inarquivos.cruzeirodosuleducacional.edu.br/principal/new/revista... · resenha de livro/book review...

57
IN Volume II. Número 2 MAI/AGO 2011

Upload: vuliem

Post on 12-Dec-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

IN

Volume II. Número 2 MAI/AGO 2011

Volume 1I - Número 2 • mai/ago 2011

Sumário/Contents

RELATOS DE PESQUISA/RESEARCH REPORTSDeterminação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnicaDetermination of myocardial infarct magnitude by measurement of angle between the infarct wall border zone: a proposal for a new techniqueRogério Canil, Julianne dos Santos Maldonado, Pamella Ramona Moraes de Souza, Marcia Kiyomi Koike .....................................................73

O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de GuarulhosHealth profile of elderly residents in GuarulhosProfa. Dra. Fabiana Augusto Neman, Nelson Henrique da Silva ................................................................................................................................83

Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutasPrevalence of work related to musculoskeletal disorders in physical therapistsCarolina Tani Bagalhi, Renata Alqualo Costa. .................................................................................................................................................................93

Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissionalInformal power in the organizations: power relations in the search for professional ascensionMarco Antonio Sampaio de Jesus, Graziela Cristina Vital ......................................................................................................................................... 103

ESTUDO DE CASO/ CASE STUDy Controle de estoque de opmeStock control of Orthotics, Prosthetics and Special MaterialsSabrina Nardino, Ane Lise Dalcul, Paulo Gil, ............................................................................................................................................................... 113

PONTO DE VISTA/POINT OF VIEWMovimento EcológicoEcological movementPedro Fernando Viana Felicio .......................................................................................................................................................................................... 120

RESENHA DE LIVRO/BOOK REVIEWThe Cigarette CenturyDr Joaquim Edson Vieira ............................................................................................................................................................................................. 123

Science in Health

A revista de saúde da Universidade Cidade de São Paulo.

Chanceler

PAULO EDUARDO SOARES DE OLIVEIRA NADDEO

Reitor

RUBENS LOPES DA CRUZ

Vice-Reitor

SÉRGIO AUGUSTO SOARES DE OLIVEIRA NADDEO

Editor chefeJoaquim Edson VieiraVice editorRodrigo Ipolito Bouças

Editoria Acadêmica Ester Regina Vitale Denise Aparecida Campos

Assistente Editorial Mary Arlete Payão Pela

Normalização e revisãoClaudia MartinsEdevanete de Jesus de Oliveira

EditoraçãoVinicius Antonio Zanetti Garcia

Revisão do idioma portuguêsAntônio de Siqueira e Silva

Assessoria de Marketing Lúcia Ribeiro Periodicidade: Quadrimestral

Corpo Editorial por Secção1 - Biomedicina

Editor Sênior: Márcio Georges Jarrouge

[email protected]

[email protected]

Editores Associados: Ana Cestari, Marcia Kiyomi Koike, Profº Dr Rodrigo Ippolito Bouças.

2 – Ciências Biológicas e Meio Ambiente

Editor Sênior: Débora Regina Machado Silva

[email protected]

Editores Associados: Maurício Anaya, Ana Lúcia Beirão Cabral, Sandra Maria Mota Ortiz

3 – Educação Física

Editor Sênior: Roberto Gimenez

[email protected]

Editores Associados: Marcelo Luis Marquezi, Maurício Teodoro de Souza;

4 – Enfermagem

Editor Sênior: Wana Yeda Paranhos

[email protected]

Editores Associados: Patricia Fera; Fabiana Augusto Neman, Adriano Aparecido Bezerra Chaves;

5 – Fisioterapia

Editor Sênior: Francine Barretto Gondo

[email protected]

Editores Associados: Fábio Navarro Cyrillo, Renata Alqualo Costa, Alexandre Dias Lopes

6 – Formação e capacitação na área da saúde

Editor Sênior: Ecleide Cunico Furlanetto

[email protected]

Editores Associados: Julio Gomes de Almeida, Joaquim Edson Viei-ra, Stewart Mennin

7 – Inclusão social

Editor Sênior: Vânia Aparecida Marques Leite

[email protected]

Editores Associados: Fernanda Mendonça Pitta, Ivete de Masi

8 – Informática na saúde

Editor Sênior: Waldir Grec

[email protected]

Editores Associados: Sergio Daré, Aníbal Afonso Mathias

Júnior.

9 – Medicina

Editor Sênior: José Lúcio Martins Machado

[email protected]

Editores Associados: Jaques Waisberg, Sonia Regina P. Souza, Edna Frasson de Souza Montero, Marcelo Augusto Fontenelle Ribeiro Júnior, Sylvia Michelina Fernandes Brenna

10 – Odontologia

Editor Sênior: Cláudio Fróes de Freitas

[email protected]

Editores Associados: Eliza Maria Agueda Russo, Rivea Ines Fer-reira,

11 – Tecnologia em saúde

Editor Sênior: Willi Pendl

[email protected]

Editores Associados: Rodrigo de Maio, Wilson carlos da Silva Jú-nior.

12. Ciências Sociais Aplicadas

Editor Sênior: Wagner Pagliato

[email protected]

Editores Associados: Marco Antonio Sampaio de Jesus; Eduardo Ganymedes; Wanderley Gonçalves; Rinaldo Zaina Junior; Roberta de Cássia Suzuki

E D I T O R I A L

O Editorial deste 5º exemplar da Science in Health tem como objetivo homenagear o professor Claudio A. B. de Toledo, idealizador deste periódico e Editor Chefe até sua recente partida. Biólogo, formado em 1984 pela PUCCAMP, com mestrado em Fisiologia pela UNICAMP, doutorado em fisiologia humana pela USP e pós--doutorado pela Universidade do Tennessee (Estados Unidos), construiu sua carreira na área da Neurofisiologia. Ao longo de sua carreira docente e científica, atuou em várias instituições de ensino e pesquisa, dentre elas a Universidade Federal de Florianópolis (UFSC) e Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Recentemen-te fora docente da UNICID (Universidade Cidade de São Paulo) e fundador e pesquisador chefe do Núcleo de Pesquisa em Neurociência (NUPEN – UNICID), orientador no Programa de Mestrado em Ciências da Saúde do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual-IAMSPE, mentor científico internacional do NIH (National Institutes of Health – Estados Unidos), pesquisador com projeto regular FAPESP, além de manter colaboração com instituições de pesquisa nacionais e internacionais.

Apesar da privação precoce de sua presença física, sua luz continua naqueles que tiveram o privilégio de compartilhar sua amizade e convívio. Solícito, sempre com seu bom humor, era incapaz de não atender a uma demanda de quem lhe solicitasse auxílio, demonstrava claramente sua disposição em colaborar humildemente com seu sólido conhecimento científico, sua retidão moral e ética e com profundo respeito à diversidade de ideias, pelo prazer de observar o crescimento e a evolução de seus alunos e pares.

Professor Claudio pensava a Fisiologia como a Filosofia que transcende os mecanismos da matéria viva, mas que provê a base para o entendimento das interações entre órgãos e sistemas, entre homens e ambiente, entre sociedades e nações, assim como A. C. Guyton, grande fisiologista que nos inspira até hoje.

Dessa forma, a escolha do estudo e da pesquisa em Fisiologia, antes mesmo de concluir a graduação, certa-mente não foi aleatória, mas provavelmente lhe chamou a atenção o poderoso instrumento da ciência, que lhe possibilitaria expressar toda sua curiosidade e angústia, naturais daqueles que se incomodam com os grandes questionamentos da existência humana, com o objetivo de contribuir para o conhecimento médico-científico e consequente bem-estar do próximo.

Sua lembrança estará para sempre preservada em nossas memórias como um “flash” de luz que não nos permitirá a paz da acomodação, mas, sim, nos instigará com a necessidade da busca.

Achille SavareseProfessor, Curso de Medicina, Universidade Cidade de São Paulo.

Marcia K. KoikeProfessora, Curso de Medicina, Universidade Cidade de São Paulo.

“Como falar de um homem que, mesmo que haja perda, não tem medo de multiplicar seu conhecimento? Que nos ensina a pensar de forma crítica, a entender da base até o produto final, não deixando de se preocupar com todos os detalhes do processo. [Que nos ensina] A sermos independentes, tal qual um pai que prepara o filho para o mundo de gente grande. Que está sempre disposto a nos ouvir, por mais atarefado que esteja. Que acolhe e abraça, defende e luta por cada um, de forma digna, sem ofender o oponente ou o obstáculo. Respeito acima de tudo. Que transmite, só pelo olhar, a força e a sabedoria do caminho a trilhar, mesmo numa confusão, e ainda dá a mão para aqueles que estão com medo. O porquê dos verbos no presente? A luz da estrela jamais se apaga, ela continua iluminando nossos caminhos e parafraseando um amigo comum, do professor Claudio e do laboratório: ‘A ‘imortalidade’ é a lembrança que temos dos momentos bons com essas pessoas especiais que fazem parte da nossa vida (J.S.C.)’, assim como todo o trabalho dele irá. Esse é nosso chefe, esse é nosso amigo, esse é nosso irmão mais velho.”

Depoimento enviado pelos colaboradores e pesquisadores (“filhos”) do NUPEN

ISSN 2176-9095

73

Science in Health 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

DETERMiNAçãO DA MAGNiTuDE DO iNFARTO DO MiOCáRDiO POR MEDiDA DA ANGuLAçãO ENTRE AS BORDAS DA PAREDE iNFARTADA: PROPOSTA DE NOVA TéCNiCA.

Determination of myocarDial infarct maGnituDe by measurement of anGle between tHe infarct wall borDer zone: a proposal for a new tecHnique.

Rogério Canil*

Julianne dos Santos Maldonado**

Pamella Ramona Moraes de Souza***

Marcia Kiyomi Koike****

**** Biomédico formado pela universidade Cidade de São Paulo (uNiCiD)**** Biomédica formada pela universidade Cidade de São Paulo (uNiCiD)**** Fisioterapeuta, doutoranda da Faculdade de Medicina da universidade de São Paulo (uSP)**** Bióloga, Doutora em ciências pela Faculdade de Medicina da uSP, professora do curso de biomedicina da uNiCiD e orientadora pelo Programa de pós-

graduação em Ciências da Saúde do instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (iAMSPE)

Resumo

O infarto do miocárdio pode ser definido como perda de cardiomiócitos (necrose) devido ao desbalanço prolongado entre o suprimento de sangue e a demanda de oxigênio do miocárdio (isquemia). Os modelos experimentais de infarto do miocárdio são frequentemente utilizados para o estudo da fisiopatologia do remodelamento cardíaco, representan-do um modelo fácil, consistente e econômico. Geralmente, o tamanho de infarto é determinado em cortes histológi-cos do ventrículo esquerdo por planimetria. A maioria das técnicas de biologia molecular requer tecido fresco, entre-tanto não há literatura sobre estimativa de infarto no co-ração fresco. O objetivo deste estudo é apresentar uma nova proposta para a determinação do tamanho de infarto por mensuração do ângulo entre as bordas da parede com infarto.

PalavRas-chaves: Infarto do Miocárdio • Remodelação ven-tricular • Rato.

aBsTRacT

Myocardial infarction can be defined as a loss of cardiac myocytes (necrosis) caused by prolonged perfusion-depen-dent imbalance between supply and demand (ischemia) of myocardium. The experimental model of myocardial infarc-tion is commonly used to study pathophysiology of ven-tricular remodeling, representing an easily, consistently and economically model. In general, infarct size is determined in histological slices of the left ventricle by planimetry. The most techniques in molecular biology require fresh tissue, however there is no literature about the infarct size estima-tion in fresh heart. The aim of this study was present a new proposal for the infarct size determination by measurement of angle between the infarct wall border zone regions.

Key-woRds: Myocardial Infarction • Ventricular Remodeling • Rats.

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

74

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

IntRoduçãoA elevação da expectativa de vida e as mudanças

socioeconômicas da população brasileira têm contri-buído para o aumento dos fatores de risco e elevação do número de casos de doenças cardiovasculares. Segundo o DATASuS, em 2006, as maiores causas de óbito no Brasil foram doenças do aparelho circu-latório, cerca de 32% da mortalidade total por doen-ças especificas, e a mais representativa foi a doença isquêmica do coração. Na região Sudeste, principal-mente em São Paulo, 25.374 indivíduos, por 100.000 habitantes, foram a óbito por doença isquêmica do coração, representando cerca de 28% do total de óbi-tos das unidades de federação (Brasil1, 2006, Brasil2, 2006).

Estudos indicam que até o ano de 2030, a doen-ça isquêmica do coração será a principal causa de mortalidade, incapacitação e morbidade no mundo, e atualmente é a responsável pelo grande número de hospitalizações (Mathers e Loncar3, 2006).

O termo “doença isquêmica do coração” (i20-i25), utilizado pelo DATASuS, se refere às patologias associadas ao processo isquêmico do coração, que são: angina pectoris (i20), infarto agudo do miocárdio (i21), infarto do miocárdio recorrente (i22), algumas complicações atuais subsequentes ao infarto agudo do miocárdio (i23), outras doenças isquêmicas agu-das do coração (i24) e doença isquêmica crônica do coração (i25) (Brasil 4, 2008).

O infarto do miocárdio ocorre quando a artéria coronária é obstruída, causando isquemia do tecido cardíaco e é seguido pelo remodelamento cardíaco caracterizado por alterações moleculares, celulares e intersticiais que se manifestam através de alterações da forma, da função e do tamanho do coração (Cohn et al.5, 2000).

Apesar dos avanços obtidos nos últimos anos, a patogênese do infarto do miocárdio é ainda exten-samente estudada, buscando-se a compreensão dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos nas síndro-mes coronarianas para prevenção e tratamento da insuficiência cardíaca que se segue.

O modelo de ligadura da artéria coronária esquer-da no rato se tornou o modelo de escolha para o estudo do infarto do miocárdio nos últimos 30 anos. Além da semelhança com os seres humanos em re-lação às alterações morfológicas e funcionais após o

infarto do miocárdio, o desenvolvimento da insufici-ência cardíaca e a baixa taxa de mortalidade após a fase aguda, o baixo custo e o fácil manuseio do animal tornaram o modelo indispensável nas pesquisas car-diovasculares.

Há características peculiares da oclusão da artéria coronária esquerda em ratos, tais como a ocorrência frequente de infarto do miocárdio transmural e su-bendocárdico e o maior acometimento do ápice do coração esquerdo e menor da base (Zornoff et al.6, 2009).

Diversos métodos foram propostos para a deter-minação do tamanho do infarto:

1) Determinação da área infartada em relação à área do ventrículo esquerdo, determinada por pe-sagem (Boor e Reynolds7, 1977) ou por planimetria (Mill et al.8, 1990);

2) Determinação do perímetro interno da região infartada em relação ao perímetro total da cavidade por histologia (Pfeffer et al.9, 1979);

3) Determinação do volume de tecido cicatricial em relação ao volume de tecido remanescente, por sistema de contagem de pontos (Anversa et al.10, 1986) ou planimetria (Olivetti et al.11, 1991).

4) Determinação das circunferências epicárdicas e endocárdicas dos segmentos infartados e não infar-tados por histologia, método que tem sido o mais aplicado nos estudos experimentais. O cálculo para determinação do tamanho do infarto se utiliza de todos os cortes transversais, calculando-se um valor médio. Spadaro et al.12 (1980), propuseram a utiliza-ção apenas do corte transversal médio do ventrículo esquerdo, entre 5 e 6 mm a partir do ápice, o que simplificaria a determinação do tamanho do infarto. isto se deve ao fato dessa região refletir a média do tamanho do infarto de todo o ventrículo esquerdo.

No entanto, a manipulação do tecido cardíaco em todos esses métodos inviabiliza a sua utilização em análises bioquímicas ou moleculares, que necessitam da rápida preservação por congelamento ou do teci-do a fresco, o que explica o fato da análise da mag-nitude do infarto do miocárdio não ser contemplada nesses tipos de ensaios. Assim, é desejável estabele-cer um novo método de avaliação da magnitude do infarto a partir de fotomacrografias digitais, que pos-teriormente poderá ser aplicado na análise de cortes de corações a fresco.

75

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

Assim, o objetivo deste estudo é estabelecer uma nova forma de avaliar a magnitude do infarto do miocárdio em ratos, através da avaliação da medida do ângulo entre as bordas do infarto transmural em cortes histológicos e testar se as mesmas relações encontradas entre as alterações hemodinâmicas e funcionais com o tamanho de infarto ocorrem com a magnitude do infarto.

MateRIaIS e MétodoSEste estudo foi realizado de acordo com as nor-

mas estabelecidas pelo Colégio Brasileiro de Experi-mentação Animal e pelo The universities Federation for Animal Welfare e o protocolo experimental foi aprovado pela Cappesq-HCFMuSP (no 777/07).

Foram utilizados 68 Ratos Wistar machos, pesan-do entre 300-350 g, provenientes do Biotério Cen-tral da Faculdade de Medicina da universidade de São Paulo.

A técnica de infarto em ratos utilizada foi uma mo-dificação daquela descrita por (Selye et al.13, 1960). Sob anestesia com cloridrato de quetamina (125 mg/kg) e diazepan (1,5 mg/kg) e ventilação assistida (8 mL/kg, 60 ciclos/min), uma incisão transversal da pele foi realizada sobre o hemitórax esquerdo para expo-sição dos músculos peitorais, os quais foram delicada-mente afastados. A seguir, a toracotomia esquerda foi realizada ao nível do terceiro espaço intercostal para visibilização da parede ântero-lateral do ventrículo esquerdo, próxima à base do coração. Após pericar-diotomia, a artéria coronária esquerda foi localizada na região entre o átrio esquerdo e a emergência da artéria pulmonar. A ligadura da artéria foi realizada com fio de nylon 6.0, um a dois mm após a origem. A isquemia resultante pôde ser verificada pelo des-coramento muscular da parede livre do ventrículo esquerdo. A parede do tórax foi suturada com fio de algodão 3.0 e o ar do espaço pleural drenado. Os músculos peitorais foram reposicionados.

Ao final de sete dias de seguimento, foram reali-zadas medidas hemodinâmicas sob a mesma mistura anestésica. Para as medidas das pressões do ventrículo esquerdo, foi realizada a canulação da artéria carótida direita com cateter de policloreto de vinila (0,05 mm de diâmetro) preenchido com solução fisiológica he-parinizada. O cateter foi introduzido até o ventrículo esquerdo e acoplado ao transdutor de pressão para identificação e registro das curvas hemodinâmicas sis-

têmicas e ventriculares. O transdutor de pressão foi, então, acoplado a um pré-amplificador calibrado (Ge-neral Purpose Amplifier 4 – modelo 2, Stemtech inc., Wiscowsin, EuA) e a um sistema computadorizado de aquisição (Windaq/Dataq, Dataq instruments inc., Akron, Ohio, EuA). As medidas hemodinâmicas ven-triculares foram registradas batimento a batimento, por 10 minutos, após a estabilização das curvas.

Foram consideradas: 1) Diferença entre a pressão arterial média e a

pressão diastólica final do ventrículo esquerdo, para cálculo da pressão de perfusão coronariana (PPC, mmHg).

2) A velocidade máxima de elevação da pressão ventricular durante a sístole (+dP/dt, mmHg/s) como índice de função sistólica e a velocidade máxima de queda da pressão ventricular durante a diástole (-dP/dt, mmHg/s) como índice de função diastólica do ven-trículo esquerdo.

Após a avaliação hemodinâmica, os animais foram sacrificados com dose extra de anestésico e cloreto de cádmio (1 ml/100g, 100 mM, Sigma) para parada em diástole. A seguir, o coração foi lavado com solu-ção fisiológica 0,9% e fixado com solução tamponada de formol 10%.

O coração foi segmentado em quatro porções do ápice à base (cortes A, B, C e D) (Figura 1) e pro-cessado em parafina para realização de cortes coro-nais de 5 micrometros de espessura. Os cortes foram montados em lâminas de vidro e corados com Picro-sirius red.

Foram considerados para a análise apenas os co-rações que apresentavam infarto transmural bem de-finido no ventrículo esquerdo.

Para as avaliações morfométricas foram utilizadas fotos obtidas com o uso de uma lente óptica tele-macro (28-70mm, Tamron, Japão) e câmera digital de 7,2 Mp. As fotos apresentavam 1280 x 960 pixels de dimensões e cerca de 600 kb. Para o cálculo do tama-nho de infarto foi utilizado apenas o corte equatorial central (corte C) e o programa image J (NiH, EuA). O tamanho do infarto (%) foi estimado calculando-se a média dos tamanhos do infarto externo e interno. O infarto externo foi calculado pela razão percentual entre o comprimento da superfície epicárdica com infarto e o comprimento total da superfície epicárdica do ventrículo esquerdo. O infarto interno foi calcu-lado pela razão percentual entre o comprimento da

76

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

superfície endocárdica com infarto e o comprimento total da superfície endocárdica do ventrículo esquer-do (Spadaro et al.12, 1980).

Para o cálculo da magnitude do infarto nas qua-tro porções, foi utilizado programa Microsoft Power-point (PPT), régua e transferidor de 360º.

A magnitude do infarto nos quarto cortes trans-versais do coração foi estimada medindo-se a angu-lação das bordas da parede do infarto. Para tanto, a imagem de cada lâmina, com quatro cortes, obtida com câmera digital e colada em uma apresentação do programa PPT (Figura 2).

uma circunferência e duas retas foram desenha-das em cada corte para estabelecer o centro do ven-trículo (Figura 3).

A apresentação PPT foi ampliada para mensurar

a angulação entre as bordas da parede do infarto, sobrepondo-se o transferidor sob a tela do monitor (Figura 4).

Cada slide foi salvo em formato de imagem com extensão JPEG (Figura 5).

Posteriormente, análise semelhante foi realizada no programa image J (Figura 6 e 7), para confrontação de ambas as técnicas e confirmação dos resultados. A ferramenta para mensuração de ângulo foi utilizada aproveitando-se o centro localizado pelos recursos

Figura 1– esquema dos cortes equatoriais do coração.

Figura 3– fotomacrografias digitais de lâmina com cortes do coração corados com Picrosirius red observadas pelo Programa Powerpoint onde foram desenha-das circunferências em torno do ventrículo esquer-do e localizado o centro (linhas pretas).

Figura 2– fotomacrografias digitais de lâmina com cortes do coração corados com Picrosirius red observadas pelo programa powerpoint.

Figura 4– Aumento da imagem de corte do coração corado com picrosirius red. pronto para mensuração da an-gulação, com transferidor, entre as bordas do infarto (corado com vermelho).

77

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

Figura 5 – Processo de salvar o slide em forma de imagem com extensão JpeG.

Figura 7 – Mensuração da angulação (linha amarela) e o resultado (quadro no canto inferior direito) utilizando-se o programa image J.

figura 6 – ferramenta de medida de ângulo do programa image J ativado. observe que a mesma foto pode ser utilizada para a mensuração pelo software. do programa PPT.

Por apresentar apenas cerca de 1% de diferenças intraobservador e 5% de diferença interobservado-res, foi considerado que os resultados obtidos pelo uso de transferidor foram válidos para apresentação nesta monografia.

análISe eStatíStICaOs resultados foram computados em planilhas do

programa Excel (Microsoft® Excel 2007) e posterior-mente analisados utilizando-se o programa SigmaStat (Sigma Stat for Windows Version 3.1, SysStat Softwa-re, inc., EuA). Os dados estão expressos em média–

Figura 8 – Magnitude do infarto do miocárdio, obtida pela mensuração do ângulo entre as bordas da parede de infarto. os cortes se referem ao ápice (a), equa-toriais (b e c) e base (D). o losango representa o valor da média e o erro-padrão médio encontrado em cada corte. Dados analisados pela analise de Variancia para medidas repetidas e Student-newman-Keuls como teste post-hoc. Houve dife-renças estatísticas entre todos os cortes estudados (p<0,05).

erro-padrão (mínimo-máximo). O valor de p<0,05 foi estabelecido como significativo.

A análise de variância para medidas repetidas foi

78

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

utilizada para comparação da magnitude do infarto entre os quatro cortes e utilizado teste de post-hoc Student-Newman-Keuls para localizar as diferenças estatísticas.

A análise de regressão linear simples foi utiliza-da para investigar as possíveis associações entre: 1) a magnitude do infarto e o tamanho de infarto e 2) a magnitude do infarto ou tamanho de infarto e as variáveis hemodinâmicas e funcionais (PPC e função ventricular).

ReSultadoS

O termo magnitude do infarto foi utilizado para representar o modelo novo proposto neste trabalho e o termo tamanho de infarto mantido para o méto-

Figura 9 – relação entre tamanho e magnitude do infarto do miocárdio, no corte b (à esquerda) e no corte c (à direita). os valores de p (<0,001) e o valor de r (>0,55) são significantes.

Tabela 1 – coeficientes de correlação e valores de p obtidos na análise das relações entre a morfometria (tamanho de infarto e magnitude do infarto) e hemodinâmica (ppc e função ventricular) no seguimento de sete dias após o infarto do miocárdio.

PPC (mmHg) +dP/dt (mmHg/s) -dP/dt (mmHg/s)R P r p r p

Tamanho de infarto (%) -0,354 0,005 -0,254 0,047 -0,344 0,006

Magnitude do infarto (%)

corte b -0,217 0,091 -0,316 0,012 -0,297 0,019Corte C -0,343 0,007 -0,222 0,089 -0,293 0,023

PPC: pressão de perfusão coronariana; +dP/dt: índice de função sistólica; -dP/dt: índice de função diastólica; mmHg: milímetro de mercúrio.

do proposto por Spadaro et al.12 (1980).Os valores de magnitude do infarto, medidos pela

angulação das bordas do infarto, em 4 diferentes por-ções do coração (ápice-base), estão apresentados na Figura 8. A análise estatística indicou que cada corte é distinto dos demais (p<0,001).

O tamanho de infarto medido no corte C foi de 42,2%±1,42 (23,8-67,9).

Entre os quatro cortes, apenas os cortes B e C apresentaram correlação da magnitude do infarto medido pela angulação com o tamanho do infarto medido pela extensão (Figura 9).

O tamanho de infarto mostrou relação inversa com a PPC e com a função sistólica e diastólica. Da mesma forma, a magnitude do infarto mostrou re-

79

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

lação inversa com PPC no corte C, e com a função ventricular sistólica e diastólica no corte B (Tabela 1). Os cortes A e D não apresentaram correlações com a PPC ou a disfunção ventricular.

dISCuSSãoOs avanços nas pesquisas cardiovasculares, em

grande parte, se devem à utilização de modelos experimentais de cardiopatias. O modelo de infarto do miocárdio em ratos foi proposto, ao final da década de 40, por (Heimburger 14, 1946). Desde então, vem sofrendo diversas modificações: as primeiras foram propostas por Selye et al.13 (1960), Kaufman et al.15 (1959), Johns e Olson16 (1954), Fishbein et al.17 (1978) e Fletcher et al.18 (1981). No Brasil, a técnica foi trazida na década de 80 pelo Prof. Joel Spadaro, atualmente professor titular aposentado da Faculdade de Medicina da universidade Julio de Mesquita Neto (uNESP) de Botucatu. Spadaro et al.12 (1980), Zornoff et al.6 (2009) apresentam um panorama histórico e uma análise detalhada do modelo de infarto em rato.

O modelo de infarto em ratos utilizado neste es-tudo foi uma adaptação realizada no Laboratório de Hipertensão do instituto do Coração (HC-FMuSP), em meados dos anos 90, com base no modelo de Se-lye et al.13 (1960). A modificação mais importante foi manter o coração in situ no interior da caixa torácica e adicionar lidocaína como tratamento agudo da liga-dura da coronária, o que contribuiu para a redução da taxa de mortalidade de 50-60% para 20% e obtenção de tamanhos de infarto entre 30-70% (de Carvalho Frimm et al.19, 2003, Koike et al.20, 2005, Koike et al. 21, 2007, Koike et al.22, 2006).

Do mesmo modo que o modelo de infarto sofreu adaptações, a forma de estimar o impacto do infarto também se modificou ao longo do tempo. A deter-minação da área infartada em relação à área do ven-trículo esquerdo, determinada por pesagem (Boor e Reynolds7, 1977) ou por planimetria (Mill et al.8, 1990) tem sido utilizada por muitos pesquisadores. Primei-ramente, a técnica consiste em separar a parede de infarto e a parede não infartada. As porções podem ser pesadas ou escaneadas/fotografadas para poste-rior medida da área de tecido. No entanto, deve-se considerar que o tecido cicatricial é um tecido mais leve que o tecido muscular, o que prejudica uma mensuração por pesagem. O coração, por sua for-

ma característica, pode se deformar ao ser colocado em apenas um plano. Além disso, o remodelamento cardíaco, como processo contínuo, leva à dilatação da cavidade ventricular, ao afinamento e à expansão da parede de infarto. Considerando-se esses fatos, torna-se inadequada a mensuração da área por plani-metria, esterologia ou métodos similares.

A determinação do perímetro interno da região infartada em relação ao perímetro total da cavida-de por histologia, proposta por Pfeffer et al.9 (1979), não leva em consideração a variação existente entre a ocorrência de infarto subendocárdico e subepi-cárdico. Pensando nisso, foi proposta a técnica que estima o tamanho do infarto pela média das circun-ferências epicárdicas e endocárdicas dos segmentos infartados e não infartados (Spadaro et al.12, 1980). Essa técnica tem sido amplamente aplicada em estu-dos experimentais de isquemia miocárdica (infarto e isquemia-reperfusão). Segundo Zornoff et al.23 (2009), é o método mais recomendado, pois leva-se em con-sideração a variação na proporção de infarto suben-docárdio e subepicárdico desse modelo. Agudamen-te, essa técnica de mensuração pode ser utilizada para estimar o tamanho de infarto no coração a fresco, pois o coração infartado se encontra em fases iniciais do remodelamento cardíaco. Entretanto, se conside-rarmos o afinamento da parede de infarto decorrente do remodelamento crônico, a mensuração a fresco fica prejudicada.

Na técnica proposta no presente trabalho, apesar de cada corte apresentar angulação distinta, houve re-lação entre as porções equatoriais do coração (corte B e C) e o tamanho de infarto mensurado no corte C, indicando que, nos cortes histológicos processados, a mensuração pela média das circunferências endo-cárdicas e epicárdicas do infarto e a angulação entre as bordas da parede de infarto apresentam estreita relação quando consideradas no plano equatorial do coração.

O processo de expansão e afinamento da parede de infarto, a hipertrofia do miocárdio remanescente e a dilatação ventricular (Cohn et al.5, 2000, Sutton e Sharpe 24, 2000), o desenvolvimento da esfericidade cardíaca (Zornoff et al.6, 2009, Pfeffer25, 1995), carac-terísticas do remodelamento cardíaco após infarto, que tanto podem comprometer a estimativa do ta-manho de infarto, pouco interferem na mensuração

80

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

da magnitude medida pela angulação. As relações entre o tamanho de infarto e as al-

terações hemodinâmicas e funcionais são conheci-das (Zornoff et al.6, 2009, de Carvalho Frimm et al.19, 2003, Koike et al.21, 2007). Neste trabalho, demons-trou-se que de maneira similar a relação inversa exis-tente entre o tamanho de infarto e a PPC e entre o tamanho de infarto e as funções ventriculares, foram encontradas para a magnitude do infarto nos cortes equatoriais, reproduzindo as relações esperadas para o coração infartado.

LimitaçõesA proposta da magnitude do infarto foi realizada

em cortes histológicos processados em parafina, vi-sando-se estabelecer e validar a técnica de magnitude do infarto pela angulação. Entretanto, a técnica não foi aplicada em fotomacrografias de cortes a fresco.

O corte transversal do coração normal não re-presenta um círculo perfeito, nem em sua porção epicárdica, tão pouco em sua porção endocárdica. O coração infartado, apesar de apresentar gradati-vamente certa esfericidade, não apresenta um círcu-lo em sua porção equatorial transversal. é certo que

a estimativa da magnitude do infarto considerou a circunferência esférica ou ovalada, conforme o cor-te histológico, e um centro encontrado pelo cruza-mento de duas retas, não representando o centro da cavidade ventricular. Outra opção para este método seria considerar a extensão da cavidade ventricular para o cálculo do centro verdadeiro e a partir dele, considerar a angulação. Provavelmente, no recálculo, as correlações encontradas possam apresentar valo-res mais significantes.

Os valores apresentados no trabalho sobre a magnitude estão representados em graus. Poder-se-ia calcular a porcentagem de ângulo encontrado em relação à circunferência completa (360º) e, assim, encontrar um valor percentual como na técnica de mensuração do tamanho de infarto.

ConCluSãoA magnitude do infarto mensurada pela angulação

entre as bordas nos cortes equatoriais é uma técnica aplicável na estimativa do impacto do infarto sobre o coração, porque as medidas de magnitude mantêm estreita relação entre o tamanho de infarto e as vari-áveis hemodinâmicas e funcionais.

81

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

RefeRências

1. Brasil. Minisitério da Saúde. Proporção de óbitos por capital e grupo de causas: indica-dores de mortalidade. Data sus; 2006 [Acesso em: Abril 2010]; Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?idb2008/c04.def.

2. Brasil. Minisitério da Saúde. Taxa de mortalidade especifica por doenças do aparelho circulatório: doença isquêmica do coração por capital. Datasus; 2006 [Acesso em: Abril 2010]; Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?idb2008/c08.def.

3. Mathers CD, Loncar D. Projections of global mortality and burden of disease from 2002 to 2030. PLoS Med 2006 Nov;3(11):e442.

4. Brasil. Minisitério da Saúde. i20-i25: doenças isquêmicas do coração. Datasus; 2008 [Acesso em 2008]; Disponível em: http://www.datasus.gov.br/cid10/v2008/webhelp/i20_i25.htm.

5. Cohn JN, Ferrari R, Sharpe N. Cardiac remodeling--concepts and clinical implications: a consensus paper from an international forum on cardiac remodeling. Behalf of an International Forum on Cardiac Remodeling. J Am Coll Cardiol 2000 Mar 1;35(3):569-82.

6. Zornoff LAM, Paiva SAR, Minicucci MF, Spadaro J. infarto do miocárdio experimental em ratos: análise do modelo. arq bras cardiol 2009 93(434-40.

7. Boor PJ, Reynolds ES. A simple planimetric method for determination of left ventri-cular mass and necrotic myocardial mass in postmortem hearts. Am J Clin Pathol 1977 Sep;68(3):387-92.

8. Mill JG, Stefanon i, Leite CM, Vassallo DV. Changes in performance of the surviving myocardium after left ventricular infarction in rats. Cardiovasc Res 1990 Sep;24(9):748-53.

9. Pfeffer MA, Pfeffer JM, Fishbein MC, Fletcher PJ, Spadaro J, Kloner RA, et al. Myocardial infarct size and ventricular function in rats. Circ Res 1979 Apr;44(4):503-12.

10. Anversa P, Beghi C, Kikkawa Y, Olivetti G. Myocardial infarction in rats. infarct size, myocyte hypertrophy, and capillary growth. Circ Res 1986 Jan;58(1):26-37.

11. Olivetti G, Capasso JM, Meggs LG, Sonnenblick EH, Anversa P. Cellular basis of chronic ventricular remodeling after myocardial infarction in rats. Circ Res 1991 Mar;68(3):856-69.

12. Spadaro J, Fishbein MC, Hare C, Pfeffer MA, Maroko PR. Characterization of myocar-dial infarcts in the rat. Arch Pathol Lab Med 1980 Apr;104(4):179-83.

13. Selye H, Bajusz E, Grasso S, Mendell P. Simple techniques for the surgical occlusion of coronary vessels in the rat. Angiology 1960 Oct;11(398-407.

14. Heimburger RF. injection into pericardial sac and ligation of coronary artery of the rat. Arch Surg 1946 Jun;52(677-89.

15. Kaufman N, Gavan TL, Hill RW. Experimental myocardial infarction in the rat. AMA Arch Pathol 1959 May;67(5):482-8.

82

Canil R, Maldonado JS, Souza PRM, Koike MK. Determinação da magnitude do infarto do miocárdio por medida da angulação entre as bordas da parede infartada: proposta de nova técnica. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 73-82

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

16. Johns TN, Olson BJ. Experimental myocardial infarction. i. A method of coronary oc-clusion in small animals. Ann Surg 1954 Nov;140(5):675-82.

17. Fishbein MC, Maclean D, Maroko PR. Experimental myocardial infarction in the rat: qualitative and quantitative changes during pathologic evolution. Am J Pathol 1978 Jan;90(1):57-70.

18. Fletcher PJ, Pfeffer JM, Pfeffer MA, Braunwald E. Left ventricular diastolic pressure-volume relations in rats with healed myocardial infarction. Effects on systolic function. Circ Res 1981 Sep;49(3):618-26.

19. de Carvalho Frimm C, Koike MK, Curi M. Subendocardial fibrosis in remote myocar-dium results from reduction of coronary driving pressure during acute infarction in rats. arq bras cardiol 2003 May;80(5):509-20.

20. Koike MK, de Carvalho Frimm C, de Lourdes Higuchi M. Bradykinin B2 receptor an-tagonism attenuates inflammation, mast cell infiltration and fibrosis in remote myocar-dium after infarction in rats. Clin Exp Pharmacol Physiol 2005 Dec;32(12):1131-6.

21. Koike MK, Frimm Cde C, Curi M. Low coronary driving pressure early in the course of myocardial infarction is associated with subendocardial remodelling and left ventricular dysfunction. Int J Exp Pathol 2007 Aug;88(4):279-90.

22. Koike MK, Moreira ED, da Silva GJ, Consolim-Colombo FM, ida F, irigoyen MC, et al. Resetting of aortic baroreceptors in response to hypotension does not alter gain sen-sitivity. Clin Exp Pharmacol Physiol 2006 Aug;33(8):679-84.

23. Zornoff LAM, Paiva SAR, Duarte DR, Spadaro J. Remodelação ventricular pós-infarto do miocárdio: conceitos e implicações clínicas. arq bras cardiol 2009 92: 157-64.

24. Sutton MG, Sharpe N. Left ventricular remodeling after myocardial infarction: patho-physiology and therapy. Circulation 2000 Jun 27;101(25):2981-8.

25. Pfeffer MA. Left ventricular remodeling after acute myocardial infarction. Annu Rev Med 1995 46(455-66.

ISSN 2176-9095

83

Science in Health 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

O PERFiL DE SAÚDE DOS iNDiVÍDuOS iDOSOS RESiDENTES NO MuNiCÍPiO DE GuARuLHOS

HealtH profile of elDerly resiDents in GuarulHos

Profa. dra. Fabiana augusto nemannelson Henrique da Silva

aBsTRacT

Address the needs of the search for a better quality of life for older people became interested in the subject, since we ob-served that many seniors age in an inappropriate manner in relation to what is known about healthy aging. Aiming to build a protocol guidelines for health professionals and qualified for the elderly population, this study based on the opinions of 40 senior enrolled at UBS Jardim Palmira, in Guarulhos. Is a questionnaire whith 19 questions, and among the most relevant responses, 62.5% did not practice any physical activity, 57.5% did not have many friends and 70% did not practice any type of leisure acti-vity with friends. It is discussed the need for greater knowledge about healthy aging and also the guidance on the topic to the aid of the elderly.

Key-woRds: Health of the Elderly • Quality of Life • Health Services for the Aged

Resumo

Perante as necessidades da busca de melhor qualidade de vida para os indivíduos idosos, surgiu o interesse pelo tema, já que existem inúmeros idosos que envelhecem de uma maneira inadequada em relação ao que se conhece sobre envelhecimento saudável. Com o objetivo de montar um protocolo de orientação para profissionais de saúde habi-litados e para a população idosa, este estudo tem como base as opiniões de 40 idosos cadastrados na UBS Jardim Palmira, no município de Guarulhos. Com isso, foi elabora-do um questionário composto de 19 questões, sendo que, dentre as respostas mais relevantes, 62,5% não praticam atividade física, 57,5% não possuem muitos amigos e 70% não praticam nenhum tipo de atividade de lazer com os amigos. Discute-se a necessidade de maior conhecimento sobre envelhecimento saudável e também para o auxílio a indivíduos idosos.

PalavRas-chaves: Saúde do Idoso • Qualidade de Vida • Ser-viços de Saúde para Idosos

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

84

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

IntRoduçãoé inegável o fato de que a população está envelhe-

cendo de maneira muito acelerada e que os idosos vêm sendo o foco de diversos assuntos relacionados ao envelhecimento saudável. Junto com essa perspec-tiva, é necessária a definição de indivíduo idoso. De acordo com Mazo et al.1 (2001), a Organização Mun-dial de Saúde (OMS) considera idoso o indivíduo com idade igual ou superior a 65 anos, residente em países desenvolvidos e com 60 anos ou mais para países em desenvolvimento. Outra classificação, baseada na Or-ganização Mundial de Saúde e citada por Weineck2 (1991), subdivide a idade adulta em quatro estágios: meia idade: 45 a 59 anos, idoso: 60 a 74 anos, ancião: 75 a 90 anos e velhice extrema: acima de 90 anos.

Para expressar a relevância do assunto, diversos estudiosos avaliam a quantidade crescente de idosos no Brasil por meio de pirâmides etárias, as quais são estabelecidas, principalmente, pelo Instituto Brasilei-ro de Geografia e estatística (iBGE). uma perspectiva do número de idosos para 2050 e a pirâmide etária do Brasil seguem abaixo.

Com a análise dos dados acima, surge à preo-cupação com o estado de saúde que esses idosos apresentarão futuramente. Com isso, termos como senescência e senilidade estão sendo cada vez mais utilizados e sua definição torna-se necessária.

De acordo com Simões3 (1999), senescência é caracterizada como um fenômeno fisiológico, arbi-trariamente identificado pela idade cronológica, que pode ser considerado como um envelhecimento sa-dio, em que o declínio físico e mental é lento, sendo compensado, de certa forma, pelo organismo e seni-lidade caracteriza-se pelo declínio físico associado à desorganização mental. Ela não é exclusiva da idade avançada e pode ocorrer prematuramente, pois se identifica com uma perda considerável do funciona-mento físico e cognitivo, observável pelas alterações na coordenação motora, a alta irritabilidade, além de uma considerável perda de memória. A senilidade pode ser exacerbada através de atitudes pessimistas em relação à vida, ao futuro, a si mesmo e aos outros. Também é importante citar que inúmeros fatores que corroboram com a senilidade estão envolvidos

Fonte: iBGE

Gráfico 1 – projeção da população com 80 anos ou mais de idade por sexo.

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

85

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

no surgimento de doenças e desvalorização do idoso. Esse tópico refere-se aos preconceitos e tabus que, incorporados e reproduzidos pelos próprios idosos, acentuam a tendência de segregação dos mais velhos, sustentada pela ideia de que são pessoas que exis-tiram no passado e que aguardam seu momento de “sair inteiramente da cena do mundo” (Birman4, 194).

é inegável o fato de que as características de saúde de um inivíduo que envelhece estão intimamente rela-cionadas com seus hábitos e vícios, prática de exercí-cios físicos, condição financeira, entre outros fatores. Com isso, uma boa qualidade de vida pode ter influ-ência direta na saúde do idoso e uma definição dessa qualidade torna-se necessária: “a percepção do indi-víduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupa-ções” (WHOQOL5, 1994).

Na perspectiva de Zlotnick e Decker6 (1991), a medida de qualidade de vida compreende vários in-dicadores, tais como condições de saúde, segurança,

Fonte: iBGE

Gráfico 2: pirâmide etária do brasil entre 1997 e 2007

ansiedade, depressão, dependência de drogas, função intelectual e sexual, satisfação de vida e suporte so-cial. Da mesma forma, diversos autores citados por Oleson7 (1990), afirmam que as definições de indica-dores subjetivos e objetivos de qualidade de vida têm incluído os fenômenos físicos e psicológicos. Aliadas ao exposto acima, diversos fatores que interferem na qualidade de vida e ocorrem de maneira exponencial com o idoso devem ser lembrados, sendo que entre os mais corriqueiros encontram-se a perda da saú-de e da autonomia, preconceito por parte da família, aposentadoria e sensação de inutilidade e dificuldades para ser empregado.

Para que uma pessoa tenha oportunidades para envelhecer de maneira saudável é extremamente ne-cessária a promoção de saúde, visto que o conheci-mento e o esclarecimento sobre o tema senescência podem fazer com que inúmeras patologias sejam evi-tadas. Atualmente, a importância do desenvolvimento de ações voltadas à promoção da saúde vem sendo destacada em nível mundial. Trata-se de uma ideia an-

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

86

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

tiga na Saúde Pública e que tem origem no reconheci-mento de que para a melhoria da saúde da população é necessário garantir o acesso a boas condições de vida e de trabalho. Na década de 1980, conforme cita-do por Kickbusch8 (1994), a Organização Mundial de Saúde definiu a promoção da saúde como o processo que consiste em proporcionar aos povos os meios necessários para melhorar sua saúde e exercer um maior controle sobre ela.

De acordo com Assis9 (2002), pode ser extrema-mente difícil orientar as pessoas com base apenas em programas prontos ou grupos de apoio, já que o con-texto em que os indivíduos vivem pode e deve ser levado em consideração. A promoção da saúde re-conhece tais implicações e preconiza um conjunto de estratégias que incluem a implementação de políticas públicas saudáveis e a criação de ambientes favoráveis à saúde como dimensões fundamentais da responsa-bilidade social da saúde. isso significa que a saúde não deve se encerrar nas ações do próprio setor, mas envolver todas as áreas, governamentais ou não, cujas ações repercutam na qualidade de vida da população.

Baseando-se nos termos citados acima, é impor-tante que haja mecanismos para desenvolver a pro-moção de saúde. Dentre esses mecanismos podemos encontrar papéis educativos mediados por médicos, encontros de grupos de idosos, ações de atividade física, entre outros. Com isso, Assis9 (2002), comenta que as ações educativas em saúde buscam, a partir do encontro afetivo entre agentes educativos e idosos, recuperar para estes:

• Direito à informação e ao debate crítico sobre aspectos gerais de saúde e sobre prevenção e controle de doenças e agravos no processo de envelhecimento;

• Sentido de humanidade, pelo reforço da auto-estima e reconhecimento e valorização de sua história de vida, suas percepções sobre a ve-lhice e seus direitos e possibilidades de ação;

• Sentido da autonomia e do papel de sujeito político na construção da dignidade do enve-lhecer.

Perante os aspectos discutidos acima, é importan-te ressaltar que o médico é um importante profissio-nal que atua na promoção de saúde para os indivíduos idosos. A escassez de material científico relacionada especificamente ao papel desse profissional na pro-

moção de saúde para idosos levou ao conhecimen-to de uma nova ciência, a gerontologia, que estuda o processo de envelhecimento, na qual o médico está inserido. De acordo com Sá10 (1999), não existe ain-da o profissional da gerontologia, mas o médico, o assistente social, o psicólogo, o enfermeiro e outros profissionais que se “especializam” em gerontologia. Todos responsáveis pelo cuidado ao idoso em suas diferentes dimensões. Ainda de acordo com a autora, a gerontologia atua “estabelecendo a ligação entre os elementos intermediários que vão aflorando, preen-chendo os hiatos deixados pelas ciências, trabalhando o caráter dialético de seu objeto específico, ao mes-mo tempo uno e diverso” (Sá10 1999).

MétodoA busca de novos horizontes para um assunto tão

importante como a senescência nos motivou a reali-zar um estudo de caráter qualitativo, por pretender analisar as condições em que os indivíduos idosos cadastrados na unidade Básica de Saúde do bairro Jardim Palmira, no município de Guarulhos, estão en-velhecendo.

O trabalho proposto foi realizado em três etapas, as quais consistiram em: coleta dos dados fornecidos pelos idosos da região, tabulação das respostas obti-das e elaboração de um protocolo de orientação para os profissionais de saúde da região e também para os idosos, proporcionando um auxílio sobre como trabalhar no sentido da prevenção de doenças e de manter um hábito de vida mais saudável para enve-lhecer com maior qualidade de vida, respectivamente.

Os dados obtidos foram submetidos ao procedi-mento de análise adequado a cada uma das etapas da coleta de dados, possibilitando a conclusão desta pesquisa.

Para o alcance do objetivo proposto foi utilizado um questionário composto de perguntas fechadas, as direcionadas para uma população de 40 indivíduos idosos cadastrados na uBS Jardim Palmira, no mu-nicípio de Guarulhos. A coleta de dados foi realizada após aprovação do Comitê de ética em Pesquisa da universidade.

Com a análise dos resultados obtidos, foi possível reconhecer o perfil de envelhecimento desses idosos, trabalhar demandas de saúde para otimizar a quali-dade do processo de envelhecimento saudável, além

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

87

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

de orientar os profissionais de saúde e também os cadastrados no sentido de prevenção de doenças e atividades que permitam uma melhor qualidade de vida, por meio de um protocolo de orientação.

aPReSentação doS ReSultadoSNa busca de respostas, após a aplicação do ins-

trumento de coleta de dados, com um total de 40 indivíduos idosos, foi possível obter as seguintes in-formações:

1- O senhor (a) pratica atividade física?

62,5%

37,5%

Sim

Não

Gráfico I – Percentual de idosos que praticam atividade física, 2010.

é inegável o fato de que as características de saú-de de um individuo que envelhece estão intimamen-te relacionadas com seus hábitos e vícios, prática de exercícios físicos, condição financeira, entre outros fatores.

II - Se não, já praticou em alguma fase de sua vida

90%

10%

Sim

Não

Gráfico II – Percentual de idosos que já praticaram ativida-de física, 2010.

iii – Quais as atividades de lazer realizadas no mo-mento?

5%

74%

0%

12,5%

7,5%

TV

Caminhada

Passeios

Outros

Teatro ou Cinema

Gráfico III – Percentual de atividades de lazer realizadas atualmelmente, 2010.

iV – O senhor (a) tem algum vício?

87,5%

12,5%

Não

Álcool

Gráfico IV – Percentual de idosos que têm algum vício, 2010.

V – Considera-se nervoso ou ansioso?

90%

10%

Sim

Não

Gráfico V – Percentual de idosos que se consideram ansio-sos, 2010.

De acordo com Simões3 (1998), em idosos senes-

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

88

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

centes, identifica-se com uma perda considerável do funcionamento físico e cognitivo, observável pelas al-terações na coordenação motora, a alta irritabilidade, além de uma considerável perda de memória.

Vi – O senhor (a) ainda trabalha?7,5%

92,5%

Sim

Não

Gráfico VI – Percentual de idosos que ainda trabalham, 2010.

Vii - Sente-se feliz com o trabalho?

Gráfico VII – Percentual de idosos que se sentem satisfeitos com seu trabalho, 2010.

Viii – Se não trabalha, percebeu mudança na qua-lidade de vida ou sensação de inutilidade após o tér-mino da atividade?

Diversos fatores que interferem na qualidade de vida, sendo que entre os mais corriqueiros encon-tram-se a perda da saúde e da autonomia, preconcei-to por parte da família, aposentadoria e sensação de inutilidade e dificuldades para ser empregado.

iX – O senhor (a) considera-se com uma condição financeira estável?

X – O senhor (a) depende de outras pessoas para

Gráfico VIII – Percentual de idosos que passaram por alteração de qualidade de vida ou sensação de inutilidade, 2010.

86,5%

13,5%

Sim

Não

45%

55%

Sim

Não

Gráfico IX – percentual de idosos que se consideram finan-ceiramente estáveis, 2010.

Gráfico X – percentual de idosos dependentes, 2010.

realizar suas atividades diárias?Xi – O senhor (a) é casado (a)?

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

89

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

22,5%

77,5%

Sim

Não

Gráfico XI – percentual de idosos casados, 2010.

Xii – Considera-se satisfeito com sua vida sexual?

28%

72%

Sim

Não

Gráfico XII – percentual de satisfação sexual, 2010.

Xiii – O senhor (a) tem muitos amigos?

42,5%

57,5%

Sim

Não

Gráfico XIII – Percentual de idosos que possuem amigos, 2010.

XiV – Realiza atividades de lazer com os amigos?

30%

70%

Sim

Não

Gráfico XIV – Percentual de idosos que praticam atividades de lazer, 2010.

XV – O senhor (a) tem alguma doença?

75%

25%

Sim

Não

Gráfico XV – Percentual de idosos que possuem doença, 2010.

XVi – Já esteve internado (a) por algum motivo de doença?

22,5%

77,5%

Sim

Não

Gráfico XVI – Percentual de idosos que já foram interna-dos, 2010.

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

90

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

XVii – O senhor (a) teve perda de memória im-portante nos últimos tempos?

80%

20%

Sim

Não

Gráfico XVII – Percentual de idosos que já tiveram perda de memória, 2010.

XViii – Sente-se rejeitad(o)a pela sociedade em que vive?

35%

65%

Sim

Não

Gráfico XVIII – Percentual de idosos que se sentem rejei-tados pela sociedade, 2010.

XiX – O que o senhor (a) considera importante para melhorar sua qualidade de vida?

34%

5%

27,5%

32,5% Viajar

Amigos

Esporte

Outros

Gráfico XIX – Percentual de atividades que podem melho-rar a qualidade de vida, 2010.

Quadro 1: Respostas mais frequentes:

1 - O senhor (a) pratica atividade física?Sim 62,5%

2 - Se não, já praticou em alguma fase de sua vida

Sim 90%

3 - Quais as atividades de lazer realiza-das no momento?

Caminhada 75%

4 - O senhor (a) tem algum vicio?Não 87,5%

5 - Considera-se nervoso ou ansioso?Sim 90%

6 - O senhor (a) ainda trabalha?Não 92,5%

7 - Sente-se feliz com o trabalho?Sim 100%

8 - Se não trabalha, percebeu mudança na qualidade de vida ou sensação de inutilidade após o término da atividade?

Sim 86,5%

9 - O senhor (a) considera-se com uma condição financeira estável?

Não 22,5%

10 - O senhor (a) depende de outras pessoas para realizar suas atividades diárias?

Não 100%

11 - O senhor (a) é casado (a)?Sim 77,5%

12 - Considera-se satisfeito com sua vida sexual?

Não 72%

13 - O senhor (a) tem muitos amigos?Não 57,5%

14 - Realiza atividades de lazer com os amigos?

Não 70%

15 - O senhor (a) tem alguma doença?

Sim 75%. A maioria com hipertensão

arterial

16 - Já esteve internado (a) por algum motivo de doença?

Não 77,5%

17 - O senhor (a) teve perda de memó-ria importante nos últimos tempos?

Sim 80%

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

91

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

18 - Sente-se rejeitada(o) pela socieda-de em que vive?

Não 65%

19 - O que o senhor (a) considera importante para melhorar sua qualidade de vida?

Viajar 35%

Fonte: Silva; Neman, 2010

ConSIdeRaçõeSDe acordo com a análise dos dados e embasados na

literatura referente ao assunto concluímos que para um envelhecimento saudável é necessária a prática de atividades físicas, atividades de lazer com amigos, evi-tar consumo de substâncias danosas à saúde como o tabaco e o álcool. Todos esses dados enquadram-se na definição de qualidade de vida, ou seja, na perspec-tiva de Segundo Zlotnick e Decker6 (1991), a medida de qualidade de vida compreende vários indicadores, tais como condições de saúde, segurança, ansiedade, depressão, dependência de drogas, função intelectual e sexual, satisfação de vida e suporte social.

é interessante o fato de que os idosos negam o consumo de tabaco e álcool, o que leva à reflexão sobre a omissão de informações sobre seus vícios, já que estes são um dos principais fatores para o avanço

do processo de senilidade.é fato que todas essas considerações são conhe-

cidas por muitos idosos e também por profissionais da saúde, mas é sempre necessária uma maior expla-nação sobre o assunto, já que, mesmo com o grande acesso a informações e o conhecimento do assunto pelos profissionais de saúde, muitos idosos ainda não seguem as orientações necessárias para que envelhe-çam com saúde.

A seguir, apresentamos uma proposta para orien-tação aos idosos, com o intuito de apoio nesta expe-riência.

1. Praticar atividades físicas, sendo a caminhada a mais indicada;

2. Atividades de lazer com amigos;3. Buscar grupos de terceira idade para maior

socialização;4. Alimentar-se de maneira adequada;5. Evitar o consumo de álcool e tabaco, preve-

nindo uma grande quantidade de doenças crô-nicas;

6. Evitar aposentadoria precoce apenas por mo-tivo financeiro;

7. Buscar formas alternativas de ocupação após a aposentadoria;

8. Procurar acompanhamento médico frequente para prevenir as doenças próprias do envelhe-cimento.

Neman FA, Silva NH. O perfil de saúde dos indivíduos idosos residentes no município de Guarulhos São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 83-92

92

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

RefeRências

1. Mazo G, Lopes M, Benedetti T. Atividade física e o idoso: concepção gerontológica. Porto Alegre: Sulina; 2001.

2. Weineck J. Biologia do esporte. São Paulo: Manole; 1991.

3. Simões R. Corporeidade e terceira idade: a marginalização do idoso. 3 ed. Piracicaba: uNiMEP; 1998.

4. Birman J. O futuro de todos nós: temporalidade, memória e terceira Idade na psicanáli-se. in: Veras R, editor. Terceira idade: envelhecimento digno para o cidadão do futuro. Rio de Janeiro: Relume-Dumará; 1995. p. 29-48.

5. WHOQOL G. The development of the World Health Organization quality of life as-sessment instrument (the WHOQOL). in: Orley J, Kuyken W, editors. Quality of life assessment: international perspectives. Heidelberg: Springer Verlag; 1994. p. 41-60.

6. Zlotnick C, Decker R. Home visiting outcomes and quality of life measures. J Commu-nity Health Nurs 1991 8(4):207-14.

7. Oleson M. Subjectively perceived quality of life. image J Nurs Sch 1990 Fall;22(3):187-90.

8. Kickbusch i. El autocuidado en la promoción de la salud. in: Salud OPd, editor. Promo-ción de la Salud: una antología. Washington: OPS; 1994. p. 235- 45.

9. Assis M. Educação em saúde e qualidade de vida: para além dos modelos, a busca da comunicação. Estud Saúde Coletiva 1998 169(3-30.

10. Sá J. Gerontologia e interdisciplinaridade: fundamentos epistemológicos. in: Neri A, Debert G, editors. Velhice e sociedade. Campinas: Papirus; 1999. p. 223-32.

93

Science in Health 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

Bagalhi, Ct*

alqualo-Costa, R**

* universidade Cidade de São Paulo (011) 2178-1240 R. Cesário Galeno 445 São Paulo 03071-000 – SP [email protected]** universidade Cidade de São Paulo (011) 2178-1240 R. Cesário Galeno 445 São Paulo 03071-000 – SP [email protected].

PREVALêNCiA DE DiSTÚRBiOS OSTEOMuSCuLARES RELACiONADOS AO TRABALHO EM FiSiOTERAPEuTAS

prevalence of worK relateD to musculosKeletal DisorDers in pHysical tHerapists

Resumo

Introdução: Os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT) compreendem transtornos funcionais e mecânicos de origem ocupacional. O fisioterapeuta duran-te sua formação agrega conhecimentos que o capacitam a atuar na prevenção e reabilitação desses distúrbios, entre-tanto, não o imunizam contra seu aparecimento. O obje-tivo desse trabalho é indentificar a prevalência de DORT em fisioterapeutas atuantes na Universidade e instituições conveniados à UNICID. Métodos: Os dados foram cole-tados por meio de seis questionários: ficha de anamnese, SF-36, índice de capacidade para o trabalho, questionário DASH, Roland Morris e questionário Nórdico de Sintomas Osteomusculares; entregues juntamente com o Termo de Consentimento. Resultados: Participaram da pesquisa 61 fisioterapeutas, divididos em 9 grupos, denominados Gru-pos de Áreas. O local mais acometido por queixas foi o pescoço (57,4%), seguido da região lombar (50,8%) e da re-gião torácica (39,3%). A mediana da quantidade de queixas apresentadas foi de 2 (1–4,50). O grupo dos professores apresentou tendência a maiores quantidades de queixas no pescoço e na lombar em relação aos demais (p=0,099 e p=0,078, respectivamente). Não houve associação entre carga horária semanal e prática de proteção articular com a quantidade de queixas referidas (p=0,912 e p=0,905, respectivamente). Indivíduos que realizam exercício físico apresentaram tendência a maiores quantidades de queixas. Conclusão: Os locais mais acometidos foram pescoço, lom-bar e região torácica, sendo o grupo com mais queixas o dos Professores. Carga horária semanal e prática de prote-ção articular não apresentaram relação com a quantidade de queixas dolorosas. Houve uma tendência de que os pra-ticantes de exercício físico apresentem maior quantidade de queixas musculoesqueléticas.

PalavRas-chaves: Transtornos traumáticos cumulativos • Fi-sioterapia

aBsTRacT

Introduction: Work-related musculoskeletal disorders (WMSD) include mechanical and functional disorders of occupational origin. The physical therapist during the trai-ning process, adds knowledge that enable him to act in the prevention and rehabilitation of these disorders, however, will not immunize against his appearance. The aim of this work is to identify the prevalence rate of WMSD in physical therapists working in university and institutions under the UNICID. Methods: Data was collected by six questionnaires: anamnesis, SF-36, work ability index questionnaire, DASH questionnaire, Roland Morris and Nordic Musculoskeletal Questionnaire. Results: 61 physiotherapists participated in the survey, divided into nine groups, named groups of Areas. The most affected part was neck (57.4%), lumbar (50.8%) and thoracic (39.3%). The median number of com-plaints was 2 (1 to 4.50). Teachers’ group had a tendency to greater amounts of complaints in neck and lumbar than the others (p = 0.099 and p = 0.078, respectively). There was no association between weekly working hours and prac-tice of joint protection with the number of complaints (p = 0.912 and p = 0.905, respectively). Individuals who per-form exercise tended to have larger amounts of complaints. Conclusion: The most affected sites were neck, lumbar and thoracic. The group with more complaints was the Tea-chers. Weekly workload and practice of joint protection did not correlate with the amount of complaints. There was a tendency that the practice of physical exercise has a greater amount of musculoskeletal complaints.

Key-woRds: Cumulative trauma disorders • Physical therapy

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

94

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

IntRoduçãoOs distúrbios osteomusculares relacionados ao

trabalho (D.O.R.T) constituem um conjunto de trans-tornos funcionais e mecânicos de origem ocupacional que acometem músculos, tendões, fáscias, nervos, bolsas articulares e pontas ósseas.(Couto et al.1, 1998)

Apresentam como características comuns o apa-recimento / evolução de caráter insidioso e etiologia multifatorial complexa, em virtude da intensa intera-ção entre inúmeros fatores causais, dentre os quais: exigências mecânicas repetitivas, posturas biomeca-nicamente incorretas e fatores da organização do trabalho, como exigência e competitividade. (Brasil2, 2001) Não correspondem a lesões propriamente di-tas, por compreender sintomas percebidos em fases precoces, tais como fadiga, queda do desempenho, incapacidade temporária, alterações sensitivas e quei-xas dolorosas. (Couto et al.1, 1998, Brasil2, 2001)

Acredita-se que a maior visibilidade desse proble-ma na atualidade deva-se não somente ao aumento real do número de casos, mas também à intensa di-vulgação por parte da mídia, e ações de sindicatos de trabalhadores e serviços especializados na saúde do trabalhador. (Brasil2, 2001)

Antes da adoção das medidas terapêuticas a se-rem aplicadas nesses pacientes, torna-se de grande importância a compreensão dos mecanismos fisiopa-tológicos das DORTs (Brasil2, 2001)

O fisioterapeuta é um profissional de nível supe-rior com possibilidade de atuação em todos os níveis de atenção à saúde. Desenvolve ações em nível indi-vidual e coletivo, comprometido com a integralidade da assistência e participação/contribuição no contex-to social. (Brasil3, 1969)

As possíveis aéreas de atuação previstas pelo Con-selho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFiTTO) dividem-se em: Fisioterapia Clínica (am-bulatórios, consultórios, centros de reabilitação, hos-pitais e clínicas), Saúde Coletiva (ações básicas de saú-de, fisioterapia do trabalho, programas institucionais, vigilância sanitária), Educação (direção e coordenação de cursos, docência em nível secundário e superior, extensão, pesquisa e supervisão técnica e administra-tiva), além do esporte e indústria de equipamentos de uso fisioterapêutico.(Brasil3, 1969, COFITTO4)

Durante o período de formação profissional, o fisioterapeuta agrega conhecimentos referentes à

biologia, anatomia, fisiologia, patologia, biomecânica, cinesiologia, comportamento e cultura, capacitando-o a elaborar diagnósticos cinesiológico-funcionais, prescrever e executar condutas fisioterapêuticas com finalidade de restaurar, desenvolver e conservar a ca-pacidade física do paciente, sensibilizado e compro-metido com o ser humano (Brasil3, 1969). Entretanto, este notável arsenal de saberes e conhecimentos que habilitam o fisioterapeuta a atuar na prevenção e re-abilitação das DORTs, não o imunizam contra elas.

A prática da fisioterapia predispõe ao aparecimen-to de distúrbios musculoesqueléticos, em decorrên-cia da utilização do corpo do terapeuta, especialmen-te as mãos, como principal instrumento de trabalho. Além disso, envolve a necessidade de manter-se em posturas estáticas por tempo prolongado e realizar movimentos de flexão, extensão e rotação do tron-co por vezes associados à carga. Dentre as princi-pais áreas acometidas destacam-se a coluna lombar, coluna cervical, mãos e punhos em proporções que variam de acordo com a área de atuação e técnicas executadas (Carregaro et al.5, 2006)

Adicionalmente, aspectos culturais infundidos no contexto da Fisioterapia limitam a possibilidade do desenvolvimento da profissão de maneira a garantir a prevenção ou minimização dos riscos de distúrbios musculoesqueléticos, tais como a confiança de que os conhecimentos inerentes à profissão são suficien-tes para prevenir o aparecimento desses sintomas e a necessidade da auto-afirmação como profissionais capacitados e habilitados a cuidar do paciente, lhes conferindo uma característica de árduos trabalhado-res, que atuam mesmo quando lesionados (Cromie et al.6, 2002)

é estimado que cerca de um em cada seis fisio-terapeutas dos Estados unidos, em algum momento, mude de área de especialidade ou mesmo abandone a fisioterapia em virtude de doenças osteomusculares relacionadas ao trabalho (Cromie et al.7, 2000). Consi-derando a elevada prevalência de fisioterapeutas aco-metidos por tais distúrbios, a implicação na vida social e profissional desses indivíduos, e o ínfimo número de estudos realizados com a população de fisiotera-peutas brasileiros (Carregaro et al.5, 2006), destaca-se como de grande valor o desenvolvimento de estudos destinados a caracterizar o perfil dos acometimentos que atingem os profissionais brasileiros de maneira a

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

95

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

implementar medidas de conscientização e prevenção baseadas em nossa atual realidade.

O objetivo deste estudo é identificar a prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao tra-balho em fisioterapeutas atuantes em instituições de ensino e hospitais conveniados à universidade Cidade de São Paulo (uNiCiD).

MetodologIaA amostra foi composta por profissionais de fi-

sioterapia vinculados à universidade Cidade de São Paulo e por aqueles atuantes nas instituições conve-niadas, Beneficência Portuguesa de São Paulo e John-son Controls do Brasil. Foram excluidos da pesquisa os fisioterapeutas atuantes exclusivamente como do-centes.

A coleta de dados foi realizada por meio do pre-enchimento de seis questionários entregues a cada participante junto com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, para confirmação da participação no estudo. A partir do recebimento desse material, os profissionais dispuseram de um prazo de sete dias para sua devolução.

Para coleta das informações pertinentes ao estudo foram utilizados os seguintes instrumentos: ficha de anamnese, investigando fatores pessoais e profissio-nais; questionário genérico de avaliação de qualidade de vida SF-36; índice de capacidade para o trabalho; Disabilities of the Arm, Shoulder and Hand Question-naire – DASH; questionário Roland Morris e questio-nário Nórdico de Sintomas Osteomusculares (Cico-nelli et al.8, 1999, Martinez et al.9, 2009, Orfale et al.10, 2005, Nusbaum et al.11, 2001, Pinheiro et al.12, 2002).

Os dados foram expostos nos planos tabular e gráfico. A normalidade dos dados foi verificada com o teste de Kolmogorov-Smirnov e análise do normal plot (Vieira13, 2003)

A estatística descritiva constou do cálculo de mé-dia e desvio-padrão para todos os dados contínuos e semi-contínuos com distribuição normal e mediana e percentis 25 e 75 para aqueles com mesmo nível de mensuração, entretanto sem distribuição normal. As variáveis categóricas foram apresentadas em frequên-cia absoluta e relativa (Vieira13, 2003)

Para comparação de variáveis contínuas com distribuição normal entre os grupos foi utilizado o ANOVA para medidas não repetidas. Os coeficien-tes de variação foram comparados através do teste

de Levene, entretanto, em nenhum dos casos foi ne-cessária a utilização da correção de Brown-Forsythe. Quando adequado, foi utilizado o pós-teste de Bon-ferroni (Vieira13, 2003)

Para comparação de variáveis contínua e semi--contínuas com distribuição não normal entre grupos, foi utilizado o teste não paramétrico de Mann-Whit-ney. (Siegel14 1975)

Para comparação de variáveis categóricas entre os grupos, foi utilizado o teste não paramétrico de qui--quadrado de Pearson. (Siegel14, 1975)

Para as correlações, foi utilizada a correlação de Spearman. E foi assumido: |0,00| a |0,19| - correlação bem fraca; |0,20| a |0,39| - correlação fraca; |0,40| a |0,69| - correlação moderada; |0,70| a |0,89| - corre-lação forte; |0,90| a |1,00| - correlação muito forte (Vieira 13, 2003).

Foi assumido valor de α=5% como estatisticamen-te significante.

Para as análises, foi utilizado o software SPSS Sta-tistics 17.0 for Windows (SPSS, inc.).

ReSultadoSMediante a aprovação pelos Comitês de ética em

Pesquisa da universidade Cidade de São Paulo (pro-tocolo: 13501006) e da Real e Benemérita Associa-ção Portuguesa de Beneficência (protocolo: 625.10), iniciou-se a coleta de dados em junho de 2010, esten-dendo-se a setembro do mesmo ano.

Foram sujeitos da pesquisa 61 profissionais de fi-sioterapia vinculados à universidade Cidade de São Paulo e atuantes na Beneficência Portuguesa de São Paulo e Johnson Controls do Brasil, instituições con-veniadas à universidade.

uma vez que a desigualdade na proporção dos fisioterapeutas representantes das diversas áreas de especificidade da Fisioterapia impossibilitaria a ava-liação por área de atuação, optou-se por dividir os indivíduos de acordo com o local de proveniência, em nove grupos, denominados Grupos de áreas: Beneficência Portuguesa de São Paulo (BP), Johnson Controls do Brasil (JCi), Mestrado em Fisioterapia (Mestrado), Pós-Graduação em Acupuntura (Pós-Acupuntura), Pós-Graduação em Fisioterapia Car-diorrespiratória (Pós-Cardio), Pós-Graduação em Fisioterapia Dermato-Funcional (Pós-Dermato), Pós-Graduação em Ortopedia e Traumatologia Desporti-va (Pós-Ortopedia), Pós-Graduação em Fisioterapia

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

96

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

Pediátrica e Saúde Mental (Pós-Pediatria) e Professo-res da Graduação em Fisioterapia (Professores).

Os principais locais de atuação desses fisiotera-peutas avaliados são clínicas, domicílios e hospitais, respectivamente; entretanto, há certa parcela atuan-te em indústrias, universidades, unidades Básicas de Saúde e academias.

Em virtude da grande quantidade de grupos, os dados não foram apresentados de forma redundante, sendo apresentados em gráficos ou em tabelas.

A Tabela 1 sintetiza as principais características da amostra de fisioterapeutas avaliados.

A comparação das médias de idade entre os Gru-pos de áreas constatou diferença estatisticamente significante (p<0,05) entre o grupo de Professores e os demais grupos. Não houve concentração maior de indivíduos do sexo masculino num grupo em relação ao outro; a despeito dos grupos JCi e Professores serem compostos 100% por indivíduos do sexo fe-minino e do grupo Pós-Pediatria e Saúde Mental ser composto 50% por homens (p=0,444).

Quanto à carga horária semanal, não houve dife-rença estatisticamente significante (p=0,464) entre os

grupos, conforme representado na Figura 3. Vale ressaltar, ainda, que 30 (52,6%) dos fisiote-

rapeutas avaliados excediam às 30 horas semanais permitidas por lei para um mesmo emprego para a categoria.

Na comparação entre os grupos, observa-se que o grupo Pós-Cardio é o que possui a maior porcen-tagem de indivíduos trabalhando acima das 30 horas semanais, enquanto o grupo JCI apresenta o maior percentual trabalhando menos de 30 horas semanais. Apesar da aparente discrepância, a comparação entre os grupos quanto à carga horária semanal categoriza-da em 30 horas não demonstrou diferença estatistica-mente significante (p=0,636).

Quanto à pratica de exercício físico, constatou-se que a proporção de fisioterapeutas praticantes é semelhante à de fisioterapeutas não praticantes de exercício físico, não havendo diferença estatistica-mente significante entre estes (p=0,249). Da mesma forma, não houve diferença estatisticamente signifi-cante (p=0,848) na comparação entre os Grupos de áreas, como pode ser observado na Tabela 2. Ausên-cia de tempo livre e indisposição física foram os prin-cipais fatores destacados pelos fisioterapeutas como barreiras à prática de exercício físico.

Situação semelhante foi observada na comparação entre a quantidade de fisioterapeutas que utilizavam técnicas de proteção articular e conservação de ener-gia em relação àqueles que não utilizavam as mesmas técnicas, ou seja, tais quantidades não diferiram signi-ficativamente (p=0,159). A comparação entre os gru-pos também não revelou diferença estatisticamente significante (p=0,634).

Os principais cuidados quanto à proteção articu-lar e conservação de energia referidos pelos fisiotera-peutas envolviam a manutenção, durante a realização da terapia, de uma postura corporal adequada, englo-bando encaixe pélvico, leve flexão de joelhos e dis-tribuição balanceada do peso corporal nos membros inferiores, assim como a utilização de alavancas cor-porais para economizar energia e minimizar a carga sobre as articulações. Alguns poucos relataram alter-nar a utilização do membro superior dominante e não dominante, evitar movimentos de ombro acima do ní-vel dos olhos e instituir pausas durante as atividades.

A partir dos dados obtidos pelo Questionário Nórdico de Sintomas Osteomusculares, identifica-

VariáveisTotal

(n = 61)

idade (anos)

média (dp) 27,72 (5,91)

mínimo – máximo 21 – 46

Sexo – n (%)

Masculino 9 (14,8%)

Feminino 52 (85,2%)

Carga horária semanal (horas)

média (dp) 34,34 (15,89)

mínimo – máximo 5 – 90

Prática de exercício – n (%)

Sim 26 (42,6%)

Não 35 (57,4%)

uso de proteção articular e conservação de energia – n (%)

Sim 36 (59,0%)

Não 25 (41,0%)

Legenda: dp = Desvio-padrão; n = frequência absoluta; % = frequência relativa.

Tabela 1 – Principais Características da Amostra

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

97

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

Loca

lBP

(n

= 7

)JC

I (n

= 5

)M

estr

ado

(n =

5)

Pós-

Acu

pun-

tura

(n

= 1

1)

Pós-

Car

dio

(n =

4)

Pós-

Der

-m

ato

(n =

12)

Pós-

Ort

o-pe

dia

(n =

8)

Pós-

Pedi

a-tr

ia

(n =

4)

Prof

esso

res

(n =

5)

Tot

al

(n =

61)

Pesc

oço

n2

34

73

46

15

35

%28

,6%

60,0

%80

,0%

63,6

%75

,0%

33,3

%75

,0%

25,0

%10

0,0%

57,4

%

Om

bro

n2

02

21

45

13

20

%28

,6%

0%40

,0%

18,2

%25

,0%

33,3

%62

,5%

25,0

%60

,0%

32,8

%

Tor

ácic

an

32

23

13

62

224

%42

,9%

40,0

%40

,0%

27,3

%25

,0%

25,0

%75

,0%

50,0

%40

,0%

39,3

%

Cot

ovel

on

01

00

13

31

211

%0%

20,0

%0%

0%25

,0%

25,0

%37

,5%

25,0

%40

,0%

18,0

%

Punh

on

11

12

13

51

318

%14

,3%

20,0

%20

,0%

18,2

%25

,0%

25,0

%62

,5%

25,0

%60

,0%

29,5

%

Lom

bar

n3

22

62

56

14

31

%42

,9%

40,0

%40

,0%

54,5

%50

,0%

41,7

%75

,0%

25,0

%80

,0%

50,8

%

Qua

dril

n1

00

10

11

03

7

%14

,3%

0%0%

9,1%

0%8,

3%12

,5%

0%60

,0%

11,5

%

Joel

hon

20

03

02

21

313

%28

,6%

0%0%

27,3

%0%

16,7

%25

,0%

25,0

%60

,0%

21,3

%

Tor

noze

lon

01

01

11

30

29

%0%

20,0

%0%

9,1%

25,0

%8,

3%37

,5%

0%40

,0%

14,8

%

Tot

aln

1410

1125

1026

378

2716

8

%†

22,2

%22

,2%

24,4

%25

,3%

27,8

%24

,1%

51,4

%22

,2%

60,0

%-

Tab

ela

2 –

qua

ntid

ade

abso

luta

e re

lativ

a de

indi

víduo

s qu

e ap

rese

ntar

am a

que

ixa

no lo

cal e

spec

ifica

do n

os ú

ltim

os 1

2 m

eses

Lege

nda:

n =

freq

uênc

ia a

bsol

uta;

% =

freq

uênc

ia r

elat

iva;

† =

freq

uênc

ia r

elat

iva

com

bas

e no

tot

al d

e qu

eixa

s po

ssív

eis

para

aqu

ele

grup

o, o

u se

ja, q

uant

idad

e de

fisi

oter

apeu

tas

aval

iado

s m

ulti-

plic

ado

por

9 (n

úmer

o de

loca

is p

ossí

veis

de

quei

xa).

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

98

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

ram-se as queixas dolorosas referidas nos últimos 12 meses pelos fisioterapeutas avaliados. De modo geral, o local mais acometido foi o pescoço (57,4%), seguido da região lombar (50,8%) e da região torácica (39,3%).

Em nenhuma das regiões anatômicas avaliadas houve diferença estatisticamente significante entre os grupos quanto a prevalência de queixas.

Entretanto, na região do pescoço e lombar hou-ve uma tendência à significância estatística (p=0,099 e p=0,078, respectivamente), e a análise do resíduo ajustado demonstra que o grupo de Professores apresenta tendência a possuir maior quantidade de queixas no pescoço e na lombar em relação aos de-mais grupos.

As comparações entre os grupos nas demais re-giões apresentaram os seguintes valores de p: ombro (p=0,361), torácica (p=0,587), cotovelo (p=0,309), punho (p=0,385), quadril (p=0,675), joelho (p=0,346) e tornozelo (p=0,286).

Quanto ao grupo mais acometido por lesões é possível afirmar que, no presente estudo, o grupo Pós-Ortopedia apresentou a maior quantidade de queixas absolutas (37), contudo, deve-se ponderar o fato de que tal grupo possuía número de avalia-dos discrepante em relação aos demais. Assim sen-do, observa-se que o grupo de Professores é o que apresentou maior quantidade de queixas perante a quantidade de queixas possíveis nesse grupo.

A mediana da quantidade de queixas apresentadas pelos fisioterapeutas foi de 2 (1 – 4,50).

Para avaliação do papel da carga horária semanal na quantidade de queixas referidas pelos fisioterapeu-tas, foi realizada a correlação de Spearman. Como re-sultado, pode-se afirmar que não há associação entre a carga horária semanal e a quantidade de queixas referidas pelos avaliados (rho=0,015; p=0,912).

No intuito de verificar a associação entre o tem-po de formação profissional e a quantidade de quei-xas musculoesqueléticas apresentadas, foi conduzi-da nova correlação de Spearman. Observou-se que não há associação significativa entre essas variáveis (rho=0,154; p=0,235).

A avaliação do papel da prática de exercício físi-co na quantidade de queixas entre os fisioterapeutas avaliados permitiu concluir que há uma forte tendên-cia de que indivíduos que praticam exercício físico

apresentem maior quantidade de queixas musculoes-queléticas (p=0,051), conforme na tabela acima.

Em relação ao efeito do uso das técnicas de prote-ção articular e conservação de energia sobre a quanti-dade de queixas musculoesqueléticas, é possível afir-mar que não há diferença na quantidade de queixas em relação aos que utilizam a técnica e os que não a utilizam (p=0,905), conforme observa-se abaixo.

A maioria dos fisioterapeutas que referiram algum tipo de sintoma musculoesquelético identificou como principais fatores agravantes na atividade profissio-nal, respectivamente: manutenção da postura or-tostática por períodos prolongados; manutenção da postura em flexão de tronco e cervical, comum em atendimentos domiciliares ou em macas muito bai-xas; transferência de pacientes dependentes e semi-dependentes, e atividades envolvendo movimentos repetitivos, como massoterapia e mobilização passiva.

dISCuSSãoDentre os 61 profissionais de fisioterapia avalia-

dos, 52 (85,2%) eram do gênero feminino enquanto os representantes do gênero masculino eram apenas 9 (14, 8%). A maioria feminina é um achado que se assemelha ao de outros estudos com a mesma popu-lação (Cromie et al.7, 2000, Bork et al.15, 1996, Cam-po et al.16, 2008, Campo et al.17, 2009, Souza18, 2007). Além disso, condiz com a atual situação da profissão no país, mais procurada por mulheres. (Sim et al.19 2006)

Sugere-se até que o sexo feminino seja um fator de risco primário associado às queixas musculoes-queléticas em fisioterapeutas, ou seja, mulheres fisio-terapeutas tendem a apresentar maior prevalência de queixas musculoesqueléticas do que homens (Bork et al.15, 1996). Contudo, em virtude da discrepância na quantidade de homens e mulheres neste estudo, não foi possível realizar tal tipo de comparação entre gêneros.

Nos profissionais avaliados, a região anatômica com maior prevalência de queixas foi a região do pes-coço (57,4%), seguida pela região lombar (50,8%), e região torácica (39,3%).

Diversos estudos apontam estas três regiões ana-tômicas como as mais acometidas por queixas mus-culoesqueléticas em fisioterapeutas (Carregaro et al.5, 2006, Cromie et al.7, 2000, Bork et al.15, 1996, Souza18,

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

99

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

2007). Entretanto, diferentemente do resultado des-te estudo, a região com maior índice de sintomas é a região lombar, e a região do pescoço ocupa a se-gunda (Carregaro et al.5, 2006, Cromie et al.7, 2000) ou terceira (Bork et al.15, 1996, Campo et al.16, 2008, Campo et al.17, 2009) posição dentre as regiões mais acometidas. Apenas um estudo encontrou propor-ções semelhantes de acometimentos entre as regiões lombar e cervical (Souza18, 2007) Outra diferença no-tada é que, em alguns trabalhos, a região de punho/mãos apresenta o segundo maior índice de queixas musculoesqueléticas (Campo et al.16, 2008, Campo et al.17, 2009), porém, neste estudo, a região possui ape-nas o quinto maior índice de queixas (29,5%).

Cabe ressaltar que, em tais estudos (Cromie et al.7 2000, Bork et al.15 1996, Campo et al.16 2008, Campo et al.17 2009, Souza18 2007, Sim et al.19 2006), as médias de idade e tempo de profissão dos indivíduos ava-liados foram de aproximadamente 40 anos de idade e 15 anos de profissão, enquanto que, no presente estudo, as mesmas médias foram de 27,7 anos e 4,8 anos, respectivamente. Assim sendo, trata-se de uma população mais jovem e com menor tempo de ex-periência profissional, o que pode ter interferido no padrão de acometimentos apresentado.

Contudo, ao considerar o grupo dos Professores, cuja média de idade (40,4 anos) e de tempo de profis-são (18 anos) é a que mais se distancia dos Grupos de áreas e mais se assemelha aos resultados dos estu-dos supracitados, é possível observar uma tendência a maior prevalência de sintomas na região lombar do que os demais Grupos de área.

Entretanto, os achados de outro trabalho desen-volvido com essa população, parecem corroborar com a tendência observada pelos fisioterapeutas do presente estudo. De acordo com o estudo mencio-nado, indivíduos mais jovens apresentam mais queixas musculoesqueléticas em pescoço do que aqueles com mais idade, enquanto que, as queixas lombares são inversamente proporcionais à idade do indivíduo.

Ao serem indagados sobre possíveis fatores ocu-pacionais relacionados com o surgimento das queixas musculoesqueléticas, os fisioterapeutas avaliados des-tacaram principalmente: ortostatismo por períodos prolongados, postura em flexão de tronco e cervical durante os atendimentos domiciliares ou em macas muito baixas, a transferência de pacientes dependen-

tes e semi-dependentes e atividades envolvendo mo-vimentos repetitivos, como massoterapia e mobiliza-ção passiva.

Tais relatos assemelham-se com os achados da literatura científica, que destacam, como principais fatores de risco associados à maior prevalência de queixas dolorosas na região do pescoço e ombros, o levantamento repetitivo de objetos pesados, a manu-tenção da postura de flexão de pescoço por tempo prolongado e movimentos de ombro acima do nível dos olhos (Madeira et al.20 2002), e associam o surgi-mento da lombalgia a movimentos de rotação/flexão de tronco e ao ortostatismo por períodos prolonga-dos (Romani21, 2001).

Cerca de 30 (52,6%) fisioterapeutas dos 61 ava-liados apresentaram carga horária semanal superior às 30 horas de trabalho estabelecidas pelo Conselho Nacional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (CO-FITTO4), condizendo com os achados de outro traba-lho com essa população (Souza18, 2007). Por mais que esta situação possa submeter esses profissionais a um maior desgaste físico e mental, não houve associação entre a carga horária semanal e a quantidade de quei-xas referidas pelos avaliados.

O exercício físico constitui um artifício a ser uti-lizado pelos fisioterapeutas no intuito de diminuir a ocorrência e gravidade das queixas musculoesquelé-ticas, uma vez que equilibra o descompasso entre de-manda ocupacional e capacidade de trabalho. Entre-tanto, é pouco valorizado pelos profissionais (Cromie et al.22, 2001).

Apesar do aspecto preventivo do exercício des-tacado pela literatura, é possível observar no estu-do forte tendência de que fisioterapeutas praticantes do exercício físico apresentem maior quantidade de queixas musculoesqueléticas; fato que, possivelmen-te, está associado às sobrecargas geradas por erros de planejamento e execução dos programas de exer-cícios.

Como parte integrante do plano de ensino, os fi-sioterapeutas aprendem a respeito dos diversos ris-cos ergonômicos associados a posturas e esforços. No entanto, muitos aplicam tais princípios apenas aos seus pacientes, não transferindo o conhecimento ao seu contexto de trabalho (Cromie et al.22, 2001).

Os programas de proteção articular compreen-dem orientações destinadas à manutenção da integri-

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

100

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

dade articular, desempenho funcional e redução dos níveis de dor. Baseiam-se no princípio de que ao se reduzir o esforço para a realização de uma atividade, diminui-se o estresse sobre a estrutura articular en-volvida. Por esse motivo tais orientações são ampla-mente utilizadas pelos fisioterapeutas na reabilitação, principalmente em indivíduos portadores de doenças reumáticas, contribuindo para uma melhora no de-sempenho ocupacional e percepção da qualidade de vida (Torquetti et al.23, 2008).

Cerca de 41% dos indivíduos avaliados não rea-lizam qualquer tipo de estratégia de proteção arti-cular durante sua atividade ocupacional, confirman-do o fato de que os fisioterapeutas não transferem seus conhecimentos preventivos ao contexto da sua profissão. independentemente, os achados do estudo não permitiram que se estabelecesse relação entre a quantidade de queixas musculoesqueléticas com o uso das técnicas de proteção articular e conservação de energia.

Além dos riscos ergonômicos aos quais estão submetidos durante o exercício da profissão, há um aspecto cultural da fisioterapia que em muito con-tribui para o aparecimento de sintomas musculo-esqueléticos: o fisioterapeuta é um profissional tão compromissado, ao ponto de tomar todas as medidas necessárias para o cuidado de seu paciente, sem se importar com o que essa atitude possa acarretar à

sua saúde. E, ao mesmo tempo em que necessitam provar sua capacidade de trabalhar duro e cuidar dos seus pacientes, os fisioterapeutas também se sentem obrigados a manterem-se imunes a qualquer tipo de lesão (Cromie et al.6, 2002)

ConCluSãoAs queixas musculoesqueléticas mais frequentes

nos fisioterapeutas avaliados foram, respectivamente, dores no pescoço, lombar e região torácica, sendo o grupo dos Professores o de maior proporção de queixas referidas. A carga horária média de trabalho foi de 34,34 horas semanais, não sendo possível esta-belecer relação entre esta e o aumento no número de queixas musculoesqueléticas. A proporção entre os fisioterapeutas praticantes e não praticantes de exercício físico mostrou-se igual, havendo certa ten-dência de que os indivíduos praticantes apresentem maior quantidade de queixas musculoesqueléticas. A proporção entre os fisioterapeutas que utilizam e os que não utilizam técnicas de proteção articular no dia a dia da profissão mostrou-se semelhante, porém não houve relação entre a quantidade de queixas e essa prática. uma vez que os resultados dos questionários SF-36, ICT, DASH e Roland Morris não foram consi-derados nesta análise inicial, não foi possível abordar certos aspectos da saúde ocupacional como fadiga muscular e qualidade de vida.

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

101

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

RefeRências

1. Couto HdA, Nicoletti SJ, Lech O. Como gerenciar a questão das LER/DORT: lesões por esforços repetitivos/distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho. Belo Horizonte: Ergo; 1998.

2. Brasil MdSdBOP-AdSn. Doenças relacionadas ao trabalho: manual de procedimentos para os serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde do Brasil; 2001.

3. Brasil Led. Decreto Lei nº 938 de 13 de outubro de 1969. Brasília: Diário oficial da união; 1969.

4. COFiTTO. Brasília: Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional; [cited 2010 20 mar]; http://www.coffito.org.br/download.asp?secao=55&cod=1].

5. Carregaro R, Trelha C, Mastelari H. Distúrbios osteomusculares relacionados ao tra-balho em fisioterapeutas: revisão da literatura. Fisioterapia Pesquisa 2006 13(1):53-9.

6. Cromie JE, Robertson VJ, Best MO. Work-related musculoskeletal disorders and the culture of physical therapy. Phys Ther 2002 May;82(5):459-72.

7. Cromie JE, Robertson VJ, Best MO. Work-related musculoskeletal disorders in physi-cal therapists: prevalence, severity, risks, and responses. Phys Ther 2000 Apr;80(4):336-51.

8. Ciconelli R, Ferraz M, Santos W, Meinão i, Quaresma M. Tradução para a língua por-tuguesa e validação do questionário genérico de avaliação de qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). rev bras rematol 1999 39(3):143 – 50.

9. Martinez MC, Latorre MdRDdO, Fischer FM. Validade e confiabilidade da versão brasi-leira do Índice de Capacidade para o Trabalho. revista de saúde pública 2009 43(525-32.

10. Orfale AG, Araujo PM, Ferraz MB, Natour J. Translation into Brazilian Portuguese, cul-tural adaptation and evaluation of the reliability of the Disabilities of the Arm, Shoulder and Hand Questionnaire. braz J med biol res 2005 Feb;38(2):293-302.

11. Nusbaum L, Natour J, Ferraz MB, Goldenberg J. Translation, adaptation and validation of the Roland-Morris questionnaire--Brazil Roland-Morris. braz J med biol res 2001 Feb;34(2):203-10.

12. Pinheiro FA, Tróccoli BT, Carvalho CVd. Validação do Questionário Nórdico de Sin-tomas Osteomusculares como medida de morbidade. revista de saúde pública 2002 36(307-12.

13. Vieira S. Bioestatística: tópicos avançados. 2 ed. Rio de Janeiro: Campus; 2003.

14. Siegel S. Estatística não-paramétrica para as ciências do comportamento. São Paulo: Makron Books; 1975.

15. Bork BE, Cook TM, Rosecrance JC, Engelhardt KA, Thomason ME, Wauford iJ, et al. Work-related musculoskeletal disorders among physical therapists. Phys Ther 1996 Aug;76(8):827-35.

Bagalhi CT, Alqualo-Costa R. Prevalência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho em fisioterapeutas São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 93-102

102

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

ISSN 2176-9095

16. Campo M, Weiser S, Koenig KL, Nordin M. Work-related musculoskeletal disorders in physical therapists: a prospective cohort study with 1-year follow-up. Phys Ther 2008 May;88(5):608-19.

17. Campo MA, Weiser S, Koenig KL. Job strain in physical therapists. Phys Ther 2009 Sep;89(9):946-56.

18. Souza E. Prevalência de Sintomas Musculoesqueléticos em Fisioterapeutas da Cidade do Guarujá – SP [Trabalho de conclusão de curso]. Guarujá, SP: universidade de Ri-beirão Preto Campus Guarujá; 2007.

19. Sim J, Lacey RJ, Lewis M. The impact of workplace risk factors on the occurrence of neck and upper limb pain: a general population study. bmc public Health 2006 6(234.

20. Madeira J, Frederico B, Braga E, Barbosa L. Prevalência de lombalgia em acadêmicos de fisioterapia no ambulatório de um hospital universitário. rev fisioterapia brasil 2002 3(6):371 – 6.

21. Romani J. Distúrbios musculoesqueléticos em fisioterapeutas: incidências, causas e al-terações na rotina de trabalho [Mestrado]. Santa Catarina: universidade Federal de Santa Catarina; 2001.

22. Cromie JE, Robertson VJ, Best MO. Occupational health and safety in physiotherapy: guidelines for practice. Aust J Physiother 2001 47(1):43-51.

23. Torquetti A, Campos TdS, Noordhoek J, Cassiano JG. Programas de proteção articular para indivíduos com artrite reumatóide: uma revisão da literatura. Revista de Terapia ocupacional da universidade de são paulo 2008 19:76-84.

103

Science in Health 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

ISSN 2176-9095

PODER iNFORMAL NAS ORGANiZAçÕES:relações de poder na busca de ascensão profissional

informal power in tHe orGanizations:power relations in the search for professional ascension

Marco antonio Sampaio de Jesus*

graziela Cristina Vital**

** Doutorando em Administração, Mestre em Gestão de Negócios internacionais (universidade Católica de Santos, Brasil), Professor do curso de Admi-nistração da uNiCiD, [email protected];

** Mestre em Political Science (university of Waterloo, Canadá), Professora do curso de Administração da uNiCiD, [email protected].

Resumo

A investigação das relações de poder nas organizações vem sendo desenvolvida há muito tempo por diferentes abor-dagens. Este estudo procura descrever as principais teorias sobre o tema, bem como sintetizá-las em sua aplicação no ensaio escrito por Rosa Maria Fisher em “O Círculo do Po-der – As Práticas Invisíveis de Sujeição nas Organizações Complexas”. Caracterizado como pesquisa exploratória de natureza bibliográfica, o estudo sistematizou conhecimen-tos empíricos sobre as possibilidades de ascensão profis-sional decorrente das relações de poder nas organizações. Evidenciou-se a existência de uma tipologia dos jogos de poder praticados com relativa frequência pelos chamados “atores desprovidos de recursos”.

PalavRas-chaves: Poder • Jogos de Poder • Ascensão Pro-fissional

aBsTRacT

The topic “power relations in the organizations” has been explored in a great number of researches and in different perspectives. The present article intends to describe the most influential theories and concepts that explain the the-me, as well as offer a synthesis of the essay written by Rosa Maria Fisher entitled Circle of Power – The Invisible Sub-jection Practices in Complex Organizations. Characterized as an exploratory research based on bibliographical review, this article organizes empirical data about the possibilities of professional ascension through power relations in the or-ganizations. It also shows the existence of a typology of the struggle for power commonly practiced by those who lack resources or are at the bottom of the chain of command.

Key-woRds: Power • Power Relations • Professional Ascen-sion

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

104

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

oBJetIVoO Objetivo deste estudo é organizar ideias e con-

ceitos que auxiliem na identificação das relações de poder (formal e informal) que estão incorporadas à estrutura e ao funcionamento das organizações e como essas relações podem ser utilizadas na busca de ascensão profissional.

Como metodologia, optou-se pela pesquisa ex-ploratória, quanto aos seus objetivos, e bibliográfica, quanto aos procedimentos técnicos, utilizando-se de dados secundários obtidos de publicações científicas pertinentes ao assunto.

ReVISão da lIteRatuRa1 O Poder nas OrganizaçõesColocado num eixo de tempo, num primeiro mo-

mento, a procura de conhecimento científico acerca das organizações procurou entender e definir as práti-cas administrativas (estrutura e funções básicas e con-cretas das organizações) ideais ao seu crescimento.

Posteriormente, esse conhecimento também pe-netrou no universo das relações e dos sentimentos das pessoas que interagem com as organizações (co-laboradores ou não), buscando-se, com isso, alcançar uma melhor compreensão dos fenômenos organiza-cionais. A busca desse conhecimento científico é pe-nosa, pois se depara com as dificuldades existentes, seja na captação da essência de certos fenômenos seja na percepção que se tem deles.

Conhecer as implicações dessas relações interpes-soais e procurar controlá-las é importante, sobretudo se considerarmos que as práticas de poder influen-ciam diretamente no comportamento organizacional.

[...] O poder organizacional não deve ser ingenuamente atribuído a determinadas pessoas ou grupos, tampouco localizado em algum ponto específico da estrutura or-ganizacional. Por não constituir uma entidade que possa ser possuída, o poder difunde-se através do corpo da organização, manifestando-se por meio de práticas e relações cuja eficácia baseia-se na capacidade de ocul-tar as contradições existentes, mediante o exercício da mediação como forma de prever e evitar a emergência de conflitos oriundos da existência dessas contradições estruturais. (PAGèS 1985, apud Fischer, 1996).

No ensaio elaborado por FISCHER (1996), essa questão do “scanning do comportamento organiza-

cional” (expressão nossa) é muito bem abordada, fi-cando claras as dificuldades desse processo.

As técnicas de investigação que procuravam iden-tificar o clima organizacional com “termômetros” que avaliavam as satisfações e as insatisfações das pesso-as num dado momento e em relação a determinados aspectos, mostraram-se insuficientes e obsoletas em relação a novas propostas conceituais apresentadas por estudiosos do assunto como SCHEIN (1983, apud FISCHER, 1996), ao propor uma perspectiva clínica na abordagem dos fenômenos culturais em que amplia as raízes antropológicas dos métodos de observação adotados nos estudos organizacionais e redefine o valor do papel do consultor no refinamen-to da percepção da dinâmica dos processos que ori-ginam tais fenômenos, e PAGèS 1985, apud Fischer1 (1996), que adota uma abordagem assumidamente psicanalítica, evidenciada pela análise de conteúdo a que submete o material obtido nas entrevistas com os agentes organizacionais.

As esferas da cultura e do poder organizacional apresentam padrões inter-relacionados, que se in-fluenciam mutuamente e guardam entre si práticas pouco conhecidas, mas que são significativamente im-portantes para definir o perfil de uma organização, penetrar em seu complexo universo e compreender as causas de fenômenos aparentemente inexplicáveis.

Fleury (in FISCHER, 1996 p.135) sistematiza as propostas teóricas e metodológicas dos principais autores que vêm estudando os sistemas culturais das organizações, avançando nesse sentido ao afirmar que

é necessário politizar a questão da cultura [...] ela é concebida como um conjunto de valores e pressupos-tos básicos expressos em elementos simbólicos que em sua capacidade de ordenar, atribuir significações, construir a identidade organizacional, tanto agem como elemento de comunicação e consenso como ocultam e instrumentalizam as relações de dominação.

Essa politização do conceito implica uma releitu-ra da realidade, na qual cultura e poder passam pelo filtro das diversas abordagens oriundas de diferentes áreas do conhecimento: a Sociologia, a Antropologia, a Psicologia e outras.

1.1 Conceito de OrganizaçãoComo o objetivo deste estudo é o de estudar as

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

105

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

relações de poder existentes nas organizações e a ascensão profissional, é necessário que se faça uma aproximação conceitual do que seja uma organização.

Considerando-se a evolução teórica sobre os es-tudos organizacionais, partindo de uma visão mecani-cista (organizações como estruturas rígidas) para uma visão sistêmica (organismos vivos que se desenvolvem e se adaptam aos input´s do seu meio envolvente), para os propósitos deste estudo será adotada a defi-nição de SROuR (1998), para o qual as organizações são “[...] agentes coletivos, à semelhança das classes sociais, das categorias sociais e dos públicos [...] pla-nejadas de forma deliberada para realizar um deter-minado objetivo”.

1.2 Conceito de PoderNa visão de MORGAN (1996) e DAHL (1957),

o exer cício do poder representa um meio para se resolver interesses conflitantes. Para tal, os múltiplos aspectos envolvidos nas relações de interesse, mui-tas vezes “carregados” de subjetividade, devem ser claramente identificados para que os conflitos sejam solucionados.

Considerando as relações entre indivíduos, DAHL (1957) aborda o poder como sendo uma relação de obediência de uma parte (B) a outra parte (A). Na medida em que A muda o comportamento de B le-vando-o a fazer algo que não faria espontaneamente, A está exercendo poder sobre B.

RuSSEL (1979) define poder como a habilidade em se produzir os efeitos e os resultados desejados independentemente da forma utilizada. Para MiNTZ-BERG (1983), poder é a capacidade de se realizar ou afetar os resultados organizacionais.

Em seu trabalho, OuiMET (2003) adota um con-ceito que caracteriza como global, definindo poder como “a capacidade que um indivíduo possui de in-fluenciar o pensamento e os comportamentos de uma pessoa”.

Na análise dessa literatura e de outros autores, entre eles BOWDITCH e BuONO (1997), GAL-BRAITH (1983), e MOTTA (1986), observa-se que a conceituação de poder não é uniforme entre os auto-res, apresentando diversos enfoques, porém o enten-dimento direciona a um mesmo sentido: a influência. Esse sentido será considerado no desenvolvimento deste estudo.

1.3 Poder versus AutoridadeNas organizações, poder e autoridade não cami-

nham, necessariamente, juntos. SiMERAY (1980) de-fine autoridade como “o direito de comandar, isto é, o direito de decidir, de dar ordens e de controlar a execução dessas ordens [...] é conservada pela dire-ção geral da empresa e transmitida aos comandos [...] via delegações parciais e sucessivas”. A autoridade é inerente a determinada função ou cargo e, portanto, é uma atribuição formal e impessoal que decorre de uma delegação legítima, seja por meio de estatuto, resoluções internas das organizações, leis, dentre ou-tros fatores.

Já o poder, cuja conceituação foi abordada no item 1.2 deste estudo, está diretamente ligado à pessoa, pois abrange as capacidades individuais de cada um, sendo, portanto, uma relação social. Segundo Srour2 (1998), o poder decorrente dessas relações sociais explica, em muitos aspectos, o surgimento de lide-ranças em função da “sintonia ‘espontânea’ e informal estabelecida entre líderes e seguidores”.

Percebe-se, portanto, que a importância das or-ganizações formais na sociedade moderna faz com que muitos cientistas tenham se dedicado e ainda se dediquem a estudá-las. um desses cientistas foi Max Weber. Para WEBER (in MAxIMIANO, 2002), as or-ganizações formais baseiam-se em leis que são aceitas pelas pessoas por acreditarem que sejam racionais e impessoais, aceitando também a autoridade daque-les que são designados para representar e zelar pelo cumprimento dessas leis.

um dos críticos de WEBER é o cientista social AMiTAi ETZiONi (in MAxIMIANO, 2002) para quem:

As organizações são unidades sociais, que têm objeti-vos específicos, e por isso não se encaixam num mo-delo universal [...] cada tipo de organização é definido pelo tipo de poder exercido sobre as pessoas. Cada tipo de poder dá origem a um tipo de obediência. A obediência é a relação em que uma pessoa comporta-se de acordo com a orientação que é dada por outra.

1.4 Relações de Poder nas OrganizaçõesEm 1924, quando o cientista George Elton Mayo

realizou experimentos na fábrica da Western Eletric Company, em Hawthorne, Chicago, objetivando ava-liar os efeitos da iluminação sobre a eficiência dos

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

106

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

operários, estendendo esses experimentos à fadiga, aos acidentes no trabalho e à rotatividade do pesso-al, surgiram fatos novos que provocaram, em certos aspectos, o redirecionamento dos estudos das orga-nizações. Esses experimentos (denominados classi-camente como “Experiência de Hawthorne”) foram os precursores da Teoria Humanística ou Escola das Relações Humanas.

Elton Mayo constatou a existência de oportunida-des de relações humanas nas organizações, devido ao grande contingente de pessoas que nelas trabalhavam e, muitas delas, com interesses comuns (expectativas

grupais). Segundo suas conclusões, esses relaciona-mentos criavam aspectos informais às organizações, influenciando, inclusive, sobre o comportamento dos trabalhadores. Essas influências não tinham rela-ção direta com os níveis de autoridade formal cons-tituídos, caracterizando a existência daquilo que se chamou de “grupos informais”. Este breve resgate da “Experiência de Hawthorne” e da influência dos grupos informais sobre o comportamento dos traba-lhadores visa sustentar a afirmação anterior de que o poder nas organizações muitas vezes independe da vontade (autoridade formal) das organizações, já que

Bases de Poder

Tipo de Poder

Principais Características

• Poder legítimo

Formal

• Vinculado à estrutura organizacional (autoridade formal), é deliberado pela própria organização e vinculado aos respectivos cargos/funções (impessoal).

• Pode ser exercido tanto “de cima para baixo” (cargos de direção/chefia sobre seus subordinados) quanto “de baixo para cima” (cargos ligados à segurança – por exemplo: portaria e seguranças).

• Poder Coercitivo

Formal

• Vinculado ao exercício do poder legítimo através de punições.• Os motivos das punições devem ser transparentes e estar embasados nas políticas da

organização ou nas doutrinas legais vigentes.• Não garante o desenvolvimento profissional das pessoas.• Não deve servir de mecanismo de satisfação pessoal de quem o aplica, pois pode

desencadear sentimentos de injustiça.• Pode ser classificado como um lado negativo do poder de recompensa.

• Poder de Recompensa

Formal

• Também vinculado ao exercício do poder legítimo, porém com raciocínio inverso do poder coercitivo, procura influenciar pessoas através de recompensas, que podem ser:

a) Materiais → melhorias salariais, promoção, prêmios, etc.b) Reconhecimento → sentir-se valorizado.• Seus motivos também devem ser transparentes e estar embasados nas políticas da

organização ou nas doutrinas legais vigentes.

• Poder de Especialização

Informal• Não está necessariamente vinculado ao poder legítimo.• Resulta do talento, dos conhecimentos específicos e especiais e das habilidades

individuais, gerando respeito.

• Poder de Referência

Informal• Deriva das características individuais de uma pessoa (carisma, caráter, comportamento,

estilo, etc.), criando “seguidores” que se identificam com essas características e que também procuram obter esse poder através da associação com aqueles que o detêm.

• Poder de Informação

Informal

• Não necessita estar relacionado aos níveis hierárquicos, mas sim à “posse” de informações a) necessárias à organização ou b) que possam comprometê-la.

• Pode ser extremamente prejudicial às organizações na medida em que as pessoas que o detenham passem a agir como “filtros” e, assim, controlarem a difusão de conhecimento nas organizações.

Tabela 1. bases de poder existentes nas organizações e suas principais características

Fonte: MONTANA (1998); STONER (1985); MORGAN (1996) e DAFT (1999).

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

107

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

existe a possibilidade de relacionamentos e alianças entre as pessoas.

Nesse contexto, CAPPELLE et al.13 (2004) cons-tatam que “essas relações (de poder) se darão, tam-bém, em função da possibilidade de coligação com outros agentes, da mobilização de solidariedade e da capacidade de se beneficiar desses elementos, além da aptidão para construir e estabelecer relações, co-municar, formar e reverter alianças e, principalmente, para suportar tensões”.

Com base nos estudos de MONTANA (1998), STONER (1985), MORGAN (1996) e DAFT (1999), identificam-se as bases de poder existentes nas or-ganizações bem como suas principais características. Os resultados dessa identificação estão sintetizados na Tabela 1.

1.4.1 Ascensão Profissional e Jogos de PoderEncontrou-se no artigo de (OuiMET, 2003) uma

adequada exploração das tipologias de jogos de po-der praticados pelas pessoas que dispõem de um fra-co potencial de autoridade devido à sua posição hie-rárquica não muito elevada, ou, como define o autor, “atores desprovidos de recursos”.

Existe um elevado volume de pesquisas científicas que analisam o poder sob a ótica da liderança orga-nizacional, ou seja, a visão de que somente dirigentes aptos a mobilizar todos os empregados em torno de um projeto comum (líderes) podem resolver os pro-blemas de performance e de adaptação das empresas às novas estruturações de mercado.

Mas, e os “atores desprovidos de recursos”? O que fazem para evoluir e progredir na estrutura hierárquica das empresas? Existem jogos de poder próprios a eles? OuiMET (2003) constata que “esse conhecimento é limitado, em termos de exploração sistemática das margens de ação desse tipo de em-pregado”

A expressão “exploração sistemática das margens de ação” retrata essencialmente a noção de jogo de poder, ou seja, a adoção de um modo de comportamentos e/ou atitudes condicionado pela situação na qual o ator se situa. De fato, o ator organizacional recorre a uma estratégia política quando explora uma oportunidade in-formal (grifo nosso) não prevista pela empresa. A explo-ração de tudo aquilo que não é prescrito formalmente pela empresa permite ao ator jogar para aumentar sua capacidade de influenciar os outros bem como o curso dos eventos (OuiMET, 2003).Dessa forma, o autor procura estabelecer uma

relação de adequação entre o tipo de jogo de poder e a natureza das situações nas quais se localizam os atores com menor grau de autoridade.

OuiMET (2003) sugere dois tipos de natureza das situações (também chamadas por ele de estratégias políticas) em que esses atores desprovidos de recur-sos atuam, identificadas pela análise de entrevistas se-miabertas feitas com gestores de alto escalão, a saber:

• Estratégia de Consolidaçãoé utilizada em um contexto de trabalho favorável,

devido a diversas razões, tais como: patrão atencioso, colegas de trabalho honestos e bem-intencionados, relações de trabalho harmoniosas entre os emprega-dos, entre outros.

Sua utilização permite aos atores aumentar a im-portância de seus recursos e, consequentemente, ampliar as chances de subir nos escalões hierárquicos (obtenção de poder).

• Estratégia de Proteção de Posiçãoé utilizada em contextos de trabalho desfavorá-

veis, tais como: patrão de personalidade difícil, cole-gas de trabalho agressivos e interessados no sucesso pessoal, uma cultura organizacional patogênica, es-tresse organizacional intenso e não controlado, uma morosidade econômica no setor de atividade da em-presa, etc.

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

108

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

Estratégias PolíticasTipos de Jogos de Poder

Características Básicas

Estratégia de Consolidação

Jogo do Tamborim

• Consiste na propagação das realizações pessoais à empresa como um todo, sempre de forma indireta, utilizando-se para tal a figura de um intermediário com capacidade/influências sobre o destinatário desejado (por exemplo: secretárias, jornal da empresa).

Jogo das Leves Queixas

• é eficaz em culturas organizacionais mecanicistas uma vez que, de certa forma, as burocracias mecanicistas apresentam fortes características de burocracias profissionais funcionais (normas impessoais).

• Consiste na formulação polida e atenciosa de queixas repetitivas, motivadas pela frustração de não poder responder convenientemente aos objetivos da empresa pela falta de recursos adequados.

• Não devem jamais ser cargas virulentas contra a empresa, nem tampouco críticas que firam certas pessoas.

• é preferível ser diplomaticamente tenaz durante um longo período de tempo a ser espontaneamente intransigente.

Jogo do Mentor

• è praticado em situações onde se disponha de poucos ascendentes e se trabalhe com indivíduos bem-intencionados, visando aperfeiçoar a compreensão da dinâmica das redes sociais informais da organização.

• Consiste em ações deliberadas com o objetivo de tornar-se pupilo de um mentor. O mentor deve ser respeitado e conhecedor da cultura organizacional da empresa para que seus conselhos possam aperfeiçoar rituais específicos da vida simbólica da empresa (missão, mitos de sua fundação, história dos fundadores, crenças e atitudes, tabus, etc).

• O deciframento desses rituais concede ao pupilo considerável vantagem sobre colegas ignorantes dessa questão simbólica.

Estratégia de Proteção de Posição

Jogo do Pato Cambaleante

• é eficaz em culturas organizacionais orgânicas ou quando se é confrontado com uma pessoa narcisista.

• Consiste em demonstrar uma personalidade terna e insípida, ou seja, escolher um perfil discreto para projetar ao outro uma imagem que não seja ameaçadora e sim de alguém que precisa lutar muito para alcançar seus objetivos. Seu efeito é ainda mais forte caso se aparente pequenino ou insignificante aos olhos de pessoas narcisistas já que essas pessoas raramente atacam alguém que julguem menos talentosa do que ela própria.

Jogo da Neblina

• Aconselhado em situações de clima de trabalho desfavorável e o poder se revela tênue.

• Consiste em restringir seus comentários às questões de ordem profissional, evitando falar o mínimo sobre si e, com isso, não revelar aos outros (adversários) seus pontos fracos que podem ser percebidos pelas suas marcas pessoais.

Jogo da Conformidade às Regras

• é eficaz quando se atua em um contexto desfavorável e em ambientes cartesianos, ou seja, organizações com cultura mecanicista ou pessoas com personalidade analítica.

• Consiste em respeitar escrupulosamente as diretivas e os procedimentos, utilizando-os como um escudo protetor legitimando suas ações defensivas.

Fonte: OuiMET (2003) OuiMET (2002)

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

109

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

Ao contrário da estratégia de consolidação, sua utilização não permite o aumento de poder, mas ob-jetiva limitar os estragos e preservar a posição orga-nizacional atual.

O autor também examina os jogos de poder pró-prios a cada uma das estratégias políticas. Desse exa-me, extraíram-se os principais jogos e suas caracte-rísticas básicas, que estão adaptados e sintetizados no quadro a seguir:

2 Síntese do Ensaio “O Círculo do Poder – As Práticas Invisíveis de Sujeição nas Organizações Complexas”

Este capítulo sintetiza os principais aspectos do ensaio elaborado por Rosa Maria Fischer com base na pesquisa “A Análise do Sistema Penitenciário Pau-lista”, conforme já foi abordado no resumo deste es-tudo.

Referindo-se a vários escritos de Schein em livros, artigos e papers que discorrem sobre a necessidade de se refinar o conceito de cultura organizacional e evitar suas aplicações incorretas e superficiais, afir-mando que é preciso concentrar esforços em descre-ver situações e padrões diagnosticados visando o de-senvolvimento de conceitos teóricos e instrumentos adequados, a autora estabelece uma abrangência pe-culiar para seu estudo: a consideração de que os esta-belecimentos penitenciários podem ser considerados como verdadeiros laboratórios para o mapeamento dos padrões culturais e das redes através das quais distribuem-se interesses, influências, informações e decisões.

Sendo uma instituição total que isola a organização do ambiente externo, criando um sistema peculiar de vida interna nos limites do mesmo espaço físico, nela se configuram as condições propícias para a formação e manutenção de padrões culturais específicos dessas organizações e relativamente isentos da influência das transformações que ocorrem no sistema social em que se inserem.

A prisão enfatiza os procedimentos para obrigar uma “reorganização do eu”, para maximizar o valor das normas e regulamentos criando um “código de ética” próprio, e para demarcar exaustivamente, atra-vés de ritos e símbolos, as diferenças que separam seus dois mundos: o grande grupo controlado e a equipe dirigente.

2.1 A Questão PenitenciáriaSegundo a autora, a enorme carência de conheci-

mento que se tem acerca das especificidades das pri-sões enquanto realidades organizacionais é fruto de uma das mais importantes características do sistema, a qual é ciosamente resguardada pelos padrões cul-turais vigentes: sua impenetrabilidade em relação aos agentes externos, mantida pela sutil invisibilidade das práticas que constituem seu cotidiano, as quais são desconhecidas da sociedade abrangente e se mantêm opacas, até mesmo nas relações mantidas com outros órgãos públicos que lhe são afins.

Os aspectos culturais de cada unidade do sis-tema penitenciário são determinantes dos padrões de comportamento, relacionamento, comunicação e distribuição de poder observados, porque foram formulados no âmbito da própria organização e para atender suas necessidades de manter-se autônoma em relação ao sistema e independente em relação ao conjunto do aparato do Estado e à influência da so-ciedade abrangente.

um forte processo de continuidade administrativa garantiu que um escudo de resistência interna impe-disse as raras tentativas de intervenção na estrutura e no funcionamento dessas organizações. Essa conti-nuidade não é percebida nas normas e procedimen-tos que explicitam o funcionamento do sistema, mas é evidenciada quando se observa que os critérios utilizados para ocupar os cargos de direção e chefia seguem padrões patrimonialistas, nos quais a legiti-midade do exercício da função baseia-se no apoio de grupos informais, que distribuem entre si a influência sobre áreas estratégicas de cada estabelecimento.

Esses grupos são compostos por relações diver-sas: funcionais, hierárquicas, pessoais; assumem dife-rentes formatações conforme as circunstâncias e os objetivos, e extrapolam o famoso limite entre uma elite dirigente e uma massa de cativos. A predomi-nância desses grupos é evidenciada porque a ação institucional nunca pode ser explicada exclusivamen-te pelos procedimentos formais. Há um livre trânsito entre padrões formais e informais que obscurece a compreensão da dinâmica organizacional ao observa-dor externo.

Confiantes na descontinuidade própria da admi-nistração pública, os funcionários do sistema eram conscientes de que os governos e secretários mu-

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

110

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

dam, enquanto eles permaneceriam nos seus cargos. Habituaram-se a esperar que no início de cada gestão sejam realizados diagnósticos e propostos planos de ação, os quais serão gradativamente esquecidos dian-te dos obstáculos para implementação. Por isso, as resistências às propostas de mudanças não precisam manifestar-se explicitamente. Basta fazer com que “não peguem”, isto é, omitir-se de opinar e de partici-par, colocar-se à margem dos levantamentos, análises e planejamento que geralmente são elaborados por assessores/técnicos do Estado e, com isso, esvaziar as possibilidades de implementação dos projetos.

Essa atitude emergia de modo quase espontâneo, insuflada por comentários irônicos e conversas infor-mais, nas quais os funcionários e dirigentes dos esta-belecimentos compartilham suas opiniões acerca da ignorância que os técnicos e assessores têm da ques-tão penitenciária, do sistema, dos riscos e dificuldades inerentes ao trabalho que executam.

Nesse discurso ficava evidente o desprezo aos que não pertenciam ao universo penitenciário e a concep-ção de que, para compreendê-lo, é preciso vivenciar, por longo tempo, sua realidade cotidiana e estabele-cer uma relação de identidade afetiva e cultural com a organização e seu modo de ser.

Verifica-se, assim, que certas características de estruturação e funcionamento das organizações pe-nitenciárias que poderiam ser modificadas com bons projetos, tendiam a permanecer na prática institu-cional, apesar de serem formalmente transformadas, porque os grupos informais articulam-se na constitui-ção de um invisível círculo de ferro que tem a capaci-dade de impedir mudanças.

Estudos sobre a Casa de Detenção de São Paulo descrevem o funcionamento desses grupos, suas dis-putas pelo controle da vida institucional e as relações que estabelecem com funcionários e dirigentes. A utilização de comissões de sentenciados não chegava a ser uma novidade quando foi proposta, pelos pró-prios detentos, ao Diretor Geral da Penitenciária do Estado de São Paulo. Formada durante o 2º semestre de 1983, era hostilizada pelos funcionários e por al-guns sentenciados, que se sentiam alijados do proces-so participativo e denunciaram que os participantes dessa comissão eram “os piores elementos da Casa, ‘faqueiros’, ‘passadores’ de drogas e exploradores dos próprios companheiros”.

insatisfeitos com a postura do Diretor Geral, aglu-

tinaram-se em torno do chefe do setor de Disciplina e Vigilância, que era um antigo funcionário do esta-belecimento e exercia suas funções sem ater-se à su-bordinação devida à Diretoria. Desse modo, o confli-to estrutural existente agravou-se, encaminhando-se para o clima que os próprios agentes organizacionais denominam “panela de pressão”.

No final de 1983, esse clima eclodiu em rebelião, associada a um nunca comprovado plano de fuga em massa. Aplacado o motim com a costumeira violên-cia, 30 sentenciados foram transferidos para outros estabelecimentos, desestruturando o incipiente gru-po que pretendia instalar a comissão. um segundo grupo de detentos se articula e solicita a intervenção direta do Secretário de Segurança do Estado para dar continuidade à implantação do sistema participativo desejado.

é designado um assessor da Secretaria para acom-panhar o desenvolvimento desse projeto e ampliá-lo, para que os funcionários também participem com seus próprios grupos, de modo a atender tanto às expectativas e necessidades dos detentos quanto dos funcionários da organização.

Enquanto os sentenciados desenvolviam com en-tusiasmo o projeto, os funcionários não sentiam a menor atração pela proposta da assessoria do Secre-tário e não formaram suas comissões. Alegavam não acreditar que esse fosse o meio mais eficaz para ve-rem atendidas suas necessidades visto que já existiam duas associações formais de servidores públicos que não obtinham o atendimento de suas reivindicações. E, principalmente, não sentiam justa essa similaridade de tratamento que, na prática, eliminava a diferença, que faziam questão de demarcar, entre eles enquanto cidadãos trabalhadores e os delinquentes que deve-riam vigiar.

Quando as primeiras propostas da comissão de detentos começaram a materializar-se, aumentou o desconforto e a insatisfação dos funcionários, genera-lizando o ressentimento contra a postura do Secre-tário. Diferentes interesses começaram a agregar-se numa rede invisível de oposição às medidas da Secre-taria da Justiça, para a qual a proposta de ampliação participativa do sentenciado funcionava como pavio de pólvora.

Novamente é instaurado o clima de “golpismo” que dia a dia assume formas concretas, sucedendo-se revistas gerais inesperadas, punições arbitrárias e

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

111

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

remoção de sentenciados.um episódio constrangedor e marcante foi pro-

vocado pelo responsável pela Vara de Execuções Criminais que, sintonizado com as pressões susci-tadas no interior do estabelecimento, denuncia ao público a existência de uma “gang”– as Serpentes Negras – organizada por sentenciados com a coni-vência da Secretaria da Justiça, com o objetivo de tomar o poder do sistema através de massacres violentos e provocar a queda do Secretário, que ocorreu pouco tempo depois desse episódio.

2.2 Comentários1. A análise das duas situações de fracasso de

projetos de mudanças organizacionais em sistemas penitenciários conduz à conclusão de que a alta resistência da maior parte do corpo funcional e da direção está na concepção que as pessoas têm da missão das organizações penitenciárias. Sendo assim, o questionamento desses valores e dos pa-drões culturais que eles determinam seria a forma indicada para se obter sucesso na implementação de projetos que venham a melhorar o sistema como um todo.

2. A implementação de medidas drásticas de reestruturação organizacional e de formulação de políticas de gestão como forma de transformar as práticas e procedimentos vigentes, somente pode-rá ocorrer após o mapeamento prévio das possi-bilidades de articulação dos grupos informais exis-tentes.

3. Além disso, a legitimidade dessas propostas só será obtida se seus pontos de apoio forem in-ternos ao próprio sistema, o que implica a clara definição sobre as linhas de subordinação e a for-malização dos papéis e atribuições dos órgãos e estabelecimentos que constituem o sistema.

4. Em seu ensaio, Rosa Maria Fischer cita um paper elaborado por Schein em que se discute como os padrões culturais podem constituir obs-táculo à implantação de estratégias empresariais transformadoras. Schein explica que a essência “da cultura organizacional reside nas ´premissas subja-centes´ onde se originam tanto os valores quanto os comportamentos, as quais referendam as auto-ridades consideradas legítimas pelos grupos, man-têm os mitos e símbolos que fortalecem a coesão

e definem os sistemas de poder e de comunicação vigentes”.

5. Dessa forma, não se pode tratar a resistência à mudança como uma questão genérica, um em-pecilho a mais nos projetos de desenvolvimento organizacional. As pessoas reagirão para evitar as transformações que interpretarem como sendo uma ruptura da profunda identidade que têm com a organização e/ou uma negação dos valores esta-belecidos que lhes transmitissem o sentimento de segurança e coesão.

3 ConCluSõeS Frequentemente, consultores e administrado-

res responsáveis pela implementação de mudanças organizacionais, assim como pesquisadores que investigam os fatores determinantes do desen-volvimento das organizações, enfrentam o desafio não só de identificar e compreender os padrões culturais, mas também de agir sobre os sistemas de comunicação, de relações sociais e poder, que estão profundamente imbricados com a cultura da organização.

A eficiência dos instrumentos tradicionais de diagnóstico do clima organizacional desaparece quando é preciso acompanhar a dinâmica das re-lações interpessoais e grupais que formam intrin-cadas redes, por onde são intercambiadas influên-cias, decisões, opiniões e informações decisivas.

Nas organizações, a busca pelo poder assume formas que, em muitos casos, colocam os objetivos organizacionais em planos inferiores aos objetivos pessoais dos integrantes. Essa priorização dos ob-jetivos pessoais pode fazer com que projetos ne-cessários ao desenvolvimento, ao crescimento, ao aprimoramento e à própria sustentabilidade dessas organizações sejam alvo de fortes “ataques”.

O poder organizacional, formal ou informal, precisa ser conhecido, previsto e tratado enquan-to tal, uma vez que pode ser utilizado para se atin-girem interesses pessoais, como por exemplo, a ascensão profissional. Omitir o poder informal existente nas organizações sob o rótulo de “re-sistências” significa correr o risco de minimizar a capacidade que detêm essas relações baseadas em traços culturais predominantes (grupos informais), de impedirem a implementação de mudanças orga-

Jesus MAS, Vital GC. Poder informal nas organizações: relações de poder na busca de ascensão profissional São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 103-12

112

ISSN 2176-9095

Relato de Pesquisa/ReseaRch RePoRts

RefeRências

BOWDITCH, J. L. and A. F. Buono. Elementos de comportamento organizacional. São Paulo: Pioneira Thomson, 1997.

CAPPELLE, M. C. A., M. C. d. O. L. Melo, et al. uma análise da dinâmica do poder e das relações de gênero no espaço organizacional. RAE-eletrônica, v. 3, n. 2, 2004.

DAFT, R. L. Administração. 4. Rio de Janeiro: LTC, 1999.

DAHL, R. The concept of power. Behavioral Science, n. 3, p. 201-215, 1957.

FISCHER, R. M. O círculo do poder: as práticas invisíveis nas organizações complexas. in: M. T. L. Fleury (Ed.). Cultura e poder nas organizações. 2. São Paulo: Atlas, 1996. p.65-88.

GALBRAiTH, J. K. Anatomia do poder. São Paulo: Pioneira, 1983.

MAxIMIANO, A. C. A. Teoria geral da administração: da revolução urbana à revolução digital. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2002.

MiNTZBERG, H. Power In and Around Organizations. Englewood Cliffs, N.J: Prentice--Hall, 1983.

MONTANA, P. J. Administração. São Paulo: Saraiva, 1998.

MORGAN, G. imagens da organização. São Paulo: Atlas, 1996.

MOTTA, F. C. P. Teoria das organizações : evolução e crítica. São Paulo: Pioneira, 1986.

OuiMET, G. Estratégias de poder e atores desprovidos de recursos. Revista de Adminis-tração de Empresas, v. 43, p. 1-11, 2003. iSSN 0034-7590. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-75902003000100006&nrm=iso >.

RuSSEL, B. O poder: uma nova análise social. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.

SiMERAY, J. P. A estrutura da empresa. Rio de Janeiro: LTc, 1980.

SROuR, R. H. Poder, cultura e ética nas organizações. 5.ed. Rio de Janeiro Campus, 1998.

STONER, J. A. Administração. 2.ed. Rio de Janeiro: Prentice Hall do Brasil, 1985.

nizacionais. As restrições a mudanças decorren-tes das práticas de poder devem ser minimizadas mediante a implementação de planos de ação que, necessariamente, entendam e considerem a difu-

são do poder em toda a estrutura organizacional para, a partir daí, criarem uma cultura organizacio-nal na qual as mudanças sejam aceitas como sendo um processo de melhoria e de evolução contínuos.

113

Science in Health 2011 mai-ago; 2(2): 113-9

ISSN 2176-9095

CONTROLE DE ESTOQuE DE OPME

STOCK CONTROL OF ORTHOTICS, PROSTHETICS AND SPECIAL MATERIALS

Sabrina nardino*ane lise dalcul**

Paulo gil***

*** Curso de Especialização MBA em Saúde iAHCS/HMD, Porto Alegre, RS, Brasil E-mail: [email protected]*** instituto de Administração Hospitalar e Ciências da Saúde, iAHCS, Porto Alegre, RS, Brasil. universidade Coorporativa Hospital Mãe de Deus, uCMD,

Porto Alegre, RS, Brasil.*** instituto de Administração Hospitalar e Ciências da Saúde, iAHCS, Porto Alegre, RS, Brasil. Hospital Mãe de Deus, HMD, Porto Alegre, RS, Brasil.

estudo de caso/case study

Resumo

Diante da globalização e do mercado competitivo, a gestão de estoques assume grande importância dentro das em-presas. No setor da saúde, a adoção de sistemas de gestão de estoque é necessária para possibilitar a contenção de gastos, com atenção à qualidade e ao envolvimento de to-dos os profissionais relacionados nesse sistema. A nível hos-pitalar, os materiais desempenham um papel importante, uma vez que seus gastos representam aproximadamente de 15% a 25% das despesas correntes. Dentre os diversos materiais utilizados na área hospitalar, as Órteses, Próteses e Materiais Especiais - OPMEs - assumem maior importân-cia econômica nas contas destas instituições. Este trabalho objetiva realizar um estudo de caso do gerenciamento do setor de suprimentos de um hospital privado de Porto Ale-gre (RS), no que se refere à distribuição de órteses, prótese e materiais especiais e identificar qual é a relação custo-benefício do processo de controle de estoque no setor de OPME desse Hospital. Realizou-se uma pesquisa qualitativa de natureza descritivo-exploratória, sendo os dados obti-dos através de entrevistas não estruturadas e consulta a documentos. Neste intuito verificou-se, dentro do propó-sito da pesquisa, que as OPMEs são uns dos componentes de maior peso na fatura hospitalar. O processo envolvendo esses itens, apesar de bastante complexo, mostrou ter uma boa relação custo-beneficio. Embora apresente alguns gar-galos, como o custo e o tempo despendido durante o fluxo de OPME, o hospital consegue ter um controle do fluxo e do estoque desse processo, que promovem a viabilidade e os benefícios da utilização de processos gerenciais específi-cos na administração de OPME.

PalavRas-chaves: Estoque de suprimentos • Administração Hospitalar

aBsTRacT

In the face of globalization and competitive market, inven-tory management is of great importance within companies. In the health sector, the adoption of systems of inventory management is needed to provide cost containment, with attention to quality and involvement of all professionals listed in this system. The hospital level, the materials play an important role, since their expenditures represent ap-proximately 15% to 25% of current expenditure. Among the various materials used in the hospital, the Orthotics, Prosthetics and Special Materials - Opme’s - take on grea-ter economic importance in the accounts of these institu-tions. This work aims to perform a case study of the sector management supplies in a private hospital in Porto Alegre, in relation to the distribution of orthoses, prostheses and special materials and identify what is the cost-effectiveness of the control process stock on the OPME sector in this Hospital. We conducted a qualitative descriptive and ex-ploratory research, with the data obtained through struc-tured interviews, and documents. In this study we found, within the purpose of research, that OPME are one of the most significant component in the hospital bill. The process involving these items, although quite complex, was shown to have a good cost - benefit. Although having some bottle-necks, such as cost and time spent during the OPME flow, the hospital can be a control flow and stock of this process, which promote the viability and benefits of the use of spe-cific management processes in the administration of OPME.

Key-woRds: Materials and Supplies Stockpiling • Hospital Ad-ministration

Nardino S, Dalcul AL, Gil P. Controle de estoque de OPMESão Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 113-9

114

ISSN 2176-9095

estudo de caso/case study

IntRoduçãoO controle de estoque exerce influência muito

grande na rentabilidade da empresa. A sua correta gestão tem grande importância no processo produti-vo pelos altos custos que pode representar, uma vez que tem como função maximizar o efeito lubrificante no feedback de vendas e o ajuste do planejamento da produção (Arozo1, 2002, Martins2, 2002, Pozo3, 2002).

No setor de saúde, as inovações tecnológicas e a descoberta de novas doenças produzem alterações na relação eficácia/complexidade/custo dos trata-mentos médicos (Fitzsimmons e Fitzsimmons4, 2005, Cavallini e Bisson5, 2002). A adoção de sistemas de gestão de estoque é necessária para possibilitar aos serviços de saúde a contenção de gastos, com aten-ção à qualidade e ao envolvimento de todos os pro-fissionais relacionados no desenvolvimento desses sistemas (Francisco e Castilho6, 2002). Nessa pers-pectiva, o gerenciamento de estoque tem como fina-lidade suprir os recursos materiais necessários para a organização de saúde, com qualidade, em quantidades adequadas, no tempo certo e, sobretudo, ao menor custo (Vecina e Ferreira7, 2001).

As instituições hospitalares são consideradas or-ganizações complexas, com profissionais especializa-dos que desenvolvem atividades em diferentes graus (Quinto e Bittar8, 2004). Essas atividades consomem uma diversidade de materiais, o que tem contribuído para a elevação dos custos nos hospitais (Lourenço9, 2006).

A administração de materiais, junto com os recur-sos humanos e financeiros, são a base de sustentação do hospital (Vecina e Ferreira7, 2001). A administra-ção de materiais na área de saúde é mais complexa do que a de outros segmentos da economia. Segundo (Lima e Rodrigues10, 2009) em um hospital, os gas-tos com materiais representam aproximadamente de 15% a 25% das despesas correntes.

Dentre os diversos materiais utilizados na área hospitalar, cada vez mais, as Órteses, Próteses e Ma-teriais Especiais - OPMEs - assumem maior importân-cia econômica nas contas dessas instituições.

O processo de solicitação e autorização de proce-dimentos e materiais de alto custo (OPME) envolve desde o profissional médico, quando da atribuição de solicitante, perpassando pelas áreas de atendimento

da empresa seguradora do plano de saúde, pela área de atendimento do hospital, almoxarifado, setor de compras, comercial, financeira, auditorias e contatos com fornecedores de materiais cirúrgicos. Tal pro-cesso requer, por muitas vezes, dias de negociações, para que se estabeleça o perfeito entendimento entre as partes envolvidas, culminando com a autorização ou a negativa para efeito da realização do procedi-mento cirúrgico.

Este trabalho objetiva realizar um estudo de caso do gerenciamento do setor de suprimentos de um hospital privado de Porto Alegre (RS), no que se re-fere à distribuição de Órteses, Prótese e Materiais Especiais. Realizaremos um diagnóstico da situação real das áreas hospitalares envolvidas com OPME, analisando os procedimentos adotados quanto ao controle de entrada e saída de produtos. As Órteses, Próteses e Materiais Especiais - OPMEs – têm uma importância econômica muito grande nas contas hos-pitalares, pois além de serem responsáveis por ele-vados custos de sua manutenção, podem apresentar perdas. Dessa forma, questiona-se qual é a relação custo-benefício do processo de controle de estoque do setor de OPME de um Hospital privado de Porto Alegre.

MetodologIaEsta pesquisa buscou analisar o processo de con-

trole de estoque do setor de OPME de um hospital privado de Porto Alegre (RS), utilizando para isso va-riáveis qualitativas em função da necessidade de se realizar um estudo exploratório, compreendendo a realização de grupos de foco e entrevista com espe-cialistas, buscando assim descobrir o que está faltan-do em relação ao problema de pesquisa.

Foi utilizado o levantamento de campo e a pesquisa documental como método de estudo o qual procede à observação de fatos e fenômenos exatamente como ocorrem na realidade, a coleta de dados referentes aos mesmos e, finalmente, a análise e interpretação desses dados, com base numa fundamentação teórica consistente, objetivando compreender e explicar o problema pesquisado (Vieira11, 2002).

A população a ser pesquisada ou universo da pes-quisa é definida como o conjunto de indivíduos que partilham de, pelo menos, uma característica em co-mum. (Marconi e Lakatos12, 2001). No caso deste tra-

Nardino S, Dalcul AL, Gil P. Controle de estoque de OPMESão Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 113-9

115

ISSN 2176-9095

estudo de caso/case study

balho, optou-se, arbitrariamente por uma amostra de 6 elementos, cada um responsável por um setor en-volvido no processo de OPME do hospital em ques-tão (suprimentos, call center, bloco cirúrgico, CME, Ti e faturamento), além de fornecedores e médicos solicitantes.

Os dados foram coletados no período de agosto a dezembro de 2009 sendo finalizados no período de maio e junho de 2010, por meio de entrevistas não estruturadas e consulta a documentos. As entrevis-tadas foram realizadas nos setores de cada um dos entrevistados.

ReSultadoS e dISCuSSãoO presente estudo foi realizado em um hospital

privado localizado no Município de Porto Alegre – Rio Grande do Sul, o qual possui caráter privado, filantró-pico, voltando-se prioritariamente ao atendimento de pacientes de maior gravidade, ou com patologias mais complexas, exigindo, dessa forma, mais recursos tec-nológicos, humanos e infraestrutura adequada.

Os processos relacionados à gestão de estoques e movimentação de órtese, prótese e materiais es-peciais, no hospital em questão, englobam os setores de Call Center, Compras, CME, Bloco Cirúrgico e Faturamento.

Fluxo do Processo de OPMEOs dados aqui apresentados foram obtidos através

da observação do processo e pelas considerações ob-tidas nas entrevistas. O fluxo do processo de OPME é ilustrado na Figura 1.

Gargalos de Tempo e CustoMunidos de dados obtidos nos anos de 2009 e

2010, pertencentes ao hospital em questão, e dos relatos das entrevistas, verificou-se que o fluxo de OPME, da mesma forma que ocorre em outras ins-tituições de saúde, é um processo complexo, que envolve vários setores e sofre influências internas e externas.

De acordo com as entrevistas realizadas percebeu-se que os gargalos de tempo e custo ocorrem desde o início do processo. Segundo o médico entrevistado, que é o primeiro a realizar o contato com o paciente, diagnosticando e determinando a necessidade ou não de uma cirurgia, o processo do agendamento cirúrgi-

co é um pouco lento. Muitas vezes surge a dificuldade do repasse dos nomes dos materiais bem como dos três diferentes fornecedores, necessários conforme resolução normativa da ANViSA. Também acha-se problemática a questão das negociações com os pla-nos de saúde (autorizações, troca de material) dos quais eles (médicos) não são avisados, chegando no horário da cirurgia e percebendo que o material que solicitou não está ou é outro. Da mesma forma o Call Center, responsável pelo agendamento cirúrgico, re-lata a pressão do corpo clínico e as dificuldades rela-cionadas a nomenclaturas e fornecedores prescritos. “Os médicos querem o agendamento da cirurgia para o mais breve possível, o nível de exigência das opera-doras é grande (documentação, justificativa médica e prazos curtos) em contrapartida o prazo de resposta das operadoras é longo, e isso consequentemente, gera reclamações por parte do corpo clínico”, relata a responsável pelo agendamento cirúrgico do setor de Call Center.

Outra dificuldade é a qualificação dos materiais. Para evitar que peças de má qualidade sejam comer-cializadas ou implantadas nos pacientes, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANViSA) auxilia. é função do órgão fiscalizar os fabricantes de próteses e órteses. A fiscalização é feita uma vez por ano du-rante a autorização para o funcionamento, que está vinculada à certificação (ANViSA13).

Outro problema relacionado ao processo em es-tudo é o alto volume dos materiais das órteses e pró-teses que é quase inadministrável. Em virtude disso, deparamo-nos com um tema polêmico que ronda o mundo das órtese e próteses que é o assédio que os médicos sofrem dos fornecedores e distribuidoras de materiais e fabricantes. Esses estão dentro dos cen-tros cirúrgicos dos hospitais, oferecendo ao profis-sional materiais que facilitam o seu trabalho, sem, no entanto, trazer a confirmação de sua eficácia para o paciente. De acordo com o Código de ética Médica : “é vedado ao médico exercer simultaneamente a me-dicina e a farmácia, bem como obter vantagem pela comercialização de medicamentos, órteses ou pró-teses, cuja compra decorra de influência direta em virtude da sua atividade profissional” (CFM14, 2009). Pelos relatos obtidos nas entrevistas, não se obteve nada concreto a respeito desse assunto.

Quanto às dificuldades relatadas nas entrevistas

Nardino S, Dalcul AL, Gil P. Controle de estoque de OPMESão Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 113-9

116

ISSN 2176-9095

estudo de caso/case study

em relação às nomenclaturas aos códigos utilizados para os diversos materiais de órtese e prótese, apesar de a Anvisa possuir tabelas com nomes e códigos dos produtos, os fornecedores não as utilizam. O hospital acaba tendo que se adaptar ao fornecedor, o que faz com que o setor de Ti tenha que constantemente criar novos códigos, bem como realizar atualizações de tabela constantemente.

De acordo com a Agência de Saúde Suplementar (ANS15, 2010), as terminologias usadas para solicita-

ção de próteses, órteses e medicamentos vão passar por um processo de unificação na saúde suplemen-tar. A ideia é que hospitais, laboratórios, operadoras de saúde, ANViSA e ANS usem uma nomenclatura única para medicamentos, próteses e órteses (ANS15, 2010).

Em se tratando de operadoras de planos de saú-de, percebeu-se que o número crescente de procedi-mentos com uso de materiais cirúrgicos de alto cus-to (OPMEs) e o valor dos produtos, cada vez mais

Figura 1: fluxograma do processo de opme do hospital em estudo. Fonte: Pesquisa de campo – observação.

Nardino S, Dalcul AL, Gil P. Controle de estoque de OPMESão Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 113-9

117

ISSN 2176-9095

estudo de caso/case study

onerosos para os planos de saúde, fazem com que as relações estabelecidas entre paciente, plano de saúde, hospitais e fornecedores, muitas vezes sejam conflituosas. Na instituição estudada, tal situação não é diferente.

A relação com as operadoras de saúde é difícil quando se trata da utilização de OPME. Há, inega-velmente, uma pressão econômica que busca a redu-ção de custos com a saúde, propiciando as negativas dos materiais conhecidos como alto custo ou OPME (Schahin16, 2008). Quando uma Operadora de Saúde nega algum material de alto custo, mesmo que emba-sada tecnicamente, de imediato cria-se um problema para todos os protagonistas do sistema - paciente, médico, hospital, operadora e a empresa financiadora. Todos ficam descontentes ou desconfortáveis. Pelos relatos obtidos no hospital em estudo, observou-se que estas dificuldades geradas pelos planos de saúde em relação à liberação de OPME, ocasionam, além de descontentamento, uma grande perda de tempo no fluxo geral do processo e retrabalho por parte dos

envolvidos.Órteses e próteses, cuja colocação exija a rea-

lização de procedimento cirúrgico, têm cobertura obrigatória nos planos regulamentados pela Lei nº 9.656/98 (ANS17, 1998). Cabe ao médico assistente a prerrogativa de determinar as características do im-plante a ser usado e justificar clinicamente a sua indi-cação, quando solicitado. A operadora pode escolher a marca e a procedência do implante a ser coberto, desde que este atenda às especificações determinadas pelo médico assistente (ANS15, 2010).

As operadoras de saúde, antes de negar qualquer nova técnica, devem fazer uma minuciosa avaliação quanto à eficácia, efetividade, benefícios, qualidade, entre outros aspectos. Os custos administrativos com que todos arcam em torno desse assunto pode-rão ser revertidos para outras atividades que agrega-rão maior valor ao consumidor final - o paciente.

Custos x BenefíciosConsidera-se um custo direto quando há neces-

Font

e: P

esqu

isa

de c

ampo

.

Figura 2: Custo e Receita Total do hospital no período de agosto de 2009 a agosto de 2010, bem como os custos e receitas de opme no mesmo período.

Nardino S, Dalcul AL, Gil P. Controle de estoque de OPMESão Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 113-9

118

ISSN 2176-9095

estudo de caso/case study

sidade de sua presença para o andamento do pro-cesso a que se propõe o hospital. Em nosso estudo, os custos diretos respondem por 42% dos custos e despesas totais do hospital.

Dentre os custos diretos, as órteses, próteses e materiais especiais, objetos do nosso estudo, no período de agosto de 2009 a agosto de 2010, res-ponderam por 25,6% do custo direto do hospital, e 10,8% do custo total. No total do período, a OPME determinou uma média de dispêndio mensal de R$ 1.964.571,00.

Ao longo dos 12 meses (agosto de 2009 a agosto de 2010) o hospital em estudo mostrou uma receita pertinente a OPME de R$ 27.511.139,00, o que cor-responde a 11,7% da receita total obtida nesse perí-odo.

Percebe-se, dessa forma, que, apesar do alto custo resultante dos itens de OPME na fatura hospitalar, os mesmos ainda conseguem gerar uma lucratividade significativa (Figura 2), obtendo, nesse período de es-tudo, uma margem bruta com OPME de 14,3%.

Em virtude da importância do custo com mate-riais de OPME no âmbito das organizações hospita-lares, observou-se que embora o fluxo do proces-so envolva um dispêndio tanto de custo (Figura 1) quanto de tempo, significativamente elevados, e ape-sar de o hospital apresentar algumas dificuldades no fluxo do processo de OPME, consegue ter um bom controle do processo, o que faz com que tenha uma lucratividade significativa. Quanto ao quesito tempo (incluindo-se as dificuldades encontradas no fluxo do processo) este ainda necessita de uma atenção maior. As séries de restringências que surgem no decorrer do processo, se solucionadas, acarretariam um fluxo

mais ágil que consequentemente refletiria na melhora da receita final de OPME. A necessidade do controle de tempo e custo no processo de OPME é fundamen-tal, uma vez que se trata de componentes relevantes para a assistência a ser prestada.

ConCluSãoÓrteses, próteses e materiais especiais, são, atual-

mente, os grandes vilões dos custos na saúde. Neste trabalho verificou-se, dentro do propósito da pesqui-sa, que as OPMEs são uns dos componentes de maior peso na fatura hospitalar. O processo envolvendo es-tes itens, apesar de bastante complexo, mostrou ter uma boa relação custo-beneficio. Embora apresente alguns gargalos, entre os quais se destaca o tempo despendido durante o fluxo de OPME, o hospital con-segue ter um controle do fluxo e do estoque desse processo, que promovem a viabilidade e os benefícios da utilização de processos gerenciais específicos na administração de OPME.

Na visão da pesquisadora, as dificuldades enfren-tadas pelos setores que realizam o fluxo de OPME, no hospital em estudo, refletem claramente no custo final do processo. A falta de padronização dos pro-cessos afeta diretamente os custos e a qualidade final, além da ocorrência de retrabalho que gera desper-dício de tempo, materiais e mão de obra. Quanto à importância do trabalho, o estudo se destaca por permitir o crescimento da aprendizagem e a possibi-lidade do conhecimento acerca do tema pesquisado. A ausência de estudos voltados para os aspectos da experiência prática do processo de OPME nas insti-tuições hospitalares reforça a dificuldade que estes têm para organizar o seu fluxo de forma eficiente.

Nardino S, Dalcul AL, Gil P. Controle de estoque de OPMESão Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 113-9

119

ISSN 2176-9095

estudo de caso/case study

RefeRências

1. Arozo R. Monitoramento de desempenho na gestão de estoque. Rio de Janeiro: uFRJ; 2002 [cited 2009 03/05]; Available from: http://www.cel.coppead.ufrj.br/fs-busca.htm?frmonitor.htm.

2. Martins PG. Administração de materiais e recursos patrimoniais. São Paulo: Saraiva; 2002.

3. Pozo H. Administração de recursos materiais e patrimoniais: uma abordagem logística. 2 ed. São Paulo: Atlas; 2002.

4. Fitzsimmons JA, Fitzsimmons MJ. Administração de serviços: operações, estratégia e tecnologia de informação. 5 ed. Porto Alegre, RS: Bookman; 2005.

5. Cavallini M, Bisson M. Farmácia hospitalar: um enfoque em sistemas de saúde. São Paulo: Manole; 2002.

6. Francisco i, Castilho V. A enfermagem e o gerenciamento de custos. Rev Esc Enferm uSP 2002 36(3):240-4.

7. Vecina N, Ferreira J. Administração de materiais para sistemas locais de saúde. in: Ve-nâncio EPdSJ, editor. Administração. Rio de Janeiro: Fiocruz 2001. p. 117-58.

8. Quinto N, Bittar O. Hospitais: administração da qualidade e acreditação de organiza-ções complexas. Porto Alegre: Dacasa; 2004.

9. Lourenço K. Nível de atendimento dos materiais classificados como críticos no Hospi-tal universitário da uSP [Dissertação]. São Paulo: universidade de São Paulo; 2006.

10. Lima F, Rodrigues R. Almoxarifado hospitalar. 2009 [cited 2009 22/09]; Available from: http://www.administradores.com.br/producao_academica/almoxarifado_hospi-talar/1679/

11. Vieira A. As tipologias, variações e características da pesquisa de marketing. Rev FAE 2002 5(1):61-70.

12. Marconi M, Lakatos E. Metodologia do trabalho científico. 6 ed. São Paulo: Atlas; 2001.

13. ANViSA. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária. [cited 2010 24/07]; Available from: http://www.anvisa.gov.br/servicosaude/organiza/inaiss/glossário.doc.

14. CFM. Código de ética médica. capítulo Vii, artigo 69. resolução CFM número 1931 2009 [cited 2010 17 de setembro]; Available from: http://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=20663:capitulo-viii-remuneracao--profissional&catid=9:codigo-de-etica-medica-atual&itemid=122.

15. ANS. Resolução normativa - RN nº 211. 2010 [cited 2010 11 de janeiro 2010]; Avai-lable from: http://www.ans.gov.br/.

16. Schahin R. Relação OPME, operadoras de saúde, você e o doutor. 2008 [cited 2010 15 de janeiro]; Available from: http://www.unidas.org.br/noticias.

17. ANS ANdSS. Lei nº 9.656, de 03 de junho de 1998. Dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde. 1998 [cited 2010 20 de setembo ]; Available from: http://www.ans.gov.br/portal/site/legislacao/legislacao_integra.asp?id_original=455

120

Science in Health 2011 mai-ago; 2(2): 120-2

ISSN 2176-9095

Qual é a sua opinião sobre seu nível atual de ativi-dade física? Ao pensar em se exercitar regularmente, que atividades ou locais vêm a sua mente? Quanto pensa em gastar nessa empreitada? Por que você, re-petidas vezes garante que vai continuar e para? Você se preocupa com as calorias de suas refeições? Este ensaio caracteriza-se por reflexões sobre respostas a essas perguntas.

Temos um organismo plástico o qual se adapta às atividades que realiza cotidianamente; assim uma pes-soa “condicionada” está adaptada para realizar muitos movimentos tardando para se cansar; já o “sedentá-rio” tem um organismo adaptado a realizar pouco movimento. Em outras palavras, para nos tornarmos fortes precisamos exercer nossa força habitualmente, o mesmo para o equilíbrio, flexibilidade, resistência, etc. (MCARDLE et al., 2003).

Historicamente, nossa capacidade de movimento esteve atrelada à nossa capacidade de adaptação ao ambiente. Tínhamos, em nosso trabalho adaptativo, a principal forma de treinamento e utilização de nos-sos movimentos e de nosso corpo. Contudo, a partir da evolução social, nossas necessidades adaptativas sobrepuseram-se desde uma base primitiva relaciona-da à alimentação, reprodução e sobrevivência até as demandas atuais relacionadas à aceitação social, quali-dade de vida e acesso aos bens de consumo.

À medida que nossas necessidades se sobrepu-nham também se adensavam e aumentavam nossas formas de produção e consumo. Nesse processo evolutivo social, o deslocamento progressivo do tra-balho físico para as máquinas tornou a participação humana mais cognitiva. A popularização do uso de computadores modificou o modo como interagimos com as informações, criando a “realidade virtual”.

Esse fenômeno, de termos uma quantidade cada vez maior de informações disponibilizadas e consumi-das por meios virtuais, foi chamado de Cibercultura

MOViMENTO ECOLÓGiCO

ecoloGical movement

Pedro Fernando Viana Felicio*

* Mestre em Motricidade Humana, pela uNESP, membro dos grupos de estudos sobre Comportamento Motor e intervenção Motor (GECOM) e Fisio-logia e Netabolismo Aplicados à Atividade Física e professor do curso de Bacharelado em Educação Física da uNiCiD.

por Lévy (1999). Consideramos que a atual imensa abrangência da Cibercultura tem levado à mentali-zação da experiência humana, e inibiu nossa natural interação motora com as informações ambientais. A experiência virtual substituiu a experiência física real, criando um novo ambiente de produção e consumo, assim, o fenômeno real passou a ser percebido por sua representação informacional virtual.

Partindo do pressuposto de que cada movimen-to humano corresponde a um pensamento e a uma emoção (FONSECA, 1996), especulamos neste en-saio que essa troca de experiências físicas reais por experiências virtuais pode ter criado um déficit em nosso nível natural diário de sensações físicas com o ambiente. E o fato de as pessoas estarem consumindo cada vez mais alimentos, ultrapassando suas necessi-dades fisiológicas, pode ser também parte de um me-canismo de compensação desse déficit de sensações físicas.

Será que ao nos alimentarmos, podemos estar também nos abastecendo de interações orgânicas com nosso ambiente físico representado, nesse caso, pelos alimentos. Seria a obesidade causada por um déficit crônico de sensações físicas que, para ser ame-nizado, levaria a um superávit alimentar crônico?

Longe das especulações, prevalece o consenso de que a sociedade atual, além do consumo alimentar elevado, apresenta uma taxa de sedentarismo recor-de em nossa história evolutiva. Estamos nos tornando dependentes de uma série de máquinas consumidoras de energia do ambiente. Quanto mais esgotamos as reservas energéticas do planeta, mais nossas reservas energéticas corporais se tornam doentiamente ele-vadas!

Os efeitos desses hábitos já atingem todos os ní-veis da população brasileira. Na pesquisa sobre antro-pometria e estado nutricional de crianças, adolescen-tes e adultos, realizada, no Brasil, pelo iBGE, de maio

Ponto de Vista/Point of View

Felicio PFV. Movimento Ecológico. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 120-2

121

Ponto de Vista/Point of View

ISSN 2176-9095

de 2008 a maio de 2009, com 188.461 pessoas e di-vulgada em 27 de agosto de 2010, é citado que o ex-cesso de peso e a obesidade mostraram crescimento em todas as idades, classes de rendimentos e regiões tanto na situação urbana como na rural. (iBGE, 2011).

Em vista disso, seria oportuno retomar os ques-tionamentos com que iniciamos este texto. Por que grande parte dos brasileiros tem um estilo de vida sedentário e não consome o mínimo satisfatório de movimentos preconizados e oferecidos pelos profis-sionais de Educação Física?

Acreditamos que os aspectos já citados da amplia-ção do uso de máquinas e da “informatização/virtu-alização” das experiências físicas podem, em parte, responder à pergunta acima. Entretanto, acredita-se que a própria Educação Física se influenciou pela ló-gica capitalista dominante e acabou por negligenciar algumas características fundamentais que motivam ao movimento.

um primeiro ponto que acreditamos ter sido ne-gligenciado pela Educação Física foi o afastamento dos seus serviços de atividades físicas das atividades da vida diária, tornando-os exóticos ou ao menos distan-tes das tarefas realizadas habitualmente pelas pessoas. Essas tarefas normalmente estiveram relacionadas à satisfação de alguma necessidade de trabalho. Mas, excluindo-se o condicionamento físico e o eventual prazer intrínseco da atividade, a maioria das ativida-des oferecidas pela Educação Física não tem uma uti-lidade produtiva.

Entretanto, a maior parte dos treinos físicos con-siste na execução de trabalho físico, assim como a maioria de nossas habilidades motoras está relaciona-da a alguma forma de trabalho, remunerado ou não. Porém, inserida na lógica de que o consumidor não poderia pagar para trabalhar, atualmente os serviços relacionados à educação física consistem em traba-lhos físicos que não repercutem em interações positi-vas com o ambiente e não ampliam o alcance do gesto motor além do simples condicionamento individual.

E assim, muitas pessoas que estão inseridas em um ambiente competitivo, próximas de seu limite de produção e de consumo, passaram a não se satisfazer com as opções artificiais oferecidas para seu trabalho físico, “[...] em geral, as pessoas não desperdiçam re-cursos, e os utilizam da melhor forma possível a fim de obter o que desejam...” (PATEL, 2010).

Corroborando com a opinião dos que consideram um desperdício as propostas motoras oferecidas pela Educação Física. Hecht (2009), argumenta que não conseguimos fazer trabalhos sem objetivo. A auto-ra cita que estamos em plena crise energética, mas quando uma pessoa saudável deseja fazer um esforço físico precisa acionar uma esteira elétrica. “O único trabalho físico disponível é não só sem sentido, na verdade esgota nossos recursos.” (HECHT, 2009).

Não defendemos que a Educação Física deva aban-donar suas práticas atuais, mas sim complementá-las com opções para as pessoas que querem trabalhar seus corpos em sinergia com mudanças positivas no ambiente. Que as pessoas aprendam, desde cedo, como treinar seus corpos também utilizando suas ati-vidades diárias de trabalho, como, por exemplo, fazer compras no mercado, lavar um carro ou casa, jar-dinagem, pintura, reflorestamentos e deslocamentos urbanos úteis.

Algumas aulas de educação física poderiam trocar os uniformes esportivos obrigatórios e os esportes com quadras e regras rígidas, distantes da realidade cotidiana das crianças, por vivências motoras que as desenvolvam em conjunto com o ambiente.

Os cursos superiores de Educação Física poderiam oferecer uma disciplina ou unidade de conhecimento, talvez chamada simplesmente de “Trabalho”. Pois o conceito físico de trabalho significa uma forma de se transferir energia a um corpo, ou ainda que “energia é definida como a capacidade de realizar trabalho.” (HiNRiCHS e KLEiNBACH, 2003).

Vivemos justamente o tempo dos acordos mun-diais para a redução do consumo de energia do am-biente. E também o tempo da epidemia de obesidade e o tempo do maior sedentarismo da história. Não por acaso, esse é também o tempo da cultura do con-forto; socialmente supervalorizamos cada nova má-quina que realize algum de nossos trabalhos. Pagamos caríssimo por carros que nos avisam sobre obstácu-los sem que tenhamos sequer que olhar para trás, ou que nos economizem segundos de esforços para estacioná-los; fazemos filas à porta dos elevadores mesmo em prédios de poucos andares; muitas crian-ças já preferem jogar futebol de forma virtual a real.

Não está na hora de propormos e implantarmos mudanças que aumentem a harmonia de nossas ações motoras com o ambiente? Se a Educação Física não

Felicio PFV. Movimento Ecológico. São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 120-2

122

Ponto de Vista/Point of View

ISSN 2176-9095

encabeçar esse processo, então quem o fará? é provável que, quando retomarmos e ampliarmos

nossa presença física nas experiências diárias, tenha-mos novas percepções e relações com o ciclo de pro-dução e consumo. Os aspectos tangíveis das experi-ências físicas, que estiveram naturalmente atrelados à evolução humana, têm o potencial de reorganizar a percepção de nossas reais necessidades e formas de

consumo. Poderemos interagir com o ambiente de maneira muito mais harmônica e econômica do ponto de vista da utilização ecológica de nossos recursos energéticos.

“A sociedade de mercado não transforma sim-plesmente as coisas em mercadorias – ela cria a pró-pria cultura as próprias ideias sobre a natureza huma-na e a ordem social” (PATEL, 2010)

RefeRências

FONSECA, V. Psicomotricidade. 4.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

HECHT, J. M. O mito da felicidade: por que o que achamos que é certo é errado. São Paulo: Larousse, 2009.

HINRICHS, R. A. and M. KLEINBACH. Energia e meio ambiente. São Paulo: Cengage Learning, 2003.

iBGE. Antropometria e estado nutricional de crianças, adolescentes e adultos no Brasil POF 2008 - 2009. Rio de Janeiro 2011. Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/pesquisas/resultado.php?consulta=antropometria+e+estado+nutricional+ >. Acesso em: 18 abr. 2011.

LéVY, P. Cibercultura. Rio de Janeiro: 34, 1999.

MCARDLE, W. D., F. I. KATCH, et al. Fisiologia do exercício: energia, nutrição e de-sempenho humano. 5.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.

PATEL, R. O valor de nada: por que tudo custa mais caro do que pensamos. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.

123

Science in Health 2011 mai-ago; 2(2): 123-4

ISSN 2176-9095

...smoking is bad for my health... it smells... it’s expensive... (but) it doesn’t change the fact that i’m still going to die. we all will one day. So, why does anyone care if I smoke?A consumer

This book, by Allan Brandt, hits directly and mer-cilessly the “Big Tobacco”, the American tobacco in-dustry. Brandt is the Dean of the Graduate School of Arts and Sciences and Professor of History of Medi-cine at Harvard Medical School. A Ph.D. in American History from Columbia university in 1983, he works on social and ethical aspects of health, disease, and medical practices in the twentieth century in the uni-ted States.

The Cigarette Century has five chapters dealing with culture, science, politics, law and the globalization is-sue of the smoking habit. First things first: tobacco production emerged as large plantations supported by slaves, but also in small and independent family far-ms by late seventeenth century, way before the ciga-rette as a product. Cigarettes, though, were deemed still a curiosity in the years of the Civil war, the 1860s. A few years later, the prototype of a cigarette rolling machine would change that image. Consider that in 1900 chewing tobacco was the way of consuming by 48% of people used to it. The cigarette then accom-plished only 2% at that time. This figure changed to 81% in 1950, a blueprint of mass culture, of mass con-sumerism...

Seeking every opportunity, the tobacco industry made its way in every turn of history during the twen-tieth century, as Allan Brandt points out. During the first World War (WWi), General Pershing, of Ame-rican Forces, answering on what was needed to win that conflict stated: “...tobacco, as much as bullets”. And WWi accelerated the consuming of cigarettes. Not only accelerated... The American culture increa-sed the Cult of Personality, and it would be hard to free

the image of a hero from WWi and his victorious ci-garette from something improper, or even unhealthy. in this regard, identification, immensely boasted by the tobacco industry as a succesful, young and beautiful smoker proved to be a crucial element in the complex structure of consumer culture. And the Big Tobacco was the most notable user, perhaps even the first ow-ner of such a strategy.

But the industry outperformed itself in the years after WWI. In 1947 during an American Medical As-sociation meeting, doctors lined up to get free ciga-rettes... At the same time, the first studies that would demonstrate the causal relationship between smoking and lung cancer had began. Not so easy, though. Bran-dt demonstrated (notice the chapter “More Doctors Smoke Camel”) that the tobacco industry invested heavily in the successful production of a scientific con-troversy by means of a simple statement: not proven. Epidemiology, statistics and animal experiments were all considered by tobacco companies as inconclusive studies, and so intensively propagated.

This careful strategy went beyond science to mix with politics, underpinned by culture. The uS Surge-on General, in 1964, stated the consistency, strength, specificity, temporal relationship of associated varia-bles and the coherence of association between to-bacco consum and cancer disease. That report succe-eded in setting the question of smoking harms – and also established the scientific validity of the surgeon general in matters of public health policies that last till these days. Even though, the uS Surgeon General statement was not enough to discredit the previous controversy raised by Big Tobacco (“not proven”). The advice could not get even close to disrupt the roots of a product that penetrated deeply into the economic and financial structures of American indus-try, media, and politics.

One of the most interesting documentation is the concealed connection between this industry and the

THE CiGARETTE CENTuRY

Resenha de liVRo/Book ReView

dr Joaquim edson Vieira*

* Editor Chefe da Revista “Science in Health”, universidade Cidade de São Paulo.

Brandt am. The cigarette century.São Paulo • Science in Health • 2011 mai-ago; 2(2): 123-4

124

ISSN 2176-9095

Resenha de liVRo/Book ReView

AMA (American Medical Association). Since AMA de-cided to defend the physician’s autonomy, it did not support the Surgeon General advice... instead, the as-sociation promoted the physician as the only source of authority to advice against smoking. Although it appears a simple matter of professionalism, that pos-ture was widely supported and even promoted by Big Tobacco, as a way of tapering the announce that smoking is associated with cancer diseases (!).

Another interesting battle described by Brandt is the inforcement of laws inhibiting smoking in public space, avoiding the second-hand smoking, and how the social acceptability of cigarette use fell precipitou-sly from the 1960s on. However, still the Big Tobacco found its way through by promoting the menthol ci-garettes among African-Americans – who considered those brands associated to some sort of medicinal taste, linked to healing practices and dating back to the colonies... Even the mandated warning label in packages (that related smoking with diseases) tur-ned into a major triumph for tobacco defense. The explanation: since the American culture emphasized individual responsibility, now smokers would bear the blame for their willful risk-taking behavior. Smart move, again...

Finally, Big Tobacco suffered important losses

from litigation, described in the chapters dealing with Law. However, still the industry proved succesful in devising new ways to resist public health regulations and keep in promoting its product. Even with the pu-blic knowledge from a federal American court that the tobacco industry engaged in a conspiracy to de-fraud the american people (“lied, misrepresented and deceived”) about the mortal dangers of cigarette and the addiction (at this time then, proved), nonetheless the law, by its own constitution, could not restrain any future behavior of that industry.

This is a book not to be missed by the general public but i would suggest it should be an obligatory reading for physicians. i have never sttoped marketing this book since i finished its reading. Even though not yet available in Portuguese and also a massive text (600 pages), The Cigarette Century needs to have our attention. And the book boosts a careful and huma-ne way to avoid as well as to recover people from smoking habit, a battle to be fought until the last man standing.

The Cigarette CenturyAllan M. BrandtBasic Books, New York, 2007.ISBN: 978-0-465-07048-0

IN