteres intrfnsecos dos eventos mais recentes em geral de tal modo seassemelham aqueles da estrada instantanea que nao nosdamos ao trabalho de discrimina-Ios. Imaginemos, porem, que uma mina instalada sob a superffcie da estrada tenha explodido antes da chegada do caminhao. Nessecaso, e obvio que 0 caminhao nao atravessara aquilo quevimos de infcio. Imaginemos que 0 caminhao se encontre em repouso no espa~o {3. Assim, a Iinha reta r doespa~o ex estara na dire~ao de {3 no espa~o ex, enquantoa recta p estara representando a Iinha r do espa~o ex nomomento M. A dire~ao de p no espa~o instantaneodo momento Mea dire~ao de {3 em M, onde Meum
140 o CONCEITO DE NA TUREZA ESPAr;O E MOVIMENTO 141
momento do sistema temporal Q. Outrossim, a matrizda linha r do espa~o '" sera igualmente a matriz de umacerta linha s do espa~o {3 que estara na dire~ao de '" noespa~o {3. Portanto, se 0 carninhao se detiver em urn certoponto P do espa~o '" compreendido na linha r, estaraagora se deslocando pela linha s do espa~o {3. Esta e ateoria do movimento relativo; a matriz camum e0 Iiame que liga 0 movimento de {3 no espa~o '" com os movimentos de '" no espa~o {3.
o rnovimento eessencialmente uma re1a~ao entrealgum objeto da natureza e 0 espa~o atemporal unicode urn sistema temporal. Urn espa~o instantaneo e estatico e esta relacionado anatureza estatica em urn instante. Quando, na percep~ao, enxergamos coisas a semover em uma aproxima~aoa urn espac;o instantaneo,as linhas futuras de rnovimento tal como imediatamente percebidas sao rectas jamais atravessadas. Essas rectas aproximativas sao compostas de pequeuos eventos,a saber, rotas aproximativas e partfculas de evento quesao deixadas para tras antes que os objetos em movimenta as alcancem. Presumindo que nossos progn6sticos de urn movimento retilfneo estejam corretos, essasrectas ocupam as linhas retas do espa~o atemporal quesao atravessadas. As rectas, portanto, sao sfmbolos daapreensao sensfvel imediata de urn futuro que apenaspermite ser expresso em termos de espac;o atemporal.
Estamos agora em condi~oes de explorar 0 caraterfundamental da perpendicularidade. Consideremos osdois sistemas temporais a e 13, cada urn com seu pr6prio espa~o atemporal e sua propria familia de momentos instantaneos com seus espac;os instantaneos. SejamMeN, respectivamente, urn momento de a e urn mo-
mento de {3. M abriga a dire~ao de BeN abriga a dire<;ao de a. Contudo, na condic;ao de momentos de sistemas temporais diferentes, MeN se interseccionam emurn nfvel. Chamemos a esse nfvel A. Assim sendo, Aeurn plano instantaneo no espa~o instantaneo de M e noespa~o instantaneo de N. Trata-se do lugar geometricode todas as particulas de evento compreendidas tantoem M como em N.
No espa~o instantaneo de M, 0 nivel Ae perpendicular a dire~ao de {3 em M e, no espa~o instantaneo deN, 0 nivel A e perpendicular a dire~ao de '" em N. Tale a propriedade fundamental que constitui a defini~ao
de perpendicularidade. A simetria da perpendicularidadeeurn caso particular de simetria das relac;6es mutuas entre dois sistemas temporais. Verificaremos na pr6ximaconferencia que e dessa simetria que deriva a teoria dacongruencia.
A teoria da perpendicularidade no espa~o atemporal de qualquer sistema temporal '" decorre de imediatodessa teoria da perpendicularidade em cada urn de seusespac;os instantaneos. Sejam puma recta qualquer nomomenta M de '" e A urn nivel em M perpendicular ap. 0 lugar geometrico desses pontos do espa~o de '" quecortam M em particulas de evento de p sera a linha retar do espa~o "', e 0 lugar geometrico dos pontos do espa~o de '" que cortam M em particulas de evento em A eo plano I do espa~o "'. Entao, 0 plano I e perpendiculara linha r.
Dessa forma, logramos colocar em evidencia as propriedades especfficas e precisas da natureza correspondentes aperpendicularidade. Verificaremos que essa descoberta de propriedades singulares que definem a per-
142 o CONCE/TO DE NA TUREZA
pendicularidade ede surna importancia para a teoria ciacongruencia, que sera 0 tema cia proxima conferencia.
Lamento que me tenha sido necessaria administrar,nesta conferencia, uma dose tao farta de geometria quadridimensional. Nao estou me desculpando, pois realmente nao sou responsavel peIo fatD de a natureza serquadridimensional em seu aspecto mais fundamental.As coisas sao como sao; e seria Gcioso encobrir 0 fatD
de que freqiientemente ediffcil aos nossos intelectos seguir aquila que "as coisas sao". Furtar-se a tais obstaculos nao passa de escapismo para com as questoesultimas.
CAPITULO VI
CONGRUENCIA
A presente conferencia tern par meta estabeleceruma teoria cia congruencia. Eo preciso que compreendam,de imediato, que a congruencia euma quesdio controversa. :E a teoria do dimensionamento no espa~o e notempo. A questao parece simples. Na verdade, e simples a ponto de um ato parlamentar haver estabe1ecidoum procedimento padrao - e a dedica~ao a sutilezasmetaffsicas e praticamente 0 unico crime jamais imputado a nenhum parlamento ingles. Todavia, 0 procedimento e uma ·coisa e seu significado outra.
Inicialmente, voltemos nossa aten~ao para a questao puramente matematica. Quando 0 segmento entredois pontos A e B e congruente com aque1e entre doispontos C e D, os dimensionamentos quantitativos dosdois segmentos serao iguais. A igualdade das medidasnumericas e a congruencia dos dois segmentos nem sempre sao claramente discriminadas, sendo ambas confundidas sob 0 termo igualdade. Contudo, 0 processo dedimensionamento pressupoe congruencia. Por exemplo,
144 o CONCEITO DE NA TUREZA CONGRUENCIA 145
1I
uma medida em jardas e aplicada sucessivamente parase dimensionar duas distancias entre dais pares de pontos no pisa de uma sala. Faz parte cia essencia do processo de dimensionamento a condi~ao de que a medidaem jardas se mantenha inalterada ao ser transferida deuma posi~ao para outra. Alguns objetos podem se alterar concretamente ao se movimentarem - urn fie ehistico, por exemplo; uma medida em jardas, todavia, caso executada com 0 material adequado, nao ira se alterar. 0 que vern a ser issa senao urn julgamento de congruencia aplicado aserie de posi<;5es sucessivas cia medida em jardas? Sabemos que ela nao se altera, poisjulgamos que seja congruente consigo propria em diferentes posi<;5es. No caso do fio, podemos observar a percia de autocongruencia. Assim, julgamentos imediatosde congruencia sao pressupostos no dimensionamento,senda este meramente urn processo para estender 0 reconhecimento cia congruencia a casos em que tais julgamentos imediatos nao sao possiveis. Portanto, nao podemos definir congruencia via dimensionamento.
Nas modernas formula~oesdos axiomas geometricos sao estabelecidas determinadas condi~oes que a rela~ao de congruencia entre segmentos deve satisfazer.Parte-se do pressuposto de que contamos com uma teoria completa de pontos, retas, pIanos e da ordem de pontos nos pIanos - na verdade, com uma teoria completade geometria nao-metrica. A seguir, investigamos acercada congruencia e estabelecemos 0 conjunto de condi~oes
- ou axiomas, como sao chamados - que essa rela~ao
satisfaz. Foi provada, entao, a existencia de rela~oes alternativas que satisfazem tais condi~oes de modo igualmente satisfatorio e que nada hci de intrinseco na teoria
do espa~o que nos leve a adotar qualquer uma dessasrela-:;oes de preferencia a qualquer outra, como a rela-:;ao de congruencia por nos adotada. Em outras palavras, contamos com geometrias metricas altemativas queexistem, sem exce-:;ao, por urn identico direito, no quetange it teoria do espa~o.
Poincare, 0 grande matemcitico frances, sustentava que nossa escolha final entre essas geometrias eguiadapuramente pela convent;ao e que 0 efeito de uma mudan~a de escolha seria apenas alterar nosso modo de expressar as leis fisicas da natureza. Por "convent;ao" entendo que Poincare quer dizer que nada existe de inerente na natureza a emprestar algumafim,iio especial aalguma dessas rela~oes de congruencia e que a escolhade uma rela~ao particular eguiada pelas voli~oes da mente na extremidade oposta da apreensao sensivel. 0 principio que determina a escolha e a conveniencia intelectual e nao 0 fato natural.
Tal posi~ao foi mal interpretada por diversos comentadores de Poincare. Eles a confundiram com outra questao, a saber, a de que ° carciter impreciso daobserva~ao determinaria a impossibilidade de se fazeruma avaliat;ao precisa na compara-:;ao de medidas.Segue-se que epossive! determinar urn subconjunto derela~oesde congruencia estreitamente afins, em que cadamembro concorda de modo igualmente satisfatorio comaquela avalia~ao de congruencia observada, sempre quea avaliat;ao inclua as devidas ressalvas quanta a seus limites de erro.
Essa euma questao inteiramente diversa, que pressupoe uma rejei~ao it postura de Poincare. A absolutaindeterminat;ao da natureza com respeito a todas as rela-
146 o CONCEITO DE NA TUREZA CONGRUENCIA 147
,oes de congruencia e substitulda pela indetermina,aocia observa~ao com respeito a urn pequeno subgrupo dessas rela~6es.
A postura de Poincare eenergica. Ele, com efeito,desafia qualquer urn aapontar algum fator na naturezaque confira uma condi~aode primazia are1a~ao de congruencia efetivamente adotada pela humanidade. Semduvida, porem, trata-se de uma posi,ao bastante paradoxa!. Bertrand Russell teve uma controversia com 0
matern:itico frances nessa questao e observou que, segundo os princfpios de Poincare, nada havia na natureza que determinasse se a terra e maior au menor queuma bola de bilhar qualquer. Poincare respondeu quea tentativa de se encontrar, na natureza, razoes para aescolha de uma rela~ao espedfica de congruencia no espac;o e semelhante a se tentar determinar a posic;ao deurn navia em alto-mar atraves cia contagem do numerode tripulantes ou da observa,ao da cor dos olhos docapitao.
A meu ver, ambos os contendores estavam corret08, levando-se em conta os fundamentos em que assentava a discussao. Russell na verdade apontava que, aparte inexatidoes menores, verifica-se uma determinada rela~ao de congruencia entre os fatores da naturezaa nos apresentados por nossa apreensao senslvel. Poincare pede informa~oesquanta ao fator da natureza quepoderia levar qualquer rela,ao de congruencia a desempenhar uma funr;iio proeminente entre os fatores apresentados na apreensao senslve!. Se for admitida a teoria materialista da natureza, nao consigo ver a respostaa nenhum desses pontos sustentados na controversia.Com essa teoria, a natureza em urn instante no espa~o
II
e urn fato independente. Assim, devemos buscar nossarela~ao primaz de congruencia em meio anatureza noespa~o instantaneo; e Poincare sem duvida esta corretoao afirmar que, com essa hipotese, a natureza em nadanos ajuda a encontra.-Ia.
Russell, por outro lado, se coloca em uma posi,aoigualmente energica quando afirma que, enquanto fatoda observa~ao,nos efetivamente a encontramos e, maisainda, concordamos em encontrar a mesma rela~ao decongruencia. Com base nisso, e urn dos fatos mais extraordinarios da experiencia humana 0 de que a humanidade inteira, sem nenhuma razao identificavel, concorde em fixar a aten~ao em uma unica rela~ao de congruencia em meio ao infinito numero de competidoresque disputam aten~ao. Seria de esperar que uma discordia nessa escolha fundamental promovesse a cisao dena,oes e 0 desmembramento de familias. Todavia, a dificuldade nem sequer foi descoberta ate fins do seculoXIX, por uma meia duzia de filasofos matematicos ematematicos filosoficos. 0 caso nao se assemelha anossa concordancia com respeito a algum fato fundamental cia natureza, como as tres dimensoes do espa~o. Seo espa~o possui apenas tres dimensoes, seria de esperarque a humanidade inteira tivesse consciencia do fato,como efetivamente se da. No caso da congruencia, porem, a humanidade concorda em uma interpreta~aoarbitraria cia apreensao senslvel quando nada existe na natureza a determina-la.
Considero urn ponto favoravel, e nada desprezlvel,da teoria da natureza que lhes estou expondo, 0 oferecimento, por esta teoria, de uma solu~ao a essa dificuldade, ao indicar 0 fator da natureza que resulta na pri-
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mazia de uma rela~ao de congruencia determinada sabre a indefinida profusao de outras re!a~6es congeneres.
A razao desse resultado eque a natureza naG maisse encontra confinada ao espac;o em urn instante. Espa90 e tempo estao agora interligados; e esse fator peculiardo tempo, tao imediatamente distingufvel entre as revelac;oes de nossa apreensao sensfve1, relaciona-se a umarelac;ao de congruencia particular no espac;o.
A congruencia e urn exemplo particular do fato fundamental do reconhecimento. Na percep~ao, nos reconhecemos. Tal reconhecimento naG se refere meramenteacomparac;ao de urn fator cia natureza apresentado peIa memoria com urn fator apresentado pe1a apreensaosenslve! imediata. 0 reconhecimento tern lugar no ambito do presente, sem intervens;ao alguma cia pura memoria. Isso porque 0 fata presente euma durac;ao comsuas durac;oes antecedentes e conseqiientes, que sao partes de si propria. A discrimina9aO, na apreensao sensi'vel, de urn evento fin ito com sua qualidade de passagem tambem e acompanhada pela discrimina~aode outros fatores da natureza que nao participam da passagem de eventos. Tudo quanta passa e urn evento. Todavia, encontramos na natureza entidades que naopassam, ou seja, reconhecemos a permanencia na natureza. 0 reconhecimento nao e fundamentalmente urnate intelectual de cOmpara9aO; e, em sua essencia, meraapreensao sensi'vel em sua capacidade de colocar diantede nos fatores nao passageiros da natureza. Por exemplo, 0 verde e percebido como situado em urn determinado evento finito contido na dura~ao presente. Esse verde preserva sua identidade do infcio ao fim, enquantoo evento passa e em consequencia disso adquire a pro-
priedade de romper-se em partes. A por~ao verde e composta de partes. Porem, ao falarmos da POr9ao verde,estamos nos referindo ao evento em sua capacidade unicade constituir para nos a situa9aO do verde. 0 verde emsi e, numericamente, uma entidade unica, identica a simesma e desprovida de partes porque desprovida de passagem.
Os fatores da natureza desprovidos de passagem serao chamados objetos. Existem especies radicalmente diversas de objetos, 0 que sera considerado na proximaconferencia.
o reconhecimento e refletido no intelecto comocompara~ao. Os objetos reconhecidos de determinadoevento sao comparados com os objetos reconhecidos deoutro evento. A compara9ao pode se dar entre dois eventos do presente ou entre dois eventos dos quais urn e apresentado pe!a apreensao na memoria e outro pela apreensao sensi'vel imediata. Entretanto, nao e entre eventosque se da a cOmpara9aO, uma vez que cada evento e essencialmente unico e incomparavel. Da-se a cOmpara9aOentre objetos e rela90es de objetos situados nos eventos.o evento considerado enquanto re!a~ao entre objetos perdeu sua passagem e, sob esse aspecto, e em si mesmourn objeto. Tal objeto nao e0 evento, mas tao-somenteuma abstra~ao inte!ectual. 0 mesmo objeto pode estarsituado em multiplos eventos e, nesse sentido, ate mesmo 0 evento como urn todo, visto enquanto objeto, pode recorrer, embora nao 0 proprio evento em si com suapassagem e suas rela90es com outros eventos.
Objetos nao apresentados pela apreensao senslve!podem ser conhecidos para 0 inte!ecto. Por exemplo, rela90es entre objetos e rela90es entre rela90es podem ser
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~:I
II
fatores cia natureza nao revelados na apreensao sensi'vel, mas conhecidos, por inferencia logica, como necessariamente existentes. Portanto, os objetos de nosso conhecimento podem ser meras abstra~6es 16gicas. Porexemplo, urn evento completo jamais e revelado naapreensao senslvel e, portanto, 0 objeto que constitui asoma total de objetos situados em urn evento assim interre1acionado naD passa de urn conceito abstrato. Da mesrna forma, urn angulo reta eurn objeto percebido capazde ser localizado em multiplos eventos; mas, embora aretangularidade seja apresentada pela apreensao senslvel,a maioria das rela~6es geometricas naD e apresentadadessa forma. Na verdade, com freqiiencia a retangularidade naD epercebida, embora se possa comprovar queestivesse preseote para a apreensao. Assim, urn objetoeconhecido amiude simplesmente como uma rela~aoabstrata nao apresentada diretamente na apreensao sensivel, embora esteja presente na natureza.
A identidade de qualidade entre segmentos congruentes geralmente possui esse carater. Em determinados casos especiais, essa identidade de qualidade podeser percebida diretamente. Em geral, porem, e inferidapor urn processo de dimensionamento que depende denossa direta apreensao sensivel de casas selecionados ede uma inferencia logica com base no caniter transitivoda congruencia.
A congruencia depende do moviment-o, e par intermedia deste gera-se a liga~ao entre congruencia espaciale congruencia temporal. 0 movimento ao longo de umalinha reta possui uma simetria em torno dessa linha. Asimetria e expressa pelas rela~6es geometricas simetricasda linha com a familia de pIanos normais amesma.
Gutra simetria na teoria do movimento surge dofato de 0 repouso nos pontos de {3 corresponder a urnmovimento uniforme ao longo de uma familia definidade retas paralelas no espa~o de Q!. Devemos observar astres caracterlsticas - (i) da uniformidade do movimento correspondente a qualquer ponto de {3 ao longo desua reta correlata em "', (ii) da igualdade em magnitude das velocidades ao longo das diversas linhas de '" correlacionadas ao repouso nos diversos pontos de {3, e (iii)do paralelismo entre as retas dessa familia.
Estamos agora de posse de uma teoria de paralelas, uma teoria de perpendiculares e uma teoria do movimento, a partir das quais pode-se erigir uma teoria dacongruencia. Deve-se lembrar que uma familia de niveis paralelos em urn momento qualquer e a familia deniveis na qual aquele momenta e cortado pela familiade momentos de urn outro sistema temporal qualquer.Por sua vez, uma familia de momentos paralelos e a familia de momentos de urn determinado sistema temporal. Assim, podemos arnpliar nosso conceito de uma familia de niveis paralelos de modo a inc1uir niveis em diferentes momentos de urn detenninado sistema temporal.Com esse conceito ampliado, dizemos que uma familiacompleta de nlveis paralelos em urn sistema temporala ea familia completa de niveis na qual os momentosde'" fazem intersec~iio com os momentos de {3. Essa familia completa de nlveis paralelos evidentemente tambern euma familia compreendida nos momentos do sistema temporal{3. A introdu~ao de urn terceiro sistematemporal A determina a obten~iio de rectas paralelas.Alem disso, todos os pontos de qualquer sistema temporal determinado formam uma familia de trilhas de
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pontos paralelas. Existem, portanto, tres tipos de paralelogramos no multiplo quadridimensional de partfculas de evento.
Nos paralelogramos do primeiro tipo, os dois pares de lados paralelos sao, ambos, pares de rectas. Nosparalelogramos do segundo tipo, urn dos pares de ladosparale10s eurn par de rectas, enquanto 0 outro eurn parde trilhas de pontos. Nos paralelogramos do terceiro tipo, ambos os pares de lados paralelos sao pares de trilhas de pontos.
o primeiro axioma cia congruencia e0 de que saocongruentes os lados opostos de qualquer paralelogramo. Tal axioma permite-nos comparar 0 comprimentode dais segrnentos quaisquer, estejam eles respectivamente em rectas paralelas ou na mesma recta. Permite-nosainda comparar a comprimento de dais segmentos quaisquer, estejam des respectivamente em trilhas de pantosparalelas ou na mesma trilha de pontos. Segue-se, desse axioma, que dais objetos em repouso em dais pontosquaisquer de urn sistema temporal {3 rnovem-se com velocidades iguais em qualquer outro sistema temporal exao longo de linhas paralelas. Podemos, assim, falar davelocidade em ex devida ao sistema temporal (3, sem especificar nenhum ponto particular em (3. 0 axioma tambern nos permite medir 0 tempo em qualquer sistematemporal, embora nao nos permita comparar tempos emsistemas temporais diferentes.
o segundo axioma da congruencia refere-se a paralelogramos de bases congruentes e entre as mesmasparalelas, que apresentam tambem seus autros pares delados paralelos. 0 axioma afirma que a recta que uneas duas partfculas de evento da interseq:ao das diago-
nais e paralela arecta em que estao situadas as bases.Com 0 concurso desse axioma, segue-se imediatamenteque as diagonais de urn paralelogramo dividem-se mutuamente ao meio.
Em qualquer espa~o, a congruencia se estende, paraaMm das rectas paralelas, as rectas em geral, atraves dedois axiomas que dependem da perpendicularidade. 0primeiro desses axiomas, 0 terceiro axioma da congruencia, e 0 de que se ABG e urn triangulo de rectas em urnmomento qualquer e D e a partlcula de evento intermediaria da base BG, a nlvel que passa por D perpendicularmente a BG contem A quando, e samente quando,AB e congruente com AG. Esse axioma evidentementeexpressa a simetria da perpendicularidade e e a essencia do celebre pons asinorum expresso como urn axioma.
o segundo axioma dependente da perpendicularidade, e 0 quarto da congruencia, e 0 de que: sendo re A uma recta e uma partfcula de evento no mesmo momento, sendo AB e AG urn par de rectas retangularesa cruzar r em BeG, e sendo AD e AE outro par de rectas retangulares a cortar r em DeE, teremos que ouE ou D esta compreendida no segmento BG, enquantoa outra das duas nao esta contida em tal segmento. Temos ainda, como caso particular desse axioma, que: sendo AB perpendicular are, em conseqiiencia, AC paralelo a r, entao DeE estarao situados respectivamenteem lados opostos de B. Com 0 concurso desses dois axiomas, a teoria da congruencia pode ser estendida de modo a camparar 0 comprimento de segmentos de qualquer par de rectas. Por conseguinte, a geometria metrica euclidiana no espac;o esta completamente estabelecida, sendo possIve1 a comparac;ao de comprimentos nos
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espac;os de diferentes sistemas temporais, como resultado de propriedades definidas da natureza que indicamexatamente esse metoda particular de comparac;ao.
A compara,ao de dimensionamentos do tempo emdiferentes sistemas temporais requer dais axiomas adicionais. 0 primeiro desses axiomas, que constitui 0 quinto axioma cia congruencia, recebera 0 nome de axiomacia "simetria cinetica". Ele expressa a simetria das rela,Des quantitativa.<; entre dois sistema.<; temporais quandoas tempos e as comprimentos nos dais sistemas sao medidos em unidades congruentes.
o axioma pode ser explicado da seguinte maneira:sejam a e {3 os nomes de dois sistemas temporais. A direc;ao do movimento no espac;o de O! devido ao repousoem urn ponto de {3 e chamada de "direc;ao {3 em a" ea dire,ao do movimento no espa,o de {3 devido ao repouso em urn ponto de a echamada de "dire,ao a em{3". Considere-se urn movimento no espa<.;o de O! queconsista em uma determinada ve10cidade na dire,ao {3de a e uma certa velocidade em angulos retas com relac;ao amesma. Esse movimento representa repouso noespa,o de outro sistema temporal - vamos chama-lode 1r. 0 repouso em 1r tambem sera representado no espa,o de {3 por uma determinada velocidade na dire,aoa em {3 e uma determinada velocidade em angulos retos com re1a<;ao a essa dire<;ao a. Assim, urn certo movimento no espa<;o de a esta correlacionado a certo movimento no espa,o de {3, com ambos representando 0mesmo fato, que tambem pode ser representado porrepouso em 7f. EpOSSIVe1, ainda, encontrarmos outrosistema temporal, a que denominarei (J, e que e tal queo repouso em seu espa<;o e representado pe1as mesmas
grandezas de velocidades ao lange da, e perpendiculares a, dire<;ao a em {3 que aquelas velocidades em a, aolange da, e perpendiculares it dire,ao {3, que representam repouso em 7f. 0 requerido axioma da simetria cinetica e 0 de que 0 repouso em (J sera representado ema pelas mesmas velocidades ao longo da, e perpendiculares it, dire,ao {3 em a que aquelas velocidades em {3ao longo da, e perpendiculares it, dire,ao a, que representam repouso em 7f.
Urn caso particular desse axioma eaquele em queas velocidades relativas sao iguais e opostas. Em outraspalavras, 0 repouso em a erepresentado em {3 por umavelocidade ao lange da dire,ao a, que e igual it velocidade ao longo da dire,ao {3 em a que representa repouso em {3.
Finalmente, 0 sexto axioma de congruencia e 0 datransitividade da rela,ao de congruencia. No que tangeaaplica<;ao desse axioma ao espa<;o, 0 mesmo e superfluo, pois a propriedade segue-se de nossos axiomas anteriores. Contudo, e necessario para 0 tempo, enquanto complemento ao axioma da simetria cinetica. 0 significado do axioma e 0 de que se a unidade de tempodo sistema a e congruente com a unidade de tempo dosistema {3 e a unidade de tempo do sistema {3 econgruentecom a unidade de tempo do sistema 'Y, tambem seraocongruentes as unidades de tempo de a e 'Y.
Esses axiomas tornam possIvel a dedu<;ao de formulas para a transforma<;ao dos dimensionamentos efetuados em urn determinado sistema temporal para dimensionamentos dos mesmos fatos da natureza em outro sistema temporal. Verificaremos que tais formulasenvolvem uma constante arbitraria, aqual chamarei k.
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Suas dimensoes equivalem ao quadrado de uma velocidade. Consequentemente, quatro casos se apresentam.No primeiro caso, k ezero. Esse caso produz resultadosabsurdos, que contradizem os dados elementares da experiencia. Vamos deixa-lo de lado.
No segundo caso, k einfinito. Esse caso resulta nasf6rmulas comuns para transformat;;ao em movimento relativo, ou seja, as formulas encontradas em qualquer livro elementar de dinamica.
No terceiro caso, k enegativo. Vamos chama-Io dec2, onde c tera. as dimensoes de uma velocidade. Essecaso resulta nas formulas de transformat;;ao descobertaspor Larmor para a transforma~ao das equa~oes do campoeletromagnetico de Maxwell. Tais f6rmulas foram desdobradas por H. A. Lorentz e empregadas por Einsteine Minkowski como a base de sua nova teoria da relatividade. Nao me refiro aqui amais recente teoria de Einstein, a cia relatividade geral, por cujo intermedio ele deduz sua modifica~aoda lei da gravita~ao. Em sendo este 0 caso que se aplica a natureza, c cleve ser estreitamente proximo avelocidade cia luz in vacuo. TaIvez setrate dessa propria ve1ocidade. Nesse sentido, "in vacuo"nao deve significar uma ausencia de eventos, ou seja,a ausencia do eter de eventos que a tudo permeia. Devesignificar a ausencia de determinados tipos de objetos.
No quarto caso, k e positivo. Vamos chama-Io deh2, onde h tera as dimensoes de uma velocidade. Estecaso redunda em um tipo perfeitamente possive! de f6rmulas de transforma~ao,mas que nao explica nenhumfato da experiencia. Ha ne!e outra desvantagem. Tomando este quarto caso como pressuposto, a distinc;aoentre espac;o e tempo torna-se indevidamente obscure-
cida. 0 objetivo geral destas conferencias tem sido 0 dedefender a doutrina de que espa~o e tempo tem sua origem em uma raiz comum e que 0 fato ultimo da experiencia eurn fato espac;o-temporal. Em ultima amilise,todavia, a humanidade inteira distingue muito claramente entre espa~o e tempo, e e gra~as a essa clareza de distinc;ao que a doutrina destas conferencias e algo paradoxal. Note-se que, no terceiro pressuposto, essa clareza de distinc;ao esta devidamente preservada. Existe umadistin~ao fundamental entre as propriedades metricas detrilhas de pontos e rectas. No quarto pressuposto, contudo, essa distin~ao fundamental desaparece.
Nem 0 terceiro nem 0 quarto pressuposto podemconcordar com a experiencia, a menos que admitamosque a ve!ocidade c do terceiro pressuposto e a ve!ocidade h do quarto pressuposto sao extremamente altas, secomparadas as velocidades da experiencia ordinaria.Nesse caso, as formulas de ambos os pressupostos verse-ao obviamente reduzidas a uma estreita aproxima~ao com as formulas do segundo pressuposto, que saoas formulas comuns dos livros diditicos de dinamica.A tItulo de classificac;ao, chamarei essas formulas encontradas nos livros didaticos de formulas "ortodoxas".
Nao pode haver duvidas quanta a generica corre~ao aproximada das f6rmulas ortodoxas. Seria simplestolice levantar duvidas a esse respeito. Mas a determina~ao do status dessas f6rmulas de modo algum fica estabe!ecida por essa admissao. A independencia entre tempo e espa~o e um pressuposto inquestionavel do pensamento ortodoxo que produziu as f6rmulas ortodoxas.Com esse pressuposto e dados os pontos absolutos de umespa~o absoluto determinado, as formulas ortodoxas sao
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dedu<;oes imediatas. Por conseguinte, tais formulas S3.0
nos apresentadas em nossa imaginac;ao como fatDs quenao podem se dar de modo diferente, sendo 0 tempo eo espa~o 0 que sao. As formulas ortodoxas adquiriram,portanto, 0 status de necessidades inquestionaveis na ciencia. Qualquer tentativa de substituir essas formulas poroutras significava abandonar afun,iio da explica~aoffsica e reeOfrer a meras formulas matematicas.
Mesma a ciencia ffsica, entretanto, assistiu ao acumu10 de dificuldades em torno das formulas ortodoxas. Emprimeiro lugar, as equac;oes do campo e1etromagnetico de Maxwell naG sao invariaveis mediante as transforma~5es das formulas ortodoxas, ao mesmo tempo emque sao invariaveis mediante as transformac;6es das f6rmulas resultantes do terceiro dos quatro casos mencionados acima, contanto que a velocidade c seja identificada com uma celebre quantidade e!etramagnetica constante.
Assim, as resultados nulos dos minuciosos experimentas para se detectar as variac;oes do movimento ciaTerra pelo eter em sua trajet6ria orbital sao imediatamente explicados pe!as formulas do terceiro caso. Contudo se adotamos as f6rmulas ortodoxas, devemos ado-,tar uma hip6tese especial e arbitnlria quanta acontra<;ao da materia durante 0 movimento. Refiro-me ahipotese de Fitzgerald-Lorentz l
Por fim, 0 coeficiente de arrasto de Fresnel, que representa a varia~ao da ve!ocidade da luz em urn move!animado, e explicado pelas formulas do terceiro caso e
1. "Todo corpo se contrai na dire~ao de sua velocidade." (N. T.)
requer outra hipotese arbitraria caso empreguemos asformulas ortodoxas.
Parece portanto que, do ponto de vista da simplesexplica<;ao ffsica, as formulas do terceiro caso sao maisvantajosas se comparadas as formulas ortodoxas. Todavia, 0 caminho esd. bloqueado pe!a crenp arraigada deque essas f6rmulas ortodoxas possuem urn carater de necessidade. Assim, e urn urgente requisito da ciencia ffsica e da filosofia 0 exame crftico dos fundamentos dessa suposta necessidade.O unico metodo segura de investiga~ao e recorrer aos princfpios originarios de nosso conhecimento da natureza. E exatamente isso 0 queestou buscando fazer nestas conferencias. Indago 0 quevern a ser aquilo que percebemos em nossa percep~ao
sensfvel da natureza. Em seguida, passo a examinaraqueles fatores da natureza que nos induzem a conceber que a natureza ocupe espa~o e persista ao longo dotempo. Tal procedimento conduziu-nos a uma investiga~ao dos caracteres do espa~o e do tempo. Resulta dessas investiga<;6es que as formulas do terceiro caso e asformulas ortodoxas ocupam urn certo patamar enquanto formulas possfveis, resultantes do carater basico denosso conhecimento acerca da natureza. As formulas ortodoxas perderam, assim, toda e qualquer vantagem emtermos da condi~aode necessidade de que desfrutavamsobre 0 grupo serial. 0 caminho esta aberto, portanto,para a ado~ao de qualquer urn dentre os dois grupos querevele maior concordancia com a observa<;ao.
Aproveito esta oportunidade para fazer uma pausa momentanea no curso de minha argumenta<;ao e fefletir acerca do carater geral atribufdo por minha doutrina a alguns conceitos familiares da ciencia. Nao tenho
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duvidas de que alguns de voces consideraram tal carater extremamente paradoxal sob determinados aspectos.
Esse cunho paradoxal deve-se parcialmente ao fato de a linguagem douta ter sido levada a conformar-seateoria ortodoxa predominante. Ao expormos uma doutrina alternativa, portanto, somes levados a lanc;ar maoquer de termos estranhos quer de termos conhecidos emacepc;5es naD usuais. Essa vit6ria cia teoria ortodoxa sabre a linguagem e bastante natural. Os eventos sao nomeados segundo os objetos proeminentes neles situadose, assim, tanto na linguagem como no pensamento, 0
evento submerge por tfCis do objeto, tornando-se 0 mero jogo de suas rela~5es. A teoria do espa~o convertese, entaD, em uma teoria das relac;5es entre objetos, emlugar de uma teoria das rela~5es entre eventos. Os objetos, cantudo, sao isentos cia passagem de eventos. Porconseguinte, 0 espac;o, enquanto relac;ao entre objetos,esta privado de qualquer liga~ao com 0 tempo. Eo espac.;o em urn instante sem nenhuma relac;ao espedficaentre as espac;os em instantes sucessivos. NaG pode serurn espac;o unico e atemporal porque as re1ac;5es entreobjetos se modificam.
Alguns instantes atras, ao falar da dedu~ao das f6rmulas ortodoxas referentes ao movimento relativo, afirmei que estas se seguiam como uma dedu~ao imediatado pressuposto de pontos absolutos em urn espa~o absoluto. Tal men~ao ao espa~o absoluto nao foi uma negligencia. Bern sei que a doutrina da relatividade do espa~o domina atualmente 0 campo tanto da ciencia comoda filosofia. Nao creio, porem, que suas conseqiienciasinevitiiveis sejam compreendidas. Quando de fato nosdefrontamos com e1as, 0 paradoxo na apresenta~aodo
carater do espa~o por mim elaborada se reduz sensivelmente. Se nao existe uma posic;ao absoluta, urn pontodevera deixar de ser uma simples entidade. 0 que paraurn homem em urn balao, olhos fixos em urn instrumento, e urn ponto, sera uma trilha de pontos para urn observador postado na Terra a observar 0 balao par meiode urn telesc6pio, e uma trilha de pontos diversa paraurn observador colocado no Sol a observar 0 balao pormeio de algum instrumento condizente a urn ser tal. Assim sendo, aos que me censuram pe10 paradoxo de minha teoria dos pontos como classes de partfeulas de evento e por minha teoria das partfeulas de evento como grupos de conjuntos abstrativos, pe~o que expliquem exatamente 0 que entendem por ponto. Ao explicar 0 queentendemos par alguma coisa qualquer, par mais simples que seja, a explicac;ao sempre tende a parecer engenhosa e bern urdida. Pelo menos expliquei exatamenteo que entendo par urn ponto, que relac;oes este envolvee quais entidades sao os termos relacionais. Se admitirem a re1atividade do espa~o, voces deverao admitir tambern que os pontos sao entidades complexas, constru~6es 16gicas que envolvem outras entidades e suas rela~6es. Apresentem sua teoria, nao em meia duzia de frases vagas e de significado impreciso, mas expliquem-napasso a passo em termos precisos, referindo-se a rela~oes especificas entre termos especificos. Demonstrem,ainda, que sua teoria de pontos resulta em uma teoriado espa~o. Alem disso, observem que 0 exemplo do homem no balao, 0 observador colocado na Terra e 0 observador colocado no Sol mostra que cada pressupostode urn repouso relativo requer urn espa~o atemporaJ compontos radicalmente diversos daqueles decorrentes de
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qualquer outro pressuposto congenere. A teoria da relatividade do espa~o e inconsistente com qualquer doutrina de urn conjunto tinieD de pontcs em urn espat;oatemporal.
o fato e que nao existe paradoxo algum em minhadoutrina cia natureza do espac;.o que naD seja, em essencia, inerente a teoria da relatividade do espa~o. Essa doutrina, no entanto, jamais foi aceita pela ciencia, digamo que disserem as pessoas. 0 que figura em nassos tratados de dinamica ea doutrina newtoniana do movimentorelativo baseada na doutrina do movimento diferencialno espa~o absoluto. Vma vez admitido que os pontossao entidades radicalmente diversas mediante diferentes hipoteses de repouso, as formulas ortodoxas perdemtoda sua obviedade. Elas apenas eram obvias porque estavamos, na verdade, pensando em Dutra coisa. Ao discutir esse tema, somente podemos evitar 0 paradoxarefugiando-nos da torrente de desaprova~ao na comoda arca da ausencia de sentido.
A nova teoria fornece uma definic;.ao cia congruencia de perfodos de tempo. A doutrina dominante naofornece tal defini~ao. Sua posi~ao e a de que se adotamos medi~6es de tempo tais que determinadas velociclades farniliares que nos parecem uniformes se mostremuniformes, as leis do movimento serao vaIidas. Ora, emprimeiro lugar, mudanc;.a alguma poderia se manifestar,quer como unifonne au nao-uniforme, sem envolver umaprecisa determina~aoda congruencia entre perfodos detempo. Assim, ao apelar para fenamenos familiares, adoutrina dominante admite a existencia de algum fatorna natureza ao qual podemos elaborar intelectualmente como uma teoria da congruencia. Todavia, ela nao
faz men~ao alguma a esse respeito, exceto a de que asleis do movimento sao, afinal de contas, corretas. Suponhamos que, atraves de alguns comentadores te6ricos, eliminemos a referencia a velocidades familiares como a de rotal;aO da Terra. Somos levados a admitir, entao, que nao existe 0 menor significado na congruenciatemporal, exceto 0 de que determinadas hipoteses conferem verdade as leis do movimento. Tal asser~ao e historicamente falsa. 0 rei Alfredo 0 Grande ignorava asleis do movimento, mas sabia perfeitamente 0 que entendia por dimensionamento do tempo, e alcanl;ou seuprop6sito via queima de velas. Da mesma forma, ninguem em eras passadas justificou 0 usa de areia nas ampulhetas dizendo que alguns seculos a frente se assistiria adescoberta de curiosas leis do movimento que emprestariam urn significado a afirmal;ao de que a areiaera esvaziada dos bulbos em tempos iguais. A uniformidade na mudan~a e diretamente perceptfvel, dondese segue que a humanidade percebe, na natureza, fatores a partir dos quais e possIvel a fOrmal;aO de uma teoria de congruencia temporal. A doutrina predominantese mostra totalmente incapaz de designar tais fatores.
A menl;ao as leis do movimento levanta outro pontoacerca do qual a teoria predominante nada tem a dizere no qual a nova teoria oferece uma explical;aO completao Elargamente sabido que as leis do movimento naosao validas para todo e qualquer eixo referencial que venhamos a adotar como fixo em todo e qualquer corporfgido. Devemos adotar um corpo que nao esteja em rota~ao e nao apresente acelera~ao. Por exemplo, elas naose aplicam realmente a eixos fixos na Terra, em razao
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da constante rota<;ao de tal corpo. A lei que malograquando adotamos as eixos errados como em repouso ea terceira lei, a de que a<;ao e rea<;ao sao iguais e opOStas. Os eixos efracios dao margem ao aparecimento defon;as centrffugas nao compensadas e for<;as centrffugascompostas nao compensadas, devido a rota<;ao. A influencia dessas for<;as pode ser demonstrada par uma serie de fatos sabre a superficie da Terra, como a pendulode Foucault a formato da Terra e as dire<;5es de rota-, ,<;ao fixas dos ciclones e anticiclones. E diffcillevar a serio a sugestao de que esses fenomenos sabre a Terra sedevam ainfluencia das estrelas fixas. Nao consigo conveneer a mim meSilla a acreditar que uma estrelinha cintilante tenha girado em torno do pendulo de Foucaultna Exposi<;ao de Paris de 1861. Obviamente, qualquercoisa edigna de eredito uma vez demonstrada uma rela<;ao ffsica inequivoca, por exemplo, a influencia dasmanchas solares. 0 presente caso ressente-se cia falta detoda e qualquer demonstra<;ao em termos de alguma teoria coerente. Segundo a teoria destas conferencias, oseixos que servem de referencia ao movimento sao eixosem repouso no espa<;o de algum sistema temporal. Parexemplo, considere-se 0 espac;o de urn sistema temporalo!. Existem conjuntos de eixos em repouso no espac;o dec/. Trata-se de eixos dinamicos adequados. Tambem urnconjunto de eixos nesse espac;o que esteja se movendocom velocidade uniforme e sem rotac;ao constitui outroconjunto adequado. Todos as pontos em movimento fixos nesses eixos em movimento estao realmente descrevenda linhas parale1as a uma mesma velocidade uniforme. Em outras palavras, sao os reflexos, no espac;o deC/, de urn conjunto de eixos fixos no espa<;o de algum
outro sistema temporal {3. Assim, a grupo de eixos dinamicos requeridos para as Leis do Movimento de Newton e produto da necessidade de referir 0 movimento aurn corpo em repouso no espac;o de algum sistema temporal, de modo a se obter urn registro coerente de propriedades ffsicas. Se procedermos de outro modo, a significado do movimento de uma por<;ao de nossa configura<;ao ffsica sera. diferente do significado do movimentode outra por<;ao de mesma configura<;ao. Assim, sendoo significado do movimento 0 que e, se quisermos descrever 0 movirnento de qualquer sistema de objetos semalterar 0 significado de nossos termos ao avanc;armos emnossa descric;ao, sera imprescindfvel adotar urn dessesconjuntos de eixos como eixos referenciais, embora possamos optar par seus reflexos no espa<;o de qualquer sistema temporal que se deseje adotar. Desse modo, umarazao ffsica definida e atribufda it propriedade peculiardo grupo dinamico de eixos.
N a teoria ortodoxa, a posic;ao das equac;6es de movimento e das mais alnbfguas. 0 espac;o a que se referem e totalmente indeterminado, e 0 mesmo aconteceao dimensionamento do lapso de tempo. A ciencia estasimplesmente partindo em uma pescaria aver se naopode encontrar algum procedimento a que possa chamar dimensionamento do espac;o, algum procedimentoa que possa chamar dimensionamento do tempo, algaa que possa chama.: urn sistema de for<;as e alga que possachamar de massas, de sarte que essas formulas possamser satisfeitas. A unica razao - nessa teoria - por quealguem desejasse satisfazer tais formulas seria urn apre<;0 sentimental par Galileu, Newton, Euler e Lagrange.A teoria, longe de basear a ciencia em urn solido alicerce
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observacional, obriga tudo a conformar-se a uma merapreferencia matematica por determinadas formulas simples.
Sequer por urn momento acredito ser esse urn autentico registro da real condi<;ao das Leis do Movimento. Essas equa<;6es pedem um ligeiro ajuste em face dasnovas f6rmulas da relatividade. Mas com esses ajustes,imperceptfveis no usa ordinaria, as leis lidam com grandezas fisicas fundamentais que conhecemos muito berne desejamos corre1acionar.
o dimensionamento do tempo era conhecido de todos os povos civilizados muito antes de serem concebidas as leis. Ecom esse tempo assim dimensionado quese ocupam as leis. Tratam, ainda, do espac;o de nassavida cotidiana. Quando nos aproximamos de uma precisao de dimensionamento que ultrapassa aque!e da observac;ao, 0 ajuste e admissfvel. Dentro dos limites ciaobservac;ao, pon§m, sabemos a que nos referimos quandofalamos de dimensionamentos de espa<;o, dimensionamentos de tempo e uniformidade de mudan<;a. Compete aciencia fornecer uma interpretac)'io intelectual daquilo que etao evidente para a apreensao sensivel. Pareee-me absolutamente inacreditave1 que 0 fata ultimo,para alem do qual inexiste uma explica<;ao mais profunda, seja que a humanidade tenha realmente sido tomadapor urn desejo inconsciente de satisfazer as f6rmulas matematicas por nos denominadas Leis do Movimento, f6rmulas completamente desconhecidas ate 0 seculo XVIIde nossa era.
A corre1a~ao desses fatos da experiencia sensive1,empreendida pela interpreta<;ao alternativa da natureza, estende-se para alem das propriedades fisicas de mo-
vimento e das propriedades de congruencia. Ela fornece uma interpreta<;ao do significado de entidades geometricas como pontos, retas e volumes, e liga as ideiasafins de extensao no tempo e extensao no espa~o. A teoriasatisfaz 0 verdadeiro prop6sito de uma explica<;ao intelectual na esfera da filosofia natural. Tal prop6sito e 0
de demonstrar as interligac;6es da natureza e demonstrar que urn conjunto de ingredientes da natureza requer, para a demonstra<;ao de seu carater, a presen<;ados demais conjuntos de ingredientes.
A ideia falsa da qual devemos nos livrar e a da natureza como simples agregado de entidades independentes,cada qual passive! de ser isolada. Segundo essa concep<;ao, tais entidades, cujos caracteres permitem definic;oesisoladas, se reunem e, atraves de suas relac;6es acidentais, formam 0 sistema da natureza. Sistema esse, portanto, que e absolutamente acidental; e, ainda que sujeitoa urn destino mecanico, apenas acidentalmente estaraassim sujeito.
Com essa teoria, poderiamos ter 0 espac;o sem 0
tempo e 0 tempo sem 0 espa<.;o. A teoria reconhecidamente cai por terra quando chegamos as re!a<;6es entremateria e espac;o. A teoria relacional do espa<;o e umaadmissao de que nao podemos conhecer 0 espa<;o sema materia ou a materia sem 0 espa<.;o. Mas 0 isolamentode ambos com re!a<;ao ao tempo e ainda guardado a sete chaves. As relac;5es entre por<;6es de materia no espa<;o sao fatos acidentais determinados pela ausencia dequalquer interpreta~ao coerente de como 0 espa<;o se origina da materia e como a materia se origina do espac;o.Da mesma forma, aquilo que realmente observamos nanatureza, suas cores, sons e texturas, sao qualidades se-
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cundarias; em outras palavras l naD se encontram absolutamente na natureza, mas sao produtos acidentais dasre1ac;oes entre natureza e mente.
A explica,ao de natureza por mim proposta comoideal alternativo a essa concep,ao acidental da natureza e a de que nada na natureza poderia ser 0 que eexceto enquanto ingrediente da natureza como esta. a todopresente para a discriminac;ao eapresentado na apreensao sensivel como necessaria para as partes discriminadas. Urn evento isolado naG eurn evento, pais cada evento efator de um todo mals amplo e esignificativo dessetodo. Nao pode existir tempo isoladamente do espa,oe espa,o isoladamente do tempo; e nenhum espa,o e nenhum tempo isolados cia passagem dos eventos cia natureza. 0 isolamento de uma entidade no pensamento,quando a concebemos como urn "alga" puro e simples,naG tern contraparte em nenhum isolamento correspondente na natureza. Tal isolarnento eapenas parte do procedimento da apreensao intelectual.
As leis da natureza sao 0 produto dos caracteres dasentidades que encontramos na natureza. Sendo as entidades 0 que sao, as leis devem ser 0 que sao; e, inversamente, as entidades decorrem das leis. Estamos muitodistantes da realiza,ao de um tal ideal; mas este se mantern como a meta perene da ci(~ncia teorica.
CAPITULO VII
OS OBJETOS
A conferencia que se segue esta voltada para a teoria dos objetos. Objetos sao elementos da natureza isentosde passagem. A apreensao de um objeto como algumfator nao-partfcipe da passagem da natureza e0 que denomino "reconhecimento". EimpossIvel reconhecer urnevento, uma vez que urn evento e essencialmente distinto de todos os demais eventos. 0 reconhecimento euma apreensao de igualdade. Contudo, chamar ao reconhecimento percep,ao de igualdade implica um atointelectual de compara,ao acompanhado de julgamento. Emprego 0 termo reconhecimento para designar arela<;ao nao-intelectual da apreensao sensIvel que estabelece a liga<;ao da mente com urn fator da natureza isento de passagem. No lado intelectual da experiencia mental verificam-se compara<;6es de coisas reconhecidas econsequentes julgamentos de igualdade ou diversidade.Provavelmente "reconhecimento sensIvel" seria uma expressao mais adequada para aquilo que chamo de "reconhecimento". Optei pdo termo mais simples por con-
170 o CONCEITO DE NA TUREZA OSOBJETOS 171
siderar que me sera passive! evitar 0 usa de "reconhecimento" em qualquer Dutra acepl,;ao que DaD a de "reconhecimento senslvel". Sou bastante propenso a acreditar que 0 reconhecimento, no sentido que estoll emprestando ao termo, DaD passa de urn limite ideal e que,na verdade, naD existe reconhecimento desprovido deacompanhamentos intelectuais de comparac;ao e julgamento. 0 reconhecimento, parern, eaque1a re1a~ao ciamente com a natureza que fornece 0 material para a atividade intelectual.
Urn objeto e urn ingrediente do cad.ter de algumevento. Na verdade, 0 carater de urn evento nada maisesenao seus objetos ingredientes e os modos pe10s quaistais objetos se introduzem no evento. A teoria dos objetos, portanto, e a teoria cia compara<;ao dos eventos.Os eventos s6 sao companiveis porque dao corpo a permanencias. Toda vez que pudermos dizer "Ei-Io novamente", estaremos comparando objetos de eventos.Objetos sao os elementos da natureza capazes de "sernovamente" .
Por vezes, epossivel comprovar a existencia de permanencias que se furtam ao reconhecimento, na acepc;ao em que estou empregando 0 termo. As permanencias que se furtam ao reconhecimento se nos afiguramcomo propriedades abstratas quer de eventos quer deobjetos. Ainda assim, estao ali presentes para 0 reconhecimento, embora indiscriminadas em nossa apreensaosensivel. A demarcac;ao de eventos, 0 desmembramento da natureza em partes, e empreendida pelos objetosque reconhecemos como seus ingredientes. A discriminac;ao da natureza e 0 reconhecimento de objetos emmeio aos eventos passageiros. Eurn composto formado
pela percepC;ao da passagem da natureza, a conseqiiente partic;ao da natureza e a definic;ao de determinadaspartes da natureza pelos modos em que se da a introduc;ao dos objetos nas mesmas.
Talvez voces tenham percebido que estou empregando 0 termo "introduc;ao" para designar a relac;ao geral entre objetos e eventos. A introduc;ao de urn objetoem urn evento e 0 modo pelo qual 0 evento molda a simesmo em virtude do ser do objeto. Ou seja, 0 eventoeo que eporque 0 objeto e 0 que e; e, quando considero essa modificac;ao do evento por parte do objeto, chama arelac;ao entre ambos "introduc;ao do objeto no evento". Eigualmente verdadeiro dizer que os objetos saoo que sao porque os eventos sao 0 que sao. A naturezae tal que nao podem existir eventos nem objetos sem aintroduc;ao de objetos nos eventos, embora haja eventos tais que seus objetos ingredientes se furtam a nossoreconhecimento. Sao os eventos no espac;o vazio. Taiseventos apenas sao analisados para nos pela investigac;ao intelectual da ciencia.
A introduc;ao e uma relac;ao que se da de diversosmodos. Existem, obviamente, especies muito diversasde objetos; e nenhuma especie de objeto pode apresentar 0 mesmo tipo de relac;ao com eventos do que se pode verificar nos objetos de outra especie. Sera preciseque analisemos alguns dos diferentes modos de introduc;ao de diferentes especies de objetos em eventos.
Todavia, mesmo que nos atenhamos a uma unicaespecie de objetos, urn objeto de tal especie apresentadiferentes modos de introduc;ao em diferentes eventos.A ciencia e a filosofia tern demonstrado uma inc1inac;aoa se enredarem em uma teoria simplista de que cada
172 o CONCE/TO DE NA TUREZA OS OBJETOS 173
objeto se encontra em urn tinieD local a qualquer momenta determinado e, sob nenhum aspecto, em partealguma alem. Essa, com efeito, e a atitude do pensamenta ditada pelo sensa comum, embora naD seja a atitude da linguagem a expressar ingenuamente os fatosda experiencia. Urna de cada duas senten~as de uma obraliteniria verdadeiramente empenhada em interpretar asfatos cia experiencia expressa as diferenc;as sofridas noseventos circundantes devido a presen~a de algum objeto. Cada objeto e urn ingrediente de toda a extensao desua circunvizinhanc;a e sua circunvizinhanc;a eindefinida. A modifica~ao de eventos por introdu~ao, alem disso, e suscetfvel de diferenc;as quantitativas. Finalmente, portanto, somos levados a admitir que cada objetoe, em certo sentido, ingrediente cia totalidade cia natureza, embora sua introdw;;ao possa ser quantitativamenteirrelevante na expressao de nossas experiencias individuais.
Tal admissao nao e inedita quer na filosofia querna ciencia. Trata-se obviamente de urn axioma necessario aqueles fil6sofos que insistem em que a realidadee urn sistema. No presente cicIo de conferencias, estamos deixando de lado a questiio profunda e inquietantequanta ao que entendemos por "realidade". Defendo,aqui, a tese mais modesta de que a natureza e urn sistema. Suponho no entanto que, neste caso, 0 menor decorre do maior e que posso reivindicar 0 _apoio dessesfil6sofos. A mesma doutrina se encontra essencialmente entretecida em toda especula~ao f(sica moderna. ] aem 1847, em urn artigo no Philosophical Magazine, Faraday observava que sua teoria dos tubos de for~a implicaque, em certo sentido, existe uma carga eletrica em toda
parte. A modificac;ao do campo eletromagnetico em cada ponto do espac;o, a cada instante, em decorrencia dahist6ria passada de cada eletron, e uma outra forma deenunciar 0 mesmo fato. Podemos, contudo, ilustrar adoutrina com os fatos mais familiares da vida sem recorrer as diffceis especulac;oes da ffsica te6rica.
o modo como se da 0 rolar das ondas junto a costada Cornualha indica uma tempestade no meio do Atlantico; e nosso jantar da testemunho da introduc;ao da cozinheira na sala de jantar. Eevidente que a introdu~iiode objetos nos eventos inclui a teoria da causalidade. Prefiro relegar esse aspecto cia introduc;ao, uma vez que acausalidade desperta a lembran~a de discuss6es baseadas em teorias da natureza estranhas aminha. Ademais,considero possfvellanc;ar novas luzes sobre 0 terna observando-o sob esse aspecto diferente.
Os exemplos da introdu~aode objetos em eventosque apresentei nos fazem lembrar que a introduc;ao assume uma forma peculiar no caso de alguns eventos; emcerto sentido, trata-se de uma forma mais concentrada.Por exemplo, 0 eIetron tern uma determinada posic;aono espa~o e uma determinada forma. Talvez se trate deuma esfera extremamente dirninuta em urn determinadotubo de ensaio. A tempestade e urn vendaval situado noAtlantico em alto-mar com uma determinada latitudee longitude, e a cozinheira esta na cozinha. Charnareia essa forma especial de introduc;ao "relac;ao de situac;ao"; tambem, por urn duplo sentido da palavra "situac;ao", chamarei ao evento no qual urn objeto esta situado a "situac;ao do objeto". Assim, uma situac;ao eurn evento que e urn termo relacional na relac;ao de situac;ao. Ora, nossa primeira irnpressao e a de termos
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finalmente chegado ao fato puro e simples da reallocaliza~ao do objeto; e que a rela~ao mais vaga a que denomino introduc;ao nao deveria ser confundida com arela~ao de situa~ao, como que inc1uindo esta na qualidade de caso particular. Parece inteiramente 6bvio quequalquer objeto se encontra em tal ou qual posi~ao e queexerce influencia sabre outros eventos em urn sentidototalmente diverso. Dito de outra forma, um objeto, emcerto sentido, e0 caniter do evento que esua situac;ao,.mas apenas influencia 0 carater de outros eventos. Nesse sentido, as re1a<;5es de situac;ao e influencia geralmenteDaD sao relac;6es do meSilla genera e nao devem ser agrupadas sob 0 meSilla termo "introduc;ao" . Acredito queessa no<.;5.o e urn equivoco e que seja impassIvel trac;ar
. uma clara distin<;ao entre as duas relac;5es.Por exemplo, onde era a sua dor de dente? Voce
foi a um dentista e indicou 0 dente para ele. Ele dec1arou esse dente perfeitamente sao e curou voce obturando outro dente. Qual dente era a situa~ao da dor de dente? Da mesma forma, urn homem tern urn brac;o amputado e experimenta sensac;oes na mao que perdeu. A situac;ao cia mao imaginaria, na realidade, e pura ilusao.Voces se poem diante de urn espelho e avistam urn incendio. As chamas que veem estao situadas atras do espelho. Assim tambem, voces observam 0 ceu durantea noite; caso algumas das estrelas tenham deixado deexistir horas atHis, voces nao teriam a menor ideia disso. Mesmo a situa~ao dos planetas difere daquela quelhes seria atribufda pela ciencia.
Seja como for, voces se verao tentados a exclamar,a cozinheira esta na cozinha. Se estiverem se referindoamente dela, nao concordarei com voces nesse ponto,
pois estou falando apenas de natureza. Consideremosapenas sua presenc;a ffsica. 0 que entendem voces poressa noc;ao? Nos nos confinamos a manifestac;oes tipicas da mesma. Voces podem ver a cozinheira, toea-la,ouvi-la. Contudo, os exemplos que lhes apresentei mostram que as noc;oes das situac;5es daquilo que veem, daquilo que tocam e daquilo que ouvem nao se encontramtao nitidamente separadas a ponto de desafiar questionamentos adicionais. Voces nao podem se apegar aideiade que contamos com dois conjuntos de experiencias danatureza, urn das qualidades primarias pertencentes aosobjetos percebidos e outro das qualidades secundarias,produtos de nossas inquieta~i5es mentais. Tudo 0 queconhecemos acerca da natureza esta no mesmo barco,para afundar ou navegar conjuntamente. As construc;oes da ciencia sao meras demonstrac;oes dos caracteresdas coisas percebidas. Nesse sentido, afirmar que a cozinheira e uma determinada danc;a de moleculas e eIetrons esimplesmente afirmar que as coisas perceptiveisde que ela edotada possuem determinados caracteres.As situa~i5es das manifesta~i5espercebidas de sua presenc;a ffsica possuem tao-somente uma relaC;ao muito generica com a situac;ao das moleculas, para serem deterrninadas pela discussao das circunstancias da percepc;ao.
Ao discutir as rela~i5es de situa~ao em particular eas de introduC;ao em geral, 0 prirneiro requisito eobservar que os objetos sao de tipos radicalmente diversos.Para cada tipo, a "situac;ao" e a "introduc;ao" tern seussignificados pr6prios e especiais, que diferem de seus significados para outros tipos, ernbora seja possive! identificar pontos de liga~ao. Ao discutir tais rela~i5es, portanto, e necessario deterrninar que tipo de objetos esta
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sob considera<:ao. Existe, penso eu, urn numero indefinido de tipos de objetos. Felizmente nao precisamos pensar em todos eles. A id€ia de situar;ao tern sua importancia peculiar com referencia a tres tipos de objetos aque denomino objetos dos sentidos, objetos perceptuaise objetos cientificos. A adequa~ao desses nomes aos trestipos ede pouca importancia, contanto que eu consigaexplicar 0 que estou designando por e1es.
Esses tres tipos formam uma hierarquia ascendente, na qual cada membro pressup6e 0 tipo que vern abaixo. A base da hierarquia e formada pelos objetos dossentidos. Tais objetos nao pressup6em nenhum outrotipo de objetos. Urn objeto dos sentidos e urn fator danatureza postulado pela apreensao sensive1 que (i) namedida em que e urn objeto, nao participa da passagemcia natureza e (ii) DaO constitui uma relac;ao entre outros fatores cia natureza. Sera ele, obviamente, urn termo de re1a~6es que tambem implicam outros fatores danatureza. Mas sera sempre urn termo relacional e jamais a rela~ao propriamente dita. Sao exemplos de objetos dos sentidos uma classe particular de COf, digamoso azul-claro, uma c1asse particular de som, uma classeparticular de aroma au uma c1asse particular de sensar;ao. NaG estoll me referindo a uma porc;ao particularde azul tal como vista durante urn segundo particularde tempo em alguma data definida. Tal por~ao e urnevento em que 0 azul-claro esta situado. Da mesma forma, nao me refiro a nenhuma sala de concertos quandopreenchida por aquela determinada nota. Refiro-me itpropria nota e nao it por~ao de volume preenchida pelosom por urn decimo de segundo. Enatural para nos pensar na nota em si mesma, embora no caso da cor nossa
inclina<:ao seja a de considera-la meramente uma propriedade da por~ao. Ninguem pensa na nota como umapropriedade cia sala de concertos. N6s enxergamos 0 azule ouvimos a nota. Tanto 0 azul como a nota sao apresentados imediatamente pela discriminac;ao da apreensaosensivel que estabelece a relac;ao da mente com a natureza. 0 azul e apresentado como existente na natureza,relacionado a outros fatores da natureza. Eapresentado particularmente enquanto na relac;ao de estar situado no evento que constitui sua situaC;ao.
As dificuldades que se acumulam em tome da relac;ao de situac;ao tern origem na obstinada recusa dos fi16sofos em encarar seriamente 0 fato ultimo das rela~6es multiplas. Por rela~ao multipla designo uma relaC;ao que, em qualquer instancia concreta de sua ocorrencia, envolve necessariamente mais de dois termosrelacionais. Por exemplo, quando dizemos que John gosta de Thomas, temos apenas dais termos relacionais,John e Thomas. Mas quando dissermos que John entrega aquele livro a Thomas, teremos tres termos relacionais, John, 0 livro e Thomas.
Determinadas escolas filos6ficas, sob a influenciada 16gica e da filosofia aristotelicas, insistem em nao admitir absolutamente relac;ao alguma, salvo aquela entre substancia e atributo. Em outras palavras, todas asrelac;oes aparentes devem ser redutiveis aexistencia convergente de substancias com atributos contrastados. Ebastante 6bvio que a monadologia leibniziana e 0 resultado necessario de qualquer filosofia do genero. Se 0 pluralismo nos desagrada, existira uma unica monada.
Outras escolas filos6ficas admitem relac;oes, mas serecusarn obstinadamente a contemplar re1ac;oes corn nlais
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de dais termos. NaG ereio que tallimita<;8.o se baseie emnenhuma finalidade ou teoria estabelecida. Ela surgesimplesmente do incomodo representado por rela(:oesmais complicadas para pessoas sem uma adequada forma<;ao matematica, quando devem considera-Ias no raciocfnio.
Devo repetir que em nada nos diz respeito, nestasconferencias, 0 carater ultimo da realidade. Ebern possivel que na autentica filosofia da realidade somente existam substancias individuais com atributos au apenas rela<;oes entre pares de termos. Nao ereio que seja este 0
caso, mas naD estoll preocupado em discutir a esse respeito agora. Nosso tema ea Natureza. Ate onde nos confinamos aos fatores apresentados na apreensao sensfvelcia natureza, pareee-me que certamente existem casosde multiplas rela~6es entre tais fatores e que a rela~ao
de situa~ao para os objetos dos sentidos e urn exemplodessas rela~6es multiplas.
Consideremos urn blusao azul, urn blusao de (Janela azul-clara pertencente a algum atleta. 0 blusao emsi e urn objeto perpetuo e naD e de sua situa<;ao que egtou falando agora. Estamos falando da precisa apreensao sensfvel, por parte de urn individuo, do azul-clarotal como situado em algum evento da natureza. 0 individuo pode estar olhando diretamente para 0 blusao. Eleenxerga entao 0 azul-claro como situado praticamenteno mesmo evento que 0 blusao naquele instante . Everdade que 0 azul que ele enxerga deve-se aluz que abandonou 0 blusao uma fra\=ao inconcebivelmente minimade segundo antes. Essa diferen~a seria importante se estivessemos olhando uma estrela cuja colora\=ao fosse azulclara. A estrela poderia ter deixado de existir dias atnls,
ou mesmo anos atnls. A situa\=ao do azul nao estanl, portanto, intimamente ligada asitua\=ao (num outro sentido de "situa~ao") de nenhum objeto perceptual. Naoeprecise uma estre1a para exemplificar essa desconex3.oentre a situa~ao do azul e a situa~ao de algum objetoperceptual associado. Urn espelho qualquer sera suficienteo Observemos 0 blusao atraves de urn espelho. Nessecaso, 0 azul e visto como situado atds do espelho. 0
. evento que e sua situa~aodepende da posi~ao do observador.
A apreensao sensivel do azul enquanto situado emurn determinado evento ao qual chamo situa\=3.o manifesta-se, portanto, como a apreensao sensive1 de uma rela\=3.0 entre 0 azul, 0 evento percipiente do observador,a situa\=3.o e os eventos intervenientes. Na verdade, toda a natureza e solicitada, embora apenas alguns eventos intervenientes exijam que seus caracteres sejam dedeterminadas qualidades especfficas. A introdu~ao doazul nos eventos da natureza manifesta-se, portanto, como sistematicamente correlacionada. A apreens3.o do observador depende da posi~ao do evento percipiente nessacorre1a\=3.o sistematica. Usarei a express3.o "introdu\=aona natureza" para designar essa corre1a\=3.o sistematicado azul com a natureza. Assim, a introdu\=3.o do azulem qualquer evento especffico e uma declara~aoparcialdo fato da introdu~ao do azul na natureza.
Com respeito aintrodu\=3.o do azul na natureza, podemos classificar os eventos, grosso modo, em quatro categorias que se sobrepoem e que nao estao nitidamenteisoladas. Tais categorias sao (i) os eventos percipientes,(ii) as situa\=oes, (iii) os eventos condicionantes ativos e
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(iv) as eventos condicionantes passivos. Para se compreender essa classificac;ao dos eventos no fato geral ciaintroduc;;ao do azul na natureza, concentremos nossaatenc;;ao em uma situac;;ao para urn evento percipienteisolado e nas conseqiientes junfoes dos eventos condicionantes na introduc;;ao assim limitada. 0 evento percipiente e 0 estado corporeo re1evante do observador. Asituac;;ao e 0 lugar cude ele ve 0 azul - digamos, atrasdo espelho. Os eventos condicionantes ativos sao aqueles cujos caracteres sao particularmente relevantes paraque 0 evento (que e a situa~ao) constitua a situa~ao dague1e evento percipiente, au seja, 0 blusao, 0 espe1hoe as condi~6es da sala no tocante it ilumina~ao e ambiente. as eventos condicionantes passivos sao aquelesdo resta cia natureza.
Em geral, a situac;;ao eurn evento condicionante atiyo, ou seja, 0 blusao em si, na ausencia de espelhos ououtros artiffcios do genero para produzir efeitos anormais. 0 exemplo do espelho, entretanto, nos mostra quea situac;ao pode ser a de eventos condicionantes passivos. Podemos dizer, nesse caso, que nossos sentidos foram ludibriados, pois exigimos, por direito, que a situac;ao seja uma condic;ao ativa para a introduc;ao.
Tal exigencia nao e tao infundada quanto pode parecer quando apresentada da maneira como liz. Tudoo que conhecemos acerca dos caracteres dos eventos danatureza baseia-se na analise das rela<;oes entre situac;6es e eventos percipientes. Se as situac;6es nao fossemem geral condic;5es ativas, essa analise nao nos revelaria coisa alguma. A natureza seria para nos urn enigmainescrutavel e nao poderia haver nenhuma ciencia. Assim sendo, 0 incipiente desapontamento surgido quando
se verifica que uma situa<;ao euma condic;ao passiva emcerto sentido ejustificavel, pois, caso esse tipo de coisase verificasse com muita assiduidade, afun~lio do intelecto estaria encerrada.
Outrossim, 0 proprio espelho e a situac;ao de outros objetos dos sentidos, seja para 0 mesmo observador com respeito ao mesmo evento percipiente como paraoutros observadores com respeito a eventos percipientes outros. Portanto, 0 fato de urn evento consistir emuma situa<;ao de introdu<;ao na natureza de urn conjunto de objetos dos sentidos e uma suposta evidencia deque tal evento euma condic;ao ativa para a introduc;aona natureza de outros objetos dos sentidos que poderaoter outras situa<;5es.
Esse e urn principio fundamental da ciencia derivado do senso comum.
Passo agora aos objetos perceptuais. Ao olharmospara 0 blusao, nao dizemos geralmente: eis uma porc;ao de azul-claro; 0 que naturalmente nos ocorre e: eisurn blusao. Tambem 0 julgamento de que 0 que vimoseuma pec;a de vestuario masculino nao passa de urn detalhe. 0 que percebemos e urn objeto que difere de urnmero objeto dos sentidos. Nao se trata de uma simplespor<;ao de cor, mas de algo mais; e eesse algo mais quejulgamos ser urn. blusao. Usarei a palavra "blusao" paradesignar aquele simples objeto que e mais que uma porc;ao de cor, sem nenhuma alusao aos julgamentos quantaa sua utilidade como pe<;a de vestuario, quer no passado quer no futuro. 0 blusao percebido - nesse sentidoda palavra "blusao" - e 0 que chama de objeto perceptual. Eprecise que examinemos 0 caniter geral desses objetos perceptuais.
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Euma lei cia natureza que, em geral, a situa<;aode urn objeto dos sentidos seja DaD apenas a situa<;ao daquele objeto dos sentidos para urn evento percipiente especifico, mas a situa,ao de uma variedade de objetos dossentidos para uma variedade de eventos percipientes. Porexemplo, para qualquer evento percipiente individual,a situa,ao de urn objeto dos sentidos para a visao tambern esta apta a ser as situa,oes dos objetos dos sentidospara a visao, 0 tate, 0 olfato e 0 som. Verifica-se, aincia, que essa confluencia nas situa<;oes dos objetos dossentidos levou 0 carpo - i.e. 0 evento percipiente a uma adapta,ao tal que a percep,ao de urn objeto dossentidos em uma determinada situac;ao conduz a umaapreensao sensfvel subconsciente de outros objetos dossentidos na mesma situa<;ao. Esse intercambio e particularmente 0 caso que se cia entre 0 tate e a visao. Existeuma certa corre1al;,:ao entre as introdu<;6es na naturezade objetos dos sentidos para 0 tato e objetos dos sentidos para a visao e, em grau menos acentuado, entre asintrodu,oes de outros pares de objetos dos sentidos. Doua esse genera de corre1ac;ao 0 nome de "transferencia"de urn objeto dos sentidos por algum outro. Ao vermoso blusao azul de flanela, subconscientemente imaginamonos vestincio-o ou tocando-o. Se formos fumantes, tambern poderemos atentar subconscientemente para 0 levearoma do tabaco. 0 fato peculiar, postulado por essaapreensao senslve1 cia confluencia de objetos dos sentidos subconscientes e urn ou mais objetos dos sentidosdominantes na mesma situac;ao, e a apreensao senslveldo objeto perceptual. 0 objeto perceptual nao e fundamentalmente 0 resultado de urn julgamento. Eurn fator da natureza diretamente apresentado na apreensao
senslvel. 0 fator julgamento se introduz quando passamos a classificar 0 objeto perceptual particular. Dizemos, por exemplo, "isso eflanela", e pensamos nas propriedades da flanela enos uso, dos blusoes esportivos.Tudo isso, contudo, tern lugar depois de nos termos assenhoreado do objeto perceptual. Os julgamentos previos afetam 0 objeto perceptual percebido, em rado dafocaliza,ao e do desvio da aten,ao.
o objeto perceptual e 0 produto do Mbito da experiencia. Tudo quanta esteja em conflito com esse habito prejudica a apreensao sensfvel de urn tal objeto. Urnobjeto dos sentidos nao e 0 produto da associa,ao deideias intelectuais; eo produto da associa,ao de objetosdos sentidos na mesma situac;ao. Esse produto nao eintelectual; e urn objeto de tipo singular, com sua introduc;ao propria e particular na natureza.
Existem duas especies de objetos perceptuais, a saber, os "objetos perceptuais enganosos" e os "objetosffsicos". A situa,ao de urn objeto perceptual enganosoe uma condi,ao passiva na introdu,ao daquele objetona natureza. Ademais, 0 evento que e a situac;ao teraa rela,ao de situa,ao com 0 objeto apenas para urn eventopercipiente particular. Por exemplo, urn observador vea imagem do blusao azul em urn espelho. Eurn blusaoazul que ele enxerga e nao uma simples mancha de cor.Isso mostra que as condic;;5es ativas para a transferenciade urn grupo de objetos dos sentidos subsconscientes atraYes de urn objeto dos sentidos dominantes devem ser procuradas no evento percipiente. Em outras palavras, devemos busca-las nas investiga,oes dos psic610gos clfnicos. A introdu,ao na natureza do objeto dos sentidos enganoso esta condicionada pela adapta,ao dos eventos cor-
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porais aocorrencia mais normal, que ea introdu~ao doobjeto fisico.
Urn objeto perceptual e urn objeto fisico quando (i)sua situac;ao eurn evento condicionante ativo para a introdu~ao de qualquer urn de seus objetos dos sentidoscomponentes e (ii) 0 mesma evento pode ser a situae;aodo objeto perceptual para urn numero indefinido de eventos percipientes possiveis. Os objetos fisicos sao os objetos ordinarios que percebemos quando nossos sentidosnaG sao ludibriados, como cadeiras, mesas e arvores. Emcerto sentido, as objetos ffsicos contam com uma fore;aperceptiva mais insistente do que as objetos dos sentidos. A atenc;ao para 0 fata de sua ocorrencia na natureza ea condic;ao primeira para a subsistencia de organismos vivos complexos. 0 resultado desse elevado poderperceptivo dos objetos fisicos e a filosofia escolastica danatureza, que ve nos objetos dos sentidos meros atributos dos objetos fisicos. Esse ponto de vista escolastico estadiretamente contestado pela prodigalidade dos objetosdos sentidos que se introduzem em nossa experiencia enquanta situados em eventos sem 0 menor vinculo comobjetos fisicos. Por exemplo, aromas, sons e cores difusos, e objetos dos sentidos mais sutis e inominaveis. Naoexiste apreensao de objetos fisicos sem a apreensao deobjetos dos sentidos. Mas a redproca nao everdadeira,vale dizer, existe uma farta apreensao de objetos dos sentidos que nao e acompanhada por nenhuma apreensaode objetos fisicos. A ausencia de reciprocidade nas rela~5es entre objetos dos sentidos e objetos fisicos e fatalpara a filosofia natural escolastica.
Egrande a diferenp entre as fun,iies das situa~5es
dos objetos dos sentidos e dos objetos fisicos. As situa~5es
de um objeto ffsico estao condicionadas pelo can~.ter tinicoe pela continuidade. 0 carater unico eum limite idealdo qual nos aproximamos ao percorrer em pensamentourn conjunto abstrativo de dura~5es, considerando dura<;6es progressivamente menores na aproxima<;ao ao limite ideal do momento temporal. Em outras palavras,quando a dura<;ao ebreve 0 suficiente, a situa<;ao do objeto fisico dentro daquela dura~ao e praticamente unica.
A identifica~ao do mesmo objeto fisico como situado em eventos distintos em dura<;6es distintas e levadaa termo pela condi~ao da continuidade. Essa condi~ao
de continuidade e a condi~ao que permite identificar umacontinuidade na passagem de eventos, sendo cada eventouma situa<;ao do objeto em sua dura<;ao correspondente, do anterior ao posterior entre dois eventos dados. Namedida em que os dois eventos sejam praticamente adjacentes em urn presente especioso, essa continuidadede passagem pode ser percebida diretamente. Do contrario, sera uma questao de julgamento e inferencia.
As situa~5es de urn objeto dos sentidos nao estaocondicionadas quer pelo carater unico quer pela continuidade. Em quaisquer dura<;6es, por menores que sejam, urn objeto dos sentidos pode apresentar qualquernumero de situa<;6es isoladas umas das outras. Portanto, duas situa<;6es de urn objeto dos sentidos, na mesmadura<;ao ou em dura<;6es distintas, nao estao necessariamente vinculadas por nenhuma passagem contfnua deeventos que tambern sao situa~5es daquele objeto dossentidos.
Os caracteres dos eventos condicionantes envolvidosna introdu~aode urn objeto dos sentidos na natureza podem ser largamente expressos em termos dos obje-
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tos fisicos situados em tais eventos. Sob determinado aspecto, isso etambem uma tautologia, pais 0 objeto fisiconada mais e do que a habitual confluencia de urn determinado conjunto de objetos dos sentidos em uma situa,ao. Assim, quando conhecemos tudo a respeito doobjeto ffsico, conhecemos, conseqiiex:teme?-.te, as o~Je
tos dos sentidos componentes. Urn obJeto fIsIco, porem,euma condi~ao para a ocorrencia de objetos dos sentidos outros que DaO seus componentes. Par exemplo, aatmosfera leva os eventos que sao suas situae;oes a serem eventos condicionantes ativos na transmissao dosom. Urn espelho, em si meSilla urn objeto fisico, eumacondic;ao ativa para a situa.;ao de uma por~ao colaridaatras de si, devido a reflexao cia luz em sua superficie.
A origem do conhecimento cientffico, portanto, eo esforc;o em expressar, em termos dos objetos ffsicos,as mu.ltiplasfunfoes dos eventos enquanto condi,oes ativas na introduc;ao do objetos dos sentidos na natureza.£, no avan,o dessa investiga,ao que os objetos cientfficos vern a tona. Eles corporificam aqueles aspectos dassituac;oes dos objetos ffsicos que sao mais permanentese exprimfveis sem referencia a uma relac;ao multipIa envolvendo urn evento percipiente. Suas re1ac;oes mutuastambern se caracterizam por uma certa simplicidade euniformidade. Por fim, os caracteres dos objetos ffsicose objetos dos sentidos observados podem ser expressosem termos desses objetos cientfficos. Na verdade, 0 cerne da busca por objetos cientfficos e 0 esfor,o em obterse essa simples expressao dos caracteres dos eventos. Taisobjetos cientfficos nao sao, em si, meras for~ulas par.ao calculo uma vez que formulas devem refenr-se a C01
sas da n~tureza e os objetos cientfficos sao .as coisas danatureza a que as formulas se referem.
Urn objeto cientffico, como urn eletron espedfico,euma correlac;ao sistematica dos caracteres de todos oseventos existentes por toda a natureza. E urn aspectodo carater sistematico da natureza. 0 eletron nao estasimplesmente ali onde esta sua carga. A carga e0 carater quantitativo de certos eventos decorrentes da introdu,ao do eletron na natureza. 0 eletron e a totalidadede seu campo de for,a. Em outras palavras, 0 eletrone a forma sistematica pe1a qual todos os eventos sao modificados enquanto expressao de sua introdu,ao. A situa,ao de urn eletron em qualquer dura,ao breve podeser definida como aque1e evento dotado do caniter quantitativo que e a carga do eletron. Podemos, se quisermos, chamar a simples carga de e1etron. Nesse caso, porem, sera preciso outro nome para 0 objeto cientfficoque e a entidade integral de que se ocupa a ciencia, ea qual denominei eletron.
Segundo essa concep,ao dos objetos cientfficos, asteorias rivais de ac;ao a distancia e ac;ao por transmissaoatraves de urn meio sao, ambas, expressoes incompletas do verdadeiro processo da natureza. A Corrente deeventos que forma a serie contfnua de situac;oes do eletron e inteiramente autodeterminada, tanto no que serefere a possuir 0 carater intrfnseco de ser a serie de situac;oes daquele eletron COmo no que se refere aos sistemas temporais com os quais seus diversos membros saocogredientes, bern como ao £luxo de suas posic;oes emsuas dura,oes correspondentes. Tal e 0 fundamento danegaC;ao da ac;ao a distancia, ou seja, 0 progresso da corrente das situa,oes de urn objeto cientffico pode ser determinado par uma analise da propria corrente.
Por outro lado, a introduc;ao de cada e1etron na natureza modifica, em certa medida, 0 carater de cada
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evento particular. Assim, 0 carater cia corrente de eventosque estamos considerando porta-sinais cia existencia detodos as demais eh~trons existentes em todo 0 universo.Se nos apraz pensar nos eletrons como senda meramente aquila que denomino suas cargas , as cargas atuam adistancia. Tal a~ao, porem, consiste na modifica~aociasitua~ao do outro e1€tron que se considera. Essa concep<;ao de uma carga atuando a distancia e totalmente artificial. A concep<;ao que mais integralmente expressa 0
can~.ter cia natureza ea de cada evento senda modificado pela introdu<;ao de cada eletron na natureza. 0 eterea expressao dessa sistematica modificac;ao dos eventosatraves de todo 0 espa<;o e de todo a tempo. Cabe aosffsicos encontrar a expressao mais adequada do caniterdessa modificac;ao. Minha teoria nada tern a ver comisso e esta pronta a aceitar qualquer resultado da pesquisa no campo cia fisica.
A rela<;ao entre objetos e espa<;o requer uma elucida<;ao. Os objetos estao situados em eventos. A rela<;aode situa<;ao difere segundo cada tipo de objeto e, no caso dos objetos dos sentidos, nao pode ser expressa comouma re1a<;ao binaria. Talvez fosse mais apropriado empregarmos uma palavra diferente para esses diferentestipos de rela~ao de situa~ao. Contudo, isso nao se feznecessario para nossas finalidades nestas conferencias.Devemos compreender, no entanto, que, quando se fala em situa<;ao, algum tipo especffico se encontra em discussao e pode se dar que 0 racioefnio nao se aplique asitua<;ao de algum outro tipo. Na totalidade dos casas,todavia, uso 0 termo situa~ao para expressar uma rela~ao entre objetos e eventos, e nao entre objetos e elementos abstrativos. Existe uma rela~ao derivativa entre
objetos e elementos espaciais, a qual denomino rela<;aode loca~ao; e quando se verifica essa loca~ao, digo quea objeto esta localizado no elemento abstrativo. Nessesentido, urn objeto pode estar localizado em urn momento do tempo, em urn volume do espa~o, uma area, umalinha au urn ponto. Haved urn tipo peculiar de localiza<;ao correspondente a cada tipo de situa<;ao, sendo ela,em cada caso, derivativa da correspondente rela<;ao desitua~ao, de uma forma que passo agora a explicar.
Tambem a localiza<;ao no espa<;o atemporal de algum sistema temporal e uma rela~ao derivativa estabelecida a partir da 10caliza<;1i.o em espa<;os instantaneosdo mesmo sistema temporal. Consequentemente, a 10caliza~ao em urn espa~o instantaneo e a ideia fundamental que nos compete explicar. Grande confusao foi gerada na fila sofia natural pela negligencia em se distinguir entre os diferentes tipos de objetos, as diferentestipos de situa<;ao, as diferentes tipos de localiza<;ao e adiferen<;a entre localiza<;ao e situa<;ao. Eimpossivel ponderar de maneira precisa na vaguidao que envolve osobjetos e suas posi~6es sem ter em vista essas distin~6es.
Urn objeto estad localizado em urn eJemento abstrativo quando for possivel encontrar urn conjunto abstrativo tal, pertencente aque1e elemento, que cada eventopertencente aquele conjunto e uma situa<;ao do objeto.Devemos lembrar que urn elemento abstrativo e urn gropo determinado de conjuntos abstrativos e que cada conjunto abstrativo e urn conjunto de eventos. Essa defini<;ao define a 10caliza<;1i.o de urn elemento em qualquerespecie de elemento abstrativo. Nesse sentido, podemosfalar cia existencia de urn objeto em urn instante, referindo-nos com isso a sua localiza<;ao em algum momen-
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to determinado. 0 objeto tambem podera. estar localizadoem algum elemento espacial do espa~o instantaneo daquele momento.
Podemos dizer que uma quantidade esta localizacia em urn e1emento abstrativo quando e passive1 encontrar urn conjunto abstrativo tal, pertencente ao elemento, que as expressoes quantitativas dos caracterescorrespondentes de seus eventos convergem para a medida da grandeza estabelecida como limite quando percorremos 0 conjunto abstrativo em dire<:;ao asua extremidade convergente.
Com essas defini<:;6es, a localizac;ao em elementosde espa<;,:os instantaneos esta definida. Esses elementosocupam elementos correspondentes de espa~os atemporais. Diremos ainda que urn objeto localizado em urnelemento de urn espa~o instantaneo esta localizado naquele momento no elemento atemporal do espa~o atemporal ocupado por aquele elemento instantaneo.
Nao e todo objeto que pode estar localizado em urnmomento. Urn objeto capaz de estar localizado em todos os momentos de uma dura~ao qualquer sera chamado de urn objeto "uniforme" ao longo de toda aqueladura~ao. Os objetos fisicos comuns nos parecem objetos uniformes e habitualmente partimos do principio deque objetos cientfficos como os eIetrons sao uniformes.Contudo, alguns objetos dos sentidos certamente nao saouniformes. Uma melodia e urn exemplo de objeto naouniforme. Nos a percebemos como urn todo em uma determinada dura<:;ao, mas a melodia, enquanto melodia,nao se encontra em momento algum dessa durac;ao, embora uma das notas individuais possa estar localizada ali.
Epossivel, portanto, que para a existencia de determinadas especies de objetos, e.g. os eletrons, seja necessario urn quanta mlnimo de tempo. Aparentemente,a moderna teoria quantica esta indicando algum postulado do genero, sendo 0 mesmo perfeitamente coerentecom a doutrina dos objetos sustentada nestas conferencias.
Tambem 0 exemplo da distin~ao entre 0 eletron enquanta simples carga e!etrica quantitativa de sua situac;ao e 0 eletron enquanto representante da introduc;aode urn objeto por toda a extensao da natureza e ilustrativo do ilimitado numero de tipos de objetos existentesna natureza. Podemos distinguir intelectualmente atemesmo tipos cada vez mais sutis de objetos. Refiro-meaqui asutileza no sentido de urn isolamento no tocanteapercepc;ao imediata da apreensao senslvel. Evoluc;ao,na complexidade da vida, significa urn acrescimo nostipos de objetos diretamente percebidos. De!icadeza naapreensao senslve! significa percep~6es de objetos enquanta entidades distintas que nao passam de ideias sutispara as sensibilidades mais embrutecidas. 0 fraseadomusical nao passa de uma sutileza abstrata para 0 individuo nao-musical; e uma apreensao sensivel direta para 0 iniciado. Por exemplo, se pudessemos imaginar algum tipo de ente organico inferior a pensar e a atentarpara nossos pensamentos, este ficaria admirado diantedas sutilezas abstratas a que nos entregamos ao cogitarem pedras, tijolos, gotas d'agua e plantas. Tudo 0 queesse ente conhece sao vagas sensa<;oes indiferenciadas danatureza. Ele nos consideraria entregues ao jogo de intelectos excessivamente abstratos. Mas, caso pudessepensar, de faria progn6sticos; e caso fizesse progn6sticos, em breve estaria percebendo por si mesmo.
192 a CONCElTO DE NA TUREZA
Procedemos, nestas conferencias, a urn exame detalhado dos fundamentos da filosofia natural. Estamosnos detendo no ponto exato em que urn ilimitado oceano de investigac;;6es se descortina para 0 nosso questionamento.
Concordo em que a concep~ao de Natureza pormim sustentada nestas conferencias DaD esimples. A natureza se mostra como urn sistema complexo, cujos fatores sao vagamente discernidos por nos. Mas, perguntoIhes, naD sera essa a verdade propriamente dita? Naodeverfamos desacreditar a contumaz seguranc;a, com quecada epoca se jacta de haver finalmente alcan~ado os coneeitos fundamentais em cujos termos tudo quanta ocorre pode ser formulado? A meta da ciencia e buscar explica~5es as mais simples para fatos complexos. Corremos 0 risco de incorrer no equfvoco de imaginar queos fatos sao simples por ser a simplicidade 0 objetivo denossa investiga~ao. A maxima diretora da atividade detodo fil6sofo natural deveria ser: buscar a simplicidadee desconfiar cia mesma.
CAPiTULO VIII
RESUMO
Econsenso geral que as investiga~5es de Einsteintern urn merito basieD, independente de quaisquer crlticas que possamos nos sentir inc1inados a dirigir-Ihes:e1as nos fizeram pensar. Uma vez admitido isso, porem,a maioria de nos se ve diante de uma desalentadora perplexidade. Em que deverfamos pensar? a cerne de minha conferencia desta tarde sera fazer frente a esse embara~o e, na medida de minha capacidade, situar sobuma luz clara as mudanc;as nos fundamentos de nossopensamento cientifico, necessarias a qualquer aceitac;ao,ainda que com reservas, das posic;5es centrais de Einstein. Lembro-me que estou me dirigindo aos membrosde uma sociedade de quimicos, que em sua maioria naosao versados em matematica avanc;ada. 0 primeiro pontoque eu enfatizaria aqui e 0 de que aquilo que concerneimediatamente a voces nao sao tanto as detalhadas dedu~5es da nova teoria como essa modifica~ao geral nosfundamentos das concep~5es ffsicas, decorrente de suaaceita~ao. Obviamente, as dedu~5es detalhadas sao im-
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portantes, porquanto a menos que nossos colegas, as astronornos e as ffsicos, corroborem esses progn6sticos, podemos descurar por completo cia teoria. Atualmente,cantudo, podemos dar como certo que, em diversos detalhes surpreendentes, verificou-se uma concordanciadessas dedw;6es com a observalYao. Assim senda, a teoria merece ser levada a serio e estamos ansiosos por saber quais serao as conseqiiencias de sua aceitac;ao final.Ademais, as publicac;oes cientfficas e a imprensa em geraltern estado repletas, nas ultimas semanas, de artigos dedicados anatureza dos experimentos cruciais realizadose a algumas das mais notaveis express6es do advento cianova teoria. "Flagrado espac;o a se curvar", foi a manchete de urn jornal vespertino bastante conhecido. Talinterpreta~aoeuma tradu~ao concisa, mas nao inabil,do modo do proprio Einstein interpretar seus resultados. Devo dizer de imediato que sou urn herege no quediz respeito a essa explica~ao e que apresentarei a vocesuma outra, baseada em alguns de meus trabalhos, umaexplica~ao que me parece mais de acordo com nossasideias cientfficas e com todo a corpo de fatos que pedemexplicac;ao. Devemo-nos lembrar de que qualquer novateoria deve dar conta dos velhos e bern atestados fatosda ciencia, exatamente na mesma medida em que daconta dos resultados experimentais mais recentes que levaram a sua elabora~ao.
Para nos colocarmos em posi~ao de assimilar e criticar qualquer mudanc;a nas concepc;6es cientfficas fundamentais, devemos come~arpelo come~o. Portanto, voces deverao ser pacientes se eu iniciar fazendo algumasreflexoes simples e 6bvias. Consideremos tres asser~6es:
(i) "Ontem, urn homem foi atropelado em Chelsea, na
margem do Tfunisa", (ii) "0 Obelisco de Cleopatra estaem Charing Cross, a margem do Tamisa" e (iii) "Existern linhas escuras no Espectro Solar". A primeira asser~ao, sobre 0 acidente sofrido peIo homem, refere-seaquilo que podemos denominar uma "ocorrencia", urn"acontecimento', ou urn "evento". Usarei 0 termo"evento", por ser 0 mais breve. A fim de especificarurn evento observado, sao necessarios 0 local, 0 momentoeo carater do mesmo. Ao especificar 0 local e 0 momento, na verdade voces estao estabelecendo a rela~ao dodito evento com a estrutura geral de outros eventos observados. Par exemplo, 0 homem foi atropelado entrea hora do cha e a do jantar, e nas adjacencias de umabarcal;a que percorria 0 Tamisa e do trafego no Strand.o ponto que desejo ressaltar e 0 seguinte: a Naturezanos econhecida, em nossa experiencia, como urn complexo de eventos passageiros. Nesse complexo, podemosdiscernir relal;oes mutuas definidas entre os eventos componentes, as quais podemos denominar suas posil;oes relativas, posil;oes estas que expressamos parcialmente emtermos de espal;o e parcialmente em termos de tempo.Alem de sua mera posic;ao relativa em face de outroseventos, cada evento particular possui, ainda, seu proprio carMer peculiar. Em outras palavras, a naturezaeuma estrutura de eventos e cada evento tern sua posiI;ao nessa estrutura e seu proprio carater ou qualidade peculiar.
Examinemos agora as duas outras asserl;oes a luzdesse principia geral quanta ao significado da natureza. Tomemos a segunda asserc;ao - "0 Obelisco deCle6gatra esta em Charing Cross, it margem do Tamisa". A primeira vista, dificilmente poderfamos classifi-
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car issa como urn evento. Pareee ressentir-se cia falta doelemento tempo au transitoriedade. Mas sera que eassim? Tivesse urn anjo feito a observa,ao algumas centenas de milhoes de anos atras, a Terra nao existia, vintemilh5es de anos atnls nao existia 0 Tfunisa, oitenta anosatnls nao existia a avenida que hoje margeia 0 Tamisae quando eu era urn meninote 0 Obelisco de Cleopatranao estava ali. E agora que se encontra ali, nenhum denos espera que isso seja eterno. 0 elemento atemporale estatico na rela,ao do Obelisco de Cleopatra com amargem do Tamisa e uma pura ilusao gerada pelo fatode, para os propositas do trata diario, sua enfase ser desnecessaria. Doncie se chega ao seguinte: entre a estruturade eventos que forma 0 meio em cujo ambito transcorreo dia-a-dia dos londrinos, sabemos como identificar umacerta corrente de eventos que mantem uma permanenciade carcher, no caso 0 caniter de constituir as situac;;5esdo Obelisco de Cleopatra. Dia a dia e hora a hora podemos nos deparar com uma certa por,ao da vida transit6ria cla natureza, acerca cla qual dizemos: "Eis 0 Obelisco de Cleopatra." Se definirmos 0 obelisco de umaforma abstrata 0 suficiente, poderemos afirmar que este jamais se modifica. Contudo, urn ffsico que encareessa por~ao da vida da natureza como uma dan,a de eletrons, dini que diariamente 0 obelisco perdeu algumasmoIeculas e adquiriu outras, e ate mesmo 0 homem comum pode perceber que ele se torna mais sujo e ocasionalmente e lavado. Assim, a questao da mudan,a no obelisco e uma simples questao de defini,ao. Quanto maisabstrata nossa defini<;ao, mais permanente sera 0 obelisco. Seja ele, porem, mutave1 ou permanente, tudoo que temos em mente ao postular que esta situado em
Charing Cross, amargem do Tamisa, e que, em meioaestrutura dos eventos, conhecemos uma certa corrente de eventos, contfnua e limitada, tal que qualquer por,ao da ditacorrente, a qualquer hora, qualquer dia ouqualquer segundo, tern 0 carater de ser a situa,ao doObelisco de Cleopatra.
Chegamos, por fim, aterceira asser<;ao - "Existern linhas escuras no Espectro Solar". Essa e uma leida natureza. Mas qual seu significado? Seu significadoe apenas 0 seguinte: se algum evento tern 0 carater deser uma demonstra<;ao do espectro solar sob certas circunstancias determinadas, tambern tera 0 carater de demonstrar a existencia de linhas escuras naque1e espectro.
Essa longa discussao nos leva a conclusao final deque os fatos concretos da natureza sao eventos que revelam uma determinada estrutura em suas re1a<;6es mutuas e determinados caracteres proprios. A finalidade daciencia e expressar as re1a<;6es entre esses caracteres emtermos das rela<;6es estruturais mutuas entre os eventosassim caracterizados. As rela<;6es estruturais mutuas entre eventos sao tanto espaciais como temporais. Se asconcebermos como meramente espaciais, estaremos omitindo 0 elemento temporal, e se as concebermos comomeramente temporais, estaremos omitindo 0 e1ementoespacial. Assim, quando consideramos unicamente 0 espa<;o, ou unicamente 0 tempo, estamos lidando com abstra,oes, ou seja, estamos deixando de lado urn elementoessencial na vida da natureza tal como esta se faz conhecer a nos na experiencia de nossos sentidos. Maisainda, existem diferentes maneiras de formar essas abstra<;6es nas quais pensamos como espa<;o e tempo; sob
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determinadas circunstancias, adotamos certa maneira esob circunstancias diversas adotamos cutra maneira. Assim, DaD hi 0 menor paradoxa em afirmar que 0 que entendemos par espa,o mediante determinado conjunto decircunstancias DaD e 0 meSilla que entendemos por espa~o mediante urn conjunto de circunstancias diverso.Da mesma forma, a que entendemos pot tempo mediantedeterminado conjunto de circunstancias DaD e0 que entendemos por tempo mediante urn canjunto de circunstancias diverso. Ao afirmar que espa,o e tempo sao abstra<;5es, DaD guera dizer que DaO expressam a nos fatcsreais acerca cia natureza. Quero dizer, issa sim, que DaD
existem fatos espaciais au fatos temporais dissociados danatureza ffsica, ista e, que espa<;o e tempo sao simplesmaneiras de se expressar determinadas verdades acercadas re1a<;6es entre eventos. E tambem que, sob diferentescircunstancias, existem diferentes sistemas de verdadesacerca do universo, naturalmente apresentadas a nos como postulados acerca do espac;;o. Nesse caso, 0 que urnser submetido a urn determinado conjunto de circunstancias entende par espa,o sera diferente daquilo que entendeurn ser submetido a outro conjunto de circunstancias.Conseqiientemente, ao compararmos duas observac;;5esemitidas sob circunstancias diversas, devemos indagar:"Entenderao os dois observadores a mesma coisa por espac;;o e a mesmacoisa por tempo?" 0 surgimento da moderna teoria da relatividade deveu-se ao fato de certasperplexidades quanta aconcordancia de algumas observa,6es delicadas como a do movimento da Terra pelo eter,o perielio de Mercurio e as posic;;5es das estrelas nas vizinhanc;;as do Sol terem sido solucionadas via referencia aesse significado puramente relativo do espa,o e do tempo.
Quero chamar a atenc;;ao de voces novamente paraa Obelisco de Cleopatra, sabre a qual ainda nao esgoteiminhas considerac;;5es. Ao caminharem pela avenida quernargeia 0 Tarnisa, voces subitarnente erguem os olhose dizern: "Ei, vejam so 0 obelisco." Em outras palavras, voces 0 reconhecem. EimposSIve! reconhecer urnevento, pais quando este se foi, se foi. Voces podem observar outro evento de carMer analogo, mas a porc;;aoatual da vida da natureza e inseparavel de sua ocorrencia singular. Epossivel, no entanto, reconhecer 0 carater de urn evento. Todos sabemos que se formos ate amargem do Tfunisa nas proximidades de Charing Crossobservaremos urn evento que tern 0 carater que reconhecemos como a Obelisco de Cleopatra. Denominareiobjetos as coisas que reconhecemos dessa forma. Urn objeto esta situado naqueles eventos ou naquela correntede eventos cujo carater ele expressa. Existem muitas classes de objetos. Segundo a defini,ao acima, par exempIa, a cor verde e urn objeto. A finalidade da cienciae enunciar as leis que governam a rnanifestac;;ao dos objetos nos diferentes eventos em que se constata sua presenc;;a. Com vistas a essa finalidade, podemos nos concentrar basicamente em dois tipos de objetos, aos quaisdenominarei objetos materiais ffsicos e objetos cientificos. Urn objeto material f(sico e uma fra,ao comum demateria, a Obelisco de Cleopatra, par exemplo. Tratase de urn tipo bern mais complicado de objeto do queuma simples cor, como a cor do Obelisco. Denominarei a esses objetos simples, como as cores ou sons, objetos dos sentidos. Urn artista se treinara para atentar maisparticularmente aos objetos dos sentidos, enquanto a pessoa comum atenta normalmente aos objetos materiais.
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Portanto, se estiverem caminhando com urn artistaquando disserem "Ali esta 0 Obelisco de Cleopatra":ele talvez exclame simultaneamente "Ali esta uma belapbn;ao de COf." Ambos, no entanto, estadio expressandoseu reconhecimento de diferentes caracteres componentesdo meSilla evento. A ciencia, porem, levou-nos adescoberta de que, quando de posse de urn conhecimentointegral das aventuras entre os eventos de objetos f(sicos materiais e de objetos cientfficos, estamos de possecia maior parte das informac;;5es relevantes que nos permitirao antever as condic;;5es sob as quais deveremos perceber os objetos dos sentidos em situa,oes especfficas.Por exemplo, quando sabemos que ha urn fogo intenso(i. e., objetos materiais e cientfficos submetidos a diferentes e interessantes aventuras em meio a certos eventos) e, no lado oposto a este, urn espelho (outro objetomaterial), e as posi,oes do rosto e dos olhos de urn homem com 0 olhar fixo no espelho, sabemos que ele poded. perceber a vermelhidao da chama situada em urnevento atras do espelho - assim, em larga medida, amanifesta,ao dos objetos dos sentidos esta condicionadapelas aventuras dos objetos materiais. A analise dessasaventuras nos leva a perceber outro carater dos eventos,a saber, seus caracteres enquanto campos de atividadeque determinam os eventos subsequentes aos quais elespassarao os objetos neles situados. Esses campos de atividade sao por nos expressos em termos de fon;as e atra~6es gravitacionais, eletromagneticas ou qufmicas. Contudo, a exata expressao da natureza desses campos deatividade nos obriga, intelectualmente, a reconhecer apresen~a de urn tipo menos obvio de objetos nos eventos. Refiro-me as moleculas e eletrons, objetos que nao
sao reconhecidos isoladamente. E improvavel que deixemos de atentar para 0 Obelisco de Cleopatra se estivermos em suas imediac;6es; ninguem, contudo, ja viuuma molecula isolada ou urn eletron isolado, embora oscaracteres dos eventos somente nos sejam explicaveis seexpressos em termos desses objetos cientfficos. Sem duvida, as moleculas e os eletrons Sao abstra~6es. Nestecaso, porem, 0 mesmo se pode dizer do Obelisco de Cleopatra. Os fatos concretos sao os eventos em si - ja lhesexpliquei que seu carater de abstra,ao nao significa queuma entidade nada seja. Significa simplesmente que suaexistencia e apenas urn fator de urn elemento mais concreto da natureza. Assim, urn eletron e abstrato porquenao podemos eliminar integralmente a estrutura doseventos e, ainda assim, manter 0 eletron em existencia.Da mesma forma, 0 sorriso do gato e abstrato; e a molecula se encontra realmente no evento, no mesmo sentido em que 0 sorriso se encontra no semblante do gato.Ora, as ciencias mais fundamentais como a qufmica ea fisica nao podem expressar suas leis ffsicas em termosde objetos vagos como 0 Sol, a Terra, 0 Obelisco de Cleopatra ou urn corpo humano. Tais objetos pertencem maispropriamente aastronomia, ageologia, aengenharia,a arqueologia ou a biologia. A quimica e a fisica lidamcom eles apenas enquanto manifesta,oes de complexosestatfsticos dos efeitos de suas leis mais basicas. Em certo sentido, eles apenas se introduzem na ffsica e na qufmica enquanto aplica,oes tecnologicas. A razao para tale serem e1es por demais vagos. Onde se inicia 0 Obelisco de Cleopatra e onde termina? Sera a fuligem partedele? Sera urn objeto diferente quando dele se desprende uma molecula ou quando sua superffcie entra em uma
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combina~ao qufmica com 0 acido de urn nevoeiro londrino? 0 carater definitivo e permanente do obelisco nadarepresenta para 0 passivel carater definitivo e permanente de uma molecula, tal como concebida pela ciencia,e 0 carater definitivo e permanente de uma molecula,por sua vez, se cleve a este mesma caniter em urn eletron. Portanto, em sua formula<;ao mais fundamentalda lei, a ciencia busca objetos imbuidos da simplicidade de carater mais permanente e inequfvoca, e em termos destes expressa suas leis fundamentais.
Assim tambem, quando buscamos expressar definitivamente as relac;6es entre eventos originadas de suaestrutura espa<;o-temporal, aproximamo-nos da simplicidade reduzindo progressivamente a extensao (tantotemporal como espacial) dos eventos considerados. Porexemplo, 0 evento representado pe1a vida da por<;ao danatureza que e0 obelisco durante urn minuto tern umarela<;ao espa<;o-temporal muito complexa com a vida danatureza compreendida em uma barcac;a a passar durante 0 meSilla minuto. Suponhamos, porem, que se reduzaprogressivamente 0 tempo considerado ate urn segundo,urn centesimo de segundo, urn milesimo de segundo, eassim por diante. Ao percorrermos uma tal serie aproximamo-nos de uma simplicidade ideal de re1a<;Des estruturais entre os pares de eventos sucessivamente considerados, ideal este que classificamos como as re1ac;oesespaciais do obelisco com a barcac;a em um'determinado instante. Mesma essas relac;oes sao por demais intrincadas para nos, e passamos a considerar frac;5es progressivamente menores do obelisco e do barco. Assim,atingimos finalmente 0 ideal de urn evento de tal modolimitado em sua extensao a ponto de estar desprovido
de extensao no espac;a au no tempo. Tal evento sera urnmero ponto-flash espacial de dura<;ao instantanea. Dou aesse evento ideal a denominac;ao de "particula de evento". Nao devemos considerar 0 mundo como fundamentalmente formado por partfculas de evento. 1sso e colocara carro<;a na frente dos bois. 0 mundo que conhecemose urn £luxo continuo de ocorrencias, que podemas distinguir em eventos finitos a formar, por meio de suasmutuas sobreposic;oes, inclusoes e separac;oes, uma estrutura espa<;o-temporal. Podemos expressar as propriedades dessa estrutura em termos dos limites ideais a rotas de aproximac;ao, aos quais denominei partfculas deevento. Conseqiientemente, as partfculas de evento saoabstrac;;oes com as quais os eventos mais concretos estaorelacionados. A essa altura, porem, vocesja terao compreendido que eimpossivel analisar a natureza concretasem elaborar abstrac;5es. De mais a mais, as abstrac;5esda ciencia, repito, sao entidades efetivamente existentes na natureza, embora nao tenham nenhum significado isoladas da natureza.
o carater da estrutura espa<;o-temporal dos eventos pode ser plenamente expresso em termos das re1ac;oes entre essas partfculas de evento mais abstratas. Avantagem em se lidar com partfculas de evento e que,embora sejam abstratas e complexas com respeito aoseventos finitos diretamente observados, sao mais simples do que os eventos finitos com respeito a suas relac;oes mutuas. Nesse sentido, expressam para nos as exigencias de uma precisao ideal e de uma simplicidade idealna demonstra<;ao de rela<;Des. Essas particulas de evento constituem os elementos fundamentais do multiploquadridimensional espa<;o-tempo pressuposto pela teoria
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da relatividade. Voces terao observado que cada partfcula de evento etanto urn instante do tempo quanta urnponto do espago. Eu a chamei de ponto-flash instantaneo. Assim, na estrutura desse multiplo espac;o-tempo,o espago nao e, por lim, diferenciado do tempo e permanece aberta a possibilidade de diferentes modos dediferenciagao segundo as diferentes circunstancias dosobservadores. Eessa possibilidade que estabelece a distinc;ao fundamental entre a nova maneira de se coneeber 0 universo e a antiga. 0 segredo para 0 entendimentoda relatividade e 0 entendimento disso. E inutil acorrermos com paradoxos pitorescos do tipo "Flagrado espac;o a se curvar", se voces nao dominaram esse conceito fundamental, subjacente a toda a teoria. Quandodigo subjacente a toda a teoria, quero dizer que deveriaser subjacente a esta, embora eu possa confessar algumas duvidas sobre ate onde todas as demonstragoes dateoria de fato compreenderam suas implicac;5es e premissas.
Nossos dimensionamentos, quando expressos emtennos de uma precisao ideal, sao medic;6es que expressam propriedades do multiplo espago-tempo. Existemdiversos tipos de dimensionamentos. Podemos mensurar distancias, angulos, areas, volumes ou tempos. Existern ainda outras especies de medidas, como as dimensionamentos de intensidade de ilumina~ao,mas por oranao pretendo consideni-Ios, e sim concentrar a aten~ao
naqueles dimensionarnentos que particularmente nos interessam enquanto medigoes de espago ou de tempo. Efacil perceber que sao necessarias quatro medigoes taisde caracteres apropriados a lim de se determinar a posigao de uma partfcula de evento no multiple espago-
tempo em sua relagao com 0 restante do multiplo. Emum campo retangular, por exemplo, partimos de um canto em urn momento dado, medimos uma distancia especflica ao longo de um lado, depois nos langamos campoadentro segundo angulos retos, depois medimos uma distancia especflica paralela ao outro par de lados, depoissubimos verticalmente por uma altura determinada emarcamos 0 tempo. No ponto e no momento assim alcant;;ados estani ocorrendo urn ponto instantaneo especHico da natureza. Em outras palavras, os quatro dimensionamentos determinaram uma partfcula de evento especflica pertencente ao multiplo quadridimensionalespa~o-tempo. Tais dimensionamentos se afigurarammuito simples ao agrimensor e nao suscitam a menordiliculdade filos6lica em sua mente. Suponhamos, porem, que existarn seres suficientemente avanc;ados nocampo da inven~ao cientffica em Marte a ponto de serem capazes de observar em detalhe 0 processo dessa atividade agrimens6ria na Terra. Suponhamos que analisem as opera~6es dos agrimensores ingleses por referenciaao espa~o natural de urn marciano, ou seja, urn espat;;omarciocentrico no qual esse planeta esta assentado. ATerra se desloca relativamente a Marte e em movimentode rota~ao. Para os seres de Marte, 0 processo de agrimensao, analisado dessa forma, redunda em dimensionamentos os mais complicados possfveis. Segundo a doutrina relativista, alem disso, 0 processo de dimensionarnentotemporal na Terra nao cdrrespondera exatamente a nenhum dimensionamento temporal em Marte.
Discuti esse exemplo a lim de que percebessem que,ao considerarmos as possibilidades de dimensionamento no multiplo espago-tempo, nao devemos nos restringir
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apenas aquelas varia<;6es menores que poderiam pareeer naturais aos seres humanos sabre a Terra. Estabele<;amos, portanto, 0 postulado geral de que e passIvelidentificar quatro dimensionamentos, respectivamentede tipos independentes (como dimensionamentos de distancias em tres direc;6es e de urn tempo), e tais que determinem uma partfeula de evento especffica em suasre!a~5es com outras partes do multiplo.
Sendo (P" h, P3 e P4) urn conjunto de dimensionamentos desse sistema, diremos que a partfeula de evento assim determinada tera P" h, P3 e h como suas coordenadas nesse sistema de dimensionamento. Suponhamos que 0 chamemos de sistemaPde dimensionamento.Assim, no mesma sistema p, variando adequadamente(P" h, P3' h), e possive! indicar cada particula de evento que foi, sera, au einstantaneamente agora. AIem disso, segundo qualquer sistema de dimensionamento para nos natural, tres das coordenadas serao dimensionamentas de espac;o e uma sera urn dimensionamento detempo. Tomemos sempre a ultima coordenada como representando 0 dimensionamento temporal. Deverfamosdizer entao, naturalmente, que (P" h, P3) determinaram urn ponto no espa~o e que a particula de eventoocorreu naquele ponto em um instante P4' Mas nao devemos incorrer no equfvoco de imaginar que existe umespa~o alem do multiplo espa~o-tempo. Esse multiploe tudo de que se disp5e para a determina~ao do significado do espa~o e do tempo. 0 significado de urn pontodo espa~o deve ser determinado em termos das particulas de evento do multiplo quadridimensional. Hoi umaunica forma de se ohter isso. Observem que se variarmos 0 tempo e adotarmos tempos com as mesmas tres
coordenadas espaciais, as partfeulas de evento, assim indicadas, estarao todas no mesmo ponto. Porem a constata~ao de que nada existe alem das partfculas de evento apenas pode significar que 0 ponto (P" Pz, P3) do espac;o no sistema Pesimplesmente a reuniao de partfeulas de evento (P" h, P3 [h])/ em que he varioivel e (P"Pz, h) se mantem fixos. E urn tanto desconcertanteconstatar que um ponto no espac;o nao e uma simplesentidade; mas e uma conclusao que decorre imediatamente da teoria re!ativista do espa~o.
o habitante de Marte, por sua vez, determina suaspartfeulas de evento atraves de algum outro sistema dedimensionamento, ao qual denominaremos sistema q.Para esse marciano, (q" q2' q3 e q4) determinam umaparticula de evento, onde (q" q2' q3) determinam urnponto e q4 urn tempo. Mas 0 agrupamento de particulasde evento que e!e considera urn ponto difere totalmentede qualquer agrupamento congenere que 0 homem terrestre considere urn ponto. Portanto, 0 espa~o q parao homem de Marte e muito diferente do espa~o P paraa agrimensor terrestre.
Ate este ponto de nossa discussao acerca do espa~o
estivemos falando sobre 0 espa~o atemporal da cienciafisica, au seja, de nosso conceito do espac;o eterno noqual se aventura 0 mundo. Mas 0 espa~o que percebemos ao olhar anossa volta eurn espac;o instantaneo. Assim, se nossas percep~6es naturais forem ajustaveis aosistema P de dimensionamentos, perceberemos instantaneamente todas as partfeulas de evento em algum momento definido P4 e observaremos uma sucessao de taisespa~os amedida que 0 tempo avan~a. 0 espa~o atemporal e a1can~ado pe!o encadeamento de todos esses espa-
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<;os instantaneos. AS pontos de urn espa<;o instantaneosao particulas de evento e os pontos de urn espa<;o eterno sao encadeamentos de particulas de evento a ocorrerem Slicessao. 0 hornem de Marte, porem, jamais percebera os mesmos espa90s instantaneos que 0 hornemcia Terra. Esse sistema de espa90s instantaneos atravessara 0 sistema do hornem terrestre. Para 0 hornem terrestre, existe urn espac;;o instantaneo que e 0 presenteinstantaneo, e existem espac;os passados e espac;os futuros. Mas 0 espa<;o presente do homem de Marte atravessa 0 espa<;o presente do homem da Terra. Assim, dentreas partfculas de evento que, para 0 hornem terrestre, ternsua ocorrencia agora no presente, algumas, para 0 hornem de Marte, ja sao passado e pertencem aancestralidade, outras estao no futuro e outras, no presente imediato. Essa ruptura no claro conceito de urn passado,urn presente e urn futuro e urn importante paradoxo.A duas particulas de evento que, em urn sistema de dimensionamento qualquer, se encontrem num mesmo espac;o instantaneo, denomino particulas de evento "copresentes". Entao, e possivel que A e B sejam co-presentes e que A e C sejam co-presentes, mas que Beenao sejam co-presentes. Por exemplo, a alguma inconcebi'vel distancia de nos existem eventos co-presentes conosco neste momenta e tambem co-presentes com 0 nascimento da rainha Vitoria. Sendo A e B co-presentes,hayed. alguns sistemas em que A precede B e outros emque B precede A. Ademais, e impossive! a existencia deuma velocidade intensa 0 suficiente para transportar umapartfcula de materia de A para B ou de B para A. Essesdiferentes sistemas de dimensionamento com suas divergencias de computo temporal sao intrigantes e, em certa
medida, representam uma afronta a nosso senso comum.Nao e a maneira usual pe!a qual ponderamos acerca doUniverso. Pensamos em urn sistema temporal necessario e urn espac;o necessario. Segundo a nova teoria, existeurn numero indefinido de series temporais discordantese urn numero indefinido de espa<;os distintos. Qualquerpar correlato, sistema temporal e sistema espacial, conseguira encaixar nossa descric;ao do Universo. Constatamos que, sob determinadas condic;oes dadas, nossosdimensionamentos obedecem necessariamente a urn parqualquer que compoe nosso sistema natural de dimensionamento. A dificuldade no tocante aos sistemas temporais discordantes e parcialmente solucionada atravesda distin<;ao entre 0 que denomino 0 avan<;o criativo danatureza, que nao e propriamente serial em absoluto,e qualquer serie temporal. Costumeiramente embaralham esse avanc;o criativo, 0 qual experimentamos e conhecemos como a perpetua transic;ao da natureza rumoao novo, com a serie unitemporal que naturalm.ente empregamos para fins de mensurac;ao. As diferentes seriestemporais dimensionam, cada qual, algum aspecto doavanc;o criativo, enquanto 0 conjunto das mesmas expressa todas as propriedades mensuraveis desse avan<;0. A razao pe!a qual deixamos de apontar anteriormenteessa diferen<;a de series temporais e a diferen<;a minimade propriedades existente entre quaisquer duas dessasseries. Quaisquer fenomenos observaveis devidos a essa causa dependem do quadrado da razao entre qualquer ve!ocidade que se passe a observar e a ve!ocidadeda luz. Ora, a luz leva cerca de cinqiienta minutos parapercorrer a orbita terrestre; e a Terra leva algo alem de17.531 meias-horas para fazer 0 mesmo. Como conse-
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qiH~ncia, todos as efeitos decorrentes desse movimentosao da ordem da razao de 1 para 0 quadrado de to.OOO.Dessa forma, urn homem cia Terra e urn homem do Solterao apenas negligenciado efeitos cujas magnitudes quantitativas contem, sem exce(ao, 0 fator 1/10B Tais efeitos, evidentemente, apenas podem ser percebidos porintermedio das mais sofisticadas observa(oes. No entanto, foram observados. Suponha-se que comparemos duasobserva(oes da velocidade da luz empreendidas com umunieD aparato ao deslocarmos 0 mesma segundo urn angulo reto. A velocidade da Terra relativamente ao Solse encontra em uma determinada direc;ao e a ve1ocidade da luz relativamente ao eter deve ser a mesma emtodas as dire(oes. Portanto, se 0 espa(o tem 0 mesmosignificado quando admitimos 0 6ter em repouso e quando admitimos a Terra em repouso, deverfamos constatar que a velocidade da luz relativamente aTerra variade acordo com a dire(ao da qual a luz provem.
Essas observac;6es acerca cia Terra constituem 0
princfpio fundamental das celebres experiencias destinadas a detectar 0 movimento do planeta pelo eter. Todos voces sabem que, para nossa grande surpresa, seuresultado foi nulo. 0 que e completamente explicado pelofato de que 0 sistema espacial e 0 sistema temporal pornos adotados sao, sob certos aspectos minimos, diferentes do espa(o e do tempo relativamente ao Sol ou relativamente a qualquer Dutro carpo com referencia ao quala Terra esteja se deslocando.
Toda essa discussao quanto a natureza do tempoe do espa(o ergueu em nosso horizonte uma grande dificuldade que afeta a formula(ao de todas as leis fundamentais da ffsica - por exemplo, as leis do campo ele-
tromagnetico e a lei cia gravitac;ao. Tomemos comoexemplo a lei da gravita(ao. Sua formula(ao e a seguinte:dais carpas materiais atraem-se mutuamente com umaforl;a proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado de suas distancias.Presume-se, nesse enunciado, que os corpos sejam suficientemente pequenos para serem tratados como partfculas materiais em relal;ao a suas distancias, de modoque podemos deixar de nos preocupar com esse pontode somenos importancia. A dificuldade para a qual querochamar a atenl;ao de voces e a seguinte: na formulal;3.0da lei, sao presumidos um tempo definido e um espa(odefinido. Parte-se do pressuposto de que as duas massas ocupam posil;oes simultaneas.
Contudo, 0 que e simultaneo em urn sistema temporal pode nao se-Io em outro. Assim, segundo nossasnovas concepl;oes, nesse aspecto a lei nao esta formulada de modo a conter algum significado exato. Alem disso,uma dificuldade anMoga se apresenta quanto aquestaoda distancia. A distancia entre duas posil;oes instantaneas, i. e. entre duas partfculas de evento, e diferente emsistemas espaciais diferentes. Qual espa(o deve ser escolhido? Se aceita a relatividade, portanto, a lei aindase ressente da ausencia de uma fonnulal;ao precisa. Nossoproblema consiste em buscar uma nova interpretal;aoda lei da gravidade em que tais dificuldades sejam contomadas. Em primeiro lugar, devemos evitar as abstra(oes de espa(o e tempo na formula(ao de nossas ideiasfundamentais e recorrer aos fatos basicos da natureza,ou seja, os eventos. Assim tambem, a fim de encontrara simplicidade ideal na expressao das rela(Oes entre eventos, devemos nos restringir a partfculas de evento. Desse
212 o CONCE/TO DE NATUREZA RESUMO 213
modo, a vida de uma partlcula material esua aventuraem meio a uma trilha de partfculas de evento encadeadas como uma serie au caminho contfnuo no multiploquadridimensional espa~o-tempo. Essas partfculas deevento sao as diferentes situa~6es da partfcula material.Normalmente expressamos esse fata atraves cia adoc;aode nosso sistema espa~o-temporalnatural e falando dopercurso da partfcula material no espa~o tal como esteexiste em sucessivos instantes do tempo.
Devemos nos perguntar quais sao as leis cia natureza que levam a partfcula material a adotar exatamenteesse caminho e naD outro entre as particulas de eventos.Pensemos no caminho como urn todo. Que caracterfsticado caminho DaD seria compartilhada por nenhum Dutro
caminho ligeiramente diverso? Nossa pergunta pede algomais que uma lei da gravidade. Queremos leis do movimento e uma ideia geral do modo como formular osefeitos das forps ffsicas.
Para responder a nossa pergunta, coloquemos aideia da atra~ao das massas em segundo plano e concentremos a atenc;ao no campo de atividade dos eventosnas imediac;oes do caminho. Assim procedendo, estamosagindo em conformidade com a tendencia geral do pensamento cientffico nos ultimos cern anos, que vern concentrando cada vez mais a aten~ao no campo de for~a
enquanto agente imediato cia direc;ao do movimento, emdetrimento da considera~ao da influencia mutua imediata entre dois corpos distantes. Precisamos encontraro meio de expressar 0 campo de atividade dos eventossituados nas imedia~6esde alguma partfcula de eventoE especffica no multiplo quadridimensional. Introduzirei agora uma ideia fisica fundamental, que chamo de
"fmpeto", a fim de expressar esse campo fisico. A partfcula de evento E est"- relacionada a qualquer partfculade evento P de sua vizinhan~apor urn elemento de fmpeto. 0 conjunto de todos os elementos de fmpeto querelacionam E ao conjunto das partfculas de evento nasimedia~6es de E expressa 0 carater do campo de atividade na vizinhan~a de E. 0 ponto em que divirjo deEinstein e que ele concebe essa quantidade a que denomino fmpeto como expressando simplesmente os caracteres espa~o-temporais a serem adotados e, assim, termina falando do campo gravitacional a manifestar umacurvatura no multiplo espa~o-tempo.Nao consigo perceber uma concep~ao clara em sua interpreta~aodo cspa~o e do tempo. Minhas formulas diferem ligeiramente das suas, embora concordem naqueles aspectos emque os resultados de Einstein tern sido comprovados.Nem e preciso dizer que, no tocante a formula~ao dalei da gravita~ao, inspirei-me no metodo geral de procedimento que constitui sua grande descoberta.
Einstein mostrou como expressar os caracteres doconjunto de elementos de fmpeto do campo circunjacentea uma partfcula de evento E em termos de dez quantidades, as quais chamarei Fll, F12 (~F21), F22, F23 (F32),etc. Poderemos observar que existem quatro dimensionamentos espa~o-temporaisa relacionar E com seu vizinhoP, e que existem dez pares de tais dimensionamentos,se nos for permitido tomar cada dimensionamento individual duas vezes para formar tal par. Os dez Fs dependem simplesmente da posi~ao de E no multiplo quadridimensional, e 0 elemento do fmpeto entre E e P pode ser expresso em termos dos dez Fs e dos dez paresdos quatro dimensionamentos espa~o-temporaisque relacionam E e P. Os valores numericos dos Fs depende-
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rao do sistema de dimensionamento adotado, parem detal modo estao ajustados a cada sistema particular queo mesmo valor e obtido para 0 elemento de fmpeto entre E e P, seja qual for 0 sistema de dimensionamentoadotado. Tal fato e expresso pelo enunciado de que osdez Fs formam urn "tensor". Nao sera exagerado dizerque, quando divulgada pela primeira vez a comprovagao dos progn6sticos de Einstein, 0 anuncio de que nofuturo os ffsicos teriam de estudar a teoria dos tensorescriou urn verdadeiro panico entre des.
Os dez Fs em qualquer partfcula de evento E podem ser expressos em termos de duas fungoes as quaisdenomino 0 potencial e 0 "potencial associado" em E.o potencial e praticamente aquilo que se entende pelagravita~ao potencial COillum, quando nos expressamosem termos do espago euclidiano em referencia ao quala massa que exerce a atra-;ao se encontra em repOllSO.o potencial associado e definido pela modificagao resultante da substituigao da distancia inversa pela distanciadireta na definigao de potencial, e pode-se facilmente fazer depender seu caIculo daquele do potencial tradicional.Assim, 0 caIculo dos Fs - os coeficientes de fmpeto, como as chamarei - nao envolve nada de muito revolucianario no conhecimento matematico dos fisicos. Voltamos agora ao caminho da partfcula atrafda. Se somarmas todos as elementos de fmpeto no caminho como urntoda, obteremos, como resultado, aquila que denomino "irnpeto integral". A caracterfstica do caminho efetivo quando comparado a caminhos altemativos das imedia~5es e que nos, caminhos efetivos nao haveria nemganho nem perda em termos do fmpeto integral, casoa partfcula se desviasse, oscilante, por urn caminho al-
ternativo pequeno e extremamente proximo. Os matematicos expressariam isso dizendo que ° fmpeto integrale estacionario para urn deslocamento infinitesimal. Nesseenunciado da lei do movimento, negligenciei a existencia de outras forgas. Mas isso me afastaria demasiado dotema em questao.
Para permitir a presenga do campo gravitacional, ateoria eletromagnetica deve sermodificada. Assim, as investiga~5es de Einstein conduziram aprimeira descobertade qualquer re1agao entre a gravidade e outros fenomenosffsicos. Da forma como apresentei essamodifica<;ao, deduzimos 0 principio fundamental de Einstein, quanta ao movimento da luz por seus raios, como uma primeira aproxima<;ao, absolutamente verdadeira para ondas infinitamente breves. 0 princfpio de Einstein, parcialmente comprovado, assim, e enunciado em minha linguagem, e0
de que urn raio de luz segue sempre urn caminho tal queo fmpeto ao longo do mesmo e zero. 0 que implica quetodo e1emento de fmpeto ao longo do mesmo e zero.
Para concluir, devo apresentar minhas desculpas. Emprimeiro lugar, empalideci consideravelmente as diversase interessantes peculiaridades da teoria original e a reduzino sentido de maior conformidade com a ffsica tradicional.Nao aceito que os fenomenos ffsicos se devam a eventuaiscaprichos do espago. Alem disso, contribuf para a aridezda conferencia, movido por meu respeito pela assistencia.Talvez tivessem apreciado uma conferencia mais popular,com alguns exemplos de deliciosos paradoxos. Sei tambern, contudo, que os senhores sao estudantes conscienciosos, que aqui vieram porque realmente querem saber como as novas teorias poderao vir a afetar suas pesquisascientfficas.
CAPITULO IX
OS CONCElTOS FISICOSFUNDAMENTAlS
a segundo capitulo do presente livro estabelece 0
prindpia fundamental a seT observado na estrutura~ao
de nossos conceitos ffsicos. Devemos evitar a nociva bifurcac;ao. A natureza nada mais e do que a reveIac;aocia apreensao sensfvel. Nao contamos com princfpio 31gum que nos indique 0 que poderia estimular a menteno sentido cia apreensao sensfveI. Nossa unica tarefa eexpor, atraves de urn sistema deterrninado, os caracteres e inter-rela~6es de tudo quanta eobservado. No tocante a formulac;ao de conceitos ffsicos, nossa atitudefrente a natureza e puramente "comportamental".
Nossa conhecimento cia natureza euma experiencia de atividade (ou passagem). As coisas previamenteobservadas sao entidades ativas, ou "eventos". Sao por~6es da vida da natureza. Tais eventos guardam entresi rela<;5es que, para 0 nosso entendimento, se distinguem em rela~6es espaciais e rela~6es temporais. Contuda, essa distinc;ao entre espac;o e tempo, embora inerente anatureza, ecomparativamente superficial; espac;:o
J
218 o CONCEITO DE NA TUREZA OS CONCEITOS FislCOS FUNDAMENTAlS 219
e tempo sao, cada qual, express6es parciais de uma mesrna rela-;ao fundamental entre eventos, que DaD e nemespacial nem temporal. A essa relal;ao denomino "extensao". A rela~ao de "estender-se por sobre" ea relac;;ao de "inc1usao", em urn sentido espacial, temporalou em ambos. A simples "inclusao", todavia, e maisfundamental que qualquer das alternativas e nao requernenhuma diferencia~aoespa~o-temporal.Com respeitoa extensao, dais eventos estao mutuamente reIacionados de tal sorte que (i) urn inclui 0 outro ou (ii) urnsobrep5e-se ao outro sem uma inclusao completa ou (iii)ambos estao completamente separados. Epreciso grande cautela, parem, na definic;;ao de elementos espaciaise temporais com base na extensao, a fim de se evitaralgumas limita~5esd.citas, na verdade dependentes derela~5es e propriedades indefinidas.
Tais falacias podem ser evitadas atentando-se paradais elementos de nossa experiencia, a saber, (i) nosso"presente" observacional e (ii) nosso "evento percipiente" .
Nossa "presente" observacional e 0 que denomino uma "durac;;ao". E 0 todo da natureza apreendidoem nossa observac;ao imediata. Tern, portanto, a natureza de urn evento, mas possui uma inteireza peculiarque distingue tais dura~5es enquanto urn tipo especialde eventos, inerentes a natureza. Vma durac;ao nao einstantanea. Ela e tudo quanto existe da natureza comcertas lirnitac;6es temporais. Contrariarnente a outroseventos, uma durac;ao sera chamada infinita, enquantoos demais eventos sao finitos1. Em nosso conhecimento
1. Cf. nota acerca de "significado", pp. 232-3.
de uma dura~ao podemos distinguir (i) determinadoseventos nela inclufdos, particularmente discriminadosquanta a suas individualidades peculiares e (ii) os eventos remanescentes inclufdos, que apenas sao conhecidoscomo necessariamente existentes em virtude de suas relac;6es com os eventos discriminados e com a durac;aocomo urn todo. A dura~ao como urn todo esigoificada2
por aquela qualidade relacional (com respeito it extensao) de que edotada a parte imediatamente sob observaC;ao; em outras palavras, pelo fato de que existe essencialmente urn alem para tudo quanta e observado.Quero dizer com isso que todo evento e conhecido enquanta relacionado a outros eventos nao inclufdos nomesmo. Esse fato, de que cada evento ereconhecido como dotado da qualidade da exc1usao, mostra ser a exclusao uma qualidade tao positiva quanta a inclusao. Naoexistem, e claro, relac;6es apenas negativas na naturezae a exclusao nao e a simples negativa da inclusao, embora as duas rela~5es sejam opostas. Ambas dizem respeito unicamente a eventos, e a exclusao e passfvel dedefini~ao 16gica em termos da inclusao.
Possivelmente a manifesta~ao mais 6bvia de sigoificado resida em nosso conhecimento do carater geometrico dos eventos compreendidos em urn objeto material opaco. Sabemos, por exemplo, que uma esfera opacapossui urn centro. Tal conhecimento nada tern a ver como material; a esfera pode ser uma s6lida e uniforme bola de bilhar ou uma bola de tenis oca. Tal conhecimento eessencialmente produto do significado, uma vez que
2. Cf. cap. III, pp. 6455.
220 o CONCEITO DE NA TUREZA OS CONCEITOS FislCOS FUNDAMENTAlS 221
o carater geral dos eventos externos discriminados nosinformou cia existencia de eventos no ambito cia esferae tambem cia estrutura geometrica desses eventos.
Algumas criticas a "The Principles of NaturalKnowledge" indicam a dificuldade encontrada em seapreender as durac;6es enquanto estratifica<;6es reais cianatureza. Penso que tal hesita~ao tern origem na influencia inconsciente do noeivo prinefpia cia bifurcac;ao, taoprofundamente arraigado no pensamento filos6fico moderno. Observamos a natureza como estendida em urnpresente imediato que e simultaneo porem DaO instantaneo e, por conseguinte, 0 todD imediatamente discernido ou significado como urn sistema inter-relacionadoforma uma estratifica~aoda natureza que e urn fato fisico. Essa euma conc1usao imediata, salvo se admitirmos a bifurcac;ao na forma do princfpia dos acrescimospsiquicos, aqui rejeitado.
Nossa "evento percipiente" eaque1e evento inc1ufdo em nosso presente observacional que distinguimoscomo sendo, de algum modo peculiar, 0 nosso ponto devista para a percep~ao. Trata-se, falando grosso modo, daquele evento que e nossa vida corporal no ambito da dura~ao presente. A teoria da percep~ao, tal como desenvolvida pela psicologia medica, baseia-se no significado. A situa,ao distante de urn objeto percebido apenasnos e conhecida enquanto significada por nosso estadocorporal, i.e., por nosso evento percipiente. Na verdade, a percep~ao exige a apreensao sensivel dos significados de nosso evento percipiente, juntamente com aapreensao sensivel de uma rela~ao peculiar (de situa~ao)
entre determinados objetos e os eventos assim significados. Nosso evento percipiente e preservado por ser a na-
tureza como urn todo segundo esse fato de seus significados. Tal e 0 sentido de chamar ao evento percipienteo nosso ponto de vista para a percep~ao. A trajet6ria deurn raio de luz esta ligada apenas derivativamente apercep~ao. 0 que efetivamente percebemos sao objetos enquanto relacionados a eventos significados pelos estadoscorporais estimulados pelo raio. Esses eventos significados (como no caso das imagens vistas atras de urn espelho) podem ter pouca rela,ao com a trajet6ria efetivado raio. No curso da evolu~ao sobreviveram aqueles animais cuja apreensao senslvel esta concentrada naquelessignificados de seus estados corporais relevantes, em media, ao seu bem-estar. 0 mundo dos eventos e significado em sua totalidade, mas alguns destes impoem a pena de morte por desaten~ao.
o evento percipiente esta sempre aqui e agora nadura~aopresente associada. Possui 0 que se pode denominar uma posi~ao absoluta naquela dura~ao. Assim,uma dura~aodefinida esta associada a um evento percipiente definido e, com isso, podemos nos aperceber deuma rela~ao peculiar que os eventos finitos podem guardar com as dura~oes. Dou a essa rela~ao 0 nome de "cogrediencia". A no~ao de repouso e derivativa daquelade cogrediencia e a no~ao de movimento e derivativa daquela de inclusao em uma dura~aodesprovida de cogrediencia com tal evento. Na verdade, 0 movimento e umarela~ao (de cad.ter variavel) entre urn evento observadoe uma dura~ao observada, enquanto a cogrediencia e 0
carater ou subespecie mais elementar de movimento. Resumindo, essencialmente envolvidos no carMer geral decada observa~ao da natureza ha uma dura~aoe urn eventopercipiente, sendo este cogrediente com a dura~ao.
222 o CONCEITO DE NA TUREZA OS CONCEITOS FislCOS FUNDAMENTAlS 223
Nossa conhecimento dos caracteres peculiares de diferentes eventos depende de nosso poder de compara~ao.
DOll ao exercfcio desse fator de nosso conhecimento 0 nome de "reconhecimento", enquanto a indispensavelapreensao senslve1 dos caracteres comparaveis denomino "reconhecimento senslve1". Reconhecimento e abstra(:ao envolvem essencialmente urn ao outro. Cada urncieles demonstra, para 0 conhecimento, uma entidade queesta aquem do fata concreto, mas que eurn fator real naque1e fato. 0 fato mais concreto passive! de uma discrimina~ao isolada e a evento. Nao pode haver abstra~ao
sem reconhecimento e nao pode haver reconhecimentosem abstra~ao. Percep~ao envolve apreensao do eventoe reconhecimento dos fatores de seu carater.
As coisas reconhecidas sao 0 que denomino "objetos". Nessa acep,;;ao geral do termo, a rela~ao de extensao e, em si mesma, urn objeto. Na pratica, todavia, restrinjo 0 termo aque1es objetos capazes de serem considerados, em urn certo sentido determinado, dotados deuma situa~ao no evento; ou seja, na frase "Ei-Io ai novamente", restrinjo 0 "ai" afun~ao de indicador de umevento especial, a situa~ao do objeto. Ainda assim, existern diferentes tipos de objetos, e as postulados que seaplicam a determinado tipo de objeto em geral nao seaplicam a objetos de tipos diferentes. Os objetos que nosdizem respeito aqui para a formula~ao das leis ffsicassao objetos materiais, como fra~oes de materia, moleculas e eletrons. As re1a~6es entre urn objeto de urn dessestipos com os eventos diferem daque1as pertencentes acorrente de suas situa~6es. 0 fato de suas situa~6es noambito dessa corrente imprimiu em todos os demaiseventos determinadas modifica~oesem seus caracteres.
Na verdade, a objeto em sua totalidade pode ser concebido como urn conjunto especffico de modifica~oescorre1atas nos caracteres de todos os eventos, com a propriedade de que essas modifica~oes redundam em umadeterminada propriedade focal naque1es eventos pertencentes acorrente de suas situa~oes. A soma total das modifica~6es nos caracteres de eventos, determinadas pelapresen~a de urn objeto em uma corrente de situa~5es,
eo que denomino "campo fisico" decorrente do objeto. Na verdade, porem, nao se pode separar a objetode seu campo. 0 objeto nada mais e, em realidade, doque 0 conjunto sistematicamente ajustado de modifica~6es no campo. A limita~ao convencional do objeto itcorrente focal de eventos em que dizemos que e1e esta"situado" e conveniente a algumas finalidades, mas obscurece a fato fundamental da natureza. Desse ponto devista, a antitese entre a~ao a distan~ia e a~ao por trans
.missao e desprovida de sentido. A doutrina desse paragrafo nada mais e do que uma outra maneira de expressar a indissoluve1 rela~ao mUitipla entre objeto e eventos.
Qualquer familia de dura~6es paralelas determinaa forma~ao de urn sistema temporal completo. Duas dura~6es sao parale!as se (i) uma inclui a outra, se (ii) elasse sobrep5em de modo a inc1uir uma terceira dura~ao
comum a ambas, au (iii) sao completamente isoladas.o caso exc1uido e a de duas dura~6es que se sobrep6emde modo a inc1uirem mutuamente urn agregado de eventos finitos, sem inc1uir mutuamente, todavia, nenhumaoutra dura~ao completa. 0 reconhecimento do fato deurn numero indefinido de dura~6es paralelas e a que diferencia 0 conceito de natureza aqui apresentado do conceito ortodoxo, mais antigo, dos sistemas temporais es-
224 o CONCEITO DE NA TUREZA OS CONCEITOS FislCOS FUNDAMENTAlS 225
sencialmente unlCOS. Sua divergencia com relac;;ao aoconceito de natureza defendido por Einstein sera indicada em linhas gerais mais adiante.
Os espac;;os instantaneos de urn sistema temporaldado sao as dura~6es ideais (inexistentes) de densidadetemporal zero indicadas pelas retas de aproximac;;ao aolongo das series formadas por dura~6esda familia associada. Cada espa~o instantaneo desses representa 0 idealcia natureza em urn instante e etambem urn momentodo tempo. Cada sistema temporal conta, assim, com urnagregado de mementos pertencentes unicamente a ele.Cada partfcula de evento esta situada em urn, em apenas urn momenta de urn sistema temporal dado. Sao tresos caracteres de uma partfcula de event03 : (i) seu cad.ter extrfnseco, que eseu carcher enquanto rota definidade convergencia entre eventos, (ii) seu carater intrfnseco, que ea qualidade peculiar cia natureza em sua circunvizinhanc;;a, au seja, 0 caniter do campo ffsico de suacircunvizinhan~a, e (iii) sua posi~ao.
A posi~ao de uma particula de evento origina-se doagregado de momentos (sem que haja dois de mesmafamilia) em que a mesma esta compreendida. Concentramos nossa aten~ao em urn desses momentos, do qualnos aproximamos atraves da breve dura~ao de nossa experiencia imediata, e expressamos a posi~ao como a posi~ao nesse momento. Mas a partfcula de evento recebesua posi~ao no momenta M em virtude do agregado total de outros momentos M', M", etc., nos quais tambern esta situada. A decomposi~ao de M em uma geo-
3. Cf. pp. 100 ss.
metria de partfculas de evento (pontos instantaneos) expressa a diferencia~ao de M atraves de suas intersec~6es
com m?mentos de sistemas temporais que Ihe sao estranhos. E dessa forma que pianos, retas e as proprias partfculas de evento ganham existencia. Tambem 0 paralelismo entre pianos e retas origina-se do paralelismo entre os momentos de urn tinico sistema temporal que cruzaM. Do mesmo modo, a ordem dos planas paralelos edas partfculas de evento em linhas retas origina-se daordem temporal desses momentos que se interseccionam.A explica~ao nao sera fornecida aqui4 . Por ora, bastasimplesmente mencionar as fontes das quais toda a geometria obtem sua explica~ao ffsica.
A correla~ao entre os varios espa~osmomentaneosde urn mesmo sistema temporal e efetuada atraves darela~ao de cogrediencia. Evidentemente, 0 movimentoem urn espa~o instantaneo e algo sem sentido. 0 movimento expressa uma compara~aoentre a posi~ao em urnespa~o instantaneo e as posi~oes em espa~os instantaneos diversos do mesmo sistema temporal. A cogrediencia revela 0 mais simples produto de tal compara~ao,
a saber, 0 repouso.Movimento e repouso sao fatos imediatamente ob
servaveis. Sao relativos no sentido de que dependem dosistema temporal que esta na base da observa~ao.Vmacadeia de partfculas de evento cuja ocupa~ao sucessivasignifica repouso em urn sistema temporal dado formaurn ponto atemporal no espa~o atemporal daquele sistema temporal. Dessa forma, cada sistema temporal pos-
4. Cf. Principles oj Natural Knowledge e capftulos anteriores do presentetrabalho.
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sui seu proprio espac;o atemporal permanente, peculiarexclusivamente a si proprio, e cada urn desses espac;ose composto por pontos atemporais pertencentes aquelesistema temporal e a nenhum outro. Os paradoxos darolatividade surgem da negligencia ao fato de que diferentes pressupostos no tocante ao repouso envolvem aexpressao dos fatDs cia ciencia ffsica em termos de espac;os e tempos radicalmente diferentes, em que pontos emomentos possuem diferentes significados.
A fonte da ordem ja foi indicada e chegamos agoraaquola da congruencia. Esta depende do movimento. Dacogrediencia advem a perpendicularidade; e da perpendicularidade, conjuntamente com a simetria recfprocaentre as relac;6es de dais sistemas temporais quaisquer,define-se completamente a congruencia tanto no tempoquanta no espa<;o (cf. IDe. cit. ).
As formulas resultantes sao aquolas da leoria oletromagnetica cia re1atividade au, conforme sua designac;aoatual, cia teoria restrita. Mas existe a seguinte diferenc;acrucial: a ve10cidade crftica c que figura nessas formulasnao tern agora a menor liga~ao com a luz ou qualqueroutro fato do campo ffsico (contrariamente aestruturaextensional dos eventos). Ela simplesmente assinala 0
fato de que nossa determina~ao de congruencia abarcatanto tempos como espa~os em urn tinico sistema universal e, por conseguinte, se duas unidades arbitrariassao escolhidas, uma para todos os espa~os e outra paratodos os tempos, a razao entre ambas sera uma velocidade, e esta, por sua vez, uma propriedade fundamental da natureza a expressar 0 fato de que tempos e espa~os sao realmente comparaveis.
As propriedades fisicas da natureza sao expressasem termos de objetos materiais (e1etrons, etc.). 0 carater
ffsico de urn evento tern origem no fato de 0 mesmo pertencer ao campo do complexo global de tais objetos. Soburn ponto de vista diferente, podemos dizer que essesobjetos nada mais sao que nosso modo de expressar acorrela~ao mutua dos caracteres fisicos dos eventos.
A mensurabilidade espa<;o-temporal da natureza decorre (i) da rela<;ao de extensao entre os eventos e (ii)do carater estratificado da natureza resultante de cadaurn dos sistemas temporais a1ternativos e (iii) do repouso e movimento, tal como revelados nas rela~6es entreeventos finitos e sistemas temporais. Nenhuma dessasfontes de medi~ao depende dos caracteres ffsicos doseventos finitos tal como manifestados polos objetos situados. Elas sao completamente significadas para eventos cujos caracteres fisicos sao desconhecidos. Assim, osdimensionamentos espa~o-temporais independem dos caracteres fisicos objetivos. Alem disso, 0 carater de nosso conhecimento de uma durac;ao completa, essencialmente derivado do significado da parte contida no campoimediato de nossa discrimina<;ao, olabora tal dura<;ao para nos como urn todo uniforrne e independente, no quese refere asua extensao, dos caracteres nao observadosde eventos remotos. Em outras palavras, existe urn todo definido da natureza, simultaneamente presente nestemomento, seja qual for 0 carater de seus eventos remotos. Tal considera~aofortalece a conc1usao anterior. Essaconclusao conduz aasser~ao da uniformidade essencialdos espa~os momentaneos dos diversos sistemas temporais e, dai, auniformidade dos espa~os atemporais, dosquais existe urn para cada sistema temporal.
A analise aqui proposta do carater geral da natureza observada se presta a explica~oes de diversos fatos
228 o CONCElTO DE NA TUREZA OS CONCElTOS FislCOS FUNDAMENTAlS 229
fundamentais ligados a observa~ao: ("') Ela explica a diferencia~ao cia qualidade unica cia extensao em tempoe espa~o. ({3) Confere urn significado aos fatos observados da posi~ao geometrica e temporal, da ordem geometrica e temporal e aqueles dotados das propriedadesgeometricas da reta e do plano. (1') Elege urn sistemade congruencia definido que abrange tanto 0 tempo como 0 espa~o e explica, assim, a concordancia quanta aosdimensionamentos obtidos na pnitica. (0) Explica (coerentemente Com a teoria da relatividade) os fenomenosobservados de rata~ao, e.g. 0 pendulo de Foucault, 0
abaulamento equatorial da Terra, os sentidos fixos derota~ao de ciclones e anticiclones e a bussola giroscopica. ISBa se terna passive! por sua admissao de estratifica~5es definidas cia natureza, reveladas pelo proprio carater do conhecimento que temos dela. (E) Suas explica'.;oes do movimento sao mais fundamentais que aquelas expressas em (0), pois explica 0 que se entende pelomovimento em si. 0 movimento observado de urn objeto estendido e a rela~ao de suas diferentes situa~6es
com a estratifica~ao cia natureza expressa pelo sistematemporal que esta na base da observa~ao. 0 movimento expressa uma rela~ao real entre 0 objeto e 0 restantecia natureza. A expressao quantitativa dessa relar;ao iravariar segundo 0 sistema temporal escolhido para suaexpressao.
Essa teoria naD atribui a luz nenhum canlter peculiar alem daquele atribuido a outros fenomenos fisicoscomo 0 som. Nao ha fundamento algum para tal diferencia~ao. Alguns objetos nos sao conhecidos apenas pelavisao, outros apenas pelo som, enquanto outros nao saoobservados por nos quer pela luz ou pelo som, mas pelo
toque, 0 olfato ou outras vias. A velocidade da luz variasegundo 0 meio em que se propaga e 0 mesmo se da como som. Sob determinadas condi~oes, a luz se desloca emtrajet6rias curvas, eo mesmo se verifica com 0 som. Tanto a luz quanta 0 som constituem ondas de perturba~ao
nos caracteres ffsicos dos eventos; e (conforme enunciado acima, p. 221) a trajetoria efetiva da luz em nadae mais importante para a percep~ao do que a trajetoriaefetiva do som. Basear toda a filosofia da natureza naluz e urn pressuposto infundado. A experiencia de Michelson-Morley e outras do genera demonstram que,dentro dos limites da imprecisao observacional, a velocidade da luz e uma apraxima~aoa velocidade critica"c", que expressa a rela~ao entre nossas unidades detempo e espa~o. Epossive! provar que 0 pressuposto referente aluz, atraves do qual se explicam tais experiencias e a influencia do campo gravitacional nos raios luminosos, ededuzivel, enquanto aprOXimafO,o, das equa~oes
do campo eletramagnetico. 1sso elimina por completoqualquer necessidade de se diferenciar a luz de outrosfenomenos fisicos enquanto dotada de qualquer caraterfundamental.
Cabe observar que 0 dimensionamento da natureza estendida por intermedio de objetos estendidos e desprovida de significado, aparte algum fato observado desimultaneidade inerente a natureza e nao urn simplesexercicio do intelecto. Do contrario, nao ha significadoalgum no conceito de uma apresentac;ao unica de nossaregua de medi~ao estendida AB. Por que nao AB', onde B' e a extremidade B cinco minutos mais tarde? Para ser viavel, 0 dimensionamento pressupoe a naturezacomo uma simultaneidade e urn objeto presente entao e
230 o CONCElTO DE NA TUREZA OS CONCElTOS FislCOS FUNDAMENTAlS 231
presente agora. Em outras palavras, 0 dimensionamentocia natureza estendida requer algum caniter inerente nanatureza que propicie a existencia de uma regra paraa apresenta~ao de eventos. Por outm lado, nao se podedefinir congruencia pela permanencia da regua de medi~ao. A permanencia em si e despmvida de significado, it parte a1gum julgamento imediato de autocongruencia. Do contrario, como diferenciarfamos urn fio elastico de uma regua rigida de medi~ao? Cada qual permanece 0 meSilla objeto, identico a si meSillO. Por que razao urn deles e uma regua de medi~ao posslvel e 0 outmnao? 0 significado da congruencia reside para a1em daidentidade do objeto consigo proprio. Em outras palavras, a mensura~ao pressup5e 0 mensuravel, e a teoriado mensuravel e a teoria cia congruencia.
Por outm lade, a admissao de estratifica~6es da natureza conduz aformulac;ao das leis cia natureza. Foi estabe1ecido que essas leis devem ser expressas em equa~6es diferenciais que, tal como formuladas em qualquersistema geral de dimensionamento, nao devem guardarreferencia a nenhum outro sistema de dimensionamento particular. Tal requisito e puramente arbitd.rio, poisurn sistema de dimensionamento dimensiona algo inerente anatureza; do contrario, nao tera absolutamentevInculo a1gum com a natureza. E aquilo que e medidopor urn sistema de dimensionamento particular podeguardar uma rela~ao especial com 0 fenomeno cuja leise encontra em formula~ao.Por exemplo, podemos esperar que 0 campo gravitacional gerado por urn objetomaterial em repouso em urn determinado sistema temporal apresente, em sua formulat;ao, referencia a grandezas espaciais e temporais daquele sistema temporal.
Ocampo, obviamente, pode ser expresso em qualquersistema de medida, mas a referencia particular permanecent como a simples explicac;ao ffsica.
NOTA:
DO CONCErTO GREGODE PONTO
As paginas precedentes foram encaminhadas aimpressaa antes que eu tivesse 0 prazer de ler 0 trabalhode Sir T. L. Heath, Euclid in Greek'. A primeira defini~ao de Euclides l no original, e
UTJJu:i:ov eU7LlI, oJ p,Epor; ov(J{v.
Citei-a na p. 104 na forma ampliada que me foi ensinada na infancia, "desprovido de partes e desprovidode magnitude". Seria preciso que eu tivesse consultado a edi~ao inglesa de Heath - urn c1assico desde 0
momenta de sua publica~ao - antes de me lan~ar auma declara~o acerca de Euclides. Esta, porem, e umacorre~ao trivial que nao afetara 0 sentido e nem justificaria uma nota. Gostaria de chamar a aten~ao aquiit nota do proprio Heath a essa defini~ao em seu Eu-
1. Cambridge Univ. Press, 1920.
234 a CONCE/TO DE NA TUREZA
did in Greek. Ele sintetiza a pensamento grego acerca danatureza do ponto desde as pitag6ricos, passando parPlatao e Arist6teles, ate chegar em Euclides. Minha analise do carater indispensavel de urn ponto nas pp. 108e 109 esta em total consonancia com 0 surgimento ciadiscussao grega.
NOTA:
DO SIGNIFICADO E DOSEVENTOS INFINITOS
A teoria do significado foi ampliada e tornada maisprecisa no presente volume. Ela ja havia sido introduzida nos Principles ofNatural Knowledge (cf. subartigos 3.3a 3.8 e 16.1, 16.2, 19.4, e artigos 20, 21). Ao revisaras provas do presente volume, chego it conclusao de que,it luz desse desdobramento, minha limita~ao dos eventos infinitos a durac;6es eindefensavel. Tallimitac;ao estaformulada no artigo 33 dos Principles e no infcio do Capitulo IV (p. 91) do presente livro. Existe urn tinico significado dos eventos discernidos a abarcar a totalidadecia durac;ao presente, mas existe 0 significado de urnevento cogrediente envoIvenda sua extensao atraves detodo urn sistema temporal, para tras e para a frente. EmQutras palavras, 0 "alem" essencial cia natureza e urnalem determinado no tempo, bern como no espa~o [cf.pp. 66, 227]. Segue isso de toda minha tese quanta itassimila~ao do tempo e do espa~o e da origem de ambos na extensao, alem de basear-se tambem na anaIisedo caniter de nosso conhecimento cia natureza. Dessa
admissao decorre que epossivel definir as trilhas de pontos [i.e. os pontos de espa~os atemporaisJ como elementos abstrativos. Ternos aqui urn grande aprimoramento, na medida em que se restaura 0 equilfbrio entre momentos e pontas. Continuo defendendo, no entanto, aafirma~ao do subartigo 35.4 dos Principles, de que a intersec~ao de urn par de dura~5es nao-paralelas nao seapresenta a nos como urn evento unico. Essa corre~ao
nao afeta nenhuma das pondera~5es subseqiientes emambos os livros.
Aproveito a oportunidade para assinalar que os"eventas estacionarios" do artigo 57 dos Principles saomeros eventas cogredientes aos quais se tern acesso a partir de urn ponto de vista matemMico abstrato.
236 o CONCE/TO DE NA TUREZA
II
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