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Laplage em Revista (Sorocaba), vol.6, n.2, mai.- ago. 2020 p.137-148 ISSN:2446-6220 A GESTÃO GERENCIAL E SEUS DESDOBRAMENTOS NA EDUCAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL DE GOIÁS Managerial management and its developments in the State public education of Goiás La gestión gerencial y sus consecuencias en la educación pública estatal de Goiás Elizabeth Gottschalg Raimann Soraia Rodrigues Chaves** Universidade Federal de Goiás [UFG-Jataí]– BRA. RESUMO Este artigo objetiva contribuir para a discussão do estado gerencial e suas práticas de gestão por resultados na educação pública goiana, a partir da década de 2000, tendo como foco as organizações públicas não estatais, ou Organizações Sociais. Nesse sentido, a gestão pública, ao buscar a eficiência de seus serviços transfere suas responsabilidades sociais para setores da sociedade, mediante contratos de gestão em parcerias público- privadas. No âmbito da educação, em específico no estado goiano, estas parcerias se encontram nos programas e ações do governo estadual. A análise dos Planos Plurianuais (2000 a 2007; 2012 a 2019) no governo Marconi Perillo e os encaminhamentos dados pela secretaria estadual de educação demonstram seu alinhamento a esta proposta dando condições para que as Organizações Sociais, como parceiras, venham se consolidando ao longo da década até aos dias atuais, apesar de posicionamentos contrários por parte dos profissionais da educação, alunos e outras entidades. Palavras-chave: Estado gerencial. Organizações sociais. Parceria público-privada. Educação pública estadual. ABSTRACT This article aims to contribute to the discussion of the managerial state and its management practices for results in public education in the State of Goiás, from the 2000s on, focusing on public non-state organizations, or Social Organizations. Therefore, public management, in seeking the efficiency of its services, transfers its social responsibilities to sectors of society, through management contracts in public-private partnerships. In the field of education, specifically in the State of Goiás, these partnerships are found in the programs and actions of the State government. The analysis of the Pluriannual Plans (2000 to 2007; 2012 to 2019) under the government of Marconi Perillo and the referrals given by the State Education Department demonstrate its alignment with this proposal, giving conditions for Social Organizations, as partners, to consolidate themselves throughout the decade to the present days, despite opposing views by education professionals, students and other entities. Keywords: Managerial state. Social organizations. Public-private partnership. State public education. RESUMEN Este artículo tiene como objetivo contribuir a la discusión del estado gerencial y sus prácticas de gestión para obtener resultados en la educación pública del Estado de Goiás, a partir de la década de 2000, teniendo como enfoque las organizaciones públicas no Estatales u Organizaciones Sociales. En este sentido, la gestión pública, al buscar la eficiencia de sus servicios, transfiere sus responsabilidades sociales a sectores de la sociedad, a través de contratos de gestión en asociaciones público-privadas. En el campo de la educación, específicamente en el Estado de Goiás, estas asociaciones se encuentran en los programas y acciones del gobierno Estatal. El análisis de los Planes Plurianuales (2000 a 2007; 2012 a 2019) bajo el gobierno de Marconi Perillo y los encaminamientos dados por la Secretaría Estatal de Educación demuestran su alineamiento con esta propuesta, dando condiciones para que las Organizaciones Sociales, como copartícipes, se consoliden a lo largo de la década hasta la actualidad, a pesar de los posicionamientos opuestos por parte de los profesionales de la educación, los estudiantes y otras entidades. Palabras - clave: Estado gerencial. Organizaciones sociales. Asociación público-privada. Educación pública estatal. DOI: https://doi.org/10.24115/S2446-6220202062914p.137-148

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Laplage em Revista (Sorocaba), vol.6, n.2, mai.- ago. 2020 p.137-148 ISSN:2446-6220

A GESTÃO GERENCIAL E SEUS DESDOBRAMENTOS NA

EDUCAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL DE GOIÁS

Managerial management and its developments in the State public education of Goiás La gestión gerencial y sus consecuencias en la educación pública estatal de Goiás

Elizabeth Gottschalg Raimann Soraia Rodrigues Chaves**

Universidade Federal de Goiás [UFG-Jataí]– BRA. RESUMO Este artigo objetiva contribuir para a discussão do estado gerencial e suas práticas de gestão por resultados na educação pública goiana, a partir da década de 2000, tendo como foco as organizações públicas não estatais, ou Organizações Sociais. Nesse sentido, a gestão pública, ao buscar a eficiência de seus serviços transfere suas responsabilidades sociais para setores da sociedade, mediante contratos de gestão em parcerias público-privadas. No âmbito da educação, em específico no estado goiano, estas parcerias se encontram nos programas e ações do governo estadual. A análise dos Planos Plurianuais (2000 a 2007; 2012 a 2019) no governo Marconi Perillo e os encaminhamentos dados pela secretaria estadual de educação demonstram seu alinhamento a esta proposta dando condições para que as Organizações Sociais, como parceiras, venham se consolidando ao longo da década até aos dias atuais, apesar de posicionamentos contrários por parte dos profissionais da educação, alunos e outras entidades.

Palavras-chave: Estado gerencial. Organizações sociais. Parceria público-privada. Educação pública estadual.

ABSTRACT This article aims to contribute to the discussion of the managerial state and its management practices for results in public education in the State of Goiás, from the 2000s on, focusing on public non-state organizations, or Social Organizations. Therefore, public management, in seeking the efficiency of its services, transfers its social responsibilities to sectors of society, through management contracts in public-private partnerships. In the field of education, specifically in the State of Goiás, these partnerships are found in the programs and actions of the State government. The analysis of the Pluriannual Plans (2000 to 2007; 2012 to 2019) under the government of Marconi Perillo and the referrals given by the State Education Department demonstrate its alignment with this proposal, giving conditions for Social Organizations, as partners, to consolidate themselves throughout the decade to the present days, despite opposing views by education professionals, students and other entities.

Keywords: Managerial state. Social organizations. Public-private partnership. State public education.

RESUMEN Este artículo tiene como objetivo contribuir a la discusión del estado gerencial y sus prácticas de gestión para obtener resultados en la educación pública del Estado de Goiás, a partir de la década de 2000, teniendo como enfoque las organizaciones públicas no Estatales u Organizaciones Sociales. En este sentido, la gestión pública, al buscar la eficiencia de sus servicios, transfiere sus responsabilidades sociales a sectores de la sociedad, a través de contratos de gestión en asociaciones público-privadas. En el campo de la educación, específicamente en el Estado de Goiás, estas asociaciones se encuentran en los programas y acciones del gobierno Estatal. El análisis de los Planes Plurianuales (2000 a 2007; 2012 a 2019) bajo el gobierno de Marconi Perillo y los encaminamientos dados por la Secretaría Estatal de Educación demuestran su alineamiento con esta propuesta, dando condiciones para que las Organizaciones Sociales, como copartícipes, se consoliden a lo largo de la década hasta la actualidad, a pesar de los posicionamientos opuestos por parte de los profesionales de la educación, los estudiantes y otras entidades.

Palabras - clave: Estado gerencial. Organizaciones sociales. Asociación público-privada. Educación pública estatal.

DOI: https://doi.org/10.24115/S2446-6220202062914p.137-148

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Introdução

gestão por resultados, incorporada pela administração pública federal e, posteriormente, pela estadual, passa a ser o receituário da Nova Gestão Pública (NGP) como um dos encaminhamentos necessários para a reconfiguração do Estado amplo, de Bem-Estar Social, para o Estado mínimo, neoliberal, diante das crises do capital.

Nesse sentido, um Estado mínimo significa menos atuação nas políticas sociais e mais incentivos nas políticas econômicas. O neoliberalismo, como ideário da política econômica nos países capitalistas, chega ao Brasil, em 1990, se entranhando em todos os setores, inclusive na educação. Nesse cenário há uma reconfiguração do mundo do trabalho, exigindo um trabalhador flexível, polivalente e multifuncional (ANTUNES, 2009). A gestão pública assume a perspectiva gerencial que, segundo Gomes (2009, p.14), busca “o uso eficaz da informação, o estabelecimento de indicadores de desempenho […] preocupação constante com o monitoramento e avaliação do efeito dos serviços e políticas públicas, visando ao aumento da eficiência, efetividade e accountability da gestão pública.” A sociedade civil, por sua vez, passa a ter um protagonismo importante, como terceiro setor, assumindo no lugar do Estado funções nas áreas sociais (PERONI; SILVA, 2013).

Bresser-Pereira (1997, 2010), compartilhando da visão gerencialista, apresenta a Nova Gestão Pública (NGP) como o ideário necessário para que se faça a segunda reforma do Estado, passando de Estado burocrático para o Estado gerencial. Bresser-Pereira, enquanto esteve à frente do Ministério da Administração da Reforma do Aparelho do Estado (MARE), buscou dar mais eficiência, eficácia e efetividade à administração pública, aos seus serviços, distribuindo o Aparelho do Estado em quatro setores, quais sejam: núcleo estratégico, atividades exclusivas, serviços não exclusivos e produção de bens e serviços para o mercado (BRASIL, 1995), imprimindo características como a responsabilização ou accountability e a avaliação de desempenho, conforme descritas por Gomes (2009) e analisadas em outros trabalhos por Raimann (2015; 2017) ao tratar do trabalho docente na sociedade da economia do conhecimento. A gestão de governo no estado de Goiás, durante a década de 2000, por Marconi Perillo incorporou esse receituário na sua proposta “Tempo Novo” abrindo possibilidades para a atuação das parcerias público-privadas (PPP) e das Organizações Sociais (O.S.).

Considerando a gestão gerencial e contratos de gestão, Souza e Flores (2017) problematizam os recursos públicos empenhados nas escolas estaduais goianas na implementação das O.S. nessas escolas. Os autores fundamentam-se nas reformas do Estado para a discussão do estado gerencial enriquecendo e ampliando a discussão sobre a temática das O.S. e a gestão compartilhada a partir da análise do orçamento do governo goiano em 2016. Este artigo tem o objetivo de contribuir na análise da gestão do governo goiano, na área da educação, considerando-se que ao trazer as PPP e as O. S. esta incorpora a gestão gerencial e o modelo de contratos de gestão abrindo possibilidades para a privatização do setor educacional público.

Como procedimento de análise o foco estará nos quatro mandatos do governador Marconi Perillo, de 1999 a 2006, sob o slogan “Tempo Novo”; e, posteriormente, de 2011 a 2018, com Goiás um estado de inovação e qualidade de vida, a partir dos Planos Plurianuais (2000 a 2007; 2012 a 2019) do governo e os encaminhamentos dados pela secretaria estadual de educação. O referencial teórico-metodológico tem a contribuição de Shiroma, Campos e Garcia (2005) ao afirmarem que palavras importam diante do cenário da política educacional nacional e internacional. As autoras buscam compreender o discurso presente nos documentos oficiais dentro do contexto político, econômico e cultural. Desta forma, apresentar-se-ão alguns elementos do estado gerencial e o encaminhamento para as PPP e as O.S. no âmbito nacional. Na sequência, analisar-se-á a gestão por resultados presente nos Planos Plurianuais e seus desdobramentos na educação, durante o governo de Marconi Perillo e possíveis resistências.

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O princípio da gestão por resultados

O Estado na sociedade capitalista busca favorecer o capital, independentemente da posição política/ideológica de governo. Defende-se que as propostas da reforma da administração do Estado implementadas a partir de 1995 tiveram sua continuidade durante o governo popular, após 2003, alinhando-se ao princípio da gestão gerencial, desenvolvendo práticas de parcerias público privadas e incentivando a criação de organizações sociais. Afirmava-se, na ocasião do estudo sobre o trabalho docente na sociedade da economia do conhecimento, que a atuação do Estado gerencial era o de dividir suas responsabilidades com setores da sociedade civil, alinhando-se às propostas de Bresser-Pereira à frente do MARE (BRASIL, 1995), como se lê:

[...] o ministro defendeu que na reforma do Estado, sustentada no processo de privatização, publicização e terceirização, a prioridade passaria a ser um enxugamento do quadro de recursos humanos […]. Tal perspectiva reorientou a gestão da administração do Estado, a fim de possibilitar a sua governança. Para tal, além de delegar competências aos demais setores da sociedade, o Estado passou a implantar uma cultura gerencial, cujas ações estavam pautadas no controle dos resultados, na competição administrativa, na avaliação de desempenho, seja ela individual ou institucional. (RAIMANN, 2017, p.155-156).

O princípio de gerência, pelo qual o Estado se orienta, está na eficiência técnica, na otimização dos recursos, na avaliação de desempenho aliado ao princípio da responsabilização, gerenciamento por resultados, com metas a serem alcançadas. A governança deve ser de forma efetiva, eficiente e flexível voltada para o atendimento do cidadão cliente em detrimento de uma administração burocrática, rígida e ineficiente (BRASIL, 1995). Tais princípios afetam também a educação. A relevância em se debruçar nos documentos elaborados durante o período da reforma administrativa do Estado para analisar o contexto atual da gestão do governo goiano é referendada por Evangelista (2019, p.1-2) ao oferecer:

Elementos teórico metodológicos que auxiliem na compreensão de processos de produção de diretrizes políticas para a educação, especificamente os presentes em documentos oficiais e oficiosos publicados em suporte de papel ou eletrônico. Trabalho com a ideia de que tais materiais – oriundos do aparelho de Estado, de organizações multilaterais e de agências e intelectuais que gravitam em sua órbita. – expressam não apenas diretrizes para a educação, mas articulam interesses, projetam políticas, produzem intervenções sociais.

De fato, para se compreender como nos dias atuais as O.S. atuam, sob o modelo de contrato de gestão na área educacional goiana, é preciso buscar nas propostas da gestão gerencial, defendida por Bresser-Pereira, os fundamentos políticos e econômicos que irão compor o pano de fundo da política educacional do estado. Os estudos de Newmann e Clark (2012) sobre o Estado gestor e o gerencialismo, apontam que o último está ligado à NGP caracterizando um novo ethos para o setor público tendo como parâmetro o modelo de negócios do setor privado pautado em valores diferentes ao do setor público, necessitando ser uma ideologia a ser difundida. Como se lê:

O gerencialismo como ideologia era essencial para o processo de reforma das décadas de 1980 e 1990 no Reino Unido porque traduzia um ethos de negócios do setor privado no estado e no setor público. Ocorre que, mesmo onde os serviços públicos não foram totalmente privatizados (e muitos permaneceram no setor público), era exigido que tivessem um desempenho como se estivessem em um mercado competitivo. Era exigido que se tornassem semelhantes a negócios e este ethos era visto como personificado na figura do gerente (em oposição ao político, ao profissional ou ao administrador). Isto introduziu novas lógicas de tomada de decisão que privilegiavam economia e eficiência acima de outros valores públicos. (p.358, grifo dos autores).

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Dentro desses princípios, Bresser-Pereira (2010, p.115) defende a reforma gerencial, ao afirmar:

A Reforma Gerencial foi a resposta a esse desafio ao modificar a forma de administrar a oferta dos serviços. Ela (1) torna os gerentes dos serviços responsáveis por resultados, ao invés de obrigados a seguir regulamentos rígidos; (2) premia servidores por bons resultados e os pune pelos maus; (3) realiza serviços que envolvem poder de estado através de agências executivas e reguladoras; e - o que é mais importante- (4) mantém o consumo coletivo e gratuito, mas transfere a oferta dos serviços sociais e científicos para organizações sociais, ou seja, para provedores públicos não estatais que recebem recursos do Estado e são controlados através de contrato de gestão. (grifo nosso).

Em outra publicação, Bresser-Pereira (1997, p.42) esclarece o que seriam as O. S. “[...] mecanismos de controle social direto, do contrato de gestão em que os indicadores de desempenho sejam claramente definidos e os resultados medidos, e da formação de quase-mercados em que ocorre a competição administrativa […].” Importante destacar, nesse contexto das reformas, que o papel das O. S. como organizações civis de interesse público, são para “aliviar” o Estado de sua responsabilidade social. Desde a década de 1990 algumas se destacam, permanecendo atuantes como: o Instituto Ayrton Senna e Ação Educativa, representando as parcerias público privadas. Em 2007, o Decreto n.º 6.094, de 24 de abril de 2007, ao implementar o Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, leva o governo federal a fazer um chamamento não apenas aos entes federados União, Estados e Municípios, mas todos da sociedade civil, em regime de colaboração, a se responsabilizarem em melhorar a qualidade da educação básica. Este decreto oportunizou a consolidação do Movimento Todos pela Educação tendo como parceiros Institutos e Fundações, a exemplo do Instituto Unibanco e Ayrton Senna, Fundação Bradesco, Lemann, Itaú Social, dentre outras (RAIMANN, 2017).

A gestão por resultados no governo de Goiás

O Planejamento Plurianual (PPA) foi instituído pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado pelo Decreto nº 2.829, de 29 de outubro de 1998, (BRASIL, 1998) objetivando dar organicidade de forma regionalizada às diretrizes e metas da administração pública. Por ser um planejamento de médio prazo, estabelece metas e diretrizes a serem seguidas pelos governos Federal, Estadual e Municipal por um período de quatro anos, sendo cada um deles aprovados pelo poder legislativo de cada esfera. O PPA, como ferramenta de planejamento em médio prazo, oferece possibilidades de avaliação mais objetiva, a partir de dados estatísticos, apontando os resultados já levantados nas metas a serem atingidas. Exige constante avaliação dos programas e ações em implementação, responsabilizando o agente público que executa as ações, buscando a excelência na aplicação dos recursos. Esta responsabilização pelo (in)sucesso das ações presentes nos programas estabelecidos é um princípio gerencial, tendo como parâmetros a eficiência e eficácia dos serviços públicos oferecidos, na lógica do cidadão consumidor dos serviços públicos. Na educação, por exemplo, deixa de ser um direito do cidadão passando a ser um bem de consumo.

O primeiro PPA adotado foi no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) (1996-1999) “Brasil em Ação” cujas orientações inspiraram Marconi Perillo no início da década de 2000, com sua proposta de “Tempo Novo”. O primeiro PPA 2000/2003, Goiás para o século XXI (GOIÁS, 2000) e o segundo, ainda na liderança do mesmo governador, Goiás para o século XXI – Avançar mais - PPA 2004/2007 (GOIÁS, 2004). Estes planejamentos foram elaborados pela Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento de Goiás (SEPLAN – GO) e pela Agência Goiana de Desenvolvimento Regional (AGDR) cujo objetivo foi o de assegurar o desenvolvimento da competitividade da economia goiana e a consolidação da sua integração aos mercados nacional e internacional. Com o PPA Goiás para o século XXI, o governo goiano buscou a transformação da política, vislumbrando levar o estado a um patamar de desenvolvimento e competitividade para

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além do âmbito regional. Para isso, implementou ações propositivas na direção de uma gestão pública gerencial, com o apoio do governo federal. A Superintendente da SEPLAN, ao tratar do novo modelo de planejamento adotado por Marconi Perillo, esclarece que

A partir da década de 1999, com o Governo Fernando Henrique Cardoso, foi-se introduzindo no estado de Goiás, uma Gestão voltada para resultados. Foi a introdução desse modelo de Gestão Pública que mudou todo o perfil. Foi o divisor de águas [...] este programa é todo gerenciado no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão que tem uma secretaria própria de planejamento estratégico que volta todas as suas ações para isso [...]. Nós fizemos o primeiro PPA de 1999 a 2003, juntamente com o Governo Federal (SALGADO, 2009, p. 5).

O que fica evidente nessa entrevista é que, em harmonia com o governo federal, o estadual também inicia sua proposta de NGP pautada em programas e ações que visavam resultados, eficiência e competitividade, buscando uma maior inserção no mercado nacional e internacional. Arrais (2007) ao tratar do Planejamento e Desenvolvimento Regional: a intervenção governamental e a problemática regional de Goiás, analisa o PPA 2000-2003 goiano e o descreve da seguinte forma:

Esse plano reproduziu o propósito de corrigir as distorções e os desequilíbrios regionais de crescimento. No PPA constam 5 estratégias que revelam em linhas gerais, o quadro de intenções do governo diante da intervenção territorial; 1) Goiás competitivo e pólo econômico regional; 2) Goiás cidadania com melhoria de qualidade de vida; 3) Goiás com desenvolvimento harmônico e equilibrado; 4) Governo moderno e empreendedor; 5) Alianças e parceria, em prol de Goiás. (ARRAIS, 2007, p. 32).

As cinco estratégias estão em consonância com o discurso de promover um espírito competitivo, próprio do mercado e do projeto neoliberal para a governança. Considerando-se os termos empreendedorismo, alianças e parcerias, na citação acima, estes trazem um vocabulário compatível com a linguagem utilizada pela proposta do estado gerencial. O PPA motiva a participação da iniciativa privada nos investimentos de interesse público, demonstrando uma forte abertura para as PPP presentes nas reformas neoliberais, conforme a Emenda Constitucional nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004 (BRASIL, 2004), que altera a Constituição Federal de 1988 para incluir as PPPs.

O empreendedorismo, as parcerias e a competitividade fazem parte de uma linguagem reformista que compõem os textos dos documentos que legitimam as reformas neoliberais, impactando a educação. Ao trazerem tais elementos do mercado para os documentos, o governo legitima o Estado mínimo e as O.S., pois estes termos estão como afirmam Shiroma, Campos e Garcia (2005, p. 438) “Cada vez mais presentes nos documentos oficiais, evidenciam não apenas a penetração da ideologia do gerencialismo na educação, mas expressam também a conformação de um novo “léxico” educacional, um híbrido de pedagógico e gerencial.” Nesse sentido, percebe-se que Marconi Perillo, ao apresentar seu plano de governo, em 1999, estava de acordo com as diretrizes governamentais federais, pois, na apresentação desse documento, o termo que mais se destaca é mudança. Por vezes, essa palavra é acompanhada por expressões que a adjetivam: “mudança de paradigma”, “mudança de conceitos”, ¨mudança de interesses do capital e do trabalho”, “mudança de natureza política, econômica e social”, anunciando assim a construção de um outro Estado, mais moderno, numa perspectiva de uma NGP. O trecho abaixo, na mensagem do governador ao legislativo apresentando seu PPA, destaca-se a afirmação:

Essa mudança deve ter como base a conciliação entre os interesses do capital e do trabalho. A implementação de uma nova forma de gestão. O desmonte de todo o arcabouço jurídico-legal de proteção aos privilégios. E o fim dos cartórios e da ineficiência administrativa. (GOIÁS, 2000, p.19).

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Nessa assertiva, o Estado de Bem-Estar Social é ineficiente e deve ser desmontado, dando lugar a um Estado mais eficiente, que, para se tornar moderno e inovador, deveria se livrar daquilo ou daqueles que o deixavam engessado, encontrando outra forma de gestão, passando então a desempenhar um papel de gerenciador, sem abrir mão de seu poder de controle. Ainda na mensagem do governador, é possível se verificar a consonância de sua fala com as propostas do MARE quanto à setorização das responsabilidades do Estado, afirma Marconi Perillo:

Nesse contexto, o Estado deve estabelecer o seu campo de atuação, destacando as atividades públicas e aquelas que poderão ser desempenhadas por outros parceiros, redimensionando prioridades. Assim ao tempo em que envolve sua estrutura governamental abre oportunidades para alianças e parcerias com a União, Estados e Municípios e, sobretudo, com o setor privado e entidades não governamentais. (GOIÁS, 2000, p.19).

Aqui fica declarada a opção do governo goiano em dividir suas responsabilidades com setores da sociedade civil, evidenciado, posteriormente, na pasta da educação com o Programa de Aceleração da Aprendizagem para corrigir as distorções idade/série em parceria com o Instituto Ayrton Senna (IAS). Nessa perspectiva, o Estado se desonera do papel de assumir investimentos na política social e compartilha essa tarefa com setores públicos não estatais, reduzindo o grau de sua interferência, assumindo o papel de avaliador dos serviços prestados. Conforme pesquisa de Peroni e Silva (2013, p.56), ao analisarem a atuação do IAS na área da educação e sua ingerência na política educacional local, afirmam “o sistema permanece público, mas é a instituição privada quem determina o conteúdo da política e estabelece as metas, conforme seus parâmetros de qualidade.” O segundo PPA dá continuidade ao primeiro: Goiás para o Século XXI para avançar mais 2004/2007 (GOIÁS, 2004). Nele, o governador em sua mensagem aponta para os avanços alcançados, propondo-se a dar continuidade ao planejamento estratégico na gestão pública. Na mensagem enviada à Assembleia Legislativa todas as promessas de um “Novo Tempo” e de uma nova gestão de resultados são reforçadas pelo governador ao fazer um balanço de sua gestão anterior. Como destaca:

O Plano Goiás Século XXI – PPA 2000/2003 - constituiu um avanço para o Governo de Goiás que passou a assumir o seu novo papel de formulador e implementador de programas estratégicos para o desenvolvimento do Estado, definindo prioridades claras para a aplicação dos recursos públicos e identificando oportunidades de parcerias para maior efetividade dos resultados. Este empreendimento lançou para Goiás um novo modelo integrado de planejamento, orçamento e gestão, em que o plano e os orçamentos não constituem apenas peças burocráticas. Assim, iniciou-se um novo tempo em nossa administração pública, regido pelos princípios do empreendedorismo e do paradigma gerencial, focado nos anseios da sociedade goiana. (GOIÁS, 2004, p.1, grifo nosso)

Aperfeiçoando a gestão de seu governo neoliberal, as diretrizes e desafios que orientam a elaboração do PPA 2004-2007, Goiás Século XXI – Avançar Mais, são levantados em cinco desafios e quatro diretrizes. Das diretrizes, destacam-se a descentralização e publicização, conforme se lê abaixo:

c) avançar com empreendimentos inovadores em parcerias com a iniciativa privada e sociedade civil;

d) avançar na integração com programas dos Governos Federal e Municipais; (GOIÁS, 2004, p. 6-7).

Analisando-se os desafios e diretrizes do PPA 2004-2007, o governador deixa claro seu posicionamento a respeito do que seja a gestão de seu mandato, não deixando dúvidas quanto ao paradigma gerencial. Durante seu governo, sanciona a Lei nº 15.503, de 28 de dezembro de 2005, que “Dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais estaduais e dá outras

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providências” (GOIÁS, 2005). A promulgação dessa lei tem seu embasamento legal no que já tinha sido aprovado em âmbito federal, Lei nº 9.637, de 15 de maio de 1998, com a finalidade de dispor sobre a qualificação de entidades como organizações sociais e que o governador desde a sua primeira gestão e, posteriormente, ao pleitear as eleições em 2010, retoma em seu programa de governo. Nesse programa, define os Contratos de Gestão, como se lê:

[...] é uma nova figura jurídica e será implementado a partir da idéia de ‘gestão pública por resultados’, modelo de Gestão baseado em metas claras, orientado para resultados, transparente e responsável. Os Contratos definirão os trabalhos a serem realizados, metas a serem atingidas, prazos de execução, sua operação, orçamento e os resultados esperados. Serão instrumentos para acompanhar e fiscalizar o desempenho dos projetos, órgãos e entidades, assim como de seus gestores. Os Contratos de Gestão serão celebrados pelo Governo Central com: Secretarias de Estado; Autarquias, Fundações e Empresas do Estado; OSCIPS, Organizações Sociais e ONG’S que prestem serviços ao Estado; Serviços Sociais Autônomos que atuem em colaboração com o Estado (PLANO, 2010, p.16, grifo nosso).

Os outros dois mandatos de Marconi Perillo ocorreram entre 2011 a 2018. Seu slogan, desta vez, está voltado para o desenvolvimento estratégico no intuito de transformar o estado em um polo de desenvolvimento econômico contando com o apoio dos entes federados, da iniciativa privada e terceiro setor, como se lê:

A meta do meu governo é transformar Goiás em um dos maiores polos de desenvolvimento econômico deste país. Caberá ao Governo ser o agente promotor e articulador das forças que contribuem para esse desenvolvimento, cujos esforços devem somar-se não só aos dos demais Poderes e entes federativos, mas, também, àqueles empreendidos pelo setor privado e terceiro setor, que compartilham da construção do bem estar social (GOIÁS, 2012, p.14).

Para realizar o seu intento, o governo reafirma sua gestão por resultados, na Lei nº 17.543, de 11 de janeiro de 2012, que dispõe sobre o PPA no quadriênio de 2012-2015. No artigo 11 e seus incisos trata do sistema de avaliação dos programas e ações, tendo os princípios da eficiência, eficácia e efetividade. E no artigo 12, o financiamento está previsto com recursos em “parcerias com a União, outros Estados, Municípios, organizações não governamentais e, ainda, pela participação do setor privado” (GOIÁS, 2012).

Nesse PPA, o governo esquematiza seu plano de governo a partir de três eixos estratégicos, sendo um deles, o da estruturação de uma nova administração pública, buscando integrar, para executar programas complexos, as administrações municipais e entidades da sociedade civil. Na área educacional, o projeto do governo com as O.S. chama a atenção de pesquisadores norte-americanos. Em 2015, no mês de julho, a pasta da educação recebe dois pesquisadores interessados em conhecer o trabalho desenvolvido. Esta visita é amplamente divulgada na página online da casa civil, a fim de mostrar a relevância da proposta para a qualidade da educação, como

se lê abaixo:

A educação da rede pública estadual de Goiás será objeto da pesquisa de dois dos mais renomados especialistas norte-americanos no setor [...] Os pesquisadores foram recebidos nesta quarta-feira (29/07) pelo governador Marconi Perillo, no Palácio das Esmeraldas, acompanhados pela secretária de Estado da Educação, Cultura e Esporte, Raquel Teixeira. No encontro, eles disseram para o governador que vieram a Goiás conhecer as medidas implantadas pelo Estado para elevar a qualidade da educação e que voltarão para uma segunda avaliação após a implantação do modelo de gestão por Organizações Sociais (OS). O governador relatou para os professores o modelo

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de gestão por Organizações Sociais que pretende implantar nas escolas públicas estaduais. (PESQUISADORES, 2015).

Em outro momento, ainda em 2015, no mês de novembro, foi notícia em jornal de grande circulação no país que Goiás entregaria 25% das escolas estaduais à gestão privada (MONTEIRO, 2015). Na reportagem de André Monteiro, foi relatado como a pasta da educação, tendo à frente Raquel Teixeira, iria implantar o modelo de Organizações Sociais. A reportagem destaca afirmações da secretária, referentes à gestão “Nosso modelo é uma busca de gestão melhor da escola e da sala de aula. Mas a orientação pedagógica continuará sendo do Estado” (MONTEIRO, 2015, s/p.).

E para justificar as críticas recebidas por parte do sindicato de trabalhadores da educação e de professores, que afirmam que essa prática é a privatização da escola, Monteiro apresenta o argumento da secretária “Não é privatização, pois não vamos perder o controle da escola, não vamos entregar para um ente privado e ele não vai ter lucro. Também não é terceirização, é uma parceria” (MONTEIRO, 2015, s/p ). O repórter encerra a matéria jornalística com o argumento da secretária “O modelo irá beneficiar os docentes temporários. Hoje eles têm contrato precário e recebem cerca de R$1.300, mas, caso sejam selecionados, serão contratados pela CLT e receberão piso de 2.400 reais se tiverem formação adequada.” (MONTEIRO, 2015,s/p.). Freitas (2015), acompanhando o processo de privatização/terceirização da educação no país e, em específico o caso de Goiás, na época da reportagem acima, teceu comentários ao posicionamento da secretária de educação Raquel Teixeira, ao tratar das O.S. e os desdobramentos na educação pública. Para ele, a afirmação da secretária que não se trata de terceirizar, mas sim de parceria isso é uma forma de camuflar as práticas mercadológicas na educação.

É assim que se tenta tornar mais simpáticos os primeiros momentos da privatização, para vencer resistências. [...] Primeiro, dizem que entregar escolas para OS, não é privatizar. Para eles, como a escola não foi “vendida” e ainda é um bem público, então argumentam que ela é pública e não privada. Não admitem outras formas de privatização como a privatização por concessão. Segundo, fazem uma separação entre gestão e educação. Para eles, a gestão pode ser separada facilmente da educação, da parte pedagógica (FREITAS, 2015, s/p).

O discurso que dissimula a privatização, via O.S., das escolas públicas, ao se utilizar do argumento de que estas são sem fins lucrativos, segundo Freitas, deve ser visto com cautela, pois se trata de um terreno fértil para o mercado educacional, como se lê:

A outra argumentação corrente é que as organizações sociais que estarão assumindo as escolas no Brasil, são OSs sem fins lucrativos. Isso igualmente não se sustenta, pois como é sabido, nos países em que se privatizou por terceirização constituiu-se um mercado tanto de organizações sociais sem fins lucrativos, como com fins lucrativos. O que ocorre é que a ordem de seu aparecimento se dará em série: primeiro aparecerão as sem fins lucrativos, para constituir o mercado; e em seguida proliferarão as com fins lucrativos. É da lógica do mercado (FREITAS, 2016, s/p).

Segundo o estudo de Souza e Flores (2017), no contexto a implantação das O.S. em Goiás, a partir de 2016, ficou constatado que:

[...] a maioria da OS selecionada não tem uma sólida experiência em gerenciar redes de educação, de modo que, assim, a educação pública pode ser entregue a profissionais sem competência na área educacional. [...] revelou que os profissionais da educação contratados via CLT não têm garantias de receber remuneração com base no PSPN, uma vez que, pelo princípio da economicidade, a OS com a menor proposta financeira será selecionada e, consequentemente, milhões de reais deixarão de ser investidos nas escolas geridas pela OS. (2017, p.228).

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A proposta de tornar 25% das escolas estaduais em gestão privada trouxe reações do segmento educacional, principalmente por parte dos estudantes secundaristas. A implantação das O.S. nas escolas estaduais de Goiás motivou a ocupação destas escolas em forma de protesto, com uma mobilização intensa durando vários dias ao final de 2015 e início de 2016, conforme noticiado no G1, jornal online. (ALUNOS, 16/12/2015). Por fim, o PPA 2016 a 2019 (GOIÁS, 2016) tendo como slogan Goiás um estado de inovação e qualidade de vida, Marconi Perillo buscou dar continuidade ao programa de governo já em curso tendo como mote a inovação tecnológica. A partir de três eixos estratégicos, qualidade de vida, competitividade e gestão para resultados, o governo define suas ações e programas, muitos em parcerias público-privadas. Dentre os programas propostos, chama a atenção nesse PPA (2016-2019), o modelo de gestão da Educação Profissional em parceria com o terceiro setor. Com a Rede ITEGO, Institutos Tecnológicos do Estado de Goiás, dois programas estão articulados, o Programa de Inovação e Tecnologia do Estado de Goiás, implementado em polos de excelência, e o Programa Bolsa Futuro Inovador, ambos com parcerias.

Os ITEGOS são unidades da SED que oferecem educação profissional e tecnológica e ações de desenvolvimento e inovação tecnológica. A Rede ITEGO será implementada por meio da integração entre as unidades do ITEGO e COTECS, e articulada com a UEG, FAPEG, EMATER e demais instituições de ensino, pesquisa e inovação (ICTIs) (GOIÁS, 2016, p.111).

O Programa Bolsa Futuro Inovador, por sua vez, visa à Educação Profissional e Tecnológica, em nível médio e superior com foco no desenvolvimento econômico e inovação tecnológica. Este programa tem como proposta o modelo de contrato de gestão e está integrado à Rede ITEGO, buscando consolidar:

[...] por meio de ações de oferta de Educação Profissional, presencial e a distância, em unidades fixas e móveis e no atendimento de convênios para oferta de cursos (como PRONATEC / E-Tec) e de ações de desenvolvimento e inovação tecnológica voltadas às demandas do produtivo. A implantação do novo modelo de gestão da educação profissional, desenvolvimento e inovação tecnológica, em parceria com o terceiro setor, mediante contratação de Organizações Sociais para a operacionalização da oferta de cursos e programas de educação profissional, nos níveis básico (capacitação, qualificação, habilitação técnica de nível médio) e superior (graduação e pós-graduação), tanto na modalidade presencial como a distância, e de ações de desenvolvimento e inovação tecnológica (GOIÁS, 2016, p.347).

Vê-se claramente a atuação do terceiro setor na educação profissional e tecnológica e, aparentemente, sem resistências por parte do setor educacional. Analisando-se os programas do governo, sob a gestão de Marconi Perillo, fica evidenciado que o alinhamento dado à proposta da gestão por resultados dá condições para que as PPP e as O.S. se efetivem nas áreas sociais e, dentre elas, a educação no estado goiano. Se por um lado, houve forte reação do setor educacional com professores, alunos e sindicato se posicionando contra a possibilidade da educação pública estadual estar sob atuação das O.S. por meio de contrato de gestão, por outro, este mesmo modelo de gestão junto à educação profissional, nível médio e superior, em Goiás não apresentou, a princípio, resistência, cabendo pesquisa para a compreensão desse fenômeno, ou seja, um estudo mais aprofundado desses programas e seus desdobramentos na educação.

Considerações finais

Este artigo ao analisar a gestão do governo goiano, tendo como referência seus Planos Plurianuais, apontou para o modelo gerencial na condução de seus programas e ações. Este modelo, representado pela Nova Gestão Pública, pauta-se nas proposições de Bresser-Pereira na redefinição do papel do Estado e de suas competências. Nesse sentido, o modelo de gestão para o funcionalismo público está pautado na avaliação do desempenho, na busca e controle dos

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resultados, na competição administrativa e na responsabilização do agente público pelos resultados.

A gestão por resultados traz em seu bojo um novo conceito de gestão pública, nesse sentido, na área educacional propõe transformar a educação pública em um quase mercado escolar sustentado pela competência e concorrência entre instituições escolares e, mediante a publicização de serviços sociais e científicos caracterizados nas parceiras público privadas, leva às escolas não apenas a ingerência do empresariado ao seu interior (como o IAS), mas abre as portas para a privatização, contratos de gestão, mediante as Organizações Sociais, como foi a proposta do governador goiano na sua terceira gestão em 2016. A proposta inicial visava transformar 25% das escolas estaduais com a gestão das O.S. resultando em forte resistência por parte de alunos secundaristas e de professores na época.

O quarto mandato de Marconi Perillo apresenta a Rede ITEGO com a educação profissional tecnológica em nível médio e superior, mediante contratos de gestão com Organizações Sociais e parcerias público privadas. Analisando-se as ações do governo goiano na sua proposta de contratos de gestão e Organizações Sociais, pode-se inferir que o estado de Goiás serviu e serve como um laboratório para implantar uma política neoliberal na educação. Desta forma, permitem ao Estado se eximir de sua responsabilidade em financiar a educação estadual, deixando os valores do mercado como parâmetros a serem seguidos na condução da educação.

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*Pedagoga, doutora em educação; professora de graduação no curso de Pedagogia e pós-graduação no Mestrado em Educação da Universidade Federal de Goiás/ Regional Jataí (em fase de transição para Universidade Federal de Jataí/GO). E-mail: [email protected].

**Pedagoga, mestranda em educação; professora efetiva da Fundação Educacional de Jataí/Goiás, exerce a docência na educação municipal e na graduação do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Goiás/ Regional Jataí – UFG - (em fase de transição para Universidade Federal de Jataí/GO). E-mail: [email protected]. Recebido em: 30/03/2020 Aprovado em: 10/04/2020